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1 DIDÁTICA E AVALIAÇÃO NA APRENDIZAGEM EM FÍSICA 1 Sumário INTRODUÇÃO............................................................................................................................ 3 O Ensino da Física na Educação Brasileira Contemporânea: como está? .................................... 3 O que é? ................................................................................................................................... 4 O comportamentalismo de Skinner ........................................................................................... 5 A aprendizagem significativa de Ausubel ................................................................................... 5 A educação bancária de Freire .................................................................................................. 5 Criticidade ................................................................................................................................ 7 As situações de Vergnaud ......................................................................................................... 7 Os conceitos fora de foco de Neil Postman ............................................................................... 8 O modelo da narrativa de Don Finkel ........................................................................................ 9 A aprendizagem significativa crítica......................................................................................... 10 Para uma aprendizagem significativa crítica (subversiva) é preciso: ......................................... 11 O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI ................................................................................... 12 O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI: como é ..................................................................... 13 O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI: como deveria ser ...................................................... 13 CONSIDEREÇÕES NO ENSINO DA FÍSICA .................................................................................. 14 APRENDIZAGEM ...................................................................................................................... 15 CONDIÇÕES PARA A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA .............................................................. 16 ANÁLISE E NOÇÃO DOS TIPOS DE APRENDIZAGEM .................................................................. 17 A CONSTRUÇÃO HUMANA ATRAVÉS DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA ................................ 19 OS MAPAS CONCEITUAIS: UMA TÉCNICA PARA A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA .................. 20 Refletindo o ensino de ciências no Brasil ................................................................................. 21 Refletindo o processo de transposição didática ....................................................................... 25 Refletindo o processo ensino-aprendizagem ........................................................................... 28 Modelagem e o ensino de Física.............................................................................................. 32 Concepções espontâneas e o ensino de Física ......................................................................... 33 Animação interativa e organizador prévio ............................................................................... 34 Referências ............................................................................................................................. 37 2 FACULESTE A história do Instituto FACULESTE, inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a FACULESTE, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A FACULESTE tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 INTRODUÇÃO A aprendizagem é muito mais significativa à medida que o novo conteúdo é incorporado às estruturas de conhecimento de um aluno e adquire significado para ele a partir da relação com seu conhecimento prévio. Ao contrário, ela se torna mecânica ou repetitiva, uma vez que se produziu menos essa incorporação e atribuição de significado, e o novo conteúdo passa a ser armazenado isoladamente ou por meio de associações arbitrárias na estrutura cognitiva. Assim, o objetivo deste texto é identificar as propostas sobre a aprendizagem e a instrução formuladas pelo psicólogo norte-americano D. P. Ausubel. As idéias de Ausubel, cujas formulações iniciais são dos anos 60, encontram-se entre as primeiras propostas psicoeducativas que tentam explicar a aprendizagem e o ensino a partir de um marco distanciado dos princípios condutistas. Neste processo a nova informação interage em comum à estrutura de conhecimento específico, que Ausubel chama de conceito “subsunçor”. Esta é uma palavra que tenta traduzir a inglesa “subsumer”. Quando o conteúdo escolar a ser aprendido não consegue ligar-se a algo já conhecido, ocorre o que Ausubel chama de aprendizagem mecânica, ou seja, quando as novas informações são aprendidas sem interagir com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Assim, a pessoa decora fórmulas, leis, mas esquece após a avaliação. O Ensino da Física na Educação Brasileira Contemporânea: como está? Além da falta e/ou despreparo dos professores, de suas más condições de trabalho, do reduzido número de aulas no Ensino Médio e da progressiva perda de identidade da Física no currículo nesse nível, o ensino da Física estimula a aprendizagem mecânica de conteúdos desatualizados. Estamos no século XXI, mas a Física ensinada não passa do século XIX. 1. Continua se ocupando das alavancas, do plano inclinado, do MRU... e nada de Quântica, de Partículas, de Plasma, de Supercondutividade, ... 2. Treina para os testes, ensina respostas corretas sem questionamentos. 3. Está centrado no docente, não no aluno. 4 4. Segue o modelo da narrativa. 5. É comportamentalista. 6. É do tipo “bancário” (tenta depositar conhecimentos na cabeça do aluno). 7. Se ocupa de conceitos fora de foco. 8. Não incentiva a aprendizagem significativa. 9. Não incorpora as TICs. 10. Não utiliza situações que façam sentido para os alunos. 11. Não busca uma aprendizagem significativa crítica. 12. Não aborda a Física como uma ciência baseada em perguntas, modelos, metáforas, aproximações. 13. Em geral, é baseado em um único livro de texto ou em uma apostila. Em resumo, o ensino da Física na educação contemporânea é desatualizado em termos de conteúdos e tecnologias, centrado no docente, comportamentalista, focado no treinamento para as provas e aborda a Física como uma ciência acabada, tal como apresentada em um livro de texto. O que é? 1. Comportamentalismo. 2. Aprendizagem significativa. 3. Aprendizagem mecânica. 4. Educação bancária. 5. Educação dialógica. 6. Situação que faça sentido. 7. Conceito fora de foco. 8. O modelo da narrativa. 9. Aprendizagem significativa crítica 5 O comportamentalismo de Skinner1. Ideia-chave: o comportamento é controlado pelas consequências. 2. O enfoque skinneriano limita-se ao estudo de comportamentos (objetivos comportamentais) manifestos e mensuráveis. 3. Não leva em consideração o que ocorre na mente do sujeito durante o processo de aprendizagem. 4. Na prática, estimula a aprendizagem mecânica. A aprendizagem significativa de Ausubel A interação cognitiva entre conhecimentos novos e prévios é a característica chave da aprendizagem significativa, aprendizagem com significado, compreensão, capacidade de aplicação, de transferência. Nessa interação o novo conhecimento deve relacionar-se de maneira não arbitrária e não literal com aquilo que o aprendiz já sabe. 1. Se tivesse (Ausubel2) que reduzir toda a psicologia educacional a um só princípio, enunciaria este: de todos os fatores que influem na aprendizagem, o mais importante é o que o aluno já sabe; averigue-se isso e ensine-se de acordo. 2. Aprendizagem mecânica é a aprendizagem puramente memorística, sem significado, sem compreensão, sem capacidade de explicar, de transferir. 3. Serve para reproduzir, a curto prazo, respostas em provas quando a matéria é a mesma que “foi dada” pelo(a) professor(a) nas aulas. 4. É a que predomina na escola. A educação bancária de Freire Educação bancária é aquela que anula o poder criador dos educandos ou o minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade. Na concepção bancária, a educação é o ato de depositar, transferir, transmitir valores e conhecimentos. Nessa concepção, o saber é uma doação dos que se julgam sábios aos que se julga nada saber. 6 Na concepção bancária cabe à educação apassivar ainda mais os sujeitos que já são seres passivos, adaptando-os ao mundo. Quanto mais adaptados, tanto mais educados. Nos dias de hoje em que o discurso pedagógico e político é o aprender a aprender e o ensino centrado no aluno, a concepção de educação bancária de Freire, como mínimo, leva a uma reflexão sobre o que é a escola e sobre como que deveria ser para ser coerente com esse discurso. Contrariamente à educação bancária, a criticidade, a consciência crítica, é fundamental para a libertação. Para isso, segundo Freire3 , a dialogicidade – essência da educação como prática da liberdade– é imprescindível. Diálogo, no entanto, não é palavreria, verbalismo, blábláblá. Também não é a discussão guerreira, polêmica, entre sujeitos que buscam impor sua verdade. Nessa perspectiva a educação autêntica não se faz do educador para o educando ou do educador sobre o educando, mas sim do educador com o educando. 