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FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DO DIREITO

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FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DO DIREITO
UNIDADE 01 – DIREITO E FILOSOFIA
1. FILOSOFIA: UM ESTUDO INICIAL
1.2 - O QUE É E PARA QUE FILOSOFIA?
Os últimos anos do século XX testemunharam grandes mudanças em toda a face da Terra. O mundo torna-se unificado – em virtude das novas condições técnicas, bases sólidas para uma ação humana mundializada. Esta, entretanto, impõe-se à maior parte da humanidade como uma globalização perversa
Ambas, juntas(tirania do dinheiro e da informação), fornecem as bases do sistema ideológico que legitima as ações mais características da época e, ao mesmo tempo, buscam conformar segundo um novo ethos as relações sociais e interpessoais, influenciando o caráter das pessoas
A competitividade, sugerida pela produção e pelo consumo, é a fonte de novos totalitarismos, mais facilmente aceitos graças à confusão dos espíritos que se instalam
Dogma é uma “verdade a priori” aceita sem questionamentos. O dogmatismo ao longo da história resultou em intolerância e opressão. Em sentido contrário, o pensar crítico é uma postura que visa rever os dogmas e os contextos teóricos, fáticos, ideológicos e culturais que os sustentam e os legitimam
Esse distanciamento das “melodias que sabemos de cor”, das verdades cotidianas, a fim de assumirmos uma atitude questionadora de si mesmo e desejar conhecer por que e para que são nossas crenças e sentimentos é que podemos chamar de atitude filosófica: ato de reflexão questionadora própria do filósofo, daquele que, tendo a consciência de que o saber é sempre provisório e também infinito, renova e reinventa sempre as perguntas que formula. É assumir o risco de viver sem verdades.
• Atitude reflexiva: é o ato de pensar as crenças, verdades e sentimentos de nosso cotidiano de forma profunda e com desejo de conhecer a essência das coisas.
• Atitude filosófica: é a reflexão própria dos que não se cansam de admirar as coisas, e são capazes de se distanciar do cotidiano e de si mesmos.
• Por que e para que a reflexão filosófica? Para um agir pessoal e social intencional e consciente, sabendo o por que, para que e como são as coisas, crenças e sentimentos em sua essência.
• A finalidade da reflexão filosófica é permitir um pensar e crer de forma crítica e livre de preconceitos.
• O filósofo é inimigo de fanatismos e dogmatismos
1.3 - FILOSOFIA: UM SABER CIENTÍFICO E METÓDICO
Filosofia trabalha com enunciados precisos e rigorosos, busca encadeamentos lógicos entre os enunciados, opera com conceitos ou ideias obtidas por procedimentos de demonstração e prova, exige a fundamentação racional do que é enunciado e pensado.
“Filosofia” é uma palavra grega que resulta da união de dois termos: filos (o que ama, o que gosta) e sofia (saber, sabedoria), portanto, Filosofia é o “amor pela sabedoria”, e o filósofo é o que tem paixão pela verdade que se quer conhecer.
• Filosofia é um saber racional, rigoroso e sistemático que se diferencia de religião, ou seja, de convicção pela fé
• Ética: do grego “ethos” – bons costumes –, diz respeito a escolhas inevitáveis e inadiáveis quando nos deparamos com condutas e hierarquia de valores que definem os caminhos a serem seguidos e os que devem ser evitados, levando em conta os fins a que se destina a justificativa do próprio agir. A Filosofia Ética tem como objeto de problematização a atitude humana em relação ao coletivo e suas consequências históricas, sociais e políticas. Em outras palavras, é um campo filosófico preocupado com o valor do bem e do agir humano que o tem como finalidade última.
• Lógica: tem como preocupação as estruturas do pensamento e seus encadeamentos racionais que permitem conhecer o ser humano e seu mundo circundante. Através da lógica se discute se as inferências – deduções, as conclusões obtidas pela relação entre uma coisa e outra – são verdadeiras ou falsas.
• Estética: do termo grego aisthetiké, significa “aquele que percebe”. É o campo da filosofia que se dedica ao estudo do belo nas manifestações artísticas e naturais; ao sentimento que desperta no indivíduo quando da sua contemplação.
• Epistemologia: termo de origem grega, “episteme”, relacionado com a natureza e limites do conhecimento humano. Normalmente definida como “Teoria do Conhecimento” ou “gnosiologia”, que no sentido mais restrito refere-se às condições – metodológicas e técnicas – sob as quais se produz o conhecimento. Como campo filosófico relaciona-se às possibilidades de alcançar a verdade no conhecimento. 
• Metafísica: do grego “metà” – além de – e “physis” – natureza, física – é um campo filosófico que discute questões para além do agir e conhecer, envolvendo discussão acerca da natureza do que se conhece, sobre o que permite indagar acerca da coisa em si. Metafísica indica o permanente esforço para atingir uma causa válida e racional para o sentido da existencialidade humana, que tem como ramo principal a ontologia – que investiga sobre as categorias ou essências do ser
1.4 - A FILOSOFIA NA TRADIÇÃO OCIDENTAL
Surgiu na antiga Grécia há mais de dois mil e quinhentos anos. A criação da palavra filosofia se atribui a Pitágoras.
Os chineses desenvolveram um pensamento muito profundo sobre a existência de coisas, seres e ações contrárias ou opostas, que formam a realidade. Deram às oposições o nome de dois princípios: Yin e Yang. Yin é o princípio feminino passivo na Natureza, representado pela escuridão, o frio e a umidade; Yang é o princípio masculino ativo na Natureza, representado pela luz, o calor e o seco. Os dois princípios se combinam e formam todas as coisas, que, por isso, são feitas de contrários ou de oposições. O mundo, portanto, é feito da atividade masculina e da passividade feminina
A extraordinária genialidade grega para a Filosofia é o chamado “Milagre Grego”.
Na verdade, entre fins do século VII a.C. e VI a.C., uma soma de fatores contribuiu para a criação, consolidação e expansão da Filosofia grega. Segundo historiadores do helenismo, a criação de um modo específico de pensar o mundo dos homens e da natureza se dá através de:
• As viagens marítimas – que contribuíram para a desmistificação da visão de mundo dominante, uma vez que os mitos já não podiam explicar as origens e diferenças descobertas. 
• A invenção do calendário – uma nova abstração sobre o tempo na qual os deuses não encontram lugar.
• Invenção da moeda – que exige nova forma de raciocinar e relacionar as coisas e os bens.
• O surgimento da vida urbana – contribuindo para a formação de uma categoria de sujeitos enriquecidos que coletivamente passaram a pensar e discutir coletivamente, criando uma espécie de espaço público de decisão.
• Invenção do alfabeto – fazendo com que se desenvolva a sofisticação da literatura, arte e capacidade de abstração.
• Criação da política – resulta da busca de equilíbrio entre a convivência dos homens e o poder. Entretanto, se em sua origem, na antiguidade grega, significou uma forma possível de humanização, momentos da trajetória histórica conferiram-lhe um sentido inverso. O nascimento da reflexão política resultou das condições específicas do modo de vida grego ateniense: a existência da pólis – Cidade-Estado – e o logos – racionalização do mundo circundante; ambas constituindo distintas dimensões da liberdade e pluralidade humana.
Os primeiros nomes históricos da Ciência e da Filosofia são: 
	Tales de Mileto (623 a.C. ou 624 a.C.-546 a.C. ou 548 a.C.), 
	Heráclito de Éfeso (535-475 a.C.), 
	Anaximandro de Mileto (610-546 a.C.), 
	Xenófanes de Colofon (570-475 a.C.) e 
	Parmênides de Eleia 
1.4.1 - POR QUE ATENAS E EM ATENAS?
De todas as cidades gregas, em nenhuma outra havia tão estreito laço entre o cidadão e a pólis – cidade autônoma/cidade-Estado - como o que existia em Atenas, uma cidade que se afirmou como superior militar, política, cultural e economicamente em relação às demais, culminando com uma dolorosa experiência: A Guerra do Peloponeso
Em nenhum outro momento da história o povo ateniense havia se dado conta de que sua maior força estava na cultura.
Neste momento, o processo históricorompe com a estabilidade da ordem social até então instituída. Assiste-se um avanço cultural decisivo que criou um fértil terreno para o pensamento político e filosófico. É superado o antigo paradigma cosmológico no qual ao homem cabia apenas aceitar o destino de nascer, viver e morrer sob a ordem do inevitável e imutável, desaparecendo o sentido de vivência como mágico círculo natural de ordem fora do qual apenas existia o caos 
Os sofistas lideram estes novos debates, auxiliando seus discípulos a obter mais sucesso na vida pública do que na especulação teórica. Sophistes era uma expressão genericamente utilizada para designar pessoas ao mesmo tempo hábeis e sábias, e, por volta de 450 a.C., passou a ser usada para identificar “professores viajantes” que ensinavam por meio de conferências públicas a arte da eloquência e da sabedoria “prática”
