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ECONOMIA NO SETOR PÚBLICO Autoria: Nelson Chalfun Homsy Dados Pessoais Nome: _________________________________________________________ Turma:____________ Matrícula:__________ Curso: __________________ Endereço: _____________________________________________________ Cidade: _____________________________________ UF: _______________ CEP: ________________ Telefone: _________________________________ E-mail: ________________________________________________________ CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito - Cx. P. 191 - 89.130-000 INDAIAL/SC - Fone Fax: (47) 3281-9000/3281- 9090 - www.uniasselvipos.com.br Programa de Pós-Graduação EAD CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Ivan Tesck Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz Prof.ª Tathyane Lucas Simão Prof.ª Kelly Luana Molinari Corrêa Prof. Ivan Tesck Revisão Gramatical: Equipe de Produção de Materiais Revisão Pedagógica: Bárbara Pricila Franz Equipe Pedagógica do IBAM: Prof. Heraldo da Costa Reis Profª. Márcia Costa Alves da Silva Profª. Tereza Cristina Baratta Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2017 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 330 H763e Homsy; Nelson Chalfun Economia no setor público/ Nelson Chalfun Homsy. Indaial : UNIASSELVI, 2017. 124 p. : il. ISBN 978-85-69910-50-3 1. Economia. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci PARCERIA ENTRE IBAM E UNIASSELVI No momento atual, em todos os países, em qualquer instância de governo, observa-se um movimento de revisão do papel do Estado, somado à exigência das populações por atuação governamental de qualidade. Esta tendência conduz à demanda expressiva para que se consolide a existência e o funcionamento de um sistema qualificado de Gestão para a implementação de políticas públicas. A institucionalização dos processos de gestão e a profissionalização dos servidores públicos passam a ser instrumentos estratégicos para alavancar condições de melhor execução de atividades e projetos, bem como dos meios de controle necessários para avaliação de resultados da atuação governamental. Inúmeras iniciativas são implementadas para dar consistência a este modelo de gestão governamental que se apoia na valorização da transparência, da participação e do controle social, que não podem existir sem instrumentos adequados e pessoas qualificadas. É neste contexto que se forma a parceria do IBAM com a UNIASSELVI. Aprimorar o sistema de gestão pública, apoiar a formação de profissionais que queiram ser ou já são do quadro do setor público e ampliar a informação para o cidadão sobre como deve funcionar o governo são os propósitos iniciais do MBA em Gestão Pública que passa a integrar o programa de pós-graduação da UNIASSELVI. A equipe de Professores Autores que o compõe se destaca pelo desempenho profissional em projetos da Administração Pública e como docentes universitários. A experiência da UNIASSELVI em processos educacionais em nível superior, aliada à do IBAM, que há 60 anos atua, em nível nacional e internacional, para o aprimoramento da administração pública, é composição de excelência para enriquecer o cenário que se quer alcançar. O IBAM e a UNIASSELVI desejam a todos os participantes uma boa jornada de estudos. Aos que se dirigem ao setor público, que consolidem sua formação; e, aos demais, que ampliem o nível de informação sobre governo e aprendam a articular-se com ele como cidadãos. Paulo Timm Superintendente Geral do Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM Prof. Carlos Fabiano Fistarol Pró-Reitor de Pós-Graduação a Distância Grupo UNIASSELVI Me. Nelson Chalfun Homsy Doutor em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (IE/UFRJ), Mestre em Planejamento Urbano e Regional (UCLA) e Graduado em Economia (I E/UFRJ). Sua carreira profissional inclui importantes posições de administração, gerência e supervisão em departamentos de planejamento, mercado de capitais, pesquisa, sistemas de informação e finanças, nas áreas de habitação e infraestrutura. Como consultor atua nas áreas de políticas tributária e fiscal, provisão e distribuição de serviços públicos, gestão do crescimento econômico, política habitacional e análise e avaliação de projetos. É professor de Economia do Setor Público e de Matemática Financeira no Instituto de Economia da UFRJ. Seus principais temas de pesquisa, além das questões acadêmicas, são Economia Urbana e Regional e Finanças Públicas e Empresariais. Sumário APRESENTAÇÃO ......................................................................7 CAPÍTULO 1 Introdução à Economia no Setor Público ...........................9 CAPÍTULO 2 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos ...............................................17 CAPÍTULO 3 As Funções Econômicas do Estado ....................................39 CAPÍTULO 4 As Políticas Tributária e Fiscal ..........................................55 CAPÍTULO 5 Endividamento Público .........................................................73 CAPÍTULO 6 A Economia do Setor Público Aplicada ao Caso Brasileiro ................................................................95 APRESENTAÇÃO Caro pós-graduando! O conhecimento de Economia do Setor Público é fundamental para o desenvolvimento das atividades de planejamento e gestão de assuntos relativos à Política Tributária, Política Fiscal e de Endividamento dos governos. A aplicação do seu conhecimento é feita, principalmente, pelos profissionais que já possuem esta formação, em função do próprio ofício (trabalham na Secretaria da Fazenda, na Secretaria de Orçamento, na Secretaria do Tesouro etc.), e por pessoas que desempenham suas funções nas áreas de ensino, saúde, assistência social, mas que necessitam dialogar com profissionais das áreas econômica, financeira, orçamentária e contábil dos governos. Para tanto, este livro trata da disciplina Economia do Setor Público e apresenta as Funções Econômicas do Estado, explicitando as Razões da Intervenção do Estado na Economia. Em seguida, são apresentados e comparados os conceitos de Bens Públicos e Bens Privados, explicitados os Arranjos Institucionais na Provisão de Bens Públicos. Apresentam-se também os conceitos complementares referentes aos bens meritórios e bens de clube, casos particulares dos bens públicos. Tais assuntos constam nos cinco primeiros capítulos deste livro e são fundamentais para o entendimento dos processos que envolvem as Políticas Fiscal e Tributária e de Endividamento público. No Capítulo 6 é introduzido o estudo dos conceitos de Estado Unitário e Federalista, de Federalismo Político e Econômico e dos aspectos referentes à execução das Políticas Fiscal e Tributária e de Endividamento público sob as visões centralizada e descentralizada. É no Capítulo 6 que o conhecimento dos conceitos e dos processos adquiridos ao longo do Módulo é aplicado ao Brasil, país que adota o sistema federativo de governo. Dessa forma, o Capítulo 6, portanto, oferecerá a você a oportunidade de verificar como os conceitos e processos econômicos que foram apresentados podem ser úteis para o entendimento do funcionamento conjunto das políticas tributária, fiscal e de endividamento, do ponto de vista da realidade brasileira, e de como eles se relacionam com a execução das políticas públicas em um ambiente descentralizado.Esperamos que este livro faça com que você goste do assunto e se interesse cada vez mais por ele, seja por curiosidade, seja por necessidade. Quanto mais você aprende e ganha segurança sobre um determinado assunto, mais aumenta o seu grau de “amizade” com esse assunto e maior a sua curiosidade em aprender o assunto mais detalhadamente, e assim desempenhará suas atividades profissionais de maneira mais eficiente. Desejamos, pois, que ao ler este livro, você inicie ou fortaleça a sua amizade com a Economia do Setor Público. Bom trabalho! Bons estudos! CAPÍTULO 1 Introdução à Economia no Setor Público A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Entender o campo de estudo da disciplina Economia do Setor Público. � Conhecer outras abordagens complementares à da Economia do Setor Público, que tratam da intervenção do Estado na economia e saber aplicá-las em função da natureza do problema a ser solucionado. 