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Ensino da Flora Brasileira 5

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AULA 5 
ENSINO DA FLORA BRASILEIRA 
Prof.ª Letícia Estela Cavichiolo 
2 
INTRODUÇÃO 
Já estudamos os biomas conhecidos por Amazônia e Pantanal, cuja grande 
precipitação pluviométrica favorece a ocorrência de plantas latifoliadas e 
higrófilas. Nesta aula, estudaremos os biomas mais secos, bem como as 
adaptações que os vegetais apresentam para se desenvolver neles. 
TEMA 1 – CARACTERÍSTICAS DO CERRADO 
 O bioma Cerrado pode ser compreendido como um complexo vegetacional 
que possui uma acentuada dinâmica de sazonalidade e antropismo (Sano et al., 
2007, p. 14). Estendendo-se por uma área de 204,7 milhões de hectares (IBGE, 
2004), é o segundo maior bioma brasileiro (Figura 1). 
Figura 1 – Mapa dos biomas brasileiros, segundo IBGE (2020) 
Fonte: IBGE, 2020. 
 
3 
 
Segundo o MMA (S.d.b), o Cerrado apresenta a savana arborizada como 
região fitoecológica predominante (Tabela 1, Figuras 2 e 3) 
que responde por 20,42% de todo o Cerrado, seguindo-se Savana 
Parque, que recobre 15,81% deste. A área florestada, somadas as 
diversas fitofisionomias nessa categoria, abrange 36,73% do bioma, 
enquanto a área não florestada recobre 23,68% deste. O restante refere-
se aos 38,98% de área antrópica, onde a categoria predominante é a de 
pastagens cultivadas. 
Tabela 1 – Caracterização do bioma Cerrado por região fitoecológica agrupada 
Região fitoecológica agrupada Área (km2) % 
Vegetação nativa florestal 751.943,49 36,73 
Vegetação nativa não florestal 484.827,26 23,68 
Áreas antrópicas 797.991,72 38,98 
Água 12.383,88 0,6 
Total 2.047.146,35 100,00 
Fonte: MMA, S.d.b. 
Figura 2 – Área ocupada por tipo de vegetação no bioma Cerrado 
 
Fonte: IBGE, 2019, p. 117. 
Em função das necessidades de trabalho, alguns pesquisadores brasileiros 
criaram sistemas próprios para a classificação de determinadas regiões 
brasileiras. Esse é o caso do Cerrado, em que a classificação proposta por Ribeiro 
 
4 
 
e Walter (Tabela 2 e Figura 4) se destaca por permitir hierarquização e 
mapeamento da vegetação desse bioma (IBGE, 2004). 
Tabela 2 – Classificação do Cerrado 
Formações florestais Mata ciliar 
Mata de galeria 
Mata seca 
Cerradão 
Formações savânicas Cerrado sentido restrito 
Parque de Cerrado 
Palmeiral 
Vereda 
Formações campestres Campo sujo 
Campo rupestre 
Campo limpo 
Fonte: IBGE, 2004. 
Figura 3 – Contato entre a savana e a floresta estacional 
 
Fonte: IBGE, 2019. 
 Segundo Scariot, Sousa-Silva e Felfili (2005, p. 28-29), os principais fatores 
responsáveis pelos padrões e processos das comunidades de savanas como o 
Cerrado são: a estacionalidade climática, a disponibilidade hídrica, o fogo e a 
herbivoria, além das características edáficas como profundidade, textura e 
disponibilidade de nutrientes no solo. No caso específico do Cerrado, a ausência 
de grandes populações de herbívoros de grande porte minimiza o papel da 
herbivoria nesse processo, mesmo com a intensa herbivoria por parte de insetos. 
 
5 
 
Já as variações na profundidade e umidade do solo têm sido usadas para explicar 
as diferenças observadas entre as fitofisionomias no Cerrado como bioma: 
Devido à capacidade da matéria orgânica em reter nutrientes, os solos 
das fisionomias com maior cobertura vegetal (cerrado e cerradão) 
tornam-se mais férteis do que aqueles com menor cobertura (campo 
limpo e campo sujo), ou seja, a dinâmica da vegetação assegura a sua 
manutenção. (Scariot; Sousa-Silva; Felfili, 2005, p. 28-29) 
Figura 4 – Esquema das fitofisionomias do Cerrado 
 
