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CASO CLÍNICO B.B.C, feminino, 13 anos. Natural e procedente de Divinolândia de Minas, comparece à UBS com queixa de fraqueza, cansaço e dificuldade de acompanhar as atividades educativas na sua escola. Sintomas iniciados há 02 meses. Ectoscopia: prostrada, orientada, hidratada, hipocorada (++/++++), acianotica, anicterica, afebril. ACV: Bulhas normorritmicas e normofoneticas em 2 tempos. Sopro sistolico em borda esternal inferior, grau II. AR: Som claro pulmonar, ausência de ruídos adventicios. AD: Abdome plano, presença de ruídos hidroaereos, indolor à palpação superficial e profunda, ausência de massas ou vísceromegalias palpáveis. Exames laboratoriais: Hb 9,5, VCM 76 HCM 22 INTRODUÇÃO Apenas três são agentes etiológicos da ancilostomose humana: Ancylostoma duodenale, Necator americanus e A. ceylanicum. Como nas demais geo-helmintoses, os ancilostomatideos são transmitidos pelo solo contaminado que provê condições para o desenvolvimento de ovos não embrionados até o estádio larval infectante A prevalência da infecção é associada a áreas de pobreza e desigualdades sociais, incluindo deficiência de acesso à infraestrutura sanitária e serviço básico de saúde adequados CLASSIFICAÇÃO E MORFOLOGIA A família Ancylostomatidae pertence ao filo Nematoda e classe Chromadorea. Sua principal característica morfológica é a presença de cápsula bucal, uma projeção da cutícula na região anterior do verme adulto. São parasitos em forma de fio (nêmatos), cilíndricos e alongados, com simetria bilateral De maneira geral, o dimorfismo sexual é evidente pelo tamanho da fêmea (maior do que o macho) e pela presença de bolsa copuladora (projeção da cutícula na região posterior) bem desenvolvida nos machos. OBS: O ovo é indistinguível CICLO BIOLÓGICO Os ancilostomatídeos apresentam um ciclo biológico direto, sem a necessidade de hospedeiros intermediários. Ovos liberados nas fezes do hospedeiro darão origem aos dois primeiros estádios larvais (LI e L2), com esôfago rabditoide e, posteriormente, ocorrerá a muda para a forma de vida infectante, com esôfago filarioide, que é a larva de terceiro estádio (L3). As L3, apesar de livre movimentação, já não se alimentam e apresentam dupla cutícula As condições de oxigenação, temperatura e umidade do ambiente favorecem o desenvolvimento dos ovos até a formação das larvas de terceiro estádio. Em ambientes de oxigenação (p. ex., terrenos arenosos), umidade (superior a 90%) e temperatura (27-32°C para N. americanus e 21-27°C para Ancylostoma spp.) o embrionamento e a eclosão da LI ocorrem em 12 a 24 horas, a muda de LI para L2 em 3 a 4 dias e, a muda para L3, após 5 dias. O homem adquire a infecção pela penetração na pele (N americanus, A. duodenale e A. ceylanicum) ou pela ingestão (A. duodenale e A. ceylanicum) da larva de terceiro estádio. A possibilidade do parasitismo após a ingestão por L3 de N. americanus é relatada pela invasão do epitélio bucal. Ao entrar em contato com o ser humano, as larvas são estimuladas por sinais térmicos e químicos derivados do hospedeiro e continuam o seu desenvolvimento a partir da expressão gênica diferenciada que culmina na produção de produtos de secreção e excreção (majoritariamente constituído por enzimas) que, junto com a movimentação (contração e extensão) da larva, auxiliam na penetração de tecidos do hospedeiro. O processo de penetração dura cerca de 30 minutos e as L3, após liberação da cutícula externa no meio externo, migram pela circulação sanguínea ou linfática até alcançar os pulmões. Em seguida, atravessam os capilares do pulmão para a luz dos alvéolos pulmonares, onde ascendem para os bronquíolos, brônquios e traqueia, auxiliadas pela movimentação de cílios da árvore brônquica e pelo carreamento em muco e produtos de secreção do hospedeiro. Nos pulmões, estimuladas pela alta oxigenação, ocorre a mudança para o estádio de L4, que apresenta uma cápsula bucal provisória. Ao atingir a laringe, as L4 podem ser expectoradas ou deglutidas. Neste caso, as larvas entram no trato gastrointestinal e migram até chegar ao intestino delgado. No intestino delgado, as L4 já exercem a hematofagia e, transcorridos 15 dias da infecção, mudam para formas adultas jovens, que darão origem a vermes adultos sexualmente maduros em mais alguns dias. Após a reprodução sexuada entre casais, as fêmeas depositam ovos na luz intestinal que são liberados ao meio exterior junto com as fezes. A hematofagia e a consequente perda de sangue do hospedeiro ocorre antes da produção de ovos e continua por toda a vida do parasito O período pré-patente para N. americanus é de 42 a 60 dias; de 35 a 60 dias para A. duodenale e de 21 a 35 dias para A. ceylanicum. Parasitos da subfamília Ancylostomatinae podem infectar o homem por via oral, pela ingestão de L3 em alimentos ou água contaminada. Nesta via de infecção, as L3 deglutidas perdem a cutícula no estômago e migram para o intestino delgado (região do duodeno), onde penetram na mucosa intestinal e mudam para L4. As L4, após emergirem na luz intestinal e iniciarem a hematofagia, mudam para adultos jovens e, posteriormente, para adultos sexualmente maduros. O período pré- patente para infecção por via oral é menor, de 30 dias para N. americanus e A. duodenale e de 15 dias para A. ceylanicum. PATOGENIA E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Após a