10 Economia no Setor Público 11 Introdução à Economia no Setor Público Capítulo 1 Contextualização O que estuda a disciplina Economia do Setor Público? A disciplina Economia do Setor Público estuda a intervenção do Estado na economia de um país e se insere na grande área de conhecimento das Ciências Econômicas ou simplesmente Economia. A Economia é uma ciência social preocupada com as formas pelas quais uma sociedade escolhe empregar seus recursos escassos, recursos estes que possuem usos alternativos para a produção de bens e serviços para o consumo presente e futuro. Caracterização da Economia do Setor Público A Economia é, muitas vezes, também chamada de Economia Política. "Polis" em grego significa Estado. E os primeiros escritores usaram o termo "Economia Política" para a gestão do Estado. Da mesma forma que se espera que a pessoa chefe de uma família faça o melhor uso dos rendimentos do conjunto familiar, espera-se que o governante obtenha o máximo benefício para a sociedade. Entretanto, a Economia é também uma ciência que lida com os desejos. E, como no mundo real, os meios que satisfazem nossos desejos são limitados, ocorre uma escassez relativa de meios existentes no sentido da satisfação dos nossos desejos. Tempo e dinheiro são limitados; a terra, o trabalho e o capital utilizados na produção são limitados. Embora o desenvolvimento científico e tecnológico tenha aumentado a possibilidade da utilização dos recursos existentes, nossas necessidades também aumentaram e nossas vontades são, por definição, ilimitadas. Devemos, então, considerar que a Economia é a ciência que trata da escassez. Nossos desejos ilimitados em um contexto de meios limitados nos obrigam a efetuar escolhas. Mas tudo que queremos não é de igual importância. Então, satisfazemos os desejos mais importantes e as necessidades mais urgentes. Assim, a escolha é a essência da atividade econômica. Podemos também dizer que a Economia é a ciência da escolha. Muitas coisas que queremos são escassas e temos que pagar um preço por elas. Então, a Economia estuda como os preços de bens e serviços diferentes são determinados. Podemos também dizer que a Economia é uma ciência que lida com preços. 12 Economia no Setor Público A Economia moderna é uma economia monetária. Os preços são pagos em dinheiro. O dinheiro desempenha um papel importante na vida econômica das sociedades modernas. É usado para a produção e a compra de mercadorias e serviços, para pagamento de aluguéis, de salários, de juros e assim por diante. Podemos também dizer que a Economia é a ciência do dinheiro. Como a Economia estuda a produção, a troca, a distribuição e o consumo dos produtos e serviços, produzidos para promover o bem-estar da sociedade, ela é também chamada de Ciência do Bem-Estar Social. A Economia do Setor Público incorpora vários aspectos inseridos nas definições da Economia, mas especialmente o estudo das funções econômicas do Estado, isto é, a alocação, a distribuição de bens e serviços e a estabilização da economia, definindo os recursos necessários para a execução dessas funções por meio da máquina pública. Abordagens à Intervenção do Estado na Economia A expressão Economia do Setor Público pode sugerir ao leitor a ideia de que o Setor Público só pode ser analisado a partir da visão econômica. Entretanto, a visão econômica não é a única a abordar a intervenção do Estado. A visão econômica como método de análise representa, entretanto, apenas uma das várias abordagens aplicáveis ao estudo da intervenção do Estado na Economia. Outras abordagens podem ser aplicadas, dentre as quais, a da Administração Pública e a da Ciência do Direito, embora também sejam aplicáveis as visões da Sociologia, da Ciência Política e a da Contabilidade Pública. a) Como a Ciência Econômica aborda a Intervenção do Estado na Economia As correntes de interpretação da visão econômica do Estado se preocupam com os aspectos associados à eficiência do funcionamento da sua estrutura organizacional enquanto elaborador e executor das políticas macroeconômicas. 13 Introdução à Economia no Setor Público Capítulo 1 Além disso, a visão econômica estuda os efeitos das ações do Estado enquanto formulador e executor de políticas públicas não macroeconômicas, isto é, como provedor de serviços tais como, saúde, ensino, justiça, dentre outros, sob os critérios de eficiência e equidade. Sob esta ótica, a visão econômica indaga se o crescimento econômico e a distribuição dos resultados do crescimento resultam na melhoria das condições das famílias e dos setores produtivos, do ponto de vista local, regional e nacional. Isto é, se o resultado do esforço despendido pela sociedade reverte em seu benefício ou se é apropriado de maneira não equitativa. O conceito de eficiência pode ter dois significados: 1. Eficiência produtiva - a utilização do método de produção mais eficiente tecnologicamente dentre os métodos disponíveis, com o objetivo de alcançar um determinado nível de produção utilizando uma quantidade mínima de recursos. 2. Eficiência econômica - expressa a adoção de métodos produtivos que permitem a obtenção de maior nível de produção com o menor custo. O conceito de equidade se refere ao reconhecimento das diferenças que existem entre as pessoas e que demandam ações no sentido de eliminar ou, no mínimo, reduzir tais diferenças ao longo do tempo. As diferenças se expressam sob as formas de gênero, de renda, de raça e de escolaridade, dentre outras formas. O conceito de equidade prescreve a necessidade de se oferecer mais e melhores oportunidades às pessoas em situação desvantajosa em relação ao acesso aos bens e serviços essenciais, como a saúde, o ensino e a nutrição. b) Como a Ciência da Administração Pública aborda a Intervenção do Estado na Economia De acordo com correntes de interpretação da Administração Pública, o Estado se estrutura a partir de núcleos ou setores específicos responsáveis pela execução dos seguintes tipos de funções: 14 Economia no Setor Público • Estratégicas (Poderes Legislativo e Judiciário, o Ministério Público e, no Poder Executivo, o Presidente da República, os Ministros e seus assessores diretos). • Exclusivas (Polícia, forças armadas, órgãos de fiscalização e tributação, dentre outros). • Não exclusivas (hospitais, universidades, museus, centros de pesquisa etc.). • De produção de bens e serviços para o mercado (empresas com atividades econômicas voltadas para o lucro, algumas ainda pertencentes ao Estado, outras em privatização). c) Como a Ciência do Direito aborda a Intervenção do Estado na economia Segundo a Ciência do Direito, uma vez constituído, o Estado realiza os seus fins atravésde três funções, as quais estruturam a organização e o funcionamento das atividades do Estado: legislação, administração e jurisdição. Uma questão relevante que decorre da abordagem da Ciência do Direito diz respeito ao planejamento e à gestão governamental quando os associamos à forma pela qual as várias unidades territoriais de um país se reúnem em um único Estado nacional e a cujo poder se submetem e sob o qual estabelecem suas relações. A forma pela qual as unidades territoriais se reúnem pode ser mais ou menos centralizada. Quando ocorre maior centralização, diz-se que se está diante de um Estado Unitário. Quanto menor a centralização, ocorre o chamado Estado Federalista. Com efeito, o modelo de planejamento econômico do país espelha a estrutura do Estado Federalista ou Unitário. Estes assuntos serão objeto de estudo detalhado no Capítulo 5. As visões do Direito, da Administração Pública e da Economia anteriormente mencionadas apresentam relações complementares, o que demanda esforços dos gestores públicos e de pesquisadores de cada uma das respectivas abordagens no sentido de propor soluções voltadas para a minimização dos conflitos e para o aumento da sinergia dos resultados da sua aplicação. 15 Introdução à Economia no Setor Público Capítulo 1 Atividades de Estudos: 1) Cite outras áreas de conhecimento, além da Ciência do Direito, da Administração Pública e da Economia, que podem complementar as abordagens ao estudo da intervenção do Estado na economia. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Agora que você já adicionou outras áreas de conhecimento, qual é a que você julga como a mais importante para a gestão do desenvolvimento? Por quê? Quais os elementos mais relevantes e como eles se articulam com esta área e com as demais? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Algumas Considerações A disciplina Economia do Setor Público estuda a intervenção do Estado na economia de um país e se preocupa em analisar a gestão do setor público e de que maneira as políticas públicas afetam o comportamento das firmas e das pessoas. Os efeitos econômicos das políticas públicas na economia envolvem aspectos normativos, sendo necessário confrontar as questões que envolvem eficiência e equidade. Envolvem também aspectos positivos, estes associados à visão de como se processam os fenômenos econômicos de forma geral, isto é, sem levar em conta as especificidades de cada país e o estágio de seu desenvolvimento econômico e social. 