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RESENHA CRÍTICA DA APRESENTAÇÃO E DA PRIMEIRA PARTE DO LIVRO: A DEFESA TEM A PALAVRA DE EVANDRO LINS E SILVA 1 Lucenir Francisco Gonçalves Terra Sérgio Taquini2 SÍNTESE DA APRESENTAÇÃO EVANDRO LINS E SILVA: O SENTIDO PÚBLICO DA ADVOCACIA A obra de Evandro Lins e Silva, em sua apresentação, empresta à vez ao professor Fábio Konder Comparato, Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e Doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra. Fábio Konder, discursa sobre como a advocacia exige mais do que a técnica profissional para o seu exercício, pois o objeto é o próprio homem. Em uma dimensão mais larga, a defesa dos direitos humanos é o fim, do ponto de vista da finalidade, da atividade do advogado. A técnica profissional do advogado, deve caminhar ao lado da defesa enérgica e destemida dos direitos humanos. Elemento fundamental da técnica da advocacia é a sua capacidade de convencimento pelo argumento de forma que seus ouvintes aceitem suas palavras e afirmações, sintam suas emoções como se suas fossem, esse é o poder da Oratória. A citação da obra literária romana “Oratore (II, 114 e ss.)” de Cícero traz a emergência de três funções do advogado diante de sua participação no processo, “probare, conciliare, movere”. O advogado deve “probare”, convencendo seus interlocutores por meio de argumentos e sentenças que pareçam simples aos ouvidos dos juízes leigos, traduzindo as questões controvertidas na causa. A “conciliare” é outra característica 1 Resenha Crítica apresentado à Disciplina de Direito Processual penal II - Professor Lucas Melo Borges de Souza - Para obtenção da nota N1B2 - 2022/1 - Faculdade Espírito Santense de Ciências Jurídicas - Faculdade PIO XII - Curso de Direito. 2 Acadêmicos de Direito – Turma D7AN. 2 do advogado que se destaca, pois nesta os julgadores precisam encontrar a segurança nas palavras do defensor daquele que está sendo acusado de cometer um crime, então a autoridade é um elemento fundamental para trazer essa credibilidade. E por fim, a “movere”, de comover, suscitar emoções que sejam úteis na busca pela benevolência dos juízes. Nesta última qualidade, é necessário, portanto, que haja equilíbrio entre a racionalidade e o emocional, e o necessário controle do ambiente teatral da audiência de instrução e julgamento. Evandro Lins e Silva, conforme afirma o prof. Fábio Konder, “jamais precisou utilizar, nas causas que assumiu, sentimentos de empréstimo, ou afetações de ator teatral, como fazem os advogados medíocres”. Fábio Konder, buscando um entendimento à cerca dos valores do bom advogado, afirma que a habilidade oratória no plenário precisa encontrar um meio entre a lógica formal de Aristóteles e o “esprit de finesse” de Pascal. Caminhando ao encerramento da apresentação, Fábio Konder, faz sua escolha pela principal qualidade do estilo forense, a clareza e precisão das ideias. Em seguida, em um levantamento histórico, lembra que a advocacia moderna nasce de momentos de ruptura, tal como foi a Revolução Francesa (1789) e a contradição dos direitos positivados e dos direitos naturais, de um lado o documento que fundamentou os direitos humanos da era moderna, Carta de Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, e de outro o terror revolucionário, reconhecido pelos “direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem”. SÍNTESE DA PRIMEIRA PARTE TEM A PALAVRA A DEFESA Esta parte do livro busca trazer ao leitor o ambiente teatral do salão do júri, onde a ansiedade dos presentes, e principalmente, do advogado que defenderá o réu, permeia o espaço, envolto de uma infinidade de sentimentos, tais como indignação, benevolência, expectativa. 3 O autor traz a importância da preparação do advogado para o grande momento de sua profissão, atuar para garantir o direito de alguém, que não é qualquer um mas, uma pessoa dotada de direitos. Evandro Lins e Silva traz o exemplo de do mestre Evaristo de Moraes que registrava no papel tudo o que a acusação dizia. Traz também outra grande advogado, Enrico Ferri que também aconselhava a mesma técnica de anotar tudo o que se passa na audiência. Assim, todas as teses são registradas e oportunamente atacadas, uma por uma. Pode haver variações de estilos na eloquência judiciária, mas esta deve ser precisa, com argumentos racionais, fortes e que dispertem sentimentos humanitários. Independente do estilo o argumento precisa ser exposto, se de maneira brilhante e encantadora, melhor. E precisa ser útil, pois ao final, o que se espera e será lembrado é o veredito. IMPROVISAÇÃO, RESULTADO DE CONHECIMENTOS ACUMULADOS Neste tópico a abordagem se desenvolve em torno da capacidade de improvisar do advogado, valorando a experiência, a amplitude cultural e, não menos importante, o talento natural e outras habilidades intrínseca ao operador do direito, tais