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Seja bem Vindo! Curso ireitoD II Penal Processual CursosOnlineSP.com.br Carga horári 60a: hs http://www.iped.com.br/ Conteúdo Parte geral: direito processual penal .................................................................... Pág.6 Inquérito Policial ................................................................................................... Pág.8 Ação Penal ........................................................................................................... Pág.12 Ação Civil ex Delicto............................................................................................. Pág.23 Jurisdição ............................................................................................................. Pág.24 Competência ........................................................................................................ Pág.25 Questões e Processos Incidentes ........................................................................ Pág.31 Prova .................................................................................................................... Pág.40 Sujeitos Processuais ............................................................................................ Pág.53 Prisão, Das Medidas Cautelares e Liberdade Provisória ..................................... Pág.57 Citações e Intimações .......................................................................................... Pág.69 Sentença .............................................................................................................. Pág.72 Procedimentos em Espécie .................................................................................. Pág.76 Nulidades ............................................................................................................. Pág.98 Recursos ............................................................................................................... Pág.102 Juizados Especiais Criminais ................................................................................. Pág.121 Bibliografia ........................................................................................................... Pág.127 http://www.iped.com.br/ 6 1. Parte geral: direito processual penal O direito processual penal é ramo do direito público. Sua finalidade é a de funcionar como instrumento de aplicação da normal penal. É através do processo que o Estado concretiza, em relação ao particular, a previsão abstrata de direito material, contida no Código Penal ou em legislação penal especial. Cometido o fato típico, o Estado só pode exercer seu poder-dever de punir mediante o devido processo legal, conforme determinação constitucional. Como o direito penal está relacionado à privação ou restrição de direitos fundamentais, antes de qualquer medida concreta, deve-se conceder ao particular um amplo direito de defesa. Sobre a competência legislativa em processo penal, a Constituição da República de 1988 conferiu competência privativa à União, nos termos do seu artigo 22, inciso I. No entanto, conforme disposição contida no parágrafo único do mencionado dispositivo existe a possibilidade de, mediante lei complementar, ser conferida autorização para que os Estados possam legislarem sobre matéria específica, relacionada ao direito processual penal. 1.1 Lei processual no tempo Assim como ocorre com o processo civil, para o processo penal vige o princípio tempus regit actum. Diferentemente do que ocorrem com as regras de direito material penal, que podem ser retroativas em benefício do réu, as regras processuais aplicam-se imediatamente após o início de sua vigência, tragam elas benefício ou prejuízo à situação do réu. Portanto, em matéria processual penal não há que se falar em retroatividade benéfica da lei, mas tão somente em irretroatividade. No entanto, questão peculiar diz respeito às normas híbridas, isto é, normas que tem disciplina material e processual. Quando uma lei abordar matérias relativas ao direito material penal e também ao direito processual penal, entende-se que há possibilidade de retroatividade ou ultratividade dos dispositivos que abordem matérias de direito material, o que não ocorre em relação aos dispositivos que abordem apenas regras de direito processual. Quanto a este assunto, porém, não está pacífico na doutrina. 1.2 Lei processual no espaço O Código de Processo Penal tem vigência em todo o território nacional, logo, quaisquer infrações penais aqui cometidas sujeitar-se-ão a norma processual penal pátria. Mas o próprio Código de Processo Penal apresenta uma ressalva, admitindo que o processo penal que tramite no Brasil seja regido por tratados, convenções e regras de direito internacional. Dessa forma, do mesmo modo em que ocorre no direito penal, também no direito processual vige a regra da territorialidade temperada. http://www.iped.com.br/ 7 1.3 Lei processual em relação às pessoas A lei processual atinge todas as pessoas, em consagração ao princípio da isonomia. Contudo, não viola este princípio a existência de imunidades, destinada a determinadas pessoas que ocupam posições que exigem essa garantia. Dentre as imunidades, existem: a) a diplomática; e b) a parlamentar. A imunidade diplomática alcança os embaixadores, todos os funcionários da respectiva embaixada e se estende, também, aos familiares do embaixador. Essa imunidade se aplica em relação a todos os crimes cometidos em território brasileiro. Nesse caso, embora o crime tenha sido cometido aqui, será processado e julgado pela lei do país de origem da embaixada. Essa imunidade alcança, também, os chefes de Estado estrangeiros e membros de organizações de abrangência internacional, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT), por exemplo. Já a imunidade parlamentar, extremamente mais restrita, tanto em relação às pessoas que alcança como em relação aos crimes a que se destina, dirige-se aos parlamentares (deputados e senadores) quando no exercício de suas funções, em relação aos crimes de opinião. A imunidade parlamentar tem início com a diplomação e se encerra na data de término do mandato. Essa imunidade impede que os parlamentares sejam presos, salvo mediante flagrante-delito, por crime inafiançável. A imunidade em relação aos crimes de opinião, que é aquela que impede a responsabilização penal do parlamentar que, no exercício de suas funções, estiver no exercício de sua liberdade de expressão, é chamada de imunidade material. Essa imunidade alcança também os vereadores, no âmbito do respectivo Município. A imunidade em relação à impossibilidade de prisão, desde a diplomação até o término do mandato, salvo por flagrante delito caso o crime seja inafiançável, é chamada de imunidade formal. Essa imunidade, diferentemente da material, não alcança os vereadores. Essas imunidades não beneficiam o parlamentar ou o agente diplomático como pessoas, mas destinam-se ao exercício livre e desembaraçado das funções inerentes ao cargo que elas ocupam. Dessa forma, não é dado ao parlamentar, nem ao agente diplomático a faculdade de renunciar as suas imunidades, que, como visto, não são suas, mas do cargo que ocupam. 1.4 Persecução penal A persecução penal é o caminho trilhado, desde a fase investigatória até a fase processual, de modo a concluir-se pela condenação à absolvição do acusado. A persecução penal tem início com o inquérito policial, fase em que são realizadas as investigações que podem dar ao Ministério Público ou ao http://www.iped.com.br/ 8 querelante os requisitos necessários ao oferecimento da denúncia ou queixa-crime. Como será oportunamente analisado, esses requisitos são: prova da materialidade e indícios de autoria. Preenchidos os requisitos, nasce para o Ministério Público o dever de oferecera denúncia que, se recebida, instaura a ação penal pública, e para o ofendido a faculdade de oferecer a queixa-crime que, se recebida, instaura a ação penal privada. Com o recebimento da denúncia ou da queixa, tem início a segunda fase da persecução penal, que é a fase judicial. Após o trâmite da ação penal, com a condenação ou absolvição do acusado, tem-se por encerrada a persecução penal. persecução penal extrajudicial persecução penal judicial Inquérito Policial Ação Penal 2. Inquérito Policial O inquérito policial abre a persecução penal e destina-se à investigação da situação criminosa, de modo a obter prova da materialidade delitiva e indícios de autoria, requisitos indispensáveis à instauração da ação penal pública ou privada. Quem realiza as investigações na fase inquisitiva é a autoridade policial. Dessa forma, o inquérito policial não resguarda a garantia do contraditório, da forma como prescrita na Constituição Federal de 1988, isto porque o inquérito policial não se destina a aplicação de punição ao acusado, competência restrita ao âmbito judiciário, após a instauração de uma ação penal. A finalidade do inquérito policial é a investigação, sendo que o resultado dessa investigação é que será ponderado pelo Ministério Público como suficiente, ou não, à instauração de uma ação penal. Embora não resguarde o direito ao contraditório, o inquérito policial pode ser acompanhado pelo advogado do averiguado ou indiciado a todo tempo, assunto por sobre o qual o Supremo Tribunal Federal editou a súmula vinculante n.