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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Cieˆncias Exatas Departamento de Matema´tica Como NA˜O Resolver Exerc´ıcios Teo´ricos Apresentamos alguns exemplos de racioc´ınios incorretos e das fala´cias mais frequ¨ente- mente usadas pelos estudantes ao resolver problemas matema´ticos. As consequ¨eˆncias de um racioc´ınio errado podem ser graves: uma ponte que desaba, um reator nuclear que explode, um roboˆ que mata seres humanos, um governo corrupto que e´ eleito, etc. Certamente espera-se de um profissional formado em uma universidade que ele seja capaz de raciocinar. Erro 1 Gostar´ıamos de comec¸ar mostrando que, diferente do que voceˆ sempre soube, ou diferente do que disseram para voceˆ e voceˆ inocentemente acreditou, temos que 2 = 1. De fato, seja a = b. Enta˜o a2 = ab a2 − b2 = ab− b2 (a+ b)(a− b) = b(a− b) a+ b = b 2b = b 2 = 1. Convencido? E pensar que voceˆ passou quase 20 anos da sua vida achando que 2 era diferente de 1... Bom, na verdade 2 realmente na˜o e´ igual a 1. Evidentemente existe um erro no racioc´ınio acima. Voceˆ consegue descobrir qual e´ o erro? Pense. Pense bastante! Sera´ que ha´ algum erro de lo´gica no racioc´ınio acima? Sera´ que foi usada alguma propriedade dos nu´meros que na˜o e´ va´lida, ou talvez alguma propriedade dos nu´meros foi utilizada de maneira erroˆnea? Ou vai ver, depois de uma meditac¸a˜o profunda, como provado acima, chega-se realmente a` conclusa˜o que 2 e´ realmente igual a 1, e que a realidade na˜o passa de uma ilusa˜o e sabe-se la´ mais o que. Se voceˆ ja´ conseguiu achar o erro, ou mesmo, se depois de pensar bastante, voceˆ na˜o conseguiu descobrir qual e´ o erro contido no racioc´ınio acima, vire a pa´gina. Talvez voceˆ tenha uma surpresa... 1 Vamos analizar passo a passo o racioc´ınio acima. Comec¸amos inicialmente fazendo a hipo´tese a = b. Na˜o ha´ nada que pro´ıba a gente de fazer esta hipo´tese. Estamos simplesmente dizendo que as letras a e b se referem ao mesmo nu´mero. Podemos, por exemplo, escolher simbolizar o nu´mero 5 pela letra a e tambe´m pela letra b: a = 5; b = 5; e neste caso certamente temos a = b. Outra maneira de dizer isso, e´ que estamos atribuindo a`s varia´veis a e b o mesmo valor, ou seja, 5. Para efeitos do racioc´ınio da pa´gina anterior, em nenhum momento foi importante saber qual o valor de a e b (ou foi?), apenas que a e b tinham o mesmo valor. Na˜o ha´ nenhum erro de lo´gica aqui. Em seguida, multiplicamos ambos os lados da igualdade por a e afirmamos que a igual- dade se mantinha: aa = ab. Na verdade, ao inve´s de escrevermos aa no lado esquerdo da equac¸a˜o, escrevemos a2: a2 = ab. mas esta e´ apenas uma forma abreviada de se escrever aa e na˜o tem a menor importaˆncia. Existe alguma du´vida de que a igualdade se mante´m quando multiplicamos ambos os lados de uma equac¸a˜o pelo mesmo nu´mero? Quando multiplicamos duas coisas iguais pelo mesmo nu´mero, obtemos nu´meros iguais. Ou seja, por exemplo, t´ınhamos antes 5 = 5, e multiplicamos ambos os lados desta equac¸a˜o por 5 (pois a = 5). Em cada lado obtemos 25 e obviamente a igualdade se mante´m: 25 = 25. Alguma du´vida? Isso e´ pura lo´gica. Certamente o erro no racioc´ınio, se e´ que existe algum, na˜o esta´ aqui. No pro´ximo passo, subtra´ımos de ambos os lados da equac¸a˜o o nu´mero b2, obtendo a2 − b2 = ab− b2 Isso tambe´m e´ verdade: quando subtra´ımos coisas iguais de coisas iguais, a igualdade se mante´m. Ou seja, por pura lo´gica, conclu´ımos que tambe´m neste passo na˜o ha´ erro. 2 No passo seguinte, fatoramos as expresso˜es de ambos os lados. No