Consolida-se uma forma de pensar onde a filosofia passa a ser a fonte primordial de conhecimento e poder. Na medida em que a capacidade de contemplação – adquirida pelo ato de filosofar – confere legitimidade racional ao discurso e à prática política, é rompida a submissão injustificável ao nomos: agora é necessário compreendê-lo racionalmente. Neste cenário é que surge uma figura que será imortalizada como a encarnação de todas as virtudes ideais de um cidadão: Sócrates 
Filosofia Antiga (VI a.C. a V)
	Pré-socráticos ou cosmológico – período e pensadores que antecederam a Sócrates e interrogavam acerca das questões da natureza, physis, e o princípio organizador, arché, do mundo e da própria natureza; o socrático ou antropológico – entre os séculos V e fins do século IV a.C., representado pelas imortais figuras de Sócrates, Platão e Aristóteles, quando a preocupação da Filosofia desloca-se para o eixo humano, a vida política e moral; bem como a capacidade humana de conhecer a essência e razão das coisas; o helenístico ou greco-romano – de fins do século III a.C. ao II, quando se dá o início da consolidação do pensamento cristão, destacadamente com o pensamento de Santo Agostinho. Nesta etapa, as grandes questões passam a orbitar em torno da busca da virtude individual e da fundamentação da ética cristã. Predominam as doutrinas dos estoicos, epicuristas e os céticos
Filosofia Medieval (V ao XIV-V) 
	Etapa histórica em que a Filosofia se torna “serva da Teologia”, uma vez que ocorre uma indissociável relação entre Filosofia e Teologia, mais especificamente, a Teologia Cristã, que nasce e se consolida associada à cultura greco-romana, porém, com forte influência do pensamento aristotélico, sobretudo em Tomás de Aquino, após uma breve aproximação inicial com o platonismo, particularmente em Santo Agostinho. A Filosofia medieval foi edificada por pensadores europeus, árabes e judeus. Naquele momento, a Igreja dominava política e ideologicamente a Europa e se expandia, ao mesmo tempo em que fundava universidades, edificava catedrais e coroava reis. Em síntese, a Igreja Católica Romana era o poder em múltiplas dimensões, tendo como uma das questões filosóficas centrais a prova da existência de Deus e da alma imortal.
	Patrística – o termo “patrística” vem do latim pater (pai) e se refere aos “pais” da teologia da Igreja, tem seu início durante o período de decadência do Império Romano, durante o século III. As principais questões filosóficas são relacionadas com fé e razão; a natureza de Deus, a alma e a vida moral Bispo de Hipona, Santo Agostinho (354-430), que desde Platão crê que a verdade é produto da iluminação divina dada por Deus a todo espírito humano.
	Escolástica – período posterior ao século XIII, quando Tomás de Aquino (1225-1274), a partir das obras de Aristóteles, garante a sobrevivência do cristianismo frente ao avanço do racionalismo que irá marcar os séculos posteriores. Desde a metafísica aristotélica são elaboradas as bases racionais e filosóficas para a separação entre fé e razão, harmonizando as distintas e maiores esferas da verdade que podem ser atingidas.
Filosofia Moderna (XV/XVI A XIX) 
	O pensamento filosófico moderno possui uma marca: a completa inovação do mundo e do homem. Como resultado de uma soma de fatores, a Modernidade inaugura um inédito estágio civilizatório de múltiplas e complexas faces. Dentre os fatores que se entrelaçam, o Renascimento, a Reforma e a Revolução Científica serão os propulsores de uma nova lógica de vida e, como veremos, de Direito
	Definitivamente o homem torna-se dono de seu destino e de suas escolhas políticas, é livre para se autodeterminar. Afinal, o homem é o “centro” do universo existencial.
	O pensamento moderno possui duas faces indissociáveis: o Racionalismo e o Iluminismo. O Racionalismo moderno é fundado na inabalável crença na autonomia e autoconsciência do ser humano em si, muito menos dependente de um Deus onipotente e onipresente. A fé na razão humana triunfa sobre as religiões, as antigas autoridades e a Ciência como uma nova forma de redenção, e conduz o homem a um novo olhar para a realidade objetiva verificável, quantificável e comprovável
	Outra face do pensamento moderno é o Iluminismo (Aufklãrung em alemão, que pode ser traduzido como Esclarecimento, ou Lumières, Luzes, no dizer francês). Para os iluministas, todo desconhecido pelo estado de ignorância pode ser conhecido, “iluminado” pela razão humana. Pensadores iluministas como Locke, Leibniz, Spinoza, Bayle, Voltaire, Montesquieu, Diderot, Hume, Adam Smith, Kant, dentre muitos outros mais, fundaram uma nova visão de mundo.
Filosofia Contemporânea (XIX aos atuais) 
	As categorias filosóficas passaram a desconfiar do otimismo técnico e científico do século XIX, afinal, as guerras mundiais desnudaram a crueldade que pode ser produzida pelo conhecimento científico. Desde aí, por exemplo, a Escola de Frankfurt, formada por um grupo de intelectuais fundadores da Teoria Crítica, fez a distinção entre razão instrumental e razão crítica. A razão instrumental, a técnico-científica, não foi capaz de promover a libertação e emancipação humanas, ao contrário, tornou-se instrumento de opressão e extermínio. Como contraposição à razão crítica, desde uma revisão da razão instrumental, propõe uma forma de conhecimento libertador e emancipatório.
RESUMO DO TÓPICO 1
• Os elementos essenciais que irão servir de referência permanente em nossos estudos.
• O sentido e especificidade do estudo da Filosofia.
• A Filosofia como saber prévio e necessário a qualquer campo do conhecimento.
• A origem do pensamento filosófico na tradição do pensamento ocidental.
• O processo histórico de construção da Filosofia ocidental.
• Os desafios da reflexão filosófica no mundo contemporâneo.
2. FILOSOFIA DO DIREITO
Uma das finalidades da dogmática jurídica é a de possibilitar o que tradicionalmente se define como segurança jurídica, ou seja, garantir um mínimo de previsibilidade das decisões que definem as relações e o comportamento social, porém, dogmática jurídica não deve ser compreendida como conceitos, ideias e concepções estagnadas e imutáveis. É exatamente a dimensão valorativa do Direito que lhe confere permanente dinâmica, e aqui podemos visualizar uma outra face do saber jurídico: a Zetética
Para pensadores clássicos do Direito, como Giorgio Del Vecchio, o Direito ultrapassa o limite de sua logicidade interna, uma vez que é produto da natureza humana, fazendo com que exista a necessidade de alargar e aprofundar a dimensão do fenômeno jurídico de forma a permitir compreender as contingências sob as quais se construiu uma lei ou um costume; e esse fundamento não pode ser investigado pela ciência jurídica stricto sensu, ou seja, em sua dimensão técnica normativa. Esta investigação define o campo da Filosofia do Direito: “disciplina que define o Direito na sua universalidade lógica, investiga os fundamentos e os caracteres gerais do seu desenvolvimento histórico, avalia-o segundo o ideal de justiça traçado pela razão pura”
2.2 - A ESPECIFICIDADE DA FILOSOFIA DO DIREITO
• Ciência do Direito, ou Jurisprudência, caracteriza-se como estudo sistemáticode preceitos já dados, postos diante do intérprete (administrador, advogado ou juiz) como algo que ele deve apreender ou reproduzir em suas significações práticas, a fim de determinar o âmbito da conduta lícita ou as consequências resultantes da violação das normas reveladas ou reconhecidas pelo Estado.
• Filosofia do Direito, ao contrário, em lugar de ir das normas jurídicas às suas consequências, volve à fonte primordial de onde aqueles ditames de ação necessariamente emanam, ou seja, não observa a experiência jurídica, como um dado ou um objeto externo, mas sim in interiore hominis
A Filosofia do Direito vai além do Direito posto pelo poder político, pelo Estado, e do problema de buscar no sistema a resposta jurídica ao caso concreto, mas vai às origens e finalidades da própria norma jurídica, isto porque, explica Reale (2002), o Direito “não é uma coisa”, mas carrega em si as relações sociais.
A atitude filosófica no Direito é um permanente estado de vigilância e atenção às práticas jurídicas e judiciais, à inovação legal, à finalidade das normas jurídicas, é, enfim, uma atitude própria daquele que está permanentemente inquieto com o mundo ao seu redor, e é esse modo de ser que distingue os jusfilósofos dos demais pensadores do Direito: a capacidade e sensibilidade de se admirar com as coisas e com mundo que nos cerca.
Tarefas e objetivos da Filosofia do Direito:
• Proceder à crítica das práticas, das atitudes e atividades dos operadores do direito.
• Avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer suporte reflexivo ao legislador.
• Proceder à avaliação do papel desempenhado pela ciência jurídica e o próprio comportamento do jurista ante ela.
• Investigar as causas da desestruturação, do enfraquecimento ou da ruína de um sistema jurídico.
