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/ DEFINIÇÃO Tópicos relevantes na implementação de políticas públicas. Nível de bens públicos e agregação. Representação e influência política. Teoria da escolha pública. PROPÓSITO Fornecer a compreensão de um modelo para provisão dos bens públicos e identificação de preferências, bem como das práticas de participação política e teorias sobre o funcionamento do governo, como a construção de sua agenda de prioridades. OBJETIVOS / MÓDULO 1 Identificar os modelos de oferta de bens públicos, a agregação das preferências e a participação política MÓDULO 2 Identificar o funcionamento do governo por meio da teoria da escolha pública e da agenda política INTRODUÇÃO Neste tema, vamos estudar conceitos e exemplos pertinentes à implementação de políticas públicas, destacando teorias e modelos relacionados ao funcionamento do governo. Fonte: WimStock / Shutterstock / No primeiro módulo, vamos tratar de um modelo de determinação da quantidade ofertada de bens públicos e formas de agregação das preferências. Trataremos também sobre representação e influência política, com destaque para a prática de lobby. Fonte: WimStock / Shutterstock No segundo módulo, vamos estudar a teoria da escolha pública e a definição da agenda política, pelas quais entenderemos como o governo e os governantes se comportam e como são escolhidas as políticas da agenda do governo. Além disso, são apresentados os mecanismos de controle operantes no Brasil. MÓDULO 1 Identificar os modelos de oferta de bens públicos, a agregação das preferências e a participação política MODELO DE OFERTA DE BENS PÚBLICOS / A discussão sobre a implementação de políticas públicas deste módulo será inicialmente abordada por meio de um modelo simples sobre oferta de bens públicos. Esse modelo é conhecido como precificação de Lindahl. Antes de apresentá-lo, alguns conceitos fundamentais serão definidos a seguir, tais como: BEM PÚBLICO Fonte: white snow / Shutterstock Bens que possuem duas características: são não rivais e não excludentes. Não rival significa que o consumo de determinado bem por uma pessoa não impede outra de consumi-lo ao mesmo tempo. Não excludente significa que uma pessoa não pode ser impedida de consumir determinado bem. Exemplo: poste de luz em uma rua aberta ao público. DISPOSIÇÃO A PAGAR / Fonte: George Rudy / Shutterstock O quanto, em valor monetário, uma pessoa valoriza um bem, de acordo com a quantidade consumida. Exemplo: uma pessoa pode estar disposta a pagar até R$20,00 por determinada roupa. BENEFÍCIO SOCIAL MARGINAL Fonte: G-Stock Studio / Shutterstock É o total da disposição a pagar de várias pessoas/sociedade, ou seja, o quanto a sociedade valoriza determinado bem de acordo com a quantidade. CUSTO SOCIAL MARGINAL / Fonte: Jade ThaiCatwalk / Shutterstock É o quanto a sociedade terá que pagar para ter, a sua disposição, uma unidade adicional. ATENÇÃO Vamos ilustrar com um exemplo simples. João e José moram em uma rua com iluminação precária: há apenas dois postes de luz, mas é necessário colocar um terceiro, que custa R$250,00. João está disposto a pagar R$100,00 para colocar esse poste de luz adicional, enquanto José está disposto a pagar R$200,00. O benefício social marginal do terceiro poste é a soma desses valores: R$300,00. O custo social marginal é simplesmente o custo em que eles incorrem para instalar o terceiro poste: R$250,00. Nesse modelo, assumimos que a sociedade como um todo quer o bem público, isto é, existe uma unanimidade para o fornecimento desse bem. O modelo verifica o benefício social marginal, que é a soma da disposição a pagar conjunta dos indivíduos que terão acesso àquele bem. / Fonte: Deni Williams / Shutterstock O benefício social marginal é comparado ao custo social marginal (custo de fornecimento daquele bem), determinando, assim, a quantidade de bem público capaz de maximizar o nível de bem- estar dessas pessoas. Além disso, é possível saber quanto o governo deve cobrar dos indivíduos a partir da disposição a pagar de cada um. PARA ILUSTRAR O MODELO, VEJAM, A SEGUIR, OS GRÁFICOS COM AS DEMANDAS DOS INDIVÍDUOS A E B POR UM BEM PÚBLICO QUALQUER. Cada curva de demanda revela a disposição a pagar dos indivíduos A e B. Suponha que, nesse mercado, o bem público apresente um custo marginal (por unidade adicional) constante no valor de $1,00, ou seja, qualquer unidade a mais custa o mesmo preço. / Essas curvas de demanda podem ser construídas por meio de uma pesquisa do governo a respeito das preferências dos indivíduos sobre determinado bem público. O governo, inicialmente, anuncia um preço. Em seguida, cada indivíduo revela a quantidade que deseja daquele bem público, dado o preço anunciado. Repete-se esse processo com diversos valores para se obter a curva de demanda, onde conseguimos ver a relação entre a disposição a pagar e a quantidade. Fonte: GRUBER, 2010. Gráfico1 – Curva de demanda do indivíduo A / Fonte: GRUBER, 2010. Gráfico2 – Curva de demanda do indivíduo B Nos gráficos, verificamos que o indivíduo A (primeiro gráfico) está disposto a pagar $1,00 pela primeira unidade do bem público. Na unidade de número 50, essa disposição a pagar cai para $0,50, e, na unidade de número 75, este indivíduo está disposto a pagar apenas $0,25. Já o indivíduo B (segundo gráfico), está disposto a pagar $3,00 pela primeira unidade, caindo para $1,50 na unidade de número 50, e apenas $0,75 na unidade de número 75. Fonte: PhuShutter / Shutterstock / Após conhecer as curvas de demanda de cada indivíduo, o governo pode construir uma curva de demanda para a sociedade. Isso significa que o governo deverá considerar a quantidade total demandada por todos os indivíduos (nesse caso, por A e B) para cada nível de preço. Somando a quantidade demandada pelos indivíduos A e B para cada nível de preço, obtemos uma curva de demanda agregada para o bem público em questão. No gráfico a seguir, encontram-se essa curva de demanda da sociedade e o custo marginal constante visto anteriormente. COM ESSAS INFORMAÇÕES, PODEMOS DETERMINAR O PREÇO E A QUANTIDADE QUE DEVEM VIGORAR: BASTA VERIFICAR QUAL É A DEMANDA PARA UM PREÇO IGUAL AO CUSTO MARGINAL. Graficamente, buscamos a interseção entre a curva de demanda e o custo marginal. Com base na disposição a pagar de cada indivíduo por essa quantidade, o governo pode, então, definir o imposto que cobrará. Veremos isso em detalhes. / Fonte: GRUBER, 2010. Gráfico 3 – Curvas de demanda agregada e custo marginal Com a demanda da sociedade (terceiro gráfico), verificamos outros valores, que são: 1 Pela primeira unidade, a sociedade está disposta a pagar $4,00 ($1,00 do indivíduo A + $3,00 do indivíduo B). Já na unidade 25, a sociedade está disposta a pagar $3,00 ($0,75 do indivíduo A + $2,25 do indivíduo B). 