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Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Diretora Editorial ANDRÉA CÉSAR PEDROSA Projeto Gráfico MANUELA CÉSAR ARRUDA Autor FRANCIANE HEIDEN RIOS Desenvolvedor CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS Olá. Meu nome é Franciane Heiden Rios. Sou formada em Pedagogia, Mestre em Educação, Especialista em Educação Especial e Inclusiva e Tecnologias Educacionais. Estou na Educação desde o início da minha vida profissional, cursei Magistério, ingressei como estagiária e da escola nunca mais sai. Esse espaço rico de aprendizagens humanas me oportunizou pensar sobre diferentes questões e perceber as pessoas em suas diferentes necessidades. Durante dez anos fui servidora concursada, professora, do Município de São José dos Pinhais, também atuei como educadora pela Prefeitura Municipal de Curitiba e, atualmente, sou supervisora do curso de Pedagogia da UNIVESP – Universidade Virtual do Estado de São Paulo e diretora pedagógica da CuriosaIdade, instituição que atua em parceria com redes de ensino para desenvolvimento de boas práticas educativas tendo como subsídio a perspectiva do Desenho Universal para a Aprendizagem. Acredito no princípio básico da Inclusão e no respeito pela diversidade, portanto, escrever, palestrar, capacitar ou qualquer outra ação ou prática profissional relacionada ao tema são hoje meu foco de atuação. Desejo que tenhamos juntos um caminho rico de aprendizagens significativas, que o material aqui proposto em suas ideias, reflexões e discussões permitam a você se construir enquanto um profissional interdisciplinar, que navega entre as mais diversas áreas do conhecimento em prol de uma melhor prática educativa, avançando para a qualidade na educação e consequente transformação social. Autor FRANCIANE HEIDEN RIOS INTRODUÇÃO: para o início do desenvolvimen- to de uma nova competência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de se apresentar um novo conceito; NOTA: quando forem necessários obser- vações ou comple- mentações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser prioriza- das para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofun- damento do seu conhecimento; REFLITA: se houver a neces- sidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou discutido sobre; ACESSE: se for preciso aces- sar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso se fazer um resumo acumulativo das últimas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma ativ- idade de autoapren- dizagem for aplicada; TESTANDO: quando o desen- volvimento de uma competência for concluído e questões forem explicadas; Iconográficos Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo pro- jeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: SUMÁRIO Introdução.............................................................................10 Competências......................................................................11 Teoria da complexidade...................................................12 História e fundamentos da teoria da complexidade.......12 Conceitos-chave da teoria da complexidade..................15 Psicologia Histórico-Cultural.........................................23 História e fundamentos da Psicologia Histórico- Cultural ........................................................................................................23 Conceitos-chave da Psicologia Histórico-Cultural......25 Método lógico-histórico...................................................30 Limites e possibilidades para estudos e construção do conhecimento na neuroeducação................................33 Problemas relacionados à natureza da Ciência e Neuroeducação.....................................................................................33 Cérebro e Aprendizagem ..............................................................38 Últimas considerações.....................................................40 Caminhos para a neuroeducação.............................................40 Ética na relação com os serem humanos:..............41 Conjunto de práticas de ação adotadas pela comunidade científica.......................................................................43 Bibliografia...........................................................................45 Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 9 UNIDADE 04 CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE EPISTEMOLOGIA E NEUROEDUCAÇÃO Atuação interdisciplinar e Neuroeducação10 Nessa unidade avançaremos nas perspectivas epistemológicas que se projetam na sociedade contemporânea. Teremos como foco a Teoria da Complexidade e a Psicologia Histórico-Cultural. Seguimos, portanto, em busca dos elementos que nos permita respostas às questões: O que é ciência? Será que ciência necessitam de verificações sistematizadas e comprovações a partir de princípios científicos? Será ciência uma organização do conhecimento empírico? Será ciência uma “roupagem” para o senso comum? Será ciência aquele conhecimento produzido em laboratório? Transitaremos por exemplos práticos e aproximações com a neurociência efetivamente, abordando os aspectos da pesquisa nessa área. Dentre essas discussões, veremos que, por exemplo, é possível articular métodos, afinal, sendo a neuroeducação um campo interdisciplinar, cabe um olhar específico, porém global, a cada conhecimento que se evidencia. Seguimos no sentido de desvelar as possíveis concepções de como se produz o conhecimento em áreas que não “são duras”, que permitem e necessitam de interpretações e narrativas. Assim, esperamos que você estudante e entusiasta da área, mantenha sua curiosidade para que juntos, possamos ampliar a concepção que temos de ciência e, consequentemente, da produção do conhecimento. Vamos lá? INTRODUÇÃO Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 11 COMPETÊNCIAS Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 4 – Considerações finais sobre Epistemologia e Neuroeducação. Nosso objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o término desta etapa de estudos: 1. Conhecer, conceituar e discutir a Teoria da Complexidade, uma consistente base epistemológica atual; 2. Conhecer, conceituar e discutir a Psicologia Histórica-Cultural, uma das principais linhas epistemológicas contemporâneas; 3. Refletir sobre os limites e possibilidades para os estudos e construção do conhecimento na neuroeducação; 4. Refletir sobre os caminhos para produção e pesquisa científica na neuroeducação diante dos conhecimentos discutidos no processo formativo. Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Atuação interdisciplinar e Neuroeducação12 Teoria da Complexidade Ao término deste capítulo você terá conhecido a proposta da Teoria da Complexidade, bem como, será capaz de compreender os principais conceitos dessa perspectiva epistemológica. Assim como as demais teorias que vimos, entender como essa perspectiva discute a construção do conhecimento é fundamental para são essenciais para a ampliação de seu campo teórico, permitindo a você uma visão ampla e geral das epistemologias/teorias do conhecimento que habitam o campo da educação e, consequentemente, da neuroeducação. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! História e fundamentos da teoria da complexidade O que é conhecimento? O que é Ciência? Essas perguntas vêm nos acompanhando desde o início dessa disciplina e, diante de tudo que vimos e discutimos, ainda estamos distantes de uma resposta concreta, afinal, tivemos um vasto percurso teórico diverso o qual permite respondermos essas questões de diversas formas. E assimcomo as teorias anteriores, a Teoria da Complexidade busca evidências, hipóteses e significados para essas questões. O primeiro elemento que podemos identificar na Teoria da Complexidade é relação entre ciência e complexidade. Morin (2007) antes de afirmar o que é, de fato, conhecimento, indica como esse opera. Para ele, qualquer que seja o conhecimento “[...] opera por seleção de dados significativos e rejeição de dados não significativos” (MORIN, 2007, p.10), utilizando-se da lógica e de princípios supralógicos nessa organização do pensamento. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 13 Figura 1: Princípios supralógicos na organização do pensamento Fonte: Elaborada pela autora (2019) Une (associa, identi�ca) Centraliza (em função de um núcleo de noções-chaves) Separa (distingue ou disjunta) Hierarquiza (o principal, o secundário) Desses princípios de fortes características de matematização, formalização e de lógica binária, resultam nossas visões de mundo, muitas vezes, sem que tenhamos o entendimento sobre esse processo. Exemplo: Você já parou para analisar como se dá, muitas vezes, o processo de pesquisa para a produção de um trabalho acadêmico? Usualmente separamos sujeito e objeto, objetividade e subjetividade, conteúdo e forma, quantidade e qualidade. Seguimos por aí: pesquisas quantitativas, pesquisas qualitativas, se descrevem, não analisam e, seguimos de forma esclarecida ou não, esse caminho de seleção e sistematização. Essa lógica de “ideias claras e distintas” (MORIN, 2007) é herança de Descartes, que promoveu o pensamento disjuntivo, responsável por grandes avanços científicos, porém, que diante do seu caráter elucidativo, precariza a reflexão sobre “[...] conhecimento que produz, à ação que determina, à Atuação interdisciplinar e Neuroeducação14 sociedade que transforma” (MORIN, 2008, p. 16). Nesse sentido, o pensamento disjuntivo torna-se excludente, segregador e meio de aprisionamento. Na contramão dessa lógica, a Teoria da Complexidade parte do pressuposto de que é necessário dispor de pensamentos que permitam compreender a complexidade intrínseca à ciência. Complexidade que não tem aqui conotação de confusão ou de complicação, como por exemplo, quando nos referimos à uma relação afetiva “complexa” – confusa e/ou complicada. Mas sim, é entendida como: a associação de elementos heterogêneos e contraditórios de forma una e múltipla, que se entrecruzam e formam uma unidade da complexidade sem, entretanto, destruir a diversidade de cada um. IMPORTANTE: Cada um desses elementos é nomeado por Morin (2007) como complexus e o encontro, como “núcleo da complexidade” que, nada mais é que “o complexus do complexus”. Nesse núcleo se interligam o núcleo empírico e o núcleo lógico. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 15 Figura 2: Núcleo da Complexidade Fonte: Elaborada pela autora (2019) Núcleo empírico Desordens Eventualidades Complicações Confusões Multiplicações proliferantes Indecisões inerentes à lógica Contradições a serem enfrentadas Núcleo lógico Assim, a premissa da complexidade propõe um sistema que tenta representar o pensar da modernidade, propõe desenvolver e ultrapassar a percepção da complexidade, para mais complexidade e em diferentes níveis de complexidade. Conceitos-chave da teoria da complexidade Dessa apresentação inicial é possível perceber que a complexidade reintroduz o caráter de incerteza aos conhecimentos que poderiam ser considerados absolutos e naturalizados. Nesse cenário, Morin (2007) Atuação interdisciplinar e Neuroeducação16 propõe o “pensamento dialógico” entre o empírico e o lógico, resultando na “unidualidade”. Unidualidade diz respeito ao “princípio da complementaridade de Bohr” (SANTOS; SOMMERMAN, 2009) que prevê que por meio da ação e interação entre os opostos – prótons e elétrons, que coexistem simultaneamente, resultam articulações nas quais nem um ou outro se anulam, configurando-se em algo que atinge outro nível de realidade ou de perspectiva. Os opostos não desaparecem e, em sua articulação, formam uma unidade diferente da que eram em sua individualidade, porém, mantêm suas características individuais. IMPORTANTE: A unidade constituída será diferente dos pares binários, mas ela não desaparece como unidade. Em suas interrelações projetam outros sistemas com conteúdos e formas que não seriam percebidos no nível individual. Exemplo: Observe a figura a seguir: Figura 3: Ingredientes Fonte: Pixabay Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 17 IMPORTANTE: Não é proposto a conversão da complexidade em um outro conjunto de princípios lógicos de base