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Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Conceitos Introdutórios e Poder Constituinte Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. 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Coliseo - Centro Cascavel - PR, 85801-050 Tel: (45) 3040-1010 www.faculdadefocus.com.br Este documento possui recursos de interatividade através da navegação por marcadores. Acesse a barra de marcadores do seu leitor de PDF e navegue de maneira RÁPIDA e DESCOMPLICADA pelo conteúdo. http://www.faculdadefocus.com.br/ mailto:secretaria.ff@faculdadefocus.com.br. http://www.faculdadefocus.com.br/ Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 3 Sumário Sumário ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 3 1 Introdução ao Direito Constitucional ---------------------------------------------------------------- 4 1.1 Da Definição de Estado ------------------------------------------------------------------------------------------------- 4 1.2 Da Responsabilidade do Estado -------------------------------------------------------------------------------------- 5 1.3 Da finalidade do Estado ------------------------------------------------------------------------------------------------ 5 2 Elementos Constitutivos do Estado ------------------------------------------------------------------- 6 2.1 Povo ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 7 2.2 Território ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 8 2.3 Governo -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 8 3 Organização do Estado ---------------------------------------------------------------------------------- 9 4 Poderes do Estado ---------------------------------------------------------------------------------------- 11 5 Poder Constituinte ---------------------------------------------------------------------------------------- 13 5.1 Poder Constituinte Originário -------------------------------------------------------------------------------------- 14 5.1.1 Limitações do Poder Constituinte Originário ------------------------------------------------------------------------------ 15 5.2 Poder Constituinte Derivado---------------------------------------------------------------------------------------- 16 5.2.1 Poder Constituinte Derivado Decorrente ----------------------------------------------------------------------------------- 16 5.2.2 Poder Constituinte Derivado Reformador ---------------------------------------------------------------------------------- 17 5.2.3 Poder Constituinte Derivado Revisor ---------------------------------------------------------------------------------------- 18 5.3 Poder Constituinte Supranacional --------------------------------------------------------------------------------- 21 5.4 Poder Constituinte Difuso ------------------------------------------------------------------------------------------- 22 6 Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição ----------------------------------------- 23 7 Conclusão --------------------------------------------------------------------------------------------------- 25 8 Referências Bibliográficas ------------------------------------------------------------------------------ 26 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 4 1 Introdução ao Direito Constitucional Em seu Manual de Direito Constitucional, Nathalia Masson define o Direito Constitucional como sendo um dos ramos do Direito Público oriundo de ideais liberais, os quais estão voltados para a “a organização estrutural do Estado, o exercício e transmissão do poder e a enumeração de direitos e garantias fundamentais dos indivíduos”. Na mesma direção, é definido por Jose Afonso da Silva (2014) “como ramo do Direito Público que expõe, interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do Estado, os quais compõem o conteúdo das constituições”. A Constituição, por sua vez, pode ser definida como “o conjunto de normas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela criação, estruturação e organização político-jurídica de um Estado”, trata-se de um documento essencial que prevê os elementos organizadores, a forma de exercício delimitado de poder, que assegura os direitos e as garantias fundamentais do homem e consequentemente faz possível a existência de um Estado. De todo o conjunto de normas vigentes dentro de um espaço territorial, a Constituição é a norma primeira e serve de fundamentação para todas as outras. Neste sentido, e tendo em vista que a Constituição rege a estruturação e organização do Estado, faz-se necessário primeiramente estudarmos os fundamentos do Estado, seus elementos constitutivos e seus poderes. É sobre isso que trataremos nos capítulos seguintes. 1.1 Da Definição de Estado O Estado pode ser definido como uma sociedade organizada política e juridicamente que ocupa um território definido, onde a lei máxima normalmente é uma Constituição escrita e dirigida por um Governo que possui soberania reconhecida, tanto interna quanto externamente. O conceito de Estado e Nação distintos e inconfundíveis. Conforme Sahid Maluf (2019), “A Nação é uma realidade sociológica; o Estado, uma realidade jurídica. O conceito de Nação é essencialmente de ordem subjetiva, enquanto o conceito de Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 5 Estado é necessariamente objetivo”. Neste sentido, diz-se que a Nação é anterior ao estado, é definida como a “substância humana do Estado”, pois se trata de um “conjunto homogêneo de pessoas ligadas entre si por vínculos permanentes de sangue, idioma, religião, cultura e ideais”, de modo que um Estado pode comportar pessoas de diversas nações, assim como uma única nação pode se dividir em diversos Estado. 