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CURSOS: BIOMEDICINA/FARMÁCIA DISCIPLINA: EPIDEMIOLOGIA PROFESSOR: JOSÉ AURÉLIO NOTA DE AULA – 16/05/2022 Saúde do Trabalhador Trabalho e Processo de Trabalho: A relação entre o trabalho, a saúde e a doença é registrada desde a Antiguidade em papiros egípcios e textos judaicos, em Hipócrates, Platão, Virgílio, Plautus e Plínio, chegando a Galeno e Paracelso, entre tantas citações ao longo da história. No atual contexto histórico e social, aproximar-se da saúde do trabalhador envolve diferentes campos disciplinares e dimensões. A questão do trabalho na contemporaneidade para depois serem tecidas considerações sobre o campo da saúde do trabalhador. Em seguida são descritos aspectos da relação saúde-trabalho no contexto atual da globalização e da reestruturação produtiva. O que é o trabalho? Segundo o dicionário organizado por Bueno (1996), trabalho associa- se a “esforço, fadiga, tarefa ou aplicação de atividade física ou intelectual”. Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o Homem e a Natureza, um processo em que o Homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Importante reconhecer o trabalho como atividade exclusivamente humana, base da práxis social, de caráter teleológico, à medida que seu resultado já existe na forma ideal na mente do trabalhador antes mesmo da concretização daquele processo. Na sociedade capitalista passa-se de um trabalho que criava valores de uso para outro cuja organização se volta para a criação de valores de troca, orientado pela produtividade e o lucro. Nesse tipo de organização, o trabalho apresenta-se de fato como conceito imbuído de uma conotação negativa: o trabalhador vende sua força de trabalho, tornando o trabalho apenas uma maneira de sobreviver e não uma atividade com um fim em si própria ou de emancipação. O trabalho na sociedade moderna tem resultado em sofrimento, adoecimento, enfim, em desgaste físico e mental do homem trabalhador. o “processo de trabalho” a unidade básica de estudo e intervenção em saúde do trabalhador. A análise dos processos de trabalho é o que permite identificar as transformações que necessitam ser introduzidas nos locais e ambientes para a melhoria das condições de trabalho e saúde. No entanto, seu uso sempre exige um tratamento interdisciplinar que possibilite contextualizar e interpretar a interseção das relações sociais e técnicas que ocorrem na produção, assim como considerar a subjetividade dos vários atores sociais nelas envolvidos. É essa mudança de foco, quase uma mudança paradigmática, que confere ao campo da saúde do trabalhador seu potencial explicativo e prático. Campo da Saúde do Trabalhador Para o Ministério da Saúde: A Saúde do Trabalhador constitui uma área da Saúde Pública que tem como objeto de estudo e intervenção as relações entre o trabalho e a saúde. Tem como objetivos a promoção e a proteção da saúde do trabalhador, por meio do desenvolvimento de ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes e condições de trabalho, dos agravos à saúde do trabalhador e a organização e prestação da assistência aos trabalhadores, compreendendo procedimentos de diagnóstico, tratamento e reabilitação de forma integrada, no SUS – Sistema Único de Saúde. A área da saúde do trabalhador tem como pontos principais: • a inserção do trabalhador como ser social no processo de produção e na sociedade produtiva, na perspectiva do conceito ampliado de saúde; • o profundo comprometimento e envolvimento do trabalhador no planejamento, desenvolvimento e execução das ações, considerando-o elemento atuante e central em todas as etapas do processo; • o princípio da transparência das ações e de todas as informações, na perspectiva da negociação igualitária, entre trabalhadores e empregadores;• a transformação das bases técnicas e organizacionais dos postos, das condições e do ambiente de trabalho, na perspectiva da democratização das decisões e do controle social referenciado ao processo de trabalho e ao ambiente de trabalho em sua relação com a saúde. SAÚDE DO TRABALHADOR: NOVOS DESAFIOS EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO E REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA A entrada dos computadores e máquinas computadorizadas no chão da fábrica promoveu muito mais do que uma troca de equipamentos, constituindo-se no princípio de uma série de mudanças que passam pelo desemprego de grande número de trabalhadores e por transformações radicais na forma do trabalho industrial. A partir daí, a tecnologia tomou conta de todos os setores econômicos e sociais, modificando e transformando as comunicações e todos os processos de trabalho (não apenas as fábricas), e acabou modificando, também, nosso modo de viver e consumir. A globalização trouxe, por sua vez, novas mudanças aos processos de trabalho, de tal modo que, atualmente, o próprio sentido do trabalho e do emprego se modificou. A ligação