1. Na educação bancária, estudar é memorizar conteúdos mecanicamente, sem significados. O que se espera do educando é a memorização dos conteúdos nele depositados. A compreensão e a significação não são requisitos, a memorização mecânica sim. 2. Na educação dialógica, estudar requer apropriação da significação dos conteúdos, a busca de relações entre os conteúdos e entre eles e aspectos históricos, sociais e culturais do conhecimento. Requer também que o educando se assume como sujeito do ato de estudar e adote uma postura crítica e sistemática. 3. Nesse processo, a pergunta é essencial: perguntar é a própria essência do conhecer. O ato de perguntar está ligado ao ato de existir, de ser, de estudar, de investigar de conhecer ([2] , p.97). 4. Na educação bancária, o educador é quem pergunta e cobra do educando respostas memorizadas. Suas perguntas geralmente são perguntas que os educandos não se fazem. 7 5. Na educação dialógica, o educando é quem deve perguntar, questionar. Mas isso não significa que o educador seja um repositório de respostas, nem que existam respostas definitivas. 6. Não há respostas definitivas, todas são provisórias. O importante é o perguntar que leva ao conhecer que também não é definitivo. Criticidade 1. Ensinar exige criticidade: na verdade, a curiosidade ingênua que, “desarmada”, está associada ao saber do senso comum, é a mesma curiosidade que, criticizando-se, aproximando-se, de forma cada vez mais metodicamente rigorosa, do objeto cognoscível, torna-se curiosidade epistemológica”. 2. Ensinar exige reflexão sobre a prática: na formação permanente dos professores, um momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática; é pensando criticamente sobre a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. 3. Um princípio geral da pedagogia da autonomia de Freire é o de que ensinar não é transferir conhecimento, mas sim criar possibilidades para sua própria produção ou sua construção. 4. Para ele, o educador que, ensinando qualquer matéria, “castra” a curiosidade do educando em nome da eficácia da memorização mecânica dos conteúdos, tira a liberdade do educando, sua capacidade de aventurar-se. As situações de Vergnaud 1. Para Vergnaud , a conceitualização é o núcleo do desenvolvimento cognitivo. 2. São as situações que dão sentido aos conceitos. 3. Para serem aprendidos significativamente os novos conhecimentos devem fazer sentido para o aprendiz. 4. As situações devem ser propostas em níveis crescentes de complexidade. 5. O domínio de um campo conceitual é lento, progressivo, com rupturas e continuidades. 8 Os conceitos fora de foco de Neil Postman 1. Podemos , afinal de contas, aprender somente em relação com o que já sabemos. Esta ideia - por si só – implica uma grande mudança na maioria das metáforas que dirigem as políticas e os procedimentos das escolas [11] . 2. No último capítulo de seu livro Teaching as a subversive activity, Postman5 e Weingartner diziam, em 1969, que mesmo que devesse preparar o aluno para viver em uma sociedade caracterizada pela mudança, cada vez más rápida, de conceitos, valores, tecnologias, a escola ainda se ocupava de ensinar conceitos fora de foco, dos quais os mais evidentes eram ([11], p. 217): 3. O conceito de “verdade” absoluta, fixa, imutável, em particular desde uma perspectiva bipolar do tipo boa ou má. 4. O conceito de certeza. Existe sempre uma resposta “correta”, e é absolutamente “correta”. 5. O conceito de entidade isolada, ou seja, “A” é simplesmente “A”, e ponto final, de uma vez para sempre. 6. O conceito de causalidade simples, única, mecânica; a ideia de que cada efeito é o resultado de uma única causa, facilmente identificável. 7. O conceito de que as diferenças existem somente em formas paralelas e opostas: bom-mau, certo ou errado; sim-não, curto-longo, para cima-para baixo, etc. 8. O conceito de que o conhecimento é “transmitido”, que emana de uma autoridade superior, e deve ser aceito sem ser questionado. 9. Ao contrário, as estratégias intelectuais de sobrevivência nessa época de energia nuclear e de viagens espaciais dependeriam de conceitos como relatividade, probabilidade, incerteza, função, causalidade múltipla (ou não- causalidade), relações não simétricas, graus de diferença e incongruência. Isso foi escrito há mais de quarenta anos, quando a chegada do homem à Lua e a chamada era nuclear simbolizavam grandes mudanças. Hoje, essas mesmas mudanças resultam pequenas frente às que nos atropelam diariamente. 9 A educação, no entanto, continua estimulando vários dos conceitos que Postman e Weingartner criticavam e classificavam como fora de foco. Ainda se ensinam “verdades”, respostas "corretas", entidades isoladas, causas simples e identificáveis, estados e “coisas” fixos, diferenças somente dicotômicas. E ainda se “transmite” o conhecimento, desestimulando o questionamento. O discurso educativo pode ser outro, mas a prática escolar segue sem fomentar o “aprender a aprender” que permitirá à pessoa lidar com a mudança de forma frutífera e sobreviver. O modelo da narrativa de Don Finkel 1. O modelo clássico de ensino, consagrado, aceito sem questionamentos por professores,alunos e pais, pela sociedade, é aquele no qual o professor ensina, básica e fundamentalmente, falando, dizendo aos estudantes o que se supõe que devem saber. 2. Esse modelo é o que Don Finkel6 [1] chama de Modelo da Narrativa ao qual ele contrapõe o de Dar aulas com a boca fechada ([1], p. 45), estimulando a busca de modos alternativos de ensinar. 3. Nesse modelo, muitas vezes baseado em um livro de texto, o professor escreve (uma forma de narrar) no quadro o que os alunos devem copiar em seus cadernos, estudar (memorizar) e depois reproduzir nas avaliações. 4. Às vezes o professor escreve no quadro partes do próprio livro de texto e, ainda assim, os alunos copiam para estudar mais tarde, em geral na noite anterior à prova para não esquecer. 5. O ato principal de dar aula é narrar clara e cuidadosamente aos estudantes algo que eles não sabem de antemão. O conhecimento se transmite, nos imaginamos, por meio deste ato narrativo ([1], p. 34). O modelo da narrativa parece natural aos estudantes, aos pais, à sociedade, a todo mundo, e, portanto, não é questionado. No entanto, não deveria ser assim porque transmitir o conhecimento desde a cabeça do professor até o caderno do aluno, de modo que o aluno transfira esse conhecimento desde seu caderno até sua cabeça para passar nos exames, e esquecer logo depois, é um objetivo inadequado para a educação, e muito mais para uma aprendizagem significativa 10 crítica. Este modelo está orientado à aprendizagem de informações específicas a curto prazo. Pouco sobra desta aprendizagem depois de algum tempo. 1. Muitos professores não se limitam a repetir no quadro o que está nos livros, fazem esquemas, resumos, trazem exemplos, explicam, quer dizer, "dão boas aulas", segundo o modelo clássico. No entanto, os alunos copiam tudo o que podem (ou pedem os arquivos eletrônicos ao professor) para estudarem depois. 2. Alguns professores, geralmente considerados excelentes professores, inclusive grandes professores, fazem magníficas apresentações orais, encantam seus estudantes explicando clara e cuidadosamente determinados tópicos. Estes estudantes tomam notas de tudo que podem e deixam a aula com a boa sensação de que entenderam o assunto. Se este assunto é solicitado nas provas da mesma maneira como o professor explicou, provavelmente, se sairão muito bem. 3. Contudo, se as questões da prova implicarem a aplicação desse mesmo assunto a novas situações, o resultado é provável que seja pobre. É comum nesse caso os alunos dizerem que a matéria não foi “dada” em aula. Nos dias de hoje se fala muito em ensino centrado no aluno, em professor como mediador e em aprender a aprender. Se estamos de acordo com esse discurso, seguramente estaremos de acordo con Finkel no sentido de que narrar não é a melhor maneira de ensinar e teremos que repensar nosso modelo de bom professor. Nessa linha, Finkel propõe a metáfora Dar aulas com a boca fechada que ele usa para tornar problemáticas as suposições clássicas sobre a boa docência. A aprendizagem significativa crítica Sabemos que a aprendizagem significativa se caracteriza pela interação entre o novo conhecimento e o conhecimento prévio. Nesse processo, que é não literal e não arbitrário, o novo conhecimento adquire significados para o aprendiz e o conhecimento prévio fica mais rico, mais diferenciado, mais elaborado em relação aos significados já presentes e, sobretudo, mais estável. (ver, por exemplo, [8], [6]; [4], [5]). 11 1. Para Moreira7 , aprendizagem significativa crítica: é aquela perspectiva que permite ao sujeito formar parte de sua cultura e, ao mesmo tempo, estar fora dela. Trata-se de uma perspectiva antropológica em relação às atividades de seu grupo social, que permite ao indivíduo participar de tais atividades, porém, ao mesmo tempo, reconhecer quando a realidade se está distanciando tanto que já não está sendo captada por parte do grupo. 2. Este é o significado de subversivo para Postman y Weingartner ([11], p. 4) porém, enquanto eles se ocupam do ensino como uma atividade subversiva, o autor prefere pensar mais em termos de aprendizagem subversiva, e acredita que a aprendizagem significativa crítica pode subjazer a esta ideia de subversão. 3. Aprendizagem significativa crítica, tal como sugere o nome, é aprendizagem com significado, mas também com criticidade. 