1.2 Da Responsabilidade do Estado O Estado é responsável pela organização e pelo controle social, pois detém o direitode soberania (ius imperii), ou o chamado poder extroverso do Estado. Mediante uma analogia, podemos pensar no Estado como um grande “fantasma”, cujo poder pesa como uma mão invisível sobre o povo. Ele é uma criação por nós reconhecida, com forma própria, concebida e conceituada como uma pessoa jurídica no direito brasileiro. O Estado nasceu para organizar um povo, uma nação, para convencer esse povo a viver sob o manto de uma ordem, sob certas regras, dogmas, direitos e deveres. Conforme explica Sahid Maluf (2019), o Estado é “criação da vontade humana”, não possui “autoridade nem finalidade próprias, mas é uma síntese dos ideais da comunhão que ele representa [...]: O Estado é o órgão executor da soberania nacional”. 1.3 Da finalidade do Estado Em consonância com o entendimento compartilhado por diversos doutrinadores, podemos dizer que a finalidade do Estado é assegurar a vida humana em coletividade, torná-la possível e viável, regulando, quando necessário, as relações Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 6 públicas e privadas. Além disso, o Estado é responsável por garantir a ordem interna e assegurar a soberania na ordem internacional. Neste sentido, o governo deve ser um ente que demonstra poder internamente, sendo reconhecido por seu povo e, ao mesmo tempo, represente esse povo para além das suas fronteiras, fazendo-se reconhecido e respeitado. O Estado deve ser visto como soberano. Por fim, o Estado deve elaborar as regras de conduta e distribuir a justiça, ou seja, organizar e manter o homem em sociedade. Em outras palavras, determinar e normatizar os direitos e deveres englobados pelo amplo arcabouço jurídico do direito civil, penal, tributário, empresarial etc. 2 Elementos Constitutivos do Estado O Estado soberano é sintetizado pela máxima “um governo, um povo, um território”. Essa máxima remete à teoria tripartite de governo, segundo a qual, em havendo um povo dentro de um território com um governo soberano passível de ser identificado, haverá um Estado. Para analisarmos pormenorizadamente cada um desses elementos, devemos considerar as causas constitutivas do Estado, que nos levam ao entendimento científico de como o Estado se constitui. Para tanto, recorremos a Acquaviva (2010), observando as três causas por ele expostas: as causas materiais, as causas formais e a causa final. Para o autor: São causas materiais do Estado o povo, ou o elemento humano, e o território, ou base física, área material ou ideal em que o Estado faz valer seu Direito positivo. Quanto às causas formais, vale dizer, aquelas que identificam o Estado quanto à sua forma jurídica ou constituição política, graças à qual um Estado não se confunde com outros - daí, a importância de conhecer o Estado por sua constituição! - são a ordem jurídica e o poder político, exercido pelos governantes (do grego kubernetes, piloto de embarcação) que o encarnam em dado momento histórico. Quanto à causa final do Estado, vale lembrar que cada sociedade tem, conforme sua natureza, uma causa final específica. [...] Quanto ao Estado, tem por causa final o bem com um de todas as sociedades menores que atuam em seu território (ACQUAVIVA, 2010, p. 24). Na sequência, vamos detalhar cada uma destas causas. Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 7 Figura 1 - Elementos constitutivos do Estado Fonte: Núcleo editorial Focus 2.1 Povo O povo é o elemento humano formado pelo conjunto de pessoas submetidas à ordem jurídica estatal. É o grupo de pessoas que possuem as mesmas características, que falam a mesma língua, que seguem as mesmas tradições e são unidas por diversos elos de ligações. Conforme aponta, Marcus Claudio Acquaviva, Ao Direito, em especial o direito constitucional, interessam os sentidos jurídico e político. Povo, no sentido jurídico, é o conjunto de indivíduos qualificados pela nacionalidade. Nele não se incluem, já se vê, estrangeiros e apátridas. Todavia, o sentido político é ainda mais restrito, pois exclui não só estrangeiros e apátridas, como também os menores de 16 anos (CF, art. 14, §§ I o, II, c, e 2o), estando o povo político, tido como o conjunto dos cidadãos do Estado, vinculado à ideia de cidadania (ACQUAVIVA, 2010, p. 25). Neste sentido, o conceito não deve ser confundido com o de população, esta é uma medida definida pelo conjunto de indivíduos da mesma espécie que vivem na mesma região em determinado período. Por exemplo, o povo baiano é o povo que nasceu na Bahia, que fala a mesma variedade linguística, tem práticas religiosas próprias da região, entre outras características que os une. Mas, em época de carnaval, a população da Bahia pode ser triplicada em virtude dos turistas que se alocam na região. Este fato, contudo, não altera as características do povo Baiano, somente a população, porque esta é definida pelo conjunto de pessoas na mesma área por determinado espaço de tempo, (os cinco dias de carnaval). Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 8 2.2 Território O território é o elemento material (espacial ou físico) do Estado, é a base geográfica que compreende a superfície do solo que o Estado ocupa, seu mar territorial e o espaço aéreo. É todo e qualquer espaço físico ou ideal delimitado e dominado pelo Estado, no qual exerce seu poder com exclusividade. Segundo Acquaviva (2010), quanto à etimologia da palavra, “Não provém, conforme se poderia pensar, de nada ligado à terra, espaço geográfico, mas do verbo latino terreo, territo, isto é, intimido, causo medo, receio, mesmo porque o Estado exerce o seu poder antevendo a possibilidade de, a qualquer momento, utilizar a força (coerção) para ver suas determinações cumpridas pelos súditos. Diga-se o mesmo no âmbito externo, quando o Estado, para manter a soberania íntegra, procura, na força das armas, impor respeito às demais sociedades políticas”. 2.3 Governo O governo é a organização necessária para o exercício do poder político e é composto por pessoas escolhidas nas diretrizes da Carta Política que rege o Estado. Embora a conceituação varie a depender do viés doutrinário, “exprime sempre o exercício do poder soberano”, dado que a soberania é a “foça geradora e justificadora do elemento governo (MALUF, 2018). Existem várias formas e modelos de governo, tais como a monarquia parlamentarista, o presidencialismo, o parlamentarismo puro, entre outros. Cada constituição, cada Estado determina como seu governo será organizado. O importante é que o governo seja reconhecido e soberano, que seja respeitado pelo povo internamente e que tenha poderes para representar o povo externamente. Além disso, é o governo que define o futuro político da sociedade, discutindo assuntos sensíveis ao povo, políticas públicas, políticas econômicas e monetárias, assuntos sensíveis de segurança nacional, entre outros. Introdução ao Direito Constitucional | Organização do Estado www.cenes.com.br | 9 Para que esse governo exista, contudo, ele precisa ter governabilidade e governança, pois não basta ele ser legalmente eleito pela população e reconhecido pelo ordenamento jurídico brasileiro, ele precisa ser capaz de implementar políticas públicas. Neste sentido, a governança, para além de seguir as leis de acordo com a Constituição, representa o poder de criar e aplicar políticas públicas, de ter condições de impor essas políticas, colocá-las em prática e governar o povo. Figura 2 - Governabilidade e governança Fonte: Núcleo editorial Focus É oportuno destacar que tratamos aqui da divisão tripartite clássica da teoria geral do Estado (povo, território e governo), que prevê três elementos basilares para constituição do Estado. Contudo, existem outrasvisões que aprofundam esse tema com outros elementos, tais como a doutrina moderna de Pedro Lenza e Vicente Paulo Marcelo Alexandrino. Para estes autores e para parte da doutrina moderna, são quatro os elementos constitutivos do Estado: soberania, finalidade, povo e território. No entanto, no mesmo viés de Sahid Maluf, entendemos que a soberania está compreendida no conceito de Estado, pois um Estado não soberano ou semissoberano não caracterizaria de fato um Estado. 3 Organização do Estado Conforme descreve Sahid Maluf (2018), as variações dos elementos que constituem o Estado caracterizado como um fato social (povo, território e governo) ensejam diversas classificações de Estado. Por exemplo, quanto ao povo, ele pode ser nacional ou plurinacional; quanto ao território, central ou marítimo. Introdução ao Direito Constitucional | Organização do Estado www.cenes.com.br | 10 Neste sentido, em que pese a estrutura material do Estado (e não a sua organização política), Maluf afirma que ele pode ser: a) perfeito ou imperfeito ou b) simples e composto, sendo tipos característicos de Estado composto a união pessoal, a união real, a união incorporada e a confederação. Ao passo que Acquaviva classifica as formas do Estado em: união pessoal; união real; Estado unitário; e Estado federal. No entanto, Flavia Bahia (2017) afirma que hoje existem apenas duas formas principais de Estado, que são: a) Estado Unitário ou Simples – no qual o Poder Central concentra o poder político, não havendo divisão geográfica deste poder. Ou seja, existe apenas um núcleo de comando, que é no âmbito nacional, estendendo-se uniformemente sobre todo o seu território. Exemplo: França, Bélgica, Itália, Portugal e Uruguai. b) Estado Federado ou Composto – no qual ocorre a divisão geográfica do poder político. Isto é, a Federação é formada por vários Estados-membros, são vários núcleos de comando, cada um com sua autonomia política, bens próprios, renda e responsabilidades entregues pela Carta política. Exemplo: Alemanha, Suíça, Brasil e EUA. O que difere um Estado Unitário de um Federado é que neste último existem outros entes com autonomia política. É claro que os Estados Unitários, como a França e o Uruguai possuem uma forma descentralizada de organização, porém essa descentralização não é política. Por outro lado, em um Estado Federado, como o Brasil, delega-se aos