2 / 3 Na unidade 50, a sociedade está disposta a pagar $2,00 ($0,50 do indivíduo A + $1,50 do indivíduo B). Por fim, na unidade 75, a sociedade está disposta a pagar $1,00 ($0,25 do indivíduo A + $0,75 do indivíduo B). 4 As curvas de demanda da sociedade e de custo marginal constante se cruzam nos valores: preço $1,00 e quantidade 75. Nessa quantidade definida de 75, como o indivíduo A está disposto a pagar $0,25 e o indivíduo B está disposto a pagar $0,75, o governo cobrará $0,75 de imposto do indivíduo A e $0,25 do indivíduo B. A precificação de Lindahl está relacionada com o conceito do princípio do benefício. Neste, as pessoas devem pagar impostos com base nos benefícios obtidos por meio dos bens públicos. RESUMINDO De forma resumida, o modelo de Lindahl busca verificar o quanto cada pessoa valoriza individualmente determinado bem e, assim, determinar quanto a sociedade como um todo está disposta a pagar. A partir das diversas opiniões obtidas (disposição a pagar pelo bem público) e do custo marginal, o governo encontra a quantidade que deve ofertar.Como o governo também conhece a disposição a pagar de cada um, é possível, então, taxar essas pessoas de acordo com o valor que elas concedem para aquele bem. Alguns problemas, no entanto, impedem que este modelo seja completamente viável na prática. PREFERÊNCIA REVELADA / Fonte: pathdoc / Shutterstock O primeiro problema é conhecido como preferência revelada. No modelo de precificação de Lindahl, as pessoas têm um incentivo para mentir sobre sua disposição a pagar pelo bem público. Isso ocorre porque se a pessoa declara que valoriza muito esse bem, ela deverá pagar mais impostos. Se você disser que está disposto a pagar sozinho por um poste de luz na sua rua, os demais moradores podem ser oportunistas e dizer que não valorizam a iluminação: você pagará todo custo sozinho! Esse tipo de situação é conhecido como o problema do consumidor-carona, no qual uma pessoa tenta se beneficiar do bem público, mesmo sem arcar com seu custo. Uma pessoa que, por exemplo, anda de noite na rua e, logo, usufrui da iluminação pública, mas não está em dia com o pagamento da taxa que custeia esse serviço de iluminação, é um consumidor-carona. CONHECIMENTO DAS PREFERÊNCIAS Fonte: pathdoc / Shutterstock / O segundo problema é o conhecimento das preferências. Mesmo as pessoas estando propensas a falar a verdade sobre sua disposição a pagar pelo bem, ainda teriam dificuldade em dizer o valor exato que acreditam possuir determinado bem público. Sabendo que a defesa nacional é um bem público, considere a seguinte pergunta: Quanto você estaria disposto a pagar pela defesa nacional do seu país? Provavelmente, a maioria das pessoas não saberia responder a essa questão. AGREGAR AS PREFERÊNCIAS Fonte: pathdoc / Shutterstock O último problema é agregar as preferências. Mesmo as pessoas estando propensas a falar a verdade sobre sua disposição a pagar e sabendo precificar exatamente o bem público, o governo teria dificuldade em agregar as demandas para conhecer o benefício social. Imagine a dificuldade em perguntar a disposição a pagar dos 210 milhões de brasileiros referente a cada bem público existente. A partir desses três problemas, podemos observar que, apesar de apresentar conceitos e um modelo de forma clara, a precificação de Lindahl é inviável de ser aplicada na prática. ESTIMANDO A DISPOSIÇÃO A PAGAR POR AR LIMPO / Fonte: Song_about_summer/ Shutterstock Apesar de saber da dificuldade em verificar a disposição a pagar das pessoas por bens públicos, alguns economistas buscam encontrar métodos alternativos para descobrir as preferências das pessoas. O estudo Disposição a pagar por ar limpo: evidências do mercado de purificador de ar na China, realizado por Koichiro Ito e Shuang Zhang, apresenta uma dessas alternativas. Os dois pesquisadores pretendiam descobrir a disposição a pagar das pessoas por ar limpo. Para isso, eles usaram como aproximação a compra de aparelhos de purificação de ar. Por meio de um modelo estatístico, foi possível estimar quanto as pessoas estavam dispostas a pagar anualmente: $1,34 para cada micrograma por metro cúbico de PM10 (partícula inalável que constitui um elemento da poluição do ar). AGREGANDO AS PREFERÊNCIAS Como vimos, o modelo de Lindahl trabalha com a hipótese de que exista unanimidade pela oferta de determinado bem público, uma vez que toda sociedade o deseja. Com isso, é factível que o governo forneça a quantidade eficiente do bem público, dada pela interseção entre a demanda total pelo bem e o seu custo. No entanto, não é isso que verificamos normalmente. / Fonte: M.Moira / Shutterstock Um mecanismo muito utilizado pelos governos para agregar as preferências individuais é o voto majoritário. Nesse mecanismo, o governo coloca as opções de política para votação e os cidadãos escolhem de acordo com suas preferências. A opção que receber mais votos é a escolhida. Para que a escolha majoritária realmente agregue as preferências de maneira consistente, há três fatores: DOMÍNIO TRANSITIVIDADE INDEPENDÊNCIA DAS ALTERNATIVAS IRRELEVANTES Se todos os eleitores preferem uma determinada opção, a agregação faz com que essa seja a opção escolhida pela sociedade; Se um indivíduo prefere A a B, e B a C, deve também preferir A a C; Se um indivíduo prefere A a B quando essas são as duas únicas opções, ele deve continuar preferindo A a B quando mais alternativas são acrescentadas. Essas três condições são necessárias para que possamos agregar as preferências de maneira satisfatória. Suponha que um grupo de pessoas precise decidir sobre um projeto em conjunto. As três pessoas do grupo são: José, João e Maria. Eles têm que decidir entre os projetos A, B e C. José tem preferência de acordo com a seguinte ordem: A, B e C. Enquanto isso, João prefere a ordem C, B e A. Já Maria, tem a ordem de preferência B, C e A. O grupo decidiu que utilizará o voto / majoritário para escolher o projeto, e as votações serão feitas comparando as possibilidades até que seja encontrado o vencedor. Ranking José João Maria 1 A C B 2 B B C 3 C A A Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal Fonte: Sergey Tinyakov / Shutterstock A primeira votação é para escolher entre os projetos A e C. José votará em A, pois prefere A a C. João votará em C, já que prefere C a A. Maria votará em C, porque prefere C a A. O projeto C tem dois votos e o A tem um voto, logo, o C vence. / Fonte: nullplus / Shutterstock A segunda votação é para escolher entre os projetos A e B. O mesmo processo é implementado, fazendo com que o projeto A tenha um voto (José) e o projeto B tenha dois votos (João e Maria). O projeto B, portanto, vence. / Fonte: Sergey Tinyakov / Shutterstock A terceira votação é entre os projetos B e C. O projeto B terá dois votos (José e Maria) e o C terá um voto (João). Com isso, o projeto B vence. Como o projeto B venceu em duas votações das três realizadas, consideramos que seja o vencedor. Nesse caso, independentemente da ordem das votações entre dois projetos diferentes, o projeto B sempre será o preferido. Assim, vimos como o voto majoritário consegue agregar as preferências da sociedade. Suponha agora que João seja substituído por Ana, que possui a seguinte preferência: C, A e B. Sabendo dessa informação, vamos repetir a votação feita acima. Ranking José Ana Maria 1 A C B 2 B A C / 3 C B A Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal Quadro 2 – Preferências individuais de José, Ana e Maria Fonte: Africa Studio / Shutterstock A primeira votação é para escolher entre os projetos A e C. Nessa votação, C tem dois votos (Ana e Maria) e A tem um voto (José). O projeto C, então, vence a votação. / Fonte: Lisa-S / Shutterstock A segunda votação é para escolher entre os projetos A e B. O projeto A tem dois votos (José e Ana) e o projeto B tem um voto (Maria). Logo, o projeto A vence. Fonte: Africa Studio / Shutterstock / A última votação é entre os projetos B e C. O projeto B tem dois votos (José e Maria) e o projeto C tem um voto (Ana). Com isso, o projeto B vence. Fonte: omphoto / Shutterstock Note que, dessa vez, independente da ordem de votação, não haverá um vencedor claro. Dadas as duas primeiras votações, onde C é preferido a A, e A é preferido a B, pela propriedade da transitividade, seria necessário que C fosse preferido a B. Como isso não ocorre, a propriedade da transitividade é violada. O voto majoritário, então, falha nesse caso. Em casos em que essa propriedade é violada, a pessoa responsável por organizar a ordem da votação pode acabar manipulando o resultado final. Suponha que o responsável por essa ordem queira que o projeto C saia vitorioso. Ele pode organizar a votação da seguinte forma: Na votação entre os projetos A e B, o projeto A vence / Depois, temos a votação entre os projetos A e C, com C sendo o projeto vencedor Se o organizador da votaçãoquiser que o projeto A vença, ela poderia ser organizada de outro modo, como veremos a seguir: Primeiro, teríamos B contra C, com B vencendo a votação Em seguida, na votação entre A e B, A sairia como vencedor TEOREMA DA IMPOSSIBILIDADE DE ARROW Algumas falhas também podem ocorrer em outros sistemas diferentes do majoritário, que acabamos de ver. No exemplo que apresentamos, em que José, Ana e Maria tinham que escolher um projeto, qualquer sistema de votação seria incapaz de agregar as preferências de maneira consistente. Se a votação envolvesse a escolha do projeto de maior preferência, José escolheria A, Ana escolheria C e Maria escolheria B. A votação estaria, dessa forma, empatada. Se o sistema de votação fosse por pontos (primeira opção = três pontos, segunda = dois pontos, e terceira = um ponto), também haveria empate, com cada projeto tendo, ao fim, seis pontos. Um resultado importante sobre a situação descrita é o teorema da impossibilidade de Arrow. Esse teorema revela que, fora algumas situações específicas, um sistema de votação é incapaz de agregar as preferências de forma consistente. / Para resolver o problema da impossibilidade, é possível considerar apenas preferências com pico único. UM PICO SERIA UMA OPÇÃO PREFERIDA EM RELAÇÃO AOS DEMAIS AO REDOR, ISTO É, A OPÇÃO COM MAIOR PONTUAÇÃO NA ESCALA DE PREFERÊNCIA DE UMA PESSOA. AS PREFERÊNCIAS COM PICO ÚNICO REVELAM UMA ÚNICA OPÇÃO COM PONTUAÇÃO MAIOR, DE FORMA QUE QUALQUER OUTRA OPÇÃO LEVARÁ A UMA QUEDA DO BEM-ESTAR/UTILIDADE DESSA PESSOA. Caso haja preferências com pico único, as votações majoritárias conseguirão agregar as preferências de maneira consistente. Podemos verificar isso nos dois gráficos a seguir, onde estão representadas as ordens preferências de cada pessoa do grupo de acordo com a pontuação firmada anteriormente (primeira opção = três pontos, segunda = dois pontos, e terceira = um ponto). No gráfico 4, estão representadas as ordens de preferências de José, João e Maria. Há apenas um pico na curva de preferências de cada um deles. Já no gráfico 5, que representa as preferências de José, Ana e Maria, as curvas de José e Maria continuam com pico único, porém a curva de Ana apresenta dois picos. A curva de Ana inicia com pico no projeto A, caindo com o projeto B e subindo novamente com o projeto C. Logo, podemos dizer que a curva de preferências de Ana é uma curva com múltiplos picos. / Fonte: GRUBER, 2010. Gráfico 4 – Curvas de preferência de João, José e Maria Fonte: GRUBER, 2010. Gráfico5 – Curvas de preferência de Ana, José e Maria Tais resultados coincidem com os exemplos das duas votações realizadas. Na primeira situação, José, João e Maria conseguem agregar suas preferências por meio da votação, de modo que encontramos curvas com pico único. Já na segunda situação, com a votação realizada por José, Ana e Maria, não é possível agregar suas preferências e encontramos a curva de Ana com dois picos. / TEORIA DO ELEITOR MEDIANO Além do voto majoritário, temos também a teoria do eleitor mediano. De acordo com ela, o voto majoritário gera um resultado igual ao do eleitor mediano caso as preferências tenham pico único. O ELEITOR MEDIANO É A PESSOA QUE ESTÁ EXATAMENTE NO MEIO DO CONJUNTO DOS ELEITORES, DE FORMA QUE EXISTE UM NÚMERO IGUAL DE PESSOAS QUE GOSTAM MAIS E MENOS DE UMA DECISÃO ESPECÍFICA. COMENTÁRIO No exemplo da primeira votação, entre