4. Para facilitá-la é preciso abandonar o comportamentalismo, a educação bancária e o modelo da narrativa. Aprendizagem significativa crítica (subversiva) Para uma aprendizagem significativa crítica (subversiva) é preciso: 1. Aprender/ensinar perguntas em lugar de respostas (Princípio da interação social e do questionamento). 2. Aprender a partir de distintos materiais educativos (Princípio da não centralidade do livro de texto). 3. Aprender que somos perceptores e representadores do mundo (Princípio do aprendiz como perceptor/representador). 4. Aprender que a linguagem está totalmente envolvida em todas as tentativas humanas de perceber a realidade (Princípio do conhecimento como linguagem). 5. Aprender que o significado está nas pessoas, não nas palavras (Princípio da consciência semântica). 6. Aprender que o ser humano aprende corrigindo seus erros (Princípio da aprendizagem pelo erro). 12 7. Aprender a desaprender, a não usar conceitos e estratégias irrelevantes para a sobrevivência (Princípio da desaprendizagem). 8. Aprender que as perguntas são instrumentos de percepção e que as definições e as metáforas são instrumentos para pensar (Princípio da incerteza do conhecimento). 9. Aprender a partir de diferentes estratégias de ensino (Princípio da não utilização do quadro de giz . Do abandono da narrativa) Todos estes princípios são metafóricos. Por exemplo, abandonar o livro de texto, o quadro de giz e a narrativa não significa não usá-los, mas sim não tornar-se escravo deles, não considerá-los como os mais importantes recursos instrucionais. Ensinar perguntas ao invés de respostas não significa não trazer à sala de aulas as respostas que existem para determinadas perguntas, mas sim que é igualmente importante ensinar os alunos a perguntar e buscar resposta O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI No ano passado, a revista Science dedicou boa parte de um volume ao tema Grandes Desafios do Ensino de Ciências [12] . Nas primeiras páginas deste material, Carl Wieman, Prêmio Nobel de Física, em 2001, diz com destaque, referindo-se ao ensino superior: A transformação é possível se a universidade realmente quiser. 1. A maneira como a maioria das universidades de pesquisa ensina ciência na graduação é pior do que ineficaz. É não científica. ([12], p. 292) 2. Há toda uma indústria dedicada a medir quão importante é minha pesquisa, com fatores de impacto dos meus artigos e por aí vai. No entanto, nem sequer coletam dados sobre como estou ensinando. Isso não recebe atenção. ([12], p. 293) 3. Há muitos professores que acham totalmente apropriado dedicar mais tempo melhorando seu ensino, mas não é isso que se espera deles. ([12], ibid.) Criticando o ensino tradicional, Wieman defende a aprendizagem ativa (active learning) e o ensino centrado no aluno: 13 1. O que funciona melhor do que aulas expositivas e temas de casa (listas de problemas) é ter os alunos trabalhando em pequenos grupos com a mediação de professores que podem ajudá-los a aplicar conceitos básicos a situações da vida real. ([12], p. 294) 2. Segundo sua experiência, a melhor maneira de implementar a aprendizagem ativa e o ensino centrado no aluno é fundi-las com o conceito de prática deliberada (deliberate practice). 3. A prática deliberada envolve o aprendiz na resolução de um conjunto de tarefas ou problemas que são desafiadores mas factíveis, viáveis, e que envolvem explicitamente a prática de raciocínio e desempenhocientíficos. O professor, ou mediador, oferece incentivos apropriados para estimular os alunos a dominar as competências necessárias, assim como uma contínua realimentação para mantê-los ativos. ([12], p. 294) 4. A ideia é que a aquisição de habilidades complexas e o desenvolvimento de competências científicas não é uma questão de encher de conhecimentos um cérebro, mas sim de desenvolver esse cérebro (ibid.). A educação em ciências não deve ser uma seleção de talentos, mas sim de desenvolvimento de talentos. 5. Competências como, por exemplo, modelagem, argumentação a partir de evidências, comunicação de resultados. O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI: como é 1. Centrado no docente, na aprendizagem mecânica de conteúdos desatualizados. 2. Basicamente do tipo “ensino para testagem”, focado no treinamento para dar respostas corretas. 3. Ao invés de buscar a interfaces e integrações entre disciplinas, as compartimentaliza ou supõe que não existem. O ENSINO DE CIÊNCIAS NO SÉCULO XXI: como deveria ser 1. Centrado no aluno e no desenvolvimento de competências científicas como modelagem, argumentação, comunicação, validação, ... 14 2. Focado na aprendizagem significativa de conteúdos clássicos e contemporâneos. 3. Fazendo uso intensivo de tecnologias de informação e comunicação, por exemplo, em laboratórios digitais. 4. O professor e o computador como mediadores. 5. Não ficar buscando talentos, por exemplo, em Física, mas começar a desenvolver talentos, fundindo a aprendizagem ativa centrada no aluno com a prática deliberada [12]. Ensino de Física não é uma questão de encher um cérebro de conhecimentos, mas de desenvolver esse cérebro em Física. CONSIDEREÇÕES NO ENSINO DA FÍSICA Certamente, o ensino de Física nas escolas depende de melhores condições de trabalho para os professores, da valorização dos professores. Essa é uma questão política a ser enfrentada. No discurso, a educação é sempre prioridade; na prática, os professores têm carga horária muito elevada e salários muito baixos. A carga horária semanal de Física no Ensino Médio era de seis horas, no antigo científico. Hoje é de duas horas ou menos. E tende a zero se a Física ficar inserida em uma só disciplina de “Ciências da Natureza”. É preciso lutar por mais aulas e pela não inserção da Física nessa “nova disciplina”. As interfaces entre disciplinas são importantes, atividades interdisciplinares ou multidisciplinares também, mas daí a “fundir” disciplinas como Física, Química e Biologia em uma só é um absurdo pedagógico. Talvez uma saída para a baixa carga horária e a manutenção da identidade das disciplinas de Física, Química e Biologia é seguir o modelo americano ou, de certa forma, voltar ao clássico e científico: em determinada etapa do Ensino Médio o aluno escolhe uma das três e, então, de fato, tem um bom ensino de ciências, seja de Física, Química ou Biologia. No caso da Física, é provável que não seja a mais escolhida, mas não importa: a carga horária voltará a ser mais adequada e os professores poderão, de fato, ensinar física. A formação dos professores é outro problema a ser resolvido. Há uma grande quantidade de pesquisas sobre formação de professores, mas grande parte dessa formação fica a cargo de professores universitários cuja 15 avaliação acadêmica depende apenas de trabalhos publicados em revistas bem indexadas. Suas “metodologias” são apenas “aulas teóricas e listas de problemas”. O resultado é aprendizagem mecânica e altos índices de reprovação. É preciso mudar essa cultura. Além disso, é notório que os professores de Ensino Médio têm dificuldades com os conteúdos de Física, principalmente os de Física Moderna e Contemporânea. Há, no entanto, muitas críticas à ênfase em conteúdos na formação de professores. Mas, sem conteúdos de Física, como ensinar Física? O problema é que esses conteúdos devem ser adquiridos significativamente. E aí voltamos ao fraco, e desvalorizado, ensino universitário que fomenta a aprendizagem mecânica do conteúdo pelo conteúdo. Na formação de professores de Física muitos conteúdos de Física, clássicos e contemporâneos, devem ser trabalhados, mas de uma visão de transferência didática e de aprendizagem significativa. Mas é óbvio que somente conteúdos, mesmo com significatividade não é suficiente. É preciso também incorporar, ao ensino da Física, as tecnologias de informação e comunicação, assim como aspectos epistemológicos, históricos, sociais, culturais. Ensinar Física é um grande desafio, mas pode ser apaixonante se conseguirmos melhores condições de trabalho para os professores, livrar-nos do ensino para a testagem e, metaforicamente, abandonarmos o modelo da narrativa, o quadro- de-giz e o livro de texto. APRENDIZAGEM A aprendizagem é muito mais significativa à medida que o novo conteúdo é incorporado às estruturas de conhecimento de um aluno e adquire significado para ele a partir da relação com seu conhecimento prévio. Ao contrário, ela se torna mecânica ou repetitiva, uma vez que se produziu menos essa incorporação e atribuição de significado, e o novo conteúdo passa a ser armazenado isoladamente ou por meio de associações arbitrárias na estrutura cognitiva. Assim, o objetivo deste texte é identificar as propostas sobre a aprendizagem escolar e a instrução formuladas pelo psicólogo norte-americano D. P. Ausubel. As idéias de Ausubel, cujas formulações iniciais são dos anos 60, encontram-se 16 entre as primeiras propostas psicoeducativas que tentam explicar a aprendizagem escolar e o ensino a partir de um marco distanciado dos princípios condutistas. Neste processo a nova informação interage em comum à estrutura de conhecimento específico, que Ausubel chama de conceito “subsunçor”. Esta é uma palavra que tenta traduzir a inglesa “subsumer”. Quando o conteúdo escolar a ser aprendido não consegue ligar-se a algo já conhecido, ocorre o que Ausubel chama de aprendizagem mecânica, ou seja, quando as novas informações são aprendidas sem interagir com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Assim, a pessoa decora fórmulas, leis, mas esquece após a avaliação. CONDIÇÕES PARA A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA Para que a aprendizagem significativa ocorra é preciso entender um processo de modificação do conhecimento, em vez de comportamento