estados-membros competências políticas e não meramente administrativas. O Estado unitário pode ser descentralizado, facilitando a administração por parte do governo central, mas isso não o torna um Estado Federado. Por fim, vale salientar que o Estado, em suas relações internacionais, possui soberania, enquanto a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, nas suas relações internas, possuem apenas autonomia. Em outros termos, dizemos que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios que compõem a organização administrativa da nossa República possuem apenas autonomia, ao passo que a República Federativa do Brasil possui total soberania. Introdução ao Direito Constitucional | Poderes do Estado www.cenes.com.br | 11 4 Poderes do Estado Esse “espírito superior” chamado Estado precisa de poderes para se impor perante o particular, pois a ele é dado o ius imperii, para que possa organizar e aplicar as normas preestabelecidas na sociedade, inclusive com punição para aqueles que as desobedecem. De acordo com o art. 2º da Constituição Federal de 1988, são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. A título de elucidação, a primeira Constituição Imperial de 1824 previa um quarto poder, o Poder Moderador, que era o poder do Imperador. Este, contudo foi removido da Constituição desde sua primeira versão Republicana, em 1891. Assim, o Estado se impõe à sociedade, já que cabe a ele organizá-la, por meio dos três poderes – um poder administra, o outro faz leis e normas, e o outro distribui a justiça para o povo. Cada um desses Poderes do Estado exerce predominantemente uma função estatal específica, porém não há uma separação absoluta de funções, uma vez que essa teoria dos três poderes não é absoluta. Dessa forma, em não havendo separação absoluta de funções, assegura-se a aplicação da teoria do sistema de freios e contrapesos, de acordo com a qual um poder pode controlar o outro para garantir que o Estado progrida, conforme expôs Dalmo de Abreu Dallari no excerto extraído da obra Elementos da Teoria Geral do Estado: “O sistema de separação dos poderes, consagrado nas Constituições de quase todo o mundo, foi associado à ideia de Estado Democrático e deu origem a uma engenhosa construção doutrinária, conhecida como sistema de freios e contrapesos. Segundo essa teoria os atos que o Estado pratica podem ser de duas espécies: ou são atos gerais ou são especiais. Os atos gerais, que só podem ser praticados pelo poder legislativo, consistem na emissão de regras gerais e abstratas, não se sabendo, no momento de serem emitidas, a quem elas irão atingir. Dessa forma, o poder legislativo, que só pratica atos gerais, não atua concretamente na vida social, não tendo meios para cometer abusos de poder nem para beneficiar ou prejudicar uma pessoa ou um grupo em particular. Só depois de emitida a norma geral é que se abre a possibilidade de atuação do poder executivo, por meio de atos especiais. O executivo dispõe de meios concretos para agir, mas está igualmente impossibilitado de atuar discricionariamente, porque todos os seus atos estão limitados pelos atos gerais praticados pelo legislativo. E se houver exorbitância de qualquer dos poderes surge a ação fiscalizadora do poder judiciário, obrigando cada Introdução ao Direito Constitucional | Poderes do Estado www.cenes.com.br | 12 um a permanecer nos limites de sua respectiva espera de competências” (DALLARI, 2010, p. 216). Isto posto, resumimos as funções típicas dos poderes da seguinte maneira: Poder Legislativo É aquele que tem como principal função a de legislar (fazer leis), ou seja, inovar o ordenamento jurídico, estabelecendo regras gerais e abstratas, criando comandos a todos os cidadãos, visto que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. No Brasil, o Legislativo tem ainda como função típica a de fiscalizar a Administração Pública, sendo o único poder do Estado a ter duas funções típicas previstas na Constituição. Poder Executivo É aquele que tem como principal função executar e administrar a coisa pública com a finalidade de atender o interesse público, dentro dos limites impostos pela lei em sentido amplo. Poder Judiciário É aquele que tem como principal função julgar, solucionar conflitos de interesses entre as partes, fazer direito e aplicar a lei nos casos concretos. Tal poder não se acha em todas as esferas, como os anteriores, dado que os municípios não possuem Poder Judiciário próprio. Retomando o conteúdo, o Estado surge com a junção de um povo dentro de um certo território, onde se tem, reconhecidamente, um governo soberano, o qual pauta-se em essência na governabilidade e governança, sendo que sem um ou o outro não é possível manter o governo. Ora, não há como manter um governo sem governabilidade eleito de forma ilegal ou imposto, assim como não há como manter um governo que, no decorrer da sua existência, não consiga impor as suas políticas públicas. Foi precisamente isso que ocorreu no exemplo mais recente que temos do governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Ela possuía governabilidade, pois foi eleita pelo povo brasileiro, porém perdeu sua governança ao longo do mandato, uma vez que não conseguiu implementar as suas políticas públicas. Quando analisamos conceito de governo passamos a entender como ele trabalha para Introdução aoDireito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 13 administrar o Estado e percebemos emergir desse conceito outro, o de Administração Pública. Este, por sua vez, divide-se em dois vieses, o viés objetivo e o viés subjetivo. No sentido objetivo, buscamos compreender o que a Administração Pública faz, portanto falamos sobre fomento, serviço público, poder de polícia e outras funções de sua responsabilidade. Já no sentido subjetivo, buscamos compreender quem faz a administração, quem é o governo, quem é responsável por fazer a administração pública, ou seja, buscamos compreender o agente público. 