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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/358806676 TRANSMISSÕES INTERGERACIONAIS DAS OCUPAÇÕES E DA EDUCAÇÃO: DA "ARMADILHA DA POBREZA" AO "CICLO VIRTUOSO DA RIQUEZA" Thesis · January 2021 CITATIONS 0 READS 27 1 author: Some of the authors of this publication are also working on these related projects: DESEMPREGO, EMPREGO E DESIGUALDADES SALARIAIS View project A mulher do século XXI no mercado de trabalho: uma abordagem das diferenças salariais por gênero no Brasil e macrorregiões View project Magno Rogério Gomes Universidade Estadual de Londrina 47 PUBLICATIONS 54 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Magno Rogério Gomes on 23 February 2022. The user has requested enhancement of the downloaded file. https://www.researchgate.net/publication/358806676_TRANSMISSOES_INTERGERACIONAIS_DAS_OCUPACOES_E_DA_EDUCACAO_DA_ARMADILHA_DA_POBREZA_AO_CICLO_VIRTUOSO_DA_RIQUEZA?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_2&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/publication/358806676_TRANSMISSOES_INTERGERACIONAIS_DAS_OCUPACOES_E_DA_EDUCACAO_DA_ARMADILHA_DA_POBREZA_AO_CICLO_VIRTUOSO_DA_RIQUEZA?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_3&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/project/DESEMPREGO-EMPREGO-E-DESIGUALDADES-SALARIAIS?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/project/A-mulher-do-seculo-XXI-no-mercado-de-trabalho-uma-abordagem-das-diferencas-salariais-por-genero-no-Brasil-e-macrorregioes?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_1&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Magno-Gomes-3?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_4&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Magno-Gomes-3?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_5&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/institution/Universidade_Estadual_de_Londrina?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_6&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Magno-Gomes-3?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_7&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Magno-Gomes-3?enrichId=rgreq-cff15d8f3efe3821220795e8be51a62a-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzM1ODgwNjY3NjtBUzoxMTI2NzA4MTk5NTg3ODQzQDE2NDU2Mzk1NzY4NDk%3D&el=1_x_10&_esc=publicationCoverPdf UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE ECONOMIA PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM ECONOMIA TRANSMISSÕES INTERGERACIONAIS DAS OCUPAÇÕES E DA EDUCAÇÃO: DA “ARMADILHA DA POBREZA” AO “CICLO VIRTUOSO DA RIQUEZA” Magno Rogerio Gomes Tese submetida ao Programa de Pós- Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Teoria Econômica. Maringá 2021 Magno Rogério Gomes Ciências Econômicas TRANSMISSÕES INTERGERACIONAIS DAS OCUPAÇÕES E DA EDUCAÇÃO: DA “ARMADILHA DA POBREZA” AO “CICLO VIRTUOSO DA RIQUEZA” Orientadora: Prof. Dra. Marina Silva da Cunha Co-orientadora: Prof. Dra. Solange de Cássia Inforzato de Souza Tese submetida ao Programa de Pós- Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Teoria Econômica. Maringá 2021 Magno Rogério Gomes TRANSMISSÕES INTERGERACIONAIS DAS OCUPAÇÕES E DA EDUCAÇÃO: DA “ARMADILHA DA POBREZA” AO “CICLO VIRTUOSO DA RIQUEZA” COMISSÃO EXAMINADORA ______________________________________ Professora Dra. Marina Silva da Cunha Universidade Estadual de Maringá - UEM ______________________________________ Professor Dr. Ednaldo Michellon Universidade Estadual de Maringá - UEM ______________________________________ Professor Dr. Ricardo Luis Lopes Universidade Estadual de Maringá – UEM ______________________________________ Professor Dr. Paulo Jorge Reis Mourão Universidade do Minho - UMinho/Portugal ______________________________________ Professora Dra. Katy Maia Universidade Estadual de Londrina - UEL Maringá 2021 DEDICATÓRIA Este trabalho é dedicado aos responsáveis pela minha existência e trajetória, a Deus e a “DONA CARMEN”. AGRADECIMENTOS A Deus, minha fortaleza e força, que me guiou pelas vielas da vida, e nunca me deixou desviar; a ti Senhor, devo tudo que sou e serei. À minha família, pois ela é o meu alicerce. À minha companheira Franciele e ao meu filho Aquiles, por me derem o suporte de que preciso. À professora e orientadora Marina Silva da Cunha pela paciência na orientação е incentivo que tornaram possível а conclusão desta tese. À professora e coorientadora Solange de Cassia Inforzato de Souza pelas excelentes contribuições, sugestões e ideias no processo de desenvolvimento deste trabalho, que tornou possível а sua conclusão. Aos professores Ednaldo Michellon e Paulo Jorge Reis Mourão, que participaram do exame de qualificação e contribuíram com a evolução desta tese. A professora Katy Maia e professor Ricardo Luis Lopes, que aceitaram prontamente o convite para avaliar esta tese. Aos colegas do doutorado que de alguma forma contribuíram para essa minha jornada. Aos professores do Programa de Doutorado em Economia da Universidade Estadual de Maringá que contribuíram para a minha formação. EPÍGRAFE “A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em procurar novas paisagens, mas em ter novos olhos”. (Marcel Proust) “Existem muitas hipóteses em ciência que estão erradas. Isso é perfeitamente aceitável, elas são a abertura para achar as que estão certas”. (Carl Sagan) “A menos que modifiquemos a nossa maneira de pensar, não seremos capazes de resolver os problemas causados pela forma como nos acostumamos a ver o mundo”. (Albert Einstein) “Nenhum homem deveria nascer e morrer no mesmo lugar”. (Gustavo Gitti) LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Características dos indivíduos ocupados, por legado e não legado ocupacional, e classe social no Brasil, para 2014. ............................................................... 50 Tabela 2 - Proporção do legado ocupacional (%) e salário hora médio (R$) dos ocupados com mais de 23 anos de idade por classe social em 2014. .................................. 52 Tabela 3 – Transferência intergeracionalda ocupação para os Pobres e Não Pobres em 2014. .................................................................................................................................... 53 Tabela 4 - Efeitos marginais (Geral), 2014 ......................................................................... 54 Tabela 5 - Legado ocupacional nos pontos médios, 2014 ................................................... 56 Tabela 6 - Características dos indivíduos ocupados, por legado e não legado, no Brasil em 2019. .............................................................................................................................. 59 Tabela 7 - Proporção do legado ocupacional (%) e salário hora médio (R$) por gênero dos pobres e não pobres ....................................................................................................... 61 Tabela 8 - Legado ocupacional dos pobres e não pobres condicionado ao nível de escolaridade dos pais, Brasil, 2019 ...................................................................................... 62 Tabela 9 - Segmento ocupacional do indivíduo pobre e não pobre, condicionado ao segmento dos pais, Brasil, 2019 .......................................................................................... 63 Tabela 10 - Efeitos marginais da probabilidade do legado ocupacional, Brasil em 2019 ... 66 Tabela 11 - Legado ocupacional nos pontos médios, 2019 ................................................. 68 Tabela 12 - Matriz de transição do Legado educacional dos pobres e não pobres (%), 2014 ..................................................................................................................................... 71 Tabela 13 - Efeito marginais do legado educacional, 2014 ................................................. 72 Tabela 14 - Legado educacional nos pontos médios condicionado ao nível de instrução dos pais, 2014 ...................................................................................................................... 74 Tabela 15 - Legado educacional por nível de instrução, Brasil, 2014................................. 75 Tabela 16 – Determinantes salariais por quantis dos trabalhadores pobres. Brasil, 2014 ... 79 Tabela 17 - Determinantes salariais por quantis dos indivíduos não pobres. Brasil, 2014 . 80 Tabela 18 - Determinantes salariais por quantis dos indivíduos pobres, Brasil, 2019 ........ 82 Tabela 19 - Determinantes salariais por quantis dos indivíduos não pobres, Brasil, 2019 . 84 Tabela 20 – Decomposição salarial dos herdeiros e não herdeiros ocupacionais no Brasil. ................................................................................................................................... 88 Tabela 21 – Decomposição salarial do Legado e Não Legado para os pobres, Brasil, 2014 e 2019 ......................................................................................................................... 89 Tabela 22 – Decomposição salarial do Legado e Não Legado para os Não pobres, Brasil, 2014 e 2019 .............................................................................................................. 90 Tabela 23 – Decomposição salarial de pobre e não pobre dos herdeiros ocupacionais, Brasil, 2014 e 2019 .............................................................................................................. 