º 14, que dispõe: “é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”. É importante frisar, também, que devido a finalidade do inquérito policial (obter prova da materialidade delituosa e indícios de autoria), ele é dispensável caso o Ministério Público (no caso de ação penal pública) ou o querelante (no caso de ação penal privada) já possuam as provas que bastem ao oferecimento da denúncia (no caso do Ministério Público) ou da queixa-crime (no caso do querelante). O inquérito policial também é dispensável no âmbito dos Juizados Especiais Criminais, eis que substituído pelo termo circunstanciado, em consagração ao princípio da celeridade, que rege os Juizados. http://www.iped.com.br/ 9 Concluído o inquérito policial, se ele trouxer prova da materialidade delitiva e suficientes indícios de autoria, o Ministério Publico ou o querelante oferecerão a denúncia ou queixa, respectivamente, e uma vez instaurada a ação penal, os autos do inquérito ficarão apensos aos autos do processo penal. Instaurada a ação penal, o valor das provas produzidas na fase inquisitiva adquirem caráter relativo, e em hipótese alguma podem fundamentar, com exclusividade, a decisão do juiz pela condenação do acusado. Isto ocorre, pois as provas produzidas na fase inquisitiva não observam o contraditório e tem por objetivo, apenas, fundamentar a instauração da ação penal, mas não a condenação do acusado. Nesse sentido é a redação do artigo 15 do Código de Processo Penal: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Só há que se falar em condenação do acusado mediante a produção de provas em juízo, após o exercício amplo do direito de defesa. As oitivas de testemunhas feitas na fase inquisitiva, por exemplo, devem ser todas repetidas na fase judicial. 2.1 Instauração do Inquérito Policial O inquérito policial é dirigido pela polícia judiciária, que é exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e tem por finalidade a apuração das infrações penais e de sua autoria. Essa atribuição, no entanto, não exclui a de autoridades administrativas que, por lei, tenham a mesma função. No âmbito da polícia judiciária, quem preside o inquérito é o delegado de polícia de carreira. O inquérito policial tem início: a) de ofício; b) mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público; ou c) a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. O inquérito policial é instaurado de ofício sempre que a autoridade policial tomar conhecimento, diretamente, de alguma prática criminosa. Nesse caso, a instauração do inquérito policial se formaliza por meio da portaria, que é a peça inaugural do mesmo. Tanto o Ministério Público como os juízes possuem autoridade para determinar à autoridade policial, a instauração de inquérito. Note-se que a lei fala de requisição, em nítido sentido de ordem. Assim, sempre que o Ministério Público ou os juízes identificarem alguma prática criminosa, devem requerer à autoridade policial que instaure o inquérito policial. Nesse http://www.iped.com.br/ 10 caso, a instauração do inquérito policial se formaliza com o próprio documento de requisição, seja do Ministério Público ou da autoridade judiciária. E o ofendido também pode requerer a instauração de inquérito policial, assim como seu representante legal. Note-se, contudo, que a lei fala em requerimento, no sentido de mera solicitação. Nesse caso, se a autoridade policial constatar a necessidade de instauração, o inquérito terá como peça de abertura o próprio requerimento do ofendido. Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito cabe recurso para o chefe de polícia (art. 5º, §2º, do CPP). A teor do parágrafo terceiro do artigo 5º, do Código de Processo Penal, qualquer pessoa que tiver conhecimento acerca da existência de infração penal em que caiba ação pública pode, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, deve mandar instaurar inquérito. Esse parágrafo trata, pois, da notitia criminis. Mas não há que se falar em notitia criminis apenas nos moldes descritos, pois a notícia do crime também pode ser obtida de forma espontânea, como mera decorrência do trabalho policial, ou de forma provocada, como nos casos de requisição para instauração de inquérito pela autoridade judiciária ou pelo Ministério Público, ou, ainda, por meio de cognição coercitiva, isto é, quando a autoridade policial toma ciência da prática criminosa logo após a realização de uma prisão em flagrante. Sempre que a ação penal depender de representação (ação penal pública condicionada), não poderá ser instaurado inquérito policial sem que esta representação tenha sido apresentada. Quando o Ministério Público apresenta requisição para instauração de inquérito, e o crime é ensejador de ação penal condicionada, essa requisição deve se fazer acompanhar da representação, obrigatoriamente. E nos casos de ação penal privada, só há que se falar em instauração de inquérito policial mediante requerimento daquele que possua legitimidade para oferecer a queixa-crime. Por derradeiro, conforme prevê ao artigo 6º do Código de Processo Penal, assim que a autoridade policial tomar ciência da prática de uma infração penal, ela deve: a) dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; b) apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; c) colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; d) ouvir o ofendido; e) ouvir o indiciado (com observância, no que for aplicável, das regras relativas ao interrogatório do acusado), devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; f) procedera reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; g) determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; http://www.iped.com.br/ 11 h) ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; i) averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. 2.2 Prazos e conclusão do inquérito policial O prazo para encerramento do inquérito policial é de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou se estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela (art. 10, do CPP). Findo o inquérito, a autoridade policial deve elaborar minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviar os autos ao juiz competente. Caso existam testemunhas que não tenham sido inquiridas, a autoridade policial deve indicá-las no relatório, mencionando o local em que elas possam ser encontradas. Em sendo o fato de difícil elucidação, e o indiciado estando solto, a autoridade policial pode requerer ao juiz a devolução dos autos para ulteriores diligências, que devem então ser realizadas no prazo que o juiz fixar (art. 10, §3º, do CPP). Devem acompanhar o inquérito, os instrumentos do crime, assim como os objetos que interessarem à prova, conforme estipula o artigo 11 do Código de Processo Penal. O inquérito policial deve sempre acompanhar a denúncia ou a queixa, sempre que lhes servir de base, ficando apenso aos autos da ação judicial. Conforme redação do artigo 13 do Código de Processo Penal, é incumbência da autoridade policial: a) fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; b) realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; c) cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; d) representar acerca da prisão preventiva. Quando o ofendido ou seu representante legal, assim como quando o indiciado façam requerimento de qualquer diligência, esta pode ou não ser realizada, a critério da autoridade policial (art. 14, do CPP). Quando o Ministério Público faça a devolução do inquérito à autoridade policial, para realização de novas diligências, estas devem ser imprescindíveis ao oferecimento da denúncia, nos termos do artigo 16 do Código de Processo Penal. http://www.iped.com.br/ 12 A autoridade policial não possui legitimidade para mandar arquivar os autos de inquérito policial, conforme orientação do artigo 17 do Código de Processo Penal. E quando o arquivamento tiver sido determinado pela autoridade judiciária, por reputar insuficientes as provas que serviriam de base à denúncia, a autoridade policial tem legitimidade para proceder a novas pesquisas, desde que tenha notícia acerca de outras provas da prática criminosa (art. 18 do CPP). Nos crimes de ação penal privada, os autos do inquérito policial serão remetidos ao juízo competente após a conclusão, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante tratado (art. 19, do CPP). Por fim, cumpre mencionar que é dever da autoridade policial assegurar o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. Nos casos em que houver solicitação de atestados de antecedentes, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes, exceto no caso de existir condenação anterior (art. 20, parágrafo único, do CPP). 