entre globalização e novas tecnologias, em termos ideológicos, baseia-se nas políticas neoliberais que tomaram conta do cenário econômico mundial. A reestruturação produtiva acabou impondo aos trabalhadores novos desafios no que se refere à prevenção e à manutenção de sua saúde, pois ela introduziu, nos processos de trabalho, formas diferentes de controle da produção. No plano social, os resultados mais visíveis dessa fase histórica do capitalismo são: a globalização do desemprego, a globalização da exclusão social e a globalização de formas precárias de trabalho e de precarização da vida. Assim, a reestruturação produtiva concretiza nos processos de trabalho as necessidades da globalização. Um dos desafios impostos à área de saúde do trabalhador na atualidade é a questão da informalização do trabalho. A noção de informalidade é bastante controversa e envolve interpretações diversas. CINCO GRUPOS DE PROBLEMAS: Cinco grupos de problemas podem ser identificados dentro do contexto de saúde mental e trabalho. O primeiro diz respeito à relação entre saúde mental e organização do processo de trabalho. Nesse caso, a organização do trabalho, que envolve as metas de produção, pressão por produtividade, entre outros determinantes, pode acarretar transtornos mentais, como depressão, síndrome do pânico, estresse e burnout, acompanhados de doenças psicossomáticas, como hipertensão arterial, insônia e disfunções sexuais, entre outras. O segundo se refere aos efeitos neuropsicológicos decorrentes da exposição a solventes e metais pesados. As intoxicações leves provocam, antes dos sintomas físicos, sinais psicológicos, como perda de memória e dexteridade, entre outros. O terceiro grupo tem como foco as repercussões psicossociais decorrentes dos acidentes de trabalho e de doenças do trabalho e profissionais. Nesse caso, verifica-se que há consequências psicológicas e sociais para os indivíduos após o acometimento pelas doenças ou acidentes decorrentes do trabalho, como, por exemplo, os transtornos de estresse pós- traumático (TEPT). Outra família de problemas congrega os relacionados com o sofrimento psíquico que pode estar associado ao fato de os trabalhadores enfrentarem cotidianamente situações de risco à vida, como, por exemplo, na construção civil, portos e indústrias petroquímicas. Por fim, tem-se verificado que as situações de desemprego prolongado repercutem nas condições psicológicas e sociais dos indivíduos. Na atualidade, o assédio moral no trabalho e suas consequências, além da síndrome de burnout, têm chamado a atenção por sua frequência e repercussão na mídia em geral e entre os trabalhadores. A sensação de estar “acabado”, ou síndrome do burnout (do verbo inglês to burn out), é um tipo de resposta à exposição prolongada a estressores emocionais e interpessoais no trabalho. São situações de exposição constante ao estresse, causando quadros ansiosos, fadiga crônica e distúrbios do sono. A síndrome, também chamada síndrome do esgotamentoprofissional, é caracterizada por três componentes: exaustão emocional, diminuição da realização pessoal e despersonalização. O primeiro se refere a sentimentos de fadiga e redução dos recursos emocionais necessários para lidar com a situação estressora; o segundo diz respeito à percepção de deterioração da autocompetência e à falta de satisfação com as realizações e os sucessos pessoais no trabalho; e o terceiro componente se refere a atitudes negativas, ceticismo, insensibilidade e despreocupação com respeito a outras pessoas. Por sua vez, o assédio moral ou violência moral traduz-se pela exposição repetitiva e prolongada a situações humilhantes e constrangedoras dos trabalhadores no desempenho de suas funções, gerando sofrimento psíquico e degradação do ambiente de trabalho. No assédio moral, a vítima é humilhada, desqualificada e desestabilizada emocionalmente, por meio de condutas negativas, no intuito de prejudicar sua relação com o ambiente de trabalho e a organização, de maneira a forçá-la a desistir do emprego. Devido à alta frequência e à longa duração das condutas abusivas que atentam contra a dignidade e a integridade física e psíquica do indivíduo, o assédio resulta em considerável sofrimento mental, cujas consequências podem provocar perturbações funcionais de ordem psicossomática. No Brasil, os índices de assédio variam de 20% a 42%, dependendo da amostra do estudo e do método utilizado para medir a ocorrência do assédio – em geral, questionários. TRABALHO E RISCO: INSTRUMENTOS DE INVESTIGAÇÃO Os riscos enunciam a probabilidade de adoecimento dos trabalhadores submetidos aos fatores de risco sociotécnicos, e seus indicadores podem contribuir para a vigilância em saúde do trabalhador. Os indicadores devem corresponder à realidade do ambiente de trabalho, ter sustentabilidade científica, ser de fácil manuseio, considerar a subnotificação e possibilitar compor uma matriz com outros indicadores de