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ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL INTRODUÇÃO 1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA 1 MITIGAÇÃO AO PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA AÇÃO PENAL 2 O ANPP É DIREITO SUBJETIVO DO INVESTIGADO? 2 PRESSUPOSTOS (CUMULATIVOS) DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL 4 CONDIÇÕES DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO 9 OBJEÇÃO DE CONSCIÊNCIA EM CASOS DE ANPP 9 VEDAÇÕES À CELEBRAÇÃO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL 10 FORMALIDADES DO ACORDO 12 CONTROLE JURISDICIONAL 12 DESCUMPRIMENTO DO ACORDO 13 CUMPRIMENTO DO ACORDO 14 PRESCRIÇÃO 15 INTRODUÇÃO Inicialmente, é importante destacar que o ANPP surgiu em 2017, com a Resolução 181 do CNMP. Com o Pacote Anticrime , o instituto foi incorporado ao Código de Processo Penal, passando a ser regulamentado legalmente no art. 28-A. Com isso, passa-se a afirmar que, atualmente, vivencia-se um MODELO DE JUSTIÇA CONSENSUADA (PACTUADA ou NEGOCIADA), ante a possibilidade de existência de consenso entre aas partes, benefícios como rapidez e menor onerosidade da justiça. Segundo Renato Brasileiro (2020, p. 275), pode-se elencar alguns fatores que justificaram a sua criação, quais sejam: “a) exigência de soluções alternativas no processo penal que proporcionem celeridade na resolução dos casos menos graves; b) priorização dos recursos financeiros e humanos do Ministério Público e do Poder Judiciário para processamento e julgamento dos casos mais graves; c) minoração dos efeitos deletérios de uma sentença penal condenatória aos acusados em geral, que teriam mais uma chance de evitar uma condenação judicial, reduzindo os efeitos sociais prejudiciais da pena e desafogando os estabelecimentos prisionais.” CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA Nas lições de Renato Brasileiro: “(...) cuida-se de NEGÓCIO JURÍDICO DE NATUREZA EXTRAJUDICIAL, necessariamente homologado pelo juízo competente – pelo menos em regra, pelo juiz das garantias (CPP, art. 3º-B, inciso XVII, incluído pela Lei n. 13.964/19) –, celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso – devidamente assistido por seu defensor –, que confessa formal e circunstanciadamente a prática do delito, sujeitando-se ao cumprimento de certas condições não privativas de liberdade, em troca do compromisso do Parquet de não perseguir judicialmente o caso penal extraído da investigação penal, leia-se, não oferecer denúncia, declarando-se a EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE caso a avença seja integralmente cumprida.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8. Ed. Juspodivm. 2020, p. 274) (grifo nosso) Renato Brasileiro (2020, p.275), citando BRANDALISE e ANDRADE, pontua que a “depender do modelo de definição dos consensos, o acordo de não-persecução penal funciona como uma espécie de diversão, opção de política criminal usada para resolução dos processos penais de maneira diversa daquelas ordinariamente adotadas no processo criminal, e que 1 consistem na solução antes de qualquer determinação ou de declaração de culpa. A diversão pode ser de 3 (três) espécies: 1) DIVERSÃO SIMPLES “a despeito da presença de indícios de autoria e/ou participação e prova da materialidade do delito, o processo é arquivado sem a imposição de quaisquer obrigações ao acusado, porquanto a persecução penal seria absolutamente inócua (v.g., prescrição virtual);” 2) DIVERSÃO ENCOBERTA “dar-se-á a extinção da punibilidade se o autor do fato delituoso praticar determinados atos, que impossibilitam a deflagração da persecução penal, como, por exemplo, a composição dos danos civis (Lei n. 9.099/95, art. 74, parágrafo único);” 3) DIVERSÃO COM INTERVENÇÃO “o investigado/acusado fica sujeito ao cumprimento de certas condições. Se cumpridas de maneira regular, o procedimento investigatório será arquivado, ou o processo será extinto. É o que ocorre não apenas no caso do acordo de não-persecução penal, mas também nos casos de transação penal e suspensão condicional do processo.” MITIGAÇÃO AO PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA AÇÃO PENAL “Segundo o princípio da obrigatoriedade, havendo justa causa e estando preenchidos todos os requisitos legais, o membro do Ministério Público é obrigado a oferecer a denúncia. Trata-se de um dever, e não uma faculdade, não sendo reservado ao Ministério Público um juízo discricionário sobre a conveniência e oportunidade de seu ajuizamento. Pode-se dizer, então, que o ANPP é uma exceção ao princípio da obrigatoriedade. Outro exemplo de exceção: o acordo de colaboração premiada, no qual o MP pode conceder ao colaborador como benefício o não oferecimento da denúncia”1. Renato Brasileiro entende que o ANPP é uma exceção ao princípio da obrigatoriedade (não uma violação, como alguns doutrinadores chegaram a pontuar), nas suas palavras: “Como espécie de exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, o acordo de não-persecução penal guarda relação muito próxima com o princípio da oportunidade, que deve ser compreendido como um critério de seleção orientado pelo princípio da intervenção mínima, o que, em tese, permite que o Ministério Público estipule regras de seleção conforme a política criminal adotada pela instituição.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8.ed. Juspodivm. 