Prévia do material em texto
O fim da venda de soluções Brent Adamson Harvard Business, 7 agosto, 2012 Hoje em dia, o aspecto mais difícil da venda de empresa a empresa, ou B2B, é que o cliente já não precisa de você como antes. Nas últimas décadas, o pessoal de vendas dominou a arte de descobrir o que o cliente precisava para poder vender “soluções” — em geral, combinações complexas de produtos e serviços. Isso funcionava porque o cliente não sabia como resolver o próprio problema, ainda que tivesse uma boa noção de qual era esse problema. Mas agora, com equipes de prospecção cada vez mais sofisticadas e consultores de compras externos munidos de toneladas de dados, é fácil para uma empresa definir sozinha suas soluções. Com efeito, um estudo recente do Corporate Executive Board com mais de 1.400 clientes B2B concluiu que esses clientes realizavam, em média, quase 60% de toda atividade envolvida em uma típica decisão de compra — pesquisa de soluções, classificação de opções, definição de requisitos, comparação de preços e por aí vai — antes mesmo de ir falar com qualquer fornecedor. Nesse mundo, o festejado “vendedor de soluções” pode ser mais um aborrecimento do que uma mão na roda. Clientes de uma leva de setores — de TI e seguros à terceirização de processos empresariais — não raro estão bem à frente dos vendedores destacados para “ajudá-los”. Mas nem tudo é má notícia. Embora o vendedor tradicional esteja em clara desvantagem nesse ambiente, um seleto grupo de profissionais de alto desempenho vai de vento em popa. Esses supervendedores deixaram para trás muitas das velhas verdades ensinadas em organizações de vendas. Em vez disso: Avaliam possíveis clientes por critérios distintos dos usados por outros vendedores. Fecham o foco em organizações ágeis, em fluxo, não as que já possuem uma clara compreensão de suas necessidades. Seu alvo são pessoas muito diferentes na empresa do cliente. Preferem agentes de mudança céticos, em vez de informantes camaradas. Orientam esses agentes de mudança sobre como comprar, em vez de sabatiná-los sobre o processo de compras da empresa. Não é que esses profissionais vendam com mais eficiência — vendem também de outro jeito. Isso significa que para turbinar o desempenho do vendedor médio, não basta melhorar a forma como vende atualmente. É preciso mudar completamente o modo como esse profissional vende. Para isso, a organização terá de repensar radicalmente a formação e o apoio que dá à força de vendas. Velho modelo já não basta No método convencional de venda de soluções que reina desde os anos 1980, o vendedor é treinado para alinhar uma solução a uma necessidade reconhecida do cliente e demonstrar por que ela é melhor do que soluções da concorrência. Isso leva a uma abordagem muito prática: o vendedor começa por identificar clientes que reconhecem ter um problema que o fornecedor pode resolver e dá prioridade àqueles que já estão prontos para agir. Em seguida, com uma série de perguntas, o vendedor encontra um “gancho” que lhe permita vincular a solução da empresa ao problema em questão. Nessa abordagem, é essencial identificar e cultivar um contato na organização do cliente — um aliado, ou coach — que possa ajudar o vendedor a se mover pelos meandros da empresa até concretizar o acordo. Hoje, porém, muito cliente abandonou por completo velhas formas de comprar e gerentes de vendas veem, cada vez mais, seu pessoal relegado a disputas movidas puramente a preços. Um diretor de vendas de uma empresa de tecnologia contou: “Nossos clientes estão chegando à mesa (...) com uma profunda compreensão dos problemas que enfrentam e com uma solicitação de proposta comercial bem detalhada para a solução. Com isso, muita discussão sobre vendas está virando uma discussão já sobre o ‘fulfillment’”. O vendedor precisa aprender a abordar o cliente muito mais cedo, bem antes que este entenda plenamente suas necessidades. De certo modo, é uma estratégia tão velha quanto a própria venda: para fechar um acordo, é preciso se antecipar à solicitação de proposta. Nossa pesquisa mostra, no entanto, que, embora seja mais importante do que nunca, isso já não basta. Para descobrir o que diferencia profissionais de vendas de alto desempenho (os 20% superiores em termos de cumprimento de cotas) de outros vendedores, a Corporate Executive Board fez três estudos. No primeiro, entrevistamos mais de 6 mil vendedores de 83 empresas, abrangendo todos os principais