Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MORIN, E. O método: 3. O conhecimento do conhecimento. Porto Alegre: Sulina, 1999. Introdução geral (Fernando) I. O abismo II. Do metaponto de vista III. A aventura Prólogo 1. Biologia do conhecimento (Camila Morais) Retorno às origens “O problema do conhecimento acha-se no coração do problema da vida”(busca pela verdade?saber quem somos, como somos?) Isso nao origina-se da concepção biológica em oposição da concepção filosófica do conhecimento. O problema da raiz do conhecimento nasceu na filosofia. Dilthey diz que os processos fundamentais do conhecimento estão na vida e que o pensamento não pode ir além. Husserl pensa que conceitos, idéias, enunciados do sujeito consciente tem as suas raízes no Lebenswelt (mundo da vida), mas ele não pôde conceber esse Lebenswelt e nele organizar/enraizar o conhecimento. Piaget tentou interrogando a biologia. para ele as condições do conhecimento, inclusive os dados a priori e as categorias, têm como fonte os princípios fundamentais da organização viva. Por isso buscava conceber o “isomorfismo” estrutural entre as organizações biológicas e cognitivas. “Cedo ou tarde, será preciso que a biologia nos ajude a compreender como as estruturas lógico-matemáticas são possíveis e como se adaptam com eficácia ao meio exterior. Piaget estagnou com essa percepção e não conseguiu perceber que a atividade do ser celular constitui a fonte do conhecimento.Ele buscava a origem dos processos cognitivos no processo de assimilação e de acomodação do organismo. Só encontrou auto-regulação como base inicial para a compreensão dos processos cognitivos: “Os processos cognitivos aparecem simultaneamente como resultantes da auto-regulação orgânica, cujos mecanismos essenciais refletem, e como órgãos mais diferenciados dessa regulação no seio das interações com o exterior.”Há um programa informacional inscrito na estrutura molecular do DNA: o programa genético. Termos como informação e programa migraram da máquina artificial (computador) para a máquina viva. I. Computação Antes de existir o computador Turing definiu computação como tratamento de símbolos. Simon concebia os computadores como sistemas de manipulação de símbolos físicos. Hoje computadores podem dirigir atividades práticas, atividades organizadoras e atividades cognitivas como perceber, diagnosticar e raciocinar. A computação pode ser simples ou complexa, seguir instruções e elaborar estratégias combinando métodos lógicos e heurísticos; pode até dispor de um mínimo de aptidões auto-referentes. “A computação situa-nos tanto do lado das operações aperfeiçoadas, mas limitadas, de uma máquina artificial quanto do lado das atividades inteligentes do espírito humano”. O autor propõe concebê-la como um complexo organizador/produtor de caráter cognitivo com as seguintes instâncias: 1. Informacional (utiliza o modo informacional binário sim/não para suas operações; trata signos/símbolos portadores de informação e pode extrair informações do seu meio quando dotada de dispositivos ad hoc) 2. Simbólica (toda informação é codificada em signos/símbolos e o ato de computação realiza-se a partir destes; as noções de informação e signo/símbolo remetem uma à outra, pois a informação é codificada em signos/símbolos que podem ser portadores de informação) 3. Memorial (necessita de uma capacidade de memorização e pode recorrer a múltiplas memórias; trabalha sua memória em função dos seus interesses e necessidades.) 4. Pragmática (tornou-se autônoma e desenvolveu-se na história recente dos computadores, é constituída pelos princípios/regras/instruções que dirigem e controlam os cálculos, operações perceptivas, raciocínios.A computação não pode se limitar ao cálculo digital, nem reduzir-se à informação II. Computação viva A idéia de organização viva substituiu a de matéria viva. Essa descoberta permitiu aplicar a essa organização o esquema cibernético de uma máquina governada por um programa informacional. A computação em benefício da informação e do programa. A computação viva deve incessantemente resolver os problemas do viver que são os do sobreviver. Os primeiros problemas essenciais do viver-sobreviver são expelir a morte. A computação viva regenera e reorganiza sem parar a máquina viva, cujo trabalho ininterrupto determina, em conformidade com o segundo princípio da termodinâmica, a sua desorganização permanente.Os problemas essenciais seguintes do viver-sobreviver são os da alimentação e da defesa num ambiente aleatório. Ao mesmo tempo a computação viva produz a vida e obedece à sua demanda de resolver os problemas do : produzir-se-reproduzir-se / viver-sobreviver. As computações vivas têm caráter incontestavelmente cognitivo e mesmo autocognitivo, pois permitem ao ser reconhecer substâncias, acontecimentos, modificações do meio exterior, bem como do meio interior. Mas esse caráter cognitivo é indistinto das atividades organizadoras vitais do ser. A máquina artificial foi concebida e construída por humanos. A máquina viva ( a bactéria) saiu da cisão de uma bactéria que é ao mesmo tempo a sua mãe, a sua irmã e ela mesma. A máquina artificial é organizada do exterior, a máquina viva auto-organiza-se. A computação viva é destinada essencialmente à organização do ser e da sua reprodução. A diferença cognitiva entre computação artificial e computação viva surge em todo o seu radicalismo. III. O cômputo A computação viva é uma computação de si, a