• Depurar a linguagem jurídica, os conceitos filosóficos e científicos do Direito.
• Investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a indivíduos, a grupos, a coletividades, a preocupações humanas universais.
• Esclarecer e definir a teleologia do Direito, seu aspecto valorativo e suas relações com a sociedade e os anseios culturais.
• Resgatar origens e valores fundantes dos processos e institutos jurídicos.
• Por meio da crítica conceitual institucional, valorativa, política e procedimental, auxiliando o juiz no processo decisório.
RESUMO DO TÓPICO 2
• Há uma especificidade na Filosofia do Direito: problematizar a essência e
finalidade do agir jurídico.
• Não há um consenso acerca do termo “Direito”, devendo ser definido de
acordo com os pressupostos ideológicos, políticos e filosóficos estabelecidos.
• A atividade do jurista exige uma permanente atitude questionadora
3. O PARADIGMA DOMINANTE DE DIREITO MODERNO E SEUS ELEMENTOS EDIFICADORES
Paradigma é um conjunto de instrumentos teóricos e práticos aceitos e partilhados por uma comunidade científica capaz de resolver problemas, explicar fenômenos e demonstrar resultados de uma investigação revestidos de “verdades científicas”
MODERNIDADE: Copérnico, no século XVI, com a teoria heliocêntrica e a órbita planetária, havia iniciado um movimento antidogmático seguido por Tycho Brahe, Kepler e Galileu, entre outros, que viria a abalar o princípio de autoridade, até então, base do poder papal. Isaac Newton, no século XVII, dá um passo definitivo para a criação de uma teoria geral da dinâmica. Em meados do mesmo século, Huygens elaborou a teoria ondulatória da luz. Em 1628 são publicadas as descobertas de Harvey sobre a circulação do sangue. Robert Boyle, em 1661, supera definitivamente os alquimistas no campo da química e retoma a teoria dos átomos de Demócrito. Giordano Bruno em 1660 é queimado na fogueira por divulgar a teoria heliocêntrica e por suas convicções teológicas serem consideradas heréticas. Acreditava que a Sagrada Escritura deveria ser obedecida como ensinamento moral e não como astronômico. A revolução da ciência abria possibilidade para a certeza epistemológica e consenso objetivo e, ao mesmo tempo, a lógica da previsão experimental e metodológica científica ia assumindo-se como redentora social.
A secularização foi elemento essencial para edificação da Modernidade e de suas instituições, como o Estado Contemporâneo e o Direito.
De forma definitiva eram rompidos os vínculos com o passado medieval e inaugurada uma era em moldes absolutamente novos anunciando o alvorecer de um progresso humano infinito. O modelo de racionalidade que foi construído desde o Renascimento chega ao auge no século XIX, quando adquire o status de modelo global de racionalidade científica que se alastra para os diversos campos do conhecimento. Tal modelo é representado melhor pelo positivismo
A característica essencial do positivismo, tal qual Comte a concebeu, é a devoção à ciência, vista como único guia da vida individual e social, única moral e única religião possível
O positivismo se caracteriza pela crença de que somente é válido e confiável o conhecimento acerca dos fatos observados e estudados através do método próprio das ciências experimentais (observação, quantificação e experimentação), pressupõe que o espírito e os métodos científicos experimentais devem se estender a todos os domínios da vida intelectual, política e moral.
É nesta concepção de contrato social e racionalidade moderna que se funda o corpo político: a recíproca obrigação política horizontal, cidadão para cidadão, e vertical, do cidadão para com o Estado. Nesta indissociável relação é que se compreende o objetivo do Direito Moderno. Em outras palavras, o direito não pode servir de instrumento de violação da vontade geral e deve ser tão universal e abstrato como a vontade que o justifica. Em síntese, o Direito Moderno é definido potencialmente como vontade do soberano, manifestação de consentimento e autoprescrição.
3.2 - O PARADIGMA MODERNO DE LEGALIDADE: FUNDAMENTOS
O paradigma da modernidade tem como pressuposto a crença de que a racionalidade técnica científica é capaz de produzir uma explicação segura e verdadeira. O Direito moderno vai ser elaborado a partir desse mesmo pressuposto, qual seja, o de que um conjunto de normas objetivas, tecnicamente adequadas e legitimamente construídas é capaz de promover a segurança jurídica e a previsibilidade nas relações humanas.
O legalismo moderno pode ser compreendido como um conjunto de normas objetivas gerais e abstratas produzidas exclusivamente pelo Estado, cuja finalidade é controlar a ação social, tanto individual como política, estabelecendo deveres e direitos de forma coercitiva
O paradigma da legalidade era, e de certa maneira é, um dos pilares centrais da segurança jurídica, uma vez que garante a coesão do grupo social e organiza a consciência individual em função de padrões universais, válidos para todos, de justiça e previsibilidade, legitimando a ordem política e jurídica posta, criando uma espécie de “consenso” no agir coletivo e individual.
Positivismo Jurídico é uma doutrina segundo a qual o único direito é o direito positivo
RESUMO DO TOPICO 3
• Direito Positivo, Positivismo Jurídico e Positivismo Filosófico são conceitos distintos, embora em muitos momentos aparentemente se aproximem e se toquem.
• Positivismo Jurídico é uma concepção teórica, política e filosófica de Direito reducionista que acabou por tornar-se o paradigma dominante de Direito.
• Direito Positivo é o Direito posto pelo poder político em distintos momentos da história cuja função é estabelecer o controle social e a sustentação das próprias relações de poder que o criam.
• O positivismo jurídico torna-se aparentemente a única forma legítima de Direito que nega os valores éticos e morais que o constituem e finalidade maior: a realização do justo concreto
4. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO POSITIVISMO JURÍDICO CONTEMPORÂNEO E DA SUPREMACIA DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE	
	A técnica exegética “[...] consiste em assumir pelo tratamento científico o mesmo sistema de distribuição da matéria seguido pelo legisladore, sem mais, em reduzir tal tratamento a um comentário, artigo por artigo, do próprio Código”. Portanto, a chamada Escola da Exegese pretendia reduzir o direito à lei, levando a cabo os objetivos revolucionários burgueses.
	Segundo Hespanha (1997), a lei sistematizada nos códigos adquire o monopólio de manifestação do direito. Já não havia lugar para outras fontes de direito. O direito doutrinal havia sido incorporado nos códigos. A Revolução rompeu definitivamente com o passado, instituindo uma nova ordem política e jurídica, desvinculando-se, assim, do Direito tradicional. A jurisprudência não tinha mais sentido como fonte de Direito, na medida em que aos juízes cabia apenas o poder de aplicar a lei e não estabelecer o Direito. Esta compreensão jurídica, predominante na França do século XIX, forjou juristas (como Duranton, Demolombe, Troplong) cujas obras doutrinárias limitavam-se a expor e interpretar os artigos dos códigos
	Tal saber jurídico, que dominou a Europa na primeira metade do século XIX, segundo Bobbio (1999, p. 84-89), possui como características fundamentais:
• A inversão das relações tradicionais entre Direito Natural e Direito Positivo.
• O monismo jurídico.
• A interpretação e aplicação da lei fundada na intenção do legislador.
• O culto à lei e o princípio da autoridade.
4.2 - VERTENTE HISTORICISTA DO DIREITO MODERNO
RESUMO DO TÓPICO 4
• O Direito moderno é um paradigma assentado no princípio da legalidade.
• Positivismo Jurídico é a síntese teórica, filosófica e política do Direito moderno que acabou por constituir-se em modelo dominante acerca do pensar e do agir jurídico.
• As crenças aceitas e reproduzidas de neutralidade e autossuficiência do sistema normativo estatal são elementos nucleares e basilares da lógica jurídica contemporânea
UNIDADE 2 - A CONSTRUÇÃO FILOSÓFICA DO DIREITO MODERNO NO MARCO DA TRADIÇÃO
1. O LEGADO GRECO-ROMANO
	A miséria da Filosofia é ficar perdida dentro de si mesma, de sua tradição, ou seja, é esquecer sua maior finalidade: o agir social.
	Práxis é uma palavra de origem grega, utilizada inicialmente por Aristóteles, que significa conduta ou ação. Portanto, refere-se à atividade oposta à teoria. Embora o termo tenha sido usado por muitos pensadores, foi em Karl Marx que ganhou ressignificação. De acordo com a filosofia marxista, práxis é o fundamento de toda teoria, qual seja, o de transformação da realidade. Marx utiliza o conceito como crítica ao idealismo, compreensão das coisas e do mundo a partir das ideias.
	O pensamento jurídico hegemônico foi elaborado como uma espécie de “engenharia” social e política, relativamente bem-sucedido, na Modernidade, a partir de uma soma de fatores e elementos que possibilitaram a edificação de um projeto jurídico cientificista e técnico de matriz eurocêntrica.
 (
O
 direito perdeu sua
 