em um sentido externo e observável, e reconhecer a importância que os processos mentais têm nesse desenvolvimento. As ideias de Ausubel também se caracterizam por basearem-se em uma reflexão específica sobre a aprendizagem escolar e o ensino, em vez de tentar somente generalizar e transferir à aprendizagem escolar conceitos ou princípios explicativos extraídos de outras situações ou contextos de aprendizagem. Para haver aprendizagem significativa são necessárias duas condições. Em primeiro lugar, o aluno precisa ter uma disposição para aprender: se o indivíduo quiser memorizar o conteúdo arbitrária e literalmente, então a aprendizagem será mecânica. Em segundo, o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente significativo, ou seja, ele tem que ser lógica e psicologicamente significativo: o significado lógico depende somente da natureza do conteúdo, e o significado psicológico é uma experiência que cada indivíduo tem. Cada aprendiz faz uma filtragem dos conteúdos que têm significado ou não para si próprio. Com esse duplo marco de referência, as proposições de Ausubel partem da consideração de que os indivíduos apresentam uma organização cognitiva interna baseada em conhecimentos de caráter conceitual, sendo que a sua complexidade depende muito mais das relações que esses conceitos 17 estabelecem em si que do número de conceitos presentes. Entende-se que essas relações têm um caráter hierárquico, de maneira que a estrutura cognitiva é compreendida, fundamentalmente,como uma rede de conceitos organizados de modo hierárquico de acordo com o grau de abstração e de generalização. A partir dessa especificação, a aprendizagem escolar passa a caracterizar-se globalmente como a assimilação a essa rede de determinados corpos de conhecimentos conceituais, selecionados socialmente como relevantes e organizados nas áreas de conhecimento. ANÁLISE E NOÇÃO DOS TIPOS DE APRENDIZAGEM Para esclarecer como é produzida a aprendizagem escolar, Ausubel propõe distinguir dois eixos ou dimensões diferentes que originarão, a partir dos diversos valores que possam tomar em cada caso, a classes diferentes de aprendizagem. • Aprendizagem significativa • Aprendizagem memorística O primeiro é o eixo relativo à maneira de organizar o processo de aprendizagem e a estrutura em torno da dimensão aprendizagem por descoberta/aprendizagem receptiva. Essa dimensão refere-se à maneira como o aluno recebe os conteúdos que deve aprender: quanto mais se aproxima do polo de aprendizagem por descoberta, mais esses conteúdos são recebidos de modo não completamente acabado e o aluno deve defini-los ou “descobri-los” antes de assimila-los; inversamente, quanto mais se aproxima do polo da aprendizagem receptiva, mais os conteúdos a serem aprendidos são dados ao aluno em forma final, já acabada. Ao contrário, o segundo eixo remete ao tipo de processo que intervém na aprendizagem e origina um continuum delimitado pela aprendizagem significativa, por um lado, e pela aprendizagem mecânica ou repetitiva, por outro. Nesse caso, a distinção estabelece, ou não, por parte do aluno, relações substanciais entre os conceitos que estão presentes na sua estrutura cognitiva e o novo conteúdo que é preciso aprender. Quanto mais se relaciona o novo conteúdo de maneira substancial e não arbitrária com algum aspecto da estrutura cognitiva prévia que lhe for relevante, mais próximo se está da aprendizagem significativa. Quanto menos se 18 estabelece esse tipo de relação, mais próxima se está da aprendizagem mecânica ou repetitiva. A noção de aprendizagem significativa, definida dessa maneira, torna-se nesse momento o eixo central da teoria de Ausubel. Efetivamente, a aprendizagem significativa tem vantagens notáveis, tanto do ponto de vista do enriquecimento da estrutura cognitiva do aluno como do ponto de vista da lembrança posterior e da utilização para experimentar novas aprendizagens, fatores que a delimitam como sendo a aprendizagem mais adequada para ser promovida entre os alunos. Além do mais, e de acordo com Ausubel, pode-se conseguir a aprendizagem significativa tanto por meio da descoberta como por meio da repetição, já que essa dimensão não constitui uma distinção tão crucial como dimensão de aprendizagem significativa/aprendizagem repetitiva, do ponto de vista da explicação da aprendizagem escolar e do delineamento do ensino. Contudo, e com relação a essa segunda dimensão, Ausubel destaca como são importantes, pelo tipo peculiar de conhecimento que pretende transmitir, a educação escolar e, pelas próprias finalidades que possui, a aprendizagem significativa por percepção verbal. Segundo a teoria de Ausubel, na aprendizagem há três vantagens essenciais em relação à aprendizagem memorística. Em primeiro lugar, o conhecimento que se adquire de maneira significativa é retido e lembrado por mais tempo. Em segundo, aumenta a capacidade de aprender outros conteúdos de uma maneira mais fácil, mesmo se a informação original for esquecida. E, em terceiro, uma vez esquecida, facilita a aprendizagem seguinte – a “reaprendizagem”, para dizer de outra maneira. A explicação dessas vantagens está nos processos específicos por meio dos quais se produz a aprendizagem significativa onde se implica, como um processo central, a interação entre a estrutura cognitiva prévia do aluno e o conteúdo de aprendizagem. Essa interação traduz-se em um processo de modificação mútua tanto da estrutura cognitiva inicial como do conteúdo que é preciso aprender, constituindo o núcleo da aprendizagem significativa, o que é crucial para entender as propriedades e a potencialidade. 19 A CONSTRUÇÃO HUMANA ATRAVÉS DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA A reforma educativa tem como missão não somente a ordenação do sistema educativo, mas também a oferta de conteúdos e metodologias de aprendizagem. A reforma do ensino supõe também a reforma do currículo e, por consequência, dos propósitos e condições para que a educação seja eficaz. Em outras palavras, para que a mudança da funcionalidade do sistema educativo seja verdadeira, é necessária uma profunda reforma de conteúdos e métodos. A intervenção educativa precisa, portanto, de uma mudança de ótica substancial, na qual não somente abranja o saber, mas também o saber fazer, não tanto o aprender, como o aprender a aprender. Para isso, é necessário que os rumos da ação educativa incorporem em sua trajetória um conjunto de legalidades processuais. Em primeiro, partir do nível de desenvolvimento do aluno, isto é, a ação educativa está condicionada pelo nível de desenvolvimento dos alunos, os quais nem sempre vêm marcados pelos estudos evolutivos existentes e que, por tal motivo, devem complementar-se com a exploração dos conhecimentos prévios dos estudantes (alunos), o que já sabem ou têm construído em seus esquemas cognitivos. A soma de sua competência cognitiva e de seus conhecimentos prévios marcará o nível de desenvolvimento dos alunos. Em segundo, a construção das aprendizagens significativas implica a conexão ou vinculação do que o aluno sabe com os conhecimentos novos, quer dizer, o antigo com o novo. A clássica repetição para aprender deve ser deixada de fora na medida do possível; uma vez que se deseja que seja funcional, deve-se assegurar a auto estruturação significativa. Nesse sentido, sugere-se que os alunos “realizem aprendizagens significativas por si próprios”, o que é o mesmo que aprendam o aprender. Assim, garantem- se a compreensão e a facilitação de novas aprendizagens ao ter-se um suporte básico na estrutura cognitiva prévia construída pelo sujeito. Em terceiro, faz-se necessário modificar os esquemas do sujeito, como resultado do aprender significativamente. Uma maneira adequada de ampliar e/ou modificar as estruturas do aluno consiste em provocar discordâncias ou conflitos cognitivos 20 que representem desequilíbrios a partir dos quais, mediante atividades, o aluno consiga reequilibrar-se, superando a discordância reconstruindo o conhecimento (PIAGET, 1997). Para isso, é necessário que as aprendizagens não sejam excessivamente simples, o que provocaria frustração ou rejeição. Em resumo, o que é sugerido é a participação ativa do sujeito, sua atividade auto estruturante, o que supõe a participação pessoal do aluno na aquisição de conhecimentos, de maneira que eles não sejam uma repetição ou cópia dos formulados pelo professor ou pelo livro-texto, mas uma reelaboração pessoal. OS MAPAS CONCEITUAIS: UMA TÉCNICA PARA A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA Os mapas conceituais têm por objetivo representar relações significativas entre conceitos na forma de proposições. Uma proposição é constituída de dois ou mais termos conceituais unidos por palavras para formar uma unidade semântica (NOVAK; GOWIN, 1988). São instrumentos que permitem descobrir as concepções equivocadas ou interpretações não aceitas (podem não ser errôneas) de um conceito, ilustradas por uma frase que inclui no conceito. Devem ser hierárquicos, quer dizer, os conceitos mais gerais devem situar-se na parte superior, e os conceitos mais específicos e menos inclusivos na parte inferior. Também podem ser considerados instrumentos úteis para negociar significados, quer dizer, os alunos sempre trazem alguma coisa deles mesmos para a negociação. Não são como uma tábua rasa ou um recipiente vazioque o professor deve preencher. É pouco provável que uma pessoa nos anos 70 imaginasse uma “era da informação” sem um pleno desenvolvimento da capacidade humana de comunicação, no entanto, comunicar-se, e bem, ainda tem sido um complexo desafio para a sociedade atual. As