partir de si, em função de si, para si e em si. POr isso pode-se propor a noção de cômputo para definir o ato computante ‘de si/para si”.A computação viva é uma computação vital. A fórmula cômputo ergo sum é integralmente verdadeira para o unicelular que produz e organiza a sua existência, sem descontinuidade, por computação. Em consequência a noção cômputo servirá para conceber na sua natureza viva e vital a noção de sujeito. O cômputo é o operador chave de um processo ininterrupto de autoprodução/constituição/organização de um ser-máquina que é ao mesmo tempo um indivíduo-sujeito. Esse processo constitui um circuito autogerativo que produz o cômputo que o produz. O cômputo opera num circuito que constitui e o constitui. O cômputo produz/mantém a identidade do ser. - Autocomputação A computação viva comporta o fenômeno original e capital da autocomputação. Esta comporta uma lógica retroativa e de identidade complexa, a qual institui o fenômeno não menos original e capital da auto-referência. - Auto-exo-referência A auto-referência não é a propriedade substancial, orgânica ou formal que permite a um sistema (vivo, no caso) designar a si mesmo: é uma aptidão para autocomputar-se ao mesmo tempo como objeto e sujeito. Ela é a capacidade de referir-se a si ao mesmo tempo que se refere ao que lhe é exterior. Assim como a auto-organização é auto-exo-organização, a auto-referência é auto-exo-referência. O caráter auto-exo-referente do cômputo põe e esclarece na fonte o problema das possibilidades e limites do conhecimento objetivo para um ser vivo. Há na auto-exo-referência unidade, complementaridade e antagonismo entre um princípio do desejo e um princípio da realidade. A auto-exo-referência permite conceber o tratamento objetivo dos dados, objetos, coisas, inclusive o tratamento objetivo de si mesmo, a partir e em função do interesse subjetivo. - Cômputo policelular Se a dimensão congnitiva entre os vegetais é, como entre os unicelulares, inerente à organização, desenvolve-se muito na e pela multiplicidade e pela complexidade das intercomputações que constituem essa organização. O conhecimento é esparso, espelhado, múltiplo na natureza, mesmo onde não há nem receptores sensoriais, nem sistemas nervosos, nem aparelho cognitivo. O conhecimento está incluído, infuso em toda vida. IV. Biologia do conhecimento O conhecimento da vida introduz-nos na vida do conhecimento de maneira extraordinariamente íntima. A fonte de todo o conhecimento encontra-se no cômputo do ser, celular, indissociável da qualidade do ser vivo e do indivíduo-sujeito. Não é somente o ser que condiciona o conhecer, mas tambémo conhecer condiciona o ser; essas duas proposições geram uma a outra num circuito retroativo. A vida só pode auto-organizar-se com o conhecimento. A vida só é viável e passível de ser vivida com o conhecimento. Nascer é conhecer. V. Às origens Conhecer é primariamente computar O conhecimento não se reduz à computação, mas podemos supor que sempre comporta computação: A computação é uma operação sobre/via signos/símbolos/formas. Conhecer é realizar operações de que o conjunto constitui tradução/construção/solução. O conhecimento é necessariamente: tradução, construção, solução. Isso significa que o conhecimento não saberia refletir diretamente o real, só podendo traduzi-lo e reconstruí-lo em outra realidade. As operações da computação artificial e da computação viva são de mesma natureza: de associação e de separação, lógicas no primeiro caso, pré-lógicas, mas pragmática, isto é, conforme princípios/regras que dirigem a lógica das operações. A computação artificial obedece a princípios /regras em conformidade com os que dirigem a racionalidade cognitiva. A computação viva obedece aos princípios/regras da auto-eco-organização viva que constituem, de qualquer maneira, o seu “programa”. O “programa” da computação viva é complexo. A diferença de programa entre as duas computações é ao mesmo tempo a diferença organizacional entre máquina artificial e máquina viva e a diferença existencial entre artefato e ser vivo. - Na origem do conhecimento O cômputo celular é a fonte indistinta e limitada de todos os desenvolvimentos do conhecimento vivo, inclusive dos do conhecimento humano. A questão de saber se, na origem do conhecimento, um dos termos da organização computante precede o outro, ou até mesmo se a computação precede ou segue a auto-eco-organização, não tem sentido. O complexo da computação viva só pode emergir como complexo organizador. - Conclusão Tudo o que precede só pode ser admitido, reconhecido, concebido, compreendido se precedemos a uma reorganização conceitual em cadeia. Precisamos reintegrar solidariamente as idéias de ser de indivíduo, de sujeito, em vez de apagá-las ou de evacuá-las. Precisamos entrar no reino do pensamento complexo de abandonar o olhar simplificador que torna cego o nosso conhecimento e, de modo singular, o conhecimento das fontes de nosso conhecimento. 