92 Tabela 24 – Decomposição salarial de pobre e não pobre dos não herdeiros ocupacionais, Brasil, 2014 e 2019 ....................................................................................... 93 Tabela A 1 - Classes de ocupação (CBO 2002) ................................................................ 105 Tabela A 2- Subsetores Econômicos (CNA 2.0) ............................................................... 106 Tabela A 3 - Resultados do modelo de participação, 2014 e 2019 ................................... 108 Tabela A 4 - Resultados do modelo Logit Multinomail, 2014 para subgrupo da CBO. ... 109 Tabela A 5 - Resultados do modelo Logit Multinomail, para subgrupo da CNAE 2019 . 110 Tabela A 6 - Resultados do Modelo logit binomial, para o legado educacional, 2014 .... 111 Tabela A 7 – Testes do modelo Probit .............................................................................. 113 Tabela A 8 - Teste para o modelo do legado Educacional ................................................ 114 Tabela A 9 - Teste de Wald de combinação de categorias modelo CBO 2014. ................ 114 Tabela A 10 - Teste de Wald de combinação de categorias modelo CNAE 2019 ............ 114 Tabela A 11 - Teste de IIA - Small-Hsiao (CBO 2014) .................................................... 115 Tabela A 12 - Teste de IIA - Small-Hsiao tests of IIA assumption (CNAE 2019) ........... 115 Tabela A 13 - Testes econométricos para regressões “mincerianas” OLS....................... 115 Tabela A 14 - Testes econométricos para regressões “mincerianas” Quantilicas 2014 ... 115 Tabela A 15 - Testes econométricos para regressões “mincerianas” Quantilicas 2019 ... 116 GOMES, Magno Rogério. Transmissões intergeracionais das ocupações e da educação: da “armadilha da pobreza” ao “ciclo virtuoso da riqueza”. 116f. Tese de Doutorado em Economia. – Departamento de Economia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2021. RESUMO A presente tese tem por objetivo analisar os mecanismos de transmissão parental da pobreza pelos canais do mercado de trabalho associados às ocupações e à educação no Brasil. Para isso, foram estimadas as probabilidades dos legados ocupacional e educacional intergeracionais, utilizando as bases de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2014 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Continua (PNADC) de 2019. Aplicou-se o modelo Logit multinomial para encontrar as chances de reprodução/transmissão parental do legado ocupacional e o Logit binomial para o legado educacional, segundo a classe socioeconômica do indivíduo. Mensurou-se também as equações salariais quantílicas com correção do viés de seleção amostral e a decomposição salarial RIF - recentered influence function. O estudo constatou a influência dos pais no processo de escolha das carreiras dos filhos, sendo diferente para grupos díspares, como a classe socioeconômica, gênero, estrutura familiar e região de moradia. Filhos homens tendem a seguir o legado ocupacional do pai, enquanto as filhas as ocupações das mães. Indivíduos do meio rural têm maior probabilidade de ser perpetuar na ocupação dos pais do que os indivíduos do meio urbano. A estrutura familiar gera influência na ocupação dos filhos, em que jovens de famílias monoparentais tendem a buscar ocupação distinta de seus responsáveis. Evidenciou-se também que, em geral, os indivíduos pobres têm uma maior probabilidade de seguir o legado ocupacional e educacional dos pais. Os resultados confirmam a hipótese levantada de que trabalhadores que tendem a seguir o legado ocupacional dos pais têm remunerações inferiores aos dos indivíduos que optam por outras ocupações, e que esse fato pode ocasionar um “ciclo vicioso da pobreza” aos indivíduos que pertençam à classe dos pobres, ou um “ciclo virtuoso da riqueza”, aos que pertençam à classe dos não pobres. Constata-se que a influência dos pais na ocupação dos filhos é mais forte quando esses ainda estão residindo com os pais, sendo que um grande número de indivíduos irá carregar essa transmissão ocupacional por toda a vida e com grande probabilidade de repassar o legado para as próximas gerações. O nível de escolaridade dos pais também influencia o nível de instrução dos filhos, o que pode promover um “ciclo vicioso da ignorância” quando os pais têm baixo nível de instrução e os filhos seguem o legado educacional. Essaevidência desfavorável é mais intensa para o grupo dos pobres. O impacto do legado ocupacional nos salários dos filhos é maior no menor quantil da distribuição salarial e mais intenso para a classe dos pobres, o que torna a “armadilha da pobreza” mais robusta, visto que os jovens economicamente menos favorecidos tendem a seguir os passos dos pais para contribuir com a renda familiar, se deparando com um trade off entre trabalho ou estudo. Isso interrompe a sua formação e os forçam a se inserirem precocemente no mercado de trabalho, desempenhando ocupações secundárias, com menores rendimentos, gerando um “ciclo vicioso da pobreza”. Palavras-Chave: Legado ocupacional, Legado educacional, Ciclo vicioso da pobreza, Ciclo virtuoso da riqueza, Decomposição RIF. GOMES, Magno Rogério. Intergenerational transmissions of occupations and education: from the “poverty trap” to the “virtuous cycle of wealth”. 116 f. Doctoral Thesis in Economics. - Department of Economics, State University of Maringá, Maringá, 2021. ABSTRACT This thesis aims to analyze the mechanisms of parental transmission of poverty through the labor market channels associated with occupations and education in Brazil. For this, the probabilities of the intergenerational occupational and educational legacies were estimated, using the databases of the National Household Sample Survey (PNAD) of 2014 and the National Household Sample Survey (PNADC) of 2019. The multinomial Logit model was applied to find the chances of parental reproduction / transmission of the occupational legacy and the Logit binomial for the educational legacy, according to the individual's socioeconomic class. Quantile wage equations with correction of sample selection bias and wage decomposition RIF - recentered influence function were also measured. We found the influence of parents in the process of choosing their children's careers, being different for different groups, such as socioeconomic class, gender, family structure and region of residence. Male children tend to follow the father's occupational legacy, while daughters tend to the mother's occupations. Individuals from rural areas are more likely to be perpetuating their parents' occupation than individuals from urban areas. The family structure also generates influence on the occupation of children, in which young people from single-parent families tend to seek occupation distinct from their parents. It also showed that, in general, the poor are more likely to follow their parents' occupational and educational legacy. The results confirm the hypothesis raised that workers who tend to follow their parents' occupational legacy have lower pay than individuals who choose other occupations, and that this fact can cause a “vicious cycle of poverty” for individuals who belong to the poor class, or a “virtuous cycle of wealth”, to those who belong to the class of non-poor. It was also found that the influence of parents in the occupation of children is stronger when they are still living with parents therefore many individuals will carry this occupational transmission throughout their lives and with a high probability of passing on the legacy for the next generations. Parental education also influences children's education level, which can generate a “vicious cycle of ignorance” when parents have low level of education and children follow the educational legacy. This unfavorable evidence is more intense for the poor group. The impact of the occupational legacy on children's wages is greater in the smallest quantile of the wage distribution and more intense for the poor class, which makes the "poverty trap" more robust, since economically disadvantaged young people tend to follow in the footsteps parents to contribute to the family income, facing a trade-off between work or study. This interrupts their training and forces them to start early in the labor market, performing secondary occupations, with lower incomes, generating a “vicious cycle of poverty”. Keywords: Occupational legacy, Educational legacy, Vicious cycle of poverty, Virtuous cycle of wealth, RIF decomposition. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 12 2 LEGADOS OCUPACIONAL E EDUCACIONAL E DIFERENÇAS SALARIAIS: TEORIAS E EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS .................................................................................. 16 2.1 Abordagens Teóricas ............................................................................................................ 16 2.2 Evidências empíricas nacionais e internacionais ......................................................... 22 3. METODOLOGIA ..................................................................................................................... 36 3.1 Bases de dados ................................................................................................................ 36 3.2 Métodos Econométricos ................................................................................................. 39 3.2.1 Método da probabilidade de ocupação: modelo Logit Multinomial ................................ 