pessoas têm cada vez mais consciência de que aquilo que elas enviam muitas vezes não é a mensagem recebida, e uma possível integração passa a ser um objetivo quase inatingível. O aluno que hoje freqüenta uma escola infelizmente ainda vê o conhecimento como algo muito distante da sua realidade, pouco aproveitável ou significativo nas suas necessidades cotidianas. Na sua teoria, Ausubel apresenta uma aprendizagem que tenha como ambiente uma comunicação eficaz, respeite e conduza o aluno 21 a imaginar-se como parte integrante desse novo conhecimento através de elos, de termos familiares a ele. Através da palavra, o educador pode diminuir a distância entre a teoria e a prática na escola, capacitando-se de uma linguagem que ao mesmo tempo desafie e leve o aluno a refletir e sonhar, conhecendo a sua realidade e os seus anseios. A palavra enquanto mensagem, segundo BAKTHTIN (1995), é uma estrutura pura, complexa, que o homem utiliza na sua prática, distanciando o receptor da essência da mensagem que pode ser feita de palavra escrita, falada, cantada, desenhada, pintada, tocada, cheirada, vista, gesticulada, saboreada ou, simplesmente, sentida. O próprio educador, praticante da sua área de conhecimento, é uma ferramenta do saber do aluno. Se ele for apaixonado pela sua área de conhecimento e for capaz de encantar, o aluno poderá talvez perceber que existe algo pelo qual alguém de fato se interessou e que talvez possa valer a pena seguir o mesmo caminho. Mas se essa não for a realidade vivida pelo professor, se ele apenas transmitir aquilo que leu nos livros, por mais que ele fale de determinado assunto, todo corpo estará dizendo o contrário e o aluno provavelmente terá aquele conhecimento como algo para apenas ser cumprido, porque a mente humana é capaz de fazer leituras bastante profundas dos detalhes aparentemente insignificantes, mas que certamente têm um grande poder de semear profundo significados. Baseado nessas informações, conclui- se que a teoria de Ausubel contribuirá de maneira significativa na construção da sociedade do conhecimento. Refletindo o ensino de ciências no Brasil Ao propor uma discussão no processo ensino-aprendizagem de Física é necessário vinculá-lo ao processo histórico/evolutivo da educação brasileira. Desta forma, é necessário conhecer o processo e os caminhos que levaram a sua inserção nos currículos escolares e as visões que tem sido dadas ao ensino desta Ciência ao longo da história educacional do país. O processo de educação escolarizado no Brasil vem sendo construído ao longo dos anos fortemente apoiados em questões de ordem política, o que de certo modo, tem proporcionado um descaso e uma falta de compromisso com a formação cultural, moral, intelectual e científica do nosso povo. 22 O ensino das Ciências é um reflexo desta situação educacional, já que não existe uma política nacional para o desenvolvimento da Ciência, nem mesmo para direcionar de forma estratégica seu ensino, como já vem acontecendo em países como a Inglaterra, a França, a Alemanha e outros. Nestes países a política estrategista existe desde o século XVIII, definindo como se deve ensinar, qual a prioridade e a inclinação que necessitam ser dadas a Ciência e ao seu ensino nas escolas e nas universidades. Olhando o aspecto histórico, identifica-se que o ensino de Física no Brasil é algo recente, passando a ser objeto de estudo nas escolas de maneira mais efetiva a partir de 1837, com a fundação do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. O ensino na época baseava-se na transmissão de informações através de aulas expositivas, visando à preparação para os exames que proporcionavam a continuidade dos estudos. Data-se 1934 como o ano em que foi criado o primeiro curso de graduação em Física no Brasil Sciencias Physicas, junto a Faculdade de Philosophia, Sciencias e Letras da Universidade de São Paulo. Este curso visava formar bacharéis e licenciados em Física, sendo os últimos destinados a lecionar em escolas desde o ensino fundamental até o superior. Porém, foi a partir dos anos de 1950, que a Física passou a fazer parte dos currículos desde o ensino fundamental até o médio, tendo sua obrigatoriedade ocorrido em função da intensificação do processo de industrialização no país. A este fator somou-se o incentivo dado ao ensino de Ciências nas escolas de formação básica nos anos pós-guerra (após o término da II Guerra Mundial) como forma de atrair estudantes para a formação superior nessa área do conhecimento. Este incentivo adveio do governo americano e estendeu-se por toda a América Latina, implementando um ensino caracterizado pelo domínio de conteúdos e pelo desenvolvimento de atividades experimentais, tendo como referência o modelo americano. Professores foram treinados em curso específicos visando à perpetuação do modelo conteudista experimental. Este fato tem tido reflexos no ensino dessa Ciência até hoje em virtude de muitos professores que hoje ministram aulas, principalmente nas academias formadoras dos professores da educação básica, terem tido seu processo de formação na época dos anos pós-guerra, fortemente identificado com a visão conteudista. 23 No período anterior à Segunda Guerra Mundial, as atividades experimentais no ensino de Física eram poucas e centradas na demonstração por parte do professor, pois eram constituídas por arranjos experimentais sofisticados, com custos elevados. Esse período ficou conhecido como a Era das Máquinas, cujo objetivo consistia na demonstração do fenômeno físico de modo a ilustrar a teoria. Entretanto, após a década de 1950, a concepção acerca das atividades experimentais modificou-se, passando a privilegiar a montagem das experiências pelos alunos. Os estudantes recebiam kits para a montagem do experimento que desejavam estudar, ocorrendo assim, uma mudança radical na postura que estava sendo dada as aulas práticas de Física. Na década de 1960, os investimentos em educação continuavam dependendo de capital estrangeiro, mas ao mesmo tempo, iniciava-se um movimento de reforma da educação brasileira, principalmente com a instituição da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em 1961. No ensino de Física, identifica-se esta época com os consideráveis investimentos na aquisição de materiais para aulas experimentais, sobretudo através de convênios com instituições e governos estrangeiros. Chegavam as escolas os kits de materiais didáticos, sempre acompanhados de livros que serviam de roteiros-guia para as atividades dos professores, perpetuando, desta forma, o modelo de ensino difundido nos programas. Segundo Popkewitz (1997), o movimento de reforma do currículo dos anos 60 surgiu dentro de uma euforia geral sobre o papel da Ciência no progresso do mundo., idealizando a visão técnica da Ciência, priorizando o conhecimento científico produzido por cientistas desinteressados pelos valores sociais e que baseavam seus trabalhos de pesquisas em normas de consenso geral (p. 151). No início da década de 1970, despertou no Brasil, assim como em outros países, a corrida para a modernidade, para o desenvolvimento, passando-se a ver na educação, em especial no ensino de Ciências, um elemento fundamental para se alcançar tal sucesso. Segundo Gouveia (1992): “Para atingir o nível de desenvolvimento das grandes potências ocidentais, a educação foi considerada como alavanca do progresso. Não bastava olhar a educação como um todo, era preciso dar especial atenção ao aprendizado de Ciências. 24 O conhecimento científico do mundo ocidentalfoi colocado em cheque e ao mesmo tempo, foi tido como mola mestra do desenvolvimento, pois era capaz de achar os caminhos corretos para lá chegar e também se sanar os possíveis enganos cometidos (p. 72).” A educação nacional passou por um redimensionamento na questão relativa a educação para o trabalho, surgindo a obrigatoriedade do ensino secundário ser preparatório para o trabalho independentemente do nível socioeconômico dos alunos. Este tipo de ensino tinha como objetivo claro, diminuir o acesso desses alunos ao ensino superior, encaminhando os mesmos para o mercado de trabalho mais rapidamente, consolidando assim na prática a visão americana da educação como fonte para o progresso econômico do país. Em decorrência dessa situação, o ensino de Ciências nas escolas sofreu, um período de adaptação ao ensino profissionalizante. Nas décadas de 1980 e 1990, o país passou por uma reorganização no campo político e o ensino de Ciências, tomava em termos mundiais uma dimensão de produção do conhecimento voltada para os avanços tecnológicos. Já não se pode mais separar Ciência da Tecnologia e iniciava-se uma discussão em torno dos benefícios desta associação para os homens e para a sociedade. Havia necessidade de uma melhoria no ensino das Ciências no Brasil e no mundo, aproximando-o das necessidades permanentes da sociedade em que os indivíduos estão inseridos. No Brasil mais uma vez, de concreto não sofreu alterações significativas no ensino de Ciências, permanecendo um ensino preso a modelos tradicionais. O ensino de Física em particular, não consegue atingir os níveis desejados, sendo praticado, na sua grande maioria, por professores que desconheciam as relações entre Sociedade, Tecnologia e Ciência, mantendo-se arraigados aos processos de ensino voltado a informação, sem qualquer vínculo com as concepções modernas de educação. Hoje, no início do século XXI, mais de cem anos de história se passaram desde a introdução da Física nas escolas no Brasil, mas sua abordagem continua fortemente identificada com aquela praticada a cem anos atrás: ensino voltado para a transmissão