setores. Queríamos saber como priorizam oportunidades, identificam e abordam contatos na empresa e executam o processo de vendas. No segundo, examinamos cenários complexos de compras em quase 600 empresas de diversos setores para entender distintas estruturas e influências de equipes formais e informais de compras. No terceiro, estudamos mais de 700 indivíduos envolvidos no processo de compras complexas em clientes B2B para determinar o impacto de cada tipo de interlocutor desses em decisões de compras da organização. Nossa principal conclusão: vendedores de melhor desempenho abandonaram a cartilha tradicional e conceberam uma abordagem nova, até radical, fundada nas três estratégias esboçadas acima. Examinemos cada uma delas. PRIMEIRA Estratégia - Evite a cilada da “demanda estabelecida” A maioria das organizações orienta seus vendedores a dar prioridade a clientes cuja alta gerência satisfaça três critérios: tenha uma necessidade reconhecida de mudança, uma visão clara de seus objetivos e processos bem estabelecidos para a tomada de decisões de compra. Em geral, é fácil checar se esses critérios foram satisfeitos e tanto vendedores como seus líderes se pautam por eles para prever a probabilidade e o progresso de um potencial acordo. Aliás, muitas empresas chegam a monitorar esses critérios com um “scorecard”, ou painel, projetado para ajudar vendedores e gerentes a otimizar seu tempo, alocar apoio especializado, apresentar propostas e melhorar suas projeções. Nossos dados, porém, mostram que os melhores vendedores dão pouca bola a esses indicadores tradicionais. Em vez disso, sua atenção vai para dois critérios nada convencionais. O primeiro é a agilidade do cliente: o cliente é capaz de agir com rapidez e determinação quando diante de uma proposta convincente, ou está de mãos atadas por estruturas e relacionamentos que impedem a mudança? O segundo critério é buscar clientes às voltas com uma nova necessidade ou em estado de fluxo organizacional, seja por pressões externas, como uma reforma regulamentar, ou internas, como uma aquisição recente, uma troca no alto comando ou insatisfação generalizada com práticas atuais. Como já estão revendo sua situação e em busca de insights, esses clientes são naturalmente mais abertos a ideias disruptivas que o supervendedor porventura apresente (veja o boxe “Como mudar o modo de pensar do cliente”). Em outras palavras, um supervendedor dá mais ênfase ao potencial do cliente de mudar do que a seu potencial de comprar. Esse profissional consegue chegar cedo e apresentar uma solução de ruptura porque mira contas onde a demanda está despontando — e não estabelecida. Ou seja, contas prontas para a mudança, mas que ainda não geraram o necessário consenso, muito menos optaram por um curso de ação. Uma consequência dessa orientação é que um astro das vendas trata pedidos de proposta comercial de um modo muito distinto do vendedor típico. Enquanto este considera um pedido de proposta como o melhor sinal de uma oportunidade promissora, o supervendedor o enxerga por aquilo que realmente é: um convite para disputar um contrato que, provavelmente, será concedido a um fornecedor favorito. O supervendedor usa essa ocasião para reformular a discussão e converter um cliente com necessidades claramente definidas em um cliente com novas necessidades. Mesmo quando chega com o processo já avançado, tenta fazer a decisão de compra retroceder a um estágio bem anterior. Um líder de vendas de uma prestadora de serviços a empresasrelatou há pouco um episódio envolvendo um dos melhores vendedores da casa. Convidado a apresentar uma proposta de serviços, assim que chegou o vendedor foi dando à reunião o rumo que queria. “Aqui está nossa resposta à solicitação de vocês. Tudo o que vocês pediram está aí”, disse aos executivos ali reunidos. “Mas, como só temos 60 minutos para falar, é melhor que vocês leiam isso depois. Gostaria de usar esse tempinho para mostrar a vocês três coisas que, a nosso ver, deviam estar no pedido, mas não estão, e explicar por que isso é tão importante.” No final da reunião, o cliente dispensou os outros dois vendedores que ainda esperavam a vez, cancelou o processo de solicitação de proposta e recomeçou do zero: o vendedor tinha deixado claro para os executivos que a empresa estava fazendo a pergunta errada. Reformulou o negócio de modo a alinhá-lo com os pontos fortes de sua empresa e, no final, fechou o contrato. Assim como outros supervendedores, sabia