39 3.2.2 Método da probabilidade educacional: modelo Logit Binomial ...................................... 41 3.2.3 Equações de salários ........................................................................................................ 42 3.2.3.1 Procedimentos de Correção de Viés de Seleção Amostral ........................................... 42 3.2.3.2 Equações mincerianas quantílicas ................................................................................. 43 3.2.3.2 Decomposição Salarial Quantílica ................................................................................ 44 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................... 49 4.1 Mobilidade Ocupacional Intergeracional e a Classe Socioeconômica no Brasil: uma análise para o ano de 2014 ......................................................................................................... 49 4.1.1 Resultados Descritivos ..................................................................................................... 49 4.1.2 Resultados das probabilidades do legado ocupacional .................................................... 53 4.1.3 Considerações Finais ....................................................................................................... 56 4.2 Legado Ocupacional Setorial por Classe Socioeconômica no Brasil: uma análise para o ano de 2019 .................................................................................................................................. 57 4.2.1 Resultados Descritivos ..................................................................................................... 58 4.2.2 Resultados das probabilidades do legado ocupacional: uma análise setorial no Brasil ... 64 4.2.3 Considerações Finais ....................................................................................................... 69 4.3 Resultados da probabilidade do legado parental da educação no Brasil ........................ 70 4.3.1 Resultados Descritivos ..................................................................................................... 70 4.3.2 Resultados da probabilidade do legado Educacional ....................................................... 72 4.3.3 Considerações Finais ....................................................................................................... 75 4.4 Legado Ocupacional e os Efeitos Salariais para Pobres e Não Pobres no Brasil ............ 76 4.4.1 Análise descritiva .............................................................................................................76 4.4.2 Determinantes Salariais.................................................................................................... 78 4.4.3 Decomposições Salariais.................................................................................................. 86 4.4.4 Considerações Finais ....................................................................................................... 94 CONCLUSÕES .............................................................................................................................. 95 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................. 98 APÊNDICES ................................................................................................................................. 105 12 INTRODUÇÃO Apesar dos avanços globais contra a pobreza, segundo informações do Banco Mundial (2020), quase metade da população mundial vive abaixo da linha da pobreza. A CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (2020), prevê aumento da pobreza na América Latina em 2020 (45,4 milhões). De acordo com o organismo regional, mais de 30% da população estava abaixo da linha da pobreza na região, em 2018. Esse cenário desfavorável teve contribuição significativa do Brasil, dado o aumento da pobreza e extrema pobreza no país. Ainda de acordo com a CEPAL, para erradicar a pobreza é necessário um mercado de trabalho que garanta postos de trabalho de qualidade e salários justos, além de proteção social integral e universal. Segundo Piketty (2000), a explicação da persistência da desigualdade através das gerações é a transmissão da riqueza dos pais para os filhos por meio de herança. Além da herança patrimonial outros legados podem ser transferidos de pais para filhos, como o legado de uma profissão e/ou transferência educacional. Uma forma dos menos favorecidos financeiramente melhorarem sua renda e, consequentemente vivenciarem um maior bem-estar e qualidade de vida, é por meio do trabalho. Portanto, é de suma importância a inserção dessa classe socioeconômica no mercado de trabalho em boas ocupações (trabalho não precário) e boas remunerações. Para que essas ocupações sejam preenchidas os indivíduos devem estar habilitados e capacitados a desempenhá-las, assim, além dos postos de trabalho é importante observar como se dá a escolha ocupacional e qual a importância do background familiar. A ocupação profissional é uma escolha importante que pode condicionar os indivíduos a uma situação economicamente favorável ou desfavorável no futuro. Quando essa ocupação sofre influência dos discursos e valores que circulam no meio familiar, esses indivíduos são lançados à sua própria sorte. Caso esses sigam o legado ocupacional dos pais, e são pobres, isso pode promover uma armadilha da pobreza, já quando o legado ocupacional é de uma família não pobre, isso pode gerar um legado da riqueza. Portanto, a escolha de uma ocupação não apenas é relevante para o futuro do indivíduo, mas para uma geração, uma vez que o mesmo formará uma família e influenciará seus filhos em sua ocupação, e os seus filhos influenciarão seus netos e, assim sucessivamente, de modo que um elo será construído, passando de geração para geração. A escolha profissional é um processo contínuo, constituído de várias decisões adotadas ao longo da vida, influenciadas pelo meio familiar (LUCHIARI, 1996; SOBROSA et al., 2015). A influência do background nas 13 ocupações dos filhos também é evidenciada internacionalmente em Laband e Lentz (1983), Sjogren (2000), Constant e Zimmermann (2003), Tsukahara (2007), Shilpi e Emran (2010), Thijssen e Wolbers (2016) e Bello e Morchio (2018). O background familiar e social deve ser levado em consideração na opção profissional dos indivíduos. Nesse sentido, Becker e Tomes (1979) veem um indivíduo não de forma isolada, mas como parte de uma família cujos membros abrangem várias gerações. A relevância dos pais na formação dos filhos transpassa a necessidade de subsistência, uma vez que os pais são referência para os filhos, e esses tendem a se espelhar em seus exemplos na formação de sua identidade e na escolha ocupacional. Assim, no processo de decisão de uma ocupação, os filhos são condicionados ao ambiente socioeconômico e à oferta de postos trabalho. O papel dos pais no processo de escolha ocupacional dos filhos é algo iniciado na infância, e essa influência pode envolver tanto as ações objetivas quanto práticas, como por exemplo, ter os pais financiando sua formação educacional (ALMEIDA E MELO-SILVA, 2011). Além do legado ocupacional também há um legado educacional entre as gerações, podendo esse ser benéfico, quando os pais têm alta instrução, ou prejudicial quando apresentam baixa escolaridade. Nesse último caso, de alguma forma, os filhos inclinam-se para o mesmo caminho educacional dos pais, gerando um “ciclo vicioso da ignorância”, podendo ser mais perverso quando visto na classe dos pobres, o que reforça a “armadilha da pobreza” enraizando ainda mais o “ciclo vicioso da pobreza”. A transmissão educacional de pais para filhos é observada tanto nacional quanto internacionalmente nos estudos de Laband e Lentz (1983), Grawe e Mulligan (2002), Tsukahara (2007), Antigo (2010), Shilpi e Emran (2010), Thijssen e Wolbers (2016), Cruz (2019) e Guimarães, Arraes e Costa (2020). Os filhos tendem a considerar o desejo e a experiência pré-consciente, relacionados às expectativas e vontades manifestadas pelos familiares no momento de escolher uma ocupação. Para Luchiari (1996), os filhos escolhem sua profissão em consonância com as expectativas de seus pais; os filhos podem escolher as profissões não realizadas pelos pais concretizando o sonho dos mesmos; e os filhos podem escolher, por identificação, a profissão dos pais, isto é, a mesma profissão do pai ou da mãe. Na mesma direção, Carvalho e Taveira (2009), no estudo para o Brasil, argumentam que a família tem sido considerada o fator de maior influência no processo de escolha das carreiras dos filhos. Outros fatores, além do legado ocupacional, influenciam tanto a inserção como a remuneração do trabalho. Tais fatores são destacados pela teoria do capital humano, pela teoria credencialista, pela teoria do mercado de trabalho segmentado ou dual e pela teoria da 14 discriminação. Estudos empíricos confirmam a influência das variáveis apontadas pelas teorias como: escolaridade e experiência (capital humano); setor econômico e ocupações (mercado dual); gênero e cor (discriminação), tanto na determinação da alocação ocupacional como nas remunerações do trabalho (CACCIAMALI; HIRATA, 2005; SALVATO et al., 2008; SOUZA E GOMES, 2015; GOMES, 2016; JACOBOWISKI E CUNHA, 2017; MANTOVANI, 2018; PAIVA, 2019). Isto posto, este estudo busca analisar os mecanismos de transmissão parental da pobreza pelos canais do mercado de trabalho relacionados às ocupações e à educação no Brasil. Além disso, pretende verificar se há diferenças desses mecanismos de