2020, p. 275) O ANPP É DIREITO SUBJETIVO DO INVESTIGADO? O critério de aferição da conveniência de oferecer a proposta de acordo, com vistas à prevenção e repressão do delito, é tarefa do MP, no exercício de seu monopólio da ação penal pública. Nessa linha de raciocínio e levando em conta que o acordo de não persecução penal deve resultar da convergência de vontades, com necessidade de participação ativa das partes, é majoritário o posicionamento doutrinário no sentido de que não se trata de direito subjetivo do acusado, sob pena de se admitir a possibilidade de o juiz determinar sua 1 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Poder Judiciário não pode impor ao MP a obrigação de ofertar ANPPA. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudenci a/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79> 2 realização de ofício, o que, aliás, lhe retiraria sua característica mais essencial, qual seja, o consenso.2 Segundo, não há falar em direito subjetivo na justiça consensual, pois existe um acordo de vontade, estando a vontade do MP e o investigado num plano horizontal (de igualdade). Ou seja, só existe acordo se os dois quiserem. Temos, na verdade, uma DISCRICIONARIEDADE REGRADA que deve ser fundamentada. Assim, caso o MP recusar ofertar o ANPP de forma injustificada, provoca-se o órgão revisional do próprio Ministério Público, para que este decida acerca da recusa ou não. Observação: O juiz deve ser provocado pelo investigado para que remeta o caso para o procurador geral. Veja o que diz a lei: “§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.” Os Tribunais Superiores possuem entendimento de que o ANPP não constitui direito subjetivo, vejamos: “O Poder Judiciário não pode impor ao Ministério Público a obrigação de ofertar acordo de não persecução penal (ANPP). Não cabe ao Poder Judiciário, que não detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao MP a celebração de acordos.” (STF. 2ª Turma. HC 194677/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2021. Info 1017). (grifo nosso)1 “O acordo de persecução penal NÃO CONSTITUI DIREITO SUBJETIVO DO INVESTIGADO, podendo ser proposto pelo MPF conforme as peculiaridades do caso concreto e quando considerado necessário e suficiente para a reprovação e a prevenção da infração penal, não podendo 2 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8. Ed. Juspodivm. 2020, p. 276. prevalecer neste caso a interpretação dada a outras benesses legais que, satisfeitas as exigências legais, constitui direito subjetivo do réu, tanto que a redação do art. 28-A do CPP preceitua que o Ministério Público poderá e não deverá propor ou não o referido acordo, na medida emque é o titular absoluto da ação penal pública, ex vi do art. 129, inc. I, da Carta Magna.” (AgRg no RHC 152.756/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 20/09/2021). AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL EM RELAÇÃO AO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ART. 35 DA LEI 11.343/2006). INVIABILIDADE. 1. As condições descritas em lei são requisitos necessários para o oferecimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), importante instrumento de política criminal dentro da nova realidade do sistema acusatório brasileiro. Entretanto, não obriga o Ministério Público, nem tampouco garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente, permite ao Parquet a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição. 2. O art. 28-A do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 13.964/19, foi muito claro nesse aspecto, estabelecendo que o Ministério Público "poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições". 3. A finalidade do ANPP é evitar que se inicie o processo, não havendo lógica em se discutir a composição depois da condenação, como pretende a defesa (cf. HC 191.464-AgR/SC, Primeira Turma, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, DJe de 3 26/11/2020). 4. Agravo Regimental a que nega provimento. (STF, HC 191124 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 08/04/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-069 DIVULG 12-04-2021 PUBLIC 13-04-2021) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRETENSÃO DE REEXAME E ADOÇÃO DE TESE DISTINTA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO JULGADO. 4. Não é caso de sobrestamento do feito, porquanto o STF já firmou entendimento de que o "art. 28-A do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 13.964/19, foi muito claro nesse aspecto, estabelecendo que o Ministério Público 'poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições'". Ou seja, o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) não obriga o Ministério Público nem garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente permite ao parquet a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição. (HC n. 195.327 AgR, relator Ministro Alexandre de Moraes, publicado em 13/4/2021.) (EDcl no AgRg no RE nos EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1816322/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, CORTE ESPECIAL, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021) PRESSUPOSTOS (CUMULATIVOS) DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL a) EXISTÊNCIA DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO: o ANPP