identidade, rendeu-se a
 
novos deuses: é visto
 
como servo da economia, da
 
política e da utilidade,
 
enquanto exigimos
 
que seja
 
visto como fenômeno
 
moral. Nunca antes, parece,
 
exigiu-se
 
tanto do direito;
 
nunca antes investiu-se tão
 
pouca autoridade nele
)
1.2 - DO MITO AO LOGOS
	A expansão do Império Romano e o aprimoramento da vida na pólis grega são fatores importantes para compreendermos a fundação de uma nova concepção de cidadania e política. Com diferenças e particularidades, o certo é que o espírito prático romanista e seu legado técnico de direito, um dos pilares da cultura ocidental, e a sofisticação da cultura grega vão encontrar na filosofia o ponto de encontro entre ambas.
	A ciência jurídica romana, no período clássico, tem na filosofia grega, particularmente no platonismo, paripatetismo e estoicismo, a fonte ética e moral de sustentação. Não que os romanos não tenham autonomia de pensamento, mas há de ser lembrado que a civilização romana foi plural e eclética, aprendendo ao longo de séculos de história de dominação a conviver e absorver distintas culturas 
	As primeiras especulações acerca da justiça na Grécia antiga são fundadas na teogonia – antiga narrativa da origem do cosmo e dos deuses –, que concebia, desde um politeísmo antropomórfico, a solução dos problemas humanos. A relação entre a natureza e os humanos estruturou o espírito inicial da filosofia
	A passagem do mito para o logos, como se denominou o processo mental que deu lugar à filosofia enquanto conhecimento racional rigoroso, não se deu de uma só vez, e por longo tempo coexistiram as duas modalidades de enfrentar o mistério do Ser
	A inicial filosofia helênica buscava compreender o enigma da existência humana desde o desvelamento do que seria o elemento essencial, primordial, estável e unitário que rege o cosmos humano e não humano. A esse princípio a que “todas as coisas” estão ligadas e a que “tudo volta” deram o nome de physis – natureza
	Protegida pelos deuses, a pólis era regida por normas tradicionais – themistes (regulamentações) – que codificadas constituíam onomos– ordem dapólis. Como você deve saber, as pólis constituíam formas diversas de organização que concretizava a convivência desde os valores de todos por todos. Graças à vida na pólis era possível a liberdade individual assegurada pela justiça, inicialmente compreendida como reparação a tudo que feria a ordem estabelecida e, posteriormente, vai se identificar como harmonia e equilíbrio nas relações entre os homens
	Se o apego da pólis às suas autocracias e independência pôde servir de estímulo à emulação, também é certo que trouxe consigo a invertebrada atomização do mundo grego, cuja unificação acabou por ser imposta do exterior, à custa da própria liberdade. Essa situação só em parte foi mitigada por confederações e
ligas de cidades, estabelecidas em geral sob a direção de uma pólis hegemônica
	Para o povo grego, o modo de vida digno dependia de uma precondição: o exercício da liberdade. A liberdade significava a independência em relação às necessidades básicas de vida, eliminando qualquer modo de vida ligado à sobrevivência. Não apenas os escravos não possuíam liberdade, mas também os artesãos livres e os mercadores, ou seja, estavam excluídos todos os que não podiam dispor de liberdade de ação e de movimento. Apenas aos homens livres pertencia o direito de escolha de uma vida digna: a vida voltada aos prazeres do corpo – onde o belo é consumido tal como é dado; a vida dedicada aos assuntos da pólis – atividade que por excelência produz belos efeitos; e a vida de filósofo – dedicada à contemplação e investigação das coisas eternas, cuja beleza não poderia ser alterada nem pela produção nem pelo consumo humano
	A pólis representava, como modelo ideal de agrupamento humano, algo mais do que uma forma possível de organização: era uma dádiva divina que possibilitava conferir sentido e individualidade à existência humana.
	A grande marca do espírito grego, uma cultura ímpar, é a busca de compreensão da relação do cosmos – mundo circundante – com o ser humano na tentativa de edificar um tipo ideal de governo desde uma Politeia, fundada na ética e no bem comum que, irrenunciavelmente fosse capaz de servir de
referencial para a ação dos governantes.
	É certo que houve um “mundo pré-político” grego, o mundo homérico, onde havia um sentido embrionário de pólis. Ilíada fala de um mundo dominado pelo espírito heroico de homens que já conheciam a vida organizada da cidade.
	Segundo o pensamento de Hannah Arendt (1983, p.16), a convivência plural da pólis é o que possibilitava uma significação ao humano, pois tal coexistência é o pressuposto da identidade individual e política. A escolha de um modo de vida digno, condicionada à ação política, dependia de uma precondição determinante: o exercício da liberdade. A noção de liberdade era o diferencial entre um grego e um bárbaro
	“Democracia” é o termo que define oficialmente o modelo político de Atenas no século V. Péricles emprega a palavra “democracia” na oração fúnebre que Tucídides lhe atribui. Como princípio político, designa um modelo oposto à tirania e oligarquia no qual a lei é igual para todos (isonomia), comigual participação nos negócios (isegoria) e no poder (isocracia). Afirma o referido autor que democracia se caracteriza como: Barreira contra o abuso da força (Hybris) e os apetites excessivos (pleonexia), ela desempenha no universo político o mesmo papel que a medida (sofrósine) no universo moral
	Os longos anos de guerra absorveram recursos que causam acentuado empobrecimento de Atenas, e, com isso, as lutas de classe acirram-se, polarizando forças sociais em antagonismos antropofágicos. O modo de vida ateniense, até então inabalável, teve que ser recomposto. A derrota da Liga de Delos na Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), com a vitória de Esparta e a imposição do regime oligárquico dos Trinta Tiranos, mostrou que as instituições políticas são tão efêmeras quanto qualquer sonho de eterna dominação e riqueza. O decréscimo populacional, a destruição das áreas agrícolas acompanhada de êxodo rural, a falta de alimento e o forte abalo econômico são alguns dos fatores que produziram um turbilhão de decadência. A participação e o interesse do cidadão nas atividades públicas, que até então davam fiança à administração política, tornaram-se objeto de repugnância. 
	Foi a partir desta dolorosa experiência que surgiu a necessidade de uma reflexão política interna, sendo este um dos fatores decisivos para a rápida e surpreendente superação da profunda crise em que aquela sociedade havia mergulhado. Em nenhum outro momento da história o povo ateniense havia se dado conta de que sua maior força estava na cultura
	O resgate da aparentemente perdida honra ateniense passa a nortear o cotidiano nas praças e nos tribunais. 
	A clara consciência do “espírito grego”, que se traduzia como distinção em relação aos demais povos, e a realização da democracia no século anterior ofereciam maior capacidade de superação aos entraves políticos, sociais e econômicos dos séculos V e IV a.C.
	É superado o antigo paradigma cosmológico no qual ao homem cabia apenas aceitar o destino de nascer, viver e morrer sob a ordem do inevitável e imutável, desaparecendo o sentido de vivência como mágico círculo natural de ordem fora do qual apenas existia o caos
	Paulatinamente ia abrindo espaço público para os debates, acentuandose a capacidade de pensar e argumentar como forma de convencimento 
	Este movimento intelectual crítico das autoridades e das convenções acaba por criar um abismo entre as velhas crenças, preocupadas com o mundo da natureza, e os assuntos da pólis.
	Os sofistas lideram estes novos debates, auxiliando seus discípulos a obter mais sucesso da vida pública do que na especulação teórica. 
	Os sofistas (sábios) eram estrangeiros, portanto, não cidadãos gregos, e sem compromisso com os destinos da cidade. O objetivo desses “professores itinerantes” era ensinar a arte do bem falar e argumentar, sem a preocupação com a essência valorativa (moral e ética) do discurso.
Os sofistas mais conhecidos são
	 Hípias (nascido na Élida no século V a.C.),
	Górgias (487-380 a.C.) e 
	Protágoras (485-410 a.C.)
	Tratava-se agora de unir, de maneira convincente, duas atividades políticas: “a ação (práxis) e o discurso (léxis), dos quais surge a esfera dos negócios humanos (taton anthropon pragmata, como chamava Platão), que exclui estritamente tudo o que seja apenas útil e necessário” (ARENDT, 1983, p. 34). A experiência crescente do exercício político vai acentuando o discurso como meio de persuasão, meio de comunicação específico que alia o pensamento filosófico ao político
	Consolida-se uma forma de pensar onde a filosofia passa a ser a fonte primordial de conhecimento e poder. Na medida em que a capacidade de contemplação, adquirida pelo ato de filosofar, confere legitimidade racional ao discurso e à prática política, é rompida a submissão injustificável ao nomos: agora é necessário compreendê-lo racionalmente
	Em Críton, Platão imortaliza a atitude de Sócrates que faz de sua morte o seu último grande ensinamento: a obediência às leis da cidade é um dever para todos, mesmo quando elas se voltam contra o cidadão.
	Compreendendo que política e ética são inseparáveis, Sócrates tinha claro o conflito de ambas na prática, chegando a afirmar diante dos juízes que a luta pela justiça deve ser do homem comum e não dos homens públicos. Observava que os crimes mais graves eram cometidos por um homem quando estava no poder, por ser a onipotência a maior tentação que uma pessoa pode ter. Por esta razão, o entendimento de Sócrates é o de que a direção política deve possuir um cunho filosófico, sendo esta a grande convicção desenvolvida por Platão, seu maior seguidor. 
	A dialética é o método pedagógico através do qual Sócrates refletia. A partir do diálogo irônico e sarcástico, para que o interlocutor chegue às suas próprias conclusões, estimula a reflexão entre “ideias opostas”. Essa forma de educação custou a Sócrates sua vida. Foi acusado de ateísmo e de corromper a juventude. O pressuposto de seu pensamento é o reconhecimento de seus próprios limites e ignorante de sua ignorância, pois só assim a razão poderia superar a mera opinião
1.3 - PLATÃO – FILOSOFIA, POLÍTICA E JUSTIÇA
	Platão, como era próprio dos jovens da aristocracia ateniense, tinha inclinação para os negócios públicos. O regime dos Trinta, que emerge da crise ateniense após 404 a.C., e o breve retorno da democracia, findada em poucos meses, fazem ruir suas ilusões em relação à política. Platão, após a morte de Sócrates, convence-se de que a Democracia é o pior dos regimes políticos
A desordem e impotência do governo democrático no desastre político de 404 (fim da guerra do Peloponeso) e o despotismo oligárquico instalado foram os motivos que conduziram Platão a ligar-se ao homem de quem dirá no final de Fédon: “[...] que entre todos os do seu tempo que lhe foi dado conhecer, ele foi o melhor e, além disso, o mais sábio e o mais justo”
Com a morte de Sócrates, Platão sabe que Atenas não era um lugar seguro e decide partir para a Itália e Secília Meridional, tornando-se próximo de Díon – cunhado do tirano de Siracusa Dionísio I, o Velho, sucedido por seu filho Dionísio, o Jovem – o que lhe permitiu visitar a corte muitas vezes e, movido por sua crença, tenta convencer o monarca de que o verdadeiro rei deveria ser um filósofo. Mais uma vez passa por uma experiência dramática: é embarcado à força num navio de Égina, cidade então em guerra com Atenas, vendido como escravo, retornando apenas para Atenas graças ao resgate feito por Anníceris. Após sua primeira viagem àquelas terras, em 387 a.C., volta para Atenas e funda a Academia, próximo ao santuário do herói ático Academos, que perdurou até 529, quando é desativada por Justiniano