16 Economia no Setor Público O estabelecimento de uma visão específica e parcial na análise dos fenômenos econômicos e sociais tende a produzir diagnósticos imperfeitos, sendo necessário adicionar outras abordagens, como a do Direito e a da Administração Pública, além das outras abordagens já referidas. Referências HOMSY, N. C. Introdução à economia. Indaial: Uniasselvi, 2017. MANKIW, N. G. Introdução à economia. São Paulo: Campus, 2005. MUSGRAVE, R. A.; MUSGRAVE, P. B. Finanças públicas: teoria e prática. São Paulo: Campus, 1980. CAPÍTULO 2 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Diferenciar dois conjuntos de bens e serviços: os bens denominados “bens privados” ou “bens de consumo privado” e “bens públicos” ou “bens de consumo coletivo”. � Saber que o mecanismo de mercado aloca e distribui de maneira eficiente os bens de consumo privado, mas que cabe ao Estado coordenar a alocação e a distribuição dos bens públicos, por meio de sua intervenção na economia do país. 18 Economia no Setor Público 19 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 Contextualização No capítulo anterior você teve a oportunidade de conhecer o campo de estudo da disciplina Economia do Setor Público e de distinguir os diferentes objetos de análise utilizados por abordagens alternativas à abordagem econômica, tais como a da ciência do direito e a da administração pública, dentre outras abordagens que tratam da intervenção do Estado na economia. Neste capítulo você irá aprender sobre as razões da intervenção do Estado na Economia, como ocorre esta intervenção e como ela afeta a organização da produção de bens e serviços. Mercado é o local (físico ou virtual) onde vendedores e compradores se relacionam para realizar a troca de mercadorias e serviços, com a observância de regras específicas previamente definidas sob as quais são efetuadas as transações. Exemplos de mercado físico são: a feira de frutas, legumes e verduras (espaço físico onde ocorrem as transações) e as bolsas de valores e títulos de dívida (espaço não físico ou virtual onde ocorrem as transações, como a internet). Os diferentes objetos de análise utilizados por abordagens alternativas à abordagem econômica, tais como a da ciência do direito e a da administração pública A Alocação de Bens Privados Pelo Mecanismo de Preços de Mercado No mercado de produção e de consumo de bens privados (camisas, refrigerantes, por exemplo), ao produzir a quantidade de um produto A que satisfaça plenamente os consumidores, obtém-se a eficiência na produção e no consumo, pois não há carência nem ociosidade dos recursos empregados na sua fabricação e na quantidade fabricada e consumida. Caso os consumidores desejem outro produto, o B, e estejam dispostos a pagar mais por esse produto, os recursos (no todo ou em parte) que estavam alocados na produção de A migrarão para a fabricação do produto B, procurando capturar aquela demanda. 20 Economia no Setor Público Nesse caso, temos: Preço = Custo Marginal, significando que o preço do produto reflete a vantagem de produzir este outro produto B, em vez de produzir A. EXEMPLO PRÁTICO DA APLICAÇÃO DO CÁLCULO MARGINAL O Emprego do Cálculo Marginal (ou Cálculo segundo a abordagem Marginalista) Suponha que você produza um produto a ser vendido por $120 e que o custo para produzi-lo é de $100, por unidade, caso você produza 50 unidades. Isso resultará em um custo total de “$100 x 50” ou $5.000 e um faturamento total de “$120 x 50” ou $6.000. Suponha agora que você examine a possibilidade de produzir a 51ª unidade deste produto. Sua receita total irá ser de “$ 120 x 51” ou $ 6.120. Entretanto, tendo em vista a necessidade de contratar mais um empregado para produzir esta unidade adicional, o custo para produzi-lo será acrescido em $ 150, passando a ser de $ 5.150. Neste caso, a decisão de produzir a unidade de número 51 seria um mau negócio, porque o custo de produção unitário aumenta para $100,98 por unidade. Seu benefício líquido sobe em $120, enquanto o custo total aumenta em $150, significando que o custo supera o benefício e que a produção da unidade adicional não compensa o custo extra. Fonte: O autor. Custo Marginal é o custo de se produzir uma unidade adicional de um produto ou serviço. Com base nesse conceito, se o preço de venda de uma unidade de um produto for maior do que o custo de produzi-la, o produtor obterá lucro.Caso contrário, ele terá prejuízo. 21 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 As Regras e as Falhas do Mecanismo de Preços de Mercado A Economia examina os problemas que as sociedades enfrentam porque os indivíduos desejam consumir mais bens e serviços do que estão disponíveis, criando uma condição de escassez relativa. Desejos são geralmente ilimitados e aparentemente insaciáveis, enquanto recursos – terra, trabalho, capital e empreendedorismo – são limitados. Para atender ao problema da escassez, um processo social é necessário para alocar recursos limitados e alternativas ilimitadas e suas combinações. Em uma economia ideal não há um coordenador central orientando seu funcionamento. A auto-organização emerge do funcionamento do mercado, onde as forças de demanda e oferta determinam o preço pelo qual ocorrem as trocas. O fornecimento de bens e serviços na sociedade é feito pelos compradores e vendedores privados atuando em regime de livre concorrência. Entretanto, na prática, o mecanismo de mercado para ser eficiente deve atender a determinadas regras internas ao próprio sistema. Entretanto, as regras que, caso respeitadas, podem garantir a eficiência, nem sempre podem ser aplicadas na prática. Esta situação é caracterizada como falhas de mercado. As Regras do Mecanismo de Mercado Com base no exemplo prático da aplicação do cálculo marginal, pode-se concluir que se o preço de venda do produto é maior do que o seu custo marginal, mais recursos deverão estar disponíveis para a sua fabricação. Ao afetar os preços dos produtos, as mudanças nas preferências dos consumidores afetam a expansão e a contração de indústrias e negócios. Estes processos ocorrem sem que seja necessário qualquer tipo de intervenção de um órgão central de planejamento ou qualquer outro mecanismo de condução. Dizemos, então, que o mecanismo de mercado é o responsável pela obtenção da eficiência na alocação e distribuição dos recursos, muito embora essa eficiência apresente consequências danosas para firmas ou negócios que, porventura, venham a perder uma parcela dos seus clientes ou que mesmo vão à falência. Estas são as regras do mecanismo de mercado. 22 Economia no Setor Público Há, entretanto, exceções a estas regras. Há situações nas quais os mercados não funcionam de maneira apropriada em razão de uma série de aspectos, ao que chamamos “falhas de mercado”. A fim de reduzir as consequências deletérias destas falhas, o conjunto de agentes que operam sob o mecanismo do mercado passa a requerer a intervenção de um órgão central capaz de regular, supervisionar e controlar as ações: os governos. As Falhas do Mecanismo de Preços de Mercado Quando e por que o mercado falha? Diz-se que o mecanismo de mercado falha diante de algumas situações nas quais o sistema de formação de preços não é capaz de sinalizar a alocação eficiente dos recursos. As situações em que ocorrem as falhas de mercado são: Distribuição Automática de Renda, Externalidades, Monopólio Natural, Instabilidade dos Mercados e Bens Públicos (ou Bens de Consumo Coletivo). Estas situações serão explicadas adiante. a) Distribuição Automática de Renda A existência do mercado não garante que todos disponham de recursos para, por exemplo, se alimentar, vestir, morar etc. Muitos não possuem o talento ou a habilidade, nem herdaram fortunas de forma a possibilitar um nível de vida razoável. Outros são muito jovens, ou muito velhos, ou incapacitados para trabalhar etc. Muitas dessas pessoas são incapazes de se sustentar sem que haja alguma forma de redistribuição de renda, realizada através da ação governamental. b) Externalidades O conceito de externalidade diz respeito aos efeitos (positivos e negativos) que ocorrem na economia em decorrência de ações tomadas de forma isolada ou em conjunto pelos indivíduos, empresas e pelo Estado. Veja no Léo a seguir, dois exemplos de externalidades. 23 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 EXEMPLOS PRÁTICOS DE EXTERNALIDADES Situação 1 A vacinação pública, por exemplo, tem a capacidade de proteger as pessoas que tomam as vacinas e aqueles que não as tomam, em razão da diminuição do risco de contágio. Este é o exemplo de uma externalidade positiva. Dependendo do nível da sua abrangência, os benefícios que decorrem da vacinação para a sociedade como um todo são superiores aos custos do seu desenvolvimento e aplicação. Situação 2 Imagine, porém, a emissão de fumaça carregada de partículas em suspensão, que provocam poluição atmosférica. Eis aí um exemplo de externalidade negativa. Um aspecto importante da externalidade negativa, entretanto, é que, em geral, os danos por ela causados à sociedade como um todo são superiores aos benefícios que são obtidos por quem a provoca. No caso de uma usina de asfalto, por exemplo, o custo da produção do asfalto é menor sem a existência de filtros capazes de reduzir a poluição e maior com o dispêndio da colocação de filtro. Fonte: O autor. Tendo em vista a incapacidade de se estimar o preço que a sociedade paga pelas externalidades, tanto positivas quanto negativas, a lógica do mercado também não funciona nesse caso. O derramamento de óleo provocado pela má operação de uma plataforma de petróleo tem sua multa estimada, de forma objetiva, a partir do custo da limpeza da área, do pagamento de renda aos pescadores locais que ficam sem poder pescar durante um determinado período, por exemplo. Mas, o que dizer (ou pagar pelos) dos danos à fauna e à flora, cuja recuperação leva milhares de anos para se concretizar? Nesse caso, uma agência reguladora ou um tribunal irá estimar o valor monetário dos danos e estipular o ressarcimento à sociedade pelo poluidor. 