3. Ação Penal É por meio da ação penal que o Estado processa e julga o acusado de alguma prática criminosa, ao final absolvendo-o ou condenando-o. Nas palavras de Fernando Capez, “é o direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto. É também o direito público subjetivo do Estado-Administração, único titular do poder-dever de punir, de pleitear ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo, com a consequente satisfação da pretensão punitiva” (2010, p. 153). 3.1 Princípios informadores do processo penal São princípios que regem as relações de direito processual penal: a) princípio do devido processo legal; b) princípio da legalidade; c) princípio da oficialidade; d) princípio da oficiosidade; e) princípio da indisponibilidade; f) princípio da publicidade; g) princípio do contraditório; h) princípio da ampla defesa; i) princípio da verdade real; e j) princípio da presunção de inocência. http://www.iped.com.br/ 13 A seguir, serão sucintamente analisados cada um dos princípios supra mencionados. 3.1.1 Princípio do devido processo legal A garantia do devido processo legal consta do inciso LIV do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, segundo o qual “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. O princípio do devido processo legal garante a observância da marcha processual legalmente prevista, sem atropelos ou inversões tumultuárias, de maneira a sempre garantir ao acusado, dentre outros, o exercício de seus direitos ao contraditório e a ampla defesa. 3.1.2 Princípio da verdade real No processo penal, diferentemente do processo civil, impera o princípio da verdade real, por meio do qual impede-se que o juiz se satisfaça com a mera verdade trazida pelas partes aos autos. Para efetivação desse princípio garante-se ao juiz ampla liberdade quanto à produção probatória, pois objetiva-se que ele busque, a todo momento, identificar o que realmente aconteceu no mundo dos fatos. Portanto, não há que se falar em inércia do juiz em relação a dilação probatória, uma vez que este tem o dever de obter para os autos a verdade real em relação ao que se apura. 3.1.3 Princípio da oficialidade Como a ação penal é pública, a persecução penal deve ser manejada por órgãos também públicos. É por isso que o inquérito policial é presidido pela autoridade policial, e a ação penal pública pelo Ministério Público. As exceções ao principio a oficialidade mostram-se no caso da ação penal privada e da ação penal popular, da Lei n.º 1.079/50. 3.1.4 Princípio da oficiosidade O princípio da oficiosidade, que não se confunde com o da oficialidade, determina que os órgãos públicos incumbidos da persecução penal não devem aguardar qualquer provocação para proceder ao que for necessário, devendo, pois, atuar de ofício. As exceções ocorrem em relação a ação penal privada e a ação penal pública condicionada a representação, pois nestas só há que se falar em atuação do Estado após a manifestação do ofendido. http://www.iped.com.br/ 14 3.1.5 Princípio da indisponibilidade A persecução penal não está na esfera de disponibilidade da autoridade policial e do Ministério Público. Ambos tem o dever de atuar de ofício (oficiosidade) e não podem, sem fundamentação, optar pelo arquivamento do inquérito (no caso da autoridade policial) ou pela desistência da ação (no caso do Ministério Público). A repreensão penal é de interesse público, a sociedade tem o direito de assistir à punição daqueles que descumprem a lei penal, e os órgãos incumbidos dessas atribuições, por não atuarem em nome próprio, não podem dispor sobre a persecução penal. No entanto, o princípio da indisponibilidade não se aplica em relação a ação penal privada, para a qual vigora o princípio da disponibilidade, uma vez que cabe ao ofendido decidir pelo ajuizamento ou não da açãopenal. 3.1.6 Princípio da publicidade As audiências, sessões e os atos processuais devem ser, via de regra, públicos e devem se realizar nas sedes dos juízos e tribunais, com assistência dos escrivãs, do secretário, do oficial de justiça que servir de porteiro, em dia e hora certos, ou previamente designados, conforme dispõe o artigo 792, caput, do Código de Processo Penal. No entanto, se da publicidade da audiência, da sessão ou do ato processual, puder resultar escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem, o juiz, ou o tribunal, câmara, ou turma, pode, de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que possam estar presentes (art. 792, §1º, do CPP). 3.1.7 Princípio do contraditório e da ampla defesa É importante salientar que o princípio do contraditório não se confunde com o princípio da ampla defesa. São dois princípios tratados frequentemente em conjunto por conveniência acadêmica. Basicamente, enquanto o contraditório reflete a necessidade de entrega de prazo à parte contrária, para que discuta as alegações ou provas produzidas pela outra parte, a ampla defesa reflete a impossibilidade de vedação no uso dos mais variados métodos de defesa, desde que lícitos, evidentemente, ou, em outras palavras, a produção e articulação da defesa deve ter a maior magnitude possível, permitindo às partes a exposição fática e probatória que mais lhes seja adequada às pretensões que manifestem. O princípio do contraditório e o princípio da ampla defesa estão consagrados no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988, que dispõe: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. http://www.iped.com.br/ 15 3.1.8 Princípio da presunção de inocência É também mandamento constitucional que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, LVII, da CRFB/88). Conforma expõe Fernando Capez, o princípio da presunção de inocência desdobra-se em três aspectos: “a) no momento da instrução processual, como presunção legal relativa de não culpabilidade, invertendo- se o ônus da prova; b) no momento de avaliação da prova, valorando-a em favor do acusado quando houver dúvida; c) no curso do processo penal, como paradigma de tratamento do imputado, especialmente no que concerne à análise da necessidade da prisão processual” (2010, p. 81). É pelo princípio da presunção da inocência que se diz que o juiz só pode condenar o réu quando possuir plana convicção acerca da autoria delitiva, bastando a dúvida a respeito da sua culpa para absolvê-lo. 3.2 Elementos, condições e pressupostos da ação penal Assim como ocorre no processo civil, no processo penal a ação é composta de elementos. Os sujeitos processuais (autor, réu e juiz), a causa de pedir e o objeto são, pois, os elementos da ação penal. Já as condições da ação, em matéria processual penal são as seguintes: a) possibilidade jurídica do pedido; b) interesse de agir; c) legitimação para agir; e d) justa causa. A possibilidade jurídica do pedido é a exigência de que o fato que é imputado ao acusado seja típico, pois se não houver previsão legal para puni-lo, não há que se falar possibilidade jurídica. O interesse de agir é a necessidade de demonstração, na denúncia ou queixa, de prova da materialidade delitiva e de indícios suficientes de autoria, sem o que faltará interesse de agir para a ação penal. Apenas o Estado é detentor do direito de punir, direito que ele exerce por meio do Ministério Público e, em alguns casos, mediante autorização dada ao particular, para que este intente a ação penal. Já a justa causa é a demonstração clara da fumaça do bom direito (fumus boni iuris) para que o juiz possa receber a denúncia ou queixa, requisito que se faz presente quando há nítida apresentação da materialidade delitiva e dos suficientes indícios de autoria delitiva. Por isso, muitos defendem que a justa causa compõe o interesse de agir. Os pressupostos processuais em matéria processual penal, por sua vez, dividem-se em objetivos e subjetivos. Os pressupostos subjetivos são classificados pela doutrina majoritária quanto ao juiz e quanto as partes. Já os pressupostos objetivos são classificados em extrínsecos e intrínsecos. São pressupostos processuais subjetivos, quanto ao juiz: http://www.iped.com.br/ 16 a) a investidura; b) a competência; e c) a imparcialidade. E quanto as partes, são pressupostos processuais subjetivos: a) capacidade de ser parte; b) capacidade processual; e c) capacidade postulatória. Já os pressupostos processuais objetivos extrínsecos são: a) a existência de fatos impeditivos; b) a litispendência; e c) a coisa julgada. E, por derradeiro, é pressuposto processual objetivo intrínseco: a) a regularidade do procedimento. 