A República é um grande diálogo que reflete um espírito inquieto que pretende, através da reflexão, encontrar um melhor caminho para o governo da cidade. Desta obra platônica podem ser extraídas três teorias: a da justiça; da educação, condição primordial para a realização da justiça; e da comunidade, condição negativa, mas necessária
Para Pitágoras a conduta humana em sociedade possui como referencial a “ordem natural das coisas divinas”, ou seja, o comportamento ou está de acordo ou em desacordo com tal parâmetro. A justiça é tomada como valor absoluto que exige do indivíduo qualquer sacrifício para mantê-la: entre sofrer uma injustiça e causar-lhe a outrem é preferível sofrê-la
Segundo Bittar (1999, p. 51), o paradigma da justiça é expresso no contexto da filosofia pitagórica como inúmeros conceitos, podendo ser resumidos nos seguintes preceitos:
1. Respeito aos deuses e ao culto.
2. No sentido judiciário (post factum) como corretivo em caso de ocorrência de uma injustiça.
3. Justiça normativa (ante factum) como algo preventivo colocado à disposição dos politai como garantia da ordem e bem comum.
4. Como sinônimo de autoridade e obediência estando implícita a ideia de hierarquia.
5. Com sentido ético como piedade. A doutrina pitagórica, segundo o referido autor, afora seu caráter místico, representou uma importante base para o pensamento platônicoPara Platão, a verdadeira política deve estar a salvo das paixões e ilusões e a chave para a verdadeira política seria a Filosofia. Por esta razão a Alegoria, ou Mito da Caverna é um dos núcleos centrais de suas ideias.
Ao instituir a política como ciência, Platão busca estabelecer princípios teóricos para bem governar, e este foi o início de uma reflexão legada a toda geração de teóricos que o sucederam.
Reconhecendo a diversidade humana, a Cidade de Platão seria constituída por três classes distintas: a primeira, dos chefes de governo com sabedoria e virtudes próprias; a segunda, de auxiliares ou guerreiros dotados de coragem; e a terceira, dos artífices ou camponeses, quer sejam proprietários ou não, virtuosos por sua temperança, ou seja, com capacidade de resistir aos apetites.
A construção teórica platônica pretendia eliminar a divisão social dominante em seu tempo e a causa da decadência moral da civilização ateniense: a luta de ricos contra pobres, dos excluídos contra a aristocracia
dominante.
A cidade perfeita era, para Platão, uma autêntica oligarquia de sábios esclarecidos, uma vez que o mérito de governar não poderia ser obtido pelo nascimento nem pelas aptidões naturais, mas pela virtude adquirida através do conhecimento científico.
Platão, ao instituir um estudo normativo sobre princípios teóricos que devem reger a convivência dos homens, inaugura a política como ciência. A invenção da política foi uma resposta ao conflito, aparentemente indissolúvel, entre aqueles cujo saber e prática era construído unicamente pela lógica do poder; e os filósofos desejavam mostrar que, afinal de contas, não eram inúteis, pois conheciam a “ciência do agir”, e esta sim, era o fundamento legítimo da política.
A política é inventada como uma ciência que não se confunde com especulação. Platão mostra que a ação de governar deve combinar a aptidão de comandar com sabedoria e justiça. Em suma, ao governante cabe saber diferenciar a justa relação entre o múltiplo e o uno, ter dignidade e legitimidade a partir de uma causa transcendente verdadeira
As condições históricas que foram sendo criadas ao longo do desenvolvimento político ocidental evidenciaram que refletir acerca da política é assumir o risco do fracasso, que apenas pode ser compensado pela oportunidade de construção de uma sociedade melhor.
• O sentido de Ética enquanto pressuposto da ordem política e jurídica que não se restringe à mera virtude, mas o agir orientado para o Bem sem abandoná-lo sob pena de “deixar o barco navegar pelo sentido da correnteza e não para onde o timoneiro deseja chegar”.
• A Filosofia – o educar-se – tem por finalidade o exercício da cidadania, para a “verdade”.
• O Bem e o Justo nascem desde a reflexão acerca da verdadeira essência – que está no mundo das ideias – sendo a finalidade da justiça o exercício do bem comum.
• O direito não existe independente da vida social – da convivência na pólis
1.4 - ARISTÓTELES: UM ESPÍRITO MODERADO
Muitos autores consideram Aristóteles o criador do método empírico, nas experiências práticas, de investigação em contraposição ao idealismo platônico.
Para Aristóteles, a essência das coisas não é um mero reflexo do mundo das ideias, mas elas podem ser compreendidas a partir da maneira como opera a natureza
Um primeiro momento, como herdeiro do pensamento platônico, mas tentando ir além, considera a filosofia política como princípio de construção da cidade, predominando a preocupação ética de identificar o bom cidadão com o homem bom, vendo na política a possibilidade de formação de um ser humano moralmente elevado. A relação entre o homem e a pólis, vínculo natural e necessário, é, para Aristóteles, o que diferencia o ser humano dos demais animais, já que a superioridade humana é adquirida com a convivência na cidade, e, por via de consequência, com a possibilidade de partilhar de um processo civilizatório comum.
Se cada indivíduo isolado não se basta a si mesmo, assim também se dará com as partes em relação ao todo. Ora, aquele que não pode viver em sociedade, ou que de nada precisa por bastar-se a si próprio, não faz parte do Estado; é um bruto ou um deus. A natureza compele assim todos os homens a se associarem
Num segundo momento de sua obra trata da questão política numa dimensão maior: “A nova ciência seria geral, isto é, abordaria tanto as formas existentes quanto os ideais de governo e ensinaria a arte de administrar e organizar Estados de todos os tipos, fosse qual fosse a forma desejada
Criticando a maneira como os sofistas ensinavam a arte de governar, que no seu entender “se omitiram quanto ao exame do assunto da legislação”, afirma que talvez fosse melhor estudar o assunto das constituições no limite da capacidade, da filosofia e das coisas humanas, apontando para o ponto de partida do estudo da política:
Este era o sentido de existência do Estado: a forma de organização que permite o mais alto desenvolvimento moral do cidadão, percebendo, afinal, que o bom homem e o bom cidadão apenas são coincidentes num modelo político ideal
Aristóteles estabelece três formas autênticas (ou constitucionais) – monarquia, aristocracia e democracia moderada – e três degenerados (ou despóticos) – tirania, oligarquia e democracia extremada (ou governo da plebe)
Critério estabelecido por Aristóteles diferencia-se do utilizado por Platão em um aspecto central: para o primeiro, as formas autênticas eram as que visavam o bem comum, enquanto que para o segundo era o respeito à lei
A justiça é a preocupação central do governante, pois esta é a virtude social por excelência. Um governo sob leis boas – representativas dos ideais da cidade – criaria o hábito de observância de todos os cidadãos de preceitos genéricos e abstratos capazes de atender aos anseios políticos dos cidadãos. Na medida em que as leis iguais para todos, com a mesma qualificação política ateniense (cidadãos, metecos e escravos), a igualdade seria de acordo com as aptidões de cada um, e assim, a felicidade seria o resultado do convívio social, a pólis, que teria sempre na célula familiar a origem primeira que ia se complementando com a convivência social
Aristóteles, com um espírito político moderador, converge seu pensamento para uma tendência em que deve prevalecer o interesse da “classe média”, classe esta que, como chama atenção Touchard (s.d., p. 60), “por diversas vezes tentara impor os seus pontos de vista em Atenas, sobretudo no fim do século V, e se definira a si própria como intermediária entre os ricos, inclinados ao egoísmo e à ambição, e os não possidentes, encargo e ameaça para o Estado”
Esta classe, entende Aristóteles, não age por interesse próprio, mas em interesse coletivo, e é isto que a torna mais capaz para o exercício da “coisa pública”. Esta concepção, sem dúvida, vincula-se ao princípio aristotélico de que a “virtude está no meio”.
É evidente, pois, que a comunidade civil mais perfeita é a que existe entre os cidadãos de uma condição média, e que não pode haver Estados bem administrados fora daqueles nos quais a classe média é numerosa e mais forte que cada uma delas; porque ela pode fazer pender a balança em favor do partido ao qual se une, e, por este meio, impedir que uma ou outra obtenha superioridade sensível
A inovação de Aristóteles está no fato de que inclui em seu estudo não apenas a significação ética da Cidade-Estado, “mas também o estudo empírico dos elementos políticos e sociais de constituições, as respectivas combinações, e as consequências que delas derivam”
Em Aristóteles encontramos dois grandes campos para a compreensão do sentido da justiça: o universal e o particular
• Justiça Universal: é a virtude que está em todas as demais, como, por exemplo, na paciência ou caridade. O paciente é aquele que reconhece o que é necessário despender de tempo ou conhecimento com outro. O professor impaciente com o aluno não possui a virtude da paciência e tampouco da justiça, porque não reconhece a necessidade e condição do outro, ou ainda, a caridade como ato de dar não deve sermovida pelo temor ou como demonstração de superioridade, mas sim como justiça.
• Justiça Particular: como virtude em si mesma que se manifesta como:
	• Justiça Distributiva: se dá na relação entre dois sujeitos e duas coisas, cujo critério fundamental é o mérito – dar a cada um o que é seu – reconhecendo Aristóteles que o mérito pode ser variável e é uma proporção
	• Justiça Corretiva: também chamada justiça diortótica, é mais simples de se compreender. Ao contrário da distributiva, nessa modalidade a justiça é considerada como um tipo de reparação que, voluntária ou involuntariamente, foi retirado de alguém ou da coletividade. É uma proporção matemática, uma vez que se trata de devolução ao que foi subtraído. Para Aristóteles, independe se a pessoa é boa ou má, uma vez que para a correção devem ser tratadas como iguais.
1.5 - O HELENISMO ROMANO
Ao final da era de Péricles (495/492-429 a.C.), considerada a Era de Ouro de Atenas, a civilização grega entrava em decadência
Desde o episódio da morte de Sócrates, os ideais éticos e políticos daquela sociedade foram se esvaindo. Apesar dos filósofos terem abandonado as praças, o espírito helênico sobreviveu e ecoou pela história!
	Helenismo é um termo que designa a divulgação, absorção e expansão da civilização grega pelo mundo mediterrâneo, euroasiático e no Oriente
O helenismo vai dialogar de forma muito próxima com os romanos, sem que se possa considerar uma sucessão linear, uma vez que as filosofias grega e romana são construídas sobre as mesmas bases, até as inovações trazidas pelo cristianismo no início da Idade Média
Os romanos ficaram conhecidos na história do Direito como essencialmente práticos, que souberam absorver diversas culturas. “Sem a criatividade e o refinamento dos helenos, os romanos incorporaram elementos culturais advindos de vários povos conquistados e os adaptaram ao seu espírito e aos seus interesses políticos de dominação”
• Epicurismo: escola que permaneceu durante séculos tanto no mundo grego como no romano, tem sua origem no pensamento de Epicuro de Samos
		• O justo segundo a natureza é a regra do interesse que temos em não nos prejudicarmos nem sermos prejudicados mutuamente. 
