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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO PEDAGOGIA – 8ºBLOCO EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS -EJA Prof. Me. José Adersino Alves de Moura CADERNO DE TEXTOS UNIDADE I 2022 GOVERNO DO ESTADO DO PIAUÍ UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – UESPI CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCACAÇÃO, COMUNICAÇÃO E ARTES - CCECA COORDENAÇÃO DO CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA PLANO DE CURSO 1. IDENTIFICAÇÃO CURSO: LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA TURNO: NOITE DISCIPLINA: EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS CARGA HORÁRIA: 60h/a CÓDIGO: 3740 PERÍODO LETIVO: 2021.2 PROFESSOR Me JOSÉ ADERSINO ALVES DE MOURA 2. EMENTA: Estudo dos princípios legais, das políticas e das práticas formais para a educação de jovens e adultos; análise da problemática histórica, social e ideológica do analfabetismo de jovens e adultos no Brasil; estudo das contribuições específicas de Paulo Freire, Emília Ferreiro e Álvaro Pinto. 3. OBJETIVOS Problematizar a realidade educacional brasileira, tendo como foco os significados que tem a educação de jovens e adultos - EJA para os sujeitos do processo; Conhecer e analisar o papel social, político e cultural, bem como o contexto histórico, as políticas públicas e os desafios presentes na EJA no contexto atual; Discutir diferentes concepções e características da EJA; bem como suas possibilidades curriculares e diferentes abordagens teorico - metodológicas. 4. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO: UNIDADE I: ESCOLARIZAÇÃO E CIDADANIA 1.1 Conceito, concepções e relações da Educação de Jovens e Adultos - educação ao longo da vida e educação popular; 1.2 Escolarização de Jovens e Adultos no Brasil: contexto histórico; 1.3 O direito à Educação de Jovens e Adultos; UNIDADE 2: POLÍTICA EDUCACIONAL PARA A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS 2.1 Política para a Educação de Jovens e Adultos: processo histórico, consolidação, financiamento e desafios; 2.2 Interface da Educação de Jovens e Adultos com a educação profissional. UNIDADE 3: ESPECIFICIDADES DOS SUJEITOS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS 3.1 Os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos: o professor e do aluno; 3.2 Pressupostos teórico-metodológicos da Educação de Jovens e Adultos; 3.3 Epistemologia da Educação de Jovens e Adutos em Paulo Freire. 5. METODOLOGIA: Exposição dialogada, videoaulas, apresentações discente/docentes, discussão e análise de textos históricos e /ou técnicos através de Estudo dirigido e metodologias ativas, painel integrado, seminários, estudo de caso, videoaulas, videoconferências, trabalhos individuais e em grupo, exposição de vídeos e filmes, outros. 6. RECURSOS DIDÁTICOS Quadro e Pincel, Data Show, filmes, vídeos, fotografias, gravuras, animações; plataformas de aprendizagem virtual: google meet, google classroom; aplicativo WhatsApp, links do youtube, OBS Studio, Blogs, aplicativos de mensagens, textos técnicos e /ou científicos, desktops, notebook, smartphones, outros. 7. AVALIAÇÃO: Quantitativa: três avaliações propostas ao longo das 60h/a, ao final de cada unidade, através de prova escrita e/ ou prova escrita complementada por outras atividades, conforme quadro abaixo - (até 10,0 para a média da prova e/ou das atividades propostas); Qualitativa: através da participação e interesse do aluno em sala; discussões em grupo; pontualidade nas diversas atividades. Média de Aprovação e Frequência: conforme normas da Universidade, a média de aprovação será igual ou superior a 07 (sete), numa escala de 0 (zero) a 10 (dez) e a frequência obrigatória mínima será de 75% (setenta e cinco por cento) do total da carga horária da disciplina. OBS.: Independente da pontuação data às atividades propostas de forma síncronas ou assíncronas, através do Google Sala de Aula no G. Suíte, ela sempre será reduzida ao intervalo de 0(zero) a 10(dez). A frequência e demais intervenções avaliativas e metodológicas, obedecerão ao disposto na Resolução CEPEX 020/2020 de 17/08/2020. ATIVIDADE CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO Leituras/ Fichamentos/ Produção de textos; Debates avaliativos; Elaboração de roteiros sobre textos; Discussões de temas através de textos tecnicos. Prova escrita. Efetividade e pontualidade nas atividades propostas; Posicionamento crítico sobre o discurso dos autores estudados; Participação efetiva e empenho no desenvolvimento das tarefas; Frequencia necessártia à fundamental participação na construção coletiva do conhecimento; Redação clara observadas as normas gramaticais. Trabalhos individuais ou em grupos (Estudo dirigido, Painel integrado, Seminários, etc) Efetividade e pontualidade nas atividades propostas; Apresentação: organização e clareza no material apresentado; Aprofundamento na dicussão do tema e compreensão da teoria estudada; Objetividade e seleção dos pontos relevantes do estudo; Criatividade nos procedimentos de apresentação das ideias. 8. REFERÊNCIAS: BÁSICAS 1. ALVARENGA, Marcia Soares de (Org.). Educação de jovens e adultos: em tempos e contextos de aprendizagens. 1.ed. Rio de Janeiro: Rovelle,20011; 2. BARCELOS, Valdo. Formação de professores para educação de jovens e adultos.5.ed. Petrópolis-RJ: Vozes,2012; 3. CARNEIRO, Moaci Alves. LDB fácil: leitura crítico-compreensiva, artigo a artigo. 23. ed. Atualizada e ampliada. Petrópolis. Rio de Janeiro: Vozes, 2015; 4. CARREIRA, Denise et al. A EJA em xeque: Desafios das políticas de Educação de Jovens e Adultos no século XXI. São Paulo: Global; Ação Educativa, 2014; 5. JARDILINO, José Rubens Lima; ARAÚJO, Regina Magna Bonifácio de. Educação de jovens e adultos: sujeitos, saberes e práticas. São Paulo: Cortez, 2014. 6. LIBÂNEO, José Carlos.; OLIVEIRA, João Ferreira de.; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação Escolar: políticas, estrutura e organização. Coleção docência em formação. Série saberes pedagógicos. 10. ed. rev. e ampl. São Paulo: Cortez, 2012; 7. MELO Adriana Almeida Sales de; PRADO, Edna Cristina (Org.). Educação, história, política e educação de jovens e adultos. Maceió: EDUFAL, 2012; 8. PAIVA. Vanilda. História da Educação Popular no Brasil: Educação popular e educação de adultos. 7ª ed. Revista e ampliada. São Paulo: Edições Loyola, 2015; 9. SOUSA, José dos Santos (Org.). Educação de jovens e adultos: políticas e práticas educativas. Rio de Janeiro: NAU Editora: EDUR, 2011; 10. ___. Reflexões da prática docente na EJA . Seropédica : EDUR, 2010 11. UNESCO. Alfabetização de jovens e adultos no Brasil: lições da prática. Brasília: UNESCO, 2008. COMPLEMENTARES 1. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é método Paulo Freire. São Paulo, Brasiliense, 2013. 2. ___. O que é educação. São Paulo, Brasiliense, 2013. 3. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 32. ed. RJ: Paz e Terra, 1997. 4. ___. Educação e mudança. 34ª.ed. São Paulo, Paz e Terra, 2011; 5. ___. Ação cultural para a liberdade. 14ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2011; 6. ___. Pedagogia da Esperança. São Paulo, Paz e Terra, 1996; 7. PINTO, Álvaro Vieira. Sete lições sobre educação de adultos. 16. Ed. São Paulo: Cortez, 2010; 8. HADDAD, S.; DI PIERRO, M. C. Escolarização de jovens e adultos.São Paulo: Revista Brasileira de Educaç ão, n.14, p.108-130, 2000b.Disponível em http://www.scielo.br; 9. SOARES,Leôncio(ORG) [et al.].Educação de Jovens e Adultos:convergências e tensões no campo da formação e do trabalho docente – Belo Horizonte :Autêntica, 2010. Assinatura do (a) Professor (a) Assinatura do(a) Coordenador(a) http://www.scielo.br/ UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS /8ºBLOCO/CARGA HORÁRIA: 60 h/ a PROFESSOR Me. JOSÉ ADERSINO ALVES DE MOURA UNIDADE I: ESCOLARIZAÇÃO E CIDADANIA Os Textos referenciados abaixo serão indutores de ESTUDO DIRIGIDO/ DISCUSSÃO E DEBATE, com socialização do seu conteúdo durante as aulas presenciais nas primeiras 20h/a da Disciplina. Requer LEITURA individual e FICHAMENTO obrigatórios de todo o texto ou tópicos deste; resposta às QUESTÕES ORIENTADORAS e citação como referência em atividade de PRODUÇÃO DE TEXTO. ______________________REFEERÊNCIAS TEXTO 01 HADDAD, S.; DI PIERRO, M. C. Escolarização de jovens e adultos.São Paulo: Revista Brasileira de Educação, n.14, p.108-130, 2000b.Disponível em http://www.scielo.br; TEXTO 02 FÁVERO, O.; FREITAS, M. Educação de Adultos e Jovens e Adultos: um olhar sobre o passado e o presente. Interação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011. Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/interacao/article/viewFile/16712/10703; TEXTO 03 DI PIERRO, M. C. Luta social e reconlhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e aduitos à educação: Educação Manta Maria, v.33, n.3, p.395-410, set./dez.2008 .Disponível em http://www.ufsm.br/revista e educação. TEXTO 04 GADOTTI, Moacir. Educação popular e educação ao longo da vida. 2016. Disponível em: <http://www.paulofreire.org/images/pdfs/Educacao_Popular_e_ELV_Gadotti. Pdf>. Obs.: FIQUE ATENTA (O)! As atividades avaliativas são obrigatórias e devem ser finalizadas e devolvidas no dentro dos prazos fixados no planejamento docente. ATIVIDADES RELATIVAS À 1ªAVALIAÇÃO: 1. Resposta à QUESTÕES ORIENTADORAS indicadas e/ ou PRODUÇÃO DE TEXTO com base nos autores referenciados acima. Valor até 40% da AV- Grupo. 2. COMENTÁRIO E ANÁLISE DE VÍDEOS/FILMES / VIDEOAULAS/ PODCAST. Assistir/ouvir todos e comentar um mínimo de 04(quatro) dos arquivos dos disponibilizados no CANAL INDICADO/ BLOG da Disciplina – LINK: https://ooperadordocenteeja.blogspot.com. Valor: até 20% da AV, com entrega de Trabalho escrito, conforme normas da ABNT- individual). 3. ESTUDO DIRIGIDO. Inclui FICHAMENTO dos textos da Unidade I ou tópicos destes conforme ROTEIRO previamente divulgado e consolidação de discurso para socialização dos conteúdos estudados em sala. OBS: valor até 30% da 1ªAV, condicionado à entrega do FICHAMENTO que pode ser substituído por SLIDES, organizado conforme normas da ABNT, bem como, registro final de PARTICIPAÇÃO INDIVIDUAL do aluno (a) em mais de 50% BOAS LEITURAS E ATIVIDADES ! http://www.scielo.br/ http://www.ufsm.br/revista%20e Segundo Severino (2002), os trabalhos didáticos exigidos, sobretudo, nos cursos de graduação, seguem um caráter universal de estruturação lógica e de organização metodológica, ou seja, são procedimentos que ainda fazem parte intrínseca da formação técnica ou científica do estudante. Os trabalhos, desde então, segundo o autor, dependerão “principalmente de seus objetivos e de natureza do próprio objeto abordado, assim como em função de exigências específicas de cada área do saber humano” (SEVERINO 2002 p. 129). O fichamento O fichamento é o ato de registrar os estudos de um livro e/ou um texto. O trabalho de fichamento possibilita ao estudante, além da facilidade na execução dos trabalhos acadêmicos, a assimilação do conhecimento. De acordo com diversos autores, o fichamento deve conter a seguinte estrutura: cabeçalho indicando o assunto e a referência da obra, isto é, a autoria, o título, o local de publicação, a editora e o ano da publicação. Existem três tipos básicos de fichamentos: o fichamento bibliográfico, o fichamento de resumo ou conteúdo e o fichamento de citações. Cada professor pode seguir um modelo de fichamento, tendo em vista, que não existe um modelo pronto e/ou determinado. Assim sendo, os modelos apresentados são sugestões. Modelo de fichamento de citações Conforme a ABNT (2002a), a transcrição textual é chamada de citação direta, ou seja, é a reprodução fiel das frases que se pretende usar como citação na redação do trabalho. Educação da mulher: a perpetuação da injustiça (pp. 30 – 132). Segundo capítulo. TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: brasiliense, 1993. “uma das primeiras feministas do Brasil, Nísia Floresta Augusta, defendeu a abolição da escravatura, ao lado de propostas como educação e a emancipação da mulher e a instauração da República” (p.30) “na justiça brasileira, é comum os assassinos de mulheres serem absolvidos sob a defesa de honra” (p. 132) “a mulher buscou com todas forças sua conquista no mundo totalmente masculino” (p.43) Modelo de fichamento de resumo ou conteúdo É uma síntese das principais idéias contidas na obra. O aluno elabora com Dicas de como fazer o fichamento suas próprias palavras a interpretação do que foi dito. Educação da mulher: a perpetuação da injustiça (pp. 30 – 132) segunda capítulo. TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: brasiliense, 1993. O trabalho da autora baseia-se em análise de textos e na própria vivência nos movimentos feministas, como relato de uma prática. A autora divide seu texto em fases históricas compreendidas entre Brasil Colônia (1500 – 1822), até os anos de 1975 em que foi considerado o Ano Internacional da Mulher. A autora trabalha ainda assuntos como mulheres da periferia de São Paulo, a luta por creches, violência, participação em greves, saúde e sexualidade. Modelo de fichamento bibliográfico É a descrição, com comentários dos tópicos abordados em uma obra inteira ou parte dela. TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: brasiliense, 1993. A obra insere-se no campo da história e da antropologia social. A autora utiliza- se de fontes secundárias colhidas por meio de livros, revistas e depoimentos. A abordagem é descritiva e analítica. Aborda os aspectos históricos da condição feminina no Brasil a partir do ano de 1500. A autora descreve em linhas gerais todo s processo de lutas e conquistas da mulher. Fichas de leitura : Onde se registram informações bibliográficas completas, anotações sobre tópicos da obra, citações diretas, juízos valorativos, comentários. Fichas de indicação bibliográfica : A indicação de referências bibliográficas é feita segundo normas da ABNT. Pesquisar a ficha catalográfica, que consta das primeiras páginas de um livro, para a transcrição das referências, ou dos elementos constantes da folha de rosto. Periódicos apresentam indicações dos elementos identificadores na primeira página, ou na capa. Ficha de resumo : redução de um texto a suas idéias principais, parafraseando o autor com o intuito de compreender o texto a fim de elaborar um novo, apresentando uma síntese das idéias do autor. Expor abreviadamente as idéias do autor. Não se faz uso de citações. Ficha de transcrição : A transcrição direta exige a colocação de aspas no início e no final do texto. Consiste na reprodução fiel de textos do autor citado. Se já houver no texto transcrito expressão aspeada, tais aspas devem ser transformadas em aspas simples. Indica-se o número da página de onde foi transcrito o texto. Se houver erros de grafia ou gramaticais, copia-se como está no original e escreve-se entre parênteses (sic). A supressão de palavras é indicada com três pontos entre parênteses. Supressões iniciais ou finais não precisam ser indicadas ; A supressão de um ou mais parágrafos intermediários é indicada por uma linha pontilhada ; Ao transcrever um texto é preciso rigor, observando aspas, itálicos, maiúsculas, pontuação, etc. Não se deve alterar o texto de nenhuma forma. Ficha de comentário : Devem-se analisar os aspectos quantitativos e depois os qualitativos, desta forma, podem-se acrescentar comentários sobre extensão do texto, sua constituição (ilustrações, exemplos, bibliografia, citações, etc.), conceitos abordados.Em aspectos qualitativos, recomenda que se atenha à análise e detecção da hipótese do autor, objetivo, motivo pelo qual escreveu o texto, as idéias que fundamentam o texto. Deve o comentarista verificar se a exemplificação é genérica ou específica, se a organização do texto é clara, lógica, consistente, e o tom utilizado na exposição é formal ou informal, se há pontos fortes e fracos na argumentação do autor, se a terminologia é precisa. E ainda dizer se a conclusão é convincente e quem será beneficiado pela leitura do texto. Finalmente, deve fazer uma avaliação da obra. UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS /8ºBLOCO - CARGA HORÁRIA: 60 h/a PROFESSOR Me. JOSÉ ADERSINO ALVES DE MOURA PRODUÇÃO DE TEXTO 1- DICAS: a) Dê um título ao seu texto, seja criativo(a). O título deve sintetizar as reflexões dos autores referenciados, ao mesmo tempo que deve ser convidativo para que os leitores se sintam motivados à leitura do texto integralmente, como acontece com as manchetes dos jornais. b) Não use outras referências, além da indicada; c) Seu texto deve ter entre 2-5 laudas; d) Seja fiel com o discurso dos autores referenciados, mesmo que você discorde. Nesse caso faça sua argumentação; e) Procure seguir as etapas seguintes afim de construir um raciocínio global, obedecendo a algumas etapas de análises: Análise Textual, consistindo em buscar informações a respeito do autor do texto, verificar o vocabulário, entre outros, podendo ser finalizada com uma esquematização do texto, tendo como finalidade apresentar uma visão de conjunto da unidade; Análise Temática procurando ouvir o autor, apreender sem intervir, fazendo ao texto uma série de perguntas, onde as respostas fornecem o conteúdo da mensagem; Análise Interpretativa visando a interpretação, segundo situações das ideias do autor, faz- se uma leitura analítica, objetivando o amadurecimento intelectual; Problematização focando o levantamento do problema relevante, para a reflexão pessoal e discussão em grupo; Síntese Pessoal que consiste na construção lógica de uma redação, baseada na problemática levantada pelo texto; E por fim conclui valorizando a leitura analítica como responsável no desenvolvimento de posturas lógicas na vida do estudante universitário. Após esse planejamento, devolva o texto de forma dissertativa, de acordo com as normas da ABNT, dividindo-o em três partes: introdução, desenvolvimento e conclusão. Demonstre esses momentos apenas nos parágrafos, não há necessidades de desenvolver em forma de tópicos. Após a escrever o último parágrafo da conclusão, releia o seu rascunho de texto e revise- o. Veja se captou a essência dos autores referenciados. Essa é uma etapa muito importante da produção escrita, já que nela o autor tem condições de ler, analisar o resultado final e revisar a sua obra. Podemos dizer que essa etapa é importante também porque nela o autor deve fazer uma autocrítica sobre o seu trabalho e compreender que ainda há tempo de fazer as modificações necessárias. 2- OUTRAS DICAS a) Sobre as referências citadas ou as referências bibliográficas: Um bom texto acadêmico implica em uma pesquisa por parte do autor sobre outros autores que trataram do tema, que sejam citados e enriqueçam o trabalho. A ética manda que cada ideia que foi originada por outro texto seja citada. Isto se passa dentro dos limites do bom senso já que existem ideias e dados que são do senso comum e que não precisam ser referenciadas; Utilizar da credibilidade de outros, na medida em que se faz uma leitura inteligente dos mesmos, com bons resumos, boas críticas/comentários e boas relações com outros autores. Entretanto, o melhor do trabalho é aquilo que o seu autor tem a dizer, o que ele aprendeu sobre o tema e que repassa a seu leitor. b) Sobre o estilo: Um erro ortográfico ou de conjugação é um pecado muito grande nestes tempos de revisão ortográfica automática. Observe o que diz seu computador e não perca a confiança do seu leitor. Seja direto, evite clichês, não seja empolado, não use jargões, aproxime-se o mais possível da linguagem cotidiana. Evite tanto as expressões excessivamente coloquiais, como as excessivamente rebuscadas. Evite abreviações, siglas e símbolos, pois o leitor pode não os conhecer. Se o fizer, explique o que significa e faça lista de abreviações, se forma muitas. O objetivo de um autor deve ser de tratar o tema o mais exaustivamente possível dando o mínimo de trabalho ao leitor, assim, evite redundâncias. “Enxugue” o texto retirando seus excessos e jamais repita o que já foi dito a não ser em situações muito particulares, assinalando para o leitor que você sabe que já falou daquilo, para não parecer descuido. Em cada parágrafo usa-se sempre o mesmo tempo verbal. Ao fornecer o dado tempo, período histórico, colocá-lo entre vírgulas. Trata-se de um aposto; Não se começam frases com números. Exemplo “40% da população...” coloque uma palavra antes; Uma palavra mal-usada causa má impressão, consulte o dicionário sempre que tiver a mínima dúvida. Bom trabalho! Com base no disponível em: https://cirandas.net/deboranunes/blog/dicas-para-um-bom-texto- academico Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 108 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 Introdução No passado como no presente a educação de jovens e adultos sempre compreendeu um conjunto muito di- verso de processos e práticas formais e informais rela- cionadas à aquisição ou ampliação de conhecimentos básicos, de competências técnicas e profissionais ou de habilidades socioculturais. Muitos desses processos se desenvolvem de modo mais ou menos sistemático fora de ambientes escolares, realizando-se na família, nos locais de trabalho, nos espaços de convívio sociocultu- ral e lazer, nas instituições religiosas e, nos dias atuais, também com o concurso dos meios de informação e co- municação à distância. Qualquer tentativa de historiar um universo tão plural de práticas formativas implicaria sério risco de fracasso, pois a educação de jovens e adul- tos, compreendida nessa acepção ampla, estende-se por quase todos os domínios da vida social. O texto que segue aborda alguns dos processos sis- temáticos e organizados de formação geral de pessoas jovens e adultas no Brasil, conferindo especial atenção à educação escolar. A análise não abrange, portanto, o vasto âmbito das práticas de qualificação profissional, de teleducação, nem a diversidade de experiências de formação sociocultural e política das pessoas jovens e adultas que se realizam fora de processos de escolariza- ção e que, na pesquisa educacional brasileira, vêm sen- do abordadas pelos estudos de educação popular. O ar- tigo também não tem a pretensão de compreender todos os níveis e modalidades de ensino, privilegiando a edu- cação básica realizada por meios presenciais e, no seu interior, as etapas iniciais da escolarização. O texto oferece uma rápida visão panorâmica do tema ao longo dos cinco séculos da história posteriores à chegada dos portugueses às terras brasileiras, mas de- tém o olhar sobretudo na segunda metade do século XX, em que o pensamento pedagógico e as políticas públicas de educação escolar de jovens e adultos adquiriram a identidade e feições próprias, a partir das quais é possí- vel e necessário pensar seu desenvolvimento futuro. Colônia e Império A ação educativa junto a adolescentes e adultos no Brasil não é nova. Sabe-se que já no período colonial os religiosos exerciam sua ação educativa missionária em Escolarização de jovens e adultos Sérgio Haddad Pontifícia Universidade Católica de São PauloMaria Clara Di Pierro Organização não-governamental Ação Educativa TEXTO 01 Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 109 grande parte com adultos. Além de difundir o evange- lho, tais educadores transmitiam normas de comporta- mento e ensinavam os ofícios necessários ao funciona- mento da economia colonial, inicialmente aos indígenas e, posteriormente, aos escravos negros. Mais tarde, se encarregaram das escolas de humanidades para os colo- nizadores e seus filhos. Com a desorganização do sistema de ensino pro- duzido pela expulsão dos jesuítas do Brasil em 1759, so- mente no Império voltaremosa encontrar informações so- bre ações educativas no campo da educação de adultos. No campo dos direitos legais, a primeira Constitui- ção brasileira, de 1824, firmou, sob forte influência eu- ropéia, a garantia de uma “instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”, portanto também para os adul- tos. Pouco ou quase nada foi realizado neste sentido du- rante todo o período imperial, mas essa inspiração iluminista tornou-se semente e enraizou-se definitiva- mente na cultura jurídica, manifestando-se nas Consti- tuições brasileiras posteriores. O direito que nasceu com a norma constitucional de 1824, estendendo a garantia de uma escolarização básica para todos, não passou da intenção legal. A implantação de uma escola de quali- dade para todos avançou lentamente ao longo da nossa história. É verdade, também, que tem sido interpretada como direito apenas para as crianças. Essa distância entre o proclamado e o realizado foi agravada por outros fatores. Em primeiro lugar, por- que no período do Império só possuía cidadania uma pequena parcela da população pertencente à elite eco- nômica à qual se admitia administrar a educação pri- mária como direito, do qual ficavam excluídos negros, indígenas e grande parte das mulheres. Em segundo, porque o ato adicional de 1834, ao delegar a responsa- bilidade por essa educação básica às Províncias, re- servou ao governo imperial os direitos sobre a educa- ção das elites, praticamente delegando à instância administrativa com menores recursos o papel de edu- car a maioria mais carente. O pouco que foi realizado deveu-se aos esforços de algumas Províncias, tanto no ensino de jovens e adultos como na educação das crian- ças e adolescentes. Neste último caso, chegaríamos em 1890 com o sistema de ensino atendendo apenas 250 mil crianças, em uma população total estimada em 14 milhões. Ao final do Império, 82% da população com idade superior a cinco anos era analfabeta. Desta forma, as preocupações liberais expressas na legislação desse período acabaram por não se consubs- tanciar, condicionadas que estavam pela estrutura so- cial vigente. Nas palavras de Celso Beisiegel: [...] no Brasil, na colônia e mesmo depois, nas primei- ras fases do Império [...] é a posse da propriedade que deter- mina as limitações de aplicação das doutrinas liberais: e são os interesses radicados na propriedade dos meios de produ- ção colonial [...] que estabelecem os conteúdos específicos dessas doutrinas no país. O que há realmente peculiar no liberalismo no Brasil, durante este período, e nestas circuns- tâncias, é mesmo a estreiteza das faixas de população abrangidas nos benefícios consubstanciados nas formulações universais em que os interesses dominantes se exprimem. (Beisiegel, 1974, p. 43) Primeira República A Constituição de 1891, primeiro marco legal da República brasileira, consagrou uma concepção de fe- deralismo em que a responsabilidade pública pelo ensi- no básico foi descentralizada nas Províncias e Municí- pios. À União reservou-se o papel de “animador” dessas atividades, assumindo uma presença maior no ensino secundário e superior. Mais uma vez garantiu-se a for- mação das elites em detrimento de uma educação para as amplas camadas sociais marginalizadas, quando no- vamente as decisões relativas à oferta de ensino elemen- tar ficaram dependentes da fragilidade financeira das Províncias e dos interesses das oligarquias regionais que as controlavam politicamente. A nova Constituição republicana estabeleceu tam- bém a exclusão dos adultos analfabetos da participação pelo voto, isto em um momento em que a maioria da população adulta era iletrada. Apesar do descompromisso da União em relação ao ensino elementar, o período da Primeira República se caracterizou pela grande quantidade de reformas edu- cacionais que, de alguma maneira, procuraram um prin- cípio de normatização e preocuparam-se com o estado precário do ensino básico. Porém, tais preocupações Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 110 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 pouco efeito prático produziram, uma vez que não havia dotação orçamentária que pudesse garantir que as pro- postas legais resultassem numa ação eficaz. O censo de 1920, realizado 30 anos após o