Fonte: Ribeiro; Walter, 2008. 
 A vegetação do Cerrado, assim como das savanas, “...é exposta a altas 
irradiâncias (1500 a 2500 μmol.m-2.s-1), altas temperaturas (25-40 °C ao meio-
dia) e, na estação seca, baixa (10-20%) umidade relativa do ar” (Furquim et al., 
2018, p. 146). Essas condições são favoráveis ao desenvolvimento de plantas 
com características xeromórficas, tais como folhas com estômatos abaxiais, 
cutícula espessa e com pilosidades, minimizando perdas de água via transpiração 
para a atmosfera (Figura 5). 
Figura 5 – Limites entre Cerrado e Caatinga evidenciando plantas xerófitas 
 
Fonte: IBGE, 2019 
 
6 
 
 Os solos do bioma Cerrado são ácidos e distróficos, apresentando baixa 
disponibilidade de nutrientes. Uma característica marcante dos solos do Cerrado 
é a presença de alumínio e manganês, considerados tóxicos para a grande parte 
das plantas cultivadas, mas que não impedem as plantas nativas de se 
desenvolverem (Haridasan, 2008, p.183). 
 Em relação a outros biomas, o fogo é um dos processos que moldam a flora 
do Cerrado. Parte de suas plantas mostram rápida recuperação às queimadas e 
alterações no ciclo fenológico frente a elas. Ainda há espécies cujo impacto do 
fogo estimula a floração, mas esse tipo de adaptação ainda é pouco estudado 
(Furquim et al., 2018, p.147). 
 Contudo, o uso do solo e a dinâmica do fogo têm sido alterados pelas ações 
antrópicas ao longo da história, modificando drasticamente a paisagem e a 
biodiversidade desse bioma. 
TEMA 2 – HISTÓRIA 
 Segundo o Ministério do Meio Ambiente (S.d.a), a história de ocupação do 
Cerrado remonta a 12 mil anos. Muitas disputas ainda se dão entre suas diversas 
populações reconhecidas e expansão das fronteiras agrícolas, prejudicando a sua 
subsistência baseada no uso dos recursos naturais. Milhões de pessoas habitam 
no Cerrado, dentre as quais etnias e comunidades que detêm um conhecimento 
tradicional de sua biodiversidade, como indígenas, quilombolas e ribeirinhos que 
compõe parte do patrimônio social, histórico e cultural brasileiro, detendo um 
conhecimento tradicional de sua biodiversidade. 
 O potencial de uso medicinal e alimentício da flora do Cerrado merece 
destaque: 
Mais de 220 espécies têm uso medicinal e mais 416 podem ser usadas 
na recuperação de solos degradados, como barreiras contra o vento, 
proteção contra a erosão, ou para criar habitat de predadores naturais 
de pragas. Mais de 10 tipos de frutos comestíveis são regularmente 
consumidos pela população local e vendidos nos centros urbanos, como 
os frutos do Pequi (Caryocar brasiliense), Buriti (Mauritia flexuosa), 
Mangaba (Hancornia speciosa), Cagaita (Eugenia dysenterica), 
Bacupari (Salacia crassifolia), Cajuzinho do cerrado (Anacardium 
humile), Araticum (Annona crassifolia) e as sementes do Barú (Dipteryx 
alata). (MMA, S.d.a) 
 Por ter um enorme potencial para geração de valor em função da 
biodiversidade existente em fragmentos de Cerrado para a produção de bens de 
serviço e de consumo de valor (Silva, 2019, p. 15), a agricultura no Cerrado tem 
 