será realizado antes da denúncia, devendo ser trabalhado num inquérito policial ou em um procedimento investigatório criminal conduzido pelo MP. Deve, portanto, haver procedimento instaurado para que se garanta TRANSPARÊNCIA, principalmente quanto aos elementos sobre o investigado. CABE O ANPP APÓS RECEBIMENTO DA DENÚNCIA? Os entendimentos jurisprudencial e doutrinário dominantes são no sentido da impossibilidade de celebração de ANPP após o recebimento da denúncia, vejamos3: “O acordo de não persecução penal, inovação inserida em nosso ordenamento jurídico pelo art. 28-A, do Código de Processo Penal - CPP, tem sua retroatividade limitada aos processos em que ainda não houve o recebimento da exordial acusatória” (STJ. AgRg no HC 619.465/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 17/09/2021). (grifo nosso) “O caráter predominantemente processual, em que pese ter reflexos penais, e a própria razão de ser do instituto - evitar a deflagração de processo criminal -, conduzem a se sustentar que sua retroatividade, diversamente do que ocorre com as normas híbridas com prevalente conteúdo material (de que é exemplo o dispositivo que condiciona a ação penal à prévia representação da vítima), deve ser limitada ao recebimento da denúncia, isto é, à fase pré-processual da persecutio criminis” (STJ. AgRg no REsp 1937513/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 21/09/2021).” (grifo nosso) 3 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Poder Judiciário não pode impor ao MP a obrigação de ofertar ANPPA. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudenci a/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79>. Acesso em: 17/11/2021 4 “Esta Corte Superior sedimentou a compreensão de que a possibilidade de oferecimento do acordo de não persecução penal, previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal, inserido pela Lei n. 13.964/2019, é restrita aos processos em curso até o recebimento da denúncia, o que não se enquadra na hipótese em apreço” (STJ. AgRg no AREsp 1909408/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 05/10/2021, DJe 13/10/2021).” (grifo nosso) Direito penal e processual penal. Agravo regimental em habeas corpus. Acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP). Retroatividade até o recebimento da denúncia. 1. A Lei nº 13.964/2019, no ponto em que institui o acordo de não persecução penal (ANPP), é considerada lei penal de natureza híbrida, admitindo conformação entre a retroatividade penal benéfica e o tempus regit actum. 2. O ANPP se esgota na etapa pré-processual, sobretudo porque a consequência da sua recusa, sua não homologação ou seu descumprimento é inaugurar a fase de oferecimento e de recebimento da denúncia. 3. O recebimento da denúncia encerra a etapa pré-processual, devendo ser considerados válidos os atos praticados em conformidade com a lei então vigente. Dessa forma, A RETROATIVIDADE PENAL BENÉFICA INCIDE PARA PERMITIR QUE O ANPP SEJA VIABILIZADO A FATOS ANTERIORES À LEI Nº 13.964/2019, DESDE QUE NÃO RECEBIDA A DENÚNCIA. 4. Na hipótese concreta, ao tempo da entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019, havia sentença penal condenatória e sua confirmação em sede recursal, o que inviabiliza restaurar fase da persecução penal já encerrada para admitir-se o ANPP. 5. Agravo regimental a que se nega provimento com a fixação da seguinte tese: “o acordo de não persecução penal (ANPP) aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia”. (STF, HC 191464 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 11/11/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-280 DIVULG 25-11-2020 PUBLIC 26-11-2020) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. DOLO EVENTUAL RECONHECIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE ANIMUS CALUNIANDI: IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ART. 28-A DO CPP). APLICAÇÃO RETROATIVA. PROCESSO SENTENCIADO COM CONDENAÇÃO MANTIDA PELO TRIBUNAL. IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. PRECEITO SECUNDÁRIO QUE COMINA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE CUMULADA COM MULTA. SUBSTITUIÇÃO POR MULTA. INVIABILIDADE. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 171/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 3. O Acordo de Não Persecução Penal consiste em um negócio jurídico pré-processual entre o Ministério Público e o investigado, juntamente com seu defensor, como alternativa à propositura de ação penal. Trata-se de norma processual, com reflexos penais, uma vez que pode ensejar a extinção da punibilidade. Contudo, não é possível que se aplique com ampla retroatividade norma predominante processual, que segue o princípio do tempus regit actum, sob pena de se subverter não apenas o instituto, que é pré-processual e direcionado ao investigado, mas também a segurança jurídica. Nessa linha de entendimento, o acordo de não persecução penal 5 (ANPP) aplica-se a fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. (AgRg no HC 680.533/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 05/10/2021, DJe 13/10/2021)b) NÃO SER O CASO DE ARQUIVAMENTO DOS AUTOS: pressupõe justa causa para a ação penal (lastro probatório mínimo). Segundo Renato Brasileiro (2020, p.280), “o acordo de não-persecução penal só deve ser celebrado quando se mostrar viável a instauração do processo