transmissão para os indivíduos que ainda residem com os pais em relação àqueles que não o fazem, já que esses últimos são mais velhos e, em sua grande maioria, constituem as suas próprias famílias. Para isso foram estimadas as probabilidades do legado ocupacional e educacional intergeracionais, e mensuradas as fontes das diferenças salariais entre os trabalhadores que optaram por seguir as ocupações dos pais e dos trabalhadores que optaram por uma ocupação diferente dos pais, bem como entre os herdeiros ocupacionais pobres e não pobres. A partir da utilização do suplemento dos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do ano de 2014 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) de 2019, este trabalho testa a hipótese geral de que os legados parentais ocupacionale educacional, proporcionam um “ciclo vicioso da pobreza” quando os filhos pertencem à classe econômica dos pobres e um “ciclo virtuoso da riqueza”, quando os herdeiros pertencem à classe dos não pobres. Acredita-se que a educação dos pais pode condicionar o nível de instrução dos filhos e espera-se que os rendimentos dos jovens herdeiros sejam menores para os que pertencem à classe dos pobres, visto que as ocupações herdadas, em sua grande maioria, estão no segmento secundário do mercado de trabalho, segundo a teoria do mercado dual, com menores salários e empregos penosos, agravando-se ainda mais quando esses pertencerem à classe de salários menores. Essas evidências podem contribuir para a caracterização das diferenças e desigualdades salariais dos trabalhadores que seguiram o legado ocupacional dos pais em relação aos trabalhadores que optam por outras profissões, e apontar para uma das possíveis origens das desigualdades de renda no Brasil. Assim, ações afirmativas para o investimento em capital humano e igualdade de oportunidade que proporcionam a ocupação em segmentos primários, de boas condições de trabalho e salários mais altos, podem ser motivadas, principalmente para os indivíduos de classe econômica menos favorecida. Outra contribuição, apesar de um possível viés de seleção que por sua vez será minimizado com o 15 procedimento de Heckman (1979), é a possibilidade de estudo de transmissão ocupacional e educacional para outros anos, independentemente se há ou não suplementos de coleta de dados das PNADs, uma vez que este estudo traz uma alternativa de análise para os indivíduos que ainda residem no mesmo domicílio dos pais. O capital humano tem um papel importante na formação do indivíduo, tanto na edificação do conhecimento, quanto no fortalecimento e construção de sua personalidade, exercendo grande influência nas escolhas que esses jovens realizarão. Além disso, também será possível verificar as disparidades de rendimentos entre as ocupações, podendo servir como base para os órgãos governamentais competentes promoverem políticas para reduzir o gap salarial entre as ocupações no mercado de trabalho brasileiro. Além desta introdução, esta tese está organizada em mais quatro capítulos. O próximo capítulo exibe a revisão de literatura teórica e estudos empíricos acerca do legado ocupacional e educacional, e as fontes das diferenças salariais. O terceiro capítulo trata das bases de dados, PNAD/2014 (suplemento) e PNADC/2019, e dos métodos utilizados para análise. Posteriormente, o capítulo quarto descreve os resultados e a interpretação dos dados. Por fim, expõe-se as conclusões do trabalho. 16 2 LEGADOS OCUPACIONAL E EDUCACIONAL E DIFERENÇAS SALARIAIS: TEORIAS E EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS 2.1 Abordagens Teóricas A escolha de uma profissão não é algo trivial, e passa por uma complexa rede de fatores de dimensões individuais e sociais. A escolha ocupacional pode ser influenciada pela formação educacional, pelas características do mercado de trabalho, e pelos contextos social, político, econômico e cultural. Todos esses fatores irão interferir na opção e na trajetória profissional do indivíduo e de sua descendência, potencializados pelo meio familiar, uma vez que os desejos e aspirações dos pais e familiares são levados em conta quando os indivíduos iniciam sua trajetória no mercado de trabalho. Além dos argumentos teóricos associados aos atributos produtivos e não produtivos dos indivíduos e às características dos postos de trabalho, que são sustentados pelas teorias do capital humano e do mercado dual, o background familiar e social deve ser levado em consideração na opção profissional dos indivíduos. Nesse sentido, Becker e Tomes (1979) veem um indivíduo não de forma isolada, mas como parte de uma família cujos membros abrangem várias gerações. Os membros contribuem para a produção de renda familiar e para o cuidado de crianças que continuam a família no futuro. Ainda de acordo com os autores, a renda dos filhos pode ser aumentada quando recebem mais capital humano e não humano de seus pais. Sua renda também é aumentada pela dotação de determinada raça, talentos e outras características determinadas geneticamente, além da reputação e conexões familiares, conhecimentos, habilidades e objetivos fornecidos pelo ambiente familiar. Portanto, o futuro de um indivíduo está ligado aos pais, não apenas através de investimentos, mas também pelas dotações transmitidas pelos pais e/ou por outros membros da família. Em linha com Becker e Tomes (1979), Almeida e Melo-Silva (2011) evidenciaram o papel dos pais nos processos de escolha profissional dos filhos, iniciados na infância. Essa influência pode envolver ações objetivas e práticas, ou mesmo ter os pais como agentes financiadores da formação educacional dos filhos. Também existem influências subjetivas, como apoio, aprovação ou reprovação das escolhas, expectativas de resultados, cobranças, e até mesmo as crenças dos pais sobre o mercado de trabalho, sonhos e projetos que traçam para seus filhos. O processo de escolha de uma profissão transcorre de uma complexa rede de fatores tanto de dimensões individuais quanto sociais, pois a escolha é influenciada pelo meio familiar, formação educacional, característica do mercado de trabalho e, mais 17 amplamente, do contexto social, político, econômico e cultural. Conjuntamente, todos os fatores influenciam a trajetória vocacional do indivíduo. Segundo Becker (1993), crianças com os mesmos pais costumam ter rendas diferentes porque sua sorte difere, assim como a composição e o nível de investimentos dos pais dependem das habilidades, deficiências, sexo e outras características dos filhos. O autor presume que as crianças recebem dotações de capital que são determinadas pela reputação e conexões de suas famílias, pela contribuição das constituições genéticas dos pais para a habilidade, raça e outras características dos filhos, e pela cultura familiar particular. Obviamente, as dotações dependem de muitas características dos pais, avós e outros membros da família. Os pais são os mais próximos geneticamente dos filhos e, geralmente, também são mais próximos ambientalmente, embora avós, tios e tias e até bisavós possam ter influência significativa em grupos de parentesco de épocas anteriores. Para Becker (1993), as diferenças entre as famílias modernas e as famílias do passado indicam que a herdabilidade não é rigidamente determinada por propriedades intrínsecas do processo biológico e cultural, mas está parcialmente sujeita ao controle das famílias. Portanto, as crianças de famílias bem-sucedidas têm mais probabilidade de ter sucesso em virtude do tempo adicional gasto com elas e também de seus dotes superiores de cultura e genes. Ainda para o autor, a renda dos filhos está relacionada com a renda e dotação de seus pais, pois tem os pais como os financiadores de capital humano que refletiria em maiores ganhos. Grawe e Mulligan (2002), em revisão das teorias econômicas de correlações intergeracionais, destacam a correlação positiva da educação infantil e renda dos pais, entre os mais ricos. Segundo os autores a renda familiar é um fator que contribui para o acúmulo da capital humano dos filhos, pois os pais ricos são capazes de financiar investimentos em capital humano com sua própria riqueza. Portanto, crianças de famílias mais ricas desfrutam de mais capital humano e, consequentemente, terão melhores ocupações e maiores ganhos no futuro. Em atenção aos atributos pessoais adquiridos, que parte de um arcabouço teórico denominado de teoria do capital humano, destacam-se como principais expoentes, Jacob Mincer, Theodore W. Schultz e Gary S. Becker. No contexto das desigualdades dos rendimentos e ocupações, a teoria do capital humano se desenvolveu tendocomo pressupostos o mercado de trabalho contínuo e competitivo, a mão de obra homogênea e a existência da perfeita mobilidade ocupacional. Segundo Mincer (1958, 1974), a escolaridade e a experiência são determinantes dos rendimentos do trabalhador e da inserção ocupacional, cujas diferenças são atribuídas pelas diferenças dos fatores produtivos (capital humano). 