como a capacidade de observação, aqui não há milagre ou mágica! PREPARAÇÃO DO PROCESSO, BINÔMIO ACUSADO-VÍTIMA, PREPARAÇÃO TÉCNICA A tarefa do advogado é árdua, fruto de lutas, seja para permitir que o réu responda em liberdade e que consiga, na audiência, sua absolvição. O ambiente, às vezes hostil, envolto em tensão pelo resultado, pelo cumprimento dos prazos e pelos enfrentamentos aos atores no Tribunal do Júri. É preciso lembra a todos que o que se está ali julgando é o homem, muito mais do que o crime. A história e a personalidade do réu devem ser trazidas ao conhecimento de todos. Nas palavras de Henri Robert é preciso apresentar aos incautos que a função do advogado não é defender o crime mas a pessoa humana que ali está sob o julgamento de todos. É preciso entender que não se trata de um problema puramente lógico, mas complexo em sua essência. É preciso analisar que os problemas humanos não são resolvidos 4 com remédios, estes são para curar as doenças. Estamos falando de alma humana, e o cárcere não é o remédio. O advogado, em sua preparação para os enfrentamentos nas audiências em defesa do réu, precisa dispor de conhecimentos que vão além do Direito, enriquecendo com os conhecimentos de outras área e ramos do saber, tais como a História, a Literatura, as Ciências Exatas e da Natureza e, fundamentalmente, as Ciências Humanas. O autor traz exemplos que demonstram a importância de outros conhecimentos do advogado, tal como nos casos “Tempo de coagulação do sangue: argumento decisivo” e “Casos de balística” e “Desabamento: acusação de erro de cálculo” Há também os casos de infanticídio apresentados, inaugurando a atuação em um deles, do advogado Carlos Lacerda (conhecido político, advogado e jornalista brasileiro dos anos 50 e 60 pela sua atuação anti Getúlio Vargas. Há também a relação de como um poema de Bertold Brecha representou uma referência para análise de uma defesa em um processo criminal de infanticídio, o poema “A infanticida Maria Farrar”. CAUSA BOA, CAUSA MÁ Neste tópico é narrada a importância de discernir quando o interesse privado conflita com o interesse público, fazendo com que o advogado atue em defesa, sempre, do interesse geral em detrimento do interesse particular. A citação à Zanardelli, permite encontrar uma referência ao que o advogado não pode se tornar parte de uma farsa, “O advogado que, conscientemente, sustenta uma iniquidade, torna-se cúmplice dela; e cúmplice moralmente ainda mais culpado, porque não tem, como o seu cliente, a atenuante das paixões que o dominam, e tem, pelo contrário, pela sua cultura e pelas obrigações de seu ministério, maiores freios para retê-lo”. Não deve o advogado ser tomado por suas convicções pessoais, correndo o risco de ferir seu Código de Ética determina que. PROBIDADE PESSOAL: MÍSTICOS E MÁGICOS Quanto a probidades pessoal, tema dessa parte do livro, traz umaimportante reflexão, pois a advocacia, como se fala nos meios da atuação do advocado, é um sacerdócio, e portanto, não se desliga da atividades profissional nem um instante. A advocacia é 5 para toda a vida e assim, como na sua vida pessoa, deve se construir uma imagem que denote autoridade, respeito e virtudes, por isso, é preciso que não se permita levar-se pelas palavras iníquas do seu cliente e compactuar-se delas. É comum sermos agrupados pela sociedade em dois tipos, conforme opinião pública ou senso comum, os advogados que se enquadram nas categorias: “O defensor da viúva e do órfão”, ou “O espertalhão, amando a chicana e as velhacarias”, de que falava Henri Robert. Se de uma lado são conhecidos como defensor dos oprimidos contra os fortes, ilustrativamente, uma épica batalha de Davi e Golias, ou do mágico, sempre disposto a “vencer” as causas, coadunando com empreitas de interesses escusos. No entanto, ressalta-se que esses, são casos atípicos. MEMORIAL PARA JURADOS O memorial, quer seja, a descrição dos argumentos que a defesa irá utilizar-se é legítimo e recomendável sua entrega aos jurados, assim, desta forma, tomam ciência dos pontos a serem esclarecidos ou defendidos pela defesa do réu, sendo claro com àqueles que decidirão o futuro de uma pessoa. O memorial é uma forma de deixar os juízes leigos, que são os jurados, cientes do processo, sob o olhar da defesa, ou seja, a quem eles irão decidir sobre o bem jurídico da liberdade. Há casos em que a família da vítima também recebe uma via do memorial. Quanto aos jurados, ao receberem o memorial, é oportuna a observação de como reagem ao receber, se com indiferença, naturalidade ou manifestando posição em relação ao réu e ao crime imputado O que se sabe é que paradigmas sobre as características dos jurados podem surpreender até o mais experiente dos advogados, pois, de forma exemplificativa, a profissão não constitui índice seguro para saber se a pessoa é benevolente ou inflexível nas suas