penal”, pois “se o titular da ação penal entender que o arquivamento é de rigor, não poderá proceder à celebração do acordo.” Alexandre de Moraes, no HC 206876 AgR, pontuou que: “constatada a materialidade da infração penal e indícios suficientes de autoria, o titular da ação penal deixou de estar obrigado a oferecer a denúncia e, consequentemente, pretender o início da ação penal. O Ministério Público poderá, dependendo da hipótese, deixar de apresentar a denúncia e optar pelo oferecimento da transação penal ou do acordo de não persecução penal, desde que, presentes os requisitos legais. Essa opção ministerial encaixa-se dentro desse novo sistema acusatório, onde a obrigatoriedade da ação penal foi substituída pela discricionariedade mitigada; ou seja, respeitados os requisitos legais o Ministério Público poderá optar pelo acordo de não persecução penal, dentro de uma legítima opção da própria Instituição. Ausentes os requisitos legais, não há opção ao Ministério Público, que deverá oferecer a denúncia em juízo. Entretanto, se estiverem presentes os requisitos descritos em lei, esse novo sistema acusatório de discricionariedade mitigada não obriga o Ministério Público ao oferecimento do acordo de não persecução penal, nem tampouco garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente, permite ao Parquet a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo de não persecução penal, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição”. c) COMINADA PENA MÍNIMA INFERIOR A 4 ANOS E INFRAÇÃO PENAL (CRIME OU CONTRAVENÇÃO PENAL) NÃO COMETIDA COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À PESSOA: ● “O delito praticado pelo investigado não pode ter como elementares a violência ou grave ameaça à pessoa, visto que a violência contra o objeto não pode ser considerada um impeditivo para a celebração do acordo de não persecução penal.”4 ● “A violência que impede o ajuste é aquela presente na conduta, e não no resultado. Logo, homicídio culposo, por exemplo, admite o ANPP” (CUNHA, 2020, p. 129)”.4 Há doutrina divergente, que entende que não cabe ANPP, pois é crime com violência à pessoa. ● Deve-se levar em consideração causas de aumento e causas de diminuição da pena quando da análise da pena mínima inferior à 4. Estando diante de uma causa de aumento variável (ex: 1/6 a 1/2), como se deve procurar a pena mínima, então escolhe-se a menor fração. Se for causa de diminuição, escolhe-se a de maior diminuição, na linha do disposto nas Súmulas 243 do STJ e 723 do STF. ● A Lei 14.064/20 acrescentou ao Art. 32 da Lei dos Crimes Ambientais o §1º-A, prevendo uma pena de 2 a 5 anos no caso de maus tratos a CÃES E GATOS. Nessa situação, em tese, caberia o ANPP. Entretanto, há doutrina defendendo que estes animais não podem ser considerados apenas como coisas, sendo 4 https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-processu al-penal/principais-aspectos-do-acordo-de-nao-persecu cao-penal/ 6 sujeitos de direitos e, portanto, não cabendo ANPP. d) O INVESTIGADO TIVER CONFESSADO FORMAL E CIRCUNSTANCIADAMENTE A PRÁTICA DO CRIME; HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. ART. 28-A, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL CPP. CONFISSÃO QUE NÃO ATENDE AOS REQUISITOS LEGAIS. INDEFERIMENTO DA HOMOLOGAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO. WRIT NÃO CONHECIDO. 2. O acordo de não persecução penal é negócio jurídico extraprocessual que possibilita a celebração de acordo entre acusação e acusado para o cumprimento de condições não privativas de liberdade em troca do não prosseguimento do processo penal, afastando, assim, efeitos deletérios da sentença condenatória. Para tanto, é requisito essencial do ato que o acusado confesse de maneira formal e circunstanciada a prática do delito. (HC 636.279/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 09/03/2021, DJe 23/03/2021) A confissão exigida para o ANPP ofende o direito constitucional ao silêncio? “Não há ofensa ao direito ao silêncio já que o investigado tem a liberdade de confessar ou não o ato delituoso, ou seja, tem o investigado o direito de ficar calado ou de confessar detalhadamente o ato delituoso. É uma opção do investigado, dentro de sua autonomia de vontade e assistido pela defesa técnica”5. Se o investigado não tiver confessado a prática da infração penal no inquérito policial, necessariamente estará inviabilizada a proposta de Acordo de Não 5 http://www.mprj.mp.br/documents/20184/2026467/Sand ro_Carvalho_Lobato_de_Carvalho.pdf Persecução Penal? “Não. O fato do investigado não confessar a prática ilícita no inquérito policial não inviabiliza, de plano, o acordo de não persecução penal (...) há necessidade de confissão formal do investigado. E essa confissão deve ocorrer na presença do Ministério Público e do defensor do investigado, na audiência extrajudicial designada pelo Ministério Público para a celebração do acordo de não persecução penal. Dessa forma, mesmo que o investigado tenha negado a prática delituosa no inquérito policial, o membro do Ministério Público, verificando pelos autos que os demais pressupostos e requisitos do ANPP estão presentes no caso concreto, deve designar audiência extrajudicial na sede do Ministério Público para explicar o ANPP ao investigado e seu defensor e esclarecer que o ANPP pressupõe a confissão formal e circunstanciada