que o certo não era tentar satisfazer necessidades presentes do cliente, mas redefinilas. Em vez de adotar a abordagem convencional de vender soluções, usou a estratégia da “venda de insights”, revelando ao cliente necessidades que este nem suspeitava que tinha. Pesquisa na prática. Com base em dados obtidos inclusive de entrevistas com cerca de cem profissionais de alto desempenho em todo o mundo, criamos um novo scorecard. A ferramenta pode http://www.hbrbr.com.br/sites/default/files/agosto2012/adamson_box3.jpg ser usada por gerentes para orientar vendedores e ajudá-los a adotar critérios e abordagens priorizados por supervendedores (veja o boxe “Priorize suas oportunidades”). Uma empresa de automação industrial com a qual trabalhamos teve sucesso no uso do scorecard — depois de ajustes mínimos para computar peculiaridades do setor. Ali, quando gerentes se reúnem com vendedores para priorizar atividades e avaliar oportunidades, a ferramenta dá um caminho concreto para redirecionarem vendedores medianos para oportunidades que talvez não estejam enxergando, ou dando suficiente atenção, e orientar a conversa naturalmente para a identificação de necessidades emergentes (um porém: um scorecard formal pode gerar processos burocráticos e extremamente elaborados para avaliar potenciais clientes; deve ser usado pelo gerente de vendas para iniciar uma discussão e orientar o treinamento, não como um checklist inviolável). SEGUNDA Estratégia - Busque mobilizadores, não aliados Como já observamos, no treinamento convencional o vendedor é orientado a buscar um aliado, ou coach, dentro da organização do cliente, para ajudálo a fechar o negócio. Até os atributos dessa pessoa são elencados. A descrição abaixo, compilada a partir do material de treinamento de dezenas de empresas, sugere que o aliado ideal: - é acessível e disposto a conversar quando necessário; - possui informações valiosas às quais gente de fora normalmente não tem acesso; - é predisposto a apoiar a solução do fornecedor; - é capaz de influenciar os outros; - fala a verdade; - tem credibilidade junto aos colegas; - transmite ideias novas aos colegas de modo inteligente e persuasivo; - faz o que promete; - tem algo a ganhar, pessoalmente, com a venda; - ajuda o vendedor a fazer contato com outros envolvidos no processo de compra. Ouvimos esta mesma lista, ou alguma variação dela, da boca de líderes de venda e especialistas em treinamento em todo o mundo. Acontece, porém, que esse ideal de aliado não existe. Embora seja possível encontrar cada atributo desses em contatos na empresa do cliente, nossa pesquisa mostra que raramente uma única pessoa reúne todos. O resultado é que o vendedor se contenta em achar alguém que exiba alguns desses traços. E, nessa busca de um aliado, muitos passam reto justamente por gente que poderia ajudá-los a fechar o negócio — gente que os melhores vendedores já sabem reconhecer e usar como ponto de apoio. Em nossa pesquisa com gente envolvida em compras em clientes, pedimos que cada pessoa avaliasse a si mesma em 135 atributos e perspectivas. Nossa análise revelou sete perfis distintos de interlocutor e mediu a capacidade relativa de indivíduos de cada categoria de gerar consenso e mobilizar os outros em torno de uma grande compra ou iniciativa na empresa. Os perfis não são mutuamente excludentes; a maioria das pessoas exibe atributos de mais de um perfil. Mesmo assim, os dados mostram claramente que quase todo envolvido no processo de compras no cliente tem uma postura básica na hora de trabalhar com fornecedores e defender mudanças na organização. Eis os sete perfis que identificamos: 1. Empreendedor. Interessado na melhoria organizacional e sempre em busca de boas ideias, o empreendedor defende a ação com base em grandes insights, não importa de onde venham. 2. Mestre. Adora compartilhar o que sabe e é procurado por colegas interessados em ouvir sua opinião. Tem talento especial para convencer os outros a adotar um determinado curso de ação. 3. Cético. Avesso a projetos grandes e complicados, o cético faz objeção a quase tudo. Mesmo quando defende uma nova ideia, sugere cautela e comedimento na implementação. 4. Guia. Disposto a contar as últimas fofocas da organização, o guia dá informações às quais gente de fora normalmente não tem acesso. 5. Amigo. Simpático, como o nome sugere, o amigo está sempre disponível e com prazer ajuda o vendedor a fazer contato com outros interlocutores na organização. 