de informações através de aulas expositivas utilizando 25 metodologias voltadas para ao resolução de exercícios algébricos. Questões voltadas para o processo de formação dos indivíduos dentro de uma perspectiva mais histórica, social, ética, cultural, permanecem afastadas do cotidiano escolar, sendo encontradas apenas nos textos de periódicos relacionados ao ensino de Física, não apresentando um elo com o ambiente escolar. Refletindo o processo de transposição didática Retomando a questão relacionada à seleção dos conteúdos no âmbito da ação didática do professor, acredita-se ser imprescindível a análise no processo de transposição didática. Este termo transposição didática foi utilizado por Chevallard no estudo da matemática, sendo definido como: “Um conteúdo do conhecimento, tendo sido designado como saber a ensinar, sofre então um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto a tomar lugar entre os objetos de ensino. O trabalho que, de um objeto de saber a ensinar faz um objeto de ensino, é chamado de transposição didática” (Chevallard e Johsua, 1991, p.39). Assim, no estudo de questões curriculares é necessário reconhecer os caminhos pelos quais um conhecimento é transformado em objeto de ensino, identificando as diferentes formas como esta relação ocorre. Segundo Grando (2000), Chevallard, enfatiza que, quando um objeto de saber (um conceito, um conhecimento científico) é designado como saber a ensinar, ele sofrerá transformações no sentido de adaptá-lo ao ensino (conteúdos escolares). Este processo, no entender de Grando, ocorre porque o funcionamento didático é diferente do funcionamento sábio (sábio está relacionado ao savoir savant, traduzido como saber sábio ou conhecimento científico), havendo dois regimes de saber, inter-relacionados mas não sobrepostos. Para Chevallerd, essa modificação que o saber gerado no mundo científico sofre é inevitável, pois sem ele não haveria possibilidade didática de concretizar o processo ensino- aprendizagem de um determinado conceito. O processo de transposição didática se divide em duas etapas: uma externa ao contexto escolar, pertencente à seleção dos conteúdos de saber a ensinar até a chegada na escola; outra interna, que se refere à apropriação do conteúdo pela escola e à chegada desse ao aluno. 26 Pinho Alves (2000) menciona que, O termo saber (savoir) é utilizado para designar o objeto sujeito a transformações (...) o processo de transposição didática estabelece a existência de três patamares, ou níveis para saber: (a) o saber sábio (savoir savant); (b) o saber a ensinar (savoir à enseigner) e (c) saber ensinado (savoir ensigné). (p. 178) Analisando os trabalhos de Chevallard e Pinho Alves, é possível identificar o trabalho externo como aquele relacionado ao saber sábio e ao saber a ensinar, enquanto o trabalho interno estaria associado ao saber ensinado. Por saber sábio entende-se aquele que advém da produção do conhecimento ou da apresentação deste a sociedade, relacionado, portanto, diretamente com o trabalho do mundo científico. Esse saber é gerado a partir de indagações e investigações dos cientistas na busca por respostas desejadas, estando vinculado a concepções e interesses políticos, econômicos e sociais. Já a apresentação deste conhecimento à sociedade, assim como as tecnologias advindas como decorrências destas pesquisas, sofrem um processo de transposição, antes mesmo de se tornarem objeto de ensino. Isto ocorre, já que há necessidade de tornar o saber científico compreensível as sociedades em geral. Ainda na esfera externa, encontra-se um grupo diferente daquele que produziu o conhecimento ou mesmo que o apresentou a sociedade, responsável pela organização e seleção dos conhecimentos que deverão ser transformados em objetos de ensino. Este grupo, sob regras próprias, passa a gerar um novo saber, tendo a competência de tornar esse conhecimento em saber que possa ser ensinado nas escolas. Segundo Pinho Alves (2000), “o saber a ensinar é produto organizado e hierarquizado em graus de dificuldade, resultante de um processo de total descontextualização e degradação do saber sábio. Enquanto o saber sábio apresenta-se ao público através das publicações científicas, o saber a ensinar faz-se por meio dos livros-textos e manuais de ensino” (p. 179). A apresentação desse saber a ensinar, após sofrer as adaptações necessárias, passa a compor os livros textos. Ele tem se apresentado linearizado, elaborado a partir dos níveis de desenvolvimento do aluno, seguindo uma lógica seqüencial, permitindo que a apropriação do conhecimento ocorra de forma facilitada ao aluno, diferente daquela que originou o objeto de estudo ou da maneira pela qual ele foi apresentado a sociedade. 27 Esses saberes sofrem um processo de descontextualização e passam a representar generalizações. Nesse processo muito se perde da história e das circunstâncias nas quais o saber emergiu. Tais situações são omitidas, dando lugar a um anonimato e a uma descontextualização do saber, assim como ocorre na despersonalização das publicações científicas na esfera do saber sábio. Um exemplo da discordância entre a produção do saber e elaboração do saber a ensinar na escola, é analisada por Astolfi se referindo a observação de Martinand sobre os estudo do efeito foto elétrico nos manuais franceses de ensino: “A maior parte dos manuais franceses de física expõe o efeito foto elétrico dando, primeiramente, as leis experimentais. Mostram, em seguida, que essas leis são bem explicadas pela teoria do fóton de Einstein. Ora, a teoria de Einstein data de 1905 e era apresentada como um ponto de vista heurístico, ao passo que as experiências haviam sido feitas com muitasdificuldades técnicas por Milikan em 1916” (Martinand apud Astolfi, 1995, p.50) Já na esfera interna o saber atinge um novo nível, agora mais próximo do aluno, relacionado com a maneira pela qual ele é transformado em objeto a ser ensinado. Essa tarefa cabe ao professor, que arraigado ao contexto escolar, impõe de certa forma a sua organização e decide, em conjunto com a escola, a melhor maneira pela qual o saber a ensinar possa ser de fato ensinado aos alunos. É nessa instância que se destaca a participação do professor como elemento mediador entre o conhecimento (saber a ser ensinado) e o aluno. Aqui é importante destacar que é nessa esfera que ocorre o processo de seleção dos saberes a serem ensinados aos alunos. O professor e a escola têm autonomia suficiente para decidir quais os conteúdos que deverão ser abordados em cada série, assim como decidir quais as obras didáticas que servirão de referência no desenvolvimento das aulas. Outro ponto importante e que pertence à esfera interna do processo de transposição didática estando relacionada diretamente a ação do professor, são as atividades práticas/experimentais. Cabe ao professor, que conjuntamente com a escola, toma a decisão pela utilização ou não das atividades práticas/experimentais no ensino de Física. Entretanto, vale lembrar que há um consenso acerca da validade de realização de práticas experimentais no ensino de Física por parte dos professores, seja no sentido de metodologia de ensino como solução das 28 dificuldades de aprendizagem ou para a ilustração de um fenômeno discutido teoricamente. Não menos importante que as questões já mencionadas a respeito da transformação do saber na esfera do professor, o trabalho de Martinand mostra que esta deve estar relacionada às práticas sociais de referência, buscando uma aproximação entre os conteúdos a serem transmitidos e a realidade dos alunos. Por práticas sociais de referências o autor entende a proximidade dos conteúdos com a cultura e o cotidiano do aluno, de maneira a buscar um significado ao objeto de estudo, não correndo o risco de ter um ensino vazio de significado (Martinand apud Astolfi, 1995) Diante dessa análise do processo de transposição didática relacionada ao ensino de Física, é possível identificar que esta se refere às questões pedagógicas dos conteúdos, de maneira a buscar uma combinação entre o conhecimento científico, produzido pelos elaboradores da ciência, e o que de fato possa ser compreendido pelos alunos. A expressão questões pedagógicas dos conteúdos foi criada por Schulman para expressar as formas mais úteis de representação daquelas ideias, as mais poderosas analogias, exemplos, ilustrações, explicações e demonstrações, numa palavra, as maneiras de representar e formular a matéria de modo a torná- la compreensível para os outros (Schulman, 1986, p. 9). Associada às questões pedagógicas dos conteúdos está o processo de seleção dos tópicos abordados em cada série Essa questão tem provocado polêmica em virtude dos critérios que tem sido utilizado neste processo seletivo. Refletindo o processo ensino-aprendizagem O processo ensino-aprendizagem de Física vincula-se diretamente ao campo das estruturas cognitivas dos indivíduos, a aprendizagem cognitiva. Neste sentido, discutir o processo escolarizado do ensino de Física requer uma identificação com as teorias cognitivas de aprendizagem, como forma de discutir os mecanismos que favorecem a compreensão dos conceitos e fenômenos físicos. Diversas são as teorias que têm sido propostas como forma de subsidiar o ensino nestes últimos anos, porém algumas podem ser vinculadas diretamente ao ensino de Física. Neste sentido, as teorias ditas construtivistas que buscam na construção do conhecimento o meio favorável a sua compreensão, parecem 29 ser mais adequadas a proposta deste trabalho. Dentre as construtivistas, encontramos a teoria histórico-cultural que fornece insight sobre como, de