estabelecimento da Re- pública no país, indicou que 72% da população acima de cinco anos permanecia analfabeta. Até esse período, a preocupação com a educação de jovens e adultos praticamente não se distinguia como fonte de um pensamento pedagógico ou de políticas edu- cacionais específicas. Isso só viria a ocorrer em meados da década de 1940. Havia uma preocupação geral com a educação das camadas populares, normalmente inter- pretada como instrução elementar das crianças. No entanto, já a partir da década de 1920, o movi- mento de educadores e da população em prol da amplia- ção do número de escolas e da melhoria de sua qualida- de começou a estabelecer condições favoráveis à implementação de políticas públicas para a educação de jovens e adultos. Os renovadores da educação passaram a exigir que o Estado se responsabilizasse definitiva- mente pela oferta desses serviços. Além do mais, os pre- cários índices de escolarização que nosso país manti- nha, quando comparados aos de outros países da América Latina ou do resto no mundo, começavam a fazer da educação escolar uma preocupação permanente da po- pulação e das autoridades brasileiras. Essa inflexão no pensamento político-pedagógico ao final da Primeira República está associada aos processos de mudança so- cial inerentes ao início da industrialização e à acelera- ção da urbanização no Brasil. Nossas elites, que já haviam se adiantado no esta- belecimento constitucional do direito à educação para todos – sem propiciar as condições necessárias para sua realização –, viam agora esse direito unido a um dever que cada brasileiro deveria assumir perante a so- ciedade. [...] ao direito de educação que já se afirmara nas leis do Brasil, com as garantias do ensino primário gratuito para to- dos os cidadãos, virá agora associar-se, da mesma forma como ocorrera em outros países, a noção de um dever do futuro ci- dadão para com a sociedade, um dever educacional de prepa- rar-se para o exercício das responsabilidades da cidadania. (Beisiegel, 1974, p. 63) Período de Vargas A Revolução de 1930 é um marco na reformulação do papel do Estado no Brasil. Ao contrário do federalis- mo que prevalecera até aquele momento, reforçando os interesses das oligarquias regionais, agora era a Nação como um todo que estava sendo reafirmada. A inclinação ao fortalecimento e à mudança de pa- pel do Estado central manifesta-se de maneira inequí- voca na Constituição de 1934. Aí, já se configurava uma nova concepção que, superando a idéia de um Estado de Direito, entendido apenas como o Estado destinado à salvaguarda das garantias indivi- duais e dos direitos subjetivos, para pensar-se no Estado aberto para a problemática econômica, de um lado, e para a problemá- tica educacional e cultural, de outro. (Ferraz et al., 1984, p. 651) Nos aspectos educacionais, a nova Constituição propôs um Plano Nacional de Educação, fixado, coor- denado e fiscalizado pelo governo federal, determinan- do de maneira clara as esferas de competência da União, dos estados e municípios em matéria educacional:vin- culou constitucionalmente uma receita para a manuten- ção e o desenvolvimento do ensino; reafirmou o direito de todos e o dever do Estado para com a educação; esta- beleceu uma série de medidas que vieram confirmar este movimento de entregar e cobrar do setor público a res- ponsabilidade pela manutenção e pelo desenvolvimento da educação. Foi somente ao final da década de 1940 que a edu- cação de adultos veio a se firmar como um problema de política nacional, mas as condições para que isso viesse a ocorrer foram sendo instaladas já no período anterior. O Plano Nacional de Educação de responsabilidade da União, previsto pela Constituição de 1934, deveria in- cluir entre suas normas o ensino primário integral gra- tuito e de freqüência obrigatória. Esse ensino deveria ser extensivo aos adultos. Pela primeira vez a educação de jovens e adultos era reconhecida e recebia um trata- mento particular. Com a criação em 1938 do INEP – Instituto Nacio- nal de Estudos Pedagógicos – e através de seus estudos e pesquisas, instituiu-se em 1942 o Fundo Nacional do Ensino Primário. Através dos seus recursos, o fundo Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 111 deveria realizar um programa progressivo de ampliação da educação primária que incluísse o Ensino Supletivo para adolescentes e adultos. Em 1945 o fundo foi re- gulamentado, estabelecendo que 25% dos recursos de cada auxílio deveriam ser aplicados num plano geral de Ensino Supletivo destinado a adolescentes e adultos anal- fabetos. Ao mesmo tempo, fatos transcorridos no âmbito das relações internacionais ampliaram as dimensões desse movimento em prol de uma educação de jovens e adul- tos. Criada em novembro de 1945, logo após a 2a Guer- ra Mundial, a UNESCO denunciava ao mundo as pro- fundas desigualdades entre os países e alertava para o papel que deveria desempenhar a educação, em especial a educação de adultos, no processo de desenvolvimento das nações categorizadas como “atrasadas”. Em 1947, foi instalado o Serviço de Educação de Adultos (SEA) como serviço especial do Departamento Nacional de Educação do Ministério da Educação e Saúde, que tinha por finalidade a reorientação e coorde- nação geral dos trabalhos dos planos anuais do ensino supletivo para adolescentes e adultos analfabetos. Uma série de atividades foi desenvolvida a partir da criação desse órgão, integrando os serviços já existentes na área, produzindo e distribuindo material didático, mobilizan- do a opinião pública, bem como os governos estaduais e municipais e a iniciativa particular. O movimento em favor da educação de adultos, que nasceu em 1947 com a coordenação do Serviço de Edu- cação de Adultos e se estendeu até fins da década de 1950, denominou-se Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos – CEAA. Sua influência foi significativa, princi- palmente por criar uma infra-estrutura nos estados e mu- nicípios para atender à educação de jovens e adultos, pos- teriormente preservada pelas administrações locais.1 Duas outras campanhas ainda foram organizadas pelo Ministério da Educação e Cultura: uma em 1952 – a Cam- panha Nacional de Educação Rural –, e outra, em 1958 – a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo. Ambas tiveram vida curta e pouco realizaram. O Estado brasileiro, a partir de 1940, aumentou suas atribuições e responsabilidades em relação à educação de adolescentes e adultos. Após uma atuação fragmen- tária, localizada e ineficaz durante todo o período colo- nial, Império e Primeira República, ganhou corpo uma política nacional, com verbas vinculadas e atuação es- tratégica em todo o território nacional. Tal ação do Estado pode ser entendida no quadro de expansão dos direitos sociais de cidadania, em res- posta à presença de amplas massas populares que se urbanizavam e pressionavam por mais e melhores con- dições de vida. Os direitos sociais, presentes anterior- mente nas propostas liberais, concretizavam-se agora em políticas públicas, até como estratégia de incorporação dessas massas urbanas em mecanismos de sustentação política dos governos nacionais. A extensão das oportunidades educacionais por parte do Estado a um conjunto cada vez maior da popu- lação servia como mecanismo de acomodação de ten- sões que cresciam entre as classes sociais nos meios ur- banos nacionais. Atendia também ao fim de prover qualificações mínimas à força de trabalho para o bom desempenho aos projetos nacionais de desenvolvimento propostos pelo governo federal. Agora, mais do que as características de desenvolvimento das potencialidades individuais, e, portanto, como ação de promoção indivi- dual, a educação de adultos passava a ser condição ne- cessária para que o Brasil se realizasse como nação de- senvolvida. Estas duas faces do sentido político da educação ganham evidência com o fortalecimento do Estado nacional brasileiro edificado a partir de 1930. Os esforços empreendidos durante as décadas de 1940 e 1950 fizeram cair os índices de analfabetismo das pessoas acima de cinco anos de idade para 46,7% no ano de 1960. Os níveis de escolarização da população brasi- leira permaneciam, no entanto, em patamares reduzidos quando comparadas à média dos países do primeiro mun- do e mesmo de vários dos vizinhos latino-americanos. De 59 a 64, um período de luzes para a•Educação de adultos Os primeiros anos da década de 1960, até 1964, quando o golpe militar ocorreu, constituíram um mo- 1 Sobre a Campanha de Adolescentes e Adultos veja Beiseigel (1974). Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 112 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 mento bastante especial no campo da educação de jo- vens e adultos.2 Já em 1958, quando da realização do II Congresso Nacional de Educação de Adultos no Rio de Janeiro, ain- da no contexto da CEAA, percebia-se uma grande preo- cupação dos educadores em redefinir as características específicas e um espaço próprio para essa modalidade de ensino. Reconhecia-se que a atuação dos educadores de adultos, apesar de organizada como subsistema próprio, reproduzia, de fato, as mesmas ações e características da educação infantil. Até então, o adulto não-escolarizado era percebido como um ser imaturo e ignorante, que de- veria ser atualizado com os mesmos conteúdos formais da escola primária, percepção esta que reforçava o pre- conceito contra o analfabeto (Paiva, 1973, p. 209). Na verdade, o Congresso repercutia uma nova forma do pen- sar pedagógico com adultos. Já no Seminário Regional preparatório ao Congresso realizado no Recife, e com a presença do professor Paulo Freire, discutia-se [...] a indispensabilidade da consciência do processo de desenvolvimento por parte do povo e da emersão deste povo na vida pública nacional como interferente em todo o trabalho de elaboração, participação e decisão responsáveis em todos os momentos da vida pública; sugeriam os pernambucanos a revisão dos transplantes que agiram sobre o nosso sistema edu- cativo, a organização de cursos que correspondessem à reali- dade existencial dos alunos, o desenvolvimento de um traba- lho educativo “com” o homem e não “para” o homem, a criação de grupos de estudo e de ação dentro do espírito de auto-go- verno, o desenvolvimento de uma mentalidade nova no educa- dor, que deveria passar a sentir-se participante no trabalho de soerguimento do país; propunham, finalmente, a renovação dos métodos e processos educativos, substituindo o discurso pela discussão e utilizando as modernas técnicas de educação de grupos com a ajuda de recursos audiovisuais. (Paiva, 1973, p. 210) Estes temas acabaram por prevalecer posteriormente no II Congresso, marcando um novo momento no pensar dos educadores, confrontando velhas idéias e preconceitos. [...] marcava o Congresso o início de um novo período na educação de adultos no Brasil, aquele que se caracterizou pela intensa busca de maior eficiência metodológica e por ino- vações importantes neste terreno,pela reintrodução da refle- xão sobre o social no pensamento pedagógico brasileiro e pe- los esforços realizados pelos mais diversos grupos em favor da educação da população adulta para a participação na vida po- lítica da Nação. (Paiva, 1973, p. 210). Esse quadro de renovação pedagógica deve ser con- siderado dentro das condições gerais de turbulência do processo político daquele momento histórico. Diversos grupos buscavam junto às camadas populares formas de sustentação política para suas propostas. A educação, sem dúvida alguma, e de maneira privilegiada, era a prá- tica social que melhor se oferecia a tais mecanismos, não só por sua face pedagógica, mas também, e princi- palmente, por suas características de prática política. A economia brasileira crescia, internacionalizan- do-se. O processo de substituições das importações rea- lizado no período de Getúlio manteve um fluxo de capi- tais internacionais concentrado no fortalecimento da indústria de base. Agora, o modelo desenvolvimentista do governo Kubistschek abriu o mercado nacional para produtos duráveis das empresas transnacionais. A pro- posta desse governo de um desenvolvimento acelerado – “cinqüenta anos em cinco” – acabou ocorrendo para- lela à crescente perda do controle da economia pela bur- guesia nacional. As contradições desse modelo se agravaram com os governos Jânio-Jango. A imposição de uma política desenvolvimentista, baseada no capital internacional, de racionalidade diferenciada daquela capaz de ser absor- vida pela economia brasileira, acabou por trazer dese- quilíbrios econômicos internos de difícil administração. Intensificavam-se mobilizações políticas dos setores médios de parte das camadas populares. A questão da democracia, da participação política e a disputa pelos votos ocupavam boa parte do tempo social. O padrão de consumo que havia sido forjado pelo desenvolvimentis- mo já não podia realizar-se em virtude da crescente in- segurança no emprego e da perda do poder aquisitivo dos salários. Ampliaram-se o clima de insatisfação e as manifestações populares. 2 Importante trabalho de revisão histórica desse período é o de Paiva (1973) Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 113 Foi dentro dessa conjuntura que os diversos traba- lhos educacionais com adultos passaram a ganhar pre- sença e importância. Buscava-se, por meio deles, apoio político junto aos grupos populares. As diversas propos- tas ideológicas, principalmente a do nacional-desenvol- vimentismo, a do pensamento renovador cristão e a do Partido Comunista, acabaram por ser pano de fundo de uma nova forma de pensar a educação de adultos. Ele- vada agora à condição de educação política, através da prática educativa de refletir o social, a educação de adul- tos ia além das preocupações existentes com os aspec- tos pedagógicos do processo ensino-aprendizagem. Ao mesmo tempo, e de forma contraditória, no contexto da ação de legitimação de propostas políticas junto aos se- tores populares, criaram-se as condições para o desen- volvimento e o fortalecimento de alternativas autôno- mas e próprias desses setores ao provocar a necessidade permanente da explicitação dos seus interesses, bem como das condições favoráveis à sua organização, mo- bilização e conscientização. É dentro dessa perspectiva que devemos conside- rar os vários acontecimentos, campanhas e programas no campo da educação de adultos, no período que vai de 1959 até 1964. Foram eles, entre outros: o Movimento de Educação de Base, da Conferência Nacional dos Bis- pos do Brasil, estabelecido em 1961, com o patrocínio do governo federal; o Movimento de Cultura Popular do Recife, a partir de 1961; os Centros Populares de Cultu- ra, órgãos culturais da UNE; a Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de Educação de Natal; o Movimento de Cultura Popular do Recife; e, finalmente, em 1964, o Programa Nacional de Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, que contou com a presença do professor Paulo Freire. Gran- de parte desses programas estava funcionando no âmbi- to do Estado ou sob seu patrocínio. Apoiavam-se no mo- vimento de democratização de oportunidades de escolarização básica dos adultos mas também represen- tavam a luta política dos grupos que disputavam o apa- relho do Estado em suas várias instâncias por legitima- ção de ideais via prática educacional. Nesses anos, as características próprias da educa- ção de adultos passaram a ser reconhecidas, conduzindo à exigência de um tratamento específico nos planos pe- dagógico e didático. À medida que a tradicional rele- vância do exercício do direito de todo cidadão de ter acesso aos conhecimentos universais uniu-se à ação conscientizadora e organizativa de grupos e atores so- ciais, a educação de adultos passou a ser reconhecida também como um poderoso instrumento de ação políti- ca. Finalmente, foi-lhe atribuída uma forte missão de resgate e valorização do saber popular, tornando a edu- cação de adultos o motor de um movimento amplo de valorização da cultura popular. O período militar O golpe militar de 1964 produziu uma ruptura po- lítica em função da qual os movimentos de educação e cultura populares foram reprimidos, seus dirigentes, per- seguidos, seus ideais, censurados. O Programa Nacio- nal de Alfabetização foi interrompido e desmantelado, seus dirigentes, presos e os materiais apreendidos. A Se- cretaria Municipal de Educação de Natal foi ocupada, os trabalhos da Campanha “De Pé no Chão” foram in- terrompidos e suas principais lideranças foram presas. A atuação do Movimento de Educação de Base da CNBB foi sendo tolhida não só pelos órgãos de repressão, mas também pela própria hierarquia católica, transforman- do-se na década de 1970 muito mais em um instrumento de evangelização do que propriamente de educação po- pular. As lideranças estudantis e os professores univer- sitários que estiveram presentes nas diversas práticas foram cassados nos seus direitos políticos ou tolhidos no exercício de suas funções. A repressão foi a resposta do Estado autoritário à atuação daqueles programas de educação de adultos cujas ações de natureza política contrariavam os interesses impostos pelo golpe militar. A ruptura política ocorrida com o movimento de 64 tentou acabar com as práticas educativas que auxiliavam na explicitação dos interes- ses populares. O Estado exercia sua função de coerção, com fins de garantir a “normalização” das relações so- ciais. Sob a denominação de “educação popular”, entre- tanto, diversas práticas educativas de reconstituição e reafirmação dos interesses populares inspiradas pelo mesmo ideário das experiências anteriores persistiram Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 114 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 sendo desenvolvidas de modo disperso e quase que clan- destino no âmbito da sociedade civil. Algumas delas ti- veram previsível vida curta; outras subsistiram durante o período autoritário. No plano oficial, enquanto as ações repressivas ocorriam, alguns programas de caráter conservador fo- ram consentidos ou mesmo incentivados, como a Cruza- da de Ação Básica Cristã (ABC). Nascido no Recife, o programa ganhou caráter nacional, tentando ocupar os espaços deixados pelos movimentos de cultura popular. Dirigida por evangélicos norte-americanos, a Cruzada servia de maneira assistencialista aos interesses do re- gime militar, tornando-se praticamente um programa semi-oficial. A partir de 1968, porém, uma série de crí- ticas à condução da Cruzada foi se acumulando e ela foi progressivamente se extinguindo nos vários estados en- tre os anos de 1970 e 1971. Na verdade, este setor da educação – a escolariza- ção básica de jovens e adultos – não poderia ser aban- donado por parte do aparelho do Estado, uma vez que tinha nele um dos canais mais importantes de mediação com a sociedade. Perante as comunidades nacional e in- ternacional,seria difícil conciliar a manutenção dos bai- xos níveis de escolaridade da população com a proposta de um grande país, como os militares propunham-se cons- truir. Havia ainda a necessidade de dar respostas a um direito de cidadania cada vez mais identificado como legítimo, mediante estratégias que atendessem também aos interesses hegemônicos do modelo socioeconômico implementado pelo regime militar. As respostas vieram com a fundação do MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização –, em 1967, e, posteriormente, com a implantação do En- sino Supletivo, em 1971, quando da promulgação da Lei Federal 5.692, que reformulou as diretrizes de ensino de primeiro e segundo graus. O MOBRAL O Movimento Brasileiro de Alfabetização foi cria- do pela Lei 5.379, de 15 de dezembro de 1967, como Fundação MOBRAL, fruto do trabalho realizado por um grupo interministerial, que buscou uma alternativa ao trabalho da Cruzada ABC, programa de maior ex- tensão apoiado pelo Estado, em função das críticas que vinha recebendo.3 Em 1969, o MOBRAL começa a se distanciar da proposta inicial, mais voltada aos aspectos pedagógi- cos, pressionado pelo endurecimento do regime militar. Lançou-se então em uma campanha de massa, desvin- culando-se de propostas de caráter técnico, muitas delas baseadas na experiência dos seus funcionários no perío- do anterior a 64. Passou a se configurar como um pro- grama que, por um lado, atendesse aos objetivos de dar uma resposta aos marginalizados do sistema escolar e, por outro, atendesse aos objetivos políticos dos gover- nos militares. [...] buscava-se ampliar junto às camadas populares as bases sociais de legitimidade do regime, no momento em que esta se estreitava junto às classes médias em face do AI-5, não devendo ser descartada a hipótese de que tal movimento tenha sido pensado também como instrumento de obtenção de in- formações sobre o que se passava nos municípios do interior do país e na periferia das cidades e de controle sobre a popula- ção. Ou seja, como instrumento de segurança interna. (Paiva, 1982, p. 99) A presidência do MOBRAL foi entregue ao econo- mista Mário Henrique Simonsen. A partir das suas arti- culações, criaram-se mecanismos para seu financiamento e procurou-se “vender” a idéia do MOBRAL junto à sociedade civil. Os recursos foram obtidos com a opção voluntária para o MOBRAL de 1% do Imposto de Ren- da devido pelas empresas, complementada com 24% da renda líquida da Loteria Esportiva. Com isso, disporia o MOBRAL de recursos amplos e ágeis de caráter extra- orçamentário. Com esse instrumento, o economista Simonsen e o então ministro da Educação, coronel Jarbas Passarinho, passaram a propagandear o MOBRAL junto aos empre- sários, convencidos que estavam de que o programa “li- vraria o país da chaga do analfabetismo e simultanea- mente realizaria uma ação ideológica capaz de assegurar a estabilidade do ‘status quo’, permitindo às empresas 3 Sobre o MOBRAL veja Paiva (1981 e 1982), publicado em quatro etapas pela revista Síntese. Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 115 contar com amplos contingentes de força de trabalho alfabetizada” (Paiva, 1982, p. 100). O MOBRAL foi implantado com três característi- cas básicas. A primeira delas foi o paralelismo em re- lação aos demais programas de educação. Seus recur- sos financeiros também independiam de verbas orçamentárias. A segunda característica foi a organi- zação operacional descentralizada, através de Comis- sões Municipais espalhadas por quase todos os muni- cípios brasileiros, e que se encarregaram de executar a campanha nas comunidades, promovendo-as, recrutan- do analfabetos, providenciando salas de aula, profes- sores e monitores. Eram formadas pelos chamados “re- presentantes” das comunidades, os setores sociais da municipalidade mais identificados com a estrutura do governo autoritário: as associações voluntárias de ser- viços, empresários e parte dos membros do clero. A terceira característica era a centralização de dire- ção do processo educativo, através da Gerência Pedagó- gica do MOBRAL Central, encarregada da organização,da programação, da execução e da avaliação do processo educativo, como também do treinamento de pessoal para todas as fases, de acordo com as diretrizes que eram estabelecidas pela Secretaria Executiva. O planejamento e a produção de material didático foram entregues a em- presas privadas que reuniram equipes pedagógicas para este fim e produziram um material de caráter nacional, apesar da conhecida diversidade de perfis lingüísticos, ambientais e socioculturais das regiões brasileiras. Entre o MOBRAL Central e as Comissões Muni- cipais, encontravam-se os Coordenadores Estaduais, que se encarregavam dos convênios municipais, responsa- bilizando-se pela assistência técnica epela “orientação estratégica”. Os Coordenadores Regionais foram insti- tuídos em 1972, para “harmonizar os programas esta- duais na mesma região, com vistas à orientação do MOBRAL Central” (Paiva, 1982). A função desses co- ordenadores e supervisores era a de garantir que as orien- tações gerais do Movimento se implantassem. Para tan- to, procurou-se firmar uma homogeneidade de atitudes através de encontros e treinamentos desses supervisores. [...] é no quadro da difusão ideológica que se pode en- tender os tão discutidos encontros de supervisores, trazidos de todas as partes do país e reunidos às centenas no Hotel Nacio- nal do Rio de Janeiro, numa aparente demonstração de des- perdício de recursos. Tais encontros serviam para reforçar os laços de lealdade para com a direção do movimento, explican- do-se deste modo a distribuição entre eles de fotos autografa- das do presidente do MOBRAL e a condução das atividades em clima festivo com declarações públicas dos que pela pri- meira vez viam o mar ou viajavam de avião ou visitavam o Rio de Janeiro. Escreve claramente Arlindo Lopes Correia sobre a função dos supervisores: “são eles que mantêm intacta a ideo- logia e a mística da organização”, possibilitando ao movimen- to servir como agente da segurança interna do regime. (Paiva, 1982, p. 101) As três características convergiam para criar uma estrutura adequada ao objetivo político de implantação de uma campanha de massa com controle doutrinário: descentralização com uma base conservadora para ga- rantir a amplitude do trabalho; centralização dos objeti- vos políticos e controle vertical pelos supervisores; paralelismo dos recursos e da estrutura institucional, garantindo mobilidade e autonomia. A atuação do MOBRAL inicialmente foi dividida em dois programas: o Programa de Alfabetização, im- plantado em 1970, e o PEI – Programa de Educação Integrada, correspondendo a uma versão compactada do curso de 1a a 4a séries do antigo primário, que se segui- riam ao curso de alfabetização. Posteriormente, uma série de outros programas foi implementada•os pelo MOBRAL. Além dos convênios com as Comissões Municipais e com as Secretarias de Educação, o MOBRAL firmou também convênios com outras instituições privadas, de caráter confessional ou não, e órgãos governamentais. Isto ocorreu, por exemplo, com o Departamento de Edu- cação Básica de Adultos, um dos departamentos da Cru- zada Evangélica de Alfabetização, com o Movimento de Educação de Base da CNBB, com o SENAC e o SENAI, com o Serviço de Radiodifusão Educativa do Ministério de Educação e Cultura, através do Projeto Minerva, com o Centro Brasileiro de TV Educativa (FCBTVE), com a Fundação Padre Anchieta, dentre outros. Estávamos em 1970, auge do controle autoritário pelo Estado. O MOBRAL chegava com a promessa de acabar em dez anos com o analfabetismo, classificado como “vergonha nacional” nas palavras do presidente Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 116 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 militar Médici. Chegou imposto, sem a participação dos educadores e de grande parte da sociedade. As argumen- taçõesde caráter pedagógico não se faziam necessárias. Havia dinheiro, controle dos meios de comunicação, si- lêncio nas oposições, intensa campanha de mídia. Foi o período de intenso crescimento do MOBRAL. Em 1973, o Conselho Federal de Educação reco- nheceu a equivalência do PEI ao antigo ensino primário e, no ano seguinte, foi concedida ao MOBRAL autori- zação para expedir certificados referendados pelas Se- cretarias Municipais ou Estaduais de Educação. No en- tanto, em 1976, com a possibilidade de o PEI firmar convênios com escolas particulares, não houve mais ne- cessidade do referendo. Observa-se, assim, uma progres- siva autonomização do MOBRAL em relação às Secre- tarias de Educação. O Movimento colocava-se fora do controle dos organismos públicos estaduais e munici- pais de administração do ensino no que concerne à pró- pria execução do Programa de Educação Integrada. O MOBRAL foi criticado pelo pouco tempo desti- nado à alfabetização e pelos critérios empregados na verificação de aprendizagem. Mencionava-se que, para evitar a regressão, seria necessária uma continuidade dos estudos em educação escolar integrada, e não em pro- gramas voltados a outros tipos de interesses como, por exemplo, formação rápida de recursos humanos. Criti- cava-se também o paralelismo da gestão e do financia- mento do MOBRAL em relação ao Departamento de Ensino Supletivo e ao orçamento do MEC. Punha-se em dúvida ainda a confiabilidade dos indicadores produzi- dos pelo MOBRAL. Em 1974, o engenheiro Arlindo Lopes Correia as- sumiu a direção do MOBRAL, com a responsabilidade de defender o programa e assegurar sua continuidade, formulando justificativas técnicas em resposta à avalanche de críticas que recaíam sobre o órgão. Bus- cou argumentos para a sua configuração pedagógica e política, tentando legitimar o trabalho da instituição pe- rante a opinião pública nacional e internacional. O MOBRAL, ao final da década de 1970, passaria por modificações nos seus objetivos, ampliando para outros campos de trabalho – desde a educação comuni- tária até a educação de crianças –, em um processo de permanente metamorfose que visava a sua sobrevivên- cia diante dos cada vez mais claros fracassos nos objeti- vos iniciais de superar o analfabetismo no Brasil. O Ensino Supletivo Uma parcela significativa do projeto educacional do regime militar foi consolidada juridicamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de número 5.692 de 11 de agosto de 1971. Foi no capítulo IV dessa LDB que o Ensino Supletivo foi regulamentado, mas seus fundamentos e características são mais bem desen- volvidos e explicitados em dois outros documentos: o Parecer do Conselho Federal de Educação n. 699, pu- blicado em 28 de julho de 1972, de autoria de Valnir Chagas, que tratou especificamente do Ensino Supleti- vo; e o documento “Política para o Ensino Supletivo”, produzido por um grupo de trabalho e entregue ao mi- nistro da Educação em 20 de setembro de 1972, cujo relator é o mesmo Valnir Chagas. Considerado no Parecer 699 como “o maior desa- fio proposto aos educadores brasileiros na Lei 5.692”, o Ensino Supletivo visou se constituir em “uma nova con- cepção de escola”, em uma “nova linha de escolariza- ção não-formal, pela primeira vez assim entendida no Brasil e sistematizada em capítulo especial de uma lei de diretrizes nacionais”, e, segundo Valnir Chagas, po- deria modernizar o Ensino Regular por seu exemplo de- monstrativo e pela interpenetração esperada entre os dois sistemas. Quando do encaminhamento do Projeto de Lei ao Presidente da República, em 30 de março de 1971, a Exposição de Motivos do ministro Jarbas Passarinho concedia ao Ensino Supletivo importância significativa por “suprir a escolarização regular e promover crescen- te oferta de educação continuada”. A Lei atenderia ao duplo objetivo de recuperar o atraso dos que não pude- ram realizar a sua escolarização na época adequada, complementando o “êxito empolgante do MOBRAL que vinha rápida e drasticamente vencendo o analfabetismo no Brasil”, e germinar “a educação do futuro, essa edu- cação dominada pelos meios de comunicação, em que a escola será principalmente um centro de comunidade para sistematização de conhecimentos, antes que para sua transmissão”. Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 117 Três princípios ou “idéias-força” foram estabele- cidos por esses documentos que conformam as caracte- rísticas do Ensino Supletivo. O primeiro foi a definição do Ensino Supletivo como um subsistema integrado, in- dependente do Ensino Regular, porém com este intima- mente relacionado, compondo o Sistema Nacional de Educação e Cultura. O segundo princípio foi o de colo- car o Ensino Supletivo, assim como toda a reforma edu- cacional do regime militar, voltado para o esforço do desenvolvimento nacional, seja “integrando pela alfa- betização a mão-de-obra marginalizada”, seja forman- do a força de trabalho. A terceira “idéia-força” foi a de que o Ensino Supletivo deveria ter uma doutrina e uma metodologia apropriadas aos “grandes números carac- terísticos desta linha de escolarização”. Neste sentido, se contrapôs de maneira radical às experiências anterio- res dos movimentos de cultura popular, que centraram suas características e metodologia sobre o grupo social definido por sua condição de classe. Portanto, o Ensino Supletivo se propunha a recupe- rar o atraso, reciclar o presente, formando uma mão-de- obra que contribuísse no esforço para o desenvolvimen- to nacional, através de um novo modelo de escola. Na visão dos legisladores, o Ensino Supletivo nas- ceu para reorganizar o antigo exame de madureza,4 que facilitava a certificação e propiciava uma pressão por vagas nos graus seguintes, em especial no universitário. Segundo o Parecer 699, era necessária, também, a am- pliação da oferta de formação profissional para “uma clientela já engajada na força de trabalho ou a ela desti- nada a curto prazo”. Por fim, foram agregados cursos fundados na concepção de educação permanente, bus- cando responder aos objetivos de uma “escolarização menos formal e ‘mais aberta’”. Para cumprir esses objetivos de repor a escolariza- ção regular, formar mão-de-obra e atualizar conhecimen- tos, o Ensino Supletivo foi organizado em quatro funções: Suplência, Suprimento, Aprendizagem e qua- lificação. A Suplência tinha como objetivo: “suprir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou concluído na idade própria” através de cursos e exames (Lei 5.692, artigo 22, a). O Suprimento tinha por finalidade “proporcionar, median- te repetida volta à escola, estudos de aperfeiçoamento ou atualização para os que tenham seguido o ensino re- gular no todo ou em parte” (Lei 5.692, artigo 24, b). A Aprendizagem correspondia à formação metódica no tra- balho, e ficou a cargo basicamente do SENAI e do SENAC. A Qualificação foi a função encarregada da profissionalização que, sem ocupar-se com a educação geral, atenderia ao objetivo prioritário de formação de recursos humanos para o trabalho. O funcionamento dessas quatro modalidades deveria se realizar tomando por base duas intenções: atribuir uma clara prioridade aos cursos e exames que visassem à formação e ao aper- feiçoamento para o trabalho; e a liberdade de organiza- ção, evitando-se assim que o Ensino Supletivo resultas- se um “simulacro” do Ensino Regular. Tanto a legislação como os documentos de apoio recomendaram que os professores do ensino supletivo recebessem formação específica para essa modalidade de ensino, aproveitando-se para tanto os estudos e pes- quisas que seriam desenvolvidos. Enquanto isto não fosse realizado, dever-se-iam aproveitar os professores do En- sino Regular que, mediante cursos de aperfeiçoamento, seriam adaptados ao Ensino Supletivo. O Ensino Supletivo foi apresentado à sociedade como um projeto de escola do futuro e elementode um sistema educacional compatível com a modernização socioeconômica observada no país nos anos 70. Não se tratava de uma escola voltada aos interesses de uma de- terminada classe, como propunham os movimentos de cultura popular, mas de uma escola que não se distin- guia por sua clientela, pois a todos devia atender em uma dinâmica de permanente atualização. Dentro dessa lógica, a questão metodológica se ateve às soluções de massa, à racionalização dos meios, aos grandes números a serem atendidos e que desafiavam o dirigente que se propusesse a educar toda uma sociedade. Colocando-se esse desafio, o Ensino Supletivo se propu- nha priorizar soluções técnicas, deslocando-se do enfren- tamento do problema político da exclusão do sistema es- colar de grande parte da sociedade. Propunha-se realizar uma oferta de escolarização neutra, que a todos serviria. 4 Veja sobre o histórico dos exames de madureza o trabalho de Haddad (1991). Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 118 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 Foi neste sentido a mensagem do presidente da Re- pública Emílio G. Médici ao Congresso Nacional quan- do do encaminhamento da nova Lei, em 20 de junho de 1971, ao justificar as reformas como uma abertura “para que possa qualquer do povo, na razão dos seus predicados genéticos, desenvolver a própria personalidade e atin- gir, na escala social, a posição a que tenha jus”. A posi- ção social de cada um seria determinada por sua condi- ção genética e pelo esforço empreendido em aproveitar as oportunidades educacionais oferecidas pelo Estado. O Ensino Supletivo, por sua flexibilidade, seria a nova oportunidade dos que perderam a possibilidade de escolarização em outras épocas, ao mesmo tempo em que seria a chance de atualização para os que gostariam de acompanhar o movimento de modernização da nova sociedade que se implantava dentro da lógica de “Brasil Grande” da era Médici. O sentido político da educação de adultos no período militar Em meados de 1972, a Secretaria Geral do Minis- tério da Educação e Cultura expediu o documento “Adult Education in Brazil” destinado à III Conferência Inter- nacional de Educação de Adultos, convocada pela UNESCO para Tóquio. Nele, traduzia o sentido da edu- cação de adultos no contexto brasileiro, em especial de- pois da criação do MOBRAL e do Ensino Supletivo. Sua introdução afirmava ser “recente a preocupação com a educação como elemento prioritário dos projetos para o desenvolvimento” e que havia também “uma atitude nova no sentido de encará-la como rendoso investimen- to”. Tais preocupações, segundo o documento, haviam sido realçadas pela presença dos militares no poder, a partir de 1964, e se refletiam através dos seus planos de desenvolvimento e dos Planos Setoriais de Educação. Os compromissos com a educação objetivavam a “for- mação de uma infra-estrutura adequada de recursos hu- manos, apropriada às nossas necessidades socioeconô- micas, políticas e culturais”. Para implementação de tais objetivos, o Estado brasileiro se propunha a criar e implementar um sistema de educação permanente, no qual a educação de adultos situava-se “na linha de fren- te das operações”, por ser “poderosa arma capaz de ace- lerar o desenvolvimento, o progresso social e a expan- são ocupacional”. O discurso e os documentos legais dos governos militares procuraram unir as perspectivas de democrati- zação de oportunidades educacionais com a intenção de colocar o sistema educacional a serviço do modelo de desenvolvimento. Ao mesmo tempo, por meio da coer- ção, procuraram manter a “ordem” econômica e políti- ca. Inicialmente, a atitude do governo autoritário foi a de reprimir todos os movimentos de cultura popular nas- cidos no período anterior ao de 64, uma vez que os pro- cessos educativos por eles desencadeados poderiam le- var a manifestações populares capazes de desestabilizar o regime. Posteriormente, com o MOBRAL e o Ensino Supletivo, os militares buscaram reconstruir, através da educação, sua mediação com os setores populares. Por outro lado, as reformas educacionais propicia- ram que os serviços de educação de adultos fossem es- tendidos, ainda que apenas no plano formal, aos níveis do ensino fundamental e médio. Ampliaram-se também as possibilidades de acesso à formação profissional. Desta forma, a educação de adultos passou a compor o mito da sociedade democrática brasileira em um regime de exceção. Esse mito foi traduzido em uma linguagem na qual a oferta dos serviços educacionais para os jo- vens e adultos das camadas populares era a nova chance individual de ascensão social, em uma época de “mila- gre econômico”. O sistema educacional se encarregaria de corrigir as desigualdades produzidas pelo modo de produção. Desse modo o Estado cumpria sua função de assegurar a coesão das classes sociais. A dimensão formal e os limites dessa democratiza- ção de oportunidades ficavam explícitos na medida em que o Estado, ao não assumir a responsabilidade pela gra- tuidade e pela expansão da oferta, deixou a educação de jovens e adultos ao sabor dos interesses do ensino privado.5 O Ensino Supletivo concebido pelos documentos legais deveria estruturar-se em um Departamento no Ministério da Educação e Cultura, o Departamento de Ensino Supletivo (DESu). Esse Departamento teria uma 5 Sobre o Ensino Supletivo no período militar veja a tese de doutorado de Haddad (1991) e a dissertação de mestrado de Vargas (1984). Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 119 Direção Geral com o objetivo de coordenar o desenvol- vimento de todas as atividades de educação de adultos em nível nacional, visando, sobretudo, à sua expansão integrada com outras agências. Apesar da intenção centralizadora no âmbito fede- ral, sempre existiram certa dispersão e certo paralelismo entre os órgãos responsáveis pelo Ensino Supletivo. Como vimos, o MOBRAL gozou durante todo o perío- do da sua existência de grande autonomia. No campo da teleducação, faltou coordenação e houve conflitos entre diferentes órgãos, conflitos estes que, por vezes, se es- tendiam a diferentes ministérios. Os programas federais decorrentes da criação do Ensino Supletivo ficaram a cargo do Departamento do Ensino Supletivo do MEC (DESU) de 1973 – ano de sua criação – até 1979, quando o órgão foi transformado em Subsecretaria de Ensino Supletivo (SESU) e subordina- do à Secretaria de Ensino de 1o e 2o Graus (SEPS). Os principais programas de âmbito federal desenvolvidos nesse período, todos eles relativos à modalidade de Su- plência, referiam-se ao aperfeiçoamento dos exames su- pletivos e à difusão da metodologia de ensino personali- zado com apoio de módulos didáticos realizada por meio da criação de Centros de Ensino Supletivo, ao lado de programas de ensino à distância via rádio e televisão. Foi no âmbito estadual que o ensino supletivo se firmou, reinando, no entanto, a diversidade na sua ofer- ta. A Lei Federal propôs que o Ensino Supletivo fosse regulamentado pelos respectivos Conselhos Estaduais de Educação. Isso criou uma grande variedade tanto de for- mas de organização como de nomenclaturas nos diver- sos programas ofertados pelos estados. Em praticamen- te todas as unidades da Federação foram criados órgãos específicos para o Ensino Supletivo dentro das Secreta- rias de Educação, cuja intervenção privilegiada era no ensino de 1o e 2o graus, sendo raras as iniciativas no campo da alfabetização de adultos. Na esfera municipal, ao contrário, raramente fo- ram criados órgãos específicos responsáveis pela suplên- cia, exceção feita às capitais dos estados mais populo- sos. Regra geral, a ação dos municípios no campo da Suplência se resumiu aos convênios mantidos pelas pre- feituras com o MOBRAL para o desenvolvimento de programas de alfabetização. Em alguns casos raros en- contramos prefeituras que assumiram programas pró- prios de educação de adultos e em alguns casos maisraros ainda encontramos aquelas que atendiam de 5a a 8a séries do 1o grau e do 2o grau. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) e a redemocratização da sociedade brasileira após 1985 Os anos imediatamente posteriores à retomada do governo nacional pelos civis em 1985 representaram um período de democratização das relações sociais e das ins- tituições políticas brasileiras ao qual correspondeu um alargamento do campo dos direitos sociais. Foi um mo- mento histórico em que antigos e novos movimentos so- ciais e atores da sociedade civil, que haviam emergido e se desenvolvido ao final dos anos 70, ocuparam espaços crescentes na cena pública, adquiriram organicidade e institucionalidade, renovando as estruturas sindicais e associativas preexistentes, ou criando novas formas de organização, modalidades de ação e meios de expressão. Nesse período, a ação da sociedade civil organizada direcionou as demandas educacionais que foi capaz de legitimar publicamente às instituições políticas da demo- cracia representativa, em especial aos partidos, ao parla- mento e às normas jurídico-legais. Esse processo resultou na promulgação da Constituição Federal de 1988 e seus desdobramentos nas constituições dos estados e nas leis orgânicas dos municípios, instrumentos jurídicos nos quais materializou-se o reconhecimento social dos direitos das pessoas jovens e adultas à educação fundamental, com a conseqüente responsabilização do Estado por sua oferta pública, gratuita e universal. A história da educação de jovens e adultos do período da redemocratização, entre- tanto, é marcada pela contradição entre a afirmação no plano jurídico do direito formal da população jovem e adulta à educação básica, de um lado, e sua negação pe- las políticas públicas concretas, de outro. A Nova República6 O primeiro governo civil pós-64 marcou simboli- camente a ruptura com a política de educação de jovens 6 Sobre levantamento histórico da educação de jovens e adultos no período pós-regime militar, veja tese de doutorado de Di Pierro (2000). Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 120 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 e adultos do período militar com a extinção do MO- BRAL, cuja imagem pública ficara profundamente iden- tificada com a ideologia e as práticas do regime autori- tário. Estigmatizado como modelo de educação domesticadora e de baixa qualidade, o MOBRAL já não encontrava no contexto inaugural da Nova República condições políticas de acionar com eficácia os mecanis- mos de preservação institucional que utilizara no perío- do precedente, motivo pelo qual foi substituído ainda em 1985 pela Fundação Nacional para Educação de Jo- vens e Adultos – Educar. Apesar de ter herdado do MOBRAL funcionários, estruturas burocráticas, concepções e práticas político- pedagógicas, a Fundação Educar incorporou muitas das inovações sugeridas pela Comissão que em princípios de 1986 formulou suas diretrizes político-pedagógicas. O paralelismo anteriormente existente foi rompido por meio da subordinação da Fundação Educar à Secretaria de Ensino de 1o e 2o Graus do MEC. A Educar assumiu a responsabilidade de articular, em conjunto, o subsistema de ensino supletivo, a política nacional de educação de jovens e adultos, cabendo-lhe fomentar o atendimento nas séries iniciais do ensino de 1o grau, promover a formação e o aperfeiçoamento dos educadores, produzir material didático, supervisionar e avaliar as atividades. A diretriz de descentralização fez com que a Funda- ção assumisse o papel de órgão de fomento e apoio técni- co, privilegiando a modalidade de ação indireta em apoio aos municípios, estados e organizações da sociedade ci- vil. O objetivo era induzir que as atividades diretas da Fundação fossem progressivamente absorvidas pelos sis- temas de ensino supletivo estaduais e municipais. Assim, as Comissões Municipais do MOBRAL foram dissolvi- das e as prefeituras municipais, herdeiras das suas ativi- dades de ensino, passaram a constituir os principais par- ceiros conveniados à Fundação, ao lado de empresas e organizações civis de natureza variada. A Educar mante- ve uma estrutura nacional de pesquisa e produção de ma- teriais didáticos, bem como coordenações estaduais, res- ponsáveis pela gestão dos convênios e assistência técnica aos parceiros, que passaram a deter maior autonomia para definir seus projetos político-pedagógicos. Se em muitos sentidos a Fundação Educar repre- sentou a continuidade do MOBRAL, devem-se compu- tar como mudanças significativas a sua subordinação à estrutura do MEC e a transformação em órgão de fo- mento e apoio técnico, em vez de instituição de execu- ção direta. Houve uma relativa descentralização das suas atividades e a Fundação apoiou técnica e financeiramente algumas iniciativas inovadoras de educação básica de jovens e adultos conduzidas por prefeituras municipais ou instituições da sociedade civil. De fato, com o processo de redemocratização polí- tica do país, a reorganização partidária, a promoção de eleições diretas nos níveis subnacionais de governo e a liberdade de expressão e organização dos movimentos sociais urbanos e rurais alargaram o campo para a expe- rimentação e a inovação pedagógica na educação de jo- vens e adultos. As práticas pedagógicas informadas pelo ideário da educação popular, que até então eram desen- volvidas quase que clandestinamente por organizações civis ou pastorais populares das igrejas, retomaram vi- sibilidade nos ambientes universitários e passaram a in- fluenciar também programas públicos e comunitários de alfabetização e escolarização de jovens e adultos. Esse processo de revitalização do pensamento e das práticas de educação de jovens e adultos refletiu-se na Assembléia Nacional Constituinte. Nenhum feito no ter- reno institucional foi mais importante para a educação de jovens e adultos nesse período que a conquista do direito universal ao ensino fundamental público e gra- tuito, independentemente de idade, consagrado no Arti- go 208 da Constituição de 1988. Além dessa garantia constitucional, as disposições transitórias da Carta Mag- na estabeleceram um prazo de dez anos durante os quais os governos e a sociedade civil deveriam concentrar es- forços para a erradicação do analfabetismo e a univer- salização do ensino fundamental, objetivos aos quais de- veriam ser dedicados 50% dos recursos vinculados à educação dos três níveis de governo. A vigência desses mecanismos, somada à descen- tralização das receitas tributárias em favor dos estados e municípios e à vinculação constitucional de recursos para o desenvolvimento e a manutenção do ensino, cons- tituiu a base para que, nos anos subseqüentes, pudesse vir a ocorrer uma significativa expansão e melhoria do atendimento público na escolarização de jovens e adul- tos. O fato de a Organização das Nações Unidas haver Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 121 declarado 1990 como o Ano Internacional da Alfabeti- zação e convocado para essa data a Conferência Mun- dial de Educação para Todos reforçava essa expectativa que, entretanto, acabou não se confirmando. A educação de jovens e adultos em três planos e duas leis de educação Uma das medidas adotadas em março de 1990, logo no início do governo Fernando Collor de Mello, foi a extinção da Fundação Educar. Esse ato fez parte de um extenso rol de iniciativas que visavam ao “en- xugamento” da máquina administrativa e à retirada de subsídios estatais, simultâneas à implementação de um plano heterodoxo de ajuste das contas públicas e con- trole da inflação. Nesse mesmo pacote de medidas foi suprimido o mecanismo que facultava às pessoas jurí- dicas direcionar voluntariamente 2% do valor do im- posto de renda devido às atividades de alfabetização de adultos, recursos esses que conformavam o fundo que nas duas décadas anteriores financiara o MOBRAL e a Fundação Educar. A extinção da Educar surpreendeu os órgãos públi-cos, as entidades civis e outras instituições conveniadas, que a partir daquele momento tiveram que arcar sozi- nhas com a responsabilidade pelas atividades educati- vas anteriormente mantidas por convênios com a Fun- dação. A medida representa um marco no processo de descentralização da escolarização básica de jovens e adultos, pois embora não tenha sido negociada entre as esferas de governo, representou a transferência direta de responsabilidade pública dos programas de alfabeti- zação e pós-alfabetização de jovens e adultos da União para os municípios. Desde então, a União já não partici- pa diretamente da prestação de serviços educativos, en- quanto a participação relativa dos municípios na matrí- cula do ensino básico de jovens e adultos tendeu ao crescimento contínuo, concentrando-se nas séries iniciais do ensino fundamental, ao passo que os Estados (que ainda respondem pela maior parte do alunado) concen- tram as matrículas do segundo segmento do ensino fun- damental e do ensino médio. Nos dois anos que antecederam o impeachment do presidente Collor, seu governo prometeu colocar em mo- vimento um Programa Nacional de Alfabetização e Ci- dadania (PNAC) que, salvo algumas ações isoladas, não transpôs a fronteira das intenções. Tendo mobilizado representações da sociedade civil e instâncias subnacionais de governo em sua elaboração, o PNAC prometia, dentre outras medidas, substituir a atuação da extinta Fundação Educar por meio da transferência de recursos federais para que instituições públicas, priva- das e comunitárias promovessem a alfabetização e a ele- vação dos níveis de escolaridade dos jovens e adultos. Desacreditado como o governo que o propôs, o PNAC foi abandonado no mandato-tampão exercido do vice- presidente Itamar Franco. Em 1993 o governo federal desencadeou mais um processo de consulta participativa com vistas à formu- lação de outro plano de política educacional, cuja exis- tência era requisito para que o Brasil (na condição de um dos nove países que mais contribuem para o elevado número de analfabetos no planeta) pudesse ter acesso prioritário a créditos internacionais vinculados aos com- promissos assumidos na Conferência Mundial de Edu- cação para Todos. Concluído em 1994, às vésperas do final daquele governo, o Plano Decenal fixou metas de prover oportunidades de acesso e progressão no ensino fundamental a 3,7 milhões de analfabetos e 4,6 milhões de jovens e adultos pouco escolarizados. Eleito para a Presidência da República em 1994 e reeleito em 1998, o governo de Fernando Henrique Car- doso colocou de lado o Plano Decenal e priorizou a im- plementação de uma reforma político-institucional da educação pública que compreendeu diversas medidas, dentre as quais a aprovação de uma emenda constitucio- nal, quase que simultaneamente à promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A nova LDB 9.394, aprovada pelo Congresso em fins de 1996, foi relatada pelo senador Darcy Ribeiro e não tomou por base o projeto que fora objeto de nego- ciações ao longo dos oito anos de tramitação da matéria e, portanto, desprezou parcela dos acordos e consensos estabelecidos anteriormente. A seção dedicada à educa- ção básica de jovens e adultos resultou curta e pouco inovadora: seus dois artigos reafirmam o direito dos jo- vens e adultos trabalhadores ao ensino básico adequado às suas condições peculiares de estudo, e o dever do poder Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 122 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 público em oferecê-lo gratuitamente na forma de cursos e exames supletivos. A única novidade dessa seção da Lei foi o rebaixamento das idades mínimas para que os candidatos se submetam aos exames supletivos, fixadas em 15 anos para o ensino fundamental e 18 anos para o ensino médio. A verdadeira ruptura introduzida pela nova LDB com relação à legislação anterior reside na aboli- ção da distinção entre os subsistemas de ensino regular e supletivo, integrando organicamente a educação de jovens e adultos ao ensino básico comum. A flexibilida- de de organização do ensino e a possibilidade de acele- ração dos estudos deixaram de ser atributos exclusivos da educação de jovens e adultos e foram estendidas ao ensino básico em seu conjunto. Maior integração aos sistemas de ensino, de um lado, certa indeterminação do público-alvo e diluição das especificidades psicopeda- gógicas, de outro, parecem ser os resultados contraditó- rios da nova LDB sobre a configuração recente da edu- cação básica de jovens e adultos. A Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases pre- vêem que o Executivo federal elabore e submeta ao Congresso planos plurianuais de educação. Mais espe- cíficas, as Disposições Transitórias da nova LDB deter- minaram que a União encaminhasse ao Congresso um Plano Nacional de Educação de duração decenal, con- soante a Declaração Mundial de Educação Para Todos. Esse foi o impulso para que, em meados de 1997, o MEC desse início a um processo de consultas que resultou em um Projeto de Plano Nacional de Educação (PNE) apre- sentado em fevereiro de 1998 à Câmara dos Deputados. Simultânea e paralelamente à iniciativa do Executivo, uma articulação de organizações estudantis, sindicais e científico-técnicas de educadores fez convergir para o II Congresso Nacional de Educação (Belo Horizonte: nov. 1997) um conjunto de propostas para a educação deno- minado “O PNE da sociedade brasileira”, também con- vertidos em projeto de lei. Embora no corpo principal os dois projetos de lei fossem substancialmente diversos e por vezes francamente conflitivos entre si, as propostas relativas à educação de jovens e adultos não chegavam a ser de todo divergentes, diferindo, sobretudo na abrangência das metas quantitativas e dos montantes de financiamento. Em fins de 1999 o relator da matéria emi- tiu um parecer que adere ao paradigma da educação con- tinuada ao largo da vida, entendida como direito de ci- dadania, motor de desenvolvimento econômico e social e instrumento de combate à pobreza. Desde esse ponto de vista, os desafios relativos à educação de jovens e adultos seriam três: resgatar a dívida social representa- da pelo analfabetismo, erradicando-o; treinar o imenso contingente de jovens e adultos para a inserção no mer- cado de trabalho; e criar oportunidades de educação per- manente. O substitutivo apresentado pelo relator assi- nala que o analfabetismo e os baixos níveis de escolarização não podem ser sanados apenas pela dinâ- mica demográfica, sendo necessário agir tanto sobre o “estoque” de jovens e adultos analfabetos e pouco esco- larizados, como sobre a reprodução desses fenômenos junto às novas gerações, indicando ainda a necessidade de políticas focalizadas dirigidas à região Nordeste, à população feminina, etnias indígenas e afro-descenden- tes. Pondera ser insuficiente prover alfabetização e for- mação equivalente às séries iniciais, insistindo que o direito constitucional e as exigências sociais de conhe- cimento impõem como mínima a escolarização equiva- lente ao ensino fundamental completo. Ao formular os objetivos, entretanto, foram mantidas as mesmas metas quantitativas propostas no PL do Executivo, restritas à alfabetização e às quatro séries iniciais do ensino fun- damental. Aprovado nas comissões do Congresso, o PNE, até maio de 2000, ainda aguardava votação em plenário. A reforma educacional e o FUNDEF A reforma educacional iniciada em 1995 veio sendo implementada sob o imperativo de restrição do gasto pú- blico, de modo a cooperar com o modelo de ajuste estru- tural e a política de estabilização econômica adotados pelo governo federal. Tem por objetivos descentralizar os en- cargos financeiros com a educação, racionalizando e redistribuindo o gasto público em favor do ensino funda- mental obrigatório. Essas diretrizes de reforma educacio- nal implicaram que o MEC mantivesse a educação bási- ca de jovens e adultos naposição marginal que ela já ocupava nas políticas públicas de âmbito nacional, refor- çando as tendências à descentralização do financiamento e da produção dos serviços. Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 123 O principal instrumento da reforma foi a aprova- ção da Emenda Constitucional 14/96, que suprimiu das Disposições Transitórias da Constituição de 1988 o ar- tigo que comprometia a sociedade e os governos a erradicar o analfabetismo e universalizar o ensino fun- damental até 1998, desobrigando o governo federal de aplicar com essa finalidade a metade dos recursos vin- culados à educação, o que implicaria elevar o gasto edu- cacional global. A nova redação dada ao Artigo 60 das Disposições Transitórias da Constituição criou, em cada um dos estados, o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), um mecanismo engenhoso pelo qual a maior parte dos recursos públicos vinculados à educação foi reunida em cada unidade ederada em um Fundo contábil, posterior- mente redistribuído entre as esferas de governo estadual e municipal proporcionalmente às matrículas registradas no ensino fundamental regular nas respectivas redes de ensino. Nesse novo arranjo do regime de colaboração entre as esferas de governo, a União deveria cumprir a função supletiva e redistributiva complementando os Fundos daqueles Estados cuja arrecadação não assegu- rava o valor mínimo por aluno ao ano, fixado em decre- to presidencial anualmente com base na previsão da re- ceita e das matrículas. A lei obrigou estados e municípios a implementar planos de carreira para o magistério, apli- car pelo menos 60% dos recursos do Fundo na remune- ração dos docentes em efetivo exercício e na habilitação de professores leigos, e instituir conselhos de controle e acompanhamento nos quais têm assento autoridades edu- cacionais, representantes das famílias e dos professo- res. No contexto fiscal e tributário brasileiro, esse mecanismo induziu à municipalização do ensino funda- mental, e foi acionado com base no suposto de que o investimento mais eficaz dos recursos municipais nesse nível de ensino daria maior liberdade aos estados para investir no ensino médio e à União para investir no ensi- no superior. Essa redistribuição dos encargos educacio- nais entre as esferas de governo, realizada sem uma am- pliação dos recursos públicos para o setor, deixou larga margem de dúvida sobre as possibilidades de seguir ex- pandindo o sistema público de ensino de modo a atender ao novo perfil demográfico da população e cobrir os ele- vados déficits de vagas, reduzindo os dramáticos índi- ces de evasão e repetência que caracterizam o sistema educacional, melhorando a qualidade da educação e as condições de trabalho do magistério. A operacionalização do dispositivo constitucional que criou o FUNDEF exigiu regulamentação adicional. Embora tenha sido aprovada por unanimidade do Con- gresso, a Lei 9.424/96 recebeu vetos do presidente, um dos quais impediu que as matrículas registradas no en- sino fundamental presencial de jovens e adultos fossem computadas para efeito dos cálculos dos fundos, medida que focalizou o investimento público no ensino de crian- ças e adolescentes de 7 a 14 anos e desestimulou o setor público a expandir o ensino fundamental de jovens e adultos. Ao estabelecer o padrão de distribuição dos recur- sos públicos estaduais e municipais em favor do ensino fundamental de crianças e adolescentes, o FUNDEF deixou parcialmente a descoberto o financiamento de três segmentos da educação básica – a educação infantil, o ensino médio e a educação básica de jovens e adultos. Com a aprovação da Lei 9.424, o ensino de jovens e adultos passou a concorrer com a educação infantil no âmbito municipal e a com o ensino médio no âmbito estadual pelos recursos públicos não capturados pelo FUNDEF. Como a cobertura escolar nestes dois níveis de ensino é deficitária e a demanda social explícita por eles muito maior, a expansão do financiamento da educa- ção básica de jovens e adultos (condição para a expansão da matrícula e melhoria de qualidade) experimentou difi- culdades ainda maiores que aquelas já observadas no pas- sado. Três programas federais de educação de jovens e adultos A década de 1990 tem sido marcada pela relativi- zação – nos planos cultural, jurídico e político – dos direitos educativos das pessoas jovens e adultas conquis- tados no momento anterior.7 A continuidade do processo de democratização, que implicava transpor para as polí- ticas públicas efetivas os direitos educacionais conquis- 7 Sobre o tema veja artigo de Haddad (1997) Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 124 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 tados formalmente no plano jurídico, foi obstada pela crise de financiamento e pela reforma do Estado. As políticas de estabilização monetária e ajuste macroeco- nômico condicionaram a expansão do gasto social pú- blico às metas de equilíbrio fiscal, o que implicou a re- definição de papéis das esferas central e subnacionais de governo, das instituições privadas e das organiza- ções da sociedade civil na prestação dos serviços so- ciais. Consolidaram-se a tendência à descentralização do financiamento e dos serviços, bem como a posição marginal ocupada pela educação básica de jovens e adul- tos nas prioridades de política educacional. Um dos fatos associados a esse processo é o recuo do Ministério da Educação no exercício de suas funções de coordenação, ação supletiva e redistributiva na pro- visão da educação básica de jovens e adultos. Na verdade, o governo federal não se retirou totalmente da provisão desses serviços, pois outras instâncias governamentais acabaram por tomar a iniciativa ou acolher demandas de segmentos organizados da sociedade civil, assumin- do para si a tarefa de promover programas de alfabeti- zação e elevação da escolaridade da população jovem e adulta. Tudo indica que a combinação de dois proces- sos – a capacidade diferencial de expressão pública das demandas educativas por parte de determinados segmen- tos da sociedade civil, de um lado, e as diferenciações internas do aparato burocrático público, de outro – pos- sibilitou a promoção do deslocamento dos programas de formação de pessoas adultas dos organismos de gestão educacional para outros setores da administração, de que resultou a atual dispersão dos programas federais. De fato, ao longo da segunda metade dos anos 90 foram concebidos e tiveram início três programas federais de formação de jovens e adultos de baixa renda e escolari- dade que guardam entre si pelo menos dois traços co- muns: nenhum deles é coordenado pelo Ministério da Educação e todos são desenvolvidos em regime de par- ceria, envolvendo diferentes instâncias governamentais, organizações da sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa. O Programa Alfabetização Solidária (PAS) foi idea- lizado em 1996 pelo Ministério da Educação, mas é co- ordenado pelo Conselho da Comunidade Solidária (or- ganismo vinculado à Presidência da República que desenvolve ações sociais de combate à pobreza). Com o objetivo declarado de desencadear um movimento de solidariedade nacional para reduzir as disparidades re- gionais e os índices de analfabetismo significativamen- te até o final do século, o PAS consiste num programa de alfabetização inicial com apenas cinco meses de du- ração, destinado prioritariamente ao público juvenil e aos municípios e periferias urbanas em que se encon- tram os índices mais elevados de analfabetismo do país. Implementado desde 1997, o Programa teve uma expan- são rápida que parece estar associada à engenhosa parce- ria envolvendo o co-financiamento pelo MEC, empresas e doadores individuais, a mobilização de infra-estrutu- ra, alfabetizandos e alfabetizadores por parte dos go- vernos municipais, e a capacitação e a supervisão peda- gógica dos educadores realizadas por estudantese docentes de universidades públicas e privadas. A Coor- denação afirma que nos três primeiros anos de funcio- namento o PAS chegou a 866 municípios e atendeu 776 mil alunos, dos quais menos de um quinto adquiriu a capacidade de ler e escrever pequenos textos, resultado atribuído pelas universidades ao tempo demasiadamen- te curto previsto para a alfabetização. Manejando um conceito operacional de alfabetismo muito estreito, o PAS corre o risco de redundar em mais uma campanha fra- cassada de alfabetização se não conseguir assegurar que os egressos tenham oportunidades de prosseguir estudos nas redes públicas de ensino, o que é dificultado pela orientação da política educacional mais geral que direciona e focaliza os recursos somente para o ensino de crianças e adolescentes. O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) guarda a singularidade de ser um programa do governo federal gestado fora da arena go- vernamental: uma articulação do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) com o Movimen- to dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi ca- paz de introduzir uma proposta de política pública de educação de jovens e adultos no meio rural no âmbito das ações governamentais da reforma agrária. Coorde- nado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), vinculado ao Ministério Extraordi- nário da Política Fundiária (MEPF), o Programa foi de- lineado em 1997 e operacionalizado a partir de 1998, Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 125 envolvendo a parceria entre o governo federal (respon- sável pelo financiamento), universidades (responsáveis pela formação dos educadores) e sindicatos ou movi- mentos sociais do campo (responsáveis pela mobiliza- ção dos educandos e educadores). O alvo principal do PRONERA é a alfabetização inicial de trabalhadores rurais assentados que se encontram na condição de anal- fabetismo absoluto, aos quais oferece cursos com um ano letivo de duração, mas seu componente mais inova- dor é aquele pelo qual as universidades parceiras pro- porcionam a formação dos alfabetizadores e a elevação de sua escolaridade básica. Mesmo sem dispor de fonte estável de financiamento, o PRONERA vem subsistin- do aos riscos de descontinuidade: em 1999 chegou a 55 mil alfabetizandos e pelo menos 2,5 mil monitores nas 27 unidades da Federação. Coordenado pela Secretaria de Formação e Desen- volvimento Profissional do Ministério do Trabalho (SEFOR/MTb), o Plano Nacional de Formação do Tra- balhador (PLANFOR) não é um programa de ensino fundamental ou médio, destinando-se à qualificação pro- fissional da população economicamente ativa, entendi- da como formação complementar e não substitutiva à educação básica. Desde sua concepção em 1995 a SEFOR/MTb delineou um perfil de formação requerido pelo mercado de trabalho que, ao lado das competências técnicas específicas e habilidades de gestão, compreen- de a educação básica dos trabalhadores, motivo pelo qual comportam iniciativas destinadas à elevação da escola- ridade de jovens e adultos do campo e da cidade. Finan- ciado com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalha- dor (FAT), o PLANFOR é operado descentralizadamente por uma rede heterogênea de parceiros públicos e priva- dos de formação profissional, composta por secretarias de educação e outros órgãos públicos estaduais e muni- cipais, instituições do “Sistema S”, organizações não- governamentais, sindicatos patronais e de trabalhadores, escolas de empresas e fundações, universidades e insti- tutos de pesquisa. O financiamento e a articulação des- sa malha difusa de agentes de formação profissional fo- ram parcialmente descentralizados, mediante assinatura de convênios com os estados, nos quais a coordenação foi atribuída às secretarias de trabalho e emprego. A par- ticipação dos segmentos sociais e agentes de formação na gestão da política foi assegurada pela constituição de comissões deliberativas nas instâncias estadual e muni- cipal, que se somaram ao Conselho Deliberativo do FAT, de âmbito nacional. O Plano visou ampliar e diversifi- car a oferta de educação profissional com vistas a quali- ficar e requalificar anualmente 20% da PEA por inter- médio dos Planos Estaduais de Qualificação (PEQs) e as Parcerias Nacionais e Regionais. Entre 1996 e 1998, quase 60% dos cinco milhões de trabalhadores atendi- dos pelo PLANFOR receberam cursos em habilidades básicas, mas o baixo nível de escolaridade dos cursistas continuou a ser apontado como obstáculo à eficácia do Programa. Contraditoriamente, vem ocorrendo uma es- cassa articulação entre a política nacional de formação profissional consubstanciada no PLANFOR e as redes estaduais e municipais de ensino, que constituem os prin- cipais agentes públicos na oferta de oportunidades de edu- cação básica de jovens e adultos. Desafios presentes e futuros Democratização da educação e superação do analfabetismo Ao longo da segunda metade deste século houve um importante movimento de ampliação da oferta de vagas no ensino público no nível fundamental que trans- formou a escola pública brasileira em uma instituição aberta a amplas camadas da população, superando em parte o caráter elitista que a caracterizava no início do século, quando apenas alguns poucos privilegiados ti- nham acesso aos estudos. Neste momento em que se ini- cia um novo século, porém, essa oferta de vagas ainda se mostra insuficiente, pois um grande número de crian- ças e adolescentes não está estudando. A ampliação da oferta escolar não foi acompanha- da de uma melhoria das condições do ensino, de modo que, hoje, temos mais escolas, mas sua qualidade é mui- to ruim. A má qualidade do ensino combina-se à situa- ção de pobreza extrema em que vive uma parcela im- portante da população para produzir um contingente numeroso de crianças e adolescentes que passam pela escola sem lograr aprendizagens significativas e que, submetidas a experiências penosas de fracasso e repe- Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 126 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 tência escolar, acabam por abandonar os estudos. Te- mos agora um novo tipo de exclusão educacional: antes as crianças não podiam freqüentar a escola por ausên- cia de vagas, hoje ingressam na escola mas não apren- dem e dela são excluídas antes de concluir os estudos com êxito. Essa nova modalidade de exclusão educacional que acompanhou a ampliação do ensino público acabou pro- duzindo um elevado contingente de jovens e adultos que, apesar de terem passado pelo sistema de ensino, nele realizaram aprendizagens insuficientes para utilizar com autonomia os conhecimentos adquiridos em seu dia-a- dia. O resultado desse processo é que, no conjunto da população, assiste-se à gradativa substituição dos anal- fabetos absolutos por um numeroso grupo de jovens e adultos cujo domínio precário da leitura, da escrita e do cálculo vem sendo tipificado como analfabetismo fun- cional. De fato, ao longo do século XX o percentual de analfabetos absolutos no conjunto da população veio declinando continuamente, alcançando na metade dos anos 90 um patamar próximo a 15% dos jovens e adul- tos brasileiros. Em 1996, entretanto, quase um terço da população com mais de 14 anos não havia concluído sequer quatro anos de estudos e aqueles que não haviam completado o ensino obrigatório de oito anos represen- tavam mais de dois terços da população nessa faixa etária. Pesquisa recente mostrou que são necessários mais de quatro anos de escolarização bem-sucedida para que um cidadão adquira as habilidades e competências cognitivas que caracterizam um sujeito plenamente al- fabetizado diante das às exigências da sociedade con- temporânea, o que coloca na categoria de analfabetos funcionais aproximadamente a metade da população jo- vem e adulta brasileira.8 Esses dados demonstram que o desafio da expan- são do atendimento na educação de jovens e adultos já nãoreside apenas na população que jamais foi à escola, mas se estende àquela que freqüentou os bancos escola- res mas neles não obteve aprendizagens suficientes para participar plenamente da vida econômica, política e cul- tural do país e seguir aprendendo ao longo da vida. Cada vez torna-se mais claro que as necessidades básicas de aprendizagem dessa população só podem ser satisfeitas por uma oferta permanente de programas que, sendo mais ou menos escolarizados, necessitam institucionalidade e continuidade, superando o modelo dominante nas cam- panhas emergenciais e iniciativas de curto prazo, que recorrem a mão-de-obra voluntária e recursos humanos não-especializados, características da maioria dos pro- gramas que marcaram a história da educação de jovens e adultos no Brasil. A estruturação tardia do sistema público de ensino brasileiro, suas mazelas e os equívocos das políticas edu- cacionais não parecem suficientes, porém, para esclare- cer as causas da persistência de elevados índices de anal- fabetismo absoluto e funcional e de uma média de anos de estudos inferior àquela de países latino-americanos com níveis equivalentes de desenvolvimento econômi- co. Essa descontinuidade entre as dimensões econômica e cultural da modernização torna-se compreensível quan- do percebemos a estreita associação entre a incidência da pobreza e as restrições ao acesso à educação. A his- tória brasileira nos oferece claras evidências de que as margens da inclusão ou da exclusão educacional foram sendo construídas simétrica e proporcionalmente à ex- tensão da cidadania política e social, em íntima relação com a participação na renda e o acesso aos bens econô- micos. A tese corrente que converte associações positi- vas em nexos causais, afirmando que a elevação da es- colaridade promove o acesso ao trabalho e melhora a distribuição da renda, é apenas uma meia-verdade ele- vada à condição de certeza com base em certa dose de ingenuidade sociológica e otimismo pedagógico. A in- versão dessa mesma equação nos leva a crer ser impro- vável a elevação da escolaridade da população sem a simultânea ampliação de oportunidades de trabalho, transformação do perfil da distribuição da renda e de participação política da maioria dos brasileiros. Os jovens e a nova identidade da educação de adultos Estreitamente relacionado ao tópico anterior, emer- ge um segundo desafio para a educação de jovens e adul-8 Veja Haddad (1997) e Ribeiro (1999). Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 127 tos, representado pelo perfil crescentemente juvenil dos alunos em seus programas, grande parte dos quais são adolescentes excluídos da escola regular. Há uma ou duas décadas, a maioria dos educandos de programas de alfa- betização e de escolarização de jovens e adultos eram pessoas maduras ou idosas, de origem rural, que nunca tinham tido oportunidades escolares. A partir dos anos 80, os programas de escolarização de adultos passaram a acolher um novo grupo social constituído por jovens de origem urbana, cuja trajetória escolar anterior foi mal- sucedida. O primeiro grupo vê na escola uma perspecti- va de integração sociocultural; o segundo mantém com ela uma relação de tensão e conflito aprendida na expe- riência anterior. Os jovens carregam consigo o estigma de alunos-problema, que não tiveram êxito no ensino regular e que buscam superar as dificuldades em cursos aos quais atribuem o caráter de aceleração e recupera- ção. Esses dois grupos distintos de trabalhadores de baixa renda encontram-se nas classes dos programas de esco- larização de jovens e adultos e colocam novos desafios aos educadores, que têm que lidar com universos muito distintos nos planos etários, culturais e das expectativas em relação à escola. Assim, os programas de educação escolar de jovens e adultos, que originalmente se estruturaram para democratizar oportunidades formativas a adultos trabalhadores, vêm perdendo sua identidade, na medida em que passam a cumprir funções de acelera- ção de estudos de jovens com defasagem série-idade e regularização do fluxo escolar. O direito à educação e o papel do Estado na oferta de ensino aos jovens e adultos Nesse breve histórico pudemos constatar que a responsabilidade pela oferta de escolarização de jovens e adultos no Brasil sempre foi compartilhada por órgãos públicos e por organizações societárias. A partir de 1940, o setor público, particularmente o governo federal, as- sumiu o papel de protagonista da oferta educacional dirigida à população adulta, tomando a iniciativa de pro- mover programas próprios e acionar mecanismos de indução e controle sobre outros níveis de governo. Foi assim com as campanhas de alfabetização da década de 1950, com o MOBRAL ou com a Lei 5.692 de 1971 que institucionalizou o Ensino Supletivo. O ponto alto do movimento de reconhecimento do direito de todos à escolarização e da correspondente responsabilização do setor público pela oferta gratuita de ensino aos jovens e adultos ocorreu com a aprovação da Constituição em 1988. As políticas educacionais dos anos 90, porém, fo- ram delineando uma transição na direção do esvaziamen- to do direito social à educação básica em qualquer idade, ao qual correspondeu um movimento da fronteira que de- limita as responsabilidades do Estado e da sociedade na provisão dos serviços de educação de jovens e adultos. Premida pelas políticas de ajuste das contas públi- cas, a reforma educacional implementada pelo governo federal na segunda metade dos anos 90 acabou por fo- calizar recursos no ensino fundamental de crianças e adolescentes de 7 a 14 anos em detrimento de outros níveis de ensino e grupos etários, como as crianças pe- quenas e os jovens e adultos com baixa escolaridade. O que se observa ao final dos anos 90 na ação do governo federal é uma pulverização de projetos de alfabetização e elevação de escolaridade em diversos ministérios, com a renúncia do Ministério da Educação em assumir res- ponsabilidades pelo atendimento direto e exercer o pa- pel de liderança, coordenação e indução dos governos subnacionais. Ao mesmo tempo, o Conselho da Comu- nidade Solidária assumiu a iniciativa de reproduzir ve- lhos modelos ineficazes de campanhas emergenciais de alfabetização de jovens e adultos, implementando o Pro- grama Alfabetização Solidária com recursos de doação de empresas e indivíduos, ficando a responsabilidade pelo financiamento de um direito básico da cidadania ao sa- bor da filantropia ou da boa vontade da sociedade civil. Observa-se, assim, que o ensino fundamental de jovens e adultos perde terreno como atendimento educa- cional público de caráter universal, e passa a ser com- preendido como política compensatória coadjuvante no combate às situações de extrema pobreza, cuja amplitu- de pode estar condicionada às oscilações dos recursos doados pela sociedade civil, sem que uma política arti- culada possa atender de modo planejado ao grande de- safio de superar o analfabetismo e elevar a escolaridade da maioria da população. Por outro lado, o veto presidencial à contagem das matrículas no ensino fundamental de jovens e adultos Sérgio Haddad, Maria Clara Di Pierro 128 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 para efeito dos cálculos do FUNDEF representou a trans- ferência aos estados e municípios da responsabilidade de responder à crescente pressão de demanda, sem que lhes fossem oferecidas as condições de atendê-la de maneira satisfatória. Esse é um dos motivos pelos quais estados e municípios têm procurado alternativas de re- dução dos custos para satisfação da demanda por edu- cação de adultos, seja mediante o incentivo a iniciativas de organizações da sociedade civil, seja recorrendo aos meios de ensino à distância, mesmo quando essas alter- nativas metodológicas não produzem os resultados es- perados nos níveis de aprendizagem, permanência, pro- gressão e conclusão de estudos. A difusão das parceriase o debate sobre serviços públicos não-estatais Ao mesmo tempo em que as políticas educacionais constrangem o papel dos organismos governamentais na provisão de oportunidades de formação para jovens e adultos, crescem a visibilidade e a importância relati- va das iniciativas da sociedade civil, difundindo-se as práticas de parceria envolvendo universidades, movi- mentos sociais, organizações não-governamentais, as- sociações comunitárias, sindicatos de trabalhadores, fun- dações privadas, organismos empresariais e órgãos públicos das três esferas de governo no desenvolvimento de projetos de alfabetização, elevação de escolaridade e/ou de formação profissional. A disseminação de dis- tintas práticas de parceria configura um terreno de ex- perimentação de diferentes concepções do que possam vir a ser, num contexto de reforma do Estado, os servi- ços públicos não-estatais. A educação continuada ao longo da vida Um movimento em sentido oposto ao esvaziamento do direito dos jovens e adultos à escolaridade básica vem sendo observado em países desenvolvidos da Europa, América do Norte e Sudeste Asiático, onde a população adulta passa a dispor de oportunidades crescentes de formação geral, profissional e atualização permanente. A extrema valorização da educação nas sociedades pós- industriais está relacionada à aceleração da velocidade de produção de novos conhecimentos e difusão de infor- mações, que tornaram a formação continuada um valor fundamental para a vida dos indivíduos e um requisito para o desenvolvimento dos países perante a sistemas econômicos globalizados e competitivos. O paradigma de educação continuada emergente nessas regiões con- cebe como espaços educativos múltiplas dimensões da vida social, inclusive os ambientes urbano e de traba- lho, as associações civis, os meios de comunicação e as demais instituições e aparelhos culturais. Nesse marco, as instituições escolares respondem por apenas uma par- cela da formação permanente dos indivíduos, que se apro- priam de conhecimentos veiculados por outros sistemas de informação e difusão cultural. O Brasil que ingressa no século XXI está integra- do cultural, tecnológica e economicamente a essas so- ciedades pós-industriais, e comporta dentro de si reali- dades tão desiguais que fazem com que as possibilidades e os desafios da educação permanente também estejam colocados para extensas parcelas de nossa população. O desafio maior, entretanto, será en- contrar os caminhos para fazer convergir as metodolo- gias e práticas da educação continuada em favor da superação de problemas do século XIX, como a uni- versalização da alfabetização. SÉRGIO HADDAD é doutor em Educação, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, presidente da Asso- ciação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (ABONG) e secretário executivo de Ação Educativa – assessoria, pesquisa e in- formação. E-mail: acaoeduca@originet.com.br MARIA CLARA DI PIERRO é doutora em Educação e asses- sora da organização não-governamental Ação Educativa. E-mail: acaoeduca@originet.com.br Referências bibliográficas ALMEIDA, T.W., (coord.), (1976). Programa de alfabetização fun- cional na região nordeste: subsídios para avaliação. Rio de Ja- neiro: MEC/MOBRAL. AMORIM, J.R., (1978). O adulto analfabeto e a necessidade de alfabetização. Belo Horizonte, s.ed., 27 p. (relatório de pes- quisa) Escolarização de jovens e adultos Revista Brasileira de Educação 129 AVELAR, R.F., (1981). A aquisição do código escrito: o desempe- nho dos alunos do Programa de Alfabetização Funcional do Mobral. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: PUC-RS, 245 p. 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The principal objective is to understand the meaning assigned to it by different groups and/or classes in the quest for democratizing education in our society, meanings which were translated into public policies or in their absence. Leonor Maria Tanuri História da formação de professores Tomando por base trabalhos historiográficos produzidos sobre a Es- cola Normal em diversos estados brasi- leiros, o presente trabalho procura recu- perar a história percorrida por essa instituição, da perspectiva da ação do Estado, ou seja, da política educacional por ele desenvolvida. Nascidas no sécu- lo XIX ao nível de modestas escolas primárias e centradas sobretudo no con- teúdo a ser ensinado, as escolas normais foram aos poucos incorporando um con- teúdo didático-pedagógico. O ideário escolanovista as marcaria definitiva- mente, deslocando a ênfase de seu cur- rículo para as denominadas “ciências da educação”. O artigo aborda questões re- lativas a: consolidação e expansão das escolas normais como instituições for- madoras do magistério para a escola primária, evolução de sua organização geral e curricular, definida, a partir dos anos 30, em nível médio, até as mudan- ças introduzidas pela Lei 9.394/96, que elevou a formação do professor das sé- ries iniciais ao nível superior. History of Elementary School Teachers’ Education in Brazil This paper deals with the history of the Brazilian training college for elementary school teachers from the viewpoint of State educational policy and having as sources historiographical works on elementary school teacher’s training colleges of several States. Founded in 19th. century those institutions initially showed a rather modest feature of elementary schools themselves with emphasis on the content to be taught. With time, however, they progressively incorporated a didatic-pedagogical content. New School movement ideas influenced them decisively changing the emphasis of their curricula to the “sciences of education”. The article examines questions related to: consolidation and expansion of that College, evolution of its general and curricular organization which has reached the secondary level from the 1930’s onwards until the National Education Law 9.394/96 when a higher education level was required to elementary teachers. Luiz Antônio Cunha O ensino industrial-manufatureiro no Brasil O artigo apresenta a origem e o desen- volvimento do ensino de ofícios para trabalhadores das manufaturas e indús- trias no Brasil, desde o século XVIII. A tese central é a de que os preconceitos contra o trabalho manual representam o mais importante determinante da desva- lorização das escolas profissionais, as- sim como do sistema educacional dual no país. Desde 1942, o SENAI desem- penhou um novo papel na formação da força de trabalho industrial brasileira, em termos de recrutamento de alunos, pedagogia, gestão e financiamento. Nos anos recentes, todavia, essa instituição perdeu a hegemonia conquistada no campo educacional, e prepara um con- junto de importantes decisões para se prevenir dos conflitos com o Estado e os sindicatos de trabalhadores. Industrial-manufacturing education in Brazil The article presents the origin and the development of the training of works for manufactures and factories in Brazil, since eighteenth century. Its central thesis is that the prejudices againstmanual work represent the main determinant of the underevaluation of the professional schools, as well as the dual educational system within the country. Since 1942, SENAI performed a new role in the brazilian industrial labor force training, in terms of students recruitment, pedagogy, management and financing. Nevertheless, in the recent years, that institution has lost the hegemony acquired in educational field, and pre- pares a package of importants decisions in order to prevent conflicts with State and labores syndicates. Sérgio Haddad e Maria Clara Di Pierro Escolarização de jovens e adultos O artigo aborda os processos sistemáti- cos e organizados de formação geral de pessoas jovens e adultas no Brasil sob a ótica das políticas públicas. Oferece uma visão panorâmica do tema ao lon- go dos quinhentos anos de história bra- sileira, dedicando especial atenção à segunda metade do século XX, em que o pensamento pedagógico e as políticas de educação escolar de jovens e adul- tos adquiriram identidade e feições próprias. Analisa o sentido político que a ditadura militar conferiu à alfa- betização de adultos e ao ensino suple- tivo nos anos 70, as diversas configura- ções assumidas pelas políticas públicas de educação escolar de jovens e adultos ao longo do processo de redemocratização dos anos 80, assim como a posição marginal conferida a essa modalidade de ensino pela refor- ma educacional dos anos 90. O ensaio indica como desafios a redefinição dos papéis do poder público e da sociedade na democratização de oportunidades de alfabetização, escolarização básica e educação continuada para que possam responder às crescentes necessidades Resumos/Abstracts 194 Mai/Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 formativas da juventude e das pessoas adultas no Brasil contemporâneo. Youth and adults schooling The article covers the systematic and organized processes of general education offered to youth and adults, carried out in Brazil, in the light of public policies. It offers an overview of this theme throughout the five hundred years of Brazilian history and dedicates special attention to the last half of the 20th century in which pedagogical tenets and school education policies for youth and adults take on specific features. It analyses the political meaning that the military dictatorship imputed to adult literacy programs and post literacy education in the 70’s, the several designs taken on by youth and adult school education public policies throughout the process of re- democratization in the 80’s, as well as the marginal position that has been given to this type of education in the 90’s. The essay indicates as a challenge the redefinition of public sector and society rules in democratizing opportunities for literacy, basic schooling and continued education in order to respond to the growing formative needs of young and adult people in contemporary Brazil. Ana Waleska P.C. Mendonça A universidade no Brasil Este artigo se propõe a traçar uma visão panorâmica da história do ensino supe- rior no Brasil, tendo como foco de aná- lise a universidade como uma institui- ção historicamente construída e privilegiando o período que vai dos anos 20 aos anos 60, ao longo dos quais a universidade se institucionaliza entre nós e assume a sua configuração atual. The university in Brazil The article presents an overall view of the history of higher education in Brazil, focusing on the university as a historically constructed institution and emphasizing the period from 1920’s to 1960’s, in which the Brazilian university became established as an institution and took on its present form. a Educação dE adultos E jovEns E adultos: uM olhar sobrE o passado E o prEsEntE* osmar Fávero, da Universidade Federal Fluminense. marinaide Freitas, da Universidade Federal de Alagoas. rEsuMo: Este trabalho constitui-se em um grande desafio, consi- derando a abrangência da temática e o objetivo de debatermos e refletirmos sobre o passado histórico da Educação de Adultos (EDA) e da Educação de Jovens e Adultos (EJA), tendo em vista a neces- sidade de compreendermos o seu presente, diante da ausência de políticas educacionais voltadas para a área, em nosso país, que chega a 2011 sem superar o analfabetismo das pessoas acima de 15 anos. É um texto polifônico e ainda inacabado. Foi elaborado a quatro mãos, contendo olhares e vozes de pesquisadores da área, por isto caracterizamos como estudo exploratório, a partir de aná- lises dos documentos pesquisados. Está estruturado em seis eixos temáticos que denominamos passos, temporalizados e nomeados a partir do foco de cada época mencionada. palavras-chavE: Histórico da Educação de Adultos e da Educação de Jovens e Adultos. Educação supletiva. Educação Popular. Educação permanente. Educação continuada. 1º passo: paschoal lEMME (1938-1940): Educação suplEtiva/Educação dE adultos1 Historicamente foi o primeiro trabalho sobre educação de adultos no Brasil, apresentado como tese de concurso para técnico de educação do Ministério de Educação e Saúde (MES), em 1938, tomando como base as experiências realizadas pelos países desenvolvidos, a exemplo da * Artigo recebido em 22/05/2011 e aprovado em 27/07/2011. DOI 10.5216/ia.v36i2.16712 TEXTO 02 FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos Inglaterra, França, Estados Unidos, após o final da 1ª Grande Guerra Mundial (1914-1918). Época em que foram implantadas extensas redes de educação não sistemática, chamadas de extraescolar e em que foram recuperados os resultados das pesquisas realizadas na Psicologia sobre a capacidade dos adultos aprenderem, realizados por Thorndike.2 Retoma também os importantes estudos de Dewey3 e Kilpatrick,4 muito atuais na época. Nesse estudo de Pascoal Lemme fica explícito que o termo educação popular refere-se à extensão do ensino elementar, na época escola primária (de 4 anos, considerada obrigatória somente até os 10 anos de idade), às crianças e aos adolescentes e adultos das camadas populares. Para os adultos, essa extensão reduzia-se, em geral, à alfabetização oferecida em cursos noturnos, de curta duração, que constituíam a forma mais elementar de solução da questão. Funcionavam incipientemente à míngua de recursos financeiros e, sobretudo, de atenção esclarecida dos seus responsáveis, o que ainda acontece no nosso país. Lemme (2004, p. 49) afirma ainda que a revolução industrial gerou uma dupla exigência para a educação de adultos: Nesta fase, vamos encontrar a educação de adultos com um duplo aspecto: de um lado, satisfazendo às necessidades das classes dirigentes e por elas estimulada; de outro, incluída entre as reivindicações das classes populares, cada vez mais ávidas de aperfeiçoarem suas condições culturais e técnicas. No caso brasileiro, o pesquisador não considera as atividades edu- cacionais desenvolvidas por empresas, desde os primórdios da implantação das primeiras indústrias no século XIX. Não comenta também as iniciativas desenvolvidas pelos anarquistas5 e outros grupos políticos, mas refere-se como importante a experiência do Liceu de Artes e Ofícios, criado em 1856, no Rio de Janeiro, que mantinha cursos noturnos para operários. Detém-se, em especial, na experiência dos Cursos de Extensão, Continuação, Aperfei- çoamento e Oportunidade, por ele concebidos, instalados e coordenados no antigo Distrito Federal (atualmente Município do Rio de Janeiro), em 1935, durante a gestão de Anísio Teixeira na Diretoria de Educação de Adultos e Difusão Cultural6 da Secretaria de Educação. Merece destaque a qualidade excepcional desse estudo, pela atualidade de muitas afirmações feitas, em particular sobre as atitudes e competência dos professores para trabalhar na educação de adultos e pela coerência do compromisso político do autor com o atendimento prioritário aos operários e demais pessoas das classes populares. Inter-Ação, Goiânia, v. 36,n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 367Dossiê 2º passo: lourEnço Filho (1945-1962) – o problEMa da Educação dE adultos7 Ao lermos os escritos de Lourenço Filho, a partir da temática acima mencionada, observamos que assume a definição de educação de adultos tendo por base a proposta por Moehlman (1944, p. 587, apud LOURENÇO FILHO, 1945, p. 176), ou seja: consistiria em qualquer plano, sistemático ou assistemático, de educação destinada a adolescentes e adultos, independente dos planos escolares convencionais, de instituições públicas e particulares. Recorrendo à literatura estrangeira, afirma que a capacidade de aprender dos adultos requer uma metodologia especial de ensino que considere o desuso da aprendizagem, desenvolva a autoconfiança e parta do diálogo. Para tanto, deveriam ser disponibilizados o rádio, a imprensa, o cinema, a biblioteca, as discotecas, dentre outros meios. Outra questão por ele enfocada, que permanece importante e discutida ainda hoje, é a formação de professores para atuar nas classes de jovens e adultos. Naquela época, ele enfatizava: [...] todas as vezes que alguém que assuma a responsabilidade de educar necessitará de ordem e método, isto é, de compreensão segura dos fun- damentos de seu trabalho. É o conhecimento do método que distingue o verdadeiro profissional do amador, mesmo quando este possua o título de professor. (LOURENÇO FILHO, 1945, p. 180) E complementava: Quem pretenda ensinar a adultos, como às crianças, precisará de conhecer, por pouco que seja, os processos de aprendizagem e os princípios gerais da didática. Mas estes ainda não bastam. Há na verdade, uma pedagogia especial para adultos. (LOURENÇO FILHO, 1945, p. 180) Entendemos, ainda, que essa pedagogia especial implica o respeito às especificidades da modalidade, o respeito e o aproveitamento dos saberes dominados pelos jovens e adultos, e o respeito à heterogeneidade dos sujeitos que dela participam. Lourenço Filho (1945, p. 177) indicava como funções da educação de adultos: a) supletiva, de combate ao analfabetismo; b) profissional, visando a reajustar o homem às novas condições de traba- lho, por meio de cursos extraescolares de continuação, aperfeiçoa mento e difusão cultural; FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos c) cívico-social, no caso de migrantes do país e imigrantes estrangeiros. A função supletiva foi inteiramente assumida pela primeira Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), organizada pelo Ministério da Educação e Saúde (MES), a partir de 1947. Os alunos analfabetos eram atendidos em classes de emergência, designadas como de ensino supletivo e organizadas com apoio das secretarias de educação e entidades privadas. As aulas eram noturnas, com professores do antigo ensino primário ou voluntários, e material didático produzido em grandes quantidades e distribuído pelo MES: cartilha de alfabetização Ler, livro de leitura Saber, elaborados segundo o método Laubach,8 e Manual de Aritmética, além de fascículos sobre higiene e saúde, civismo, técnicas agrícolas rudimentares, dentre outros pontos. Influenciada pela criação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 1947, a CEAA assume o amplo conceito de educação de base no sentido de: 1) desenvolvimento do pensamento e dos meios de relacionamento (ler e escrever, falar e ouvir, calcular); 2) desenvolvimento profissional (agricultura, trabalhos caseiros, edificação, formação técnica e comercial necessária ao progresso econômico); 3) desenvolvimento de habilidades domésticas (pre- paração de comida, cuidado das crianças e enfermos); 4) desenvolvimento de meios de expressão da própria personalidade em artes e ofícios; 5) desenvol- vimento sanitário por meio da higiene pessoal e coletiva; 6) conhecimento e compreensão do ambiente físico e dos processos naturais (elementos científico-práticos); 7) conhecimento e compreensão do ambiente humano (organização econômica e social, leis e governos); 8) conhecimento das outras partes do mundo e dos povos que nelas habitam; 9) conhecimento de qualidades que capacitam o homem a viver no mundo moderno, como o são o ponto de vista pessoal e a iniciativa, o triunfo sobre o medo e a su- perstição, a simpatia e a compreensão para com as opiniões diferentes; 10) desenvolvimento moral e espiritual; fé nos ideais éticos e aquisição do hábito de proceder de acordo com eles, com a obrigação de submeter a exame as formas de condutas tradicionais e de modificá-las segundo o requeiram as novas circunstâncias. (Unesco, 1949, p. 11-12; trad. de BEISIEGEL, 1974, p. 81-82; 2004, p. 91-92) Esta Campanha coincidiu com o movimento de expansão da escola primária para crianças, inaugurando o apoio do MES aos estados e destes aos municípios no atendimento escolar obrigatório. Demarca a institucionalização de educação de adultos, uma vez que teve a União como sua implementadora, Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 369Dossiê contando com recursos financeiros do Fundo Nacional do Ensino Primário (FNEP). Compreendemos como institucionalização da EDA e da EJA as ações, desde a alfabetização ao ensino médio, realizadas historicamente, tendo por base o aparato das leis/normas/resoluções advindas das esferas nacional, estaduais e municipais, bem como outros documentos referenciais internacionalmente constituídos.9 Em uma análise mais geral, podemos afirmar, com Mészaros (2005), que a educação, especialmente nos últimos 150 anos, serviu – no seu todo – ao propósito de não só fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à máquina produtiva em expansão do sistema do capital, como também gerar e transmitir um quadro de valores que legitima os interesses dominantes, como se não pudesse haver nenhuma alternativa à gestão da sociedade, seja na forma internalizada, pelos indivíduos devidamente educados e aceitos, seja por meio de uma dominação estrutural e uma subordinação hierárquica implacavelmente imposta. Retomando o histórico brasileiro, a CEAA, por influência da proposta de desenvolvimento de comunidades divulgada pelos Estados Unidos e da experiência das missões rurais realizadas no México, foi reforçada, a partir de 1950, pela Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), que também partia do conceito de educação de base, estrategicamente designada como educação rural, adentrando também na categoria de iniciativas institucionalizadas no Brasil.10 Nesse mesmo período, o governo federal incentivou ainda a criação, em 1946, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e logo depois do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), vinculados ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, visando à formação profissional com a colaboração dos setores industrial e comercial.11 3º passo: MoviMEntos dE cultura E Educação popular do início da década dE 1960 O amadurecimento do processo democrático, revelado nas elei- ções majoritárias de 1958; as experiências inovadoras na área da cultura e os debates sobre educação, na segunda metade dos anos de 1950; a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1961; e a aprovação do Plano Nacional de Educação, em 1962; ao lado do enfraquecimento das campanhas nacionais, criaram as condições para novas experiências de educação de adultos, com a consequente redefinição FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos de um conceito de alfabetização voltado apenas para ler, escrever e contar. Por isso, pode ser caracterizado como um momento de ruptura com a forma institucionalizada até então, viabilizando o repensar da Educação de Adultos no Brasil. O primeiro sinal é dado pelo discurso do Presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira, na abertura do II Congresso Nacional de Educação de Adultos realizado no Rio de Janeiro, em 1958, sobre o importante papel da educação dos adultos na solução dos problemas criadospelo desenvolvimento econômico. Cabe, assim, à educação dos adolescentes e adultos, não somente suprir, na medida do possível, as deficiências da rede de ensino primário, mas também e muito principalmente dar um preparo intensivo, imediato e prático aos que, ao se iniciarem na vida, se encontram desarmados dos instrumentos fundamentais que a sociedade moderna exige para completa integração nos seus quadros: a capacidade de ler e escrever, a iniciação profissional técnica, bem como a compreensão dos valores espirituais, políticos e mo- rais da cultura brasileira. Vivemos, realmente, um momento de profundas transformações econômicas e sociais na vida do País. A fisionomia das áreas geográficas transforma-se contínua e rapidamente, com o aparecimento de novas condições de trabalho que exigem, cada vez mais, mão-de-obra qualificada e semiqualificada. O elemento humano convenientemente preparado, que necessita nossa expansão industrial, comercial e agrícola, tem sido e continua a ser um dos pontos fracos da mobilização de força e recursos para o desenvolvimento. Essa expansão vem sendo tão rápida e a consequente demanda de pessoal tecnicamente habilitado tão intensa, que não podemos esperar a sua formação regular de ensino; é preciso uma ação rápida, intensiva, ampla e de resultados práticos e imediatos, a fim de atendermos os reclamos do crescimento e do desenvolvimento da Nação. (KUBITSCHEK DE OLIVEIRA, 1958, p. 3) É também nesse congresso que pela primeira vez é questionada a prioridade dada à educação, e em especial à alfabetização, como motora do pretendido desenvolvimento econômico-social. No relatório de uma das comissões do seminário preparatório realizado em Pernambuco, cujo relator foi Paulo Freire, afirma-se que o problema fundamental é a miséria do povo e propõe-se outra forma de trabalho educativo: não sobre ou para o homem, mas com ele, considerando “imperativa sua participação em todos os momentos do trabalho educativo, preparatória ou concomitante àquela outra ainda mais estimável, que é a participação na vida da região e nas esferas mais amplas da sociedade em que vive”.12 Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 371Dossiê Na efervescência no contexto histórico da realidade brasileira, foi realizada a implantação de vários movimentos designados de cultura popular, entre os quais destacam-se: Movimento de Cultura Popular (MCP, Recife, 1960); Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE, 1961), que se expandiu para vários estados; Campanha De Pé no Chão se Aprende a Ler (Natal, 1961); Campanha de Educação Popular da Paraíba (CEPLAR, 1962); Movimento de Educação de Base (MEB), criado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em 1961, com apoio do governo federal; e o Sistema de Alfabetização Paulo Freire, que, a partir da experiência de Angicos, em 1963, inovou radicalmente não só o conceito de alfabetização como consolidou o próprio modo de trabalhar com os adultos. A fundamentação apresentada e a proposta do sistema de alfabetização de adultos sugerida por Paulo Freire, nessa ocasião, configura-se em um novo entendimento da educação de adultos, cujo passo inicial seria a alfabetização feita na perspectiva da conscientização (FREIRE, 1963). Não temos dúvida em afirmar que a melhor metodologia de trabalho foi o Sistema Paulo Freire de Alfabetização, que estava na base de um amplo Sistema de Educação de Adultos, iniciado com a alfabetização e culminando com uma Universidade Popular, numa perspectiva de alargamento da continuidade dos estudos bem mais avançada do que a que encontramos nos dias atuais. De acordo com o foco deste texto, o importante a destacar do conjunto dos movimentos de cultura e educação popular do início dos anos de 1960 é: a) o conceito de cultura popular, assumido como fundamental, do qual passou a derivar o conceito de educação popular – não a disseminação da cultura erudita aos setores populares, mas a consideração da cultura do povo como expressão de sua visão de mundo e, a partir dela, no que se designou conscientização, pensar a transformação da realidade em uma perspectiva democrática; b) uma nova forma, consequentemente, de entender a alfabetização, proposta por Paulo Freire, com expressa dimensão política; e c) a definição e vinculação assumida dos movimentos de cultura e educação popular com o movimento social mais amplo, no qual teve origem e ao qual se alia na luta por um novo projeto histórico. A melhor expressão desse compromisso encontra-se em um documento denominado Plano de Ação do MCP para 1963: 1. Um movimento de cultura popular só surge quando o balanço das rela- ções de poder começa a ser favorável aos setores populares da comunidade FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos e desfavorável aos seus setores de elite. Esta nova situação caracteriza, de modo genérico, o quadro atual da vida brasileira [...]. 2. O movimento popular gera o movimento de cultura popular. O movimento popular, ao atingir determinada etapa de seu processo de desenvolvimento, experimenta a necessidade de liquidar certos entraves de ordem cultural que se apresentam como barreiras características daquela etapa, dificultando a passagem para a etapa seguinte. A superação de tais dificuldades se apre- senta como condição para o prosseguimento do processo. 3. O movimento popular não gera um movimento cultural qualquer. Gera, precisamente, um movimento de cultura popular. Os interesses culturais do movimento popular têm, portanto, um caráter específico: exprimem a necessidade de uma produção cultural, a um só tempo voltada para as massas e destinada a elevar o nível de consciência social das forças que integram, ou podem vir a integrar, o movimento popular. 