	• Em relação àqueles, dentre os viventes, que não puderem concluir pactos para não se prejudicarem pessoalmente nem serem prejudicados mutuamente, nada há que seja justo ou injusto. Isto também vale para os povos que não puderam ou não quiseram concluir os pactos para não se prejudicarem nem serem prejudicados mutuamente. 
	• Nunca houve justiça em si, mas nas relações recíprocas, quaisquer que sejam seu âmbito e as condições do tempo, uma espécie de pacto a fim de não prejudicar nem ser prejudicado
• Estoicismo: corrente que influenciou mais que o epicurismo, cujo fundador foi Zenão de Citium
RESUMO DO TÓPICO 1
• A Filosofia greco-romana significou o rompimento da lógica mítica na legitimação e justificação da política e da justiça nas relações humanas.
• O rico legado da cultura grega, em suas distintas etapas, dos pré-socráticos aos socráticos, construiu o sentido ético e moral da justiça e do Direito.
• A civilização helênica, preservada mesmo após a desintegração do mundo greco e romano, por sua beleza, força e complexidade foi mantida, reproduzida e reinventada, chegou até os dias atuais enquanto momento fundacional e sempre referenciado do modelo ideal de justiça e seu sentido maior: a felicidade e bem comum.
2. O PENSAMENTO MEDIEVAL
A verdadeira desintegração do Império Romano, longo processo que se inicia em torno do século V, marcado pela divisão do império em Oriente e Ocidente em 476, a expansão dos reinos bárbaros e a ascensão do cristianismo são fatores que marcam a entrada do mundo ocidental em um novo estágio civilizatório.
Enquanto na Antiguidade os homens eram valorizados por suas posses, qualidades e por seus feitos heroicos, excluindo os pobres, mulheres e os escravos, na sociedade cristã ocidental se reconhece o homem como unidade composta de matéria e espírito.
A sociedade medieval era um universo profundamente hierarquizado, no qual a nobreza e o clero detinham o poder, restando aos servos a submissão aos senhores em troca de proteção e uso da terra para a sobrevivência
Durante a Idade Média, no mundo ocidental, predomina uma visão homogênea de cristianismo fundada em verdades e dogmas difundidos pelos doutores da Igreja. A filosofia e o direito se submetiam ao controle da teologia cristã e da doutrina da Igreja, que irão dialogar com pensadores como Platão e Aristóteles
Aliar fé (pístis) e razão (logos) será o grande esforço desta etapa, que pode ser sintetizada pelos seguintes elementos caracterizadores:
• A hegemonia do monoteísmo cristão no mundo ocidental.
• A adoção da teoria criacionista – origem do mundo e controle do tempo por Deus.
• O antropocentrismo – assumindo o homem (ser criado à imagem e semelhança de Deus) lugar privilegiado na história.
• Condição humana marcada pelo pecado cuja redenção depende do perdão divino condicionado à adoção do modo de vida cristão.
• A incorporação na natureza humana dual platônica – corpo e alma racional – o espírito (pneuma) que é o elo como o divino através do exercício da fé.
• O sentido do amor divino como único verdadeiro que conduz à redenção.
• Concepção linear e progressiva da história (anunciando o fim com o Juízo Final).
2.2 - A PATRÍSTICA E O PENSAMENTO DE SANTO AGOSTINHO
Muitos serão os padres que irão assumir a tarefa de edificar os fundamentos da fé cristã, sendo este período conhecido como Patrística
Santo Agostinho, ou Aurélio Agostinho, o Bispo de Hipona, é considerado o grande conciliador entre a filosofia grega e o cristianismo. O conjunto de sua obra tem como ponto de partida a defesa da revelação da palavra de Deus na Bíblia;
A concepção agostiniana acerca do justo e injusto pode ser compreendida a partir da própria teologia aliada à metafísica platônica, tão bem evidenciada na obra Cidade de Deus. “O tema em Agostinho remete ao estudo do problema da justiça fundamentalmente à discussão da relação existente entre lei humana (lex temporalem) e lei divina (lex aeterna), onde está compreendido o estudo das diferenças, influências, relações etc. existentes entre ambas”
Defende que a justiça humana – falha, transitória, imperfeita e corrupta – apenas será corrigida pela justiça divina – eterna, perfeita e incorruptível. As leis humanas, que regulam a relação entre os homens, devem ser inspiradas em leis divinas que têm como fonte o maior dos legisladores: Deus, que diferentemente dos homens é ilimitado, tudo sabe e tudo vê. Assim, a justiça divina deve comandar e inspirar a justiça humana, que tem sua origem na própria criação de Deus, mas que por imperfeições e erros humanos acabou sendo desvirtuada.
• A razão deve ser aliada à fé a fim de que seja possível a iluminação interior.
• Redefine o platonismo – é forte em sua obra o dualismo platônico como corpo/ alma; terreno/divino; imperfeito/perfeito; mutável/imutável etc. – encontrando na transcendência divina cristã a essência da verdade.
• Desenvolve os grandes dogmas da Igreja, tais como o da Santíssima Trindade, além da tese do criacionismo.
• Conceito de “mal” como mero resultado degradante do afastamento de Deus pelo próprio homem.
• Existência concomitante de dois poderes: o Divino – que governa a Cidade Celeste cujos cidadãos participam e comungam do amor de Deus – e o Humano – onde vive
A Escolástica é o último período do pensamento cristão medieval, que vai do começo do século IX até o fim do século XVI, da constituição do sacro romano império bárbaro, ao fim da Idade Média, que se assinala geralmente com a descoberta da América (1492). O termo escolástica tem sua origem relacionada à filosofia ensinada nas universidades, pelos mestres escolásticos. Esta é uma etapa de grande avanço do ensino superior, as universidades se tornaram centros de discussão, o que chamou a atenção dos eclesiásticos para o “perigo” das diversidades acerca da verdade cristã. Até quando, por autorizaçãopapal, em 1215, a Universidade de Paris recebe o direito de autonomia em relação à busca pelo conhecimento.
Tomás de Aquino e seus discípulos enfrentam, magistralmente, o desafio e aparentes contradições da cultura grega e o cristianismo, preparando o firme terreno por onde se edificaria a ciência moderna. A ele foi legada a tarefa de integrar de forma coerente o legado grego à fé cristã, e, atento às transformações de seu tempo, soube dar “de modo impressionante a virada do pensamento ocidental sobre seu eixo na Alta Idade Média para uma nova direção da qual a mente moderna seria herdeira e depositária”
Na concepção tomista, o homem é um ser naturalmente voltado para a felicidade e o pecado é um agir em sentido inverso que, pela bondade divina, constitui uma escolha, uma vez que o homem é um ser livre. A liberdade é a precondição para qualquer ato ser considerado moral, pois um ato só é humano se for livre, ensinava Aquino
• O homem tem o dever moral de proteger sua vida e sua saúde, razão pela qual o suicídio e a negligência constituem um erro.
• A necessidade natural de propagar a espécie resulta na necessidade fundamental de união de um homem e uma mulher.
• Tendo em vista que o homem busca a verdade, seu melhor meio de consegui-lo consiste em viver em harmonia social com seus concidadãos, que também estão engajados em tal busca. Para assegurar uma sociedade ordenada e harmoniosa, as leis humanas são moldadas de modo que sirvam de diretrizes pa
Aquino (2001 apud MORRISON, 2006) define a lei na lógica tomista como:
• Lei Eterna: a lei é um ditame da razão prática que emana do governo que rege uma comunidade perfeita. Portanto, a ideia mesma do governo das coisas em Deus, o senhor do Universo, tem a natureza de uma lei. E, como a concepção das coisas da razão divina não está sujeita ao tempo, mas é eterna, conclui-se que essa espécie de lei deve ser chamada de eterna (pergunta 91, r. 1).
• Lei Natural: a lei natural é a parte da lei eterna que diz respeito especificamente ao ser humano. Se o homem não pode conhecer a totalidade de Deus, a racionalidade humana garante sua participação na razão eterna, através da qual ele identifica uma tendência natural (normativa) à prática de atos e a fins adequados. A lei natural nada mais é que a participação da criatura racional na lei eterna (pergunta 91, r. 2).
• Lei Humana: as leis escritas – leis humanas – devem derivar de preceitos gerais da lei natural. Sendo, portanto, o direito um “ditame da razão prática”. A forma de se extrair as conclusões da lei é semelhante ao que ocorre com a “razão especulativa”. Da mesma forma que chegamos a conclusões distintas nas ciências, do mesmo modo, a partir dos preceitos da lei natural, a razão humana deve atingir determinações mais particulares de certas questões. O que confere à lei sua legitimidade é sua dimensão moral originada do Direito Natural.
• Lei Divina: sua função é dirigir o homem a seu devido fim, que é revelado nas Escrituras Sagradas como forma de graça divina para que o homem possa atingir seus fins espirituais e naturais. A lei divina provém diretamente de Deus e é conhecida pela fé, esperança e amor.
2.3 - A CULTURA JURÍDICA MEDIEVAL
O trabalho dos glosadores na interpretação exegética do texto de Justiniano ia paulatinamente se transformando numa dogmática, por criar uma linguagem técnica acerca do direito, entretanto, sem a preocupação exclusivamente prática, mas com objetivo teórico-dogmático, ou seja, de demonstrar a racionalidade de textos jurídicos sagrados.
Na Idade Média, quanto mais prática necessitava ser a interpretação dos textos jurídicos, mais ia se aproximando de técnicas suficientemente capazes de harmonizar, construir regras e princípios do que foi sendo definido como dogmática jurídica.
	Este processo acabou por conduzir a uma unidade racional e lógica das distintas concepções, mas com uma finalidade prática, o que vai ultrapassando os glosadores por constituir-se numa interpretação menos comprometida com a “sacralidade” dos textos de Justiniano, além de também fundada numa atitude mais racionalista no sentido de guiar o pensamento por critérios lógicos tal como haviam sido herdados por Aristóteles.
	Entretanto, o direito, tanto para os comentadores, como havia sido para os glosadores, era considerado um repositório de experiências de natureza indiscutível, mesmo quando contraditório. Por esta razão, todo trabalho de sistematização foi realizado segundo uma ordem formalmente preestabelecida, porém, criando inovações dogmáticas que se tornam permanentes na modernidade.
	A inovação no plano interpretativo foi a oposição entre o texto de lei (verba) e seu espírito (mens).
2.4 - A HERANÇA CULTURAL PARA A MODERNIDADE
	O saber jurídico edificado pelos comentadores acabou por colocar em marcha uma lógica que conduziu à unificação interna do ordenamento jurídico, chegando no século XVI já pronta para sua cientifização.
	É o ambiente filosófico do século XVII que vai fornecer elementos para uma concepção de direito estável e previsível, como a própria razão cartesiana dominante 
RESUMO DO TÓPICO 2 
• O pensamento jurídico medieval é produto das relações de poder e cultura
daquele momento histórico quando o grande desafio foi o de consolidar o
cristianismo e simultaneamente legitimar o poder papal.
• O Direito Canônico resultou da consolidação e desenvolvimento da filosofia
medieval que, resgatando o platonismo e aristotelismo, elaboram as bases do
poder da Igreja.
• O trabalho dos canonistas foi o início do que iríamos denominar na Modernidade
de “Ciência Jurídica”
UNIDADE 3 - FILOSOFIA MODERNA DO DIREITO E DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS
1. OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO PENSAMENTO JUSFILOSÓFICO MODERNO