decisões, indulgentes ou severos. Assim como a idade e o sexo não são taxativos quanto a personalidade do jurado. CENSORES DO JÚRI: REFRÃO ANTIGO De certo é afirmar que o júri não encontra com regularidade a simpatia da opinião pública, ou até mesmo dos operadores do Direito, em especial, quando é convocado a julgar causas de grande repercussão. Essas críticas são , em sua maioria, manifestações de ignorância sobre os procedimentos do júri, suas limitações e sua 6 importância constitucional de representar o povo na Justiça de um país, trazendo limites ao poder Estado, quando este age contra o interesse público. CONTROVÉRSIA IMEMORIAL: SÓCRATES, CATILINA, A INQUISIÇÃO, OS GRANDES PROCESSOS DA HISTÓRIA Essa parte do livro traz à lembrança grandes processos judiciais que marcaram a históriaI, inclusive em tempos que antecederam a criação do tribunal do júri. É uma forma de comparar que mesmo as pessoas ditas não leigas no Direito são objetos de discordâncias em suas sentenças ou veredictos. Casos como a condenação á morte Sócrates, os cárceres e fogueiras da inquisição do tribunal do Santo Ofício, o tribunal revolucionário, de Fouquier-Tinville, o acusador implacável, no período do terror da Revolução Francesa. ERROS JUDICIÁRIOS Os erros judiciários não são incomuns, quer seja, a condenação de inocentes ou a não condenação de culpados, sendo muito numerosos ao longo da história, mais do do que se supõe. O autor cita Lailer e Vonoven, em obra literária que cataloga nada menos de noventa e cinco erros judiciários, isto é, a condenação de noventa e cinco inocentes, reconhecidos oficialmente. Os erros podem ocorrer por diversas falhas ou limitações humanas, desde erros procedimentais, ou movidos pela paixão pública, pelo falso testemunho, equívocos dos peritos, a prevenção dos juízes, das confissões obtidas mediante torturas, as investigações tendo como ponto de partida errôneos pressupostos, aparências cruéis e impressões fantasiosas não devidamente esclarecidas, defesas mal aparelhadas e pior conduzidas, enfim, há uma série de obstáculos a serem transpostos para vencer a barreira do erro e o pior, o reconhecimento do erro não traz de volta a vida dos inocentes condenados à morte. A DEFESA NO CRIME POLÍTICO Este tópico é dedicado a análise do crime político e o tribunal do júri, que não é a arena para decidir sobres esses delitos. Cita-se o exemplo dos crimes nos regimes de exceção, caso das ditaduras que punem a liberdade de expressão e de convicções políticas, sob vários argumentos falsos no intuito de parecer justas e democráticas, quando no fim, o que realmente desejam é reprimir àqueles que tecem críticas ao regime político e de governo. 7 De modo a lembrar da história do Brasil, poder-se-ia dizer, seria interessante imaginar se os crimes políticos fossem julgados pelo júri. Imagina-se se a revolta dos 18 do Forte de Copacabana, o movimento tenentista, que promoveu duas outras sedições, em 1924 e 1926, o movimento revolucionário de 1930, a revolução constitucionalista de São Paulo (1932), o levante da Aliança Nacional Libertadora, dirigido pelos comunistas (1935), o golpe ditatorial do governo (1937), o putsh integralista (1938), a derrubada da ditadura (1945), o movimento de 1964, os golpes que se lhe seguiram e que culminaram com o Ato Institucional no 5 (1968) fossem da competência do júri! A DEFESA NO CRIME POLÍTICO O crime político traria dificuldades aos advogados em sua atuação pois se de um lado poderia ter ligações com pessoas do governo e de repente fazendo a defesa de clientes que tivessem o governo como parte do pólo passivo da ação. Em breve síntese, os tópicos do livro “A DEFESA TEM A PALAVRA” de Evandro Lins e Silva, é um importante material de estudos, seja para os estudantes de Direito ou até para os mais experientes nessa vocação de defender o Direito da pessoa, pois nos leva a compreender a complexidade da atividades advocatícia, sua relação conflituosa com a sociedade e com o Estado, sua importância na defesa da dignidade do homem, e no trabalho fundamental na garantia do Estado de Direito das nações democráticas. É possível fazer abstrações e sentir-se em uma tribuna fazendo a defesa do réu ou colocando-se na pele do acusado ou do juiz leigo. As experiências trazidas de casos e de atuações de grandes juristas, contemporâneos ou não de Evandro Lins e Silva confere o vasto conhecimento do autor desta obra, que sem dúvida, deve estar presente na “prateleira de cima” das obras sobre a atuação do advogado. Diante de tudo, e independente do que dizem os críticos ao trabalho do advogado, é suficiente lembrar que sem nosso trabalho, a justiça não seria possível. REFERÊNCIAS SILVA, Evandro Lins e, 1920-1998. A defesa tem a palavra / Evandro Lins e Silva. – 4a ed. - Rio de Janeiro: Booklink, 2011. 356 p. 20,5 cm
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