5 Poder Constituinte Poder Constituinte é o nome dado ao poder que pertence ao povo para organizar juridicamente a política e o Estado ou, conforme cita Sahid Maluf, “é uma função da soberania nacional. É o poder de constituir e reconstituir ou reformular a ordem jurídica estatal”. Sua titularidade é dada ao povo através de seus legitimados, que, em razão da complexidade do Estado moderno, representam seus interesses. Por óbvio, esse poder pode não se aplicar a regimes de governo que não sejam democráticos. Nas teocracias, por exemplo, o poder pertence a um conjunto de normas religiosa; em uma autocracia, o poder pertence a um detentor soberano. Mas, em um regime democrático, o poder constituinte pertence ao povo e é a partir deste poder que nasce a Constituição que organiza o Estado-nação. Este poder “tanto pode se exercido para a organização originária de um agrupamento nacional ou popular quanto para constituir, reconstituir ou reformular a ordem jurídica de um Estado já formado” (MALUF, 2019) Podemos classificar o Poder Constituinte de várias formas. A forma mais tradicional o classifica em Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado. Hoje, contudo, existem outras espécies de Poder Constituinte, dentre as quais destacam-se o Poder Constituinte Supranacional e o Poder Constituinte Difuso. Assim, nesta aula, falaremos sobre essas quatro classificações. É importante salientar que o Poder Supranacional e o Poder Difuso não são ramificações do Poder Constituinte Derivado, pois, como veremos mais adiante, o Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 14 Poder Derivado possui somente três vertentes: derivado decorrente, derivado reformador e derivado revisor. Figura 3 - Classificações do poder constituinte Fonte: Núcleo editorial Focus 5.1 Poder Constituinte Originário O Poder Constituinte Originário (também chamado de poder inicial, fundacional, inaugural, genuíno, primário ou de primeiro grau) é o que sustenta a criação de uma nova constituição, que estabelece uma nova ordem jurídica, rompendo com a precedente. De acordo com Nathalia Masson, O poder constituinte é a energia (ou força) política que se funda em si mesma, a expressão sublime da vontade de um povo em estabelecer e disciplinar as bases organizacionais da comunidade política. Autoridade suprema do ordenamento jurídico, exatamente por ser anterior a qualquer normatização jurídica, o poder é o responsável pela elaboração da Constituição, esta norma jurídica superior que inicia a ordem jurídica e lhe confere fundamento de validade (MASSON, 2018). Sua existência precede a compreensão teórica da Constituição, remetendo às primeiras organizações políticas, pois, conforme cita Luís Roberto Barroso, “Onde quer que exista um grupo social e poder político efetivo, haverá uma força ou energia inicial Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 15 que funda esse poder, dando-lhe forma e substância, normas e instituições” (BARROSO, 2020). Quanto a sua natureza, pode ser considerado como um “poder de fato, detentor de natureza essencialmente política, ou um poder de direito, possuidor de natureza jurídica” (MASSON, 2018). Caracteriza-se por ser político, inicial, autônomo, incondicionado, juridicamente ilimitado, inalienável e permanente, e é de titularidade do povo. Figura 4 - Poder constituinte originário Fonte: Núcleo editorial Focus 5.1.1 Limitações do Poder Constituinte Originário Em relação à existência ou não de limitações ao Poder Constituinte Originário, a corrente jusnaturalista afirma que este poder possui freios, portanto, possui limitações. Contudo, pela teoria positivista, este poder se caracteriza como sendo ilimitado. Para a corrente jusnaturalista, as limitações materiais deste poder são abordadas em três categorias. ➢ Limitações transcendentes: envolvem os direitos fundamentais da sociedade e proibição do retrocesso. Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 16 ➢ Limitações permanentes: estão relacionadas à soberania e à forma do Estado. ➢ Limitações heterônomos: são impostas pelas obrigações internacionais, pelos direitos internacionais e direitos humanos. Novamente, essas limitações são contempladas na teoria jusnaturalista, e esta é apenas uma das correntes de pensamento. Se analisadas pelo viés da teoria positivista, que se volta mais para aquilo que está propriamente escrito no texto jurídico, este poder será ilimitado. 