José, João e Maria, Maria seria a eleitora mediana. Para que o governo selecione o melhor nível de bem público a ser ofertado à sociedade, é preciso escolher uma pessoa que esteja exatamente no meio da distribuição de preferências. EXEMPLO Na discussão sobre a criminalização do porte de armas, por exemplo, uma pessoa no meio da distribuição não se posicionaria completamente a favor, nem completamente contra. O governo não precisa, portanto, saber a preferência de todas as pessoas, mas encontrar o eleitor mediano e aplicar sua preferência. A escolha pode não levar à eficiência, como foi visto no modelo de Lindahl, já que a eficiência é alcançada quando o benefício social marginal se iguala ao custo social marginal. / Fonte: Air Images / Shutterstock Na realidade, as pessoas não votam em projetos que o governo pretende realizar para que o nível de bem público ofertado seja selecionado. Em países democráticos, os cidadãos selecionam seus representantes, que assumem a responsabilidade de tomar as decisões em nome da população. Dessa forma, é possível dizer que a teoria do eleitor mediano também pode ser utilizada para estudar o comportamento dos políticos. Para analisar esse comportamento, a teoria do eleitor mediano assume que os políticos buscam atrair o eleitor mediano para que seus votos sejam maximizados. PARA EXEMPLIFICAR ESSA TEORIA, VAMOS CONSIDERAR UM EXEMPLO: EXEMPLO Suponha que haja dois candidatos e um espectro político, isto é, um sistema de classificação das posições políticas indo de um (extrema esquerda) até dez (extrema direita). Esses dois políticos devem, então, se posicionar para maximizar seus votos. / VAMOS IMAGINAR QUE O CANDIDATO A TENHA SE POSICIONADO NA EXTREMA ESQUERDA. O CANDIDATO B SE PERGUNTARÁ, DADO A POSIÇÃO DO CANDIDATO A: “QUAL POSIÇÃO DEVO ESCOLHER?”. 1 Sabendo que cada posição representa 10% dos votos, o candidato B escolherá a posição 2. Isso porque, nessa posição, o candidato B conseguirá os votos da posição 2 a 10, acumulando 90% dos votos. Assim, o candidato A ficará com apenas 10% dos votos, como representado na figura ao lado: Agora, sabendo que isso ocorrerá, o candidato A se perguntará: “Será que a posição 3 será melhor?”. O candidato A decide, então, pela posição 3 e acumula 80% dos votos, deixando o candidato B com apenas 20% restantes dos votos, como representado na figura ao lado. / 2 3 Repetindo essas decisões algumas vezes, chegamos ao cenário em que o candidato A estará na posição 5 e o candidato B, na posição 6. Cada candidato terá, nesse caso, 50% dos votos, como na figura ao lado. A conclusão que tiramos desse cenário é que os candidatos se posicionarão ao centro para conquistar o maior número de votos possíveis. / HIPÓTESES DA TEORIA DO ELEITOR MEDIANO Neste vídeo, abordaremos com detalhes as seis hipóteses da teoria do eleitor mediano. Outro ponto a destacar é o lobby. Essa prática se refere à influência articulada por grupos organizados com o objetivo de interferir em decisões políticas. Esse tipo de prática pode ser organizado por diversos grupos, como empresários, sindicatos, estudantes, ambientalistas, entre outros. Nesse conceito, o lobismo não configura corrupção, mas certa pressão sobre políticos / realizada por grupos organizados. O interesse de políticos no lobismo pode ocorrer por dois motivos: Fonte: Reshetnikov_art / Shutterstock Os grupos de interesse podem fornecer informações relevantes sobre determinado assunto. / Fonte: Rawpixel.com / Shutterstock Os grupos de interesse podem recompensar o político que os apoiou mediante doações de campanhas, influenciando o voto dos eleitores. Fonte: KAMONRAT / Shutterstock O problema do lobismo surge quando um grupo de interesse apresenta projetos que impõem prejuízos para a sociedade, enquanto geram ganhos para o seu grupo. Nesse caso, entramos no problema do consumidor-carona. Mesmo os benefícios estando concentrados em determinado grupo, seria muito difícil para o resto da população se mobilizar a ponto de conter essa ação do / grupo lobista. Os benefícios encontram-se, portanto, concentrados, enquanto os custos são dispersos. EXEMPLO Um exemplo da situação que acabamos de descrever são os subsídios fornecidos para diversos setores da economia, mesmo quando eles não apresentam qualquer externalidade positiva, isto é, quando nenhum efeito positivo é gerado pela produção desses setores a terceiros. PLEBISCITOS E REFERENDOS NO BRASIL Fonte: Minerva Studio / Shutterstock No tópicoanterior, vimos que diversos países são democracias representativas. Isso significa que os cidadãos ficam responsáveis por selecionar, por meio de eleições, seus representantes no governo. A partir disso, tais representantes eleitos serão responsáveis por decidir a quantidade a ser fornecida de bens e serviços pelo governo Outra opção é a democracia direta, onde os cidadãos decidem as ações do governo, como demonstrado nos modelos iniciais deste tema. Algumas vezes, os governos propõem que certas decisões sejam feitas pelos eleitores e não por seus representantes. Existem dois mecanismos utilizados para pôr em prática a democracia direta: o plebiscito e o referendo. / PLESBICITO O plebiscito é convocado previamente ao ato legislativo ou administrativo que trata de um determinado assunto. REFERENDO O referendo é uma consulta a população após o ato legislativo ou administrativo feito. Esses instrumentos podem ser utilizados em qualquer nível da federação, isto é, os governos federal, estadual ou municipal podem fazer essa consulta à população, desde que esteja de acordo com a legislação aplicável. EXEMPLO / Um exemplo foi o plebiscito realizado no Brasil em 1993. Nessa consulta, a população decidiu a forma de governo (república ou monarquia) e o sistema de governo (presidencialista ou parlamentarista). Os resultados foram: república com 86,6% dos votos e monarquia com 13,4%; sistema presidencialista com 69,2% e parlamentarismo com 30,8% dos votos. Com esse plebiscito, ficou definido, portanto, que o Brasil seguiria como uma república presidencialista. Fonte: Stefano Chiacchiarini / Shutterstock O Brasil realizou também um referendo em 2005. Nessa consulta, foi feita uma pergunta sobre o artigo 35 do estatuto do desarmamento: “O comércio de arma de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?”