7 
 
se mostrado lucrativa, motivo pelo qual a sua expansão deve se manter acelerada 
(Klink e Machado, 2005, p. 147). Tem havido um progressivo esgotamento dos 
recursos naturais da região, sobretudo nas três últimas décadas. Outro fator 
agravante consiste no fato de que “o bioma Cerrado é palco de uma exploração 
extremamente predatória de seu material lenhoso para produção de carvão” 
(MMA, S.d.a). 
 Esse histórico levou o Cerrado a uma grande fragmentação e 
desmatamento dos seus habitats. Segundo Scariot, Sousa-Silva E Felfili (2005, p. 
5), o conhecimento das causas e das consequências dessa destruição é 
fundamental para a compreensão e a conservação de amostras funcionais 
representativas dos ecossistemas naturais e dos recursos biológicos desse 
bioma. 
A paisagem natural do Cerrado, manifestada em muitas fisionomias de 
vegetação que hospedam espécies endêmicas, conhecimentos 
tradicionais, culturas particulares e cenários deslumbrantes está 
rapidamente sendo transformada em monoculturas de soja e algodão e 
pastagens para gado. A facilidade com que a vegetação pode ser 
removida, em comparação àquelas de outros biomas, clima e solos 
propícios à agricultura e pecuária, juntamente à falta de ordenamento na 
ocupação da paisagem e uso dos recursos naturais poderá trazer 
consequências desastrosas.Não somente a biodiversidade será afetada 
em sua composição, mas também os serviços advindos de 
ecossistemas, como a ciclagem de nutrientes, a recarga dos aquíferos e 
o fluxo das águas, dentre muitos outros, comprometendo a qualidade de 
vida das populações e a sustentabilidade das atividades econômicas e 
sociais da região. (Scariot; Sousa-Silva; Felfili, 2005, p. 5) 
 Se, do ponto de vista econômico, o Cerrado ficou conhecido por colocar o 
Brasil como um dos principais produtores mundiais de grãos, fibras, 
biocombustíveis e carne bovina, do pondo de vista ambiental, esse bioma conecta 
a maioria dos biomas brasileiros (MMA, 2015, p. 11), permitindo a recarga de 
aquíferos e fluxo de águas (Scariot; Sousa-Silva; Felfili, 2005, p. 5), porém toda a 
sua biodiversidade vem sendo ameaçada pelas rápidas mudanças no uso e 
cobertura da terra que têm se acelerado deste a década de 70 (MMA, 2015, p. 
11). 
TEMA 3 – BIODIVERSIDADE 
 Segundo o MMA (2007, p. 55), o Cerrado é a savana tropical mais 
diversificada do mundo, apresentando elevada riqueza de espécies de plantas 
herbáceas, arbustivas, arbóreas e cipós. Com mais de 12 mil espécies (Tabela 3), 
 
8 
 
cerca de um terço da sua flora é composta por espécies endêmicas (Tabela 4) 
(Forzza, 2010, p. 33). 
Tabela 3 – Número total de espécies nos biomas brasileiros 
 Fungo
s 
Alga
s 
Briófita
s 
 
Samambaia
s 
e licófitas 
Gimnos
-permas 
Angios
-
permas 
Total 
Mata 
Atlântica 
1.664 1.545 1.333 834 7 13.972 19.35
5 
Amazôni
a 
519 444 561 428 16 11.349 13.31
7 
Cerrado 291 308 433 245 8 11.384 12.66
9 
Caatinga 734 44 93 25 2 4.320 5.218 
Pampa 1 505 107 5 1 1.345 1.964 
Pantanal 28 130 179 18 0 885 1.240 
 Fonte: Forzza, 2010. 
Segundo o Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro 
(Forzza, 2010, p. 32), os números da flora vascular nativa, com suas mais de 
12.000 espécies, evidenciam que o bioma Cerrado é muito mais diverso do que 
se previa, aproximando-o das florestas Atlântica e Amazônica, em um patamar 
muito superior ao da Caatinga, Pampa e Pantanal. 
No Cerrado, existe uma grande diversidade de habitats, que determinam 
uma notável alternância de espécies entre diferentes fitofisionomias (Klink; 
Machado, 2005). Essa variedade de habitats favorece uma elevada 
biodiversidade que ainda é menosprezada. A devastação vem ocorrendo de forma 
tão acelerada que muitas espécies endêmicas correm o risco de serem extintas 
antes mesmo que sejam conhecidas. De acordo com Myers et al. (2000, p. 353), 
o Cerrado é um dos 25 biomas do mundo considerados como hotspots, ou seja, 
críticos para a conservação ambiental devido à ameaçada de extinção de suas 
espécies endêmicas. 
Tabela 4 – Número e porcentagem de espécies endêmicas da flora brasileira nos 
diferentes biomas 
 Fungos Algas Briófitas Samambaias 
e licófitas 
Fanerógamas Total 
 