lado esquerdo temos o produto nota´vel: a2 − b2 = (a+ b)(a− b), e no lado esquerdo simplesmente colocamos o nu´mero b em evideˆncia: ab− b2 = (a− b)b = b(a− b). As fatorac¸o˜es em ambos os lados da equac¸a˜o esta˜o corretas, decorrendo de propriedades satis- feitas pelos nu´meros reais (ate´ onde sabemos), que sa˜o a distributividade e a comutatividade. Portanto, podemos realmente concluir que (a+ b)(a− b) = b(a− b). Em seguida, notando que em ambos os lados da equac¸a˜o temos dois produtos envolvendo um termo comum, isto e´, a−b, cancelamos ou elimininamos este termo comum, simplificando a expressa˜o: a+ b = b. O que nos da´ o direito de fazer isso? E´ realmente uma propriedade satisfeita pelos nu´meros reais que sempre que temos xz = yz, podemos cancelar o z obtendo x = y? Descrevendo isto de outro modo, se temos dois nu´meros x e y tais que o produtos de cada um deles pelo nu´mero z da´ o mesmo nu´mero (xz = yz), sera´ que isso so´ e´ poss´ıvel se os nu´meros x e y forem o mesmo nu´mero? Na verdade, na˜o. Isso vai depender do nu´mero z. Se z for igual a 0, enta˜o, apesar de que xz = yz, na˜o precisamos ter necessariamente x = y. Isso se deve ao fato de que qualquer nu´mero multiplicado por 0 e´ igual a 0. Assim, poder´ıamos muito bem ter x = 3, y = 4, portanto x 6= y, z = 0, portanto xz = 3 · 0 = 0 = 4 · 0 = yz. A chamada “lei do cancelamento” dos nu´meros que permite cancelar z de ambos os lados da equac¸a˜o so´ vale se z 6= 0. Ela e´ uma consequ¨eˆncia lo´gica do fato de todos os nu´meros 3 diferentes de 0 possu´ırem inversos multiplicativos. Em outras palavras, quando z 6= 0, no´s podemos dividir ambos os lados da equac¸a˜o xz = yz por z (o que equivale a multiplicar ambos os lados da equac¸a˜o por 1/z, que e´ o inverso multiplicativo de z, isto e´, o nu´mero que multiplicado por z produz o nu´mero 1) para obter x = y. Se z = 0, na˜o podemos dividir os lados da equac¸a˜o por z, pois na˜o faz sentido dividir por 0. Voltando a` ana´lise da equac¸a˜o (a+ b)(a− b) = b(a− b), perguntamos novamente se podemos dividir ambos os lados da equac¸a˜o por a − b. Como acabamos de ver, so´ podemos fazer isso se a− b 6= 0. Mas, se lembrarmos o in´ıcio do nosso racioc´ınio, a nossa hipo´tese inicial era que a = b. Isso significa que a− b = 0 e na˜o podemos cancelar o termo a − b de ambos os lados da equac¸a˜o. Este foi o erro do nosso racioc´ınio: dividimos ambos os lados da equac¸a˜o por 0. Portanto, podemos nos sentar confortavelmente e voltar a viver as nossas vidas, com a nossa crenc¸a de que 2 e´ diferente de 1 inabalada... Observac¸a˜o. O passo seguinte a a+ b = b, envolveu substituir a por b; ja´ que eles representam o mesmo nu´mero, na˜o ha´ nada que impec¸a isso do ponto de vista lo´gico. Fazendo isso, obtivemos no lado esquerdo da equac¸a˜o a+ b = b+ b = 2b, e portanto chegamos a` equac¸a˜o 2b = b e dividimos por b para obter 2 = 1. Novamente, para que na˜o houvesse um erro de divisa˜o por 0 aqui, ter´ıamos que colocar ale´m da nossa hipo´tese inicial a = b, outra hipo´tese inicial extra: que b (e portanto tambe´m a, ja´ que eles representam o mesmo nu´mero) e´ um nu´mero diferente de 0. Isso, pore´m, e´ irrelevante agora, ja´ que antes de chegar neste ponto o nosso racioc´ınio ja´ estava incorreto. O exemplo que acabamos de discutir mostra um erro de racioc´ınio comum: utilizar uma propriedade de forma erroˆnea, em uma situac¸a˜o onde ela na˜o e´ va´lida (a lei do cancela- mento na˜o vale se o fator e´ o nu´mero 0) . No pro´ximo exemplo, veremos um erro de lo´gica frequ¨entemente encontrado em provas, nas resoluc¸o˜es de questo˜es teo´ricas pelos