4. A demanda por uma consciência popular adequada ao real e possuída pelo projeto de transformá-lo é característica do movimento popular por- que este se assenta nas três seguintes pressuposições: a) só o povo pode resolver os problemas populares; b) tais problemas se apresentam como uma totalidade de efeitos que só pode ser corrigida pela supressão de suas causas, radicadas nas estruturas sociais vigentes; c) o instrumento que efetua a transformação projetada é a luta política guiada por ideias que representam adequadamente a realidade objetiva.13 O MEB, o único movimento que atuava exclusivamente no meio rural, que havia iniciado seus trabalhos de alfabetização por meio de escolas radiofônicas e assumido, em um primeiro momento, o conceito de educação de base da Unesco, redefiniu-o radicalmente ao final de 1962: Considerando as dimensões totais do homem, entende-se como educação de base o processo de autoconscientização das massas, para uma valorização plena do homem e uma consciência crítica da realidade. Esta educação deve- rá partir das necessidades e dos meios populares de participação, integrados em uma autêntica cultura popular, que leve a uma ação transformadora. Concomitantemente, deve propiciar todos os elementos necessários para capacitar cada homem a participar do desenvolvimento integral de suas comunidades e de todo o povo brasileiro.14 Num segundo momento houve redefinições, com o amadureci- mento do trabalho junto às comunidades rurais e alternativas à censura aos programas radiofônicos; o MEB passou a privilegiar o contato direto com a população atingida. Nesse movimento, redefiniu o desgastado conceito de desenvolvimento de comunidades, criando o de animação popular, entendida como um processo essencialmente político, porque Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 373Dossiê a) é uma educação de vida comunitária, de participação comum nos problemas e soluções de cada dia e, por isso, é um processo gradativo de conscientização; b) estrutura a comunidade de tal forma que possibilita a participação política de cada um na vida da comunidade, através de grupos e trabalhos comuns; c) leva inevitavelmentea ampliar esta vida política para o processo político nacional. (MEB, 1966, p. 27) Em termos da definição da educação de adultos, ainda neste período, há um registro importante que merece ser feito: o Seminário promovido pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e realizado em Recife, em janeiro de 1967, com o propósito de fixar as diretrizes para os programas de educação de adultos na Região Nordeste. Mesmo considerando o momento político autoritário que o Brasil vivia, foi elaborado com muita clareza e pertinência o Documento Final das Diretrizes, contendo propostas para um Programa da Educação de Adultos da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (BRASIL, 1967). Essas propostas, exemplificadas a seguir, foram abortadas: a) a educação de adultos não pode se limitar a “alfabetizar por alfabetizar”, mas deve preparar os indivíduos e os grupos para participarem responsável e produtivamente de um processo de mudança cultural identificado como um processo de desenvolvimento socioeconômico. (p. 2) b) Quando a educação de adultos é repensada em termos de desenvolvimen- to, é indispensável que se leve em conta a grande massa de marginalizados. É necessário que esta parte da população seja motivada para que, de modo consciente, integre, participe e assuma o processo de mudança, uma vez que este mundo adulto é detentor de capacidade de decisão, de esforço, de tra- balho e pensamento não solicitados na medida de suas possibilidades. (p. 10) c) Em termos da realidade brasileira, a educação de adultos, integrada em um conjunto de medidas, deve ter como consequência, entre outras, libertar o homem da condição de “objeto” dos processos culturais. (p. 10) Os movimentos de educação popular, surgidos no mesmo período, dão um salto qualitativo em relação às campanhas e mobilizações governa- mentais contra o analfabetismo de adultos, ou de educação rural, dos anos de 1940 e 1950. Foram iniciativas qualitativamente diferentes das ações anteriores. Havia um compromisso explicitamente assumido em favor das classes populares, urbanas e rurais, assim como orientação da ação educativa para uma ação política. FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos Em nosso entender, perdeu-se, nesse período, a oportunidade signi- ficativa de absorver as práticas de educação popular como política pública. A alfabetização e educação das pessoas adultas, no início dos anos de 1960, apareciam como perigosas para a estabilidade do regime e para a preservação da ordem capitalista e por isto foram suprimidas pelo golpe militar de 1964. 4º passo: Educação pErManEntE, Educação continuada (Final dos anos dE 1960 E início dos anos dE 1970) De um lado, as exigências postas pelas transformações no sistema produtivo e a grande demanda pela expansão do ensino em níveis cada vez mais elevados produziram, na Europa, o que se designou como crise da educação (COOMBS, 1968). De outro lado, o relativo fracasso das grandes campanhas de alfabetização e o insucesso do planejamento educacional nos países considerados subdesenvolvidos passaram a enfatizar os modos de educação não escolares, ou realizados à margem dos sistemas de ensino regulares, que passaram a ser designados como não formais ou extraescolares. O tema da educação permanente privilegiava a educação de adultos, referida, em primeiro plano, pelo menos no caso europeu, à possibilidade de formação para o mercado de trabalho, necessariamente continuada, exigida pelos novos sistemas de produção. Alguns autores abordavam também, e algumas vezes prioritariamente, a formação cultural mais ampla, propondo aprendizagens sistemáticas ou livres no lazer ou nas férias, por meio do cinema, da literatura, do turismo, dentre outras formas de aprender. Essa foi a perspectiva mais desenvolvida teoricamente, no Brasil e na América Latina. Mas as críticas feitas às experiências europeias, sobretudo francesas, denunciavam que as atividades consideradas de educação permanente ou de educação continuada eram promovidas, sobretudo, por empresas e sempre postas em termos de atualização profissional. A produção sobre estes temas foi bastante grande e divulgada pela Unesco e pela Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico (OCDE). No entanto, a produção de autores brasileiros foi muito limitada. Quem garantiu a divulgação desses conceitos no país, de forma significativa, foi Pierre Furter,15 por meio da publicação de vários livros, bastante lidos entre nós. Por sua vez, o n. 113 da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, de jan./mar. 1969, contém importante dossier sobre o tema, inclusive o documento de trabalho “Educação permanente na perspectiva do desenvolvimento nacional”, elaborado por Pierre Furter e Aníbal Buitrón para o simpósio realizado em Caracas em 1968, sintetizando as discussões e Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 375Dossiê as propostas existentes, assim como propondo alternativas para a América Latina. É também desse período a publicação do relatório coletivo da Comis- são Internacional para o Desenvolvimento da Educação, criada pela Unesco, Aprender a ser, coordenada por Edgar Faure,16 em 1972, que se tornou um catecismo para os defensores da educação permanente. Menos divulgado, mas também importante e bastante mais concreto – desde a explicitação do sistema de valores que orientava o projeto, reorganização das escolas, valorização de outras agências educativas, até a proposta de organização de distritos educativos – é o relatório “A educação amanhã: um projeto de educação permanente”, produzido pela Fundação Europeia da Cultura, sob coordenação de Bertrand Schwartz.17 Em termos teóricos, a concepção de educação permanente partia da incompletude do homem, a ser completada com o apoio de processos educativos durante toda a vida e não apenas na faixa etária privilegiada para a educação básica, compreendida pelo início da escolarização até o ensino médio, realizados em várias instituições da sociedade e não apenas em escolas. Na sistematização proposta por Furter (1966, p. 136) afirma-se: [...] a educação permanente não pode ser reduzida nem a uma educação “extraescolar”, nem “complementar”, nem “prolongada”, nem “fundamental”, nem tampouco “de adultos”, porque todas estas interpretações só veem uma parte do problema. A educação permanente não é algo que se acrescente a um sistema dado. Não é um novo setor, um novo campo. É uma nova perspectiva que leva os educadores a redefinir toda e qualquer educação. Um de seus pontos fundamentais era a relação entre a educação geral e a educação técnica ou a formação profissional, especialmente sua relação intrínseca: sem educação geral de qualidade não se consegue uma formação profissional satisfatória, em termos de abstração e capacidade de decisão exigidas pelos novos processos produtivos. No caso brasileiro, os anos de 1970 até meados dos anos de 1980 foram marcados por duas ações complementares, embora pouco articuladas: a Lei n. 5692/71, que criou os ensinos de 1º e 2º Graus e sistematizou o Ensino Supletivo, em termos de exames e cursos, e o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), ambas influenciadas pela ideologia da educação permanente. No primeiro caso, o Parecer n. 699/72 do Conselho Federal de Educação justificou a criação de um Sistema de Ensino Supletivo, paralelo ao Sistema de Ensino Regular, prevendo a criação de outro modelo de escola – os Centros de Ensino Supletivo (CES), existentes ainda em alguns estados – e FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos tentando coordenar e certificar, pelo menos em parte, ações já realizadas pelo Senai e Senac, por exemplo. No mesmo movimento, o MEC implantou vários projetos visando a regularizar a situação de profissionais experientes, mas não titulados, sobretudo em nível médio: desenhistas, enfermeiros, professores, dentre outras categorias, com base em regulamentaçãoprópria e materiais didáticos específicos. Quanto aos exames supletivos, a partir da criação do 1º Grau, reunin- do o antigo primário e o curso ginasial, o mercado de trabalho passou a exigir o certificado de oito anos de estudos. A procura da certificação neste nível mobilizava milhares de pessoas, que lotavam estádios de futebol, obrigando a padronização dos exames em nível nacional. Embora com menor intensidade, a procura dos exames supletivos de 2º Grau, naquele período, também foi significativa, tendo se tornado crescente no período mais recente, quando o mercado de trabalho passou a exigir a certificação em nível do ensino médio.18 O conceito de educação de adultos assumido pelo Departamento de Ensino Supletivo (DSU) do MEC é, em primeiro lugar, de suplência do ensino não obtido no sistema regular, e de suprimento, entendido como complementação da educação recebida nos bancos escolares, a ser obtida em outras agências de formação. Embora se justifique pela categoria de educação permanente, sua proposta é estritamente escolar, prevendo para os adultos repetidas voltas à escola – o que é uma evidente redução do conceito. Deve-se anotar, neste período, a presença de adolescentes e jovens nos cursos de ensino supletivo, em parte porque expulsos do ensino regular por terem superado a idade dos 14 anos, prevista como limite para a obrigatoriedade do 1º Grau, hoje do Ensino Fundamental, cunhando-se a expressão juvenilização do supletivo. Mas também porque muitos jovens migravam para as metrópoles, em busca de trabalho nas grandes obras de infraestrutura: pontes, elevados, metrô etc. As próprias discussões sobre a educação permanente começam a incorporar a categoria juventude, recuperada como temática importante pela Sociologia.19 O Mobral tem sua história bastante conhecida, embora a produção sobre ele seja pequena. Estruturou-se como fundação, com poderosa coor- denação nacional e comissões coordenadoras em praticamente todos os municípios. Com integral apoio dos governos militares e recebendo transfe- rências vultosas da Loteria Esportiva e doações do empresariado, deduzidas do Imposto de Renda por elas devido, foi a campanha de alfabetização mais ampla e mais rica, o que lhe permitiu produzir farto material didático, centrali- zado em plano nacional, e importantes investimentos na formação de pessoal. Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 377Dossiê No entanto, o exame do material didático utilizado tanto para a alfabetização quanto para as classes ditas de ensino integrado, constituem- se, na verdade, uma reposição da primeira fase do ensino de 1º Grau, revelando a adoção das mesmas sistemáticas utilizadas nas escolas regulares. Sua concepção de educação permanente é a adotada pelos economistas da educação, justificando a necessidade de mais estudo para melhor desempenho nas tarefas profissionais, cada vez mais exigentes pela transformação dos meios de produção. Segundo Ribeiro (1992) esse movimento teve também um indicador de população bastante jovem. A pesquisadora, aproximando-se dos diversos estudos apresentados à época, constatou que algo em torno de 60% dos estudantes do Mobral tinham menos de 20 anos e mais da metade deles já havia frequentado a escola. Sua demanda, pois, não era majoritariamente de adultos, que não tiveram acesso à escola na infância, ou que passaram muitos anos dela afastados. É importante deixar registrado também que, tanto nas campanhas iniciadas nos anos de 1940 quanto nos movimentos do início dos anos de 1960, foi produzido e distribuído farto material sobre higiene, saúde e trabalhos a serem feitos com poucos recursos. No caso do Mobral, no entanto, sua produção mais interessante, sobre temas culturais e de divulgação de obras clássicas, parece não ter chegado aos alunos. 5º passo: constituintE dE 1987-1988; constituição FEdEral dE 1988 E anos dE 1990 A intensa participação das organizações e movimentos na Constituin- te gerou uma postura muito ativa e a produção de vários documentos em defesa da educação básica de 12 anos – compreendendo a educação infantil, o ensino fundamental, o ensino médio e a educação de jovens e adultos – e propostas específicas para cada uma dessas modalidades. A conquista maior, expressa na Constituição de 1988, foi a declaração do ensino fundamental como direito público subjetivo. Seu não oferecimento, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente – inclusive para os que não tiveram oportunidade de cursá-lo ou concluí-lo na idade própria. A partir de então, com o retorno das eleições diretas para prefeitos, os municípios que foram administrados por partidos políticos progressistas buscaram qualificar a EJA, institucionalizando-a no contexto de suas secretarias de educação, criando setores/departamentos responsáveis pela sua implantação, cuidando da formação continuada de professores, FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos elaborando propostas curriculares específicas, muitas delas retomando as propostas freirianas, dentre outros pontos. Os municípios brasileiros que mais se destacaram à época foram Porto Alegre, Santos, São Paulo, Diadema dentre outros. Registramos, como iniciativa de governos locais, o Movimento de Alfabetização (Mova)20 surgido na cidade de São Paulo no governo Luíza Erundina, na gestão de Paulo Freire como secretário municipal de educação (1989-1991). Esse movimento nasceu com uma nova configuração que procurava envolver o poder público e a sociedade civil, com o objetivo de combater o analfabetismo, oferecendo o acesso à educação de forma a atender às necessidades e condições dos alunos jovens e adultos e à continuidade dos estudos por meio dos sistemas estaduais e municipais de ensino. Com significativa atuação no Sul e no Sudeste do país, não conseguiu espaço no Ministério de Educação para transformar sua prática em política pública para EJA, em 2003, nem mesmo quando da ascensão ao poder de um presidente da República do Partido dos Trabalhadores, tendo sido preterido pelo Programa Brasil Alfabetizado (PBA). Sobrevive ainda em alguns estados e municípios brasileiros, embora descaracterizado, contando com recursos do governo federal destinados ao PBA. De acordo com Jane Paiva (2004) muitas são as iniciativas de EJA que, em certas condições e com diferentes graus de controle, fazem insti- tucionalmente a parceria sociedade civil-Estado, existindo municipalidades realmente sensíveis à demanda pela EJA que têm dado respostas positivas para seu atendimento. Essas experiências são de grande importância, porque vêm construindo saberes, lideranças e legitimidade política. Quanto à educação dos trabalhadores, durante as discussões da Constituinte de 1987, as primeiras propostas, inscritas no capítulo dos direitos dos trabalhadores, previam sua liberação para a realização de atividades educativas no próprio local de trabalho ou em instituições próximas. Elas foram recusadas, no final da primeira fase nas discussões, pelo rolo compressor da bancada conservadora do Congresso Nacional, apoiada por forças de direita. Por sua vez, as decisões inscritas no art. 60 das Disposições Transitórias da Constituição previam a ação intensiva no sentido de eliminar o analfabetis- mo em dez anos. Esta decisão foi abortada pelo governo Fernando Henrique Cardoso que, em sintonia com as diretrizes dos organismos internacionais, passou a privilegiar a universalização do ensino fundamental para crianças, embora desenvolvendo outra campanha de alfabetização de adultos, em Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 379Dossiê bases já superadas: o Programa Alfabetização Solidária (PAS)21 – denominada a partir de 2003 de Alfasol –, implantada por intermédio da organização não governamental Comunidade Solidária. Paradoxalmente, apesar do contexto social apontar para um novo direcionamento à EJA, retoma-se a proposta de campanhas, envolvendoos vários segmentos da sociedade, inclusive o empresariado, e fazendo parcerias com entidades não governamentais que assumem a tarefa a baixo custo, de alfabetização das pessoas jovens e adultas. No período, foi importante ainda a discussão posta por algumas entidades e por alguns educadores sobre a categoria “trabalho” como fundamental, tanto para a educação em geral, em especial para o ensino médio, quanto para a educação de jovens e adultos em particular. A palavra- chave era politecnia que, segundo Saviani (2003, p. 140): [...] diz respeito ao domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que caracterizam o processo de trabalho produtivo moderno. Está relacionada aos fundamentos das diferentes modalidades de trabalho e tem como base determinados princípios, determinados fundamentos que devem ser garantidos pela formação politécnica. A ideia de politecnia envolve a articulação entre trabalho intelectual e tra- balho manual, implicando uma formação que, a partir do próprio trabalho social, desenvolva a compreensão das bases da organização do trabalho da nossa sociedade e que, portanto, nos permite compreender o seu funcionamento. A história recente é bastante conhecida e é suficiente destacar nela, no período imediatamente seguinte, em primeiro lugar, a produção do relatório da Comissão Internacional do Século XXI, em 1996, conhecido como Relatório Delors (presidente da comissão). Trabalhando a elaboração das diretrizes da educação para o Século XXI, atualizou o conceito de educação ao longo da vida. Esse conceito, no Relatório, é visto como uma das chaves para o século XXI. O referido Relatório, publicado no Brasil em 1998, com o apoio do MEC e apresentação de Paulo Renato, ministro de educação à época,22 propõe quatro pilares sobre os quais deveria assentar-se a educação de adultos: a) aprender a conhecer – não apenas a aquisição de um repertório de saberes codificados, mas o domínio dos próprios instrumentos do conhecimento, considerado como meio e finalidade da vida; b) aprender a fazer – indissociável do aprender a conhecer, liga-se à formação profissional, substituindo o conceito de qualificação profissional pelo de competência pessoal; FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos c) aprender a viver juntos – opondo a esperança à violência e tentando superar o potencial de destruição criado durante o século XX; d) aprender a ser – ou seja, contemplar o desenvolvimento integral da pes- soa, para que possa decidir por si mesma, de forma crítica, nas diferentes circunstâncias da vida. Mais ainda que o Relatório Faure, de 1972, que atualiza em parte, o Relatório Delors é visto e criticado como expressão do momento atual do capitalismo e da globalização da economia. Suas propostas são em geral divulgadas quando não assumidas como dogmas, sem contextualizar sua produção, nem procurar referi-la a outras realidades distintas dos países considerados desenvolvidos. Duarte (2000) observa que, aparentemente, o Relatório Delors trabalha com um raciocínio calcado na busca de equilíbrio e conciliação entre polos opostos, sendo capaz de superar as visões unilaterais acerca da educação. Numa leitura rápida e superficial, pode-se considerá-lo um documento dialético. No entanto, na avaliação do pesquisador, o relatório em foco, nada tem a ver com qualquer tipo de dialética; apresenta-se como: [...] um mero recurso discursivo de tentar manter-se na metade do caminho entre posições opostas e decorrendo de insuperáveis limitações da própria ótica da comissão. Não são, porém limitações de caráter unicamente lógico- epistemológicas, mas principalmente limitações de natureza ideológica [...], que impedem de avançar na direção da crítica ao capitalismo gerador de conflitos (não só de tensões), conflitos esses que não podem encontrar solução efetiva sem a superação da sociedade capitalista. (DUARTE, 2000, p. 48-49) Muito mais importante, no período, foi a realização da V Conferência Internacional de Educação de Adultos (V Confintea), realizada em Hamburgo, na Alemanha, em 1998,23 inclusive e talvez principalmente pelas reuniões nacionais e regionais preparatórias. A contribuição latino-americana foi importante. Foi a região que insistiu na necessidade de considerar prioritário o trabalho educativo com jovens carentes e de conceder ao problema de gênero valor especial; seus re- presentantes exigiram a necessidade de superar a educação centrada em desempenhos; passar de uma educação controlada em exames a outra, baseada na responsabilidade individual e coletiva; de educação acumuladora de informações para uma educação que processe e utilize essa informação. (RIVERO, 2000, p. 112) Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 381Dossiê Foi a partir desse momento que se consagra a expressão Educação de Jovens e Adultos, e que foi criado, na Anped, o GT 18 de Educação de Pessoas Jovens e Adultas. No caso brasileiro, a preparação da V Confintea, foi praticamente liderada por profissionais que trabalham em entidades que praticavam ou se interessavam pela educação de jovens e adultos. O documento final, produzido em vários encontros com ampla participação, foi rejeitado pelo Ministério da Educação, pois sua política era, como foi dito, de um lado, priorizar a universalização do ensino fundamental e, de outro, realizar uma campanha de alfabetização nos moldes já superados e à margem do próprio Ministério da Educação, a Alfabetização Solidária. Por influência de organizações da sociedade civil, afirma-se, nesse período, a defesa do direito de acesso dos jovens e adultos ao ensino fundamental e ao ensino médio, em cursos definidos conforme o estabelecido no art. n. 208, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, reiterado pelo Inciso VI, do art. 4º das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/1996): [...] oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com caracte- rísticas e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e per- manência escolar. E, na defesa deste direito, organizam-se, primeiramente no Rio de Janeiro em 1998, depois progressivamente em todos os estados e em vários municípios, os Fóruns de Educação de Jovens e Adultos. Para Paiva (2009, p. 89) o ponto de partida desses fóruns foram as estratégias definidas na con- ferência regional preparatória à V Confintea, realizada em Brasília, em 1997: a) centrar o foco da EJA no ensino e na aprendizagem, melhorando a quali- dade do processo educativos; b) atenção especial aos jovens; c) vínculos com a transformação produtiva e com o trabalho; d) superação do círculo vicioso da pobreza e ampliação de políticas de ma- nejo sustentável do meio ambiente, no marco de um desenvolvimento justo; e) práticas orientadas para desenvolver valores democráticos e os direitos humanos; f ) universalidade do direito à educação por toda a vida e adoção de pers- pectiva de aprendizagem permanente como expressão do desenvolvimento humano. Da V Confintea realizada em Hamburgo, na Alemanha, dois docu- mentos foram publicados e ganharam o mundo: a Declaração de Hamburgo FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos e a Agenda para o Futuro, este último formulado a partir de dez temas de estudos, para os quais a Conferência indicou compromissos entre os estados- membros. Por sua vez, a Declaração, dentre outros pontos, destaca os direitos à educação e o de aprender ao longo da vida, assim expressos: O reconhecimento do “Direito a Educação” e o “Direito a Aprender por Toda a Vida” é mais que nunca uma necessidade: é o direito de ler e escrever; de questionar e analisar; de ter acesso a recursos e de desenvolver e praticar habilidades e competências individuais e coletivas. (Unesco, 1997, p. 93) Ambos os documentos foram considerados no Brasil como re- ferências para a modalidade e tiveram significativa repercussãoentre os pesquisadores. 