simples e dualistas, mas sim, que seja assumida que a complexidade é base da vida e das relações. Temos a farinha de trigo e os ovos que, em uma aproximação simples, seriam os complexus. Cada qual com suas características e especificidades. Já abaixo, temos o macarrão, que resulta no “complexo dos complexus”, o trigo e os ovos ao “se unirem” resultam em algo que, individualmente, não seria possível contemplarem, porém, não deixam de ser farinha, tampouco, ovo. A crítica que Morin (2007) estabelece à lógica clássica é que essa, por suas características, ao se deparar com as contradições refutava o conhecimento produzido, nessa perspectiva, qualquer contradição que o conhecimento apresentasse, apontaria que ele estaria errado. Na perspectiva da complexidade, a contradição toma outro lugar: é a descoberta de uma outra “camada” desse conhecimento, mais profunda ou não perceptível pela nossa visão reducionista orientada por princípios lógicos. Outra questão importante da Teoria da Complexidade é a relação do homem com a produção do conhecimento. Na lógica da modernidade, para que o objeto pudesse ser “estudado”, o homem deveria ser separado dele, pois para que o conhecimento fosse objetivo, seria necessário eliminar qualquer ruído que pudesse interferir em sua produção. Sendo o homem orientado por diversas questões: cultura, sociedade, crenças, entre outras, deveria se afastar para que não corrompesse o processo científico. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação18 Novamente surge um paradoxo: “o conceito positivista de objeto faz da consciência ao mesmo tempo uma realidade (objeto) e uma ausência de realidade (reflexo)” (MORIN, 2007, p. 42). Ou seja, essa consciência reflete no mundo porque é reflexo do sujeito e, portanto, objeto e sujeito – sujeito e objeto se permeiam em uma relação complexa e indissociável, atravessados pelos princípios da incerteza, da incompletude e da abertura. Para Morin (2007, p. 47-48), “a epistemologia não é pontifical nem judiciária; ela é o lugar ao mesmo tempo da incerteza e da dialógica”, apresentando verdades que são “biodegradáveis, isto é, mortais, isto é, ao mesmo tempo, vivas”. IMPORTANTE: Diante da perspectiva da complexidade, a teoria não propõe métodos, mas sim, estratégias para a produção de conhecimentos. Não propõe, portanto, um novo método, mas, caminhos que poderão ser mais ou menos assertivos no percurso dialógico. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 19 SAIBA MAIS: Edgar Moran – A complexidade do Eu “Eu sou um produto do meio.” Será? Até onde somos criadores do nosso “eu” e até onde o meio nos define? Quem responde uma das reflexões mais interessantes da psicologia humana é Edgar Morin, que esclarece como a noção de identidade se define de uma forma dupla. Um eu singular e insubstituível e um eu comunitário, composto por uma família, pátria ou comunidade. Para compreender a multiplicidade da identidade, Morin defende a necessidade do pensamento complexo, capaz de relacionar conjuntos de concepções ao mundo através da vida. Essas reflexões são trazidas pelo próprio Morin, disponível no Canal Fronteiras do Pensamento, no link: https:// www.youtube.com/watch?v=ExOqRgBKDKA Como destaque, portanto, podemos apontar que a complexidade não tendênciaser clara, distinta ou delimitada às fronteiras dos conceitos. Ainda, diante do pensamento sistêmico: “as propriedades das partes podem ser entendidas apenas a partir da organização do todo” e que, as construções teóricas são permeáveis e fluídas. https://www.youtube.com/watch?v=ExOqRgBKDKA https://www.youtube.com/watch?v=ExOqRgBKDKA Atuação interdisciplinar e Neuroeducação20 SAIBA MAIS: Indicamos a leitura do artigo da Revista Nova Escola, intitulado: Edgar Morin, o arquiteto da complexidade, disponível em: https:// novaescola.org.br/conteudo/1391/edgar- morin-o-arquiteto-da-complexidade Morin (2003) define três princípios para pensar a complexidade: dialógico, recursivo e hologramático. O princípio dialógico “pode ser definido como a associação complexa (complementar/concorrente/ antagonista) de instâncias, necessárias conjuntamente à existência, ao funcionamento e ao desenvolvimento de um fenômeno organizado” (MORIN, 1996, p.95). “O termo dialógico quer dizer que duas lógicas, dois princípios, estão unidos sem que a dualidade se perca nessa unidade[...]” (MORIN, 2003, p. 189). Já o princípio recursivo é o processo no qual produtos e efeitos assumem concomitantemente “causa” e “agente” da produção. O princípio hologramático considera a “parte que está no todo”, busca superas a ideia reducionista que se debruça sobre a parte e o holismo que, ao contrário, se debruça sobre o todo. Por fim, outro destaque da perspectiva da complexidade é a relação ordem-desordem- organização. Para Morin (2002) essa é a relação que controla todas as coisas, se estruturando conforme a figura a seguir: https://novaescola.org.br/conteudo/1391/edgar-morin-o-arquiteto-da-complexidade https://novaescola.org.br/conteudo/1391/edgar-morin-o-arquiteto-da-complexidade https://novaescola.org.br/conteudo/1391/edgar-morin-o-arquiteto-da-complexidade Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 21 Ordem Interação Desordem Organização Figura 4: Tetragrama da relação Fonte: Elaborada pela autora, com base em Morin (2003, p. 204) Segundo Morin (1990, p. 91), “a complexidade da relação ordem/desordem/organização surge quando se verifica empiricamente que fenômenos desordenados são necessários em certas condições, em certos casos, para a produção de fenômenos organizados, que contribuem para o aumento da ordem”. Portanto, é preciso pensar “ordem e desordem conjuntamente” para que se estabeleça um diálogo efetivo. “Esse tetragrama permite-nos conceber que a ordem do universo se autoproduz ao mesmo tempo que esse universo se autoproduz, por meio das interações físicas que produzem organização, mas também desordem” (MORIN, 2003, p. 204). Assim, podemos perceber que o pensamento complexo não propõe uma nova lógica, mas sim, evidencia um pensamento articulante e multidimensional. Não despreza o que é simples, tampouco, privilegia a especialização, busca, portanto, refletir sobre as fragilidades existentes no processo de conhecer e, com isso, considerar o que é indissociável. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação22 RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que a Teoria da Complexidade parte do pressuposto de que é necessário dispor de pensamentos que permitam compreender a complexidade intrínseca à ciência. Complexidade que não tem aqui conotação de confusão ou de complicação, mas sim, é entendida como: a associação de elementos heterogêneos e contraditórios de forma una e múltipla, que se entrecruzam e formam uma unidade da complexidade sem, entretanto, destruir a diversidade de cada um. Unidades que são nomeadas por Morin (2007) como complexus e que agrupadas, formam um “núcleo da complexidade” que, nada mais é que “o complexus do complexus”. Nesse núcleo se interligam o núcleo empírico e o núcleo lógico. Vimos que unidualidade diz respeito ao “princípio da complementaridade de Bohr” (SANTOS; SOMMERMAN, 2009) que prevê que por meio da ação e interação entre os opostos, que se em algo que atinge outro nível de realidade ou de perspectiva. Ainda, que esses opostos não desaparecem nessa articulação, formam uma unidade diferente da que eram em sua individualidade, porém, mantêm suas características individuais. Evidenciamos que não é proposto a conversão da complexidade em um outro conjunto de princípios lógicos de base simples e dualistas, mas sim, que seja assumida que a complexidade é base da vida e das relações. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 23 Ainda, que a Teoria da Complexidade critica a relação do homem com a produção do conhecimento na lógica da modernidade, quando essa afirma que, para que o objeto pudesse ser “estudado”, o homem deveria ser separado dele, pois para que o conhecimento fosse objetivo, seria necessário eliminar qualquer ruído que pudesse interferir em sua produção. Sua perspectiva complexa não propõe métodos, mas sim, estratégias para a produção de conhecimentos. Não propõe, portanto, um novo método, mas, caminhos que poderão ser mais ou menos assertivos no percurso dialógico. Psicologia Histórico-Cultural Ao término deste capítulo você terá conhecido a proposta da Psicologia Histórico-cultural que, apesar de não ser considerada uma teoria de como se constrói o conhecimento, tem em sua base epistemológica conceitos fundamentais para a compreensão da neuroeducação enquanto um campo multi e interdisciplinar. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! História e fundamentos da Psicologia Histórico-Cultural A Psicologia Histórico-Cultural está associada principalmente à Vygostky (1896-1934), Leontiev (1903-1977) e Luria (1902-1977). Atuação interdisciplinar e Neuroeducação24 Figura 5: Vygotsky, Leontiev e Luria Fonte: Wikipedia No período do desenvolvimento da Psicologia Histórico-Cultural, três correntes se destacavam no campo psicológico: a introspecionista, dedicada a descrever fenômenos da consciência a partir das análises dos elementos de constituição desse fenômeno; a Gestalt, que propôs a análise holística dos fenômenos psíquicos; e a funcionalista, contraposição ao introspecionismo na análise da consciência. As premissas da Psicologia Histórico-Cultural se diferenciavam dessas correntes em voga, principalmente, por suas características culturais peculiares de forte conexão e embasamento nas ideias socialistas de Marx e Engels. Nesse sentido, podemos evidenciar na construção teórica de Vygotsky, Luria e Leontiev as linhas de desenvolvimento natural – campo biológico - e social-cultural, bem como: A presença de uma visão holística do desenvolvimento; A função dos instrumentos/objetos na atividade humana; A premissa da existência de duas categorias de funções: elementares e superiores; Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 25 O conceito de interiorização das funções psíquicas; A importância da atividade tanto nas relações externas como internas ao sujeito; A função atribuída à linguagem. Conceitos-chave da Psicologia Histórico- Cultural Dessas principais características, podemos seguir para destacar os princípios epistemológicos da Psicologia Histórico-Cultural, principalmente, aqueles que nos permitem compreender como nesse paradigma, Vygotsky, Luria e Leontiev, a priori, analisam o processo de construção do conhecimento. A primeira análise diz respeito à concepção de “signo” e “instrumento”. Para Bernardes (2010) esses dois elementos são construções históricas elaborados pelo homem que surgem diante das necessidades de se apropriar e transformar a natureza. Eles atuariam na mediação das relações, os signos agindo na atividade interna e, os objetos, na atividade externa ao homem. Por ser campo interno ao homem, os signos estão diretamente relacionados ao significado social e sentido pessoalem seu uso pelo homem. O significado social diz respeito às apropriações do processo histórico; já o sentido pessoal, resulta da interação entre o homem e o mundo. Na questão da relação homem-objetos, Bernardes (2010) aponta que a consciência humana é, também, resultado das relações com o “mundo dos objetos”, afinal, são eles que possibilitam a comunicação com outras pessoas. Chegamos, assim, a outro conceito importante nessa perspectiva: a consciência. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação26 A consciência é compreendida como o produto das relações sociais estabelecidas por meio da vida social, e, concomitantemente, é mediada pelas significações elaboradas pela sociedade em seu percurso histórico. Leontiev (1983) define consciência como o conhecimento partilhado, ou seja, um produto social que tem a língua como instrumento para sua produção. Portanto, um outro fundamento dessa perspectiva é a “mediação semiótica”, que consiste na reflexão da relação entre os instrumentos e o sistema de signos, com destaque para a linguagem. Para a perspectiva histórico-cultural, a característica da atividade humana é que ela é mediada por instrumentos técnicos que operam na regulação das ações sobre os objetos e, o sistema de signos, que operam na regulação das ações simbólicas, que se estabelecem com os outros e consigo mesmo. Vygotsky debruça-se principalmente na análise dessa relação simbólica e, portanto, na ação dos signos na atividade humana, principalmente por ele conceber que é a palavra que constitui o “microcosmo” da consciência. Está reflexão evidencia as relações do pensamento humano com a linguagem na mesma relação de significação de dupla função: de representação e generalização. Funções que permitem a reconstrução do real ao nível simbólico a partir da atividade humana. Essa reconstrução se dá pela atividade compreendida como uma forma de mediação das relações do homem com a natureza, desenhando a realidade, é portanto, criadora. Tem como perspectiva o homem que “[...] age sobre a natureza externa e a modifica, modifica sua própria natureza e desenvolve as faculdades nela adormecidas” (Sirgado, 1990, p.65). Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 27 É fundamental indicar que, evidentemente, essa perspectiva é relacionada ao conceito de trabalho dos textos de Marx. SAIBA MAIS: Indicamos a leitura da reportagem “Karl Marx – o filósofo da educação”, publicada na Revista Nova Escola, disponível em: https:// novaescola.org.br/conteudo/7222/karl-marx Dessa perspectiva, o modelo de atividade de trabalho compõe-se de três elementos: o sujeito ativo, o objeto e o mediador instrumental. Figura 6: Modelo básico de mediação em Vygotsky Fonte: Elaborada pela autora com base em Vygotsky (1978) Instrumento Sujeito Objeto OBJETO: traduz a atividade inteligente do sujeito, consiste em uma produção social-cultural. INSTRUMENTOS: condutores da ação humana. Dessa relação, há a objetivação da atividade humana que se dá concomitantemente produto e fonte de conhecimento, ou seja, a partir da sua ação – atividade, faz-se possível emergir as funções https://novaescola.org.br/conteudo/7222/karl-marx https://novaescola.org.br/conteudo/7222/karl-marx Atuação interdisciplinar e Neuroeducação28 e habilidades humanas. No caminho inverso à objetivação, tem-se a apropriação e internalização das produções culturais que explicam que, antes da existência no nível individual, há a existência no nível social. Sendo, portanto, a apropriação o resultado de processos de “reconstrução” do sujeito. Assim, consciência e atividade são elementos fundamentais à psicologia histórico-cultural. Mas, o que “gera” a atividade na perspectiva da psicologia histórico- cultural, essa que regula e orienta a atividade concreta do sujeito em seu meio? Seria a necessidade seja ela de ordem biológica ou de ordem da fantasiosa, mas, essa necessidade não é a atividade em si, somente quando o objeto correspondente à necessidade, é que se é possível orientar e regular a atividade. [[Exemplo]]: De maneira “simplória” podemos exemplificar atividade a partir da seguinte imagem: Figura 7: Ponta de lança Fonte: Wikipedia Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 29 Trata-se de uma “ponta de lança” produzida pelo homem quando houve a necessidade de “caçar e se defender de outra forma”. Ou seja, houve a produção de um objeto para satisfazer uma necessidade eminente. Com essa produção, ampliou-se as necessidades e, a produção de outros objetos, em um ciclo retroalimentado. Motivo AçõesAçõesAçõesAções ATIVIDADE Motivo Motivo Motivo Figura 8: Relação objeto-necessidade Fonte: Elaborada pela autora (2019) Assim, podemos afirmar que a atividade tem como componentes estruturais: necessidade, objeto e motivo; só sendo possível sua existência a partir das ações. O motivo é, portanto, o “cara a cara” da necessidade com o objeto, o princípio de impulsionamento da atividade e o elo de ligação entre a necessidade e o objeto. Portanto, isoladamente necessidade e objeto não resultam em atividade. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação30 Nessa relação, a proposta da psicologia histórico- cultural propõe a análise da natureza do objeto, o que não é novidade na cientificidade, porém, propõe um novo método que permitam uma nova perspectiva dos fenômenos psíquicos, por considerar que esses não podem ser considerados e estudados como meros objetos, por serem processo que resultam em mudanças. Esse método é chamado de “Método lógico-histórico”. Método lógico-histórico Esse método tem o contraste entre enquanto princípio-chave. Converge com as premissas de Engels, as quais elucidam a relação entre a abordagem naturalista (suposição de que são as condições naturais que determinam o desenvolvimento histórico) com a abordagem dialética (que sustenta que, mesmo havendo influência das condições naturais, o homem age sobre a natureza e a transforma, nisso há transformação e a produção de novas condições de existência). Essa abordagem dialética exige uma nova estrutura analítica e metodológica, a qual pode ser compreendida a partir de três princípios básicos: 1) Primeiro princípio: o centro está nos processos e não nos objetos, sendo necessário expor de forma dinâmica os pontos históricos da constituição desses processos. 2) Segundo princípio: a abordagem deve ser explicativa e não, tão somente, descritiva. São as explicações que permitirão evidenciar às relações internas constitutivas. 3) Terceiro princípio: é necessário analisar em suas origens os processos psicológicos fossilizados, automatizados ou mecanizados. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 31 O princípio explicativo define um campo teórico- metodológico de análise, resultando em uma construção que permite associar as determinadas realidades às determinadas elaborações teóricas. Assim, dessa perspectiva podemos evidenciar que é contraproducente isolar o momento da ação do percurso histórico, bem como, isolar o sujeito das suas relações sociais. Trata-se, portanto, de uma abordagem dinâmica que busca e age na origem e nas causas dos fenômenos investigados, sem que esses sejam extirpados de seu movimento de existência, necessitando, portanto, de um método para cada problema. RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que a Psicologia Histórico-Cultural está associada principalmente à Vygostky (1896-1934), Leontiev (1903-1977) e Luria (1902- 1977). Que surge no mesmo período de outras correntes de destaque no campo psicológico, sendo elas a introspecionista, a Gestalt e a funcionalista. Avançamos para compreender as premissas da Psicologia Histórico-Cultural, indicando sua diferenciação das demais, principalmente, por suas características culturais peculiaresde forte conexão e embasamento nas ideias socialistas de Marx e Engels. Vimos que essa corrente relacionam o desenvolvimento natural – campo biológico - e social-cultural, tendo como características: Atuação interdisciplinar e Neuroeducação32 visão holística, a função dos instrumentos e objetos na atividade humana, existência de duas categorias de funções: elementares e superiores; o conceito de interiorização das funções psíquicas, a importância da atividade, função atribuída à linguagem. Como conceitos, destacamos que são construtos históricos, elaborados, reelaborados e apropriados mediante a relação do homem com o meio. Vimos que consciência é compreendida como o produto das relações sociais estabelecidas por meio da vida social, e, concomitantemente, é mediada pelas significações elaboradas pela sociedade em seu percurso histórico. Podendo ser, portanto, definida como o conhecimento partilhado, ou seja, um produto social que tem a língua como instrumento para sua produção. Percebemos que da perspectiva histórico- cultural é possível identifica o método lógico-histórico, que elucida a relação entre a abordagem naturalista (suposição de que são as condições naturais que determinam o desenvolvimento histórico) com a abordagem dialética (que sustenta que, mesmo havendo influência das condições naturais, o homem age sobre a natureza e a transforma, nisso há transformação e a produção de novas condições de existência). Tal método tem como características a abordagem dialética que exige, portanto, uma nova estrutura analítica e metodológica. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 33 Limites e possibilidades para estudos e construção do conhecimento na neuroeducação [Ao término deste capítulo você será capaz de relacionar os conhecimentos trabalhados durante essa disciplina com a neuroeducação. Iremos ampliar as relações de produção de conhecimento na perspectiva da articulação entre neurociência e Educação, fundamental para sua prática seja de intervenção, seja na pesquisa. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Problemas relacionados à natureza da Ciência e Neuroeducação Durante o percurso formativo dessa disciplina buscamos apresentar as diversas perspectivas sobre o entendimento de como o conhecimento é produzido. Vimos, ainda, que a sistematização de métodos e os próprios conceitos de conhecimento e Ciência são diversos, que algumas teorias se “confrontam” em suas premissas, outras, articulam-se. Porém, o mais importante sobre tudo o vimos até aqui é que nós, humanos, somos peça-chave em qualquer que seja a perspectiva, afinal, ou pensamos o método, ou somos submetidos à natureza, ou transformamos a natureza, enfim, a produção de conhecimento e a busca pelo esclarecimento dele, seja em sua produção/processo, seja em conceito é uma ação humana que é permeada por diferentes elementos. Portanto, conhecer as diferentes perspectivas e refletir criticamente sobre o que elas nos oferecem é essencial para o profissional da educação com vistas Atuação interdisciplinar e Neuroeducação34 à neuroeducação. Afinal, é complexa a relação que se estabelece nesse campo em decorrência, como vimos, da articulação de diferentes áreas que abordam diferentes questões e que, mesmo objetivas diante de suas especificidades, acabam subjetivas quando transportadas para a neuroeducação. REFLITA: Vejam algumas questões pertinentes: Sabemos que com os exames de imagem é possível identificar o local no cérebro que “acende” quando o indivíduo recebe uma ordem, ou seja, desses exames podemos identificar o resultado da ação exterior no interior biológico-anatômico do indivíduo. Entretanto, de que forma essa informação nos serve na neuroeducação? Seria nosso objetivo “acender” essa parte do cérebro do estudante? Quais atividades permitiriam “acender” esse local cerebral? Ainda, o que “acender” esse local específico contribuiria com a aprendizagem e o desenvolvimento do estudante? Essas são questões válidas que exemplificam um dos problemas da própria natureza da ciência e suas finalidades. Podemos identificar a neurociência como uma ciência natural, descritiva, que tem como finalidade, a princípio, descobrir e descrever as estruturas e o funcionamento neurológico. Já a Educação, ao contrário, é artificial e normativa, não se satisfaz pela descrição do natural, pretende criar, transformar, modelar, intervir, mediante objetivos específicos. Ainda, temos a psicologia que, de certa forma, aproxima-se Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 35 mais da educação, pois, no campo terapêutico também é interventiva, mas, também privilegia a descrição de “como os processos psíquicos acontecem”, como se estabelecem a relação entre o que é biológico (cérebro) com o que é psicológico (mente) e como essa relação se manifesta (comportamento). Novamente, ao se aproximar da psicologia, a educação questiona: Como transformar, qualificar, potencializar, substituir, enfim, como intervir para que a relação cérebro-mente- comportamento apresente resultados normativos, aqueles que propomos enquanto objetivos de aprendizagem? Outro problema, portanto, estaria nos níveis de análise. A neurociência estuda as funções cognitivas em um sistema isolado, já a Educação considera as funções cognitivas em todo um sistema de plural, permeado de diferentes e diversas interações, no qual, o “cérebro” é um dos elementos, e não o centro da questão. Dessa afirmação a questão que resulta é: Sabendo que Piaget, Vygotsky, Wallon e tantos outros teóricos já discutiram e que já é “sedimentada” a importância do cérebro na aprendizagem, por quê precisaríamos de uma outra ciência, de uma outra área? Talvez aqui, no terceiro problema é que possamos esboçar uma resposta. O terceiro problema reside no campo da linguagem e diz respeito a necessidade de traduz os conteúdos das duas ou três áreas para uma teoria interdisciplinar que, como vimos, vem a ser chamada de neuroeducação. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação36 IMPORTANTE: Enquanto a neurociência evoca conceitos da natureza do sistema nervoso – elétrica, química, espacial, temporal, entre outras; a psicologia evoca as questões da pisque, a educação se debruça no campo da aprendizagem. Nesse sentido, a neuroeducação nos permitiria, como exemplo, o seguinte percurso de ação: Exemplo: Observe a imagem: Figura 9: Produção de texto Fonte: Acervo da autora (2019) Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 37 Trata-se da produção de texto de um estudante do terceiro ano do ensino fundamental. Ao perceber que ele, apesar dos esforços do professor em termos de metodologia, não avança, a neuroeducação nos permitiria as seguintes questões: - Esse aluno tem algum transtorno/distúrbio de aprendizagem? – Para essa resposta a neurociência proveria os seguintes dados: RESPOSTA AFIRMATIVA: Sim. Então, o professor saberia que esse estudante tem questões relacionadas à estrutura biológica de seu cérebro que dificulta seu processo de aprendizagem. RESPOSTA NEGATIVA: Não. Então, o professor saberia que, talvez, outros fatores precisam ser revistos, como: a condição do espaço da sala está propícia para a aprendizagem desse aluno? A metodologia está em consonância com suas necessidades? Aqui, portanto, a neurociência em aproximação com a percepção dos elementos externos que influenciam o global do estudante forneceria elementos básicos do funcionamento do cérebro, como: está escuro? O aluno consegue enxergar do local onde está sentado? Há algo que prejudique sua atenção? Portanto, tanto a neurociência quanto a psicologia, tampouco a neuroeducação, assumiriam um caráter “prescritivo” para a ação docente, mas sim, se retornarmos a perspectiva de Bachelar, nos permitiriam “falsear” as afirmações/verdades, para que pudéssemos avançar em novas possibilidades e novos caminhos. Assim, para o sucesso da neuroeducaçãoé necessário compreender e lidar com expectativas realistas em relação ao que cada ciência dispõe. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação38 Cérebro e Aprendizagem Nessa perspectiva de “expectativas realistas ao que cada ciência propõe”, é possível indicar alguns avanços promovidos pela neuroeducação. Primeiramente que, com o destaque dessa “nova ciência” que, como vimos, não é tão nova assim, voltou-se a discutir questões biológicas, psicológicas e comportamentais no processo de ensino- aprendizagem. Estando em destaque, a neurociência retomou e evidenciou relações que já compunham o campo de formação do professor, mas que, poderiam estar sublimadas. Ao se debruçar nas questões da relação biológica com a aprendizagem do estudante, a neuroeducação contribuiu com evidências – exames, imagens, testagens – que permitem superar qualquer dúvida sobre a influência de uma na outra, por exemplo, não cabe mais discutir que uma criança com deficiência intelectual pode aprender, porém, é necessário que a educação busque caminhos para esse processo e considere seu componente biológico. Assim, a neuroeducação contribui para, à luz das investigações da neurociência, pensar a aprendizagem e sua íntima e inegável relação com o substrato biológico, resultando na: “[...] compreensão dos mecanismos do cérebro que estão na base da aprendizagem e da memória, e dos efeitos da genética, do ambiente, das emoções e da idade em que se aprende, pode ser transformada em estratégias educacionais [...]” (BLAKEMORE & FRITH, 2009, p. 11), para a qualificação da aprendizagem. É fato que esse percurso não está findado e que poderíamos listar e refletir sobre diversas possibilidades da neuroeducação, porém, a perspectiva que trazemos é essa: a de que você, estudante que irá atuar com Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 39 os subsídios da neuroeducação tenha criticidade e busque sempre fundamentação para a sua prática. RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que a sistematização de métodos e os próprios conceitos de conhecimento e Ciência são diversos, que algumas teorias se “confrontam” em suas premissas, outras, articulam-se e que, o mais importante sobre tudo o vimos até aqui é que nós, humanos, somos peça-chave em qualquer que seja a perspectiva, afinal, ou pensamos o método, ou somos submetidos à natureza, ou transformamos a natureza, enfim, a produção de conhecimento e a busca pelo esclarecimento dele, seja em sua produção/ processo, seja em conceito é uma ação humana que é permeada por diferentes elementos. Ainda, evidenciamos a necessidade de se conhecer as diferentes perspectivas e refletir criticamente sobre o que elas nos oferecem enquanto neuroeducadores. Afinal, é complexa a relação que se estabelece nesse campo em decorrência, como vimos, da articulação de diferentes áreas que abordam diferentes questões e que, mesmo objetivas diante de suas especificidades, acabam subjetivas quando transportadas para a neuroeducação. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação40 Últimas considerações [Ao término deste capítulo esperamos que você compreenda os caminhos para a neuroeducação no campo da pesquisa científica, bem como, esperamos que você possa identificar as características de estrutura que está em voga na atualidade. Ainda, esperamos que você identifique o dinamismo desses processos, compreendendo-os como perspectivas e não como verdades ou “receitas”. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Caminhos para a neuroeducação Como vimos, a ciência e o conhecimento seguem juntas. Assim, é necessário pensar como a pesquisa se faz necessária à neuroeducação. Como os dados, observações e análises das diversas áreas que se articulam podem ser sistematizados para que os resultados indiquem caminhos éticos para a ação perante os problemas, desafios e objetivos identificados e/ou propostos. Neste contexto, vimos várias possibilidades de como áreas e correntes já estabelecidas indicam ser possível, metodologicamente, contribuir para a construção e evolução do conhecimento, no nosso caso, da neuroeducação. Cabe, agora, compreender que as normas metodológicas são variadas e que podem envolver um ou mais métodos científicos, principalmente no caso da interdisciplinaridade inerente à neuroeducação. Seguimos, portanto, a lógica que é a análise, revisão, transformação e reinterpretação que permite a ciência ser possível nessa área. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 41 Então, mais que respostas, temos perguntas que orientam essa construção do conhecimento: O que é pesquisa? Qual o melhor direcionamento? O que justifica essa pesquisa? Como serão obtidas as informações dessa pesquisa? Como os dados e evidências serão tratados e analisados? Indiferente das respostas que você esboce para cada uma dessas questões, há elementos que devem estar presentes em qualquer caminho seguido, que vermos a seguir. Ética na relação com os serem humanos: Consiste na necessidade de fundamentação teórica dos valores vividos de forma prática por uma sociedade. Tem suas premissas baseadas pelo Código Nuremberg e Declaração de Helsinque. SAIBA MAIS: Acesse na íntegra o Código de Nuremberg e a Declaração de Helsinque nos links: h t t p : // w w w . b i o e t i c a . o r g . b r / ? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=2 e h t t p : // w w w . b i o e t i c a . o r g . b r / ? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=4 Assim, na realização das pesquisas é necessário: 1) O consentimento voluntário dos participantes. 2) A fundamentação de vantagem à sociedade dos resultados. 3) A condução por pesquisadores/pessoas qualificadas em termos de estudo e formação. 4) É prioridade que todo sofrimento e danos desnecessários sejam evitados. http://www.bioetica.org.br/? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=2 http://www.bioetica.org.br/? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=2 http://www.bioetica.org.br/? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=4 http://www.bioetica.org.br/? siteAcao=DiretrizesDeclaracoesIntegra&id=4 Atuação interdisciplinar e Neuroeducação42 Assim, cabe ao pesquisador: a) Proteção integral do participante, ou seja, sua vida, saúde, dignidade e integridade. b) O projeto e os métodos devem atender os protocolos reconhecidos e ter como base a literatura que se aprofunda no tema da pesquisa. Podemos resumir essas indicações em quatro eixos: Justiça como equidade- equidade na distribuição dos benefícios Bene�cência - Ponderação entre os riscos e os benefícios. Autonomia - o consentimento livre e esclarecido dos sujeitos e a proteção a grupos vulneráveis. Não male�cência - garantia de que os danos previsíveis serão evitados. Figura 10: Eixo das pesquisas em seres humanos Fonte: Elaborada pela autora (2019) Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 43 Conjunto de práticas de ação adotadas pela comunidade científica Essas regras e normas são oriundas da comunidade científica, que é autorreferente e autorregulada. Tem como princípios: primazia, avanço do conhecimento e reprodutibilidade. Sendo: Primazia: quem publica o primeiro artigo sobre o tema, tem o crédito da descoberta (ou da invenção) Avanço do conhecimento: todo artigo científico deve conter um resultado inédito e relevante para a Ciência Reprodutibilidade: todo experimento publicado deve ser replicável por outrem. (MARINHO, 2005, online) Portanto, em Neuroeducação, os trabalhos científicos estão centrados em todos os procedimentos da pesquisa científica, procurando fornecer soluções às perguntas levantadas e atendendo todo o rigor científico para cada temática levantada e ou para estudo de caso tratado. E, na atualidade, pode-se perceber um avanço nas pesquisadascentradas no desenvolvimento pessoal para melhorar a capacidade de aprendizagem, qualidade de vida, transtornos e distúrbios da aprendizagem, entre outros que se fazem presentes diante da necessidade social. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação44 RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que na neuroeducação a ciência e o conhecimento seguem juntas. Sendo necessário, portanto pensar sobre e como os dados, observações e análises das diversas áreas que se articulam e como podem ser sistematizados para que os resultados indiquem caminhos éticos para a ação perante os problemas, desafios e objetivos identificados e/ou propostos nessa área. Vimos ainda que, as normas metodológicas são variadas e que podem envolver um ou mais métodos científicos, principalmente no caso da interdisciplinaridade inerente à neuroeducação. E que, portanto, a lógica que é a análise, revisão, transformação e reinterpretação é o que permite a ciência ser possível nessa área. Também indicamos que, indiferente do caminho a ser seguido, o princípio ético é fundamental, sendo esse compreendido como a necessidade de fundamentação teórica dos valores vividos de forma prática por uma sociedade. Atuação interdisciplinar e Neuroeducação 45 BIBLIOGRAFIA Ribeiro, L.O.M.; Timm, M.I.; Becker, F. e Zaro, M.A. (2005). Monitoramento da atividade cognitiva através de EEG e seu uso potencial na avaliação de ambientes virtuais de aprendizagem e simuladores. Em: COPEC - Conselho de Pesquisas em Educação e Ciências (Org.), Anais, GCTE 2005 - Global Congress on Engineering and Technology Education 2005 (pp. 1386-1390). Santos: UNISANTOS. Tokuhama-Espinosa, T. N. (2008). The scientifically substantiated art of teaching: a study in the development of standards in the new academic field of neuroeducation (mind, brain, and education science). Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Educação, Capella University, Mineápolis, Minesota. FAZENDA, Ivani C. Integração e interdisciplinaridade no ensino brasileiro: efetividade ou ideologia. São Paulo: Loyola, 1979. GADOTTI, Moacir. A organização do trabalho na escola: alguns pressupostos. São Paulo: Ática, 1993. _________. Interdisciplinaridade: atitude e método. São Paulo: Instituto Paulo Freire. Disponível: <www.paulofreire.org>. Acesso em: 10 out. 2019. 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