3.3 Classificação da ação penal Em matéria processual penal, a ação é classificada, segundo a sua titularidade, em pública ou privada. A ação penal pública, de titularidade do Ministério Público, pode ser: a) ação penal pública incondicionada; b) ação penal pública condicionada à representação; e c) ação penal pública condicionada à requisição. Enquanto a ação penal pública incondicionada pode ser ajuizada pelo Ministério Público, independentemente da participação de qualquer pessoa, o mesmo não ocorre quando a ação depende de representação ou requisição. A ação penal pública condicionada à representação só pode ser ajuizada pelo Ministério Público mediante a feitura do pedido/autorização pelo ofendido ou por seu representante legal, e no caso de morte, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do ofendido. Já a ação penal pública condicionada à requisição só pode ser ajuizada pelo Ministério Público quando houver requisição do Ministro da Justiça. Por sua vez, a ação penal privada pode ser: a) ação penal privada propriamente dita; b) ação penal privada personalíssima; e c) ação penal privada subsidiária da pública. Pode ajuizar a ação penal privada propriamente dita, o ofendido ou seu representante legal, assim como seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. http://www.iped.com.br/ 17 Já a ação penal privada personalíssima, como é sugestiva a expressão, só pode ser ajuizada pelo próprio ofendido. Por derradeiro, a ação penal privada subsidiária da pública é aquela que pode ser ajuizada pelo ofendido ou seu representante legal, assim como pelo seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, no caso de inércia do Ministério Público em relação ao oferecimento da denúncia no prazo legal. 3.4 Ação penal pública O caput do artigo 24 do Código de Processo Penal abre o Título que trata da “Ação Penal” dispondo que “nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo”. No caso de morte do ofendido ou quando este for declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (art. 24, §1º, do CPP). Conforme salienta o artigo 25 do Código de Processo Penal, uma vez apresentada a representação, esta é irretratável após o oferecimento da denúncia, nada obstando, portanto, a retratação antes desse momento. A representação é a autorização do ofendido, ou no caso de sua morte ou ausência declarada judicialmente, do cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Sem essa autorização não pode ter início a persecução penal. Nos casos em que somente se procede mediante ação penal pública condicionada,o Código Penal é expresso, sendo que em relação aos demais vige a regra da ação pública incondicionada. O prazo para representação, de natureza decadencial, é de 6 (seis) meses, contados a partir do conhecimento da autoria do crime. O direito de representação pode ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial. A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada do ofendido, de seu representante legal ou procurador, deve ser reduzida a termo, perante o juiz ou autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida (art. 39, §1º, do CPP). A representação deve conter todas as informações que possam servir à apuração do fato e da autoria criminosa. Tão logo seja oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial deve proceder ao inquérito, ou, se não for competente, deve remetê-la à autoridade que o seja. Quando feita ao juiz ou perante a este reduzida a termo, a representação deve ser remetida à autoridade policial para que este proceda ao inquérito. No entanto, admite-se que o Ministério Público dispense o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, caso em que a denúncia deve ser oferecida no prazo de 15 (quinze) dias, conforme determina o parágrafo quinto do Código de Processo Penal. http://www.iped.com.br/ 18 Estipula o parágrafo segundo do artigo 24 do Código de Processo Penal que, seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado, Distrito Federal e Município, a ação penal a ser adotada é a pública incondicionada. Conforme prevê o artigo 27 do Código de Processo Penal, qualquer pessoa do povo pode provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção. A partir daí, é dever o Ministério Público proceder ao necessário para apuração do fato noticiado. Quando o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, caso considere improcedentes as razões invocadas, deve remeter os autos do inquérito ou das peças de informação ao procurador-geral, que oferecerá a denúncia em substituição ao órgão que requereu o arquivamento, ou designará outro órgão do Ministério Público para que a ofereça, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender (art. 28, do CPP). Como se vê, o juiz não é obrigado a aceitar o pedido de arquivamento de um inquérito policial ou de peças informativas do Ministério Público. Se ele entender que há indícios suficientes de autoria e materialidade, ou que estes podem ser obtidos com novas diligências, ele deve remeter os autos ao procurador-geral, que pode adotar três condutas: a) oferecer a denúncia, imediatamente; b) designar outro órgão do Ministério Público para que a ofereça; ou c) insistir no pedido de arquivamento do inquérito ou das peças informativas. No último caso o juiz estará obrigado a atender o pedido de arquivamento, não podendo adotar outra conduta. O prazo para oferecimento da denúncia, conforme prevê o artigo 46 do Código de Processo Penal, estando o réu preso, é de 5 (cinco) dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 (quinze) dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial para novas diligências, contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos, conforme dispõe o caput do artigo 46 do Código de Processo Penal. Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação (art. 46, §1º, do CPP). Antes de oferecer a denúncia, se o Ministério Público julgar necessários maiores esclarecimentos e documentos complementares ou novos elementos de convicção, deve requisitá-los, diretamente, de quaisquer autoridades ou funcionários que devam ou possam fornecê-los (art. 47, do CPP). Se não forem respeitados os prazos supra mencionados para oferecimento da denúncia, o Código de Processo Penal faculta ao ofendido ou a seu representante legal, e no caso de morte, ao cônjuge, ascendente, http://www.iped.com.br/ 19 descendente ou irmão o oferecimento de queixa substitutiva da denúncia (ação penal privada subsidiária da pública), como será analisado no tópico seguinte, referente às ações penais privadas. 3.5 Ação penal privada Em algumas situações, o Estado autoriza que o particular ocupe o pólo ativo da ação penal, situações em que se pode dizer que o interesse do ofendido se sobrepõe ao próprio interesse público. Isso não quer dizer, naturalmente, que o Estado não exerça com exclusividade a atividade punitiva, pois em caso de condenação na ação penal privada, é apenas o Estado quem poderá aplicar a punição ao condenado. Conforme prevê o artigo 30 do Código de Processo Penal, ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo cabe intentar a ação penal privada. E o artigo 31 completa o raciocínio ao dispor que em caso de morte do ofendido ou quando este for declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Se comparecer mais de uma pessoa com direito de queixa, tem preferência o cônjuge, e, em seguida, o parente mais próximo na ordem de enumeração constante do art. 31 do Código de Processo Penal, podendo, entretanto, qualquer delas prosseguir na ação, caso o querelante desista da instância ou a abandone. Nos crimes de ação penal privada, o juiz, a requerimento da parte que comprovar sua pobreza, deve nomear advogado para promover a ação penal. Considera-se pobre a pessoa que não possa prover às despesas do processo, sem privar-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento ou da família (art. 32, §1º, do CPP). Como prova da pobreza basta o atestado da autoridade policial em cuja circunscrição residir o ofendido. Para a ação penal privada vige o princípio da disponibilidade, isto é, o ofendido tem a faculdade de oferecer a queixa, e não a obrigatoriedade, como ocorre com o Ministério Público em relação a ação penal pública incondicionada e em relação a ação penal pública condicionada quando o ofendido faz a representação. A consagração do mencionado princípio resulta: a) na possibilidade do ofendido renunciar ao direito de queixa; b) na possibilidade do ofendido perdoar o agente; c) na possibilidade de se verificar perempção; e d) na possibilidade de se verificar a perda do direito de intentar a ação penal privada, pela decadência. Em qualquer desses casos, opera-se a extinção da punibilidade do agente, todos melhor abordados no tópico seguinte. Outro aspecto importante acerca da ação penal privada é a indivisibilidade, ou seja, o ofendido não pode optar por oferecer a queixa em relação a apenas um ou alguns, dentre os autores do crime contra ele cometido. O artigo 48 do Código de Processo Penal prevê que a queixa http://www.iped.com.br/ 20 contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade. Nesse sentido, o artigo 49 do Código de Processo Penal dispõe que a renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estende. E mais, dispõe o artigo 51 do Código de Processo Penal que o perdão concedido a um dos querelados aproveita a todos, salvo emrelação àquele que o recusar. Quanto ao prazo, salvo disposição em contrário, o ofendido ou seu representante legal tem 6 (seis) meses, contados do dia em que se tomar ciência de quem é o autor do crime, para o oferecimento da queixa-crime, sob pena de decadência, com o que estará extinta a punibilidade do autor do crime. No caso da ação penal privada subsidiária da pública, esse prazo de 6 (seis) meses tem início no dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia, pelo Ministério Público. Por derradeiro, há que se mencionar que dentre as espécies da ação em estudo, a regra é a utilização da ação penal privada propriamente dita, que pode ser ajuizada pelo ofendido ou por seu representante legal, e no caso de morte, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. A ação penal privada personalíssima, atualmente, tem apenas uma hipótese de utilização, que é no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, do artigo 236 do Código Penal. Quanto ao assunto, veja-se a transcrição do referido tipo penal: Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. Parágrafo único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento. Por fim, a ação penal privada subsidiária da pública é passível de ser utilizada quando o Ministério Público não observar os prazos legais para oferecimento da denúncia, caso em que o ofendido pode oferecer a queixa- crime, substitutiva da denúncia. Nesse caso, a ação penal não perde seu caráter público, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal, conforme previsão legal do artigo 29 do Código de Processo Penal. Essa ação, é importante frisar, possui previsão constitucional, no artigo 5º, inciso LIX, que dispõe: “será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal”. 3.5.1 Causas extintivas da punibilidade nas ações penais privadas Como mencionado, a consagração do princípio da disponibilidade em sede das ações penais privadas resulta: http://www.iped.com.br/ 21 a) na possibilidade do ofendido renunciar ao direito de queixa; b) na possibilidade do ofendido perdoar o agente; c) na possibilidade de se verificar perempção; e d) na possibilidade de se verificar a perda do direito de intentar a ação penal privada, pela decadência. Em todos esses casos, há extinção da punibilidade do agente. Contudo, frise-se que essas hipóteses extintivas da punibilidade não alcançam a ação penal privada subsidiária da pública, pois como mencionado, essa ação não perde seu caráter público, logo, não se submete ao princípio da disponibilidade e às consequências dele resultantes. 3.5.1.1 Renúncia ao direito de queixa A renúncia ao direito de queixa pode ser tácita ou expressa. Será tácita quando o ofendido deixar transcorrer o prazo in albis para o oferecimento da queixa (decadência), assim como quando praticar ato incompatível com ela. E será expressa quando constar de declaração assinada pelo ofendido, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. Portanto, a renúncia é ato anterior ao oferecimento da queixa, e uma vez operada em relação a um dos autores do crime, a todos se estende. 3.5.1.2 Perdão do ofendido Enquanto a renúncia ao direito de queixa provoca a extinção da punibilidade do agente, antes do início da ação penal, o perdão do ofendido destina-se a extinguir a punibilidade daquele quando a ação já estiver em curso, desde que ainda não tenha transitado em julgado a decisão condenatória. O perdão do ofendido só produz efeitos em relação ao querelado que o aceitar, sem o que não há que se falar em extinção da punibilidade. O perdão concedido a um dos querelados aproveita a todos, exceto em relação ao que o recusar (art. 51, do CPP). Conforme prevê o artigo 55 do Código de Processo Penal, o perdão só pode ser aceito por procurador quando a este tiverem sido conferido poderes especiais. Tanto nos casos de renúncia tácita quando nos de perdão tácito, admitem-se todos os meios de prova (art. 57, do CPP). Concedido o perdão, mediante declaração expressa nos autos, o querelado deve ser intimado a dizer, dentro de 3 (três) dias, se o aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cientificado de que o seu silêncio importará aceitação (art. 58, caput, do CPP). Aceito o perdão, está extinta a punibilidade. Por derradeiro, conforme dispõe o artigo 59 do Código de Processo Penal, a aceitação do perdão fora do processo deve constar, obrigatoriamente, de declaração assinada pelo querelado, por seu representante legal ou procurador com poderes especiais. http://www.iped.com.br/ 22 3.5.1.3 Perempção Nos casos em que se procede somente mediante queixa-crime, considera-se perempta a ação penal: a) quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 (trinta) dias seguidos; b) quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36 do Código de Processo Penal; c) quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; d) quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. Caso a ação penal privada seja personalíssima e ocorra a morte do querelante, ela será extinta pela perempção e o querelado terá extinta sua punibilidade. No caso de ação penal privada subsidiária da pública, a inércia do querelante nada mais causa que a retomada da titularidade da ação penal pelo Ministério Público. 3.5.1.4 Decadência A decadência é a perda do direito de oferecimento da queixa-crime, em razão da inércia do ofendido. Via de regra, o prazo para oferecimento da queixa é de 6 (seis) meses, contados: a) da data em que o ofendido tomou ciência sobre quem seja o autor do crime; ou b) da data em que venceu o prazo legal para o Ministério Público oferecer denúncia em relação a um crime de ação penal pública. Nesse último caso, no entanto, o que ocorre é apenas a perda do direito do ofendido oferecer queixa substitutiva da denúncia, mas não o direito do Ministério Público oferecer denúncia. Tão menos há que se falar, quanto a esta hipótese, de extinção da punibilidade, uma vez que essa só ocorre (pela inércia do ofendido) em relação a crimes que sejam exclusivos de ação penal privada, e não em relação a crimes de ação penal pública. 3.6 Denúncia e queixa-crime A denúncia, se recebida, é a peça processual que instaura a ação penal pública, ao passo que a queixa-crime, se recebida, é a peça processual que instaura a ação penal privada. http://www.iped.com.br/ 23 Conforme previsão legal do artigo 41 do Código de Processo Penal, são requisitos da denúncia, assim como da queixa-crime: a) a descrição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias; b) a qualificação do acusado ou o fornecimento de elementos que permitam identificá-lo; c) a classificação do crime; e d) se necessário, o rol de testemunhas. Ausente qualquer desses requisitos, considera-se inepta a denúncia ou queixa (art. 395, I, do CPP). No caso da queixa-crime, alguns requisitos devem ser acrescidos, conforme determinação do artigo 44 do Códigode Processo Penal, que exige poderes especiais do procurador que oferecer a queixa-crime, devendo constar do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal. Admite-se que a queixa, ainda quando a ação penal for privativa do ofendido, seja aditada pelo Ministério Público, salvo para imputar ao querelado novos crimes ou para nela incluir novos ofensores (art. 45, do CPP). As hipótese de rejeição da denúncia ou queixa, antes descritas no artigo 43 do Código de Processo Penal, passaram a ser descritas no artigo 395 do mesmo Códex, após a reforma processual operada pela Lei n.º 11.719/08. Dessa forma, a denúncia ou queixa deve ser rejeitada quando: a) for manifestamente inepta; b) faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou c) faltar justa causa para o exercício da ação penal. 