2. A animalidade do conhecimento (Paula) Edgar Morin inicia o capítulo contextualizando o aparelho neurocerebral e a forma pela qual acontece a organização da ação e do conhecimento. Ele explica a questão dos sistemas nervosos e mobilidade muscular em mamíferos, abordando os gânglios cefálicos, que são quase cérebros situados em cabeças, até chegar ao córtex eneocórtex, estes responsáveis por armazenar conhecimentos. Prossegue falando sobre a investigação do homem animal, primata e observa que, os conhecimentos humano e animal sinalizam uma relação paradoxal, pois para Morin o conhecimento humano se distingue ou se confunde com o comportamento animal. Continua discorrendo a respeito do tecido nervoso humano e de que modo se formou, sendo a partir de interações com o mundo exterior. Segundo o autor, os desenvolvimentos cerebrais não se separam da locomoção rápida e um dos motivos é o fato do homem não dispor de muita capacidade para captar energia solar. De acordo com essa ótica em relação ao aparelho neurocerebral, Morin (2008, p. 63), compara o cérebro humano como um “gigantesco centro de computação”, devido a tratar o conhecimento, a ação e as interações conhecimento/ação. Morin reporta para o aspecto de que a existência animal depende, também, do conhecimento do meio. Assim, vê-se que o conhecimento progride a partir de quando o conhecimento beneficia a ação e a ação beneficia o conhecimento. Outro ponto que Morin toca é a dialética, que tem dinâmica a partir da ação, que gera o conhecimento, comunica, propicia a sensibilidade e a afetividade. Morin, no que diz respeito ao conhecimento cerebral, compara como se fosse uma composição das computações, inclusive usa a expressão “computação das computações”, definindo a composição do conhecimento cerebral como: megacomputação de microcomputações (neurais); mesocomputações (regionais) e intercomputações (entre neurônios e entre regiões). No que tange ao que chama de grande cômputo, trata-se de um ato egocêntrico que une o conhecimento individual e o senso comum. Essa computação cerebral está composta por: dupla memória (uma hereditária e outra adquirida); terminais sensoriais diversificados que oferecem milhares de informações e princípios regras específicos que lhe permitem organizar o conhecimento em um continum espaço temporal dotados de esquemas a priori. Em seguida, Morin esclarece a questão da percepção categorial, apresenta, ainda, as policomputações cerebrais ou ditas operações fundamentais, as quais têm o objetivo de sintetizar e analisar. O autor conceitua, também, a representação como “parte do mundo exterior captado pelo sentido.” Outro item relevante citado é a automatização do conhecimento, na qual estão presentes aprendizagens, estratégias e curiosidades. Começando pelo aprender, não significa apenas savoir-faire, que quer dizer obter êxito, mas saber fazer para adquirir saber, contudo, o cérebro é construtor e dispnibiliza a capacidade de aprender. O conhecimento necessita do cérebro que precisa de estímulos do meio para se desenvolver e referente ao ato de aprender, este unifica o conhecido e o desconhecido. Já a estratégia se produz durante a ação, transformando de acordo com o surgimento dos acontecimentos ou a recepção das informações, a conduta da ação desejada. A estratégia dois aspectos: aptidão para empreender, considerando a incerteza; e aptidão para modificar o desenvolvimento da ação, conforme o acaso do novo. Morin elenca, ainda, a missão das estratégias cognitivas em três: extrair informações “oceano” de ruído; realizar a representação correta de uma situação e avaliar as eventualidade e elaborar cenários de ação. Portanto, a missão do conhecimento é ambígua: simplificar e complexificar. Morin diz que a inteligência animal trata-se de uma arte estratégica no conhecimento e na ação e acrescenta mais, a inteligência exprime a virtude de uma pessoa não se deixar levar pelos hábitos, temores, vontades subjetivas. O autor comenta que o cérebro tem a capacidade de armazenar 30 bilhões de neurônios, daí conta com a possibilidade de conseguir aprender memorizar, de modo grandioso. Para tanto, há linguagem, pensamento e consciência. No caso do pensamento, supera a computação por meio da cogitação e as possibilidades cognitivas estão ligadas ao cérebro sapiens (animal). 3. O espírito e o cérebro (Larisse) O texto inicia com a epígrafe de “Jaques Monod” falando que o fato de vermos a alma humana como uma “substancia” imaterial não significa negar a sua existência, mas, ao contrário, significa reconhecer a complexidade dos fenômenos que a compõem. Morin discute neste capítulo as noções de cérebro e espírito como duas visões que estão “ligadas por um nó que não se pode desatar, em torno do qual giram as visões de mundo, do homem e do conhecimento.” (p.78). Cérebro e espírito são dois aspectos do mesmo, porém, O espírito nada sabe, por si mesmo, do cérebro que o produz, o qual nada sabe do espírito que o concebe. Resumindo: é juntos, mas sem se conhecer, que eles se conhecem. Os fenômenos de cada um são estudados em separado: um pelas ciências biológicas e outro pelas ciências humanas e permanecem condenados à redução do espírito ao cérebro ou à subordinação do cérebro ao espírito. Desde o século XVII, a cultura ocidental inseriu o cérebro no reino da ciência e das leis deterministas da matéria, e o espírito no reino da filosofia e das humanidades, este vivendo na imaterialidade, na criatividade e na liberdade. “Quando os dois reinos se encontram, entregam-se à guerra metafísica do Espírito livre contra a Matéria determinista”. O antagonismo do materialismo e do espiritualismotorna-se ainda mais radical porque cada concepção é hegemônica e redutora: assim, o materialismo reduz tudo o que é espiritual a uma simples emanação da matéria, e o espiritualismo reduz tudo o que é material a um subproduto do espírito. (p. 80) Essa discussão pode ser relacionada com a discussão de Hessen sobre