produção ou de trabalhadores e com outros sistemas de informação em saúde-doença. Em 1999, o Ministério da Saúde publicou, em acordo com o Ministério da Previdência Social, a Portaria/MS 1.339, que institui a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (BRASIL, 2001). Composta de 210 entidades nosológicas, classificadas de acordo com a CID-10, a lista incorpora 27 agentes de risco presentes nos ambientes de trabalho e apresenta as patologias a eles relacionáveis. Os agentes de risco são de natureza química, incluindo as seguintes substâncias e seus compostos: arsênio, asbesto ou amianto, benzeno, berílio, bromo, cádmio, carbonetos metálicos de tungstênio, chumbo, cloro, cromo, flúor, fósforo, hidrocarbonetos alifáticos ou aromáticos, iodo, manganês, mercúrio, substâncias asfixiantes (monóxido de carbono, cianeto de hidrogênio, sulfeto de hidrogênio), sílica livre, sulfeto de carbono ou dissulfeto de carbono, alcatrão, breu, betume, hulha mineral e parafina. Inclui também agentes de risco de natureza física, como ruído, vibrações, ar comprimido e radiações ionizantes. Também são indicados os microrganismos e parasitos infecciosos vivos e seus produtos tóxicos, bem como algodão, linho, cânhamo e sisal. O amianto, por exemplo, pode causar um amplo leque de patologias do sistema respiratório, inclusive vários tipos de câncer: neoplasia maligna do estômago, da laringe, dos brônquios e do pulmão; mesotelioma da pleura, do peritônio, do pericárdio; placas epicárdicas ou pericárdicas; asbestose; derrame pleural e placas pleurais. Essa lista é complementada por outra que organiza os agravos em grandes grupos, sistemas ou aparelhos: doenças infecciosas e parasitárias, neoplasias, doenças do sangue e dos órgãos hematopoéticos, doenças endócrinas, metabólicas e nutricionais; transtornos mentais e do comportamento; doenças do sistema nervoso; doenças do aparelho respiratório; doenças do ouvido; doenças do sistema circulatório; doenças do sistema digestivo; doenças do sistema geniturinário; doenças da pele e anexos; traumatismos e envenenamentos etc. Um exemplo seria a infertilidade masculina, que pode ser provocada pelo chumbo ou seus compostos tóxicos, por radiações ionizantes, pelo clordecona e dibromocloropropano, assim como pelo calor (trabalho em temperaturas elevadas). A hipertensão arterial, agravo prevalente na população, pode fazer parte da intoxicação por chumbo ou dos efeitos da exposição ao ruído, e também se reconhece sua possível ocorrência por “problemas relacionados com o emprego e o desemprego”. Segundo a legislação brasileira, também são considerados acidentes do trabalho: (a) o acidente ocorrido no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado; (b) a doença profissional, assim entendida como aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade; e (c) a doença do trabalho, adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e que com ele estejam diretamente relacionadas. MAPA DE RISCOS O mapa de riscos é um instrumento incorporado à legislação brasileira e que tem suas origens no movimento sindical italiano dos anos 1960, motivado a defender a saúde no trabalho sob o lema “Saúde não se vende, nocividade se elimina!”. Apesar do vigor político dessa inspiração, no Brasil sua apropriação se deu dentro de modelos de explicação limitados à uni e à multicausalidade, utilizados pela medicina do trabalho e pela saúde ocupacional. A elaboração do mapa de riscos orienta-se pelas Normas Regulamentadoras de Segurança e Medicina do Trabalho (NR) do Ministério do Trabalho, especificamente a NR 5 (BRASIL, 2012b), que trata da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) e que estabelece como uma de suas funções “identificar os riscos do processo de trabalho e elaborar o mapa de riscos com a participação do maior número de trabalhadores, com assessoria do SESMT, onde houver”. Exemplo no livro, página 837: QUADRO 18.4 Classificação e exemplos dos principais riscos ocupacionais em grupos de acordo com sua natureza e a padronização das cores correspondentes. Portaria SSST/mTb no 25/1994. INDICADORES DE ACIDENTES DE TRABALHO, MORTES E INCAPACIDADES PERMANENTES DOS TRABALHADORES BRASILEIROS No Brasil, o setor saúde dispõe de uma complexa rede de sistemas de informação sobre saúde e doenças dos trabalhadores tanto no SUS, com o Sinan, SIM, Datasus, SIH e o SINITOX, como no Ministério da Previdência Social, este voltado para os acidentes de trabalho daqueles contratados de acordo com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Segundo a Portaria GM/MS 104/2011 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011), todos os acidentes e doenças do trabalho (AT) deverão ser notificados independentemente do vínculo dos trabalhadores, seja “celetista”, informal ou servidor público. Importante observar os vários tipos de indicadores a partir da Página 844 do Livro.
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