. O resultado foi “Não” com 63,94% e “Sim” com 36,06% dos votos. EXEMPLO Um exemplo de plebiscito em nível estadual ocorreu no estado do Pará no ano de 2011. Nessa consulta, a população respondeu sobre a divisão do estado do Pará em três: Pará, Carajás e Tapajós. Para Carajás, o resultado foi “Não” com 66,6% e “Sim” com 33,4%. Para Tapajós, o resultado foi “Não” com 66,08% e “Sim” com 33,92%. LOBBY NO BRASIL E EM OUTROS PAÍSES / Fonte: Pressmaster / Shutterstock O lobby pode ser uma ferramenta utilizada por setores da sociedade para exercer influência na tomada de decisão dos políticos. No Brasil, assim como em outros países, existem grupos de interesses que estão em constante contato com diversos órgãos do governo para discutir suas ideais. Um estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), chamado Propostas de regulamentação do lobby no Brasil: uma análise comparada, apresenta uma discussão sobre o lobismo, assim como possíveis regulamentações e medidas adotadas por outros países para lidar com essa prática. O primeiro ponto abordado é a discussão sobre a regulamentação do lobismo, com foco nos grupos favoráveis e contrários. O grupo favorável à regulamentação diz que é essencial a existência de regras que promovam deliberação, transparência e accountability (termo utilizado em referência à prática de prestação de contas). Com isso, a sociedade poderia ter conhecimento de forma clara dos interesses em jogo, dos recursos utilizados para tentar influenciar os políticos e dos mecanismos de responsabilização dos agentes públicos e lobistas pelos seus atos. O grupo contrário, por sua vez, argumenta que a regulamentação pode limitar o acesso à política, atrapalhar as negociações e ter um custo-benefício ruim para o Estado. Para esse grupo, o / excesso de formalização pode criar barreiras para as pessoas terem acesso aos políticos, além dos custos envolvidos no processo de credenciamento, disponibilização de informações, entre outros. Grupos com menos recursos financeiros poderiam, dessa forma, ser prejudicados pela regulamentação. Outro argumento é que a confidencialidade é necessária para formulação de boas políticas. Por fim, o último argumento está relacionado aos custos incorridos pelo Estado com a criação de agências para controle e monitoramento da atividade, podendo não compensar a regulamentação no caso de custos muito altos. Outro ponto do estudo é a apresentação dos modelos de regulamentação do lobby, divididos em três práticas: legislação indireta, legislação específica e autorregulação. Fonte: Atstock Productions / Shutterstock A legislação indireta tem o objetivo de criar códigos de conduta e ética para os funcionários públicos e políticos a fim de evitar práticas corruptas. Esses códigos normalmente são estabelecidos por meio de decretos e resoluções. / Fonte: YP_Studio / Shutterstock A legislação específica é feita por diplomas legais específicos e superiores na hierarquia do ordenamento jurídico. Fonte: Rawpixel.com / Shutterstock A autorregulação são códigos de conduta autodefinidos pelos lobistas e todos os outros agentes envolvidos. SAIBA MAIS / No Brasil, existe apenas a legislação indireta, como a resolução nº 47/2013 (Código de ética e decoro parlamentar da Câmara dos Deputados), a resolução nº 20/1993 (Código de ética e decoro parlamentar do Senado), o decreto nº 1171/1994 (Código de ética do servidor público civil do poder executivo federal) e o decreto nº 4334/2002 (regulamentação das audiências concedidas a particulares por agentes públicos). O terceiro ponto do estudo do IPEA é o CPI score, um indicador criado pelo Centro para Integridade Pública para indicar o grau de regulamentação do lobismo. Além de descrever a metodologia por trás do cálculo desse indicador, o estudo em questão destaca que o CPI score tem como objetivo avaliar as regras para a atividade do lobby em termos de transparência e accountability. O indicador varia entre 0 e 100 e apresenta três categorias: altamente regulamentado (acima de 60), intermediários (30 a 59) e pouco regulamentados (abaixo de 30). CENTRO PARA INTEGRIDADE PÚBLICA Center for Public Integrity, organização americana sem fins lucrativos. O estudo aponta que cada categoria tem sua vantagem e desvantagem. MODELOS COM BAIXA REGULAMENTAÇÃO Modelos com baixa regulamentação implicam em baixa transparência e accountability. Mesmo sendo possível identificar os lobistas, não há conhecimento dos custos e de quem influencia quem. javascript:void(0) / As vantagens desse sistema decorrem do baixo custo arcado pelos lobistas ou grupos de interesse, garantindo a participação de grupos com menos recursos, além do pequeno aparato de controle do Estado, implicando também em custos menores para o governo. Esse modelo é utilizado pela Polônia, Comissão Europeia, Alemanha e o Parlamento Europeu. MODELO DE REGULAÇÃO INTERMEDIÁRIA O modelo de regulação intermediária oferta maior grau de transparência e accountability, permitindo saber quem faz o lobby, com quem os lobistas estão se relacionando e os interesses defendidos. Porém, nesse tipo de regulação, não é possível ter acesso aos gastos com a atividade de lobismo. Os custos mais elevados para o controle e os resultados incertos são a desvantagem. Tal incerteza decorre da falta de clareza na definição de quem é lobista e de quem pode praticar a atividade, gerando, assim, insegurança jurídica. Países como Austrália e Hungria optaram por esse modelo. MODELO DE ALTA REGULAÇÃO Esse modelo apresenta informações detalhadas sobre a atividade lobista, o que torna extremamente transparente a relação de lobistas com políticos. / Porém, o sistema apresenta dois problemas fundamentais. O primeiro é o alto custo de fiscalização, como já foi apontado. O segundo tem relação com o excesso de preocupação com o que é legal e ilegal na relação entre o lobista e o político. Como as punições são claras e fortes, a interação entre os atores públicos pode acabar sendo desestimulada. O modelo de alta regulação é aplicado apenas pelos EUA. Fonte: Alexey Struyskiy / ShutterstockPor fim, os pesquisadores apontam que é necessário um esforço para melhorar a regulamentação no Brasil e aumentar sua transparência, ainda que sem a criação de grandes barreiras de participação uma vez que, como vimos, o lobismo representa uma importante prática de conexão entre diversos grupos da sociedade e a classe política. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. NO MODELO DE LINDAHL, PARA O GOVERNO CONSTRUIR A DEMANDA DA SOCIEDADE PELO BEM PÚBLICO É NECESSÁRIO: A) Somar as demandas individuais horizontalmente. B) Somar as demandas individuais verticalmente. C) Verificar o pico da função de bem-estar. / D) Verificar a demanda mais inclinada. 2. DE ACORDO COM A TEORIA DO ELEITOR MEDIANO, É CORRETO AFIRMAR QUE: A) Candidatos se aproximam dos extremos para conseguir mais votos. B) O modelo considera múltiplos candidatos. C) O modelo considera que candidatos não têm informação perfeita. D) Candidatos tentam se aproximar do eleitor mediano para obter mais votos. GABARITO 1. No modelo de Lindahl, para o governo construir a demanda da sociedade pelo bem público é necessário: A alternativa "B " está correta. Para conseguir a demanda agregada da sociedade, é necessário conhecer as demandas individuais e somá-las verticalmente. Ou seja, para cada unidade produzida, fazemos a pergunta: “Quanto cada pessoa está disposta a pagar por essa unidade?”. Somamos esses valores e obtemos com isso o quanto a sociedade está disposta a pagar. 2. De acordo com a Teoria do Eleitor Mediano, é correto afirmar que: A alternativa "D " está correta. Essa é exatamente a hipótese da teoria do eleitor mediano: os candidatos só querem maximizar o número de votos, e para isso o ideal é ficar tão perto quanto possível do centro, ou seja, do eleitor mediano. Com isso, atraem votos de todos os lados do espectro político. / MÓDULO 2 Identificar o funcionamento do governo por meio da teoria da escolha pública e da agenda política TEORIA DA ESCOLHA PÚBLICA A teoria da escolha pública procura explicar o funcionamento do governo. De acordo com esta, o objetivo do governo não é buscar o máximo de bem-estar para os cidadãos. Tal argumento rompe, dessa forma, com a hipótese de que o governo sempre age de maneira benevolente. A primeira ideia da teoria trata dos burocratas, pessoas responsáveis por prestar serviços do governo, e discute a possibilidade dessas pessoas poderem estar mais interessadas na sua autopreservação e no seu crescimento individual, ao invés da execução eficiente dos objetivos do governo. Fonte: J Walters / Shutterstock. / No modelo de maximização do orçamento administrado pelo burocrata, criado por William Niskanen, os burocratas são responsáveis por administrar algum órgão do governo, que possui o monopólio na oferta de algum serviço ou bem público. Nesse modelo, à diferença das empresas privadas, que pagam seus funcionários com base na eficiência, burocratas são mais bem remunerados de acordo a quantidade de serviços e bens que ofertam. Sendo assim, o burocrata tende a buscar sempre maximizar o tamanho do órgão governamental e, com isso, maximizar seu orçamento, deixando de escolher o nível de serviço e bens que maximiza o bem-estar da população. A partir disso, surgem alguns questionamentos sobre a possibilidade de certos bens e serviços serem mais bem ofertados pelo setor privado, no lugar do governo. O QUE SE OBSERVA NAS EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS, ISTO É, NA REALIDADE DEMONSTRADA PELOS DADOS, É QUE BENS PRIVADOS (COMO PRODUÇÃO DE AÇO, TELECOMUNICAÇÕES E BANCOS) FORNECIDOS POR EMPRESAS PRIVADAS SÃO, COM FREQUÊNCIA, MUITO MAIS EFICIENTES. AS EMPRESAS TRANSFORMAM A VISÃO DO PENSAMENTO BUROCRATA EM UMA VISÃO MAXIMIZADORA DE LUCRO, RESULTANDO EM GANHOS DE PRODUTIVIDADE E EFICIÊNCIA. Há, no entanto, algumas limitações para o uso desse modelo. / A primeira limitação vem dos monopólios naturais. Alguns mercados possuem características específicas que tornam naturalmente mais eficiente a produção por apenas uma empresa. A principal característica está ligada ao custo marginal de produção decrescente, ou seja, a cada produto adicional que a empresa produz, o custo dessa unidade extra se reduz. Essa característica é muito comum em setores que encaram um custo fixo (aquele que independe do nível de produção) extremamente elevado, permitindo que o custo médio decresça com o aumento da quantidade produzida (economia de escala). Usinas hidroelétricas e sistemas de saneamento são exemplos de atividades com alto custo fixo e baixo custo marginal. Como alguns mercados são monopólios naturais, a presença de oferta privada não teria concorrência e faria com que privatizações resultassem em custos mais elevados para os consumidores. / Fonte: MIND AND I / Shutterstock. Uma opção intermediária, entre a privatização e a empresa pública, seria o governo contratar empresas privadas para fornecimento do serviço. Nesse sistema, ele poderia aproveitar o sistema de competição fazendo uma licitação competitiva. Assim, manifestaria o interesse em determinado serviço e a empresa selecionada seria aquela que presta o serviço da maneira mais eficiente. Note que, nesse sistema, o governo consegue aproveitar ao mesmo tempo a economia de escala e a eficiência do mercado competitivo. / Fonte: Maryna Pleshkun / Shutterstock. Em alguns casos, porém, a contratação de serviços privados não garante que haja competição. Há situações em que os burocratas buscam se aproveitar do poder e não executam o contrato com a empresa mais eficiente, mas, sim, com aquela que oferece mais poder a ele, como pode ocorrer, por exemplo, por meio de propinas. A teoria do Leviatã, criada por Brennan e Buchanan, é outra abordagem para entender a atuação do governo. Nessa teoria, o órgão do governo e o burocrata são, na realidade, uma entidade e o pensamento é próximo ao que acabamos de ver: essa entidade tenta maximizar o tamanho do setor público se aproveitando da ignorância dos eleitores. Logo, a partir desse entendimento, as pessoas não poderiam confiar no governo para gastar seu dinheiro e deveriam criar mecanismos para bloquear a ganância do governo. Com essa visão do governo, podemos entender melhor uma série de regras que existem em diversos países controlando assuntos como orçamento do governo, divisão de poderes, entre outros. Outro modo de combater a ineficiência governamental seria a competição política, onde a / disponibilidade de opções políticas pode gerar pressões a favor da melhor oferta de serviços públicos. Fonte: Artem Oleshko / Shutterstock. Outro problema que surge dessa visão de governo é a corrupção, situação em que o agente público tira proveito do governo