a relação de dominação entre sujeito e objeto. Em ambos os casos, parece haver a necessidade de que um fenômeno sempre prevaleça sobre o outro. Conforme o autor, o espírito consciente apareceu, segundo a Razão teológica, como entidade superior, governando o pensamento, a decisão e a ação, mas no século XIX, o espírito deve de descer ao universo da ciência (com os estudos de Darwin) e tornar-se apenas um fruto da evolução, não mais autor primeiro da Criação: De fato, as descobertas do fim do século XIX, revelaram que todas as atividades mentais ou intelectuais são localizadas ou ao menos inscritas no cérebro. O espírito recua, dobra-se, fragmenta-se e, sob o efeito das vitórias deterministas e simplificadoras, parece ter se volatilizar-se. (p. 80) Já no século XX o materialismo entra em uma crise inesperada, porém, apenas o materialismo físico perde terreno, pois a materialidade bioquímica do cérebro ganha espaço. “Descobre-se que não há atividade intelectual, movimento de alma, delicadeza de sentimento, o menor sopro de espírito, que não corresponda a interações moleculares e não dependa de uma química cerebral.” (p. 81). Assim, os materialistas continuam a considerar o espírito como ilusão, mas os espiritualistas admitiram o cérebro como suporte. A informação que penetra pelos sentidos “materializa-se” em substancias químicas e em modificações neuroniais que armazenam fisicamente a significação simbólica das recepções sensoriais. O espiritualismo, obrigado a compor com a realidade material do cérebro, desemboca num dualismo colaborador ou interacionista que aceita que a realidade espiritual realiza as suas operações com a cooperação da realidade material. (p. 81). Morin explica que não podemos nem aceitar que o caminho da ciência elimina a presença do espírito, nem que o caminho da filosofia conduz à eliminação do cérebro. Ambos são necessários, mas insuficientes isoladamente. Essa ideia é expressa também pelo autor em seu texto “Para além do Iluminismo”, onde afirma que não existe ciência sem sentimento. O autor sugere que as discussões acerca do assunto devem partir do reconhecimento dessas suas realidades inseparáveis: atividades do espírito dependentes das atividades do cérebro, bem como a dependência dos fenômenos psíquicos aos fenômenos biofísicos. “Devemos, igualmente, recusar-nos a qualquer subordinação unilateral do espírito ao cérebro e vice-versa, mas antes conceber uma dupla subordinação.” (p. 82). Antes de tudo, num primeiro nível, impõe-se uma relação inegável de dependência do espírito em relação ao cérebro. Pode-se estimular, modificar, aniquilar todos os aspectos do espírito agindo de maneira química, elétrica ou anatômica sobre o cérebro (pode-se destruir a consciência com seções ou lesões do cérebro; pode-se modificar os estados de consciência com drogas etc.) [...] o que nos mostra bem o quanto o espírito se torna cego em função de alterações físico-químicas. (p.82) Podemos compreender assim que, o que afeta o espírito afeta o cérebro e, através do cérebro, todo o organismo. Através do cérebro, interferências externas podem afetar o espírito e o que afeta o espírito, afeta o cérebro. No final das contas, ambos se afetam mutuamente. (crença de que os males do espírito podem tornar-se doenças do corpo). Nesse contexto, inserem-se reflexões também acerca da fé: encantamentos e maldições que podem matar e milagres que podem curar. Por isso, a relação do espírito com o cérebro não pode ser simplesmente concebida como a do produto com o produtor, do efeito com a causa, do emanado com a fonte, pois o produto pode retroagir sobre o produtor e o efeito sobre a causa. Tudo isso nos indica uma ação recíproca, um efeito mútuo, uma causalidade circular. (p. 83). “Em conseqüência, devemos conceber, na sua própria dependência, certa autonomia do espírito.” (p. 83). Ou seja, ele influencia e é influenciado pelo cérebro. A atividade do espírito é uma produção do cérebro, mas a concepção do cérebro é uma produção do espírito. Assim, constitui-se um círculo: o cérebro não explica o espírito, mas necessita dele para explicar-se a si mesmo e vice-versa. O cérebro só pode conceber-se via espírito, e este só pode conceber-se via cérebro. Não se pode isolar o espírito do cérebro nem o cérebro do espírito. Além disso, não se pode isolar o espírito/cérebro da cultura. Com efeito, sem cultura, isto é, sem linguagem e saberes acumulados no patrimônio social, o espírito humano não teria atingido o mesmo desenvolvimento e o cérebro do homo sapiens teria ficado limitado às computações de um primata do mais baixo grau. (p. 85) “A cultura é indispensável para a emergência do espírito e para o desenvolvimento total do cérebro. [...] Enfim, a esfera das coisas do espírito é e continua inseparável da esfera da cultura: mitos, crenças, teorias, ideias...” (p. 85). A cultura é um terceiro elemento incluído na identidade espírito/cérebro. Morin faz uma classificação das oposições absolutas: ● Suspensão física: a realidade física comporta realidades imateriais como a informação e a organização. ● Suspensão biológica: todo ato biologicamente organizador comporta uma dimensão cognitiva. Em determinada profundidade, a organização vital e a organização mental constituem uma única coisa. A ideia central do texto é que espírito e cérebro formam uma organização retroativa na qual o produto torna-se também produtor das atividades que o produzem. Assim, o espírito surge com o