6. Alpinista. Interessado basicamente no ganho pessoal, o alpinista apoia projetos que o coloquem em destaque e espera ser recompensado se um projeto desses der certo. 7. Bloqueador. Talvez um nome mais adequado seja “anti- stakeholders”. Gente desse perfil tem forte tendência a preservar o status quo — e pouco interesse em falar com fornecedores externos. Nossa pesquisa também revela que o vendedor mediano gravita para três destes perfis no cliente, enquanto o supervendedor é atraído para outros três. O mediano costuma procurar Guias, Amigos e Alpinistas — tipos que reunimos na categoria dos Falantes. É gente simpática e acessível. Está sempre pronta a dar informações sobre a empresa, o que aumenta muito seu apelo. Mas se seu objetivo for fechar um contrato, e não só bater papo, um Falante não será de muita ajuda: em geral, são tipos sem capacidade de gerar o consenso necessário para decisões de compra complexas. Ironicamente, o treinamento de vendas tradicional joga o vendedor diretamente nos braços dos Falantes — reforçando justamente o desempenho fraco que a empresa busca reverter. Já os tipos procurados por grandes vendedores — Empreendedores, Mestres e Céticos — têm muito mais capacidade de gerar consenso. São o que chamamos de Mobilizadores. Uma conversa com um Mobilizador nem sempre é fácil. Por ser gente interessada basicamente em promover mudanças produtivas para a empresa, é sobre isso que vão querer falar: a empresa deles, não a sua. Aliás, sob muitos aspectos, um Mobilizador é profundamente descrente em relação a fornecedores. Não costuma preferir um determinado fornecedor, mas sim um determinado insight. Um vendedor que siga a abordagem tradicional de apresentar “recursos e benefícios” dificilmente conseguirá conquistar Mobilizadores. Perguntas intermináveis e diagnósticos de necessidades não têm valor nenhum para Mobilizadores. Essa turma não quer que lhe perguntem o que tira seu sono à noite. Quer, isso sim, especialistas externos que tenham insights sobre o que a empresa deve fazer; são atraídos por ideias grandes, disruptivas. Contudo, ao ouvir uma ideia dessas, Mobilizadores fazem muitas perguntas difíceis. Se for um Empreendedor, pergunta porque quer agir; se for um Mestre, porque quer compartilhar; e se for um Cético, porque quer testar. Céticos são particularmente inclinados a destrinchar uma ideia antes de avançar. Isso pode intimidar muitos vendedores, que tomam o interrogatório do Cético por hostilidade,não por interesse. Mas um supervendedor adora esse tipo de conversa. Um deles nos disse: “Se o cliente não for cético e não me colocar contra a parede, ou fiz alguma coisa de errado ou ele simplesmente não está falando sério”. Pesquisa na prática. Trabalhamos com grandes vendedores do mundo todo na criação de um guia prático para a identificação de Mobilizadores (veja o boxe “Ache os aliados certos”). O primeiro passo é medir a reação de um cliente a um dado provocativo (vendedores da fornecedora de suprimentos industriais Grainger, por exemplo, abrem uma conversa citando dados que mostram que nada menos de 40% dos gastos de empresas em manutenção, reparo e operações são com compras não planejadas). Qual a reação do cliente? Rejeitar o dado de cara, aceitá-lo sem discutir ou colocá-lo à prova com perguntas difíceis? Ao contrário do que pensa a maioria, perguntas duras são um bom sinal; sugerem que o vendedor conseguiu a descrença saudável de um Mobilizador. Se o cliente aceitar a afirmação sem discutir, você está diante de um Falante ou um Bloqueador — com a diferença de que um Falante vai, ao menos, oferecer alguma informação útil sobre a organização, enquanto o Bloqueador simplesmente ficará na dele. Em seguida, o vendedor deve ouvir atentamente a forma como o cliente discute a ideia, à medida que a conversa avança. Cuidado com o cliente que diz algo como “Você está ensinando padre-nosso ao vigário. Faz anos que eu venho defendendo essa ideia aqui!”