para ganhos pessoais. Uma forma de evitar seria questionar sempre o político, o que poderia ser feito por meio do accountability, isto é, da prestação de contas do político. Essa ferramenta implica, basicamente, no esclarecimento de como os recursos do governo estão sendo gastos, podendo ser interpretada também como transparência. A prática de corrupção parece ser mais propensa em locais onde há mais red tape, ou seja, locais com excesso de burocracia ou regulamentações. Tais excessos de regras criam barreiras que, por sua vez, deixam os custos das empresas mais elevados. DEFINIÇÃO DE AGENDA Definição de agenda é um conceito que pode ser traduzido como a organização da agenda política. / Em outras palavras, o processo de problemas e soluções que ganham e perdem a atenção do público e da elite. A competição entre grupos de interesse por espaço nessa agenda é intensa porque as instituições políticas têm restrições de recursos e, com isso, devem focar em assuntos selecionados. A agenda possui diversos níveis podendo ser de interesse federal, estadual ou municipal. AGENDA UNIVERSAL O processo de definição de agenda possui diversas dimensões. A primeira é a agenda universal, com todos os assuntos possíveis que podem ser discutidos pela sociedade ou pelo sistema político.Podemos discutir até mesmo assuntos fora da alçada de um governo, como: “Deveríamos trazer todos os jogadores do futebol europeu para o Brasil?”. Na democracia, pode parecer que é possível as ideias sejam discutidas livremente e de qualquer forma, porém, há situações que impedem alguns discursos. Nos EUA, por exemplo, é permitido o uso de símbolos nazistas e até a existência de grupos nazistas, devido à constituição americana e à primeira emenda, que garantem o direto à livre expressão. Diferente disso, no Brasil e em muitos outros países, símbolos e grupos nazistas são proibidos. Esse cenário demonstra que leis podem impedir a participação de certas ideias na agenda, assim como a pressão social. Mesmo havendo nos EUA permissão para expressar qualquer tipo de ideia, isso não significa que as instituições aceitem discutir ideias condenadas pelas normas sociais. AGENDA SISTEMÁTICA A segunda dimensão é a agenda sistemática, que inclui todos os assuntos que os políticos entendem que mereçam atenção do público e envolvam assuntos internos à jurisdição legítima do governo. Por exemplo, a agenda sistemática do governo federal pode incluir uma discussão sobre a liberação de armas de fogo, ou de consumo de drogas: o governo federal pode propor alterações legais para implementar essas mudanças. A diferença entre a primeira e a segunda dimensão é a jurisdição do governo. AGENDA INSTITUCIONAL A terceira dimensão é a agenda institucional, com a lista de ideais que são explicitamente colocadas para considerações sérias e ativas das autoridades responsáveis por tomarem as decisões. Por exemplo, o Congresso pode debater a Reforma Tributária proposta pelo governo federal. / AGENDA DE DECISÃO A última dimensão é a agenda de decisão, com os assuntos sobre os quais as instituições estão propondo e aprovando ordens. Por exemplo, o Congresso pode aprovar medidas de alívio econômico durante a pandemia da Covid-19. É evidente, dessa forma, que o objetivo de qualquer grupo é que suas ideias saiam da agenda sistemática e ocupe a agenda de decisão, enquanto outros grupos terão o objetivo oposto, ou seja, bloquear essas ações. No processo de construção da agenda, alguns grupos normalmente possuem mais poder do que outros. Poder aqui pode ser definido como a capacidade de obrigar as pessoas a fazer algo, mesmo contra sua vontade. ATENÇÃO Os dois tipos de poder são os comentados anteriormente: os que se referem à capacidade de passar e de bloquear projetos. Fonte: FrameStockFootages / Shutterstock. / Os grupos minoritários podem utilizar recursos para melhorar a posição de seus projetos na formação da agenda. Tais recursos podem ser, por exemplo, símbolos e imagens para atrair a atenção da mídia e simpatia do público. Esses grupos também podem apelar para instituições em níveis superiores como, por exemplo, em casos onde um projeto é rejeitado em nível municipal e acaba sendo oferecido para discussão em nível estadual. Parte importante do processo de formação da agenda política reside na forma como um problema é definido. Para entender melhor, precisamos saber sobre suas condições, símbolos, história causal, indicadores e eventos em foco. ELEMENTOS PARA DEFINIÇÃO DA AGENDA POLÍTICA Neste vídeo, abordaremos alguns dos elementos para a definição da agenda política. / MECANISMOS DE CONTROLE NO BRASIL Um instrumento citado e importante para controlar o comportamento dos burocratas, sejam eles eleitos ou não, é o accountability. No Brasil, esse instrumento é utilizado e possui órgãos públicos que têm competências distintas para essa atividade. O PROCESSO DE ACCOUNTABILITY GERA UMA NECESSIDADE POR INSTITUIÇÕES QUE TENHAM PROFISSIONAIS ALTAMENTE ESPECIALIZADOS E COM MANDATO ESTABELECIDO. A prática de accountability está dentro do processo de freios e contrapesos, ou seja, das medidas de descentralização do poder. Além disso, essas instituições não devem agir de forma isolada e devem ter a participação dos três poderes. As quatro instituições mais importantes para o processo de accountability são: Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público (MP), Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU). Todas essas instituições fiscalizam, controlam, corrigem e instruem judicialmente ações contra gestores públicos e políticos, em casos de atitudes que vão contra o interesse público. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU) / Fonte: Diego Grandi / Shutterstock. O TCU é um órgão de controle externo do governo federal e auxilia o Congresso Nacional na missão de acompanhar a execução orçamentária e financeira do país, e contribuir para o aperfeiçoamento da administração pública. Além disso, o TCU também é responsável por observar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Lei de Licitações e Contratos e a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Essa instituição é um órgão colegiado, composto por nove ministros, sendo seis escolhidos pelo Congresso Nacional, um escolhido pelo presidente da república, necessitando a aprovação do senado, e dois escolhidos entre os ministros-substitutos e membros do Ministério Público junto ao TCU. MINISTÉRIO PÚBLICO Fonte: Tarcisio Schnaider / Shutterstock. / O Ministério Público tem como funções, de acordo com a Constituição Federal de 1988, a defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis; a defesa da ordem jurídica; e a defesa do regime democrático. A instituição também é responsável por fiscalizar, controlar e punir irregularidades de gestão. O MP brasileiro é dividido em dois: Ministério Público da União e Ministério Público Estadual. O Ministério Público da União é dividido em mais quatro: Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Militar (MPM) e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). O chefe do Ministério Público da União, também responsável pelo Ministério Público Federal, é o Procurador-Geral da República. Esse é indicado pelo presidente da república e, mediante aprovação do Senado, pode exercer o cargo. POLÍCIA FEDERAL Fonte: Sergio Ariel / Shutterstock. A Polícia Federal é instituída por lei como órgão permanente organizado e mantido pela União. A PF tem as funções de apurar infrações penais de interesse da União e casos interestaduais, prevenir e reprimir o tráfico de drogas e contrabando e agir como polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras. Essa instituição também é organizada em carreira, o que significa que existem regras para acesso a cargos, definição de hierarquia, previsão de regras para ascensão a cargos e as subdivisões da organização. Os responsáveis pela PF são o ministro da justiça e o diretor- geral da PF, que são escolhidos pelo presidente da república. CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO / Fonte: Diego Grandi / Shutterstock. A Controladoria-Geral da União tem como objetivo de controle interno do governo federal e combate a corrupção. A lei nº 10683/2003 criou a instituição e o órgão também tem a garantia da autonomia funcional. A CGU também é responsável pelo Portal de Transparência do governo federal, onde é possível ver informações sobre o orçamento, receitas, despesas, licitações, transferências para estados e municípios, servidores públicos, emendas parlamentares, entre outros. O ministro do CGU é escolhido pelo presidente da república. BASE DE DADOS SOBRE DEFINIÇÃO DE AGENDA NO BRASIL E NO MUNDO Uma forma de ver a importância de um determinado assunto é analisar o quanto ele está presente na agenda do governo. Para analisar essas informações, o Center for American Politic and Public Policy (CAPPP) oferece o serviço Policy Agendas Project, onde estão disponíveis dados sobre ações do executivo, legislativo, partidos políticos e mídia de diversos países, incluindo o Brasil. / Fonte: NaruFoto / Shutterstock. Para o Brasil, existe o Brazilian Policy Agendas Project, que conta com organização de professores e alunos da UNESP e da UFSCar. O projeto buscaanalisar documentos como emendas constitucionais, mensagens do Congresso, discursos presidenciais, medidas provisórias e problemas e leis mais importantes aprovadas pela Câmara dos Deputados. Com essas informações, podemos verificar o quanto um assunto está sendo tratado pelas diversas instâncias governamentais. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. DE ACORDO COM A TEORIA DA ESCOLHA PÚBLICA, PODEMOS AFIRMAR QUE. A) O Estado é considerado benevolente. B) O governo é o melhor em prover bem e serviços. / C) Os burocratas buscam maximizar o tamanho do orçamento da agência que controlam. D) O governo sempre alcança resultados eficientes. 2. DE ACORDO COM A TEORIA DA ESCOLHA PÚBLICA, QUANDO AS PRIVATIZAÇÕES SÃO RECOMENDADAS? A) Quando os bens forem do tipo bem privado. B) Quando os bens são monopólio natural. C) Para qualquer tipo de bem. D) Nunca são recomendados. GABARITO 1. De acordo com a Teoria da Escolha Pública, podemos afirmar que. A alternativa "C " está correta. Essa é exatamente uma das hipóteses da teoria da escolha pública: o burocrata não tem por objetivo maximizar o bem-estar social, mas o orçamento sob seu controle. 2. De acordo com a teoria da escolha pública, quando as privatizações são recomendadas? A alternativa "A " está correta. Evidências empíricas mostram que as privatizações devem ocorrer em casos de bens privados (como produção de aço, telecomunicações e bancos), pois empresas privadas são frequentemente mais eficientes ao adotarem uma visão maximizadora de lucro. CONCLUSÃO / CONSIDERAÇÕES FINAIS Todos sabem que políticas públicas são importantes, mas precisamos saber como implementá-las. Estudamos neste módulo o funcionamento do governo, entidade responsável por essa implementação. Discutimos a oferta de bens públicos e como partes da sociedade (eleitores ou grupos organizados) pode influenciar o governo. Vimos a teoria da escolha pública e, em particular, a definição da agenda política. Estudamos ainda alguns mecanismos usados no Brasil. Fique sempre atento a esses mecanismos. Uma política pública não é apenas uma boa ideia: há um longo caminho até sua implementação. REFERÊNCIAS BRAZIL. Comparative agendas project. Consultado em meio eletrônico em: 17 mai. 2020. CUNHA, L.; SANTOS, M.L. Propostas de regulamentação do lobby no Brasil: uma análise comparada. Brasília: Ipea, 2015. (Texto para Discussão, n. 2094). FISCHER, F.; MILLER, G. J.; SIDNEY, M. S. Handbook of public policy analysis: theory, politics and methods. Londres: Routledge, 2006. GRUBER, J. Public finance and public policy. 3. ed. Nova Iorque: Worth, 2010. ITO, K.; ZHANG, S. Willingness to pay for clean air: evidence from air purifier markets in China. In: Journal of Political Economy, Chicago, v. 128, n. 5, pp. 1627-1672, mai., 2020. / MANKIW, G. N. Princípios de Microeconomia. 3.ed. São Paulo: Cengage Learning, 2009. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. Plebsiscitos e referendos. Consultado em meio eletrônico em: 17 mai. 2020. WASHINGTON UNIVERSITY. Center for american politics and public policy. Consultado em meio eletrônico em: 17 mai. 2020. EXPLORE+ Para saber mais sobre o controle da burocracia e o accountabillity, pesquise na Internet e leia o artigo Burocracias do controle, controle da burocracia e accountability no Brasil, de Fernando Filgueiras. CONTEUDISTA Iago de Azevedo Rocha Maia CURRÍCULO LATTES javascript:void(0);
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