18 Para Schultz (1961), o capital humano não se limita apenas à escolaridade e experiência, mas também se relaciona com a saúde, as vestimentas, o vigor físico, a motivação, as habilidades manuais e artísticas, a migração entre outros. Para Becker (1962, 1966), os investimentos em capital humano podem explicar as desigualdades de rendas entre as pessoas, pois que a produtividade e os rendimentos de um trabalhador aumentam em função da elevação da escolaridade e de suas habilidades adquiridas com a experiência. Para o autor há diferentes formas de investimento em capital humano, incluindo o investimento em educação, treinamento (on-the-job training), cuidados médicos e aquisição de informações do sistema econômico. O investimento em capital humano pode reduzir a desigualdade de rendimentos e facilita a inserção ocupacional em melhores empregos (BECKER; CHISWICK, 1966). Segundo Lima (1980), a teoria do capital humano segue o seguinte raciocínio: as pessoas se educam, a educação por sua vez tem como principal efeito mudar as “habilidades” e conhecimentos, assim maiores serão suas habilidades cognitivas e maior a produtividade e, por fim, uma maior produtividade resultará em maiores rendas para os trabalhadores. Portanto, a teoria do capital humano destaca que os salários são determinados por características inatas e adquiridas. As características inatas, não produtivas, são aquelas que não podem ser alteradas pelo indivíduo, como raça, sexo, origem geográfica, classe social entre outras. Características adquiridas, produtivas, são aquelas sobre as quais os indivíduos têm a capacidade de escolha de adquiri-las ou não, como investimento em capital humano, educação, treinamentos, despesas com saúde etc. Lima (1980) destaca uma extensão da teoria do capital humano, que ele chama de teoria da socialização. As escolas produzem credenciais ou uma espécie de “sinal” (de persistência, determinação etc.) para os demandantes de mão de obra. Os credencialistas defendem que as escolas selecionam, filtram, os estudantes de acordo com as suas características. Neste sentido, as escolas oferecem credenciais que facilitam a seleção dos trabalhadores pelos empregadores. Segundo Spence (1973), as teorias do filtro ou da sinalização consideram os diplomas escolares como filtros para os empregadores no momento da seleção dos indivíduos. Os certificados representam o possível potencial das capacidades dos candidatos, e não um indicador de produtividade, como defende a teoria do capital humano. De acordo com Becker (1993) a taxa de retorno sobre o capital humano, entretanto, é significativamente influenciada pelo sexo, raça, habilidade, idade, alocação de tempo, 19 origem social e muitas outras características das crianças. Além disso, os investimentos em capital humano são geralmente financiados pelos pais (ou autofinanciados). As desigualdades pessoais de salários e de inserção também podem ser explicadas pela teoria da segmentação ou mercado dual. Essa teoria pressupõe um mercado de trabalho competitivo, não contínuo, em que os agentes são heterogêneos, e a mobilidade não é algo fácil. Segundo Harrison e Sum (1979) a teoria do mercado dual surgiu nos fim dos anos1960 e início dos anos 1970 com a crítica sobre os teóricos econômicos ortodoxos, e se organiza sob diferentes abordagens que se complementam. Uma vertente da explicação é dada por Doeringer e Piore (1970), os quais enfatizam as características pessoais e o comportamento dos trabalhadores, o “lado da oferta”, como determinantes da segmentação do mercado de trabalho; para os autores são as características pessoais dos indivíduos que determinam o tipo de mercado em que eles serão inseridos. Empregos com características distintas são associados a diferentes pessoas. Características de indivíduos, como raça, sexo, background social, anos de escolarização, experiência no emprego, experiência na firma, etc., irão determinar na sua gama de oportunidade de trabalho. Sua alocação em um emprego, por sua vez, irá condicionar a evolução futura de suas características pessoais (LIMA, 1980, p.237). Para Doeringer e Piore (1970), depois que um indivíduo é alocado em um determinado segmento, seu salário depende das regras internas do segmento com relação a promoções e padrão de remuneração. Nessa abordagem, os trabalhadores são segmentados em dois tipos de mercado, o primário e o secundário: o mercado primário, segundo Doeringer e Piore (1970) e Lima (1980), é caracterizado por empregos estáveis, salários relativamente altos, alta produtividade, progresso técnico, há políticas de promoções por competência e por antiguidade dentro das firmas, bem como treinamentos fornecidos pelas mesmas (on-the-job training), e normalmente, esses empregos são fornecidos por grandes empresas. O mercado secundário por sua vez é caracterizado por alta rotatividade de mão de obra, salários baixos, más condições de trabalho, baixa produtividade, estagnação tecnológica e níveis relativamente altos de desemprego. As empresas desse segmento exigem e propiciam baixo ou nenhum treinamento e, em geral, um mínimo de qualificação é necessário. Não há promoções por competência ou antiguidade. As firmas que proporcionam esses empregos são pequenas empresas competitivas que operam em um mercado restrito de demanda instável e não é fácil o acesso ao capital, e os lucros são baixos o que dificulta programas de qualificação de mão de obra e aquisição de tecnologia. 20 Outro enfoque apresentado por Vietorisz e Harrison (1973) e Lima (1980), é que a segmentação também surge pelas diferenças tecnológicas entre as atividades econômicas. Os autores segmentam o mercado de trabalho entre atividades econômicas que investem em tecnologia e qualificação de mão de obra e atividades intensivas em mão de obra de baixa qualificação. Segundo Harrison e Sum (1979) a tecnologia segmenta os postos de trabalho e a organização dos trabalhadores. Além disso, as habilidades específicas, grau de instrução (escolaridade), raça, sexo entre outras características, são requerimentos à admissão e parcialmente avaliadas para a mobilidade dos trabalhadores do secundário na entrada no segmento primário. O problema é que muitos trabalhadores são fadados a permanecer no mercado secundário devido à imobilidade ocupacional. Para os autores, frequentemente atribui-se como maior barreira que exclui os pobres do mercado primário, a sua própria falta de motivação no trabalho, ignorando uma importante vertente da teoria do mercado de trabalho segmentado, em que a motivação, em particular, e o comportamento do trabalhador, em geral, é formado em resposta ao tipo de emprego que está inserido. A terceira vertente dessa teoria é apresentada por Lima (1980) a luz dos estudos de vários autores, em que as desigualdades salariais decorrem de um processo histórico e da existência de diferentes classes sociais que acabam por ocasionar a segmentação do mercado de trabalho, destacando a responsabilidade do sistema educacional na manutenção de uma relativa imobilidade ocupacional e social intergeração. Outra corrente que tenta explicar a inserção ocupacional e as diferenças dos rendimentos dos trabalhadores é a teoria da discriminação. Dadas as características produtivas dos indivíduos e na ausência de salários compensatórios, a persistência dos hiatos salariais é atribuída pela discriminação. Para Becker (1966, 1971) existe discriminação econômica contra membros de um grupo sempre que houverpreferências para contratação e/ou que os salários pagos sejam menores já descontadas as diferenças pelas habilidades individuais. Para Arrow (1971) a discriminação abrange o conceito de que as características individuais dos empregados que não estão relacionadas à produtividade também são valoradas no mercado de trabalho, como características de raça, etnia e gênero. Phelps (1972) destaca que há discriminação estatística, e que essa é oriunda do problema das informações imperfeitas do mercado sobre a produtividade e o potencial do empregado e, neste caso, o indivíduo é valorado tendo como base a média do grupo que pertence. Uma forma que as empresas encontram para acomodar essa discriminação é a segregação. Os empregadores contratam apenas homens, brancos ou outras maiorias, para funções específicas, ainda que membros de sexo oposto ou etnia diferente tenham o potencial 21 de desempenhar a mesma função. Segundo Phelps (1972) e Cain (1984), a teoria da discriminação estatística que se baseia na tese de que as variáveis que mensuram o potencial de produtividade do indivíduo não podem ser conhecidas com total certeza, e como as empresas devem contratar, pagar e promover trabalhadores sem perfeito conhecimento sobre a sua real produtividade, os empregadores dependem das características demográficas observáveis como indicadores da produtividade dos indivíduos. Loureiro (2003) expõe que para qualquer indivíduo ofertante de mão de obra, os contratantes utilizarão as características como raça ou gênero como critério de seleção em sua decisão de contratação e, logo, os trabalhadores são avaliados de acordo com a média das características às quais pertencem, bem como dos atributos individuais. Apesar das teorias já levantadas, a escolha de uma profissão a qual condicionará sua remuneração não é algo trivial. Essa escolha e as expectativas dos indivíduos em relação ao seu futuro profissional é um processo contínuo, composto pelas decisões adotadas ao longo da vida. Suas capacidades, habilidades e opções profissionais são influenciadas pelo convivio familiar (LUCHIARI, 1996; SOBROSA et al., 2015). Segundo Almeida e Melo-Silva (2011) a escolha de uma profissão passa por uma complexa rede de fatores de dimensões individuais e sociais, é influenciada pelo meio familiar, além da formação educacional, características do mercado de trabalho, contexto social, político, econômico e cultural. Portanto, todos esses fatores influenciam a trajetória profissional do indivíduo. O Quadro 1 apresenta uma sintese das principais teorias levantadas. Quadro 1 - Síntese das teorias do Background , Capital humano, Credencialista, Segmentação e Discriminação “continua” Autores Teorias Conclusões Becker e Tomes (1979) Becker (1993) Background veem o indivíduo não de forma isolada, mas como parte de uma família cujos membros abrangem várias gerações. A renda dos filhos pode ser aumentada quando recebem mais capital humano e não humano de seus pais. Grawe e Mulligan (2002) Background em revisão das teorias econômicas de correlações intergeracionais, destacam a correlação positiva da educação infantil e renda dos pais, entre os mais ricos. Luchiari (1996); Sobrosa et al. (2015) Background a escolha e as expectativas dos indivíduos em relação ao seu futuro profissional é um processo contínuo, composto pelas decisões adotadas ao longo da vida. Suas capacidades, habilidades e opções profissionais são influenciadas pelo convívio familiar. Almeida e Melo- Silva (2011) Background a escolha de uma profissão passa por uma complexa rede de fatores de dimensões individuais e sociais, é influenciada pelo meio familiar, além da formação educacional, características do mercado de trabalho, contexto social, político, econômico e cultural. 