. Se a pessoa vê a ideia como um meio de promover sua própria agenda — se fala basicamente “eu”, e não “nós” —, é um forte sinal de que é um Alpinista. E esse tipo pode ser perigoso. Muitos supervendedores nos disseram que o perfil do Alpinista não é óbvio só para eles; é óbvio para todos, sendo muitas vezes causa de ressentimento e desconfiança entre os colegas. Um grande vendedor não vai supondo que identificou um Mobilizador enquanto essa pessoa não der provas com seus seus atos. Um craque das vendas costuma pedir a um possível Mobilizador que marque uma reunião com gente responsável por decisões na empresa ou que forneça informações que só se pode conseguir investigando com afinco um assunto ou consultando colegas. Uma grande vendedora de uma empresa mundial de telecomunicações nos explicou que sempre busca comprovar que seus contatos no cliente podem fazer o que dizem poder. Pede, em especial, que chamem executivos de alto escalão, não raro de outras áreas, para reuniões de acompanhamento. Se forem incapazes de trazer essa gente para as reuniões, ela conclui que, embora sonhem em mobilizar, essas pessoas provavelmente não têm os contatos nem o cacife para tal. TERCEIRA Estratégia - Mostre ao cliente como comprar Muitos gerentes de vendas ignoram um fato importante: se para o fornecedor já é duro vender uma solução complexa, para quem compra é ainda mais difícil. Isso vale sobretudo quando Mobilizadores estão a cargo. É que são “gente de ideias” — gente que tende a ter menos conhecimento do que Falantes dos meandros do processo interno de compras. Tendo visto acordos semelhantes darem em nada em outras organizações, o fornecedor normalmente está mais bem posicionado do que o próprio cliente para nortear o processo de compra pela organização. Um fornecedor pode prever prováveis objeções. Pode prever o jogo político entre silos. E, em muitos casos, pode eliminar problemas pela raiz. Esse processo é parte da estratégia global de dar, e não pedir, insights. Enquanto a maioria dos vendedores conta com o cliente para orientá-la pelo processo de venda, o supervendedor é quem orienta o cliente. À luz desse fato, vale a pena refletir sobre o tempo e o esforço investidos por organizações de vendas em aparelhar o vendedor para que este “descubra” qual o processo de compras do cliente. A maioria treina minuciosamente esse pessoal para sabatinar o cliente sobre como se dá a tomada de decisões ali dentro e como o negócio irá avançar — na suposição de que o cliente terá respostas precisas. É uma péssima estratégia. Essa ideia dá um nó na cabeça de líderes de vendas. Onde já se viu o vendedor guiar o cliente no processo de compra — quando o provável é que nem entenda as particularidades da organização do cliente? E não é verdade que cada cliente tem seu próprio processo de compra? Para dar uma http://www.hbrbr.com.br/sites/default/files/agosto2012/adamson_box5.jpg resposta breve: não. Um supervendedor que entrevistamos explicou: “Não perco muito tempo perguntando a meus clientes quem tem de participar do processo de análise, quem tem de dar a aprovação, quem tem a chave do cofre. O cliente não sabe. Para ele, esse tipo de compra é novidade. Em geral, sei mais do que o cliente sobre o modo como a compra vai se desenrolar. Deixo que defenda a visão internamente, mas minha função é ajudá-lo a fechar o acordo”. Pesquisa na prática. A Automatic Data Processing (ADP), líder mundial em soluções de terceirização, há pouco adotou uma metodologia para orientar seus vendedores — e a empresa toda — em torno de processos de compra do cliente. O programa foi batizado de Buying Made Easy (“Compra Fácil”). Como mudar o modo de pensar do cliente A venda tradicional de soluções parte da tese de que o vendedor deve abrir o processo com perguntas feitas para expor necessidades sabidas do cliente. Já a venda com base em insights pressupõe que o vendedor deve partir com ideias disruptivas que revelarão ao cliente necessidades que este ainda desconhece. No livro The Challenger Sale (Portfolio/Penguin, 2011), usamos dados de mais de 6 mil representantes de vendas ao redor do mundo para mostrar que todo vendedor se encaixa em um de cinco perfis: o Construtor de Relacionamentos, o Solucionador de Problemas Reativo, o Trabalhador, o Lobo Solitário e o Questionador. Um supervendedor tem muito mais chance de ser um Questionador do que qualquer outro tipo. O motivo? É o que mais sabe argumentar e debater na equipe de vendas. Esse indivíduo tem um ponto de vista provocativo, capaz de revirar práticas atuais do cliente. E não tem medo de tirar o cliente da zona de conforto (essa ideia foi explorada por Philip Lay, Todd Hewlin e Geoffrey Moore no artigo “Durante a crise, provoque seus clientes.”, HBR Março 2009). Em nosso estudo, quase 40% dos vendedores de alto desempenho eram Questionadores — número que salta para 54% em ambientes complexos, onde insights são cruciais. Clientes dão valor à abordagem