da prática delituosa, deixando a critério do investigado se deseja confessar – e ter o ANPP – ou manter a negativa da prática já exposta durante o inquérito policial”5. A confissão exigida para o Acordo de Não Persecução Penal serve para formar a opinio delict do Ministério Público? “Não. Só cabe acordo de não persecução penal quando o Ministério Público já possuir todos os elementos suficientes para a ação penal. É dizer, quando já estão plenamente preenchidas as condições da ação penal. A justa causa e demais elementos para a denúncia já estão presentes. Isto é um outro requisito do ANPP: não ser caso de arquivamento. Havendo elementos para a denúncia, o Ministério Público passa a analisar o cabimento do ANPP. Logo, não é a confissão por ocasião da celebração do acordo de não persecução penal que fundamentará a opinio delict do Ministério Público, posto que esta já estará formada quando da audiência extrajudicial para a formulação do ANPP.”5 e) ACORDO SEJA NECESSÁRIO E SUFICIENTE PARA A REPROVAÇÃO E PREVENÇÃO DO CRIME, NO CASO CONCRETO O Professor Márcio Cavalcante, de forma brilhante, resume os requisitos do ANPP na tabela a seguir6: 6 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Poder Judiciário não pode impor ao MP a obrigação de ofertar 7 REQUISITOS PARA QUE O MP POSSA PROPOR O ANPP 1) não ser o caso de arquivamento Se não houver justa causa ou existir alguma outra razão que impeça a propositura da ação penal, não é caso de oferecer o acordo, devendo o MP pedir o arquivamento do inquérito policial ou investigação criminal. 2) o investigado deve ter confessado a prática da infração penal O ANPP exige que o investigado tenha confessado formal (em ato solene) e circunstancialmente (com detalhes) a prática da infração penal. O art. 18, § 2º, da Res. 181/2017-CNMP exige que a confissão seja registrada em áudio e vídeo. 3) infração penal foi cometida sem violência e sem grave ameaça A infração penal não pode ter sido cometida com violência ou grave ameaça. Prevalece que é cabível ANPP se a infração foi cometida com violência contra coisa. Assim, o ANPP somente é proibido se a infração foi praticada com grave ameaça ou violência contra pessoa. 4) a pena mínima da infração penal é menor que 4 anos A infração penal cometida deve ter pena mínima inferior a 4 anos. Se a pena mínima for igual ou superior a 4 anos, não cabe. Para aferição da pena mínima, serão consideradasas causas ANPPA. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudenci a/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79>. Acesso em: 12/09/2021 de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. Aplicam-se ao ANPP, por analogia, as súmulas 243-STJ e 723-STF. 5) o acordo deve se mostrar necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime no caso concreto Esse requisito revela que a propositura, ou não, do acordo está atrelada a certo grau de discricionariedade do membro do MP, que avaliará se essa necessidade e suficiência estão presentes no caso concreto. 6) não caber transação penal Se for cabível transação penal (art. 76 da Lei nº 9.099/95), o membro do MP deve propor a transação (e não o ANPP). Isso porque se trata de benefício mais vantajoso ao investigado. Por outro lado, mesmo que seja cabível a suspensão condicional do processo, ainda assim, o membro do MP pode propor o ANPP. 7) o investigado deve ser primário Se o investigado for reincidente (genérico ou específico), não cabe ANPP. 8) não haver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas Regra: se houver elementos probatórios que indiquem que o investigado possui uma conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, não cabe ANPP. Exceção: se essas infrações pretéritas que o investigado se envolveu forem consideradas “insignificantes”, será possível propor ANPP. 9) o agente não pode ter sido beneficiado nos 5 anos anteriores ao cometimento da infração com outro No momento de decidir se vai propor o ANPP, o membro do MP deverá analisar se, nos últimos 5 anos (contados da infração), aquele investigado já foi beneficiado: 8 https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79 https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79 ANPP, transação penal ou suspensão condicional do processo · com outro ANPP; · com transação penal ou · com suspensão condicional do processo. 10) a infração praticada não pode estar submetida à Lei Maria da Penha Não cabe ANPP nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. CONDIÇÕES DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO O promotor e o investigado, devidamente assistido, irão discutir as seguintes condições (que podem estar previstas alternativa ou cumulativamente): Art. 28-A: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de 1/3 a 2/3, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou V - cumprir, por prazo determinado, OUTRA CONDIÇÃO INDICADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. (Rol Exemplificativo) APROFUNDANDO: OBJEÇÃO DE CONSCIÊNCIA EM CASOS DE ANPP7 ● OBJEÇÃO DE CONSCIÊNCIA: “é prerrogativa personalíssima assegurada ao indivíduo para eximir-se do cumprimento de determinadas obrigações coletivas, sem perda de direitos subjetivos, por motivos ligados a crenças religiosas ou a convicções filosóficas ou políticas”8 ● PREVISÃO NORMATIVA: 5º, inciso VIII, CF: “Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.” ● CABIMENTO EM CASOS DE ANPP: Eduardo Luiz Santos Cabette pontua que “a Objeção de Consciência é um Direito Fundamental Individual de caráter constitucional. Nesse passo certamente se insere dentre os chamados “direitos públicos subjetivos”, ou seja, aqueles direitos que o indivíduo pode exigir cumprimento perante o Estado. Neste sentido vale retomar os ensinamentos de Bernardes e Ferreira, segundo os quais se deve considerar “a escusa de consciência, ao menos no sistema brasileiro, um direito público subjetivo a ser utilizado em face de 8 BERNARDES, Juliano Taveira, FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alues. Direito Constitucional. Tomo II. 10ª. ed. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 170. 7 https://meusitejuridico.editorajuspodivm.com.br/2021/09 /22/acordos-de-discricionariedade-regrada-no-processo -penal-e-objecao-de-consciencia/ 9 obrigações coletivas decorrentes de ato normativo dos poderes públicos” (grifo no original). Assim sendo, não parecem restar maiores dúvidas quanto ao fato de que a proposta de acordo em qualquer caso deve respeitar eventual escusa de consciência, optando por prestação alternativa que não prejudique o interesse coletivo e respeite, concomitantemente, o direito individual envolvido. Como já visto, o direito de escusa não é estabelecido na Constituição em rol de hipóteses taxativas, de modo que cada caso concreto merece avaliação particular. Observe-se que no regramento legal do Acordo de Não Persecução Penal, há previsão no artigo 28, § 5º., CPP, de que o Juiz, em considerando haver inadequação, insuficiência ou abusividade nas condições dispostas no acordo, deverá restituir os autos ao Ministério Público para reformulação da proposta em consonância com o investigado e seu defensor. E acaso não haja regularização o juiz poderá recusar a homologação (artigo 28, § 7º., CPP). E essa abusividade certamente pode se configurar no desrespeito de eventual Objeção de Consciência quando, por exemplo, se pretenda impor como obrigação a ser cumprida o trabalho comunitário a um médico em serviço de realização de abortamentos legais, sendo fato que tal profissional se opõe a essa espécie de conduta, ainda que legalmente amparada, devido a uma convicção ética, filosófica ou religiosa. Prosseguindo, na Transação Penal, o artigo 76, § 3º., da Lei 9.099/95 impõe o controle jurisdicional da proposta a ser homologada e ainda prevê a possibilidade de apelação contra a sentença homologatória, de acordo com o disposto no § 5º. do mesmo dispositivo. No mesmo passo segue a Suspensão Condicional do Processo sob controle jurisdicional (artigo 89, § 1º., da Lei 9.099/95), deixando ainda claro que as condições exigidas do implicado para o acordo devem ser adequadas à sua “situação pessoal” (artigo 89, § 2º., da Lei 9.099/95). Diverso não é o caso da Colaboração Premiada, a qual também é submetida ao controle jurisdicional de legalidade nos termos do artigo 4º., §§ 7º. a 8º., da Lei 12.850/13. Portanto, também na colaboração, não seria admissível impor àquele que alegue escusa de consciência, por exemplo, o benefício de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade no trabalho de auxiliar de armeiro em instituição militar, acaso a pessoa seja adepta do pacifismo e contrária ao manejo de armas de fogo. Assim também inviáveis prestações de serviços aos sábados com relação a pessoas que professam determinadas religiões que impõem dogmaticamente a vedação de atividades nesse dia da semana. Em todos os casos de cláusulas abusivas que violem escusa de consciência, a primeira providência será acionar o Juiz de Direito responsável pelo controle de legalidade no caso concreto. Em não havendo resultado, será sempre cabível o remédio constitucional do “Habeas Corpus”, apontando como autoridade coatora o órgãodo Ministério Público que viola o direito de objeção.”5 O ANPP IMPÕE SANÇÃO PENAL? “O acordo de não persecução penal não impõe penas, mas apenas estabelece direitos e obrigações de natureza negocial e as medidas acordadas voluntariamente pelas partes não produzirão quaisquer efeitos daí decorrentes, incluindo a reincidência.9” VEDAÇÕES À CELEBRAÇÃO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL O Art. 28-A, §2º enuncia hipóteses em que não cabe ANPP (condições negativas): 9 https://www.mppi.mp.br/internet/wp-content/uploads/20 21/01/MPSC-Manual.-ANPP-na-Lei-Anticrime.pdf 10 § 2º O disposto no caput deste artigo NÃO SE APLICA nas seguintes hipóteses: I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III - ter sido o agente beneficiado nos 5 anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. APROFUNDANDO: ● CRIME HABITUAL E HABITUALIDADE CRIMINOSA: “O crime habitual exige uma prática reiterada de determinada conduta, por exemplo, casa de prostituição. A habitualidade criminosa, por sua vez, ocorre quando o agente faz do crime sua atividade frequente como meio de subsistência, por exemplo, o ladrão.”10 Segundo o Professor Rafhael Nepomuceno, “o art. 28-A não veda o ANPP no caso de crime habitual, mas sim na hipótese de “conduta criminal habitual”11 ● ANPP EM CRIMES CULPOSOS VIOLENTOS: “É cabível o ANPP nos crimes culposos com resultado violento, uma vez que nos delitos desta natureza a conduta consiste na violação de um dever de cuidado objetivo por 11 