A concepção moderna de Direito é o resultado de uma convergência de fatores e elementos sociais, políticos, econômicos, históricos e culturais cuja maior expressão é o liberalismo, que em sua vertente filosófica é, em síntese, uma concepção doutrinária que, com base em ideias iluministas elaboradas entre os séculos XVII e XVIII na Europa, defende a não intervenção do Estado no controle da economia e da vida social
O modelo liberal passou historicamente por inúmeras transformações, havendo uma diferenciação entre as distintas etapas do liberalismo, que foram desde a absoluta não intervenção estatal – na sua versão clássica – até uma intervenção necessária a fim de impedir a dominação dos mais fortes sobre os mais fracos – liberalismo social.
O pressuposto filosófico do liberalismo é a doutrina dos direitos do homem, segundo a qual todos os homens, independentemente de sua condição ou origem, são portadores de direitos essenciais, como a vida, liberdade, autodeterminação, segurança, felicidade, entre outros.
A lógica liberal, em suas múltiplas faces e versões, que vão desde o liberalismo filosófico até o político e econômico, tornou-se o principal ideário do mundo moderno. 
	LIBERALISMO = defesa de valores individuais burgueses bastante convenientes para os interesses da burguesia que emergia e se consolidava naquele momento histórico.
Dentre os pensadores iluministas que elaboraram as bases do liberalismo moderno podem ser destacados: John Locke (1632-1704), 
Voltaire (1694-1778),
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), 
David Hume (1711-1776), 
Adam Smith (1723-1790), 
Immanuel Kant (1724-1804), dentre outros
O Iluminismo, no qual o Direito Moderno é edificado, pode ser resumidamente compreendido a partir das seguintes características:
	Valorização da razão acima da fé, devendo ser o conhecimento acerca da natureza, da sociedade e da política, produto da investigação e experiência objetiva.
	Forte oposição ao absolutismo político e aos privilégios da nobreza e da Igreja.
	Defesa da liberdade na política, economia e escolha religiosa incluindo a igualdade de todos perante a lei
	Defesa dos interesses individuais, naturais e inerentes à condição humana. Particularmente, para o Direito interessa também a forma e dinâmica de estruturação de poder que foi elaborada e consolidada
O positivismojurídico acabou por eliminar todas as especulações idealizadas e metafísicas acerca do direito, reduzindo Direito às categorias de legalidade vigentes. Nesta ótica, a formalização do positivismo jurídico encontra legitimidade na explicação da objetividade coercitiva, na previsibilidade e segurança jurídica
• A concepção jurídica normativa moderna é elaborada desde a existência e forma de organização do Estado.
• O Positivismo Jurídico foi a melhor e mais sofisticada elaboração concreta da lógica de Direito Moderno.
• Tem como maior característica o formalismo legal.
• O processo de codificação do século XIX foi o mais eficiente instrumento de legitimação e operacionalidade do Direito
1.2 - HANS KELSEN E A PURIFICAÇÃO DO DIREITO
O paradigma da subsunção é o modelo de racionalidade jurídica que vai dominar a prática do direito na perspectiva positivista. Trata-se de uma concepção que entende que a aplicação do direito ao caso concreto é resultado de um pensamento silogístico no qual o juiz fixa:
	• o fato como premissa maior;
	• o sistema normativo como premissa menor;
	• o direito do caso concreto como conclusão necessária e inquestionável.
ESTE MODELO PRESSUPÕE: 
	• o direito como um sistema autossuficiente e coerente; 	• o raciocínio lógico é a metodologia adequada para fixar o justo do caso concreto;
	• há possibilidade de distinção entre fato (premissa maior) e direito (premissa menor); 	• a decisão, justo do caso concreto, é resultado do necessário e inquestionável “enquadramento” (subsunção), extraindo daí os efeitos legais e jurídicos para o caso concreto
O direito, nesta perspectiva, é transformado em uma ciência dogmática estática, reservando ao jurista o papel de reprodutor de códigos e leis, eliminando qualquer discussão acerca dos valores, interesses e necessidades sociais que estão subjacentes à norma jurídica e como isso, além de empobrecer o papel do direito, o transforma em instrumento de reprodução de uma ordem política posta
Em meio à profunda crise teórica em fins do século XIX e início do XX, Kelsen é um marco divisório para o positivismo jurídico, inaugurando o chamado normativismo positivista e superando a esgotada concepção exegética. Com base na sólida e rigorosa metodologia científica e constitucionalista – tendo redigido a Constituição da Áustria –, inaugura a técnica de controle de constitucionalidade através de tribunal específico.
A “Teoria Pura do Direito” é a obra pioneira que distingue duas esferas distintas: o fenômeno jurídico – manifestação social e valorativa do Direito – e a ciência do Direito – entendimento técnico procedimental científico desta manifestação. E é nesta distinção que vamos encontrar a base da teoria kelseniana, qual seja: direito e moral
Segundo tal perspectiva, o órgão julgador (Estado) não está legitimado a julgar de acordo com convicções políticas/morais, mas sim de acordo com o sentido do fato dado pelas normas estatais
Lendo atentamente as primeiras palavras da obra, não é difícil concluir que o objetivo de Kelsen é depurar o Direito, entendido exclusivamente como Direito Positivo, de outras formas de conhecimento, compreendendo-o como ciência em si mesma.
Fica evidente em Kelsen que a atividade do jurista é, a partir de um sistema normativo previamente definido, chegar à norma do caso concreto, não cabendo nesta análise os valores que antecedem a elaboração da norma. Exatamente por esta concepção é que Direito e Estado seriam “duas faces” de uma mesma “moeda”. Outro conceito-chave da teoria kelseniana é o conceito de validade da norma. Validade deve ser compreendida como a qualidade e condição da norma quando ela é emanada de um órgão político competente e se elaborada de acordo com o procedimento, modo, hierarquia, estrutura e lógica prevista pelo ordenamento jurídico
Todo sistema hierárquico requer um “ponto final” de referência para não regressar ad infinitum, além de que, se não há um pressuposto de validade, pode ser aceito qualquer um
Desde esse conceito de validade não é difícil compreender que Kelsen nos leva a compreender que Direito é um sistema de normas hierarquicamente definidas desde a ordem política e jurídica estabelecida segundo um pressuposto de validade, norma hipotética fundamental, e que permite o controle de constitucionalidade das normas.
A validade da norma, portanto, está condicionada a três pressupostos:
• Competência da autoridade que a editou, derivada da norma hipotética fundamental.
• Mínimo de eficácia, possibilidade de produzir os efeitos jurídicos a que se destina, sendo irrelevante a sua inobservância episódica ou temporária – porque as normas jurídicas não perdem a validade por ‘desuso’.
• Eficácia global da ordem de que é componente.
Como se conclui, o método kelseniano tem que ser compreendido como a busca de uma tentativa de autonomia da ciência do Direito, não como o estudo ou a teoria de uma ordem jurídica particular, mas compreender as estruturas sobre as quais se constrói o Direito Positivo e a universalização destas estruturas. Exclui-se qualquer preocupação sociológica ou juízo acerca do justo, uma vez que o que importa para a Teoria Pura é compreender os pressupostos de validade, vigência e eficácia da norma jurídica.
O político e o jurídico devem ser separados para que a ciência jurídica não se contamine com elementos de natureza política, correndo o risco de perder sua independência
Isso significa que o objeto do Direito nessa concepção pode e deve ser estudado como algo diverso/separado dos fenômenos sociais e estudar a ciência jurídica é independente da realidade social.
O postulado central do positivismo é a crença epistemológica de que o sentido do justo está expresso na letra da lei.
Em tal perspectiva, as aparentes ambiguidades, insuficiências, lacunas, ou até mesmo contradições do sistema, poderiam ser solucionadas com critérios hermenêuticos adequados e análise mais detalhada do significado do texto legal. Esta “flexibilidade dogmática” seria necessária para resolver as dificuldades
práticas, solucionadas com a reportação do intérprete à mente do legislador, compreendendo o caso concreto tal qual teria sido previsto ou poderia resolver o elaborador da lei
Distintas teorias elaboradas sob o rótulo de “hermenêutica jurídica”, assim como admitem a “vontade do Estado” como instância política legítima de produção do direito, característica maior do positivismo jurídico, identificam esta como instância racional do direito, o “espírito da lei” ou “espírito do legislador”.
Assim, a operacionalidade técnica do sistema normativo acaba por identificar metodologia da ciência jurídica com procedimento interpretativo, confundindose a esta metodologia, e por vezes absorvendo, com o ato hermenêutico. Tratase, sobretudo, de uma racionalidade cognitiva-instrumental específica do direito moderno que pretende solucionar o problema básico da atividade jurídica como a correta e segura determinação do sentido prático da ordem normativa.
O desafio kelseniano de depurar a ciência jurídica acaba por deixar em aberto os fundamentos da interpretação e aplicação normativa ao demonstrar que a interpretação é um ato de decisão, de vontade ou mesmo de poder político. Esta afirmação acaba por criar um vazio epistemológico para as tradicionais teses de segurança jurídica, neutralidade, objetividade e previsibilidade penosamente mantidas desde o século XIX e que serão revistas pelas correntes críticas do Direito
1.3 - CRISE E CRÍTICA: OS LIMITES DA RACIONALIDADE JURÍDICA MODERNA
A razão libertadora, um dos mais audaciosos projetos da Modernidade, foi idealizada desde seu início para carregar em si um conjunto de representações e perspectivas que pareciam representar a realização de um grande sonho da humanidade
a justificativa de necessidade de submissão social e política à razão científica era a promessa de segurança definitiva contra qualquer imprevisibilidade do mundo natural, e com tal discursojustificador a ciência submeteu a natureza em toda sua dimensão (a humana e não humana)
“há uma suspeita de que o projeto iluminista estava condenado a voltar-se contra si mesmo e transformar a busca de emancipação num sistema universal de opressão em nome da liberdade humana, e esta espécie de tragédia anunciada tornou-se realidade no início do século XX”.
Sem dúvida, a maior catástrofe humana foi a Segunda Guerra Mundial, cuja lembrança, com os episódios de Auschwitz e Hiroshima, tornou-se insuportável. Nos anos 50 a Europa, e com ela boa parte da humanidade, deixou de acreditar no futuro e, como consequência, a ciência perde grande parte da autoridade que até então possuía. Esta desilusão não pode ser dissociada das guerras mundiais.
A razão moderna embrionariamente carregava consigo a exigência de uma crítica. Crítica que, como afirma Michel Foucault (s.d., p. 35), é uma atitude própria da civilização moderna, um movimento:
A razão herdada do século XIX que havia possibilitado uma ciência positiva assentada numa lógica instrumental e a edificação do Estado como aparato legítimo de racionalização da economia e da sociedade pode ser apontada como a causa do surgimento de um movimento crítico na Alemanha da primeira metade do século XX, que demonstrou os elos entre a ingenuidade do saber científico com as formas de dominação construídas pela sociedade moderna
A empreitada da Escola de Frankfurt de deslocar a crítica para a esfera do poder permitiu compreender a falsa ideia que o saber possui de si mesmo e como a aproximação desmedida entre ambos – saber e poder – produziu consequências desastrosas e irremediáveis.
		