5.2 Poder Constituinte Derivado O Poder Constituinte Derivado, como o próprio nome já diz, é aquele que deriva do poder originário. Não é um poder inicial, mas sim de segunda mão, e por essa razão é também chamado de poder instituído, constituído ou de segundo grau. São características principais desse poder ser derivado, limitado e condicionado às determinações do poder originário, devendo sempre respeitar a lei da Constituição Federal. Este poder se subdivide em três categorias, são elas: ▪ Poder Constituinte Derivado Decorrente: pode ser subdividido em dois: o inicial e o reformador. O poder decorrente inicial foi entregue aos estados-membros para formularem cada qual sua própria Constituição. Assim, as constituições estaduais são constituídas a partir do poder decorrente inicial e reformuladas a partir do poder decorrente reformador. ▪ Poder Constituinte Derivado Reformador: envolve a alteração, a reforma da Constituição Federal de 1988 via emenda constitucional (difere-se do poder decorrente reformador). ▪ Poder Constituinte Derivado Revisor: remete às emendas constitucionais de revisão da Constituição Federal de 1988. 5.2.1 Poder Constituinte Derivado Decorrente O poder constituinte derivado decorrente surge para os Estados-membros e Distrito Federal criarem uma constituição, a fim de se adaptar à nova realidade. O poder responsável pela auto-organização dos Estados-membros costuma ser classificado em duas espécies. Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 17 a) Poder Constituinte Derivado Decorrente Inicial, o qual é responsável pela criação das constituições estaduais. b) Poder Constituinte Derivado Decorrente Reformador, o qual tem a função de fazer alterações no texto das constituições estaduais. 5.2.2 Poder Constituinte Derivado Reformador O Poder Constituinte Derivado Reformador é o poder que garante a possibilidade de reforma e modificação da Constituição por meio de emenda, restringindo-se às limitações impostas pelo texto constitucional, tais como: as limitações materiais, as chamadas clausuras pétreas; as limitações formais, que remetem aos procedimentos para emendar a constituição; as limitações circunstanciais, que dizem respeito a circunstâncias ou períodos em que a constituição não pode ser alterada; e as temporais. 5.2.2.1 Limitações Materiais As limitações impostas pela constituição estão em sua grande maioria no art. 60, § 4º da CF/88. Este dispõe sobre as clausuras pétreas, ou seja, sobre as clausuras que não podem ser retiradas da Constituição Federal. De acordo com o posicionamento do STF, as clausuraspétreas podem até ser objeto de emenda, porém essa emenda não pode ser tendente a abolir o assunto que está previsto no § 4º do art. 60, que prevê o seguinte. Art. 60, § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 18 III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. 5.2.2.2 Limitações Circunstanciais A limitação circunstancial está prevista no art. 60, § 1º da CF/88, segundo o qual a Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. Ora, a Constituição Federal é a maior lei que nós temos, por isso ela deve ser preservada, e uma das formas de fazer isso é não a alterando em tempos e circunstâncias que estão fora da situação de normalidade, como ocorre nesses casos. 5.2.2.3 Limitações Formais As limitações formais se referem à forma e ao procedimento de tramitação e aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional – PEC. A nossa CF/88 é uma constituição rígida, portanto o procedimento para sua alteração é muito mais rigoroso. 5.2.2.4 Limitações Temporais A limitação temporal consiste na proibição de alteração do texto constitucional durante certo período de tempo após ser promulgada uma nova constituição. Esta limitação, no entanto, não foi adotada pela atual Carta Magna. Lembre-se que embora o poder constituinte reformador não tenha essa limitação, o poder constituinte revisor tem. 5.2.3 Poder Constituinte Derivado Revisor O poder constituinte derivado revisor é usado para revisar e alterar a Constituição, é diferente do derivado reformador tendo em vista que sustenta a total revisão e reformulação da Constituição havendo decorrido certo prazo a contar da sua promulgação. A CF/88 previu que após um lapso temporal de cinco anos haveria uma revisão constitucional e essa revisão já ocorreu, dessa forma não é mais possível aplicar à nossa constituição o poder constituinte derivado revisor, ele se exauriu em Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 19 uma única revisão feita em junho de 1994, da qual surgiram seis emendas constitucionais de revisão, as chamadas ECRs. Art. 3º ADCT. A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. Conforme esclarece Nathalia Masson, no entanto, há quem defenda na doutrina a “a viabilidade de uma emenda constitucional que altere o art. 3° do ADCT, propiciando uma nova revisão. Essa alteração, porém, só se legitimaria se grandiosas e substanciais mudanças fossem percebidas na sociedade, de modo que necessária se tornaria uma revisão global do texto, com o fito de adequar a Constituição a (nova) realidade a ser normatizada”, desde que haja uma “manifestação popular direta favorável a realização da nova revisão”. Para a autora, isso caracterizaria, todavia, uma tentativa de ferir a vontade do poder originário, portanto advoga em sentido oposto a tal entendimento. Observe o quadro sinóptico extraído do Manual de Direito Constitucional (2020), de Nathalia Masson, com as principais diferenças entre o poder derivado revisor e o