fato, se efetiva uma aprendizagem baseada na apropriação do conhecimento, atribuindo enorme importância ao papel da interação social no desenvolvimento do ser humano. Os estudos de Vygotsky apontam para a inter-relação entre aprendizagem e desenvolvimento, porém mostram que aprendizagem não é desenvolvimento, visto que progride de forma mais lenta e após o processo de aprendizado (1999). Continua Vygotsky: “... o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas” (p. 118). Portanto, o desenvolvimento pleno do ser humano depende do aprendizado que ele realiza num determinado grupo cultural, a partir da sua interação com outros indivíduos. Mais especificamente, com relação ao processo ensinoaprendizagem, Vygotsky (1999) afirma que “o bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento”. Ao possibilitar a existência de zonas de desenvolvimento proximal, o professor estaria forçando o aparecimento de funções ainda não completamente desenvolvidas. Para Vygotsky, as disciplinas escolares são capazes de orientar e estimular o desenvolvimento de funções psíquicas superiores uma vez que se ligam ao sistema nervoso central. A teoria histórico-cultural evidencia a relação entre o social e a aprendizagem escolar. No ensino de Física, percebe-se a importância dessa interação social no processo de aprendizagem escolar, já que esta Ciência se encontra próxima e presente na realidade do educando. Neste sentido, a teoria enfatiza a relação entre os conceitos científicos (ambiente escolar) e os conceitos espontâneos (apropriados no cotidiano), como forma de favorecer a formação dos conceitos. As proposições de Vygotsky a respeito deste processo de formação de conceitos possibilitam verificar a relação existente entre o pensamento e a linguagem, pelos quais ocorre a internalização do conhecimento, e as relações estabelecidas entre os conhecimentos cotidianos e os científicos. O autor afirma: 30 “A formação de conceitos é o resultado de uma atividade complexa, em que todas as funções intelectuais básicas tomam parte. No entanto, o processo não pode ser reduzido a associação, à atenção, à formação de imagens, à interferência ou as tendências determinantes. Todas são indispensáveis, porém insuficientes sem o uso do signo, ou palavra, como o meio pelo qual conduzimos as nossas operações mentais, controlamos o seu curso e as canalizamos em direção à solução do problema que enfrentamos” (Vygotsky, 1999, p. 72). Na formação dos conceitos, salienta-se o confronto entre o conhecimento cotidiano e o científico, que embora pareçam antagônicos, não o são; apenas pertencem a diferentes níveis de desenvolvimento da criança, ou seja, enquanto criança, ela, de fato, entra em conflito com os conhecimentos cotidianos e os discutidos na escola, porém, à medida que ela se desenvolve, tais divergências deixam de existir, dando lugar a um relacionamento mais abrangente, no qual se torna importante a busca pela proximidade entre esses tipos de conhecimento. Vygotsky acredita que esses dois conceitos se relacionam e se influenciam constantemente, fazendo parte de um único processo: o desenvolvimento da formação dos conceitos. Pode-se dizer que a formação de conceitos é afetada por diferentes condições, tendo no aprendizado escolar a força que impulsiona o desenvolvimento mental da criança. No entanto, cabe salientar que, como os conceitos científicos e cotidianos são formulados em condições diferenciadas, produzirão também desenvolvimento diferenciado na mente da criança. Considera-se que, por trás de qualquer conceito científico, existe umsistema hierarquizado do qual ele faz parte e que, por sua vez, pressupõe uma relação consciente e consentida entre sujeito e objeto do conhecimento. O ambiente escolar é considerado o espaço ideal para a aquisição desse tipo de conceito. No entanto, ele se apresenta vinculado ao espontâneo, cujo cerne se encontra na convivência do indivíduo com o mundo que o cerca. Vygotsky (1999) mostra que, à medida que os conceitos científicos avançam, os espontâneos também progridem, permitindo que a relação se dê cada vez mais de forma integrada e associada. Para ele, a tarefa principal do professor é de mediador entre o aluno 31 e o objeto de conhecimento. Quanto à internalização concreta e verdadeira de um conceito por parte de um aluno, Vygotsky (apud Moysés, 1997, p.36) mostra que “[...] o professor, trabalhando com o aluno, explicou, deu informações, questionou, corrigiu o aluno e o fez explicar”. A última expressão "e o fez explicar", é a essência do mecanismo de internalização do conhecimento. No momento em que o professor solicita que um aluno explique o conceito desenvolvido em aula, conseguirá detectar se, de fato, ele se apropriou do conceito. Pode-se, entretanto, dizer que os conceitos científicos estão apoiados em bases sólidas dos conceitos cotidianos. Segundo Vygotsky, “o desenvolvimento dos conceitos espontâneos da criança é ascendente enquanto o desenvolvimento dos seus conceitos científicos é descendente” (1999, p. 135). Acrescenta-se a essa concepção a importância da escola no processo, a qual tem a tarefa de tornar os conhecimentos cotidianos (espontâneos) mais abstratos e abrangentes, permitindo abstrações graduais, com diferentes graus de generalizações, avançando na formação completa do pensamento do aluno. Rego (1996) cita um exemplo do avanço escolar que os conhecimentos espontâneos adquirem, tornando-se, assim, científicos, sem negar os anteriores. Afirma que: “ ... a partir do seu dia-a-dia, a criança pode construir o conceito gato. Esta palavra resume e generaliza as características deste animal (não importa o tamanho, a raça, a cor, etc.) e o distingue de outras categorias tal como livro, estante, pássaro. Os conceitos científicos se relacionam àqueles eventos não diretamente acessíveis à observação ou a ação imediata da criança: são conhecimentos sistematizados, adquiridos nas interações escolares. Por exemplo, na escola o conceito gato pode ser ampliado e tornar-se ainda mais abstrato e abrangente. Será incluído num sistema conceitual de abstrações, graduais, com diferentes graus de generalizações: gato, mamífero, vertebrado, animal, ser vivo constituem uma sequência de palavras que, partindo do objeto concreto gato adquirem cada vez mais abrangência e complexidade”. (p.77) As relações entre os conhecimentos científicos e os adquiridos no cotidiano são particularmente de grande importância para o processo ensino aprendizagem em Física. 32 Como exemplo da importância desta relação entre o conceito espontâneo trazido pelo aluno para o ambiente escolar e o científico desenvolvido na escola, pode- se analisar o estudo da dilatação dos corpos. O aluno já traz consigo, como fruto de sua relação cotidiano com o meio social, a convicção de que, à medida que um corpo é aquecido, aumenta de tamanho (volume), porém é no ambiente escolar que ele amplia esse conceito, na busca pela sua cientificidade, analisando fatores que interferem nesse aumento; o que significa o aquecimento do corpo; a diferença existente em função da natureza da substância; ou, ainda, a possibilidade de que, ao contrário de se expandir, ele se contraia. É preciso, contudo, considerar que o aprendizado escolar é de fundamental importância para o processo de desenvolvimento mental, principalmente na perspectiva vygotskyana, a qual prima pelas relações entre os indivíduos e as formas culturais de comportamento. Vygotsky e seus colaboradores basearamse nos princípios do materialismo dialético e buscaram a interação do homem enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e social, enquanto membro da espécie humana e participante de um processo histórico (Oliveira, 1993). Modelagem e o ensino de Física Aojeriza que grande contingente de alunos do Curso Médio sente por Física deve-se em parte à ausência de alternativas de aprendizagem apresentadas a esses alunos. Coloca-se a aprendizagem memorística como a única possibilidade existente. Na realidade, nem se cogita que existam alternativas. O tipo de aprendizagem de Física que acontece na maioria das situações pode ser resumida a um monte de equações que devem ser misturadas a um monte de dados e, daí, supostamente sairão as respostas aos problemas propostos. Poucos estudantes saem do Curso Médio, ou mesmo da Universidade, com uma visão clara sobre Ciência e a sua função de tentar explicar a Natureza. Em muitas circunstâncias, a Física é ensinada através de fórmulas que descrevem determinado fenômeno. Não se questiona a origem delas que passam a ter as fórmulas são a representação de modelos que foram criados para se entender determinado evento. Esses modelos têm uma região de validade e, além dessa região, eles perdem o sentido, deixam de ser válidos. Desse modo, passam a ser necessários outros modelos para preencherem a lacuna. 