24 Economia no Setor Público c) Monopólio Natural Em algumas indústrias o custo de produção pode ser substancialmente menor quando se trata de grandes firmas. Isso é comum ocorrer, por exemplo, com os Serviços de Utilidade Pública, tais como saneamento, eletricidade etc., situações em que uma firma apenas possui a capacidade de produzir a um preço menor do que duas, em função das economias de escala (uma distribuidora de energia elétrica, por exemplo). Nesses casos o governo sempre intervém, exercendo forte regulação, a fim de garantir que não haja a cobrança pelo monopolista de preços em níveis acima do razoável no seu mercado cativo. O monopólio natural é um caso particular do monopólio. É assim denominado por não ser possível a existência de concorrência, dado que o setor exige custos fixos elevados aliados a uma função de produção geradora de economias de escala, ou seja, as curvas de custo médio e custo marginal são decrescentes para qualquer nível de produção relevante de mercado. No caso dos serviços de saneamento, as operações de captação, tratamento e distribuição de água ocorrem em uma bacia hidrográfica, que tem como usuários dos serviços várias cidades situadas no raio de influência da bacia. O nível de eficiência mais elevado depende de economias de escala e de escopo, o que é facilitado quando a operação é desenvolvida por uma única empresa. Economias de escala são economias que surgem por meio da redução no custo de produção em decorrência do aumento da quantidade produzida, utilizando-se o mesmo conjunto de equipamentos, instalações e tecnologia. Ocorrem quando a empresa aumenta a quantidade produzida e obtém ganhos de produtividade, pois o custo fixo dividido pela quantidade produzida decresce. Exemplo: o custo do aluguel de um galpão é o mesmo para produzir mil ou duas mil unidades de um produto. Se o aluguel é igual a $ 10.000,00 por mês, o custo do aluguel ao se produzir mil unidades é $ 10,00por unidade; se a produção for de duas mil unidades o custo é $ 5,00 por unidade, isto é, a metade em relação à produção de mil unidades. Além das economias de escala, há também economias de escopo. No setor de saneamento básico, por exemplo, ocorrem economias de escopo, pois a oferta conjunta de água (A) e 25 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 esgotamento sanitário (E) pela empresa A custa menos do que ofertar água pela empresa A e esgotamento por uma outra empresa B, ou seja, não há viabilidade econômica na desintegração vertical com vistas à elevação da concorrência e da eficiência econômica. Ocorre quando a firma obtém maior eficiência ao passar a operar em mais de um segmento de negócio, especialmente de natureza complementar. Exemplo: uma siderúrgica instala uma empresa metalúrgica em um mesmo galpão, utilizando sobras da produção de perfis de aço. Com isso, a empresa incorre em menores custos para transportar as sobras da área de produtos siderúrgicos para o local de produção de produtos metalúrgicos; pode utilizar mão de obra porventura ociosa em uma determinada etapa da produção de aço na produção de produtos metalúrgicos; pode promover programas de capacitação conjunta para empregados das distintas divisões da empresa etc. O aumento da produtividade significa maior produção (saída) com a mesma (ou inferior) quantidade de fatores de produção (entrada). Significa um processo de produção em que o valor agregado aos produtos pode efetivamente elevar os padrões de vida da sociedade em função da diminuição do investimento monetário exigido, tornando os consumidores mais ricos (em um sentido relativo) e as empresas mais rentáveis. Numa perspectiva mais ampla, o crescimento da produtividade dos diversos setores produtivos afeta positivamente o crescimento econômico e satisfaz as necessidades humanas com menos recursos. Como resultado, as economias irão se beneficiar de maior volume de receitas tributárias destinadas a financiar serviços sociais tais como a saúde, a educação, a assistência social e o transporte público, entre outros. No Brasil, várias companhias de saneamento são operadas pelo instrumento da concessão pública, e, por isso, estão sujeitas às influências de cunho político, o que afeta os aspectos de caráter econômico de eficiência na gestão, em situações que envolvem a tomada de decisões de investimento, fixação de tarifas e expansão dos serviços. Atualmente, a discussão acerca da titularidade dos serviços de saneamento, a dificuldade em desenvolver planos de desenvolvimento de longo prazo e a instituição de regras estáveis afetam de maneira negativa os resultados esperados. 26 Economia no Setor Público Uma importante questão institucional diz respeito à interpretação quanto ao poder concedente dos serviços de água e esgoto, se municipal ou estadual. Esta incerteza está evidenciada no polêmico processo de privatização da Companhia Estadual de Água e Esgoto do Estado do Rio de Janeiro, que tem como usuários dos serviços vários municípios fluminenses e que tem gerado manifestações públicas interessadas em influenciar o processo de venda da participação estatal na empresa. d) Instabilidade dos Mercados Os governos são responsáveis pela existência da infraestrutura de serviços básicos necessária para assegurar o funcionamento mais eficiente possível do mercado. Os governos também devem garantir a propriedade e regular os contratos. Os governos desempenham também um importante papel ao buscar garantir a estabilidade do nível de emprego, instituindo, por exemplo, condições especiais para empréstimos destinados à execução de projetos capazes de absorver grandes quantidades de trabalhadores, mesmo que tais projetos sejam menos eficientes do que outros, tendo em vista os objetivos de desenvolvimento social. e) Bens Públicos (ou Bens de Consumo Coletivo) Há várias classificações aplicáveis ao conjunto de bens e serviços, dependendo do tipo de análise que se queira desenvolver. Quando estudamos as cadeias produtivas ou os aspectos mercadológicos de um setor produtivo, estamos interessados em saber se o bem é de consumo final (uma camisa) ou de consumo intermediário (um botão da camisa, a linha de costura etc.), se é perecível (alimentos in natura), se é um bem de capital (um forno industrial), se é complementar a outros (locomotivas e vagões), se é concorrente com outros (refrigerantes e sucos industrializados) etc. As Falhas de Mercado e a Intervenção do Estado na Economia O Estado intervém na Economia a fim de corrigir problemas que afetam a alocação e a distribuição adequadas de determinados tipos de bens, cuja característica principal é o seu consumo coletivo, o que impossibilita a definição do seu preço e a determinação de quantidades individualizadas. Um exemplo comum a todos nós é a defesa do território nacional. Nosso “consumo” de defesa nacional é conjunto, não individualizado, assim como o que pagamos para tê-la. 27 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 A alocação governamental de recursos é o ato pelo qual o governo define uma quantidade e um valor monetário a ela correspondente, destinados à produção de bens e serviços de consumo coletivo. A distribuição governamental de recursos é o ato pelo qual o governo redireciona recursos entre determinados setores econômicos, regiões e segmentos da sociedade, visando a maior eficiência e equidade no consumo de bens públicos e no recebimento das rendas do trabalho (salários) e do capital (juros, aluguéis e royalties). O termo “bem público” popularmente sugere a existência da “propriedade pública do bem”, quando na realidade o seu caráter “público” se associa ao seu uso coletivo, daí a denominação “bem de consumo coletivo”, muito embora sua propriedade possa ser privada. Uma frota de ônibus urbanos, por exemplo, pode ser de propriedade privada, mas o serviço concedido é “transporte coletivo”. Neste curso, interessa conhecer de perto o gerenciamento da provisão, da produção e da demanda dos bens de consumo coletivo, já que os bens de consumo privado possuem como instrumento de “gerenciamento” o próprio mecanismo do mercado. O termo provisão, sob a perspectiva da Economia do Setor Público, significa a responsabilidade do Estado pela existência da oferta do bem ou do serviço. A produção do bem ou serviço pode ser estatal ou privada. Por exemplo: até a década de 1980 os serviços de telefonia apresentavam provisão e produção pelo Estado. Atualmente, apenas a responsabilidade da provisão é estatal (ANATEL), enquanto que a produção é privada (Claro e Vivo, por exemplo). Como distinguir na prática um bem público de um bem privado? 