reformador. Tabela 1 - Principais diferenças entre os poderes derivados revisor e reformador. MECANISMOS FORMAIS DE ALTERAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL REFORMA (art. 60, CF/88) REVISÃO (art. 3º, ADCT) POSSIBILIDADE DE MODIFICAR O TEXTO CONSTITUCIONAL VIA REGULAR E PERENE MEIO EXCEPCIONAL E PRECÁRIO LIMITAÇÕES TEMPORAIS INEXISTEM NO ATUAL TEXTO CONSTITUCIONAL 5 ANOS LIMITAÇÕES MATERIAIS ▪ EXPRESSAS (constantes do art. 60, § 4º, CF/88): a) a forma federativa de Estado; b) o voto direto, secreto, universal e periódico; c) a separação de poderes; APLICA-SE A MESMA PREVISÃO VÁLIDA PARA O PROCEDIMENTO DE REFORMA Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 20 d) os direitos e as garantias individuais. ▪ IMPLÍCITAS: a) imutabilidade do art. 60, CF/88; b) titularidade do poder constituinte originário e do poder derivado de reforma; c) impossibilidade de supressão dos fundamentos da República Federativa do Brasil. LIMITAÇÕES CIRCUNSTANCIAIS A constituição não poderá ser emendada na vigência de (art. 60, § 1º, CF/88): a) INTERVENÇÃO FEDERAL; b) ESTADO DE DEFESA; c) ESTADO DE SÍTIO. APLICA-SE A MESMA PREVISÃO VÁLIDA PARA O PROCEDIMENTO DE REFORMA LIMITAÇÕES FORMAIS Art. 60, caput, I, II, III, §§ 2º e 5º, CF/88: ▪ A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: a) de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; b) do Presidente da República; c) de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. ▪ A proposta será discutida e cotada em Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. ▪ A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. ▪ VOTO DA MAIORIA ABSOLUTA DOS MEMBROS DO CONGRESSO NACIONAL ▪ SESSÃO UNICAMERAL Fonte: Nathalia Masson (2018, p. 182) Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 21 5.3 Poder Constituinte Supranacional O poder constituinte supranacional nasceu a partir da Emenda Constitucional 45/04 e foi incluído no art. 5º da CF/88, na forma do § 3º, prevendo o seguinte: CF, Art. 5º, § 3º - Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) Esse poder é baseado na teoria da interconstitucionalidade e no transconstitucionalismo. Segundo Masson (2018), “A partir dos ideais de cidadania universal, pluralismo, integração e soberania remodelada, que surge o (ainda incipiente) conceito de poder constituinte supranacional, destinado a equacionar uma Constituição supranacional legítima, com aptidão para vincular toda a comunidade de Estados sujeita à sua ação normatizadora”. Além disso, a ideia de se ter um poder como este, voltado para equivaler tratados e convenções internacionais a emendas constitucionais, remete à ideia de cidadania universal, ou monismo jurídico (um único ordenamento jurídico mundial), que representam, por sua vez, o constitucionalismo global. Figura 5 - Poder constituinte supranacional Fonte: Núcleo editorial Focus Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 22 O poder constituinte supranacional é utilizado quando se autoriza, no mesmo procedimento da PEC, a homologação de tratados internacionais e de direito humanos. Com isso, um tratado assinado fora do Brasil, que não pertence ao texto constitucional, é reconhecido e ganha um status constitucional. 5.4 Poder Constituinte Difuso O poder constituinte difuso diz respeito às novas interpretações dadas pelo Supremo Tribunal Federal ao texto da Constituição que consolidam a mutação constitucional. É definido por Pedro Lenza (2021) como “um poder de fato e que serve de fundamento para os mecanismos de atuação da mutação constitucional”. É importante lembrar que o poder constituinte difuso não trabalha com alterações materiais, mas sim com novas interpretações. Ou seja, não há PEC no processo, não háalteração material ou formais, trata-se apenas de um poder entregue aos Ministros do Supremo Tribunal Federal para darem uma nova interpretação ao texto da Constituição Federal, por isso dizemos que esse poder permite somente a mutação constitucional. Conforme explica Lenza (2021), Se por um lado a mudança implementada pelo poder constituinte derivado reformador se verifica de modo formal, palpável, por intermédio das emendas à Constituição, a modificação produzida pelo poder constituinte difuso se instrumentaliza de modo informal e espontâneo, como verdadeiro poder de fato, e que decorre dos fatores sociais, políticos e econômicos, encontrando-se em estado de latência. Trata-se de processo informal de mudança da Constituição, alterando-se o seu sentido interpretativo, e não o seu texto, que permanece intacto e com a mesma literalidade (LENZA, 2021, grifo do autor). No decorrer do nosso curso, conforme formos adentrando no estudo da Constituição, nos depararemos com vários exemplos de mutações constitucionais. O art. 5º, por exemplo, é repleto delas. Introdução ao Direito Constitucional | Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição www.cenes.com.br | 23 Figura 6 - Poder constituinte difuso Fonte: Núcleo editorial Focus 6 Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição Em regra, quando surge uma nova Constituição ela revoga a anterior, podendo apenas recepcionar normas infraconstitucionais, feitas de acordo com a Constituição anterior, desde que estas não contrariem materialmente os direitos estabelecidos pela nova. Em outras