6º passo: os anos dE 2000, parEcEr cury E situação atual Quanto à legislação relativa à educação de jovens e adultos, há pelo menos três registros relativos a documentos oficiais importantes a serem feitos no período: o parecer CNE/CEB 11/2000, de autoria de Carlos Roberto Jamil Cury, relativo às Diretrizes Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos; a Emenda Constitucional n. 53, de 19 de dezembro de 2006, que instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), substituindo o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundef); e o Parecer CNE/CEB 03/2010, que reformulou as Diretrizes Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos nos aspectos relativos à duração dos cursos e idade mínima para ingresso nos cursos, idade mínima e certificação nos exames e a educação de jovens e adultos desenvolvida por meio da educação à distância – decisão que provocou muitos debates entre os pesquisadores. Em termos teórico-conceituais, o que mais nos interessa neste trabalho, é apenas o primeiro parecer. Além de reiterar o direito à educação para os jovens e adultos, supera o antigo conceito de ensino supletivo e avança na definição das funções dessa modalidade, estabelecendo: a) função reparadora, que devolve a escolarização não conseguida quando criança; b) função equalizadora, que cuida de pensar politicamente a necessidade de oferta maior para quem é mais desigual do ponto de vista da escolarização; e Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 383Dossiê c) função qualificadora, entendida como o verdadeiro sentido da EJA, por possibilitar o aprender por toda vida, em processos de educação continuada. (PAIVA, 2009, p. 205) No entanto, os termos da resolução derivada desse parecer ainda estão circunscritos à tradição do antigo ensino supletivo, tomando os parâmetros escolares como norteadores dos exames de certificação. Na mesma tradição, tanto o veto imposto ao FUNDEF, impedindo a aplicação de recursos na EJA, assim como a transferência da organização dessa modalidade aos municípios, provocou a transformação de antigas classes de ensino supletivo em ensino regular noturno, sem maiores adequações. As próprias estatísticas relativas à EJA a tomam como sinônimo de ensino supletivo. São poucas as experiências de renovação efetiva desta modalidade, nas quais se pode localizar não só a influência da pedagogia de Paulo Freire, como do legado da educação popular, traduzida em alguns indicadores que representam rupturas com o antigo ensino supletivo e a rígida sistemática do ensino regular: a) matrícula ao longo do ano; b) mapeamento do perfil dos alunos visando ao agrupamento dos mesmos; c) frequência flexível, em lugar dos termos evasão e abandono a introdução do conceito de interrupção; d) momentos de encontro dos professores, em reuniões para plane jar, rever a prática e planejar novamente; e) novos espaços e novos projetos dentro e fora da escola; f ) avaliação flexível com momentos variados, consistindo em diagnóstico no início e avaliação qualitativa processual durante o período letivo, valendo-se de diversos recursos e instrumentos.24 No ano de 2003, com a assunção de um presidente da República oriundo da camada popular, contrariando as expectativas dos estudiosos da EJA e dos Fóruns de EJA, o MEC institucionalizou o Programa Brasil Alfabetizado (PBA). Direcionado para os estados, o Distrito Federal e os municípios com elevados índices de analfabetismo de jovens acima de 15 anos, este Programa, desde sua implantação inicial já passou por vários redesenhos e prolonga-se até os dias atuais, O PBA visava e visa estimular ações supletivas e redistributivas, para a correção progressiva das disparidades de acesso e garantia de padrão de qua- lidade da alfabetização de jovens e adultos, com a implantação de programa FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos específico de erradicação do analfabetismo em todo território nacional. Por meio da transferência de recursos financeiros advindos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), em caráter suplementar, aos entes federados que aderiram ao Programa e por meio do pagamento de bolsas benefício a voluntários (Resolução FNDE/CD, 2003). Rummert e Ventura (2007) reconhecem que o governo Lula trouxe para a EJA maior destaque do que os governos anteriores da Nova República. Entretanto, o discurso que anunciou sua valorização, não se fez acompanhar de ações concretas para a superação da matriz construída na década anterior. Assim, embora o arco das ações no âmbito da EJA seja ampliado, permanece centrado nas políticas focais, fragmentadas e fragmentadoras do tecido social. As autoras referem-se implicitamente, nesse comentário, ao Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) e ao Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Embora não envolvendo aspectos teórico-conceituais, retomamos o aspecto legal, para fazermos pelo menos uma observação sobre o Parecer CNE/CBE n. 03/2010. Homologado em 3 de junho de 2010, após dois anos de discussões, com discordâncias entre os participantes dos Fóruns de EJA e adiamento em sua homologação pelo ministro da educação, estabelece a idade mínima de 15 anos para ingresso na EJA, em nível do ensino fundamental, e de 18 anos, para o ensino médio. O problema fundamental diz respeito à transferência obrigatória, na verdade à “expulsão” dos alunos do ensino fundamental com mais de 14 anos para as classes de EJA, o que vem ocorrendo desde a promulgação da Lei n. 5692/71. Nos municípios nos quais tem sido adotado sistematicamente, este procedimento normativo tem ocasionado problemas na organização da EJA. Concebida inicialmente como educação de adultos – designação que perdura até hoje nos eventos internacionais – está sendo obrigada a atender um contingente de jovens para os quais as propostas pedagógicas adotadas mostram-se inadequadas. Ao mesmo tempo, parece que, se não com a mesma intensidade do afluxo de jovens, a EJA passou a ser demandada também por pessoas idosas e portadoras de necessidades especiais, que merecem atendimentos diferenciados. Associando-se a isto há a crescente oferta de cursos à distância, que em pouco ou nada atualizam os cursos supletivos, e abre-se um amplo leque de problemas a serem enfrentados, de modo inovador, pelas instâncias responsáveis pela EJA. Deve-se acrescentar, no período, a realização de duas importantes reuniões, ambas intensamente precedidas de reuniões regionais preparató- Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 385Dossiê rias: a VI Confintea, realizada em Belém do Pará, em dezembro de 2009, e a Conferência Nacional de Educação (Conae), realizada em Brasília, em março de 2010, com o intento de fixar as bases para o futuro Plano Nacional de Edu- cação. No caso da democratização do acesso, da permanência e do sucesso escolar, no caso da EJA, essas bases incluem: A consolidação de uma política de educação de jovens e adultos, concre- tizada na garantia de formação integral, de alfabetização e das demais etapas de escolarização, ao longo da vida, inclusive aqueles/as em situação de privação de liberdade. Essa política – pautada pela inclusão e qualidade social – prevê um processo de gestão e financiamento que assegure isono mia de condições da EJA em relação às demais etapas e modalidades da educação básica, bem como a implantação do sistema integrado de monitoramento e avaliação, além de uma política de formação permanente específica para o/a professor/a que atue nessa modalidade de ensino e maior alocação do percentual de recursos para estados e municípios. Ainda, essa modalidade de ensino deve ser ministrada por professores/as licenciados/as. (BRASIL,2010, p. 70) Em termos de concepções de EJA, no entanto, as resoluções não vão além das estratégias de ação: 1) Promover a educação inclusiva pautada nos direitos humanos e no reco- nhecimento da diversidade, assim como o princípio do direito de aprender, ampliando conhecimentos ao longo da vida e não apenas escolarizando. 2) Estimular a concepção de projetos que contemplem a pedagogia da alternância, segundo a necessidade dos educandos/as. 3) Promover educação não sexista que combata a homofobia e todas as formas de discriminação e preconceito. (BRASIL, 2010, p. 152) Essas resoluções incorporam parte do excelente relatório brasileiro preparatório à VI Confintea, apresentando como ponto de partida um diagnóstico atual da situação da educação de jovens e adultos. Ele relaciona inclusive os programas que traduzem as políticas dos diversos ministérios, analisa detalhadamente os desafios postos para a modalidade, e apresenta extensa relação de recomendações para as diversas instâncias. Ainda em termos de concepções, vale transcrever alguns parágrafos desse relatório: Primeiramente, cabe abordar a concepção ampliada de educação de jovens e adultos, que entende educação pública e gratuita como direito universal de aprender, de ampliar e partilhar conhecimentos e saberes acumulados ao longo da vida, e não apenas de se escolarizar. Em outras palavras, os FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos educandos passam a maior parte de suas vidas na condição de aprendizes e, portanto, muitas são as situações de aprendizado que vivenciam em seus percursos formativos. A consciência do direito à educação e a mobilização em sua defesa crescem entre a população jovem e adulta excluída do e no sistema escolar e fazem com que suas demandas sejam consideradas na conformação de projetos político-pedagógicos e de políticas públicas a ela destinadas. Quem são esses sujeitos? Como se expressam no mundo? Onde estão no território bra- sileiro? O que fazem? Como produzem a existência? Quais são seus desejos e expectativas? Que projetos de vida manifestam? Como aprendem? Esses sujeitos participam da elaboração das políticas públicas? Pensar sujeitos da EJA é trabalhar para, com e na diversidade. A diversidade é constituída das diferenças que distinguem os sujeitos uns dos outros – mulheres, homens, crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, pessoas com necessidades especiais, indígenas, afro-descendentes, descendentes de portugueses e de outros europeus, de asiáticos, de latino-americanos, entre outros. (BRASIL, 2009, p. 27-28) Esse modo de entender a EJA pode ser assumido como plataforma para rever os programas em execução, visando a reorientá-los na perspectiva de uma política integrada para jovens e adultos, assim como para redirecionar as práticas escolares tradicionais ainda prevalecentes nos sistemas de ensino. Pode e deve incorporar também, como preocupação específica, o atendimento aos jovens de 15 a 18 anos, em classes diurnas do sistema regular de ensino devidamente adequadas, assim como considerar os jovens e adultos atendidos e a serem atendidos pela EJA como trabalhadores, donos de experiências e de saberes acumulados ao longo da vida. Retomamos especificamente a VI Confintea, que, por meio do Marco de Belém (2009), permanece enfatizando, a exemplo da V Confintea, a necessidade da educação ao longo da vida, expressão advinda do contexto dos eventos internacionais realizados por agências supranacionais como o Banco Mundial e a Unesco, a partir dos anos de 1990. Nesse sentido, é importante a crítica de Rummert e Alves (2010, p. 516): [...] A aprendizagem ao longo da vida trata a nova fase capitalista de forma naturalizada e evoca a adaptação/preparação dos indivíduos como forma de responder ao novo quadro hegemônico internacional. Trata-se, assim, de promover a adaptação funcional dos sujeitos e da educação à economia, difundindo a crença de que os problemas de inserção ou permanência no mercado de trabalho são decorrentes da pouca ou inadequada formação dos trabalhadores. Essa perspectiva é justificada pela necessidade de maior Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 387Dossiê qualificação para lidar com o mundo do trabalho, imposta pela dita complexa sociedade da informação ou sociedade do conhecimento. Na realidade essa colocação merece nossa especial atenção no aprofundamento da questão. Em nome de um discurso defensor do univer- salismo da educação básica para os jovens e adultos com baixa escolarização, materializam-se políticas de governo fragmentárias e de baixa institucio- nalização, a exemplo do Projovem e do Proeja – embora ambos possuam, potencialmente, possibilidades de constituírem avanços significativos no âmbito teórico-metodológico da educação de jovens e adultos –, assim como do Enceja e do Certif, que, na verdade, conferem o direito não à educação, mas à certificação de escolaridade. ADULT AND YOUTH AND ADULT EDUCATION: A LOOK AT THE PAST AND PRESENT abstract: This study presents a great challenge, when one considers the breadth of its theme. It sets out to discuss and reflect on the past history of Adult Education and Youth and Adult Education, with a view to understanding its present. It does so against the background of our country’s lack of educational policies for this area on reaching 2011 without eliminating the illiteracy of over 15-year-olds. It is a polyphonic and as yet unfinished text, prepared by four people with the views and voices of researchers in the field. Hence, it is characterized as an exploratory study, based on an analysis of the documents researched. It is built around six thematic areas called steps, situated in time and named according to the focus of each period mentioned. KEywords: History of Adult Education. History of Youth and Adult Education. Supplementary Education. Popular Education. Permanent Education. Ongoing Education. NOTAS 1. Publicada inicialmente, como artigo, no Boletim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 1939, editada em 1940 pelo Jornal do Commercio, de Rodrigues e Cia, do Rio de Janeiro, e republicada em Paschoal Lemme (2004, p. 41-88). 2. Edward Lee Thorndike e seus colaboradores, em estudos comparativos realizados entre a capacidade de aprendizagem na infância, na adolescência e idades mais avan- çadas, segundo Lourenço Filho (1945, p. 11), comprovaram por meio de experiências que a infância não se apresentou como a melhor idade para aprender. Afirmaram à época que a melhor idade para aprendizagem é a dos 20 aos 30 anos; e qualquer idade entre 30 e 45 é ainda melhor do que as que medeiem entre 10 e 14. 3. Filósofo e pedagogo, reconhecido como um dos fundadores da escola filosófica de Pragmatismo (juntamente com Charles Sanders Peirce e William James); conside- FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos rado um pioneiro em Psicologia Funcional e representante principal do movimento da educação progressiva norte-americana durante a primeira metade do século XX. Fundou uma escola conhecida como Escola de Educação ou Escola Dewey, na qual pôs em prática suas teorias pedagógicas. 4. Pedagogo, discípulo de Dewey. Defendia que não basta só a criança dar atenção àquilo que faz, é necessário também a intenção, pois esta torna o educando agente. 5. Brandão (2008) caracteriza as escolas anarquistas de e para trabalhadores entre aquelas que devem ser consideradas como uma alternativa de projeto cultural, por meio da educação popular, ou que pelo menos se aproximou dela. 6. Responsável pelo desenvolvimento dos serviços de ensino, de extensão e aperfeiço- amento, administração e direção artística dos teatros da municipalidade, os museus e bibliotecas públicas e escolares, bem como todas as organizações de natureza cultural ou educativa destinadas a adultos (cf. Parecer 2º do Decreto n. 17 de 1935). 7. Palestra realizada a convite do Centro de Professores Noturnosdo Rio de Janeiro, publicada na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. v. 5, n. 14, ago. 1945, p. 169-185. 8. Criado nas Filipinas, em 1915, pelo missionário protestante norte-americano Frank Charles Laubach e depois utilizado em toda a Ásia e em vários países da América Latina. Laubach esteve no Brasil em 1943, tendo assessorado a equipe do Ministério da Educação e Saúde responsável pela elaboração do material didático da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos. 9. Por exemplo, a Declaração de Hamburgo (1997) e o Marco de Belém (2009). 10. Ver documentos da CEAA e da CNER em www.forumeja.org.br/edupopular/ campanhas. 11. Para maior aprofundamento ver Cunha (1975). 12. Relatório Final do Seminário Regional de Educação de Adultos de Pernambuco, preparatório ao II Congresso Nacional de Educação de Adultos, 1958, p. 8. 13. Reproduzido em Fávero (1983, p. 90-91) e em I Encontro Nacional de Alfabetização e Cultura Popular (MEC/Unesco, 2009, p. 60-61); disponível em www.forumeja.org. br/edupopular/mcp. 14. Reproduzido em Fávero (2006, p. 80). 15. Pierre Furter é um educador suíço que conheceu as experiências de Paulo Freire, no Nordeste, e foi durante vários anos perito da Unesco para a educação, no Brasil e na Venezuela, depois professor na Universidade de Neuchâtel, na Suíça. Seus livros diretamente ligados ao tema, publicados no Brasil, são: Educação e reflexão (Vozes, 1966); Educação e vida; uma contribuição à educação permanente (Vozes, 1966) e Educação permanente e desenvolvimento cultural (Vozes, 1974), no qual aborda dire- tamente o problema do analfabetismo e da educação de adultos. Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011 389Dossiê 16. Edição portuguesa da Livraria Bertrand (Portugal) e Difusão Europeia do Livro (São Paulo), de 1974. 17. Edição brasileira da Editora Vozes, de 1976. 18. As melhores análises da política de ensino supletivo estão contidas na disserta- ção de mestrado de Sônia Maria De Vargas, A atuação do Departamento de Ensino Supletivo do MEC no período 1973-1979 (PUC-Rio, 1984) e na tese de Sérgio Haddad, Estado e educação de adultos, 1964-1985 (USP, 1991). Sobre os exames supletivos de 2º Grau dispõe-se do relato da pesquisa realizada no município do Rio de Janeiro, sob a coordenação de Cláudio Moura Castro: O enigma do supletivo (Edições UFC, 1980). 19. Significativa, nesse período, a criação do Programa de Educação de Jovens (PEJ), no município do Rio de Janeiro, quando Leonel Brizola era governador e Darcy Ribeiro vice-governador e secretário de educação do estado. Foi, provavelmente, o primeiro programa de uma secretaria de educação que procura recriar a proposta pedagógica de Paulo Freire. Ver Haddad (2007, p. 77-110). 20. A palavra movimento utilizada para caracterizar o Mova, semanticamente, é bem diferente da referência feita ao Mobral. O Mova atua como um movimento da socie- dade civil em parceria permanente com os estados e municípios, com acentuada preocupação na continuidade dos estudos dos seus egressos. 21. Lançado na cidade de Natal, estado do Rio Grande do Norte, em setembro de 1996, no Dia Internacional da Alfabetização, quando se realizava um encontro nacional de jovens e adultos, preparatório para a V Conferência Internacional de Educação de Adultos (V Confintea). Sugere-se a leitura das investigações de Marinaide Lima Freitas, Letramento: as marcas de oralidade nas produções escritas de alunos jovens e adultos, Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística. Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2002; Márcia Soares Alvarenga, Os sentidos da cidadania: entre vozes, silenciamentos e resistências no Programa Alfabetização Solidária. Tese (Doutorado) Programa de Pós-Graduação em Serviço Social. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2003; Clarice Traversini, Programa Alfabetização Solidária: o governa- mento de todos e de cada um. (Tese) Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2003. 22. Para Duarte (2000), esse apoio não seria dado, no caso de o documento vir a constituir-se em obstáculo para os reais objetivos do processo no qual se encontra- va empenhado à época o MEC, processo esse caracterizado pelo então ministro da educação como um repensar da educação brasileira. O discurso sobre educação era pautado pela importante tarefa de esconder as contradições do projeto neoliberal de sociedade. 23. O histórico dessa preparação e desta Conferência é detalhado criticamente no livro de Paiva (2009). 24. Síntese de consultas do autor. FÀVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos REFERÊNCIAS BEISIEGEL, Celso de Rui. Estado e educação popular. 1. ed. São Paulo: Pioneira, 1974; 2. ed. Brasília: Liber Livro, 2004. 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Osmar Fávero: Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF). Email: ofavero@infolink.com.br Marinaide Freitas: Professora do Curso de Pedagogia e da Pós-Gra- duação em Educação Brasileira da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Email: naide12@hotmail.com 395educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação Maria Clara Di Pierro* Resumo O artigo recupera os principais momentos da história da educação de jovens e adultos no Brasil nos últimos cinqüenta anos, e conclui que os movimentos sociais contribuíram decisivamente para a inscrição nos instrumentos jurídicos nacionais do direito dessa população à educação. O texto analisa as políticas públicas de educação do período recente e faz indicações para a atualização da agenda de lutas pelo direito humano à educação na juventude e na vida adulta. Palavras-chave: Educação de jovens e adultos. Direito à educação. Políticas educacionais. Legislação educacional. Social fight and juridical acknowledgement of the human right of young and adults to education Abstract The article reviews the main periods in the history of youth and adult education in Brazil in the last fifty years and concludes that the social movements contributed decisively to the acknowledgement of the right of this population to education in the national juridical means. The article analyses public policies in the recent period and proposes items to update the agenda of fights for the human right to education during youth and in adult life. Keywords: Youth and adult education. Right to education. Educational policies. Educational legislation. * Professora Doutora em Educação – Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo/ USP e diretora da organização não governamental Ação Educativa. TEXTO 03 396 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro Quando tratamos nos dias atuais da educação de pessoas jovens e adultas, estamos nos referindo a um conjunto variado de processos formais e informais de aprendizagem pelos quais as pessoas enriquecem seus conheci- mentos, cultura e qualificações profissionais para satisfazer a necessidades individuais ou coletivas. Compreendida como chave para a conquista e garantia de outros direitos, a educação ao longo da vida tem por objetivos desenvolver a autonomia e o sentido de responsabilidade das pessoas e comunidades para enfrentar as rápidas transformações socioeconômicas e culturais por que pas- sam o mundo atual, estimulando o convívio tolerante e a participação criativa e consciente dos cidadãos na construção e manutenção de sociedades democrá- ticas e pacíficas. Essa é a perspectiva adotada na V Conferência Internacional de Educação de Adultos – Confintea (Alemanha, 1997) e expressa na Declara- ção de Hamburgo: Art. 1º – [...] reafirmamos que apenas o desenvolvimento centrado no ser humano e a existência de uma socieda- de participativa, baseada no respeito integral aos direi- tos humanos, levarão a um desenvolvimento justo e sus- tentável. A efetiva participação de homens e mulheres em cada esfera da vida é requisito fundamental para a humanidade sobreviver e enfrentar os desafios do futu- ro. Art. 2º – A educação de adultos, dentro desse contexto, torna-se mais que um direito: é chave para o século XXI; é tanto conseqüência para o exercício da cidadania como condição para uma plena participação na sociedade. [...] é um poderoso argumento em favor do desenvolvimen- to ecológico sustentável, da democracia, da justiça, da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento socioeconômico e científico, além de ser um requisito fundamental para a construção de um mundo onde a violência cede lugar ao diálogo e à cultura de paz basea- da na justiça [...]. Essa concepção ampliada de educação ao longo da vida não se esgo- ta na escolarização, compreendendo também aprendizagens realizadas de for- ma sistemática ou incidental nas mais diversas práticas sociais familiares, co- munitárias, religiosas, políticas, de trabalho, de informação, comunicação, lazer ou fruição cultural. Em uma cultura letrada como a que vivemos, tais aprendiza- gens e práticas sociais são mediadas pela escrita e outras tecnologias e códi- gos culturais da modernidade que cumpre à escola básica difundir. Por essa razão, no contexto latino-americano, a educação de pessoas jovens e adultas com freqüência se confunde com a reparação dos direitos à alfabetização e à escolarização elementar violados na infância e adolescência. Afinal, a América Latina tem 39 milhões de analfabetos e 110 milhões de pessoas com escolari- dade reduzida e de baixa qualidade. O Brasil é o país do continente que mais contribui para esses números: dentre os 132 milhões de jovens e adultos registrados em 2005, 67 milhões (51%) tinham baixa escolaridade, sendo 14 397educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação milhões de analfabetos absolutos (11%) e cerca de 33 milhões de analfabetos funcionais (25% da população nessa faixa etária têm menos de quatro anos de estudo). Entretanto, menos de 10% dos jovens e adultos analfabetosou com poucos anos de estudo fruem oportunidades de escolarização. O desrespeito aos direitos educativos dos jovens e adultos resulta, dentre outras causas, da postergação do tema nas políticas governamentais. No Brasil, como em quase toda a América Latina, a educação de jovens e adultos ocupou, no desenvolvimento do sistema de ensino público, um papel subsidiário às demais modalidades, cumprindo função compensatória de repo- sição de escolaridade não realizada na idade considerada apropriada, ou de aceleração de estudos de pessoas com atraso escolar. O desprestígio da edu- cação de jovens e adultos repercutiu no escasso financiamento, na precarieda- de institucional e na posição desfavorável ocupada pelos seus órgãos de gestão na hierarquia governamental. A literatura latino-americana das últimas décadas do século XX expli- ca a posição secundária da educação de jovens e adultos na agenda pública pela debilidade política de seus potenciais beneficiários (LATAPÍ, 1987; RIVERO HERRERA, 2000; TORRES, 1983). Nesse contexto, as políticas educacionais dirigidas a esse grupo atenderiam, sobretudo, aos projetos das elites dominan- tes para o controle social das classes subalternas e qualificação de mão-de- obra para atender às necessidades do capital. De fato, o analfabetismo e a baixa escolaridade estão associados a outros processos de exclusão social – pobreza, vivência rural, condição feminina, pertencimento a grupos étnico-cultu- rais discriminados, baixa qualificação profissional e situação desvantajosa no mercado de trabalho – que também estão relacionados ao reduzido peso desse grupo na conformação da opinião e das políticas públicas. Ao menos no caso brasileiro, porém, o projeto educativo das elites para o disciplinamento e qualifi- cação profissional das classes populares e sua inclusão subalterna no sistema sociopolítico é insuficiente para explicar a construção do marco jurídico e das políticas, bem como do pensamento e das práticas de educação de jovens e adultos, que só podem ser apropriadamente compreendidos à luz da história dos movimentos pela educação popular. Não é o caso de historiar neste artigo toda luta social pela educação de adultos no Brasil, até mesmo porque essa história já se encontra bastante documentada e analisada na literatura especializada. Mas é possível ilustrar sua influência na consecução do direito à educação destacando alguns episó- dios marcantes desse percurso. Três momentos da luta social pelo direito dos adultos à educação Um período histórico em que a ação social impulsionou o reconheci- mento do direito dos adultos à educação transcorreu no início da década de 1960 e correspondeu à eclosão dos movimentos de educação e cultura popular. 