22 “continuação” Mincer (1958) Becker (1962) Lima (1980) Capital humano a escolaridade e experiência são determinantes dos rendimentos do trabalhador e da inserção ocupacional. Schultz (1961) Capital humano o capital humano não se limita apenas à escolaridade e experiência, mas também se relaciona com a saúde, as vestimentas, o vigor físico, a motivação, as habilidades manuais e artísticas, a migração entre outros. Spence (1973) Credencialista as teorias do filtro ou da sinalização consideram os diplomas escolares como filtros para os empregadores no momento da seleção dos indivíduos. Doeringer e Piore (1970) Segmentação enfatizam as características pessoais e o comportamento dos trabalhadores, o “lado da oferta”, como determinantes da segmentação do mercado de trabalho; para os autores são as características pessoais dos indivíduos que determinam o tipo de mercado em que eles serão inseridos. Vietorisz e Harrison (1973) Harrison e Sum (1979) Segmentação tecnologia segmenta os postos de trabalho e a organização dos trabalhadores. Além disso, as habilidades específicas, grau de instrução (escolaridade), raça, sexo entre outras características, são requerimentos à admissão e parcialmente avaliadas para a mobilidade dos trabalhadores do secundário na entrada no segmento primário. Becker (1966) Arrow (1971) Phelps (1972) Discriminação existe discriminação econômica contra membros de um grupo sempre que houver preferências para contratação e/ou que os salários pagos sejam menores já descontadas as diferenças pelas habilidades individuais. Loureiro(2003) Discriminação expõe que para qualquer indivíduo ofertante de mão de obra, os contratantes utilizarão as características como raça ou gênero como critério de seleção em sua decisão de contratação, e logo os trabalhadores são avaliados de acordo com a média das características dos grupos aos quais pertencem, bem como os atributos individuais. Fonte: Elaborado pelo autor Considerando as teorias expostas, cientistas econômicos nacionais e internacionais, estão constantemente elaborando ensaios para tentar explicar ou mensurar tais ideias. 2.2 Evidências empíricas nacionais e internacionais Trabalhos empíricos reforçam e comprovam as teorias supracitadas, no que tange à inserção ocupacional e remuneração dos trabalhadores, e a mobilidade ou transmissão intergeracional das ocupações e da educação dos indivíduos no mercado de trabalho. No Brasil é ampla a literatura que utiliza metodologias científicas para identificar as características dos indivíduos que determinam a alocação ocupacional e os salários, como constam em Cacciamali (1978); Soares (2000); Zuchi e Hoffmann (2004); Cacciamali e Hirata (2005); Salvato et al. (2008); Kon (2004, 2011); Souza (2011); Gonçalves e Monte (2008, 2011); Casari (2012); Souza e Gomes (2015); e Gomes (2016). No que se refere às desigualdades salariais, Soares (2000) estudou os principais determinantes dos diferenciais de salários por gênero e cor no Brasil para os anos de 1987 a 1998, e concluiu que mulheres brancas são mais qualificadas que os homens brancos e estão 23 inseridas nos mesmos setores e regiões, entretanto, recebem menos que eles, uma diferença média de 35%. Cacciamali e Hirata (2005) seguiram o mesmo propósito, com dados para São Paulo e Bahia, para 2002. Utilizando o método probit expõem que há a discriminação de gênero e cor, pois homens estão em melhor situação que as mulheres, homens não brancos estão em uma situação melhor do que a mulher branca. A discriminação contra a mulher é maior nos cargos com salários elevados e a situação se agrava para as mulheres negras. Em consonância, Salvato et al. (2008), com dados da PNAD, mediram a discriminação nos estados da Bahia e Minas Gerais no ano de 2005 e confirmaram que em maiores faixas de renda há maior discriminação, sendo mais significativa a discriminação de gênero, com maior pesopara homens brancos contra mulheres negras. Na década de 1970, Cacciamali (1978) em seu estudo sobre os mercados duais, destaca que certas características da mão de obra que preenchem os postos de trabalho, como status socioeconômico, idade, escolaridade, sexo e experiência, e acabam por determinar em qual tipo de emprego o indivíduo será alocado. Homens de maior escolaridade, experiência profissional e alto status socioeconômico obterão os melhores empregos, e os indivíduos homens e mulheres menos favorecidos da sociedade atuarão em empregos secundários. Zuchi e Hoffmann (2004) vão ao encontro da teoria do mercado dual e apontam que os setores econômicos produtivos também desempenham influência na determinação dos salários. Kon (2004, 2011) destaca que a relevância das características do trabalhador como escolaridade, experiência, idade, gênero, raça, entre outras determinam a alocação dos indivíduos nos postos de trabalho no mercado primário ou secundário. Em linha com as teorias do capital humano e mercado segmentado, Gonçalves e Monte (2011) efetuaram uma análise comparativa entre o número de trabalhadores admitidos via primeiro emprego e os readmitidos no mercado de trabalho formal na região do Nordeste do Brasil, utilizando dados da RAIS/2005. Uma das conclusões foi o baixo percentual de inserção dos jovens, entre 16 a 24 anos no mercado de trabalho formal, o qual pode ser atribuído à pouca experiência, que reflete tanto na probabilidade de inserção quanto na sua remuneração. Os achados de Monte, Araújo e Lima (2007) destacam que os trabalhadores que já possuem experiência no mercado de trabalho brasileiro, apesar de terem um nível de qualificação escolar inferior na comparação com os indivíduos que buscam o primeiro emprego, tem as maiores chances de inserção. Com dados da Pesquisa Mensal do Emprego de 2000 e 2001, aplicando o modelo logit bivariado, constataram que no mercado de trabalho formal a probabilidade de inserção ocupacional é maior para homens em comparação com 24 as mulheres, os níveis de escolaridade de segundo e terceiro grau apresentaram maior probabilidade de ingresso ocupacional. Também em um estudo feito por Casari (2012) para os anos de 2004 a 2009, verificou-se que as características do mercado de trabalho interno e a diferenciação entre o setor primário e o secundário, de acordo com a teoria da segmentação, são observadas no mercado de trabalho brasileiro. Os setores de atividade, as ocupações, sindicatos e as condições de trabalho impactam sobre os rendimentos e alocação dos trabalhadores. Gomes (2016) em seu estudo para as regiões Sul e Nordeste do Brasil, com dados da RAIS/2013 e aplicação o modelo logit multinomial para mensurar as probabilidades de inserção ocupacional por setores econômicos e as equações mincerianas de determinação de salários, mostrou que variáveis como escolaridade e experiência apresentam retornos positivos nos salários além de uma maior probabilidade de inserção no mercado de trabalho. As características individuais como as dos postos de trabalho e região foram relevantes para a inserção e remuneração e, por fim, constatou uma grande discriminação, tanto na inserção ocupacional quanto nos rendimentos do trabalho contra mulheres e negros. Também com o objetivo de discutir a desigualdade de rendimentos entre as ocupações, com dados das PNADs de 2002 e 2012, e identificar a influência da estrutura nos rendimentos e emprego no mercado de trabalho brasileiro, Jacobowiski e Cunha (2017) constaram a importância das ocupações na explicação da desigualdade na distribuição dos rendimentos. Na literatura internacional, Oaxaca (1973); Blinder (1973), Newell e Reilly (1996), Maradona e Calderón (1998), Booth et. al (2002), Heinze e Wolf (2006), Card, Cardoso e Kline (2013), Cobb-Clark e Tan (2010), Parente et al. (2011) e Murphy e Topel (2016), comprovam as diferenças salariais e os ajustes alocativos associados ao capital humano, às ocupações e ao gênero no mercado de trabalho internacional. Diante das possíveis explicações para as diferenças salariais entre grupos distintos, Oaxaca (1973) e Blinder (1973) desenvolveram um método de decomposição de diferenças salariais utilizando as equações de determinação de salários. Essa metodologia é exposta nos trabalhos realizados pelos autores sobre as diferenças salariais entre homens e mulheres na região urbana dos Estados Unidos em 1967, e ambos concluíram que, mantidas as características