pensamento e com a consciência. O espírito é pois uma emergência, um complexo de propriedades e de qualidades que, originário de um fenômeno organizador, participa dessa organização e retroage sobre as condições que o produzem. O espírito é uma emergência própria do desenvolvimento cerebral do homo sapiens, mas somente nas condições culturais de aprendizagem e de comunicação ligadas à linguagem humana. (p. 88) Morin afirma que podemos conceber um circuito retroativo-produtivo em que o espírito é continuamente gerado-regenerado pela atividade cerebral, ela própria gerada-regenerada pela atividade de todo ser. Assim, consciência e espírito não podem ser concebidos independentemente dos processos de transformações físicos. Para o autor essas duas grandes abordagens poderão e deverão aproximar-se e comunicar-se, mas nunca poderão integrar-se ou harmonizar-se totalmente, pois, se elas se aproximam em demasia, as visões se confundem. Morin explica ainda que o aparelho cerebral é o dispositivo que organiza as operações cognitivas dos indivíduos e o cérebro é parte central desse aparelho pois é responsável pelo controle motor, análise sensorial e capacidade cognitiva. Nesse contexto, o espírito é a esfera das atividades cerebrais onde os processos computantes tomam forma cogitante, ou seja, de pensamento, linguagem, sentido, valor, sendo atualizados ou virtualizados fenômenos de consciência. O espírito não é uma substância pensante, mas uma atividade pensante que produz uma esfera “espiritual” objetiva. Morin conclui: [...] devemos parar de pensar em função do paradigma de simplificação (disjunção e redução) que só pode dissociar os dois termos ou aniquilar um pelo outro. Deve-se entender que quem conhece não é um cérebro, nem um espírito, mas um ser-sujeito pelos meios do espírito/cérebro. Os processos espirituais necessitam dos processos cerebrais, que necessitam dos processos fisiológicos. O espírito não é um locatário nem proprietário do corpo. (p. 94) 6. A existencialidade do conhecimento (Isabela) A ideia de ser e a de existência pode ser distinguida filosoficamente, mas não biologicamente. A existência é definida em função da precariedade e da incerteza próprias àvida de um ser cuja autonomia depende do seu meio. Os aspectos existenciais permanentes da vida animal são: a falta, a insuficiência, o perigo, e os animais superiores são particularmente seres de necessidades, pulsões, desejos, inquietudes, temores, sempre em busca e errantes. A marca existencial da necessidade e do desejo cresceu no homo sapiens, que se tornou o mais acabado e menos completo de todos os animais, tornando-se cada vez mais sacudido por necessidades insaciáveis e desejos infinitos. O capítulo trata do engajamento da consciência na existência e do engajamento da existência do conhecimento, focalizando a relação entre conhecimento e psique. Psique definida como o aspecto individual-subjetivo do espírito; a psique implica e sempre engaja a identidade pessoal e os problemas existenciais do indivíduo-sujeito. O conhecimento, a serviço do sujeito cognoscente (aquele que conhece ou tem a capacidade de conhecer), pode também colocá-lo a seu serviço. I A psique Psiquiatria do conhecimento As nossas interpretações da realidade são dependentes de nossos estados psíquicos profundos, os quais interdependem dos estados bio-neuro-cerebrais. Os estados de exaltação estão ligados ao otimismo; os depressivos, ao pessimismo. As psicoses determinam visões de mundo específicas que impõem sentidos às informações, acontecimentos, situações; assim, os estados maníacos apropriam-se de todo acontecimento fortuito, considerando-o como pleno de sentido, interpretando de maneira coerente em função da ideia fixa do sujeito; os estados esquizofrênicos fazem surgir contradições insuperáveis. Esses dois estados extremos ilustram a ideia freudiana de que os processos patológicos exageram os processos normais e revelam, em seus excessos, aspectos invisíveis da normalidade; assim, a psicose maníaca é resultado do exagero incontrolável da nossa necessidade racional de coerência, enquanto a esquizofrenia é resultado do exagero de nossa aptidão a conceber contradições e reconhecer as incertezas. Psicanálise do conhecimento “O futuro julgará que o valor da psicanálise como ciência ultrapassa amplamente seu valor terapêutico” disse Freud em 1926, justificando que a psicanálise deve ser concebida como uma ciência da psique. Para o autor, a psicanálise é uma ciência nova inacabada, extraviada, deslocada, que deve ao mesmo tempo retornar aos seus princípios de base e integrá-los numa concepção mais ampla. De toda maneira, uma psicanálise do conhecimento é possível e necessária ao conhecimento do conhecimento. O autor admite que desejos, temores, fantasias, infiltram as ideias consideradas mais puras. II Obsessões cognitivas e alegrias da certeza A etologia do conhecimento leva-nos a considerar uma pulsão propriamente1 cognitiva que se manifesta no apetite, nos desejos e eventualmente numa descarga de consumação. Coloca-se essa pulsão cognitiva em interdependência com a ansiedade vital, bastante presente em muitas espécies de mamíferos que, no homem poderá se projetar nos grandes problemas do conhecimento relativos a vida e a morte e tomar então forma de angústia metafísica. A pulsão cognitiva do homem ultrapassa, desenvolve, transforma a curiosidade mamífera e comporta a necessidade de compreender ou explicar não somente o