28 Economia no Setor Público A distinção exata entre bem público e bem privado não é tão simples. Para tanto, dois conceitos são utilizados para diferenciá-los: rivalidade no consumo e exclusão do consumo. Quanto maior a rivalidade e a exclusão, mais privado será o bem. Quanto menor a rivalidade e a exclusão, mais público ele o será. Os exemplos a seguir nos ajudam a entender como o Estado desempenha as funções alocativa e distributiva ao intervir na provisão dos bens públicos. EXEMPLOS PRÁTICOS DA DISTINÇÃO ENTRE BENS PÚBLICOS E BENS PRIVADOS Situação 1. Atravessando uma ponte (um bem de consumo coletivo) Imagine que vários veículos estejam engarrafados em uma ponte congestionada onde não haja a cobrança de pedágio. Há rivalidade, pois os veículos disputam a vez de atravessar o mais rapidamente possível. Mas não há exclusão, pois todos os veículos, mais cedo ou mais tarde, irão concluir o percurso. Imagine agora que haja a cobrança de pedágio. Continua a haverrivalidade, pois todos os veículos que lá se encontram disputam a vez de atravessar o mais rapidamente possível. Nesse caso, porém, há exclusão no consumo da ponte, pois alguns veículos “fugiram da cobrança do pedágio” (foram excluídos do seu consumo) e procuraram outro percurso. Situação 2. Matriculando o filho na escola pública Você cadastrou seu filho para a matrícula do próximo ano em uma escola pública do seu bairro. Por escassez de vagas, a Secretaria de Educação o matriculou em escola de outro bairro mais distante. Nesse caso, a rivalidade existe – entre o seu filho e o de outra família -, mas não há exclusão, pois seu filho foi matriculado. Situação 3. Matriculando o filho na escola privada Você quer matricular seu filho, no próximo ano, em uma escola privada. Ao consultar a mensalidade, você constata que 29 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 ela ultrapassa a sua capacidade de pagamento. Nesse caso há rivalidade e há exclusão. Situação 4. Obtendo uma Bolsa de Estudo Você quer matricular seu filho, no próximo ano, em uma escola privada. Ao consultar a mensalidade, você constata que ela ultrapassa a sua capacidade de pagamento. Seu filho, seja por apresentar bom rendimento escolar, seja por sorteio, obtém uma bolsa de estudos integral. Nesse caso há rivalidade e há a redução da exclusão no consumo de um bem privado. Situação 5. Comprando peras (um bem de consumo privado) Imagine que os últimos três quilos de peras estão à venda na feira ao preço de R$ 3,50 p/Kg. Suponha, ainda, que você esteja disposto a gastar o máximo de R$ 7,00 com peras, enquanto que o comprador ao seu lado (rival) está disposto a gastar o máximo de R$ 10,50 com peras. Se você resolver comprar antes do seu rival, levará 2 Kg (2 x 3,50 = 7,00) e ele levará o quilo restante. Nesse caso ele ficará excluído parcialmente de adquirir os 2 Kg que ainda estaria disposto a comprar. Mas se ele se antecipar, você será excluído totalmente do consumo das peras. Situação 6. O ar atmosférico e a defesa nacional (bens públicos puros) Há situações, entretanto, nas quais é impossível haver rivalidade e exclusão no consumo. É o caso dos chamados “bens públicos puros”. Os exemplos tradicionalmente utilizados são o ar atmosférico e a defesa nacional. Nesses casos, nenhum indivíduo se sente disputando o consumo do ar e da defesa nacional, uma vez que a sua “produção” é abundante e indivisível. Da mesma maneira, é impossível cobrar- se de maneira individualizada pelo seu consumo. Não há como individualizar o meu consumo de defesa nacional, pois todos nós, indistintamente, estamos cobertos pelo serviço, mesmo que não o desejemos. O mesmo raciocínio se aplica ao ar atmosférico. 30 Economia no Setor Público Com isso, temos a seguinte importante relação entre preço e quantidade de um bem ou serviço: Preço Igual e Quantidades Diferentes => Bem Privado Ao consumir peras, paga-se um preço definido pelo mercado, preço esse baseado no conjunto de “lances” que são dados para que sejam adquiridas as peras. Se não há “lances” de compra ao preço desejado pelo vendedor, ele provavelmente irá baixar o preço e aguardar pelos novos lances. Ao preço de R$ 3,50 p/Kg de peras você adquiriu 2 Kg, a quantidade que “cabia em seu bolso”. O outro consumidor, rival, pagou o mesmo preço (R$ 3,50 p/ Kg), mas consumiu uma quantidade diferente do outro consumidor. Com isso, temos outra importante relação entre preço e quantidade de um bem ou serviço: Preços Diferentes e Quantidade Igual => Bem Público Ao consumir “ensino público”, a família do aluno não pagou uma mensalidade, nem um preço por hora/aula. Entretanto, o seu filho consumiu a mesma quantidade de “ensino público” que foi dispensada aos seus colegas de sala. Podemos resumir, dizendo que: > consumimos a mesma quantidade de bens públicos e “pagamos preços diferentes” pelo seu consumo; e > consumimos diferentes quantidades de bens privados e pagamos o mesmo preço pelo seu consumo. Fonte: O autor. Características do Consumo de Bens Públicos Nos exemplos anteriores podemos verificar que nós não revelamos o grau de importância que atribuímos ao consumirmos bens públicos. Ao consumirmos 31 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 bens privados essa revelação ocorre de maneira explícita, uma vez que pagamos um preço por eles. Ao adquirirmos certa quantidade de bens privados, estamos compatibilizando a quantidade de dinheiro de que dispomos com as nossas vontades de consumo. Assim, embora o consumo de bens públicos e privados apresente satisfação diferenciada (indivíduos têm satisfação diferenciada em relação ao consumo) e tributação diferenciada (indivíduos pagam impostos, taxas e contribuições públicas em valores diferentes), somente os bens públicos apresentam impossibilidade de exclusão no consumo. Com isso, mesmo as famílias que têm seus filhos nas escolas privadas e aquelas que nem filhos têm, estarão consumindo “ensino público” na mesma quantidade que as demais famílias. No mercado de bens privados, a existência do preço exclui alguns consumidores, enquanto que a característica do consumo rival garante que nem todos aqueles que podem pagar o preço realmente adquirem o bem privado. No mercado de bens públicos, o atributo da não rivalidade no consumo faz com que a provisão do bem para o consumidor A garanta a provisão do consumo para o consumidor B. Da mesma forma, no mercado de bens públicos, o atributo da não exclusão faz com que não seja possível excluir o consumidor B dos benefícios do consumo do bem público. O consumidor B pega carona na provisão do bem público oferecido ao consumidor A, usufruindo do seu consumo, sem pagar por ele, pois não há qualquer incentivo que faça o consumidor B pagar pelos custos da sua provisão. Um exemplo clássico de um bem público puro é o farol marítimo, situação em que a provisão é ao mesmo tempo não rival e não excludente. Já a programação de peças de teatro ou eventos esportivos não televisionados são exemplos de bens públicos com características de consumo local, nos quais o consumo é não rival mas é excludente. Há um determinado grupo de bens denominados bens meritórios, que são os ofertados pelo sistema de mercado, mas, certamente, em quantidades inferiores ao desejado. Isto ocorre porque o mercado leva em consideração apenas os custos e benefícios privados. 32 Economia no Setor Público São chamados de meritórios os (bens) serviços aos quais temos direito ou merecemos (daí o termo), simplesmente pelo fato de vivermos em sociedade, independentemente de nossa capacidade de pagamento. Isso não significa que esses serviços devam ser grátis para todos, mas sim apenas para as pessoas que não possuem capacidade de pagar por eles. Tomemos, por exemplo, o caso dos serviços de ensino. Se não houvesse ensino público, existiriam escolas privadas para as pessoas com capacidade de pagamento e, com isso, várias novas escolas particulares iriam surgir. Entretanto, não existiriam vagas na quantidade necessária para absorver todos os alunos em idade escolar, já que muitas famílias não disporiam de recursos para pagar. O mercado não considera, por exemplo, os benefícios adicionais decorrentes do maior nível de escolaridade da população, que afetam positivamente toda a sociedade. Por essa razão, os bens meritórios serão sempre sub-ofertados pelo sistema de mercado. Fonte: O autor. Subsídio ao Setor Privado ou Participação Direta do Estado? Uma vez que o setor privado, segundo a lógica da internalização dos benefícios, não ofertará tais serviços na quantidade necessária, duas situações devem, necessariamente,ocorrer: ou o governo incentiva o setor privado a ofertar mais desse serviço (através de subsídio) ou ele próprio (o governo) oferta de maneira direta. Na realidade, uma grande parcela dos gastos dos governos se associa à oferta de bens e serviços de caráter meritório pelo setor privado: educação e saúde, principalmente. Não por acaso, os retornos dos investimentos nessas áreas apresentam longo perfil temporal, baixa rentabilidade e estão associados à agregação de valor ao chamado capital humano, isto é, ao fator trabalho. O papel do setor público no financiamento desse tipo de serviço é, portanto, de grande relevância. Devemos considerar a dimensão dos benefícios derivados do consumo desses serviços pela sociedade quando questionamos o volume 33 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 de recursos destinados ao gasto público nessas áreas e os impactos sobre o resultado nas contas públicas. O consumo de bens meritórios é considerado como “socialmente desejável”, independentemente das preferências individuais dos consumidores. O incentivo à maior produção desses bens significa a suspensão da chamada “soberania do consumidor”. Os bens meritórios estão incluídos no conjunto dos bens públicos ou de consumo coletivo, mas diferem, por exemplo, dos bens públicos “puros”, como a defesa nacional, o rastreamento do espaço aéreo, e o conjunto dos Serviços de Utilidade Pública. Estes demandam altos investimentos iniciais, apresentam graus elevados de indivisibilidade, custo marginal tendendo a zero (atributos característicos dos monopólios naturais) etc. O entendimento da diferenciação relativa à formação de preços e de arranjo produtivo é que orienta o poder público a adotar conformações institucionais diversas com vistas à oferta. Implicações da Existência dos Bens Meritórios para a Elaboração das Políticas Tributária e Fiscal Já que deve haver intervenção do Estado na formação da oferta de bens meritórios, como, então, estabelecer políticas voltadas para esse fim? De maneira objetiva, temos três questões principais a serem enfrentadas: 1. O que deve ser considerado como bem meritório? 