https://blog.mege.com.br/10-perguntas-e-respostas-sob re-anpp-prof-rafhael-nepomuceno-2/ 10 https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/121920359/ crime-habitual-e-habitualidade-criminosa negligência, imperícia ou imprudência, cujo resultado é involuntário, não desejado e nem aceito pela agente, apesar de previsível.”12 ● CRIMES HEDIONDOS OU EQUIPARADOS: a Resolução 171/17 do CNMP vedava, expressamente, no art. 18, §, V, ANPP em casos de crimes hediondos ou equiparados. Entretanto, a Lei 13.964/19 não repetiu tal vedação, de forma que alguns doutrinadores entendem ser cabível. ATENÇÃO (CONCURSOS DO MP): O Conselho Nacional de Procuradores Gerais (CNPG) publicou o enunciado 22 afirmando serem incompatíveis com o ANPP. Enunciado n. 22 (CNPG): “Veda-se o acordo de não persecução penal aos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, bem como aos crimes hediondos e equiparados, pois em relação a estes o acordo não é suficiente para a reprovação e prevenção do crime” ● CRIME DE RACISMO: Alguns MPs, a exemplo do MP de São Paulo, tem orientado pela inaplicabilidade, vide boletim 95 de 2020 do MP/SP: “Neste cenário, a Procuradoria-Geral de Justiça e a Corregedoria-Geral do Ministério Público, entenderam por bem expedir a presente orientação conjunta de atuação aos Membros da Instituição, frisando que todos os órgãos de execução devem evitar qualquer instrumento de consenso (transação penal, acordo de não persecução penal e suspensão condicional do processo) nos procedimentos investigatórios e processos criminais envolvendo crimes de racismo, compreendidos aqueles 12 https://www.mppi.mp.br/internet/wp-content/uploads/20 21/01/MPSC-Manual.-ANPP-na-Lei-Anticrime.pdf 11 tipificados na Lei 7.716/89 e no art. 140, §3º, do Código Penal, pois desproporcional e incompatível com infração penal dessa natureza, violadora de valores sociais, sendo tais modalidades de Justiça Consensual insuficientes para a prevenção e reprovação pela prática de tais delitos.” ● CRIMES ELEITORAIS: Existe corrente doutrinária afirmando não caber ANPP em crimes eleitorais, por conta do bem jurídico tutelado, visto que afetam mais grave e diretamente o interesse público, no sentido de impedir ou turbar o regular desenvolvimento do processo eleitoral na consecução da soberania popular através do direito ao sufrágio. Rogério Sanches discorda, pois não há impedimento para suspensão condicional do processo nem transação penal, podendo-se, em sede de ANPP, discutir uma cláusula relativa à inelegibilidade do investigado. O MPPI, na cartilha PRINCIPAIS CRIMES ELEITORAIS E SEUS ASPECTOS GERAIS13 pontuou pela aplicabilidade de APP em crimes eleitorais: “Em virtude de os crimes eleitorais se enquadrarem, prima facie, aos pressupostos e requisitos legais, e levando em consideração a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal, é cabível a propositura de ANPP ao investigado pela prática de ilícito penal eleitoral.” FORMALIDADES DO ACORDO ● O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito, com a qualificação completa do investigado; ● Deverá estipular de modo claro as suas condições, eventuais valores a serem restituídos e as datas para cumprimento; 13 https://www.mppi.mp.br/internet/wp-content/uploads/20 20/11/MPPI-Cartilha-Crimes-Eleitorais-Eleic%CC%A7o %CC%83es-Limpas.pdf ● Será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor; ● A confissão formal e circunstanciada da prática da infração penal deverá ser registrada em termo próprio; ● Na sequência, os autos serão submetidos à homologação judicial. CONTROLE JURISDICIONAL § 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade. § 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor. § 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal. § 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo. § 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia. O juiz possui 3 cenários diante do ANPP: 12 a) Homologar o ANPP, devolvendo os autos ao MP para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal (§6º); b) Considerando inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta do acordo, com concordância do investigado e seu defensor (§5º.). c) Recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação anteriormente mencionada (§8º.) Observações: ● O magistrado não pode intervir na redação final do ANPP. ● Caso o magistrado recuse a homologação do ANPP, cabe RESE (Recurso em Sentido Estrito), com fulcro no artigo 581, XXV do CPP. ● Caso o MP, injustificadamente, recuse o oferecimento do ANPP e o investigado tiver interesse, poderá requerer a remessa dos autos para o órgão superior do MP (PGJ Ou Câmara de Coordenação e Revisão), com fulcro no art. 28-A, §14. Se o MP se recusar a oferecer o acordo e a defesa requerer a remessa dos autos ao órgão superior, o juiz é obrigado a remeter?14 Regra sim. Em regra, não cabe ao Poder Judiciário analisar a recusa do MP e, portanto, se a defesa não se conformar, deverá remeter os autos ao órgão superior do Parquet. 14 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Poder Judiciário nãopode impor ao MP a obrigação de ofertar ANPPA. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudenci a/detalhes/cc02d42b8939768b8a4f1e4d826faa79>. Exceção o STF afirmou que o juiz não precisa remeter ao órgão superior do MP em caso de manifesta inadmissibilidade do ANPP. Nas palavras do Min. Gilmar Mendes: “Não se tratando de hipótese de manifesta inadmissibilidade do ANPP, a defesa pode requerer o reexame de sua negativa, nos termos do art. 28-A, § 14, do CPP, não sendo legítimo, em regra, que o Judiciário controle o ato de recusa, quanto ao mérito, a fim de impedir a remessa ao órgão superior no MP. Isso porque a redação do art. 28-A, § 14, do CPP determina a iniciativa da defesa para requerer a sua aplicação.” DESCUMPRIMENTO DO ACORDO Descumpridas quaisquer das condições voluntariamente ajustadas, o Ministério Público comunica (requerimento) o juiz para que decrete sua rescisão, possibilitando ao titular da ação o oferecimento da denúncia. A decisão judicial, que rescinde, tem NATUREZA CONSTITUTIVA NEGATIVA. (Cunha, 2020) Art. 28-A (...) § 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. APROFUNDANDO: ● Segundo Renato Brasileiro (2020, p. 287), a “denúncia a ser oferecida pelo Ministério Público poderá trazer, como suporte probatório, inclusive a confissão formal e circunstanciada do investigado por ocasião da celebração do acordo”. 13 A confissão exigida para o Acordo de Não Persecução Penal pode ser usada no processo criminal, caso descumprido o ANPP? “Sim. Se o acordo de não persecução penal for homologado judicialmente, mas o investigado deixar de cumprir integralmente suas condições, haverá rescisão do ANPP e o Ministério Público oferecerá a denúncia (art. 28-A, § 10, do CPP) e a confissão poderá ser usada como elemento de reforço da prova de autoria, corroborando com as demais provas produzidas em contraditório. Como explica CABRAL (2020, p. 113): “É importante frisar, porém, que essa confissão formal e circunstanciada somente poderá ser utilizada no processo penal, caso seja o acordo homologado e caso exista descumprimento do acordo, levando o Ministério Público a oferecer denúncia”. E CUNHA (2020, p. 309): Nesse sentido, é viável defender que a confissão apresentada como condição para o acordo de não persecução pode ser utilizada pelo órgão acusatório quando for possível atribuir ao acusado a responsabilidade pela rescisão do negócio jurídico. Entender contrariamente, nesse caso, seria o mesmo que anuir que o acusado pode ser beneficiado por uma situação que deu causa”15. E se o Acordo de Não Persecução Penal não for homologado pelo Juízo, pode a confissão ser usada no processo criminal? “Não. Se o Juízo competente não homologar o ANPP e o Ministério Público oferecer a denúncia, não pode usar a confissão realizada no ANPP no processo criminal.” Para CABRAL (2020, p.114): “Na hipótese de o acordo não ser homologado, volta-se ao status quo ante, não sendo possível, por força do princípio da lealdade e da moralidade administrativa, o seu uso em prejuízo do investigado”.15 ● O descumprimento do acordo poderá ser utilizado pelo Ministério Público como 15 http://www.mprj.mp.br/documents/20184/2026467/Sand ro_Carvalho_Lobato_de_Carvalho.pdf justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo (§11). ● NOVAÇÃO: É possível, depois de descumprido o acordo, haver uma repactuação? Para parcela da doutrina, seria possível, levando em conta que se trata operação jurídica típica do Direito das obrigações, criando uma nova obrigação, substituindo e extinguindo a obrigação anterior e originária. A novação pode evitar a rescisão. Por óbvio, sua eficácia dependerá de homologação judicial, nos termos dos §4º do art. 28-A do CPP. ● ANPP E AÇÃO PRIVADA: Cabe ANPP aos processos de ação privada? Segundo Aury Lopes Jr. e Higyna Josita, Sim. Para eles, “cabível o ANPP por ausência de vedação legal aos crimes de ação privada que tramitam na Justiça comum desafiando o rito especial (art. 519 a 523, CPP) ou que tramitam no JECRIM, mas o querelante não tem direito a transação, nem a sursis processual. Inclusive, pensamos que esse debate seguirá o mesmo rumo que no passado existiu em torno da transação penal. Para a primeira audiência de tratativas perante o Ministério Público deverá também a vítima ser intimada para comparecimento, com vistas a, exemplo do que ocorre na transação penal, participar da audiência e discutir as condições. Caso não compareça ou se negue a oferecer o acordo isso não impede o membro do Parquet o proponha, na qualidade de custos legis”.16 CUMPRIMENTO DO ACORDO De acordo com o artigo 28-A, cumprido integralmente o ANPP, o juízo competente decretará a EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. O juízo competente, na linha da opção do legislador na Lei 13.964/19, é o da execução penal. 16 https://www.conjur.com.br/2020-mar-06/limite-penal-que stoes-polemicas-acordo-nao-persecucao-penal 14 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ART. 306 DO CTB. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ANPP). RETROATIVIDADE DO ART. 28-A DO CPP. LIMITE TEMPORAL. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O acordo de não persecução penal é instituto mediante o qual o órgão acusatório e o investigado celebram negócio jurídico em que são impostas condições, as quais, se cumpridas em sua integralidade, CONDUZEM À EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE DO AGENTE. (AgRg no HC 636.024/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 21/09/2021) PRESCRIÇÃO Conforme o Art. 116, IV do CP, não corre a prescrição da pretensão punitiva enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal. 15