meio, mas o mundo e a si mesma. O exame dessa pulsão conduz ao problema das obsessões cognitivas, na qual se exprime necessidades, faltas, angústias. Ansiedade, faltas, necessidades, angústias animam uma busca que aspira a resposta capaz de acalmar, dar segurança ou euforia. A busca é animada pelo mesmo que a parasita e engana quando a questão ansiogênica, portadora de angústias e de tormentos existenciais, aciona automática e necessariamente a resposta desejada, que faz bem ou até mesmo favorece um gozo psíquico próximo do gozo físico. Posse e possessão Deve-se distinguir a ideia de verdade do sentimento da verdade. A ideia de verdade corresponde a uma solução alternativa verdadeiro ou falso, sem que sejamos envolvidos ou afetados. Sem parar retomamos ou formulamos a ideia de verdade em nossos cálculos, percepções, observações. O sentimento de verdade traz a dimensão afetivaIexistencial para a ideia de verdade e pode tanto se apropriar da ideia de verdade quanto lhe obedecer. O sentimento de verdade liga-se a ideia de verdade não apenas quando estão em jogo os nossos interesses e problemas pessoais, mas também quando nos colocamos nos grandes problemas da natureza do real e do universo. O sentimento de verdade suscita uma dupla posse existencial: apropriação da verdade (eu tenho a verdade) e possessão pela verdade (eu pertenço a verdade). As duas posses ligam-se num ciclo que as alimenta “Pertenço a verdade que detenho”. 1 Significado: 1. bio eto estudo do comportamento social e individual dos animais em seu habitat natural. 2. p.ext. antrpol ciência que estuda os costumes humanos como fatos sociais. O sentimento de verdade é inseparável do sentimento de certeza, também distinguível da ideia de de certeza. A ideia de certeza pode ser-nos pessoalmente indiferente. O sentimento de certeza, ao contrário, comporta uma resposta a angústia da incerteza e nos implica pessoalmente. A necessidade de verdade e a necessidade de certeza recorrem uma a outra. A religião da verdade e a verdade da religião Toda evidência, toda certeza, toda posse possuída da verdade é religiosa no sentido primordial do termo: religa o ser humano à essência do real e estabelece uma comunhão. Gozo psíquico e a êxtase Como no gozo sexual, o gozo psíquico une a perda de si e a realização de si, traduzindo-se no seu apogeu, por essa beatitude veridicamente expressa por Pascal: “Alegria, alegria, lágrimas de alegria, certeza O erro da verdade No capítulo foi abordado o sentimento de verdade (e não a ideia de verdade), um complexo existencial que tentamos reconhecer evocando a possessão e a êxtase. Toda adesão à verdade comporta um elemento submístico, sub-religioso (fé, fervor, sentimento do sagrado) e mesmo um componente submágico. Os possessores de verdade são possuídos, encontrando e reencontrando a verdade por toda parte. Não entendem que ao encontrá-la perderam o sentido da verdade. A verdade é a fonte principal de nossos erros, ilusões e delírios. Conclusão: para além do princípio do prazer Todo conhecimento comporta aspectos individuais, subjetivos e existenciais. As ideias que possuímos nos possuem, tem caráter passionalIexistencial. A paixão pelo conhecimento pode suscitar num engajamento total do ser. Da mesma forma que conhecimento humano não conseguiria desconsiderar do sujeito, mas deve lutar vitalmente contra o egocentrismo; o conhecimento humano tem necessidade vital de afetividade (paixão de conhecer, sede da verdade), mas deve lutar vitalmente contra a afetividade, pois ela extravia e falseia tal afetividade. O conhecimento humano não saberia se desvincular da existência, mas não deveria ser acorrentado a esta. Não podemos ser acorrentados. Podemos viver ao mesmo tempo a paixão do conhecimento e, por e pelo conhecimento, controlar essa paixão. O amante da verdade deve desconfiar do que o faz gozar psiquicamente e buscar a verdade para além do princípio do prazer. Deve analisar seu comportamento, sua natureza intelectual e o significado das suas obsessões cognitivas e tentar elucidar aquilo que o causa ansiedade e suas próprias respostas calmantes. É preciso auto-análise. O comportamento explorador do mamífero transformou-se em paixão humana de conhecer. No coração dessa paixão há um comportamento insaciável que faz com que o sujeito busque a sua verdade fora dele mesmo, além do que ele conhece. O motor mais potente da aventura do conhecimento são: o desejo infinito de conhecer e o desejo imperativo de verdade, que levam a conhecer por conhecer, sem considerar as consequências éticas, políticas ou religiosas; tendem a superar obstáculos e liberar-se dos imprinting socioculturais. Esse mesmo motor pode enganar o conhecimento, teleguiando-o rumo as aspirações metafísicas secreta e inconscientementeinscritas no começo da investigação. 