2. Como devemos pagar pelo seu consumo? 3. Devem ser produzidos diretamente pelo setor público? Ou pelo setor privado, contando com recursos públicos para a sua produção? As possíveis respostas são: 1. O que deve ser considerado como bem meritório? Tomemos o exemplo da saúde. Parece razoável admitir que todo cidadão deva ter direito aos serviços básicos de saúde. Entretanto, discordâncias surgem quanto aos tipos de serviços que devem ser incluídos no “pacote básico”, e como 34 Economia no Setor Público cada um deve pagar pelo serviço. Outro ponto de forte discordância surge quando se trata de definir o papel que o Estado deve desempenhar, enquanto provedor e supervisor da prestação de tais serviços. Se a distribuição dos bens meritórios pelo setor público tende a aumentar, o espaço ocupado pelo setor privado tende a diminuir, sendo necessário alocar-se um volume maior de recursos oriundos de tributos para fazer face à cobertura dos custos dessa oferta. 2. Como devemos pagar pelo seu consumo? Devemos refletir sobre essa questão, pois só porque um serviço é definido como meritório não significa que toda sua oferta deva ser custeada por meio de tributos e deva estar disponível para toda a sociedade. Imaginemos a alimentação, por exemplo. Se considerarmos a garantia aos cidadãos de um mínimo acesso aos gêneros alimentícios, estaremos definindo a alimentação como um bem meritório. Mas será que todos os cidadãos devem ter acesso ao Vale Refeição? Ou apenas aqueles trabalhadores com salário até um determinado valor? Excluindo os assalariados com renda mais elevada, podem ser utilizados recursos tributários que possibilitem a instalação de restaurantes populares capazes de garantir a alimentação daqueles cidadãos que não estão empregados e que, como tal, não recebem Vale Refeição. 3. Devem ser produzidos diretamente pelo setor público? Ou pelo setor privado, contando com recursos públicos para a sua produção? Devem ser buscadas maneiras de encarar a provisão de bens meritórios de modo a permitir a manutenção do peso dos tributos sobre a renda pessoal em patamares mais baixos, mantendo o setor privado comprometido com os objetivos sociais e, de maneira objetiva, garantindo o acesso aos serviços de educação, saúde, alimentação etc., não interessando se a produção é executada pelo setor público ou pelo setor privado. Bens de Clube Uma das razões básicas do não funcionamento eficiente do mercado dos bens não rivais, mas excludentes, é a incapacidade dos cidadãos em agir de forma cooperativa, de maneira a eliminar a exclusão. Essa falta de cooperação é motivo para que o governo desempenhe a sua função de alocar recursos. Um bem cujo consumo é coletivo, mas que é sujeito à exclusão, caracteriza-se como 35 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 um “bem de clube”. Podemos pensar nos bens de clube como bens públicos sem exclusão, com economias de escala resultantes do aumento de consumidores e derivadas da redução do custo médio da sua provisão. Entretanto, a entrada de consumidores adicionais leva ao congestionamento, o que, a longo prazo, cria uma situação de consumo rival. Nesses casos as soluções envolvem a provisão dos serviços por meio de “clubes pequenos” e “clubes grandes”. Clubes Pequenos: quando o tamanho do clube é pequeno, relativamente ao total de usuários, novos clubes surgirão, até se atingir uma quantidade suficiente de clubes pequenos, de tal forma que todas as pessoas serão sócias de clubes de tamanho adequado. Neste caso, a solução é eficiente e a taxa de admissão torna os usuários indiferentes entre os clubes, já que todos terão o mesmo número de sócios e oferecerão a mesma quantidade de serviços. Nesses casos, deve-se levar em conta que as economias de escala e de escopo serão menores do que uma situação na qual os clubes grandes prestariam os serviços. Clubes Grandes: no caso dos clubes grandes, isto é, quando o dimensionamento do espaço é determinado para receber um número elevado de sócios ou assistentes, mas em situações pouco frequentes, o custo de manutenção se torna elevado e exige o aumento da contribuição dos sócios ou do preço do ingresso. Nesta situação é possível adotar-se soluções tais como um grande equipamento contando com participação de grande número de sócios ou assistentes, um único clube com participação de parte da população; dois equipamentos de tamanhos semelhantes ou a setorização de um equipamento. Esta última situação começou a ser enfrentada pelo Estádio do Engenhão, no Rio de Janeiro, após a realização da Copa do Mundo de 2014. 36 Economia no Setor Público Atividades de Estudos 1) Dê um exemplo de bem público puro, além dos dois citados no texto (ar atmosférico e defesa nacional). ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ___________________________________________________ ___________________________________________________ 2) O que significa a expressão “rivalidade no consumo”? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ___________________________________________________ ___________________________________________________ 3) Analise a situação a seguir: Um industrial emprega 500 funcionários. 90%dos funcionários ganham três salários mínimos e têm, em média, dois filhos entre 5 e 15 anos de idade. O industrial é solteiro, não possui filhos e despende mensalmente 10 salários mínimos com seu plano de saúde. Quanto o industrial consome de ensino público e de saúde pública? Quanto o industrial deveria pagar de tributos para que houvesse equivalência entre o seu consumo de bens públicos e o que ele realmente paga? Ou qual a alternativa que poderia ser aplicada aos salários pagos a fim de que o industrial tivesse o seu pagamento de tributos reduzido? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 37 A Alocação e a Distribuição de Bens Privados e de Bens Públicos Capítulo 2 ____________________________________________________ __________________________________________________ Algumas Considerações Você observou neste capítulo que, em uma economia ideal, não há um coordenador central orientando seu funcionamento. A auto-organização advém do funcionamento do mercado, onde as forças de demanda e oferta determinam o preço pelo qual ocorrem as trocas, em regime de livre concorrência. Na prática, o mecanismo de mercado, para ser eficiente, deve atender a determinadas regras internas ao próprio sistema. Entretanto, as regras que, caso respeitadas, podem garantir a eficiência, nem sempre podem ser aplicadas na prática. Esta situação é caracterizada como falhas de mercado. A fim de minimizar os efeitos destas falhas, o conjunto de agentes que operam sob o mecanismo do mercado passa a requerer a intervenção do governo, capaz de formalmente regular, supervisionar e controlar as ações: os governos. De maneira geral, cabe ao Estado coordenar a alocação e a distribuição dos bens públicos, por meio de sua intervenção na economia do país. Referências ARVATE, P., BIDERMAN, C. (Ed.). Economia do setor público no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. MUSGRAVE, R.; MUSGRAVE, P. Finanças públicas: teoria e prática. Campus. 1980. PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. 6. ed. São Paulo: Pearson, 2007. 38 Economia no Setor Público CAPÍTULO 3 As Funções Econômicas do Estado A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � Conhecer quais as funções econômicas do Estado. � Compreender os limites da intervenção do Estado na Economia. � Reconhecer a relação entre a Economia do Setor Público e as Políticas Macroeconômicas. 40 Economia no Setor Público 41 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 Contextualização Agora que já sabe diferenciar “bens públicos” de “bens privados” e sabe que o mecanismo de mercado, quando falha, entrega ao Estado a tarefa de coordenar a alocação e a distribuição dos bens públicos, você estudará neste Capítulo 2 as funções econômicas desempenhadas pelo Estado. As Funções Alocativa, Distributiva e Estabilizadora A provisão de bens públicos e a elaboração e execução das políticas macroeconômicas são desempenhadas através das três funções econômicas do Estado: as funções alocativa, distributiva e estabilizadora. A primeira é a função alocativa, pela qual é complementado ou regulado o fornecimento de bens e serviços não oferecidos adequadamente pelo sistema de mercado. A função alocativa, pela qual é complementado ou regulado o fornecimento de bens e serviços não oferecidos adequadamente pelo sistema de mercado. A função distributiva, visando a maior eficiência e equidade na distribuição das rendas do trabalho e do capital. Reveja quais são as falhas de mercado apresentadas no Capítulo 2. Conforme já foi visto no Capítulo 1, os bens públicos têm por principal característica a impossibilidade de excluir as pessoas de seu consumo (princípio da não exclusão). A segunda é a função distributiva, pela qual o governo, através da tributação, retira recursos de determinados setores econômicos e de segmentos da sociedade e, pela via do gasto público, os transfere para outros grupos, visando a maior eficiência e equidade na distribuição das rendas do trabalho e do capital. 