produtivas, homens e brancos ganhavam mais do que as mulheres e os não brancos. A discriminação de rendimentos também é percebida no Reino Unido, no estudo das diferenças salariais entre os economistas acadêmicos no Reino Unido, em 1999. Com a aplicação de questionários, Booth et al. (2002) concluem que as mulheres são menos 25 propensas a serem promovidas, recebem salários inferiores, e percebem uma discriminação de gênero. Com a utilização das equações de determinação de salário e a metodologia desenvolvida por Oaxaca, Newell e Reilly (1996) com os dados da Pesquisa de Monitoramento Longitudinal Russa (RLMS) para a Rússia, os autores mostram que a diferença salarial de gênero para os trabalhadores foi de 30% (contra as mulheres), sendo que a maior parte foi atribuída a diferenças de gênero, ao invés de diferenças das características produtivas. Maradona e Calderón (1998) estimaram equações salariais para homens e mulheres em Mendoza para o ano de 1997, utilizando os dados da Encuesta Permanente de Hogares. Os resultados apontaram que as diferenças salariais marginais existentes, não são explicadas pelos diferentes níveis de escolaridade e experiência (capital humano) ou viés de seleção. Nesse caso, os hiatos salariais poderiam ser associados à segmentação do mercado de trabalho. Heinze e Wolf (2006), também nas evidências das diferenças de rendimentos entre os gêneros dentro das firmas alemãs para o período de 1975 a 2002, argumentam que a maioria dos estudos analisa os diferenciais de salários, concentram-se principalmente sobre as diferenças nas características dos homens e mulheres e negligenciam o estabelecimento como o lugar onde a discriminação surge e é mantida. As empresas desempenham um papel importante na criação e manutenção da desigualdade de gênero, pela forma como elas definem a contratação e recompensas. Cobb-Clark e Tan (2010) vão ao encontro da teoria da segmentação ao examinarem se as características não cognitivas das mulheres e homens influenciavam suas habilidades ocupacionais na Austrália. Para isso, utilizaram a decomposição de Oaxaca-Blinder e confirmaram um efeito significativo das habilidades não cognitivas sobre a probabilidade de emprego. Seus resultados também apontam que o mercado de trabalho da Austrália de 2001 a 2006 é segmentado, além de constatar que mulheres auferem salários inferiores aos dos homens mesmo estando empregadas na mesma ocupação. Card, Cardoso e Kline (2013) e Parente et al. (2011), em estudos para Portugal, constataram a existência de uma associação entre níveis de escolaridade baixos, com profissões pouco ou nada qualificadas e rendimentos baixos. Pode-se considerar que, de acordo com a teoria da segmentação, indivíduos com baixa escolaridade provavelmente serão alocados em setores ou ocupações do tipo secundário. Murphy e Topel (2016) apresentam a falta de capital humano qualificado para explicar o crescente aumento na desigualdade de rendimentos nos EUA após 1970. Segundo 26 os autores o aumento dos salários relativos dos trabalhadores mais qualificados reflete o fato de que a demanda por mão de obra qualificada ultrapassou o crescimento da oferta de mão de obra qualificada. Ainda que os estudos supracitados apontem evidências importantes, a escolha da profissão do indivíduo é também influenciada pelo background familiar. Luchiari (1996) identificou ainfluência na profissão dos pais e dos avós no processo de escolha profissional dos filhos. Utilizou como instrumento o levantamento de dados primários e aplicação de questionário em unidades agrícolas e constatou que a profissão dos pais é igual a escolha dos filhos de 1 para 4 jovens. Em relação à autonomia de escolhas (considerou “autonomia” como a escolha diferente aos desejos dos pais) o resultado foi de 1 para 6 jovens investigados. O percentual de jovens que não segue as ocupações dos pais pode sinalizar maior independência ao escolherem sua carreira profissional, porém é importante salientar que, de acordo com Luchiari (1986), se os pais realizaram seus projetos de vida em relação a sua profissão, seus filhos são mais livres para realizar os seus próprios sonhos. No entanto, se os pais não conseguiram por algum motivo realizar a profissão desejada, frequentemente eles projetam esse sonho nos filhos para que eles realizem em seu lugar. Portanto, ainda de acordo com os autores a profissão do pai é fonte de inspiração profissional dos filhos, que por sua vez é determinado pelo nível social alcançado ou que desejariam ter alcançado. Os progenitores desejam que os filhos alcancem um nível superior ao seu, assim eles tendem a fazer todos os esforços para que seus herdeiros alcancem tal nível. Segundo Pero e Szerman (2008), uma fonte de manutenção de desigualdade é a transmissão intergeracional de renda, uma vez que filhos de pais com maiores ou menores níveis de renda tendem a possuir níveis equivalentes. Dessa forma, essa desigualdade poderia ser transmitida pelas gerações além de promover desigualdade relativa de oportunidades. Na mesma direção, Carvalho e Taveira (2009) argumentam que a família tem sido considerada como o fator de maior influência no processo de escolha das carreiras dos filhos. Gomes et. al (2020) analisaram a probabilidade condicional clássica dos jovens que residem no meio rural atuarem nas mesmas ocupações de seus pais no mercado de trabalho brasileiro, a partir dos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2017. Os resultados mostram que a profissão do jovem é marcada pela trajetória profissional familiar. Os filhos homens herdam as ocupações do pai, enquanto as filhas herdam as ocupações das mães. Filhos, cujos pais e mães exerçam a mesma ocupação, 27 independente do gênero, tem maior probabilidade de executar a mesma ocupação dos pais, mas essa tendência é menor em famílias monoparentais. Os jovens também sofrem influência dos pais em relação ao capital humano, que determinará sua ocupação e remuneração do trabalho. Quanto mais elevada for a escolaridade dos jovens, maiores as chances de seguirem profissões diferentes das exercidas pelos pais. Esses resultados confirmam a importância da educação no meio rural, e das políticas de incentivo aos estudos dos jovens, o que contribui para uma melhor qualidade de vida das famílias do meio rural. Gomes e Cunha (2019) mensuraram as probabilidades de um jovem seguir o legado ocupacional dos pais e se esses jovens são remunerados de forma diferente em relação aos jovens que optaram por ocupações diferentes a de seus pais. Estimou-se a equação de probabilidade do legado ocupacional e as equações salariais com correção do viés de seleção amostral e efetuou-se a decomposição salarial, para o Brasil, a partir dos microdados da PNADC de 2017. Os resultados apontaram que a família tem forte influência no processo de escolha das carreiras dos filhos. A probabilidade média de um jovem seguir o legado ocupacional dos pais foi de 39,37%, e esse percentual é diferente segundo grupos diferentes dos indivíduos, como residir na área urbano ou rural, ser homem ou mulher. Araújo et al. (2019), analisaram como a ocupação dos pais influencia as preferências dos filhos no mercado de trabalho brasileiro, utilizando um modelo de escolha discreta que incorpora características dos indivíduos e das alternativas do conjunto escolha, tendo como base de dados a PNAD/2014. Mostraram que há diferenças consideráveis entre os efeitos da mãe e do pai: em diversos casos, filhas têm relativamente alta probabilidade de escolher a mesma ocupação mãe, e os filhos, a dos pais. Segundo os autores, quando os menos abastados não têm oportunidade de desenvolver suas habilidades, não conseguem uma boa colocação no mercado de trabalho e isso se reflete na sua remuneração, reproduzindo os mecanismos de desigualdade. A ocupaçoes exercidas pelos mais pobres, frequentemente, são ocupações de caráter secundário, de acordo com a teoria do mercado dual. Uma vez que no mercado primário ou secundário, os herdeiros ocupacionais estariam fadados a pertencer ao mesmo mercado que os seus antecessores. Como cita Lima: Os hábitos engendrados no trabalho são reproduzidos em casa: o sistema é tal que, uma vez que o trabalhador esteja no secundário, tanto ele quanto seus herdeiros têm uma probabilidade altíssima de estarem sempre “amarrados” àquele segmento. A filtragem discriminatória tende a perpetuar, através de gerações, o comportamento típico do mercado de trabalho secundário (LIMA, 1980, p.237). 