estudantes de GAAL. 4 Erro 2 Um modo comumente empregado na demonstrac¸a˜o de certas fo´rmulas que envolvem um termo simples de um lado e um termo complicado do outro e´ desenvolver o lado mais com- plicado ate´ chegar no lado mais simples. A`s vezes, os dois lados sa˜o igualmente complicados e pode na˜o ser claro qual dos lados e´ o mais simples; neste caso, geralmente se desenvolve ambos os lados ate´ chegar em uma expressa˜o comum. Outra estrate´gia empregada por alguns alunos (mas na˜o recomendada) e´ tentar simplificar a equac¸a˜o atrave´s de operac¸o˜es permiss´ıveis ate´ chegar em umaequac¸a˜o que e´ obviamente verdadeira (por exemplo, do tipo a = a); da´ı se conclui que a expressa˜o ou equac¸a˜o original tambe´m era verdadeira. Cuidado especial tem que ser usado quando se usa este procedimento pouco recomenda´vel (porque em geral ele na˜o explica como se chegou a` fo´rmula que se quer provar, logo e´ uma demonstrac¸a˜o que pouco ensina, apenas prova que a fo´rmula e´ verdadeira). Quando se passa de uma linha para a outra, devemos nos preocupar em verificar se as linhas sa˜o logicamente equivalentes. Frequ¨entemente se confunde o significado do s´ımbolo ⇒ (implica) com o s´ımbolo ⇔ (se e somente se). Por exemplo, vejamos como a falta de cuidado pode levar a` demonstrac¸a˜o de resultados patentemente absurdos. Vamos provar o que poder´ıamos chamar de a fo´rmula universal : quaisquer que sejam os nu´meros a e b, sempre temos a = b. De fato, a = b a · 0 = b · 0 0 = 0. Como 0 = 0 e´ verdade, a equac¸a˜o original tambe´m e´ verdade. Em particular, conclu´ımos que tudo e´ igual a tudo e na˜o precisamos provar mais nada. Sempre que pedirem para a gente provar que uma certa fo´rmula e´ verdadeira, basta invocar a fo´rmula universal que afirma que a = b quaisquer que sejam a e b. Certamente Einstein na˜o precisava perder tanto tempo para mostrar que E = mc2... O problema aqui esta´ na passagem da equac¸a˜o a = b, que queremos provar, para a equac¸a˜o a · 0 = b · 0. Certamente a primeira implica a segunda, mas a segunda na˜o implica a primeira (o produto de quaisquer nu´meros e´ sempre igual a 0, na˜o importa se eles sa˜o iguais ou diferentes); elas na˜o sa˜o logicamente equivalentes. Logo a validade da segunda equac¸a˜o na˜o diz nada sobre a validade da primeira. Em uma cadeia de implicac¸o˜es lo´gicas, a u´ltima equac¸a˜o ser verdadeira implicara´ que a primeira tambe´m e´, somente se a passagem de uma equac¸a˜o para a outra desde a primeira ate´ a u´ltima for sempre do tipo “se e somente se”, ou seja, cada equac¸a˜o e´ logicamente equivalente a` anterior. Caso este princ´ıpio lo´gico simples seja esquecido, qualquer coisa no mundo pode ser provada verdadeira por mais falsa que seja, como acabamos de ver. 5 O melhor conselho para evitar erros deste tipo e´ escrever com palavras o que voceˆ esta´ fazendo. A matema´tica na˜o e´ somente uma colec¸a˜o de s´ımbolos, como muitas pessoas imag- inam. Muitos alunos se equivocam e acham que matema´tica nada mais e´ que a manipulac¸a˜o de s´ımbolos. Na verdade, saber manipular s´ımbolos e´ importante para realizar qualquer atividade matema´tica (pois s´ımbolos sa˜o a linguagem da matema´tica, e saber manipula´-los e´ como saber usar a grama´tica da l´ıngua, saber como escrever palavras e frases), mas na˜o e´ isso que caracteriza a matema´tica. A matema´tica e´ uma colec¸a˜o de ide´ias e o trabalho matema´tico consiste em entender e saber manipular estas ide´ias, ter a capacidade de derivar novas ide´ias a partir de ide´ias antigas e ver as consequ¨eˆncias das ide´ias presentes. Portanto, exponha as suas ide´ias