4. Ação Civil ex Delicto A ação civil ex delicto é aquela destina a ressarcir o ofendido ou seus familiares pelos prejuízos materiais ou imateriais que sofreram em razão da prática de um crime. Proferida sentença penal condenatória, possuem legitimidade para requerer a reparação de danos: o ofendido, seu representante legal, ou seus herdeiros. A sentença em questão é título executivo judicial, e a execução segue rito processual próprio, autônomo, perante o juízo cível. A ação civil ex delicto, portanto, é a ação executiva destinada a entregar ao ofendido ou familiares os valores ressarcitórios devidos em razão da prática criminosa. A ação civil ex delicto pode ser ajuizada contra o autor do crime, e, se for o caso, contra o responsável civil (art. 64, do CPP). Ao proferir sentença penal condenatória, o juiz deve fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando http://www.iped.com.br/ 24 os prejuízos sofridos pelo ofendido, sem prejuízo da liquidação para apuração do dano efetivamente sofrido. A sentença penal que reconhece ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito faz coisa julgada também na órbita civil (art. 65, do CPP). Inobstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser ajuizada quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência do fato, conforme orienta o artigo 66 do Código de Processo Penal. Por fim, há que se mencionar que não impedem, igualmente a propositura da ação civil: a) o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação; b) a decisão que julgar extinta a punibilidade; e c) a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime. 5. Jurisdição O Estado é o legítimo detentor da atividade jurisdicional. É dele a função de solucionar os conflitos após ser provocado pelas partes nele envolvidas. A jurisdição penal é exercida pelos juízes e tribunais, que atuam em nome do Estado nessa atividade. A divisão desses juízes e tribunais, de modo que a cada um seja dada uma parcela de atribuições em relação à atividade jurisdicional, ocorre mediante a delimitação das regras de competência, regras estas objeto de estudo no próximo capítulo. A jurisdição rege-se por princípios, quais sejam: a) investidura; b) indelegabilidade; c) inevitabilidade; d) inafastabilidade; e) juiz natural; f) inércia; e g) correlação. O princípio da investidura fixa a regra de que só pode exercer uma parcela de jurisdição aquele que estiver regularmente investido no cargo de juiz. Por meio do princípio da indelegabilidade, veda-se que qualquer órgão do Poder Judiciário delegue suas atribuições. No entanto, há que se fazer ressalva quanto às cartas precatórias, rogatórias e cartas de ordem. O princípio da inevitabilidade dá às partes a condição de pura sujeição perante o Estado-juiz, já que elas não podem evitar, nem recusar a http://www.iped.com.br/ 25 atividade jurisdicional por ele exercida. Ressalva seja feita em relação aos casos de impedimento, suspeição e incompetência. Está constitucionalmente garantido que a lei não pode excluir da apreciação do poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV), consagrando, pois o princípio da inafastabilidade. Por ele, o juiz está obrigado a prestar a tutela jurisdicional ainda que haja lacuna na lei. O princípio do juiz natural garante a inexistência de juízos ou tribunais de exceção, isto é, juízos ou tribunais criados após a ocorrência de determinada infração criminal com o propósito exclusivo de julgá-la, conforme prevê o artigo 5º, inciso XXXVII da Constituição Federal de 1988. E esse princípio se forma completamente com a aglutinação da regra contida no artigo 5º, inciso LIII, também da Constituição Federal, que consagra que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. O princípio da inércia garante que só haverá instauração de ações penais mediante provocação de quem seja legitimado. Dessa forma, veda-se a instauração de ações ex officio. Esse princípio, frise-se, aplica-se a fase inicial do processo penal, isto é, em relação a instauração do mesmo, mas não na dilação probatória, quando o juiz pode e deve atuar de ofício, pretendendo o maior número de provas que lhe permitam encontrar a verdade real. Por derradeiro, o princípio da correlação impede o julgamento fora dos limites pré-determinados na peça acusatória. Com o pedido apresentado pelo Ministério Público ou pelo querelante, o juiz fica a ele restrito, não podendo proferir sentença ultra, extra ou infra petita. 6. Competência Determina a competência jurisdicional, conforme estipulação do artigo 69 do Código de Processo Penal: a) o lugar da infração: b) o domicílio ou residência do réu; c) a natureza da infração; d) a distribuição; e) a conexão ou continência; f) a prevenção; g) a prerrogativa de função. 6.1 Competência pelo lugar da infração Via de regra, a competência para a ação penal é determinada pelo lugar em que se consuma a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que foi praticado o último ato de execução (art. 70, caput, do CPP). Se a execução do crime tiver início no Brasil e se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no http://www.iped.com.br/ 26 Brasil, o último ato de execução, conforme determina o parágrafo primeiro, do artigo 70 do Código de Processo Penal. Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado (art. 70, §2º, do CPP). Se incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção (art. 70, §3º, do CPP). Por fim. tratando-se de infração continuada ou permanente, praticada em território de duas ou mais jurisdições, a competência também firmar-se-á pela prevenção (art. 71 do CPP). 6.2 Competência pelo domicílio ou residência do réu Se não for conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu, conforme determina o caput do artigo 72 do Código Penal. Caso o réu tenha mais de uma residência, a competência firmar-se-á pela prevenção. Mas se o réu não tiver residência certa ou for ignorado o seu paradeiro, será competente o juiz que primeiro tomar conhecimento do fato (art. 72, §2º, do CPP). Nos casos de exclusiva ação privada, o querelante pode preferir o foro do domicílio ou da residência do réu, ainda que conhecido o lugar da infração, conforme orienta a hipótese excepcional do artigo 73 do Código deProcesso Penal. 6.3 Competência pela natureza da infração A competência para a ação penal também pode ser firmada pela natureza da infração. Nesses casos, a competência será firmada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri. Conforme orienta o artigo 74, parágrafo primeiro do Código de Processo Penal, é competente o Tribunal do Júri para o julgamento dos seguintes crimes (todos dolosos, contra a vida): a) homicídio simples, privilegiado ou qualificado (art. 121, §§1º e 2º, do CP); b) induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (art. 122, parágrafo único, do CP); c) infanticídio (art. 123, do CP); d) aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art. 124, do CP); e) aborto provocado por terceiro (arts. 125, 126 e 127 do CP). Em qualquer caso, serão julgados perante o Tribunal do Júri os crimes supra mencionados, sejam eles consumados ou tentados. http://www.iped.com.br/ 27 Se, iniciado o processo perante um juiz, houver desclassificação para infração da competência de outro, a este deve ser remetido o processo, salvo se mais graduada for a jurisdição do primeiro, que, em tal caso, terá sua competência prorrogada (art. 74, §2º, do CPP). Se o juiz da pronúncia, que é o juiz da primeira fase do procedimento do júri, desclassificar a infração para outra atribuída à competência de juiz singular, a ele deve remeter os autos, observando o artigo 419 do Código de Processo Civil; mas se a desclassificação for feita pelo próprio Tribunal do Júri, a seu presidente caberá proferir sentença (art. 492, §1º, do CPP). 6.4 Competência por distribuição A competência para ação penal também pode ser fixada pela distribuição. A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente (art. 75, caput, do CPP). A distribuição realizada para o efeito da concessão de fiança ou da decretação de prisão preventiva ou de qualquer diligência anterior à denúncia ou queixa prevenirá a da ação penal, conforme disposição do parágrafo único do artigo 75 do Código de Processo Penal. 6.5 Competência por conexão ou continência A competência é determinada pela conexão: a) se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras; b) se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas; c) quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração. Conforme a lição de Fernando Capez, “conexão é o vínculo, o liame, o nexo que se estabelece entre dois ou mais fatos, que os torna entrelaçados por algum motivo, sugerindo a sua reunião no mesmo processo, a fim de que sejam julgados pelo mesmo juiz, diante do mesmo compêndio probatório e com isso se evitem decisões contraditórias”. Por sua vez, a competência é determinada pela continência quando: a) duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração; b) no caso de infração cometida nas condições previstas nos arts. 70, primeira parte, do Código Penal (concurso formal), 73, parte final, do Código Penal (aberratio ictus) e 74, parte final, também do Código Penal (aberratio criminis). http://www.iped.com.br/ 28 A continência, quando verificada, não possibilita que haja mais de um processo, pois a causa de um está contida noutro. Isso ocorre quando duas ou mais pessoas são acusadas pela mesma prática criminosa, ou quando se está diante de hipóteses de concurso formal de crimes, aberratio ictus ou aberratio criminis. Para a determinação da competência por conexão ou continência, devem ser observadas as seguintes regras: I - no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri; Il - no concurso de jurisdições da mesma categoria: a) preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena mais grave; b) prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número de infrações, se as respectivas penas forem de igual gravidade; c) firmar-se-á a competência pela prevenção, nos outros casos; III - no concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação; IV - no concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta. Conforme disposição do artigo 79 do Código de Processo Civil, tanto a conexão como a continência importam em unidade de processo e julgamento, exceto: a) no concurso entre a jurisdição comum e a militar; b) no concurso entre a jurisdição comum e a da infância e juventude. Nesse caso, há regras próprias no Estatuto da Criança e do Adolescente, em relação aos atos infracionais praticados por adolescentes. Se sobrevir doença mental a algum co-réu, o processo deve permanecer suspenso em relação a ele, e deve prosseguir quanto aos demais, cessando, obrigatoriamente, a unidade do processo, seja ela decorrente de conexão ou continência. A unidade do processo não importa na unidade de julgamento, quando houver co-réu foragido que não possa ser julgado à revelia, bem como na hipótese do artigo 469 do Código de Processo Civil, que trata da recusa de jurados para a composição do Tribunal do Júri, quando forem dois ou mais os acusados. Nesses casos, também é obrigatória a separação dos processos. Em contrapartida, é facultativa a separação dos processos: a) quando as infrações tiverem sido cometidas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes; b) quando houver excessivo número de acusados; c) para não prolongar a prisão provisória de nenhum dos réus; ou d) por outro motivo relevante. http://www.iped.com.br/ 29 Reconhecida inicialmente ao Tribunal do Júri a competência por conexão ou continência, o juiz, se vier a desclassificar a infração, impronunciar ou absolver o acusado, de maneira que exclua essa competência, deverá remeter o processo ao juízo competente (art. 81, parágrafo único, do CPP). Se, inobstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deve avocar os processos que corram perante os outros juízes, exceto se já estiverem com sentença definitiva, caso em que a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas (art. 82 do CPP). 6.6 Competência por prevenção A determinação da competência pela prevenção ocorre toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido ao outro na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa. 6.7 Competência pela prerrogativa de função A competência pela prerrogativa de função é do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, relativamente às pessoas que devam responder perante eles por crimes comuns e de responsabilidade. É importante frisar que a competência por prerrogativa de função não prevale sobre a competência do Tribunal do Júri quando a primeira tiver sido fixada, com exclusividade, por Constituição Estadual, entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal (súmula n.º 721). Ao Supremo Tribunal Federal compete processar e julgar, originariamente: a) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice- Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; e b) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estadoe os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, da CRFB/88, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente. Ao Superior Tribunal de Justiça compete processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal; e http://www.iped.com.br/ 30 b) nos crimes comuns e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais. Os Tribunais Regionais Federais, por sua vez, tem competência para processar e julgar, originariamente: a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. Por derradeiro, compete aos Tribunais de Justiça dos Estados processar e julgar: a) os Prefeitos Municipais, os Juízes de Direito, os Juízes Auditores da Justiça Militar e os membros do Ministério Público. É importante, frise-se, não esquecer que o Senado Federal também possui competência para processar e julgar: a) o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles; e b) os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade. Nos processos por crime contra a honra, em que forem querelantes as pessoas que a Constituição Federal sujeita à jurisdição do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça, àquele ou a estes caberá o julgamento, quando oposta e admitida a exceção da verdade, conforme redação legal do artigo 85 do Código de Processo Penal, redação que trata de questão prejudicial ao julgamento de mérito. Por derradeiro, o artigo 86 do Código de Processo Penal dispõe que compete, privativamente, ao Supremo Tribunal Federal, processar e julgar: a) os seus ministros, nos crimes comuns; b) os ministros de Estado, salvo nos crimes conexos com os do Presidente da República; c) o procurador-geral da República, os desembargadores dos Tribunais de Apelação, os ministros do Tribunal de Contas e os embaixadores e ministros diplomáticos, nos crimes comuns e de responsabilidade. http://www.iped.com.br/ 31 6.8 Modificação da competência Fala-se em modificação da competência para a ação penal sob as seguintes modalidades: a) prorrogação; b) delegação; e c) desaforamento. A prorrogação da competência ocorre quando há substituição de um juízo por outro. Assim como ocorre no processo civil, se a ação penal for ajuizada em foro relativamente incompetente e não for oposta exceção de incompetência no prazo previsto, o foro que era incompetente torna-se competente por prorrogação. Também há prorrogação nos casos de conexão e continência. A delegação, em verdade, é de atribuições relativas a ação penal e não da competência. Diz-se que há delegação interna quando um juiz pratica, no lugar de outro, atos relativos à ação penal, como o faz o juiz substituto durante as férias do juiz titular. E diz-se que há delegação externa quando há solicitação da prática de atos relativos à ação penal a outro juízo, como ocorre nas cartas precatórias e rogatórias. O desaforamento ocorre nos crimes de competência do Tribunal do Júri, quando se altera a comarca de julgamento. O desaforamento ocorrerá: a) quando houver interesse de ordem pública; b) quando houver dúvida sobre a imparcialidade do júri; c) quando necessário à segurança do acusado; ou d) quando houver excesso de serviço, situação em que deve ser ouvido o juiz presidente e a parte contrária, desde que o julgamento não possa ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da pronúncia. O pedido para realização do julgamento em outra comarca pode ser feito mediante requerimento, pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo querelante ou mediante representação, pelo próprio juiz. O pedido de desaforamento deve ser dirigido ao Tribunal de Justiça. Enquanto a competência territorial (ratione loci) pode sofrer modificação, a competência em razão da matéria (ratione materiae), assim como a competência por prerrogativa de função (ratione personae) não o podem, já que as últimas traduzem causas de ordem pública. 7. Questões e Processos Incidentes As questões e os processos incidentes traduzem a previsão legal de situações excepcionais que podem surgir durante o trâmite da ação penal e que lhe prejudicam a análise meritória. Fernando Capez escreve que, “em sentido jurídico, as questões e os processos incidentes são soluções dadas pela lei processual para as variadas eventualidades que podem ocorrer no http://www.iped.com.br/ 32 processo e que devem ser resolvidas pelo juiz antes da solução da causa principal” (2010, p. 454). 7.1 Questões prejudiciais Se a decisão sobre a existência da infração depender da solução de controvérsia, que o juiz repute série e fundada sobre o estado civil das pessoas, o curso da ação penal deve permanecer suspenso até que no juízo cível seja a controvérsia dirimida por sentença passada em julgado, sem prejuízo, no entanto, da inquirição das testemunhas e de outras provas de natureza urgente (art. 92 do CPP). Se o reconhecimento da existência da infração penal depender de decisão sobre questão diversa da supra mencionada, da competência do juízo cível, e se neste houver sido proposta ação para resolvê-la, ao juiz criminal é conferida a faculdade, desde que essa questão seja de difícil solução e não verse sobre direito cuja prova a lei civil limite, suspender o curso do processo, após a inquirição das testemunhas e realização das outras provas de natureza urgente (art. 93, caput, do CPP). Nesse caso, o juiz deve marcar o prazo da suspensão, que pode ser razoavelmente prorrogado, desde que a demora não seja imputável à parte. Expirado o prazo sem que o juiz cível tenha proferido decisão, o juiz criminal deve fazer prosseguir o processo, retomando sua competência para resolver, de fato e de direito, toda a matéria da acusação ou da defesa (art. 93, §1º, do CPP). Conforme disposição do parágrafo segundo do artigo 93 do Código de Processo Penal, é irrecorrível o despacho que denega a suspensão do processo. Suspenso o processo, e tratando-se de crime de ação pública, incumbe ao Ministério Público intervir imediatamente na causa cível, para o fim de promover-lhe o rápido andamento (art. 93, §3º, do CPP). A suspensão do curso da ação penal, nas hipóteses supra mencionadas, deve ser decretada pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes (art. 94 do CPP). 