palavras, quando surge uma nova Constituição, a anterior é “jogada fora”, as leis da velha Constituição que estiverem de acordo com a nova Constituição serão recepcionadas, ou seja, “reutilizadas”, e as leis que não estiverem de acordo com a nova Constituição serão “jogadas fora” junto com a velha constituição. Introdução ao Direito Constitucional | Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição www.cenes.com.br | 24 Além do fenômeno da recepção, existem outros dois fenômenos, que, no entanto, não são admitidos no atual ordenamento jurídico. São eles: ▪ DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO: ocorre quando a nova Constituição recebe a Constituição anterior como norma infraconstitucional. Esse fenômeno não é admitido no atual ordenamento jurídico, portanto não é adotado. ▪ REPRISTINAÇÃO: ocorre quando a nova Constituição revigora as normas infraconstitucionais que a Constituição anterior havia revogado. Ocorre, por exemplo, quando uma lei A é revogada por uma segunda lei B, que por sua vez é revogada por uma terceira lei C. Uma vez que a lei C revogou a lei B, que havia revogado a lei A, ocorre a repristinação da lei A, ou seja, a lei A volta a vigorar. Este é um fenômeno que ocorre no âmbito das leis, por isso dizemos que ele existe no plano infraconstitucional. No entanto, não existe no plano de normas de caráter constitucional. REGRA: A nova CF REVOGA a CF anterior RECEPÇÃO: a nova CF recepciona as normas infraconstitucionais feitas de acordo com a CF anterior desde que não contrariem materialmente os direitos estabelecidos pela nova CF. ATENÇÃO: As normas infraconstitucionais anteriores não podem contrariar materialmente, mas podem contrariar formalmente a nova CF. Exemplo: CP de 1940 foi criado via Decreto Lei (espécie normativa inexistente no ordenamento jurídico atual); outro exemplo é o CNT, que foi feito por Lei Ordinária, mas foi recepcionado pela CF/88 como Lei Complementar, assim como parte do Código Eleitoral de 1965. Introdução ao Direito Constitucional | Conclusão www.cenes.com.br | 25 Figura 7 - Fenômenos que surgem com uma nova Constituição Fonte: Núcleo editorial Focus 7 Conclusão Neste material vimos que o Estado se constitui a partir da existência um povo dentro de um território em que há, reconhecidamente, um governo soberano que se pauta essencialmente na governabilidade e na governança, sendo que sem um ou o outro não se mantém. Na sequência estudamos os poderes constituintes do Estado, o poder originário, responsável pela formação da Constituição, que remete às primeiras organizações políticas e se caracteriza por ser uma força política que se funda em si mesma, existindo “onde quer que exista um grupo social e poder político efetivo”, e seus poderes derivados (o poder decorrente, o reformador e o revisor). Vimos, ainda, que podem resultar alguns fenômenos do surgimento de uma nova Constituição; o primeiro, aplicável ao nosso sistema, é a revogação da Constituição anterior, recepcionando apenas as normas que não contrariam materialmente os direitos estabelecidos pela nova Constituição; o segundo é a desconstitucionalização, não adotado pelo nosso sistema jurídico, e o terceiro é a repristinação, o qual existe apenas no âmbito das normas infraconstitucional, não sendo adotado no plano das normas de caráter constitucional. Por fim, entendemos que o estudo da parte do Direito Constitucional que se caracteriza como a teoria geral do Estado é de suma importância para compreendermos a finalidade do Estado de assegurar a vida humana em coletividade, regulando as relações públicas e privadas por meio de regras de conduta e normatização de direitos e deveres englobados pelo amplo arcabouço jurídico do direito em todas as suas vertentes. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 26 8 Referências Bibliográficas ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Teoria geral do Estado. -3. ed. Barueri, SP: Manole, 2010. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. – 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. LENZA, Pedro. Direito Constitucional. – 25. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. Atualizado por prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. -35. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. -8. ed. Salvador: JusPODVM, 2020. SILVA, José Afonsa da. Curso de Direito Constitucional Positivo. -37. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 27 Sumário 1 Introdução ao Direito Constitucional 1.1 Da Definição de Estado 1.2 Da Responsabilidade do Estado 1.3 Da finalidade do Estado 2 Elementos Constitutivos do Estado 2.1 Povo 2.2 Território 2.3 Governo 3 Organização do Estado 4 Poderes do Estado 5 Poder Constituinte 5.1 Poder Constituinte Originário 5.1.1 Limitações do Poder Constituinte Originário 5.2 Poder Constituinte Derivado 5.2.1 Poder Constituinte Derivado Decorrente 5.2.2 Poder Constituinte Derivado Reformador 5.2.2.1 Limitações Materiais 5.2.2.2 Limitações Circunstanciais 5.2.2.3 Limitações Formais 5.2.2.4 Limitações Temporais 5.2.3 Poder Constituinte Derivado Revisor 5.3 Poder Constituinte Supranacional 5.4 Poder Constituinte Difuso 6 Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição 7 Conclusão 8 Referências Bibliográficas
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