9. Inteligência, Pensamento e Consciência (Dayanne) A inteligência, o pensamento e a consciência são infinitas relações computantes e cogitantes que constituem as atividades cerebrais. Com qualidades próprias e alguma autonomia, sendo interdependentes. Usa-se as seguintes referências para cada uma delas: Arte estratégica (Inteligência), Arte dialógica (Pensamento) e Arte reflexiva (Consciência). I. A inteligência da inteligência humana A inteligência é uma qualidade anterior e exterior ao pensamento humano se a definirmos como aptidão para pensar, tratar, resolver problemas em situações complexas. Porém, definindo-a assim, constataremos que há inteligência nos animais e até mesmo no reino vegetal. Quanto utilizamos da definição de Arte estratégica, que é a utilização da astúcia, a capacidade de reconhecer os próprios erros, a aptidão para aprender, permite-nos reconhecer um ser inteligente. Assim, a inteligência precede a humanidade. O próprio da inteligência humana consiste em permanecer ao mesmo tempo vivo, animal, individual, tonando-se espiritual e cultural, de desenvolver-se nos níveis inter-relacionados da linguagem, do pensamento, da consciência e de desdobrar-se em todas as esferas das atividades e pensamentos humanos. De fato, o desenvolvimento da inteligência humana está ligado aos diversos desdobramentos das atividades pessoais, interpessoais, coletivas e nos variados domínios sociais, econômicos, profissionais, político, militar e etc. Operando tanto na Práxis (transformadora e produtiva), quanto na Techne (produtora de artefatos), e também, na Teoria ( conhecimento contemplativo/especulativo). Existindo assim, diversos tipos de inteligência. As qualidades inteligentes A inteligência como Arte estratégica, combina eficazmente qualidade muito numerosas e diversas, eis algumas delas: 1) capacidade de aprender por si mesmo 2) aptidão para hierarquizar (definir prioridades) 3) análise de utilizar meios para atingir os fins 4) aptidão para simplificar um problema, reduzindo-o a um enunciado essencial 5) aptidão para reconsiderar sua percepção e sua concepção acerca de uma situação 6) aptidão para realizar descobertas a partir do acaso 7) aptidão para reconstituir acontecimentos a partir de rastros 8) aptidão para conjecturar o futuro, considerando as diversas possibilidades 9) perspicácia em situações inesperadas 10) aptidão para desenvolver informações a partir de informações e experiências 11) aptidão para reconhecer o novo sem reduzir o conhecido 12) aptidão para enfrentar/superar situações novas e inovar 13) aptidão para discernir o possível do impossível 14) aptidão para recortar um objeto de um sistema de referência e reintegrá-lo em um outro 15) Armazena a informação, memória, experiência e a imaginação A inteligência mistura qualidades muito diversas, sendo sua associação indispensável. É construtiva e destrutiva, combinatória e ocasionalmente rotativa. A arte da inteligência significa também saber escolher inteligentemente os meios inteligentes próprios para tratar de maneira específica uma situação determinada. Chances e azares da inteligência Todo ser humano dispõe da potencialidade da inteligência, porém alguns fatores como fatores culturais, familiares, históricos, ela exprime-se de forma desigual. Precisando ela de certas condições para afirma-se e desenvolver-se. Precisa ser alimentada e fortalecida. O autor define o mal das carências da inteligência humana, como asneira, que corresponde: - A incapacidade de aprender com a experiência e de beneficiar-se com os erros; - A incapacidade de modificar os próprios esquemas mentais em função da diversidade e da novidade das situações; - A seleção de falsos problemas e de falsos critérios, em detrimento dos verdadeiros, e à acumulação de dados inúteis; - A perda de vista dos fins no uso dos meios e à incapacidade de conceber os meios adequados aos fins. O problema da inteligência concerne diretamente ao do conhecimento. Este depende da inteligência. As fraquezas, fracassos, carências da inteligência repercutem no conhecimento. II. Do pensamento O pensamento é uma atividade específica do espírito humano que expande-se na esfera da linguagem, da lógica e da consciência. No seu movimento organizador/criador, é uma dialógica complexa de atividades que aciona competências complementares do espírito/cérebro. Essa dialógica se organiza e desenvolve a concepção, que caracteriza o pensamento. A dialógica pensante O autor apresenta um quadro com componentes da dialógica que o pensamento aciona e que o acionam. Como por exemplo: o abstrato aciona o concreto, a verificação a imaginação, o racional e o irracional, etc. Associando de modo permanente e complementar processos virtualmente antagônicos que tenderiam a se excluir. Concluindo que todo processo de pensamento, isolado e levado ao extremo, conduz à cegueira ou ao delírio. A concepção A concepção transforma o conhecido em concebido, em pensamento. Sendo ela, a ideia de engendrar ou de procriação; de formação de conceito e a de design, onde configura modelos ou objetos novos. Podendo ser definida como uma configuração original, formando unidade organizada, enquadrada por um espírito humano. A concepção cobre todos os campos sociais, como a elaboração de uma teoria, uma obra de arte, a invenção de um instrumento ou uma representação cinematográfica. A concepção utiliza todos os recursos do espírito, do cérebro e da mão do homem. Combinando a aptidão para formar imagens mentais em produzir imagens materiais (objetos, desenhos, etc), utiliza das palavras, da imaginação e diversas estratégias da inteligência. Conceber a concepção O espírito humano concebe um fenômeno ou um problema em função de princípios/regras, terias,etc, e a partir de métodos ou estratégias cognitivas. Existindo vários níveis de concepção: o primeiro é o da concepção dentro de uma teoria que permite conceber; o segundo é o da concepção que permite conceber uma teoria nova, adequada aos dados ou os fenômenos a serem concebidos; o terceiro nível é o da concepção da concepção, em que se concebem e questionam os princípios