claramentes. Sempre que puder, escreva palavras. So´ isso mostra que voceˆ esta´ entendendo do que esta´ falando. Na˜o escreva apenas s´ımbolos, ou seu texto vai parecer uma colec¸a˜o de hieroglifos eg´ıpcios desprovidos de qualquer significado (ate´ mesmo para voceˆ). Depois de colocar o seu racioc´ınio no papel, leia o que voceˆ escreveu e veja se realmente esta´ intelig´ıvel, se qualquer pessoa pode leˆ-lo. Se na˜o, e´ bem prova´vel que o seu racioc´ınio esconde erros de lo´gica ou de uso das propriedades dos objetos com que voceˆ esta´ lidando neste problema e, bem provavelmente, o seu racioc´ınio esta´ totalmente incorreto. Erro 3 Um erro bastante comum entre os alunos e´ tentar provar a validade de um fato atrave´s de um exemplo. A seguinte histo´ria, baseada em fatos reais, tem como intenc¸a˜o ilustrar este erro graficamente. O grande sa´bio Shpipock, membro da Academia de Cieˆncias de Wulkan (ACW) resolveu fazer uma pesquisa sobre os quadru´pedes do planeta Terra. Tendo conseguido financiamento atrave´s da Ageˆncia Financiadora de Pesquisas de Wulkan (tambe´m conhecida, por motivos desconhecidos, como CNPqW), ele adquiriu uma nave espacial e zarpou rumo ao planeta Terra. Shpipock na˜o esperava descobrir nada de muito interessante ou relevante em sua viagem, apesar da vida animal terrestre ser totalmente desconhecida em Wulkan; se tivesse sorte talvez encontrasse quadru´pedes com antenas ou com penas, mas no ma´ximo iria render uns bons dois ou treˆs artigos em revistas cient´ıficas de renome. Qual na˜o foi a sua surpresa, enta˜o, quando, ao descer de sua nave, ele se deparou com um ca˜o com apenas treˆs patas! [Nota do Editor: o animal sofrera um acidente e ficou aleijado, mas Shpipock na˜o sabia disso.] Usando a sua infal´ıvel lo´gica wulkaniana, sem pensar duas vezes, Shpipock concluiu, exclamando em voz alta: – Na˜o ha´ quadru´pedes no planeta Terra! Quase imediatamente, Shpipock entrou de volta na sua nave e trac¸ou um curso de volta para o sistema Wulkan. Shpipock mal podia esconder o seu excitamento. Ele estava prestes a dar uma confereˆncia que abalaria os alicerces da cieˆncia wulkaniana e certamente faria a sua reputac¸a˜o para todas as gerac¸o˜es futuras ate´ o fim do Universo. No mı´nimo ganharia um preˆmio Wobel. 6 Ao chegar em Wulkan, Shpipock imediatamente convocou uma reunia˜o extraordina´ria da ACW. Em voz solene, ele declarou perante a assemble´ia: – Minhas pesquisas levaram-me a concluir que na˜o existem quadru´pedes no planeta Terra. Houve comoc¸a˜o geral entre os presentes. Ate´ enta˜o, nenhum planeta habitado havia sido encontrado em que na˜o houvesse formas de vida com quatro patas. Alguns cientistas teo´ricos haviam hipotetizado que poderiam existir planetas em que todas as formas de vida tivessem um nu´mero ı´mpar de membros de locomoc¸a˜o, mas eles eram considerados exceˆntricos pela maioria dos pesquisadores se´rios; a teoria aceita era que todo planeta tinha pelo menos uma forma de vida quadru´pede. Esta descoberta revoluciona´ria certamente abalava o paradigma existente e criava novos e excitantes campos de investigac¸a˜o. Em meio a toda aquela comoc¸a˜o, o sa´bio Uorfi, professor visitante do planeta Chlinghon, tomou a palavra e corajosamente interpelou Shpipock: – Mas um u´nico exemplo na˜o e´ prova de um fato geral!!! Os demais cientistas, todos wulkanianos, na˜o puderam deixar de rir. Os chlinghoneses na˜o eram particularmente conhecidos como um povo culto e inteligente. Que provas mais ele precisava? Na˜o havia visto a prova que Shpipock trouxera da Terra? ([Nota do Editor: Shpipock, e´ claro, havia tido o cuidado