7.2 Exceções Segundo o artigo 95 do Código de Processo Penal, podem ser opostas exceções de: a) suspeição; b) incompetência de juízo; c) litispendência; d) ilegitimidade de parte; e) coisa julgada http://www.iped.com.br/ 33 7.2.1 Suspeição A arguição de suspeição precede a qualquer outra, salvo quando fundada em motivo superveniente (art. 96 do CPP). Quando o juiz afirmar espontaneamente a suspeição, deve fazê-lo por escrito, oportunidade em que deve declarar o motivo legal e remeter imediatamente o processo ao seu substituto, intimando as partes (art. 97, do CPP). Sempreque uma das partes pretender recusar o juiz, deve fazê-lo em petição assinada por ela própria ou por procurador com poderes especiais, aduzindo as suas razões acompanhadas de prova documental ou do rol de testemunhas. Nesse caso, se o juiz reconhecer a suspeição, deve sustar a marcha processual, mandando juntar aos autos a petição do recusante com os documentos que a instruam, e por despacho deve declarar-se suspeito, ordenando a remessa dos autos ao substituto. Em contrapartida, se não aceitar a suspeição, o juiz deve mandar autuar em apartado a petição, dando resposta em 3 (três) dias, podendo instruí-la e oferecer testemunhas, para, em seguida determinar a remessa dos autos, em 24 (vinte e quatro) horas, ao juiz ou tribunal a quem competir o julgamento, conforme dispõe o caput do artigo 100 do Código de Processo Penal. Uma vez reconhecida, preliminarmente, a relevância da arguição, o juiz ou o tribunal, com citação das partes, deve marcar dia e hora para a inquirição das testemunhas, seguindo-se o julgamento, independentemente de mais alegações (art. 100, §1º, do CPP). Em contrapartida, se a suspeição for de manifesta improcedência, o juiz ou relator deve rejeitá-la liminarmente (art. 100, §2º, do CPP). Se a exceção de suspeição for julgada procedente, ficarão nulos os atos do processo principal, sendo o pagamento das custas de incumbência do juiz, no caso de erro inescusável. Mas, se a exceção for rejeitada, evidenciando-se a malícia do excipiente, a este será imposta multa. Na hipótese da parte contrária reconhecer a procedência da arguição, a seu requerimento, o processo principal pode ser suspenso até que se julgue o incidente da suspeição (art. 102, do CPP). Se arguida a suspeição do órgão do Ministério Público, o juiz, depois de ouvi-lo, decidirá, sem recurso, podendo antes admitir a produção de provas no prazo de 3 (três) dias (art. 104, do CPP). As parte também podem arguir como suspeitos os peritos, os intérpretes e os serventuários ou funcionários de justiça, decidindo o juiz de plano, em decisão irrecorrível, à vista da matéria alegada e prova imediata (art. 105, do CPP). Em se tratando da suspeição de jurados, ela deverá ser arguida oralmente, decidindo de plano o presidente do Tribunal do Júri, que a rejeitará se, negada pelo recusado, não for imediatamente comprovada, o que tudo deve constar da ata (art. 106, do CPP). Em relação as autoridades policiais, quanto aos atos do inquérito, não poderá ser oposta suspeição, mas elas tem o dever de declarar-se suspeitas, sempre que ocorrer algum motivo legal (art. 107, do CPP). http://www.iped.com.br/ 34 7.2.2 Incompetência A exceção de incompetência do juízo pode ser oposta de forma verbal ou escrita, mas apenas no prazo para defesa, sob pena de preclusão e prorrogação do foro relativamente incompetente. Se, ouvido o Ministério Público, for aceita a exceção declinatória de competência, o feito deve ser remetido ao juízo competente, onde, ratificados os atos anteriores, o processo terá seu normal prosseguimento (art. 108, §1º, do CPP). Em contrapartida, se a exceção de incompetência for recusada, o juiz continuará no feito, fazendo tomar por termo a declinatória, se ela tiver sido formulada de forma verbal. Conforme disposição do artigo 109 do Código de Processo Penal, se em qualquer fase do processo o juiz reconhecer motivo que o torne incompetente, deve declará-lo nos autos, haja ou não alegação da parte nesse sentido. 7.2.3 Litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada Consabido, litispendência é o ajuizamento de ação que apresenta as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo objeto, em relação a outra ação que já está em curso perante o mesmo ou em juízo diverso. A litispendência, consabido, é um pressuposto processual negativo, isto é, se verificado dá causa à extinção do processo posterior sem julgamento de mérito. A coisa julgada, de maneira semelhante, também é um pressuposto processual negativo que, uma vez identificado, dá causa à extinção do processo sem julgamento de mérito. A coisa julgada é o ajuizamento de ação, com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo objeto, em relação a um processo já definitivamente julgado. Conforme orienta o parágrafo segundo do artigo 110, do Código de Processo Penal, a exceção de coisa julgada somente poderá ser oposta em relação ao fato principal, que tiver sido objeto da sentença. Já a ilegitimidade de parte, é uma condição da ação, sem a qual haverá extinção do processo sem julgamento de mérito. Há ilegitimidade de parte, por exemplo, quando o Ministério Público ajuíza ação penal em face de pessoa errada, não relacionada à prática criminosa objeto do processo penal. Nas exceções de litispendência, ilegitimidade de parte e coisa julgada, observa-se, no que pertinente for, o disposto sobre a exceção de incompetência do juízo (art. 110, do CPP). Sempre que a parte tenha de ajuizar mais de uma exceção, ela deve fazê-lo em apenas uma petição ou articulado, conforme determina o parágrafo primeiro do artigo 110 do Código de Processo Penal. Em todos os casos, as exceções devem ser processadas em autos apartados e, via de regra, não suspendem o andamento da ação penal. http://www.iped.com.br/ 35 7.2.4 Incompatibilidades e impedimentos O juiz, o órgão do Ministério Público, os serventuários ou funcionários de justiça e os peritos ou intérpretes tem o dever de abster-se de servir no processo, sempre que houver incompatibilidade ou impedimento legal, que deve ser declarado nos autos. Se a abstenção não ocorrer, a incompatibilidade ou impedimento poderá ser arguido pelas partes, seguindo-se o mesmo procedimento estabelecido para a exceção de suspeição. 7.3 Conflito de jurisdição Além da exceção, as questões atinentes à competência podem ser resolvidas pelo conflito positivo ou negativo de juridição (art. 113, do CPP). O conflito de jurisdição é positivo quando duas ou mais autoridades judiciárias se considerarem competentes para conhecer do mesmo fato criminoso. E será negativo o conflito de jurisdição quando duas ou mais autoridades judiciárias se considerarem incompetentes para conhecer do mesmo fato criminoso. Conforme disposição do artigo 115 do Código de Processo Penal, o conflito pode ser suscitado: a) pela parte interessada; b) pelos órgãos do Ministério Público junto a qualquer dos juízos em dissídio; c) por qualquer dos juízes ou tribunais em causa. Os juízes e tribunais, sob a forma de representação, e a parte interessada, mediante requerimento, devem dar forma escrita e circunstanciada do conflito, perante o tribunal competente, expondo os fundamentos e juntando os documentos comprobatórios. Se o conflito for negativo, os juízes e tribunais podem suscitá-los nos próprios autos do processo. No entanto, distribuído o feito, se o conflito for positivo, o relator poderá determinar imediatamente que se suspenda o andamento do processo. Expedida ou não a ordem de suspensão, o relator deve requisitar informações às autoridades em conflito, remetendo-lhes cópias do requerimento ou representação. Essas informações devem ser prestadas no prazo que o relator assinalar. Recebidas as informações, e depois de ouvido o procurador-geral, o conflito será decidido na primeira sessão, salvo se a instrução do feito depender da realização de alguma diligência. Proferida a decisão, as cópias necessárias devem ser remetidas, para a sua execução, às autoridades contra as quais tiver sido levantado o conflito ou que o houverem suscitado. http://www.iped.com.br/ 36 7.4 Restituição das coisas apreendidas Orienta o artigo 118 do Código de Processo Penal, que antes de transitar em julgado a sentença final, as coisas apreendidas não poderão ser restituídas enquanto interessarem ao processo. Alguns objetos, no entanto, mesmo depois do
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