organizadores das teorias. A concepção da concepção cobre a teoria do conhecimento, a epistemologia, a lógica, a paradigmática, ou tudo o que tentará conceber de modo articulado o conhecimento do conhecimento. Ars cogitandi O pensamento pode-se aplicar a todos os problemas, parece-se com uma máquina de Turing (computador), polivalente e poligeradora, capaz de descrever, compreender e explicar através de meios de concepção (noções, ideias, discursos), tudo o que pode ser descrito, compreendido e explicado por tais meios. Contudo, difere de uma máquina de Turing, o pensamento duvida, concebe, afirma, nega, quer , não quer, imagina e sente. O pensamento é uma arte que deve inventar sua concepção de um fenômeno, de um acontecimento, de um problema. A ars cogitandi é uma arte dialógica da concepção que ativa as aptidões e atividades do espírito/cérebro. O pensamento criador “A descoberta consiste em ver o que todos viram e em pensar no que ninguém pensou”. “Ver o que todos viram” necessita da nova concepção “pensar o que ninguém pensou”, que determina a integração na percepção, e assim a sua modificação, do que era antes invisível, mesmo “visto”. Qualquer descoberta é uma conquista cognitiva que comporta invenção e criação, sendo estes, dois temos que se sobrepõem e não podem ser separados. III. A consciência A consciência da consciência O desenvolvimento pleno do espírito comporta a sua própria reflexividade, a consciência. Sob todos os aspectos, a consciência é o produto e a produtora da reflexão; como um retorno do espírito sobre si mesmo via linguagem. Este retorno permite um pensamento do pensamento capaz de retroagir sobre o pensamento e possibilita um pensamento de si apto a retroagir sobre si. A consciência duplica todas as atividades e coisas do espírito, ela é consciente de si mesmo. Sendo subjetiva, mas permite o sujeitotratá-la de forma objetiva. Tendo como características paradoxais: - sempre subjetiva e objetivante; - distante e interior; - estranha e íntima; - periférica e central; - epifenomenal e essencial. A consciência é como um miradouro (binóculos), que permite ao espírito considerar-se a si mesmo de um ponto de vista superior sem deixar, contudo, de permanecer no seu próprio interior. Mas, não é de forma alguma um edifício fixo e estável. Permite a autodescrição, a autocorreção e o autodesenvolvimento do conhecimento, do pensamento, da psicologia e do comportamento do ser consciente. O iceberg da inconsciência O consciente emerge de um fundo inconsciente de acordo com um processo inconsciente. O conhecimento elabora-se inconsciente e a consciência só se encarrega de uma parte dele. Estamos conscientes apenas do caráter global de nossas sensações: sinto frio, calor, fome, sede. Não temos consciência das inter-relações cerebrais. Entre a esfera inconsciente profunda e a esfera da consciência consciente de si mesma, há uma zona imprecisa que pode ser nomeada subconsciente, onde fluem e refluem consciência e inconsciência. A consciência de si A consciência de si parece-nos evidente, mas há uma experiência reflexiva, onde o “eu”, duplica-se, num “ego”, para formar o “eu sou eu”. Sendo esse “duplo”, já tão internalizado em nosso espírito, que perdeu seu aspecto corporal. Em consequência, a consciência de si interiorizou-se e espiritualizou-se, embora sempre comporte fundamentalmente a unidualidade do eu e o diálogo consigo mesmo (a voz interior). A brecha Diferentemente dos animais, que vivem num eterno presente, pois não tratam a memória e as lembranças como construção de conhecimento, a consciência humana institui a consciência do passado como o abolido para sempre e a consciência do futuro como o não-acontecido. Restaurando-as sem parar a unidade do eu através da diversidade das experiências vividas e da evolução da pessoa. Os animais “conhecem” a morte, pressentem-na. O espírito humano tem acesso à consciência da morte. O encontro entre a consciência de si e a consciência do tempo determina a consciência de viver no tempo e de ter de enfrentar a morte. Devemos compreender que a aptidão à regressão e à perversão é inerente à consciência. O subdesenvolvimento da consciência O homo sapiens dispõe da possibilidade de consciência, mas só consegue ativá-la através da linguagem e numa sociedade. Será que houve uma consciência “selvagem” antes da “civilizada”? Como e de que forma deu-se o surgimento da consciência? O autor não pretende responder a tais perguntas, mas sim salientar que há uma historicidade da consciência humana. Que ela poderia e deveria desenvolver-se a partir das experiências históricas através da conversa com o inconsciente, porém existem limites. Considerados esses limites, podemos esperar um enorme progresso da consciência, que seria simultaneamente um grande progresso no conhecimento e um progresso rumo à co-pilotagem do homem e da sociedade pela consciência. Conclusão O pássaro de Minerva A inteligência humana, o pensamento. a consciência não são apenas interdependentes: cada um desses termos necessita dos outros para ser definido e concebido. Assim, o pensamento necessita da arte e da estratégia cognitiva, ou seja, da inteligência.Esta precisa do pensamento, isto é, dos diálogos polimorfos do espírito e da aptidão para conceber. A consciência precisa ser controlada pela inteligência, a qual necessita das tomadas de consciência. O pensamento necessita da reflexão (consciência) e a consciência necessita do pensamento.
Compartilhar