42 Economia no Setor Público Reveja quais são as rendas do trabalho e do capital no Capítulo 1. As duas primeiras funções possuem conotação microeconômica, pois procuram corrigir falhas que afetam determinados setores produtivos, parcelas específicas da população com renda ou necessidades definidas, determinadas regiões etc. A terceira é a função estabilizadora, que trata todos os segmentos da população, todo o território e todos os setores produtivos como um grande “agregado” macroeconômico. Esta, por sua vez, é de caráter macroeconômico, pela qual o governo interfere com o objetivo de reduzir os efeitos de bruscas e consideráveis oscilações que ocorrem na economia, seja nos níveis dos preços ou do emprego. As ações referentes às funções acima descritas são executadas por meio da Política Econômica maior do governo, representada pelas Políticas Monetária, Cambial, Tributária e Fiscal. As duas primeiras são de competência exclusiva do Governo Federal. As duas últimas apresentam competência dividida entre os três níveis de governo. Atividades de Estudos: 1) Quais as três funções econômicas do Estado? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ __________________________________________________ 2) Quais são as quatro subdivisões da Política Econômica do Governo? ____________________________________________________ ____________________________________________________ 43 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ __________________________________________________ 3) Preencha as lacunas da sentença abaixo. As Políticas Monetária e Cambial são de competência única do Governo _____________________. Já as Políticas Tributária e Fiscal são de competência dos Governos ____________________, _____________________ e ______________________. Limites da Ação do Estado na Execução das Funções Alocativa e Distributiva O exercício mais ou menos intenso e frequente das funções alocativa e distributiva pelo Estado é que define o sistema econômico adotado, tendo como polos o liberalismo total até a regulação mais extremada. Na prática, encontramos sistemas intermediários, apresentando maior ou menor ênfase nas funções mencionadas. O diagrama a seguir nos ajuda a entender esse raciocínio. Ele é baseado em trabalhos do economista Paul Samuelson (1915-2009), Prêmio Nobel de Economia de 1952, que desenvolveu estudos relativos à alocação e distribuição de bens públicos e privados. Esse diagrama se refere às possibilidades da produção de bens e serviços públicos e privados. O eixo vertical (OA) representa a situação na qual todos os bens e serviços produzidos na sociedade são privados. Já o eixo horizontal (OB) representa a situação na qual todos os bens e serviços produzidos na sociedade são públicos. Estas são “situações-limite”, que não encontram respaldo na realidade (rever a distinção entre bens públicos e bens privados). Portanto, na prática, o que ocorre são as situações intermediárias, que dependem de vários fatores institucionais, sociais,culturais, políticos e, sobretudo, econômicos. 44 Economia no Setor Público Figura 1 – Possibilidades da produção de bens e serviços públicos e privados A C X D Y O E F B bens públicos be ns p ri va do s Fonte: O autor. Examine os pontos X e Y do diagrama. Eles representam as diferentes combinações da produção de bens privados e bens públicos em uma sociedade. No ponto X o montante dos recursos alocados para a produção de bens privados é superior à de bens públicos (OC > OE). Já o ponto Y representa uma situação na qual o montante dos recursos destinados à produção de bens públicos supera o de bens privados (OF > OD). Portanto, o que devemos ter em mente é que quanto maior a parcela de recursos destinada à produção de bens públicos, menor será a parcela de recursos destinada à produção de bens privados. E vice-versa. Por que isto acontece? Porque grande parte da produção de bens públicos (ensino e saúde, por exemplo) é financiada com tributos. E os tributos representam a parcela da renda das pessoas e das firmas que é apropriada pelo Estado, sendo, portanto, desviada do consumo de bens privados para a produção de bens públicos. Mas estes recursos retornam ao fluxo econômico, sob a forma de pagamento de salários aos professores e médicos, com a compra de livros didáticos e mobiliário utilizados nas escolas públicas, no pagamento de merendeiras etc. Utilizamos novamente o estudo de Samuelson para criar a tabela a seguir. Ela serve para que possamos delimitar o papel das funções alocativa e distributiva do Estado e, por consequência, definir o volume de recursos destinados ao financiamento da provisão de bens públicos. 45 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 O estudo de Samuelson reconhece que existem pobres e ricos na sociedade e que o Estado deve alocar e distribuir bens e serviços públicos e privados com o objetivo de atender às necessidades de consumo dos pobres, uma vez que os ricos podem satisfazer as suas necessidades através do mecanismo do mercado. Nas colunas A e B da tabela estão assinaladas as possibilidades de produção de bens públicos e de bens privados, apontando para uma produção máxima de bens privados ($ 160), superior à produção máxima de bens públicos ($ 120), por razões de eficiência de natureza tecnológica, que surgem naturalmente a partir do processo da concorrência no mercado. Isso significa que, se todos os recursos fossem utilizados para produzir bens públicos, a sociedade teria “$ 120 em bens públicos”. Se todos os recursos fossem utilizados para produzir bens privados, a sociedade teria “$ 160 em bens privados”. As colunas C e D apresentam a combinação de gastos em bens públicos e privados pela população pobre. Já as colunas E e F apresentam a combinação de gastos em bens públicos e privados pela população rica. Tabela 1 – Equilíbrio geral no mercado de bens públicos e bens privados Fonte: O autor. De acordo com o processo de formação de preços nos mercados de bens públicos e privados, ambos, ricos e pobres, consomem, direta ou indiretamente, a mesma quantidade de bens públicos, tendo em vista a impossibilidade de rejeição (exclusão voluntária) do seu consumo, ao passo que ambos, ricos e pobres, 46 Economia no Setor Público aceitam preços iguais e consomem quantidades diferenciadas de bens privados, o rico consumindo uma parcela maior do estoque de bens privados. Toda pessoa, independentemente do fato de ser rica ou pobre, atribui “seus próprios preços” aos bens públicos. Isto é, umas pessoas atribuem alto valor ao que recebem do governo, enquanto outras atribuem baixo valor aos mesmos serviços prestados pelo governo. Atividade de Estudos: 1) Faça um gráfico (em uma planilha eletrônica ou em papel milimetrado) utilizando os dados da Tabela “Equilíbrio geral no mercado de bens públicos e bens privados”. Os dados de Bens Públicos devem ser marcados no eixo horizontal e os dados de Bens Privados devem ser marcados no eixo vertical. Com isso, a situação de equilíbrio se dá no ponto no qual o pobre consome a maior parcela de bens privados possível (45,1 na coluna J), que corresponde à diferença (isto é, o que sobra!) entre a produção total de bens privados e a parcela de bens privados consumida pelo rico (132,2 - 109,1 = 45,1). Esta combinação aparece na linha destacada em cinza na tabela. A combinação de equilíbrio de bens públicos e privados se dá no ponto onde bens públicos é igual a 50 (consumidos indistintamente por pobres e ricos) e bens privados é igual a 132,2 (soma das colunas F e J). Esse é ponto no qual o Estado pode encontrar o limite da sua intervenção no desempenho das suas funções alocativa e distributiva. Qualquer outro ponto acima ou abaixo da linha de possibilidades de produção denota ineficiência. Por exemplo, a soma das colunas G e H produz pontos que se situam fora da zona de possibilidades de produção. 