28 Portanto, jovens de classes socioeconômicas desfavoráveis possivelmente têm menores expectativas de sucesso profissional, o que acaba criando um ciclo vicioso de pobreza. Esses jovens tornam-se cada vez mais desmotivados na escolha da ocupação desejada e aceitam a mais próxima de sua realidade, que frequentemente são ocupações de caráter secundário. Guimarães, Arraes e Costa (2020) mensuraram o efeito indireto da transmissão da renda dos pais sobre a renda dos filhos, levando-se em consideração o nível de escolaridade (mediação da educação). Para isso, utiliza o efeito mediação, que captou a magnitude do impacto por meio de uma análise contrafactual. Utilizando uma amostra de filhos com idade entre 16 e 35 anos que residiam com os pais da PNAD de 2014, os autores encontraram indicativos de que o Brasil tem baixo nível de mobilidade de renda, ou seja, filhos de pais ricos tendem a receber salários mais altos quando comparados a filhos de pais que tinham menores rendas, e essa transmissão de status socioeconômico é mais acentuada nos níveis mais elevados de renda. Portanto, o nível de escolaridade dos filhos acompanha o crescimento de sua renda. Pais mais ricos podem gerar incentivos para que os filhos alcancem níveis de educação mais elevados, o que refletirá em sua renda. Dessa forma, o background familiar afeta diretamente a educação dos filhos, proporcionando-lhes níveis mais elevados de renda. Bousquat e Cohn (2003) no estudo sobre o mapa da juventude de São Paulo no ano de 2003, apresentaram que 31,9% dos jovens das regiões mais pobres da cidade estavam inseridos no mercado de trabalho, e para os jovens das regiões mais ricas este percentual era de 43,6%. Também constataram que indivíduos pobres, em média, apresentam menor escolarização do que indivíduos ricos e vão ocupar setores e postos de trabalho que exigem pouco capital humano e apresentam baixos rendimentos. Para Carvalho (2004), a baixa qualificação dos trabalhadores os condenará a uma miséria permanente e à impossibilidade de promover o desenvolvimento nacional. “Ser jovem, pobre, negro, do meio rural ou da periferia de uma grande cidade constitui uma experiência de vida marcada pela múltipla dificuldade para se alcançar um espaço digno no mundo do trabalho” (CARVALHO, 2004, p.12). Portanto, há uma grande probabilidade desse tipo de jovem ser empregado pelo mercado de trabalho secundário e ter proventos menores. Paim (2007) cita fatores que podem impedir ou dificultar a inserção dos jovens no mercado de trabalho, como a experiência, a qualificação requisitada, mas também o local de moradia, e questões relativas à aparência dos mesmos, tais como a cor da pele, tipo de cabelo, biotipo corporal.Sobrosa et al. (2015) destacam a opinião dos pais sobre o mundo do 29 trabalho, que é levada em consideração pelos jovens nos seus planos futuros, e a busca do equilíbrio entre o que se deseja ser e o que a realidade possibilita, uma vez que, as escolhas profissionais envolvem, entre outros fatores, as características pessoais, fatores socioeconômicos e a própria realidade do mercado de trabalho. O background econômico familiar está também destacado por Moura e Possato (2012) e Oliveira, Pinto e Souza (2003). Jovens provenientes de classes socioeconômicas menos privilegiadas tendem a apresentar dificuldades para a tomada de decisões sobre a ocupação desejada, pois as restrições econômicas podem limitar suas possibilidades, aceitando o que estiver mais próximo de sua realidade. Esse fato é relevante em um contexto intergeracional, onde as habilidades e os recursos das famílias de alta renda geram maior investimento de capital humano em seus filhos. Segundo Heckman (2008, p.15), “crianças em lares ricos são banhadas em recursos cognitivos e financeiros” que reduzem os custos de aquisição de capital humano. Os recursos incluem melhor suporte dos pais, que são mais qualificados, além de recursos financeiros, escolas superiores e interações com colegas com vantagens comparáveis. Todos esses fatores facilitam o investimento em capital humano. A escolha dos jovens, se deve continuar os estudos ou ir para o mercado de trabalho é influenciada pelo núcleo familiar, portanto, os pais desempenham um papel importante no legado ocupacional passado para os seus herdeiros. Becker (2008) destaca a importância da família na acumulação do capital humano, conhecimentos, habilidades, saúde, valores e hábitos de seus filhos. Os pais afetam os níveis de escolaridade, a estabilidade conjugal, as propensões a fumar e consumir bebidas alcoólicas, as responsabilidades com horário e muitas outras dimensões da vida de seus herdeiros. Pochmann (2003) destaca que as dificuldades para conseguir trabalho e permanecer no mesmo se agravam para jovens de classes menos favorecidas, uma vez que são incitados a agarrar a primeira oportunidade de ocupação para obter uma renda que possa contribuir para o sustento da família e a própria sobrevivência, o que muitas vezes acaba por comprometer a formação escolar e uma maior qualificação profissional, fadando esses jovens a empregos secundários. O problema é que muitos trabalhadores são destinados a permanecer no mercado secundário devido à imobilidade ocupacional. Ferreira e Veloso (2006) também confirmam a evidência de forte persistência de salários intergeracional. A probabilidade de um filho de um pai no quintil inferior da distribuição salarial mudar para o quintil superior é de apenas 7%, enquanto a probabilidade análoga para um filho de um pai no quintil superior é de 43%. Os autores também observam 30 que a posição ocupacional do filho e educação estão altamente correlacionadas com a educação de seu pai. Antigo (2010) analisou a mobilidade de rendimentos no Brasil, para os períodos anterior e posterior à queda da desigualdade de renda no país. Para isso realizou o exercício empírico baseado em um pseudo-painel dinâmico. Utilizou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), entre 1993 e 2007, e da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 1992 e 2009. Os resultados mostram que a queda da desigualdade foi acompanhada por uma maior mobilidade ascendente de rendimentos na base da distribuição. As variáveis de educação e de salário mínimo têm um papel chave para explicar a mobilidade dos mais pobres. Além disso, o autor destaca que as influências intergeracionais dos rendimentos dos filhos podem ser movidas por outros aspectos do background familiar e da comunidade. No que tange ao background familiar, o talento das crianças pode ser tanto inato quanto herdado de seu pai. Internacionalmente, alguns estudos levantam a preocupação com a mobilidade intergeracional da renda e da ocupação. Laband e Lentz (1983), Harper e Haq (1997), Sjogren (2000), Constant e Zimmermann (2003), Ferreira e Veloso (2006), Tsukahara (2007), Shilpi e Emran (2010), Becker et. al (2015), Thijssen e Wolbers (2016), Bello e Morchio (2018) encontraram influência dos pais na renda, escolaridade e ocupações dos seus descendentes. Laband e Lentz (1983) apresentam um modelo de maximização dos valores presentes dos rendimentos, com dados provenientes do Student-Parent Socialization Study, que contem informações sobre as ocupações dos avôs, pais e filhos dos Estados Unidos em 1965. Os autores discutem o legado ocupacional incentivado pelas transferências diretas de capital humano específico para o trabalho. Filhos que seguem as ocupações dos pais têm um diferencial positivo de salários em relação àqueles que não o fazem. Os trabalhadores independentes têm maior probabilidade de seguir a ocupação do pai em comparação ao trabalho não agricola. O legado é maior para os agricultores que têm aproximadamente nove vezes mais chances de seguir os passos de seus pais do que outros trabalhadores independentes. Uma característica dessas ocupações é a proximidade da casa com o local de trabalho e, portanto, a acessibilidade da criança à ocupação de seu pai. Harper e Haq (1997) examinam o papel do contexto familiar, desenvolvimento da primeira infância, investimento em capital humano e o mercado de trabalho na determinação do nível de realização profissional alcançada por homens jovens. Para isso aplica um modelo em painel de efeitos fixos com dados longitudinais extraídos do National Child Development 31 Study (NCDS), para a Grã-Bretanha. Os autores encontraram evidências de que o contexto familiar e o desenvolvimento da primeira infância têm um efeito forte sobre desempenho ocupacional dos indivíduos. Sjogren (2000) utiliza o modelo logit multinomial a partir de dados do Swedish Level of Living Survey de 1991, para verificar se o histórico familiar influencia as escolhas ocupacionais dos indivíduos determinando assim sua perspectiva de ganhos na Suécia. Sjogren apresenta duas explicações para a correlação dos ganhos intergeracionais. Primeiro, o acesso ao investimento ao capital humano, e segundo a herança das habilidades influenciadas pelos pais. De acordo com a autora, a capacidade de ganho é parcialmente transmitida geneticamente e parcialmente influenciada pela educação, tanto de propósito quanto como forma de externalidade do capital humano e das habilidades dos pais. Constant e Zimmermann (2003) comparam a escolha ocupacional dos alemães nativos e imigrantes. Eles estimam o modelo logit multinomial utilizando os dados do Painel Socioeconômico Alemão (GSOEP) de 2001. Os autores encontram evidências de que indivíduos herdam seu status social e sua posição na distribuição ocupacional. O contexto familiar afeta as escolhas profissionais diretamente através de doações genéticas, conexões sociais e riqueza, e indiretamente através da educação. Indivíduos mais instruídos têm maior probabilidade de avançar para ocupações que oferecem maiores ganhos e status social. Também destacam que os alemães são mais propensos a escolher ocupações semelhantes à ocupação de seus pais se eles estão na categoria profissional white collar ou professional category. Em contraste, a escolha ocupacional dos imigrantes é mais influenciada pela educação de suas mães e não pela ocupação de seus pais. Tsukahara (2007) utiliza o logit multinomial e dados individuais da Keio Household Panel Survey (KHPS) do ano de 2004 para investigar o efeito da ocupação do pai e de sua escolaridade na escolha ocupacional das crianças no Japão. Os resultados estimados sugerem que as crianças tendem a escolher a mesma ocupação de seus pais. Essa predisposição é mais evidente para os filhos.
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