especial de tirar uma holografia do espe´cimen tr´ıpede que encontrara, antes de voltar para Wulkan, para provar as suas concluso˜es, e holografias na˜o podem ser forjadas, como qualquer cientista versado em teoria fotoholotroˆnica bem sabe.] A declarac¸a˜o certamente precipitada de Uorfi apenas comprovava o que todos sabiam: o parco conhecimento de lo´gica que aqueles seres pouco sofisticados possu´ıam. Mas, como os wulkanianos na˜o gostavam de ser acusados de imparciais e como Uorfi estava sendo muito insistente, a ACW decidiu enviar uma nova expedic¸a˜o, liderada pelo pro´prio Uorfi, a convite da Academia. Para surpresa de todos, depois de uma viagem relativamente curta, Uorfi voltou com um exemplar da mesma espe´cie que Shpipock descobrira, mas com 4 patas! Na verdade, Uorfi havia encontrado va´rios outros exemplos de quadru´pedes na Terra, mas ele sabia que pela lo´gica, bastava um contra-exemplo para provar que uma afirmativa era falsa, logo ele se contentou em apresentar apenas um exemplo de uma forma de vida quadru´pede da Terra. O pobre Shpipock na˜o podia entender o que havia de errado com o seu racioc´ınio. Em que ele falhara? Desgostoso, resolveu mudar de profissa˜o e tentar uma vaga como deputado federal na Assemble´iaLegislativa da Gala´xia, ja´ que a profissa˜o de pol´ıtico naquela parte do Universo, diferente de outros lugares, na˜o exigia particularmente o uso do ce´rebro. MORAL DA HISTO´RIA: Para provar que uma afirmac¸a˜o e´ verdadeira, na˜o basta um exemplo, dois exemplos ou um milha˜o de exemplos; nem mesmo infinitos exemplos sa˜o suficientes. E´ poss´ıvel que exista uma quantidade infinita de casos particulares para os quais a afirmac¸a˜o seja verdadeira, mas mesmo assim existam casos em que ela na˜o se verifica. Por outro lado, para provar que uma afirmac¸a˜o e´ falsa, basta exibir um u´nico contra-exemplo. Assim, por exemplo, a proposic¸a˜o “todas as matrizes sa˜o invert´ıveis” e´ falsa, apesar de 7 existir um nu´mero infinito de matrizes invert´ıveis: todas as matrizes da forma A = ( a 0 0 a ) , onde a e´ qualquer nu´mero real diferente de 0, sa˜o invert´ıveis; de fato a inversa de A e´ A−1 = 1a 0 0 1 a . Como existem infinitos nu´meros reais, existem infinitas tais matrizes. No entanto, dizer que todas as matrizes sa˜o invert´ıveis e´ falso. Um contra-exemplo e´ a matriz nula: A = ( 0 0 0 0 ) . Erro 4 Finalmente, o u´ltimo erro que vamos comentar e´ o erro de confundir o que se sabe com o que se quer provar (confundir a hipo´tese com a tese). Por exemplo, suponhamos que queiramos provar a seguinte afirmativa Se AB e´ invert´ıvel, enta˜o A e´ invert´ıvel e B e´ invert´ıvel. Tudo o que sabemos aqui e´ que o produto AB das matrizes A e B e´ uma matriz invert´ıvel. Na˜o sabemos em princ´ıpio se as matrizes A e B sa˜o elas pro´prias invert´ıveis (sabemos que o produto de matrizes invert´ıveis e´ uma matriz invert´ıvel; mas nada pro´ıbe, em princ´ıpio, que o produto de duas matrizes na˜o invert´ıveis possa ser uma matriz invert´ıvel). Em outras palavras, na˜o sabemos se as inversas A−1 ou B−1 existem. Na verdade, e´ exatamente isso que queremos provar! Um exemplo de um racioc´ınio completamente equivocado para provar esta afirmac¸a˜o e´ o seguinte: “como (AB)−1 = B−1A−1, segue que ABB−1A−1 = I A(BB−1)A−1 = I AIA−1 = I AA−1 = I logo A e´ invert´ıvel.” Essencialmente, existem duas maneiras diferentes (envolvendo argumentos distintos que na˜o teˆm relac¸a˜o nenhuma um com o outro) de se demonstrar de maneira correta a afirmativa acima. Veja se voceˆ consegue descobrir as duas. 8
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