penetração das L3 pela pele, o primeiro sintoma é o aparecimento imediato de erupções papulovesiculares pruriginosas eritematosas. A gravidade das erupções pode variar de acordo com a infecção primária ou reinfecção, desde o aparecimento de simples pápulas eritematosas até o surgimento de pápulas vesiculadas, com edema generalizado e inchaço de linfonodos locais. Os sinais e sintomas sequenciais são decorrentes da migração larval inicial, geralmente observados pela tosse, inflamação na garganta e febre, ou pela presença do parasito no pulmão, que pode desencadear febre transiente em 2 a 4 semanas após a infecção. Durante a migração no trato respiratório, sinais e sintomas incluindo coriza, faringite, laringite, sensação de obstrução da garganta e dor ao falar e deglutir foram descritas na ancilostomose. Já na migração no trato gastrointestinal, é relatada dor epigástrica relacionada com a presença das L3 e, em razão da presença e do desenvolvimento do verme adulto, podem ocorrer diminuição do apetite, indigestão, cólicas, náuseas, vômitos, flatulência e diarreia e, em casos mais graves, ulceração intestinal e colecistite. Após o estabelecimento no hábitat final, a laceração da mucosa e da submucosa pelos aparatos bucais cortantes dos vermes adultos, acompanhados por sucção e secreção de enzimas hidrolíticas e agentes anticoagulantes, resultam em uma intensa perda de sangue intestinal (diarreia sanguinolenta) As principais manifestações clínicas da ancilostomose são consequentes da perda crônica de sangue, acarretando em anemia por deficiência de ferro e hipoalbuminemia. A anemia microcítica e hipocrômica e a eosinofilia coincidem com o estabelecimento dos vermes adultos no intestino e são proeminentes durante a infecção. A hipoalbuminemia estaria associada à diminuição da capacidade de síntese da albumina no fígado, à perda de plasma durante a hematofagia e à desnutrição do hospedeiro. Indivíduos com baixa carga parasitária são usualmente assintomáticos, infecções moderadas e altas resultam em dores epigástricas recorrentes, náusea, dispneia, palpitações, dores no esterno e juntas, dor de cabeça, fadiga e impotência. Alguns indivíduos podem desenvolver a alotriofagia (também conhecida por síndrome de Pica) que consiste em um apetite compulsivo por substâncias não nutritivasou não alimentares como solo, argila, tijolos ou areia. Finalmente, anemia e subnutrição podem afetar a produtividade e a capacidade de trabalho de indivíduos doentes, com potencial perda de função assalariada e aumento do desequilíbrio social. SÍNDROME DE LOEFFLER Tosse, sibilância e infiltrados pulmonares migratórios (raro) OBS: Em penetração ativa, não costuma ser sintomática na via pulmonar pela parasitemia baixa DIAGNÓSTICO CLÍNICO O diagnóstico clínico da ancilostomose é baseado na anamnese associada aos sintomas cutâneos, pulmonares e intestinais, acompanhados ou não de anemia e eosinofilia. Ainda, analisa-se o histórico de contato com solo contaminado ou eosinofilia sem explicação DIRETO: PARASITOLÓGICO I: EPF: Encontro de ovos de A. duodenale ou N. americanos, por método de HPJ ou Kato Katz II: Coprocultura: identificar espécie LABORATORIAL O diagnóstico laboratorial é realizado pelo exame coproparasitológico, utilizando métodos qualitativos ou quantitativos (para avaliação de carga parasitária do hospedeiro). O diagnóstico diferencial para determinar a infecção por N. americanus ou Ancylostoma sp. pode ser realizado pela coprocultura (método de Harada e Mori). PROFILAXIA Como para as demais helmintoses, o uso de medidas preventivas para controlar a ancilostomose deve ser baseada na implementação e na melhora das condições socioeconômicas da população afetada. Acesso à infraestrutura sanitária e ao atendimento básico em saúde, além de condições mínimas de alimentação, educação e habitação seriam pré-requisitos para estabelecer o controle da doença. A negligência acerca da prevalência da ancilostomose, sobretudo nas populações que vivem no meio rural ou em comunidades periféricas urbanas, ainda determina a presença da infecção nos dias atuais. Além das condições socioeconômicas, a educação em saúde visando a prevenção da infecção por L3 pode ter papel primordial no controle da infecção. Assim, para a prevenção é recomendado ações educativas para hábitos de higiene, defecar em locais apropriados (privadas, acesso a fossas ou rede de esgoto), lavar mãos antes das refeições e do manuseio de alimentos, lavar alimentos crus, beber água filtrada ou fervida, uso de calçados ou equipamentos de proteção individual (que impeça o contato com solo contaminado) e alimentação rica em ferro e proteínas. TRATAMENTO I: Albendazol (larvicida e vermicida – 100%) Contraindicado na gravidez; ação teratogênica; efeitos colaterais II: Mebendazol (95%) Contraindicado na gravidez; ação teratogênica; efeitos colaterais III: Pamoato de Pirantel Tratamento de gestantes ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Importante geo-helmintíase; Ancylostoma duodenale e Necator americanus Prevalência: 576 a 740 milhões de pessoas no mundo Países de clima tropical e subtropical Associada a pobreza, saneamento básico, construção inadequada de moradias e acesso deficiente a medicações essenciais; Comunidades rurais, trabalhadores rurais, disposição inadequada de fezes humanas, andar descalço...
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