9 
 
Mata 
Atlântica 
100 
(50,5%) 
22 
(61,1%) 
189 
(83,3%) 
321 (79,7%) 
7.014 
(50,2%) 
7.646 
Cerrado 
7 
(3,5%) 
0 9 (4%) 48 (11,9%) 
4.151 
(29,7%) 
4.215 
Amazônia 
35 
(17,7%) 
8 
(22,2%) 
24 
(10,6%) 
31 (7,7%) 
1.948 
(13,9%) 
2.046 
Caatinga 
56 
(28,3%) 
0 
2 
(0,9%) 
2 (0,5%) 744 (5,3%) 804 
Pampa 0 
6 
(16,7%) 
2 
(0,9%) 
0 76 (0,5%) 84 
Pantanal 0 0 
1 
(0,4%) 
1 (0,2%) 46 (0,3%) 48 
Fonte: Forzza, 2010, p. 33. 
 Muitas espécies frutíferas, medicinais e madeiráveis estão presentes nesse 
bioma. Na região compreendida como campos gerais (Cerrado sentido restrito e 
formações campestres), é comum a presença de espécies vegetais como: 
o caju (Anacardium othonianum), o pau-santo (Guttiferae), capim-
fexinha (Gramineae), jatobá (Leguminosae), piqui (Caryocar 
brasiliensis), mangaba (Hancornia speciosa) e bromélias. Buritis 
(Mauritia flexuosa) e pindaíbas (Xylopia sp.) enquanto que Angicos 
(Leguminosae), Aroeiras (Miracrodruon urundeuva), cedros (Cedrella 
fissilis), ipês (Tabebuia sp.) e perobas (Aspidosperma sp.) povoavam as 
formações florestais dos Gerais, principalmente as manchas de matas 
secas mais próximas à Depressão do São Francisco. No entanto, estão 
extintas em muitos locais ou ameaçadas de extinção. (Felfili, 2001, p. 
19-29). Árvores frutíferas como o araticum (Annona crassifolia) e o araçá 
(Psidum sp.) também são encontradas nas matas (Santos, 2013, p. 158). 
 Segundo Bezerra (2014, p. 8), a forma como o Cerrado é representado nos 
livros didáticos não contempla a sua complexidade de habitats, o que pode 
desfavorecer o desenvolvimento do sentimento de pertença em relação a esse 
bioma. Isso pode impactar as gerações e a maneira como estas contribuem para 
a sua degradação: 
Os livros analisados privilegiam imagens de árvores tortas, secas, com 
folhas grossas, em meio a pedregulhos ou a resquícios de queimadas, 
perdendo a possibilidade de outras formas de contextualização. Frente 
a essa constatação, considera-se que a omissão na descrição das 
formações florestais nos livros didáticos pode contribuir para as ações 
que visem a derrubada da vegetação (Bezerra, 2014, p. 8). 
 
 
10 
 
TEMA 4 – ADAPTAÇÕES DOS PRINCIPAIS GRUPOS TAXONÔMICOS 
 Segundo Haridasan (2008, p. 183), assim como os solos amazônicos, os 
solos do bioma Cerrado são ácidos e distróficos, possuindo baixa disponibilidade 
de nutrientes, porém a sua vegetação apresenta baixa biomassa, sendo deficiente 
em nutrientes como ecossistema. Isso o difere do bioma Amazônia, cuja reserva 
de nutrientes na sua biomassa vegetal é maior. Outra diferença reside na 
presença de alumínio e manganês nos solos do cerrado, considerados tóxicos 
para grande parte das plantas cultivadas. No entanto, isso não se aplica às plantas 
nativas, pois estas são consideradas tolerantes ou resistentes ao alumínio, uma 
vez que a sua capacidade de absorção de nutrientes essenciais, crescimento e 
reprodução não é prejudicada: 
Muitas espécies comuns do cerrado, em vez de excluir, absorvem 
grandes quantidades deste elemento e transportam para folhas e 
acumulam em diferentes tecidos incluindo folhas e sementes e alguns 
não sobrevivem na ausência do alumínio trocável apesar de não ter 
comprovado nenhum papel deste elemento no metabolismo das plantas 
(Haridasan, 2008, p. 183). 
 Segundo Scariot, Sousa-Silva e Felfili (2005, p. 84), o fogo é um agente 
que perturba drasticamente a dinâmica da flora do Cerrado, ocasionando 
diminuição da altura da vegetação, mortalidade de até 16% das árvores e mais e 
33% das plântulas, além de favorecer as formas arbustivas e a reprodução 
vegetativa. A complexidade dos efeitos do fogo sobre a vegetação desse bioma 
encontra-se esquematizado na Figura 6, contudo, a magnitude desses efeitos 
depende da frequência com que ocorre o fogo e da variação climática da região. 
Figura 6 – Esquema dos efeitos do fogo sobre a vegetação do Cerrado 
 
Fonte: Scariot; Sousa-Silva; Felfili, 2005, p. 84. 
 