do Questionador. Em um estudo correlato, descobrimos que o maior motor da lealdade de clientes B2B é a capacidade do fornecedor de oferecer novos insights. Para que a abordagem do Questionador dê certo é preciso recursos organizacionais e competência da parte do vendedor. Embora o vendedor precise estar à vontade com a tensão inerente a uma conversa de vendas voltada à orientação do cliente, líderes de vendas e marketing precisam, antes, criar insights que o vendedor possa transmitir. Quando o vendedor é hábil, esses insights direcionam a conversa para áreas nas quais sua empresa supera as concorrentes. A abordagem do Questionador está se tornando o procedimento operacional padrão nas melhores organizações de vendas. Na Dentsply International, empresa global de produtos e serviços odontológicos, os vendedores conversam com dentistas sobre faltas de assistentes devido à síndrome do túnel do carpo e outras lesões do trabalho. E mostram como o material da Dentsply, por ser mais leve e sem fio, pode reduzir a tensão no pulso de assistentes. Na Cargill, empresa de produtos e serviços agrícolas, vendedores discorrem sobre como a volatilidade de preços no mercado internacional obriga o agricultor a perder tempo tentando prever o rumo da cotação de commodities. O assunto leva, naturalmente, à oferta de um serviço de informações sobre cotações de grãos, que ajuda agricultores a mitigar a exposição à flutuação de preços. Já na Ciena, fornecedor mundial de equipamentos, software e serviços detelecomunicações, equipes a cargo de contas não abrem uma conversa falando das vantagens técnicas de seus produtos, mas sim dos benefícios para o cliente, como a redução das ineficiências operacionais em redes. Falam, por exemplo, de quanto o cliente poderia economizar se eliminasse visitas técnicas desnecessárias ao melhorar a automação da rede. Na Aramark, do setor de alimentação, vendedores usam insights colhidos ao servir um segmento de consumidores (universitários, digamos) para mudar o modo como potenciais clientes de outros segmentos encaram a gestão do negócio (como o exército alimenta suas tropas, por exemplo). —B.A. e M.D. O objetivo é reduzir o trabalho do cliente. Como? Fazendo o vendedor seguir certos passos predefinidos, cada qual com ferramentas e documentos próprios, a fim de dar apoio ao cliente ao longo do processo. Em vez de representar um conjunto de atividades de vendas, como em programas tradicionais, cada passo desses representa uma série de atividades de compra (“reconhecer necessidade”, “avaliar opções”, “validar e selecionar uma solução”). E vem acompanhado de ações recomendadas que ajudam o vendedor a conduzir o cliente. Qualquer conversa na ADP sobre o andamento de um acordo leva em conta o que o cliente precisa fazer em seguida e como a ADP pode ajudá-lo nesse passo. Além disso, a ADP criou pontos de verificação para garantir que todo vendedor possa documentar plenamente, e com precisão, o progresso da compra no cliente. Um verificador, por exemplo, é o compromisso por escrito do cliente de fazer um diagnóstico pré-venda para avaliar a exposição da empresa a riscos e sua disposição a adotar uma solução terceirizada. Cada verificador é um indicador claro e objetivo do ponto exato no qual o cliente se encontra no processo de compra. É o fim da tradicional venda de soluções. Cada vez mais, o cliente dispensa o representante de vendas. Hoje, pode usar informações de caráter público para diagnosticar as próprias necessidades e buscar a ajuda de sofisticados departamentos de prospecção e consultores de compras externos para conseguir a melhor oferta possível de fornecedores. Essa tendência só vai acelerar. Para a área de vendas, não se trata de mais um verão longo, abrasador; é uma mudança climática em escala global. Muitos vendedores vão simplesmente ignorar a reviravolta e continuar com a venda de soluções — e ouvir, cada vez mais, um não de seus clientes. Já o vendedor que souber se adaptar, que buscar clientes prontos para a mudança, que desafiá-los com insights provocantes e orientá-los sobre como comprar, será uma figura indispensável. Talvez ainda siga vendendo soluções — mas, de modo geral, vai vender insights. E nesse novo mundo, é a diferença entre uma proposta que não dá em nada e uma que garante o negócio. Brent Adamson é diretorgerente, Matthew Dixon é diretor-executivo e Nicholas Toman é diretor de pesquisas do instituto Corporate Executive Board, nos EUA.