33 Os homens constroem modelos conceituais para explicar os fenômenos que os intrigam, que os desafiam. Os modelos de sucesso permanecem até que surjam novos fatos que não podem ser explicados por eles, que estão além de seus limites de validade. No Nível Médio, aprendemos que a trajetória de um projétil lançado obliquamente é uma parábola. Mas não fica claro para os alunos que esse resultado é válido apenas quando consideramos a Terra como uma superfície plana e a força da gravidade terrestre como sendo constante. Quando olhamos em direção à linha do horizonte (~15kms) a Terra nos parece plana. Para altitudes muito menores que o raio da Terra (~6400kms) a força da gravidade terrestre pode ser considerada constante. Desse modo, para lançamentos de projéteis com um alcance aquém da linha do horizonte e que viajem em baixa altitude, a sua trajetória será de fato uma parábola. Foram reduzindo a quantidade de informações sobre o modelo do lançamento de projéteis até que ele ficasse muito distante de uma realidade mais global. Fora das circunstâncias bem específicas, o modelo é inadequado e a trajetória do projétil não é mais uma parábola. Em raras situações são explicitadas essas considerações, de modo a permitir aos aprendentes uma visão mais clara do mundo que os cerca. Concepções espontâneas e o ensino de Física Quando chega à escola, o aluno já possui uma concepção empírica sobre os fenômenos que acontecem à sua volta. Essa construção é apoiada na observação de como os eventos acontecem. Existe uma grande identificação destes conceitos, e a Física aristotélica que permaneceu vigente até a Idade Média. Uma das características do trabalho de Aristóteles foi o compromisso entre a conceituação e a observação experimental. No entanto, uma das possíveis fragilidades do empirismo é não conseguir teorizar além dos fatos específicos que observa. Quando analisa o lançamento de projéteis, a Física aristotélica provê um modelo de movimento adequado para pequeno alcance desse objeto. Newton provocou uma reviravolta na compreensão do movimento de corpos. Ele entendeu que esse movimento depende de cada uma das forças que atuam no corpo assim como das condições inicias deste movimento. Pode- se analisar o efeito e a importância da atuação de cada uma das forças, bem como o efeito global da atuação de todas elas. 34 Quando um projétil se movimenta, existem basicamente duas forças atuando nele: a força gravitacional e a força de atrito entre o projétil e a atmosfera, originada com o seu movimento. A Física newtonianaé reducionista e, no Ensino Médio, costuma-se analisar apenas parcialmente esse tipo de movimento. Costuma-se estudar o movimento de projéteis na ausência da força de atrito. Nessas circunstâncias, a sua trajetória será parabólica. Entende-se essa restrição porque a ferramenta matemática necessária para a inclusão dessa força, o cálculo diferencial, só será lecionada na universidade. o entanto, o imaginário popular não identifica espontaneamente a trajetória de um projétil como sendo parabólica. Um exemplo relevante é a representação desse fato que acontece nos desenhos animados, sejam nacionais ou importados. Quando lançado obliquamente, ele descreve uma trajetória retilínea até parar no ponto mais alto da trajetória e, daí, começa a cair verticalmente. Esse tipo de trajetória é aquela preconizada pela física medieval usando a teoria do ímpetos e, no entanto, é obtida também se usando a Física newtoniana quando consideramos a força de atrito adequada. Devemos ter em mente que a física newtoniana requer uma grande abstração (advinda do reducionismo) quando considera o movimento de um projétil na ausência da força de atrito, que é um dado presente no nosso cotidiano. No entanto, podemos fazer uma ponte cognitiva entre a concepção espontânea aristotélica e a Física newtoniana através de uma animação interativa que passe paulatinamente de um modelo para o outro - com a introdução e aumento gradativo da intensidade da força de atrito com o ar e, desse modo, facilitar a compreensão de um modelo aceito pela comunidade científica. Animação interativa e organizador prévio A animação interativa tem-se confi- gurado como uma possibilidade alvissareira no processo ensino-aprendizagem de Ciências Naturais de modo geral e de Física, de modo particular (Halloun - 1996; Veit e Teodoro - 2002). Uma animação se caracteriza por mostrar a evolução temporal de um dado evento e se presta de maneira exuberante para a exposição de fenômenos que se apresentam intrincados para aqueles alunos que não têm uma percepção visual aguçada ou uma capacidade de abstração sofisticada. Podemos citar, como 35 exemplo, a grande dificuldade em expor um conteúdo como a propagação de ondas longitudinais em meios elásticos (tal como a onda sonora), usando como recurso apenas giz e quadro, em comparação com a facilidade que esse tópico é apresentado através das animações e isso pode ser analisado e avaliado na observação das inúmeras animações existentes na WWW, tais como García (2004), Fendt (2004), Reddy (2004), Santos e Tavares (2004). sobre o aproveitamento escolar de 12.000 estudantes americanos em cursos de Física nas escolas secundárias, faculdades e universidades. Ele concluiu que antes das aulas de Física os alunos têm crenças errôneas sobre a Mecânica, que contrariam os conceitos Newtonianos. O sucesso no processo ensino aprendizagem através da modelagem, relatado por Wells et al. (1995), sugere que essas crenças errôneas dos estudantes são tratadas de maneira mais eficiente, usando-se as animações pedagógicas. E desse modo o aproveitamento escolar, como um todo, será substancialmente melhorado devido à elucidação das crenças mencionadas e com a presença dos conceitos claramente delineados pelo uso das animações pedagógicas. Mas o que fazer quando não existem subsunções disponíveis? Esse é o contexto da maioria dos alunos dos cursos básicos de Ciências Exatas quando estão cursando Física Geral II. Vários conteúdos não fazem parte das suas vivências cotidianas e também nunca lhes foram apresentados formalmente. Os tópicos Gravitação, Fluidos, Ondas em Meios Elásticos e Termodinâmica compõem o conteúdo desse curso, e praticamente, na sua totalidade, se enquadram como assuntos estranhos, nunca trabalhados. Os alunos do Nível Médio passam por situação equivalente quando se deparam com os mesmos conteúdos que fazer? A primeira atitude que se toma para acompanhar um curso nestas condições é ir memorizando as partes iniciais até que o seu conteúdo seja absorvido, incorporado meio na força, de modo abrupto, na concepção da aprendizagem mecânica apontada por Ausubel (1980, 2003), com pouca interação com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. A escolha de um organizador prévio depende da situação da aprendizagem, e diversas alternativas foram propostas (Moreira - 1983). Neste trabalho, a alternativa apresentada é a animação interativa, definida como programa de computador que simula os fenômenos físicos modelados matematicamente em que o 36 aprendiz poderá, através da ação, trocar significados e modificar a animação para atender seus objetivos gerais ou específicos, com a apresentação dos reais conceitos, relacionamento entre grandezas, gráficos e referências. Estas animações interativas enquadram-se no conceito de ferramentas computacionais que são capazes de auxiliar na construção do conhecimento (Veit e Teodoro - 2002) e podem ser usadas para dar significado ao novo conhecimento por interação com significados claros, estáveis e diferenciados previamente existentes na estrutura cognitiva do aprendiz (Moreira - 1999). Com as animações interativas, podem-se criar uma representação real ou ideacional de um fenômeno físico e apresentar aos alunos as características do fenômeno para a observação. Além de serem sensíveis aos critérios individuais, onde o aprendiz pode agir na modificação das condições iniciais, e observar as respostas e relacionar grandezas e outros atributos pertinentes ao fenômeno físico, estando o conhecimento amparado nos contextos nos quais os alunos aprendem (Brown et al - 1989; Lave et al - 1991; Schank et al - 1993/1994), de tal forma que os subsunçores seriam modificados e ampliados para apreender o novo conhecimento. Nesta visão, as animações interativas seriam capazes de exercer a principal função dos organizadores prévios que, de acordo com Ausubel (1980, 2003), preencheriam o hiato entre aquilo que o aprendiz já conhece e o que precisa conhecer antes de poder aprender significativamente a tarefa com que se defronta, permitindo oferecer uma armação ideativa para a incorporação estável e retenção do material mais detalhado e diferenciado que se segue no texto a aprender. A proposta de (Tavares e Santos - 2003; Santos e Tavares - 2003) é que esse primeiro contato se dê através das animações interativas. Nós identificamos uma animação interativa como um organizador prévio. O aluno tem o contato inicial com um conteúdo através de uma conceituação com um grau de abstração e inclusividade maior que um simples resumo inicial. Grandezas abstratas como vetores são passíveis de uma representação gráfica, que evolui com a passagem do tempo. Pode-se representar a evolução da interação entre duas grandezas vetoriais tal como o esforço que duas pessoas fazem para deslocar um objeto. Por outro lado, ela pode facilitar a mudança conceitual dos alunos que construíram a sua visão de mundo usando a física aristotélica. 37 Referências [1] Finkel, D. (2008). Dar clase con la boca cerrada. València: Publicacións de la Universitat València. Tradução para o espanhol do original Teaching with your mouth shut. 292p. [2] Freire, P. (1988). Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra. 18a edição. 184p. [3] Freire, P. (2007). Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra. 36a edição. 79p. [4] Moreira, M.A. (1999). Aprendizagem significativa. Brasília: Editora da UnB. 129p. [5] Moreira, M.A. (2000). Aprendizaje significativo: teoría y práctica. Madrid: Visor. 100p. [6] Moreira, M.A. (2006). A teoria da aprendizagem significativa e sua implementação em sala de aula. Brasília: Editora da UnB. 185p. [7] Moreira, M.A. (2011). Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares. São Paulo: Editora Livraria da Física. 179p. [8] Moreira, M.A. e Masini, E.A.S. (1982).
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