11 
 
 A flora nativa do Cerrado geralmente apresenta um conjunto de adaptações 
às condições do solo, às queimadas e à estiagem prolongada. Dentre as principais 
adaptações, as que merecem maior destaque são as seguintes (Furquim et al., 
2018, p. 146; Scariot; Sousa-Silva; Felfili, 2005): 
a. redução na taxa de transpiração; 
b. sistema subterrâneo desenvolvido desde o estádio de plântula, com raízes 
espessadas e que atingem grandes profundidades no solo em busca de 
água; 
c. caules subterrâneos com função de reserva (xilopódio) e com gemas que 
permitem a rebrota das plantas após a estiagem e as queimadas; 
d. translocação de fotoassimilados para o sistema subterrâneo nos períodos 
de seca, com acúmulo de carboidratos não estruturais em tecidos; 
e. caules aéreos muito espessos e com acúmulo de cortiça para proteção 
contra o fogo; 
f. folhas com estômatos abaxiais, cutícula espessa e com pilosidades, 
minimizando perdas de água para a atmosfera; 
g. resposta de crescimento sob baixas concentrações de nutrientes e pH 
ácido; acúmulo foliar dealumínio; 
h. ajustamento osmótico das raízes, possibilitando a entrada de água nos 
meses secos e a continuidade da transpiração e da fotossíntese; 
i. dormência fisiológica de sementes. 
TEMA 5 – IMPORTÂNCIA E PRESERVAÇÃO 
 O Cerrado brasileiro é um dos biomas que mais tem sofrido com a 
crescente pressão antrópica, principalmente pela mudança na cobertura de uso 
do solo e avanço do plantio de soja. Consequentemente, a perda de 
biodiversidade tem se acelerado. 
 A urgência da preservação do Cerrado pode ser mais bem compreendida 
quando o comparamos com a situação de outros biomas. Segundo Klink e 
Machado (2005, p. 147), as taxas de desmatamento no Cerrado têm sido 
historicamente superiores às da floresta Amazônica. Esse quadro encontra-se 
agravado devido á fraca proteção do Cerrado, onde apenas 2,2% da sua área 
encontra-se legalmente protegida. 
 Como a agricultura no Cerrado tem se mostrado lucrativa, sua expansão 
deve se manter acelerada. Embora esse bioma seja adaptado ao fogo, extensas 
 
12 
 
áreas são queimadas de modo intenso e frequente para abertura de áreas virgens 
e para estimular o rebrotamento das pastagens. Essa dinâmica de uso do solo 
agrava a erosão, degrada os diversos tipos de vegetação presentes no bioma e 
favorece a invasão biológica causada por gramíneas de origem africana. De 
acordo com Klink e Machado (2005, p. 147), “Estudos experimentais na escala 
ecossistêmica e modelos de simulação ecológica demonstraram que mudanças 
na cobertura vegetal alteram a hidrologia e afetam a dinâmica e os estoques de 
carbono no ecossistema”. 
 Segundo Klink e Machado (2005), a perda acelerada de biodiversidade tem 
provocado o desaparecimento de variedades selvagens de cultivares devido à 
perda de habitat. A mandioca (Manihot sp.), por exemplo, tem o Cerrado como 
centro de sua diversidade, cujas variedades selvagens apresentam fenótipos de 
interesse comercial, como a tolerância à estiagem. Infelizmente, apenas uma das 
41 localidades identificadas nos anos 70 como centros de diversidade do gênero 
Manihot ainda permanece (Nassar, 2004, citado por Klink; Machado, 2005, p. 
150). 
Segundo Silva (2019, p. 15), há um enorme potencial para geração de valor 
em função da biodiversidade existente em fragmentos de Cerrado, principalmente 
pela produção sustentável de produtos não madeireiros. A utilização de espécies 
nativas para produção de serviços e bens de consumo com valor comercial, como 
pequi, marolo, gabiroba e o palmito, por exemplo, desponta como uma forma 
direta de atribuição de valor aos ativos da biodiversidade. No entanto, a falta de 
manejo sustentável e cadeias produtivas mal estruturadas dificulta esse processo, 
assim como a falta de legalização das atividades e certificação dos produtos. 
É urgente o desenvolvimento de políticas públicas para o Cerrado. A 
ocupação desordenada da paisagem e o uso excessivo dos recursos naturais 
poderá trazer consequências ainda mais desastrosas, pois não somente a 
biodiversidade será afetada em sua composição, mas também os serviços 
advindos de seus ecossistemas. De acordo com Scariot, Sousa-Silva e Felfili 
(2005, p. 5), “A ciclagem de nutrientes, a recarga dos aquíferos e o fluxo das 
águas, por exemplo, são serviços ambientais que, uma vez afetados, 
comprometem a qualidade de vida das populações e a sustentabilidade das 
atividades econômicas e sociais da região”. 
 
 
 
13 
 
REFERÊNCIAS 
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de biologia aprovados pelo PNLD 2012. Trabalho de Conclusão de Curso 
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Tecnologia de Goiás, Câmpus Formosa, 2014. 
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MYERS, N. et al. Biodiversity hotspots for conservation priorities. Nature, v. 403, 
n. 6772, p. 853-858, 2000 
 
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