47 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 Você irá obter quatro curvas que expressam os valores constantes das seguintes colunas da Tabela Equilíbrio Geral no mercado de Bens Públicos e Bens Privados: “Possibilidades de Produção”, “Consumo de Bens Privados do Pobre”, “Consumo de Bens Privados do Rico” e “Possibilidades de Consumo do Pobre”. A Competição por Recursos para a Produção de Bens Públicos e Privados Após tratarmos dos limites das funções alocativa e distributiva, trataremos agora da disputa por recursos que se dá entre o Estado e os agentes autônomos (pessoas e empresas privadas). O diagrama a seguir apresenta a situação de um país onde existem dois grandes grupos de bens e serviços. Os de “consumo coletivo” e os de “consumo privado”. Em função da limitação natural de recursos financeiros, humanos, tecnológicos etc., a quantidade de bens de consumo coletivo possível de ser produzida se reduz de maneira automática ao aumentarmos a quantidade de bens de consumo privado, e vice-versa. Ou seja, não podemos produzir a quantidade “desejada” de um e de outro. Só podemos produzir a quantidade possível de um ou de outro. Ou seja, temos que efetuar escolhas. O diagrama a seguir apresenta três situações diferenciadas, considerando agora o montante de recursos disponíveis para a provisão de bens de consumo coletivo do país que esteja sendo analisado. Um país que possua baixo nível de renda tenderá a apresentar uma proporção maior de recursos destinada à provisão de bens de consumo coletivo em relação aos bens de consumo privado, maior intervenção do Estado na provisão de bens e serviços públicos e maiores necessidades da implementação de políticas de cunho social. Conforme o conceito já apresentado de “possibilidades de produção”, as curvas que delineiam as áreas azul, verde e cinza apontam como se divide a alocação de recursos destinados à provisão e à produção de bens de consumo coletivo e de bens de consumo privado. 48 Economia no Setor Público Gráfico 1 – Ambiente Macroeconômico: função alocativa do Estado e competição por recursos para gastos públicos e privados País de Alta Renda País de Renda Média País de Baixa Renda% d e Be ns e S er vi ço s Pr iv ad os % de Bens e Serviços Públicos Fonte: O autor. Atividade de Estudos: 1) Explique em cerca de 50 palavras porque dizemos que: quanto maior a produção de bens públicos, menor será a parcela de recursos destinada à produção de bens privados? _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ _______________________________________________ ______________________________________________________________________________________________ Economia do Setor Público e Políticas Macroeconômicas A Macroeconomia é o estudo do comportamento econômico agregado dos setores familiar, empresarial, governamental e externo. Já a Microeconomia analisa o comportamento desses setores e de seus componentes de forma isolada. 49 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 O quadro analítico da Economia do Setor Público aborda a intervenção do Estado na economia do ponto de vista microeconômico, isto é, se preocupa com as questões referentes à alocação e à distribuição de recursos entre as famílias e as empresas, tomadas de maneira individual, bem como as finanças dos governos estaduais, municipais e o Governo Federal, enquanto agentes responsáveis pela provisão de bens e serviços públicos. Mas seu quadro analítico deve levar em conta a projeção das unidades individuais no contexto macroeconômico, bem como as restrições de caráter macroeconômico associadas à estabilização. Dessa forma, os setores Famílias e Empresas, o setor Externo e o setor Governo, e seus respectivos indicadores agregados macroeconômicos, passam a incorporar as denominações do quadro a seguir. Quadro 1 – Setores e Agregados Macroeconômicos Setor Macroeconômico Agregado Macroeconômico Setor Famílias e Empresas Consumo, Investimento e Poupança Setor Externo Exportações e Importações Setor Governo Tributos e Gastos do Governo Fonte: O autor. As Políticas Macroeconômicas As Políticas Macroeconômicas são: Política Monetária, Política Cambial, Política Tributária e Política Fiscal. Todas as quatro políticas possuem impactos de natureza macroeconômica. No entanto, as políticas monetária e cambial apresentam algumas características peculiares: • São exclusivas do Governo Federal; • São nacionais – a taxa de juros básica e a taxa de câmbio oficial são as mesmas em todo o território; • As decisões de alteração nas taxas de juros e de câmbio ocorrem no âmbito da área econômica do Executivo Federal, sem qualquer interferência formal de outros setores do Executivo e do Legislativo; • Possuem vigência imediata; • Os efeitos da variação das taxas de câmbio e de juros são imediatos e se propagam por todos os setores da economia; • Em função da abrangência nacional e da intensidade da propagação dos efeitos da sua aplicação, os resultados – positivos ou negativos – são de grande magnitude; 50 Economia no Setor Público • Os instrumentos de política econômica destinados à estabilização de preços frequentemente geram efeitos perversos e assimétricos sobre o emprego, o meio ambiente, a acessibilidade da população à infraestrutura habitacional, de saúde, saneamento, educação e lazer; • Em função das disparidades de renda, de estrutura econômica, de tamanho da população, dentre alguns aspectos, seus efeitos de assimetria em âmbito setorial, social, regional e local são de grande impacto. a) Objetivos das Políticas Macroeconômicas Os objetivos das Políticas Macroeconômicas são os de prever, controlar e alterar o comportamento do conjunto dos agentes econômicos privados e públicos, visando o crescimento econômico estável, o qual pode ser aferido com base nos indicadores de emprego dos fatores de produção; nível de preços e inflação; resultado da Balança Comercial e política de câmbio; Balanço de Pagamentos e Déficit e Dívida Pública. Observe que as Políticas Macroeconômicas têm como foco o “conjunto dos agentes econômicos privados e públicos, visando o crescimento econômico estável”, em contraposição à abordagem da Economia do Setor Público que prioriza a redução das desigualdades de toda ordem entre pessoas, setores, regiões etc. O Produto Interno Bruto e sua Repartição A produção total de bens e serviços de um país, em um determinado exercício, medida em moeda (reais, dólares etc.), é expressa pelo Produto Interno Bruto (PIB). O PIB representa a soma dos pagamentos efetuados pela utilização dos quatro grupos de fatores utilizados na produção (o trabalho – sob a forma de salários, o capital físico – sob a forma de aluguéis, o capital financeiro – sob a forma de juros e o capital tecnológico – sob a forma de royalties), contabilizados de 1º de janeiro a 31 de dezembro de cada ano. Os bens e serviços que compõem o PIB resultam das atividades produtivas executadas tanto pelo setor privado (profissionais liberais e empresas) quanto pelas atividades produtivas do setor público, nos âmbitos federal, estadual e municipal (Executivo, Legislativo e Judiciário). O PIB considera o valor adicionado dos bens produzidos e serviços prestados dentro do território econômico do país, independentemente da nacionalidade dos 51 As Funções Econômicas do Estado Capítulo 3 proprietários das unidades produtoras desses bens e serviços. Por considerar apenas o valor adicionado, seu cálculo exclui as transações intermediárias. Além disso, o PIB é calculado a preços de mercado, podendo ser calculado de acordo com três óticas: a) PIB sob a ótica do produto – soma dos valores agregados líquidos dos setores primário, secundário e terciário da economia, mais os impostos indiretos, mais a depreciação do capital, menos os subsídios governamentais. Produto Final Agregado: soma do valor dos bens e serviços finais produzidos pelas firmas (não contabiliza o valor dos bens intermediários). Ex.: Automóvel = R$ XX.XXX,00 Não confundir com valor bruto da produção, que é a soma do valor de todos os bens e serviços (inclusive dos que entram na produção de outros bens e serviços). b) PIB sob a ótica da renda – remunerações pagas dentro do território econômico do país, sob a forma de salários, juros, aluguéis e lucros distribuídos; somam-se a isso os lucros não distribuídos, os impostos indiretos e a depreciação do capital e, finalmente, subtraem-se os subsídios. Quadro 2 – Renda agregada: soma das rendas pagas aos fatores de produção FATOR DE PRODUÇÃO Capital Físico Capital financeiro Capital Tecnológico Capital Humano/Trabalho TOTAL DA RENDA RENDA = aluguel, leasing (R$) = juro (R$) = royalties (R$) = salário (R$) = (aluguel + juro + royalty + salário) Fonte: O autor. c) PIB sob a Ótica da despesa – dispêndios em consumo das unidades familiares e do governo, mais as variações de estoques, menos as importações de mercadorias e serviços e mais as exportações. Sob essa ótica, o PIB também se denomina Despesa Interna Bruta. 52 Economia no Setor Público Despesa agregada (soma da demanda agregada): Consumo + Poupança* + (Tributos - Gastos do governo) + (Exportações - Importações) * Poupança = Investimento Equação de equilíbrio da renda agregada: Renda = Produto = Despesa Y = (C+I (S)) + (T-G) + (X-M), onde: Y = Renda, Produto, Despesa C = Consumo I = Investimento S = Poupança T = Tributos G = Gasto Público X = Exportações I = Importações Atividades de Estudos: 1) Quais são os objetivos das Políticas Macroeconômicas? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Quais são os indicadores que medem os resultados das Políticas Macroeconômicas? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 3) Quais os indicadores agregados que medem os resultados do Setor Externo da Economia? ____________________________________________________ ____________________________________________________
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