A Teoria Crítica, como enfrentamento à lógica de ciência positiva, surge em um momento histórico de otimismo na realização da revolução operária.
A Teoria Crítica
	Intelectuais da escola de Frankfurt (1937) 	Ideário contraposto ao paradigma cartesiano 	12 ensaios
O projeto de aliar a teoria marxista com as distintas disciplinas da ciência social através de uma metodologia fecunda e orientada filosoficamente representava, para Max Horkheimer, um dos fundadores da Escola de Frankfurt, uma forma de mediação necessária a partir do esgotamento no século XIX das premissas idealistas da filosofia da história hegeliana, que, até então, representavam a tradição teórica capaz de aliar análise empírica da realidade e reflexão filosófica, mas esvaziadas por terem sido absorvidas pelo positivismo e a metafísica contemporânea.
A base da Teoria Crítica de pensar uma filosofia da história a partir da pesquisa social, buscando meios cognitivos que possam mediar as relações sociais com uma ideia transcendental de razão, conduziu a uma sistemática crítica ao positivismo como tentativa metodológica de visualizar um conceito interdisciplinar de pesquisa.
A esta tradição, Horkheimer dá o nome de “Teoria Tradicional” ou hipotético-dedutiva. A “Teoria Crítica” é crítica da “Teoria Tradicional” sob um ponto de vista ético. Admitindo a impossibilidade de abandono absoluto com as realizações teóricas passadas, diferencia ambas propostas quanto à atitude do sujeito, ou seja, na relação do cientista para com a sociedade
A Teoria Crítica é uma concepção teórica que não perde de vista seu contexto social de origem e sua possibilidade de aplicação prática, pretendendo cumprir a tarefa de transformação radical da ordem social existente
Tal proposta exigia uma permanente reflexão no sentido de esclarecer seu papel no processo histórico, o que até então não era metodologicamente possível pela rígida divisão entre filosofia e ciência.
Buscando edificar o pensador social num agente de transformação, parte da eliminação da natural separação entre indivíduo e sociedade na medida em que, reconhecendo os limites de sua base social, busca um comportamento orientado para uma emancipação do todo social. A intenção do comportamento crítico é ultrapassar o da práxis social dominante. 
	E é exatamente aí que o conhecimento encontra seu lugar: o de admitir como pressuposto de racionalidade a permanente dinâmica social, articulando, assim, a reflexão teórica com o processo histórico-social. Em outras palavras, o objeto privilegiado da Teoria Crítica é a investigação acerca da articulação dialética entre os processos de conhecimento e transformação social. A pretensa isenção defendida pela Teoria Tradicional mostrava-se insustentável e deveria ser repudiada pelas consequências contra os humilhados da história. Havia servido de perverso instrumento de legitimação de formas alienantes e alienadas de formas de vida humana, legitimando racionalmente o enigma da “servidão voluntária”
	É neste contexto que deve ser compreendida a Escola de Frankfurt e a Teoria Crítica, como defesa de uma insurgência contra o positivismo que pretende aliar o conhecimento científico acerca dos fatos sociais à reflexão filosófica	
	Um traço marcante da Teoria Crítica é a oposição ao positivismo e ao empirismo, destacando e denunciando a crescente racionalidade instrumental e tecnológica que toma conta da sociedade ocidental como forma de dominação. A observação de que o mundo é reduzido a objeto de exploração técnica é relacionada pelos pensadores da Teoria Crítica ao método elegido pelas Ciências Sociais, considerando a consciência científica a principal fonte de declínio cultural através do qual a humanidade ingressou numa nova barbárie.
 1.4 - A REVISÃO DOS FUNDAMENTOS DO DIREITO NO BRASIL: CRISE E CRÍTICA
A entrada do pensamento crítico no direito se intensifica a partir da década de 60 desde a influência de pensadores e das ideias que vinham da Escola de Frankfurt e das teses de pensadores como Michel Foucault. Na Europa as inovações da Teoria Crítica encontravam um terreno fértil no ambiente pósguerra, que projetavam no campo jurídico a desmistificação do jusnaturalismo e do positivismo
A crítica jurídica se consolidou inicialmente na França por volta dos anos 70, culminando com o “manifesto” da Associação Crítica do Direito em 1978, atingindo, em seguida, a Itália, Espanha, Bélgica, Alemanha, Inglaterra e Portugal
Na América Latina, os “ventos” inovadores chegam por volta da década de 80, com o engajamento de juristas progressistas e comprometidos com a superação dos obstáculos políticos que impediam a construção e efetivação da democracia
As perspectivas epistemológicas, apesar de múltiplas, tinham como ponto em comum a defesa do rompimento com o positivismo legalista e revelando o caráter dominador e centralizador do direito hegemônico
Diferentemente da concepção moderna de ciência, coloca no interior da discussão jurídica as contradições e ambiguidades inerentes ao direito moderno, buscando tomar o direito como instrumento não de manutenção da ordem estabelecida, mas a possibilidade de emancipação do sujeito histórico tradicionalmente submerso em determinada normatividade repressora, mas também discutir e redefinir o processo de constituição do discurso legal mitificado e dominante
horizonte inovador, mas que trazia consigo a necessidade de rompimentos e abandonos teóricos
O saber jurídico moderno, até então uma sólida ciência que sustentava a racionalidade e autonomia do direito, viu-se esgotado
	A consciência jurídica crítica emerge num novo momento histórico brasileiro quando é iniciado o rompimento com o poder ditatorial, em fins dos anos 80, e a ação de novos atores sociais vai indicando que não se tratava somente de buscar novos conteúdos teóricos
	O momento apontava o esgotamento do pensamento tradicional, era um problema político que trazia consigo profundas implicações de conhecimento. Assim, construir um saber contra-hegemônico era uma questão epistemológica de consequências políticas irrenunciáveis.	
	A capacidade de percepção da complexa realidade não era tão somente uma questão de troca de

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