398 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro O cenário externo era dominado pela Guerra Fria que, no continente latino- americano, tinha na experiência revolucionária cubana seu ponto crítico. O Bra- sil experimentava transformações sociais relacionadas ao crescimento demográfico e econômico, à urbanização e à industrialização. Essas mudanças se deram ao longo de um período relativamente prolongado de democracia for- mal em que as classes populares emergiram na vida política do país, mas dis- punham de reduzido peso eleitoral, inclusive porque a alfabetização era requisi- to para o exercício do direito de voto. Foi então que o Movimento de Educação de Base da Igreja Católica, o Movimento de Cultura Popular do Recife, a Campa- nha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler, no Rio Grande do Norte, os Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes e outras inicia- tivas similares conferiram a práticas de animação sociocultural e alfabetização de jovens e adultos o sentido de transformação sociopolítica e emancipação humana que o pensamento do educador Paulo Freire exprimiu e impulsionou. Após o golpe militar de 1964, a efervescência político-social resultante dessas experiências foi reprimida pelo regime ditatorial, mas as lições aprendidas não foram esquecidas pelas pessoas, organizações sociais e agremiações políticas que delas participaram. Em meados dos anos 1980 o país se transformara, dentre outras ra- zões pelo intenso êxodo rural das décadas precedentes, o esgotamento do modelo de desenvolvimento concentrador de riqueza e os novos papéis desem- penhados pelas mulheres e pelos jovens na vida social e política. A resistência ao cerceamento às liberdades democráticas e à violação dos direitos humanos pela ditadura militar abriu caminho à transição política para a democracia, im- pulsionada pela emergência de novos movimentos sociais. Nesse período, o paradigma da educação popular – que conformara toda uma corrente de pensa- mento e ação na América Latina – inspirou práticas de alfabetização, escolarização, formação política e ação cultural convergentes aos movimentos do campo (sem-terra, posseiros, bóias-frias, seringueiros, ribeirinhos), dos tra- balhadores urbanos (comissões de fábrica, sindicatos e oposições sindicais), das periferias urbanas (clubes de mães, comunidades eclesiais de base e pas- torais populares), dos movimentos negro e indígena. Essas práticas desempe- nharam papel relevante na organização de base e em mobilizações pela con- quista da terra e da justa remuneração do trabalho, contra a carestia e por melhores condições de moradia e serviços urbanos (transporte, saneamento, saúde e educação). Assim como na década de 60, algumas dessas experiênci- as educativas se desenvolveram com o apoio de instâncias governamentais, em especial mediante parcerias das organizações sociais com administrações municipais progressistas, eleitas pelo voto direto. Com o fim do regime militar, a Assembléia Nacional Constituinte aco- lheu as demandas dos movimentos sociais, restituindo o direito de voto aos analfabetos e reconhecendo os direitos educativos dos jovens e adultos. Esse reconhecimento não teve, porém, a repercussão esperada nas políticas públi- cas de educação, devido às orientações neoliberais que prevaleceram na admi- 399educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação nistração governamental durante os anos 90, um período marcado pela redefinição da liderança mundial, pela globalização econômica e por profundas mutações no mundo do trabalho. A reforma educativa inaugurada na gestão da socialdemocracia brasi- leira à frente da Presidência da República assimilou as diretrizes de descentralização da gestão, contenção e focalização do gasto público, impos- tas pelo ajuste macroeconômico e pela redefinição do papel do Estado. Estabe- leceu-se então uma falsa dicotomia entre a prioridade conferida à educação fundamental de crianças e adolescentes e as possibilidades de reposicionamento da educação de jovens e adultos na agenda pública. A exclusão do ensino de jovens e adultos do Fundo de financiamento da educação fundamental criado em 1996, em virtude de veto presidencial à Emenda aprovada unanimemente no Congresso, repercutiu negativamente na institucionalidade e cobertura da mo- dalidade, impulsionando processos de descentralização da oferta e delegação à sociedade civil de tarefas estatais, disseminando estratégias de parceria. Pro- duziu-se, assim, uma espécie de “paradoxo da redemocratização”, em que os direitos educacionais dos jovens e adultos afirmados na legislação seriam nega- dos objetivamente nas políticas governamentais. Em reação a esse contexto, emergiram dois tipos de movimentos protagonizados por atores da sociedade civil que repercutiram no desenho das políticas de educação de jovens e adul- tos. Organizações sociais do campo e das periferias urbanas que reivindicavam o direito dos jovens e adultos à educação e a democratização das políticas governamentais conferiram à estratégia de parceria um sentido de participação popular queresultou em iniciativas de gestão compartilhada, como nos Movi- mentos de Alfabetização – Mova - ou no Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – Pronera (ALMEIDA et al., 2007; ANDRADE et al., 2004; GADOTTI, 1995; HADDAD et al., 2007; PONTUAL, 1997). A resistência à viola- ção dos direitos educativos conquistados pelos jovens e adultos na redemocratização também acabou por forjar articulações plurinstitucionais cons- tituídas para o exercício do debate público, o controle e a incidência nas políti- cas governamentais, que assumiram a forma de fóruns autônomos em relação aos governos. Esse movimento, que teve início em 1996, resultou na realização de encontros anuais e na criação em todas as unidades da federação de fóruns que, hoje, desfrutam do reconhecimento e até mesmo apoio dos governantes (SOARES, 2003). O direito humano dos jovens e adultos à educação na legislação nacio- nal Fruto dessa trajetória, os direitos educativos dos jovens e adultos bra- sileiros estão inscritos, na atualidade, em três instrumentos jurídicos de âmbito nacional. A Constituição Federal de 1988 atendeu aos reclamos da sociedade e reconheceu o direito dos jovens e adultos ao ensino fundamental, obrigando os poderes públicos à sua oferta gratuita:¹ 400 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetiva- do mediante a garantia de: I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, assegura- da, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria; [...] VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às con- dições do educando; [...] Esse direito foi detalhado pela Lei n.9.394, de 1996, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), na qual a Educação de Jovens e Adultos (EJA) foi inscrita como modalidade da Educação Básica, apropriada às neces- sidades e condições peculiares dessas gerações. Art. 4º – O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; [...] VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo- se aos que forem trabalhadores as condições de aces- so e permanência na escola; [...] Art. 5º – O acesso ao ensino fundamental é direito públi- co subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cida- dãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo. § 1º – Compete aos Estados e aos Municípios, em regi- me de colaboração, e com a assistência da União: I – recensear a população em idade escolar para o ensi- no fundamental, e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso; II – fazer-lhes a chamada pública; [...] Art. 37 – A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade pró- pria. § 1º – Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamen- te aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacio- nais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de traba- lho, mediante cursos e exames. 401educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação § 2º – O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. Art. 38 – Os sistemas de ensino manterão cursos e exa- mes supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. § 1º – Os exames a que se refere este artigo realizar-se- ão: I – no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos; II – no nível de conclusão do ensino médio, para os maio- res de dezoito anos. § 2º – Os conhecimentos e habilidades adquiridos pe- los educandos por meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames. Uma das inovações introduzidas pela LDB de 1996 foi reduzir a idade mínima para conclusão dos exames supletivos de Ensino Fundamental e Médio para 15 e 18 anos (antes, as idades mínimas exigidas eram, respectivamente, 18 e 21 anos). A diminuição das idades mínimas de ingresso e conclusão refor- çou uma função que a educação de jovens e adultos já vinha cumprindo há pelo menos duas décadas: configurar um espaço de contenção das problemáticas sociais e da diversidade sociocultural recusadas pela educação comum, abrin- do-se como um canal de reinserção no sistema educativo de adolescentes e jovens dele excluídos precocemente, e de aceleração de estudos para aqueles que apresentam acentuado atraso escolar. A presença juvenil na modalidade é significativa: em 2006, 45,6% dos estudantes de todo ensino básico de jovens e adultos tinham menos de 25 anos; e 14,2% eram adolescentes de até 17 anos de idade. O direcionamento de políticas ao público adolescente e sua presença nos cursos e exames destinados aos jovens e adultos é alvo de grandes contro- vérsias no campo pedagógico e entre os gestores de políticas educacionais, e há toda uma corrente que defende a revisão desse aspecto da legislação.² Como a LDB não foi específica com respeito à duração mínima dos cursos e à idade mínima de ingresso nos mesmos, coube ao Conselho Nacional de Educação (CNE) criar normas complementares e fixar Diretrizes Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos. As Diretrizes foram estabelecidas em 2000 no Parecer 11 da Câmara de Educação Básica (CEB) do CNE, do qual derivou a Resolução CEB/CNE n. 1 de 2000, fixando a idade mínima para in- gresso nos cursos de Ensino Fundamental e médio em 15 e 18 anos, respecti- vamente. Mais tarde, o Parecer CEB/CNE n. 36/2004 estabeleceu a duração mínima dos cursos para jovens e adultos em 24 meses para as séries finais do Ensino Fundamental e 18 meses para o Ensino Médio. O Parecer 11 enfatizou o direito público subjetivo dos jovens e adultos ao ensino de qualidade, à luz dos princípios da proporção, equidade e diferença; explicitou as funções dessa mo- dalidade da educação básica (reparação de direitos educativos violados, 402 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro equalização de oportunidades educacionais e qualificação permanente); colo- cou limites de idade (distinguindo a educação de jovens e adultos da aceleração de estudos que visa à regularização do fluxo escolar de adolescentes); e assi- nalou a necessidade de flexibilizar a organização escolar e contextualizar o currículo e as metodologias de ensino, proporcionando aos professores a forma- ção específica correspondente (CURY, 2000). Esse conjunto de definições legais implicou grandes desafios às três esferas de governo, cujas políticas deveriam orientar-se pela Lei n. 10.172 de 2001, que instituiu o Plano Nacional de Educação – PNE. Entre as prioridades do Plano se inclui “a garantia de ensino fundamental a todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria ou que não o concluíram”. Dentre as 26 metas do PNE referentes à educação de jovens e adultos, destacam-se: a alfabetiza- ção de 10 milhões de pessoas, a oferta de séries iniciais do Ensino Fundamen- tal para 50% das pessoas jovens e adultas que têm menos de quatro anos de estudos e a duplicação da capacidade de atendimento no Ensino Médio até 2006; a oferta de séries finais do Ensino Fundamental para todos os que têm menos de oito anos de estudos até 2011; a generalização da oferta de educação geral e profissional em presídios e estabelecimentos que atendemadolescen- tes em conflito com a lei. No ritmo em que as políticas públicas evoluem no início do novo milênio, o alcance dessas metas parece improvável: a proporção de analfabetos que participam a cada ano de programas de alfabetização não alcança 10% do contingente total; a matrícula em toda a educação básica de jovens e adultos em 2006 foi de apenas 4,8 milhões de pessoas; menos de 1,5 milhão freqüentava cursos correspondentes ao primeiro segmento do Ensino Fundamental, o que representava apenas 0,5% dos 33 milhões de jovens e adultos brasileiros que tinham menos de quatro anos de estudos.³ A garantia dos direitos educativos dos jovens e adultos em situação de privação de liberdade constitui uma problemática à parte. O Brasil mantém em mais de mil estabelecimentos penais uma população carcerária de cerca de 350 mil pessoas, constituída predominantemente por homens jovens e negros, provenientes dos extratos sociais de menor renda, com nenhuma ou baixa es- colaridade, dos quais somente 17% participam de atividades de ensino. A LDB não aborda essa temática, mas a Lei de Execução Penal n.7.210 de 1984 é clara no sentido de obrigar os governos estaduais, responsáveis pela adminis- tração penitenciária, a garantir assistência educacional às pessoas no cárcere, em especial no ensino fundamental. A violação dos direitos educativos e a redu- zida oferta de oportunidades educacionais para os presos são atribuídas, entre outros fatores, à ausência de diretrizes nacionais para a educação nas prisões e à indefinição de atribuições por essas atividades: o documento elaborado em 2006 no Seminário Nacional pela Educação nas Prisões co-promovido pelos Ministérios da Justiça e da Educação ainda aguarda aprovação dos conselhos nacionais de Educação e Política Criminal e Penitenciária; na maior parte dos Estados brasileiros, permanece indefinida a responsabilidade das secretarias de educação e dos órgãos de administração penitenciária na gestão e financia- 403educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação mento das atividades de ensino nos presídios. Outro fator que afeta a participa- ção dos presos nas atividades de ensino é a concorrência com as atividades laborais, porque as mesmas representam uma fonte de renda e também porque a legislação admite a remição de pena pelo trabalho, mas não prevê o mesmo benefício para o estudo. Compromissos internacionais de garantia do direito humano dos jovens e adultos à educação Embora não façam menção específica à aprendizagem na vida adulta, os instrumentos internacionais de proteção dos Direitos Humanos são abrangentes na declaração do direito à educação, compreendendo os diferentes grupos etários.4 Responsáveis pelo monitoramento desses direitos, os organis- mos das Nações Unidas detêm certa liderança intelectual no campo educativo, influenciando as concepções pedagógicas e as políticas educacionais, especi- almente quando suas iniciativas envolvem algum tipo de cooperação técnica e financeira. Embora a proposta de educação ao longo da vida formulada na V Confintea oriente os discursos que emolduram as políticas recentes de educa- ção de jovens e adultos, as estratégias de reforma e política educacional implementadas no Brasil na última década foram influenciadas, sobretudo, pela iniciativa internacional de Educação Para Todos e, mais especificamente, por sua versão restrita, que reduziu as generosas concepções e metas originais a políticas focalizadas na instrução primária de crianças, confinando a educação das pessoas adultas a uma posição marginal na agenda pública (TORRES, 2001; 2003). Os compromissos de Educação Para Todos firmados na Tailândia em 1990 foram renovados em 2000 no Fórum Mundial de Dakar, em cujas metas para 2015 constam a satisfação das necessidades de aprendizagem de todos os jovens e adultos e a redução em 50% os índices de analfabetismo, com paridade de gênero. Por ser um dos nove países populosos que concentram os maiores contingentes de analfabetos do globo,5 o Brasil compôs o grupo de nações que receberam cooperação financeira internacional com vistas à Educa- ção Para Todos. Os empréstimos concedidos pelo Banco Mundial, como de resto toda a política de melhoria da educação básica, foram focalizados no ensino fundamental de crianças e adolescentes, e não incidiram sobre as políti- cas de educação de jovens e adultos. Não surpreende, portanto, que os relató- rios de monitoramento global da iniciativa de Educação Para Todos revelem que o Brasil não evolui bem em direção à meta de alfabetização de jovens e adultos, devido ao lento recuo nos índices de analfabetismo (Tabela 1), que persistem malgrado os esforços empreendidos pelo governo federal a partir de 2003 por meio do Programa Brasil Alfabetizado. 404 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro O fraco desempenho dos indicadores de alfabetização de jovens e adultos em boa parte da Ásia, África e América Latina foi um dos fatores que impulsionaram o lançamento da Década das Nações Unidas para a Alfabetiza- ção 2003-2012, cujo Plano de Ação reafirma as metas de Educação Para To- dos, mas inova na adoção de uma visão ampliada de alfabetização. Além da retórica dos documentos e reuniões internacionais, a Década compreende até o momento uma iniciativa de cooperação internacional denominada LIFE 2005- 2015 (Literacy Iniciative For Empowerment), lançada pela Unesco com apoio da primeira dama norte-americana Laura Bush. Previsto para abarcar 35 países ao longo de três etapas (com início previsto em 2006, 2008 e 2010), a LIFE está direcionada a países com mais de 10 milhões de analfabetos, nos quais preten- de diminuir à metade os índices de analfabetismo atuais. Embora o Brasil esteja listado entre os países selecionados para a primeira etapa, até o momento não temos notícia de qualquer atividade relacionada a essa iniciativa. No âmbito continental, a declaração da Década da Alfabetização impulsionou a formulação do Plano Ibero -americano de Alfabetização e Educação Básica de Adultos 2008- 2015, coordenado pela Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI). Todas essas iniciativas terão um momento propício de avaliação no processo que ora se inicia de preparação da VI Confintea, que o Brasil sediará em 2009. Entraves à garantia dos direitos educacionais dos jovens e adultos no Brasil Não são poucos nem simples de equacionar os entraves à consecu- ção em nosso país do direito dos jovens e adultos à educação ao longo da vida, até mesmo pela interdependência dos direitos humanos e das relações socioeconômicas, culturais e políticas que conduzem à sua violação. Sem pre- tender esgotar a complexidade do tema, os parágrafos seguintes destacam algumas dessas barreiras pertinentes ao campo da formulação e gestão de políticas públicas de escolarização. Tabela I - Brasil: Evolução do analfabetismo entre pessoas de 15 anos ou mais (1991/2006) Fontes: IBGE. Censos Demográficos, e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2006. onA latoT sotebaflanA % launaoãçudeR 1991 340.738.59 857.332.91 1,02 - 0002 576.655.911 988.492.61 6,31 %7,0- 6002 000.485.831 000.193.41 4,01 %5,0- 405educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação As estatísticas nacionais exibem o fosso que separa a demanda po- tencial e a oferta de oportunidades educacionais para jovens e adultos. Ainda assim, não é raro assistirmos ao encerramento de programas, fechamento de escolas e de salas de aula sob a alegação de que não há demanda. É possível que as dificuldades de expressão das necessidades educativas estejam relacio- nadas ao baixo grau de consciência dos direitos e à debilidade política dos potenciais beneficiários.Também é provável que a rigidez e homogeneidade da oferta escolar predominante a torne pouco atrativa ou dificulte o acesso por parte de populações que têm características socioculturais, necessidades e condições de estudo peculiares.6 Mas a baixa procura deve-se, também, à omis- são dos poderes públicos perante a obrigação de criar as condições para a mobilização da demanda por escolarização. Um dos dispositivos legais siste- maticamente violados é o artigo da LDB que determina aos poderes públicos realizar o recenseamento e a chamada escolar da população que não teve aces- so ao ensino fundamental. Um dos caminhos para reparar essa violação do direito à educação é aquele percorrido pelo Fórum Paulista de Educação de Jovens e Adultos, que acionou o Ministério Público e deu início a uma Ação Civil Pública para compelir os governos municipal e estadual a cumprir sua obrigação de recensear os estudantes potenciais. Além de vontade política, a realização dos censos implica desafios técnicos que requerem cooperação intergovernamental e reunião de esforços de institutos de pesquisa, instituições de ensino superior, da Justiça Eleitoral e de órgãos que detêm cadastros de beneficiários de políticas e programas sociais diversos. Dentre os desafios da gestão de políticas e programas de educação de jovens e adultos, sobressaem as dificuldades de permanência e progressão do alunado, refletidas nas elevadas taxas de abandono e nos baixos índices de conclusão característicos da modalidade. As pesquisas indicam a combinação de fatores internos e extra-escolares na determinação desses resultados. Os fatores intrínsecos ao processo de ensino-aprendizagem que contribuem para a evasão e o insucesso escolar são complexos e sua elucidação extrapola os objetivos deste artigo. No que concerne aos fatores extra-escolares que podem ser modificados pela administração educacional, trata-se de operacionalizar o dispositivo previsto no 2º parágrafo do artigo 37 da LDB que determina ao Poder Público viabilizar e estimular o acesso e a permanência do trabalhador na esco- la, mediante ações integradas e complementares entre si. Embora a redação da Lei seja imprecisa, é possível interpretá-la na direção da criação de incentivos aos empregadores para facilitar o acesso dos trabalhadores aos estudos, ao lado de mecanismos de gratuidade ativa, como a provisão de assistência de saúde, transporte, alimentação, material escolar e didático-pedagógico.7 Outro desafio pendente para a ampliação da abrangência e da quali- dade do atendimento educativo a jovens e adultos é o financiamento do ensino. No decorrer da década 1996-2006, em que a destinação de recursos públicos para a educação básica foi regulada pelo Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), a provisão de ensino aos 406 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro de jovens e adultos sofreu restrições em decorrência do veto presidencial que impediu o cômputo das matrículas nessa modalidade nos cálculos do Fundo. Unidades Federadas e alguns municípios tiveram um alívio parcial quando o Ministério da Educação instituiu em 1998 o programa Recomeço (rebatizado em 2003 como Fazendo Escola), por meio do qual o governo federal prestava assistência financeira para a contratação e formação de professores e provisão de materiais didáticos do Ensino Fundamental de jovens e adultos. Com a cria- ção do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) pela Lei n.11.494 de 2007, as reivindicações em favor da inserção da modalidade no sistema de financiamento da educação básica foram parcialmente atendidas. Entretanto, o temor de que a disponibilidade de financiamento levasse a um crescimento ace- lerado de matrículas e trouxesse dificuldades financeiras aos governos justificou uma regulamentação desfavorável. A consideração das matrículas no ensino presencial de jovens e adultos no FUNDEB é progressiva (um terço ao ano, até alcançar 100% em 2009). O fator de ponderação atribuído é o menor de todas as modalidades compreendidas pelo Fundo, correspondendo a 70% do valor de referência, e não varia segundo as etapas de ensino, de modo que se supõe um mesmo gasto com um estudante de alfabetização ou do ensino médio profissionalizante, cujos custos reais são muito diferentes. A regulamentação do Fundeb pelo Decreto n.6.353 estipulou ainda um teto máximo de 15% para despesas com a educação de jovens e adultos e conferiu prioridade ao ensino regular. Assim, embora a simples garantia de uma fonte regular de financiamen- to abra novas perspectivas para a modalidade, a inserção da educação de jo- vens e adultos no Fundeb comporta limites à ampliação e à qualificação da oferta. Dessa breve análise, é possível extrair indicações para a atualização da agenda de lutas pelo direito humano à educação na juventude e na vida adulta, organizada em torno a quatro eixos de reivindicação e mobilização: · Um primeiro eixo voltado à mobilização da demanda educacional da população adulta, orientado por ações de conscientização em relação aos direitos educativos e pela reivindicação de cooperação entre os poderes públicos para a realização do recenseamento e da chamada escolar da população que não teve acesso ao ensino fundamental. · Um segundo eixo visando à garantia das condições de acesso, per- manência e progressão dos jovens e adultos no sistema educacional, mediante ações voltadas à conciliação entre trabalho e estudo, provi- são de bens e serviços em assistência ao estudante (merenda, trans- porte, óculos, material escolar, livros didáticos e de leitura), diversifi- cação, flexibilização e qualificação da oferta escolar. · Um terceiro eixo cuja meta é a ampliação do financiamento da edu- cação de jovens e adultos, direcionado à reforma dos regulamentos que depreciam a modalidade na gestão do FUNDEB. 407educação Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008Disponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Luta social e reconhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e adultos à educação · Um quarto eixo direcionado à aprovação de diretrizes nacionais e metas estaduais para a educação nas prisões (incluindo legislação relativa à remição penal pelo estudo), especificando fontes de financi- amento e atribuições das esferas de governo e dos organismos de gestão da educação e do sistema penitenciário. 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Essa determinação (que jamais foi cumprida pelo governo federal) foi suprimida na nova redação dada ao artigo 60 pela Emenda Constitucional n.14 de 1996, que instituiu o Fundo de Desenvol- vimento do Ensino Fundamental – Fundef. ² Em 2007 a CEB/CNE promoveu uma série de audiências públicas para ouvir os interessados em relação ao emprego dos recursos da educação a distância e às idades mínimas de ingresso e realização de exames para o Ensino Fundamental e Médio na modalidade Educação de Jovens e Adultos. A consulta não produziu consensos que levassem à mudança das normas vigentes. ³ A remição da pena pelo estudo está prevista em leis ou normas de alguns Estados brasileiros, mas não na legislação nacional. Existem no Congresso projetos de lei relativos ao tema, cuja tramitação não avança devido a resistências da opinião pública e de parlamentares. 4 Refiro-me ao artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de que o Brasil é signatário, e aos artigos 13 e 14 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, que o país subscreveu tardiamente, em 1990. 410 Santa Maria, v. 33, n. 3, p. 395-410, set./dez. 2008 educaçãoDisponível em: <http://www.ufsm.br/revistaeducacao> Maria Clara Di Pierro 5 Índia, China, Bangladesh, Paquistão, Nigéria , Etiópia, Egito, Indonésia e Brasil reúnem 70% dos 800 mil analfabetos com idade superior a 15 anos registrados pela Unesco em 2004. .6 Baseados em pesquisas, vários autores afirmam que, no caso da educação de jovens e adultos, é a configuração da oferta (mais ou menos diversa, flexível e apropriada) que potencializa a demanda (HADDAD, 1997; MESSINA, 1993). 7 Cabe mencionar que, até o presente momento, o ensino de jovens e adultos (exceção feita às turmas do Programa Brasil Alfabetizado) não é beneficiado pelo Programa Nacional de Livro Didático, o que fere o princípio de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, enunciado no art. 3º, inciso I da LDB. Correspondência Maria Clara Di Pierro - Av. da Universidade, 308 bloco A sala 207 - Cidade Universi- tária - CEP: 05508-040 - São Paulo (SP). E-mail: mcpierro@usp.br Recebido em 17 de julho de 2008 Aprovado em 12 de outubro de 2008 1 EDUCAÇÃO POPULAR E EDUCAÇÃO AO LONGO DA VIDA Moacir Gadotti Presidente de Honra do Instituto Paulo Freire Professor aposentando da Universidade de São Paulo Pode-se continuar a aprender até o fim da vida sem, no entanto, jamais se educar (ARENDT, 1972:37). A primeira reação que tive ao ver, em meados de 2015, o súbito interesse pelo tema da “Educação ao longo da vida” foi, primeiro, de espanto, e, logo em seguida, de curiosidade epistemológica. Desde a realização da Sexta Conferência Internacional de Educação de Adultos da Unesco, em 2009, a CONFINTEA VI, esse tema não aparecia na agenda do MEC de forma tão incisiva e pensava que o foco de nossas preocupações era a eliminação do analfabetismo e a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Afinal, a CONFINTEA é uma conferência de “Educação de Adultos” e não uma conferência de “Educação ao Longo da Vida”. Não podemos confundir Educação de Adultos com Educação ao Longo da Vida. Se as duas expressões se identificaremnão seria uma educação “ao longo da vida”, mas apenas ao longo da vida dos adultos. Seria ao “longo da vida”, menos a vida da criança e do adolescente. Será que a Unesco e o MEC desistiram da Educação de Adultos? O MEC estaria abandonando a discussão da Educação Popular interrompida em setembro de 2014 quando, depois de um longo processo de discussão, chegou-se a uma minuta de decreto sobre a “Política Nacional de Educação Popular”? Começaram a chegar até mim consultas de pessoas ligas aos fóruns de EJA, de quadros ligados à educação de adultos que estão em secretarias de educação, e também de alguns colegas do MEC, da CNAEJA (Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos) sobre essa mudança. O que está acontecendo? Por que, agora, essa proposta de Educação ao Longo da Vida? É possível um diálogo entre Educação Popular e Educação ao Longo da Vida? O que tem a ver a Educação ao Longo da Vida com a nossa trajetória da Educação Popular e da EJA? Além das perguntas que vieram de diversos cantos, outras duas razões me instigaram a escrever o texto que ora apresento para a discussão do tema: a minha própria inquietude diante do que tenho lido e escutado e o evento marcado para abril de 2016 sobre o tema, a CONFINTEA BRASIL + 6. Não podemos deixar de levar a sério essa repentina mudança de direção pois terá consequências importantes para a educação brasileira. Precisei voltar a estudar o que havia trabalhado na minha tese de doutorado na Universidade de Genebra, defendida em 1977 (GADOTTI, 1979). Senti-me provocado a buscar entender melhor o alcance dessa proposta de uma “Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida” que me soava muito estranha. Será que um novo debate sobre a “Educação ao Longo da Vida” da Unesco vai avançar a discussão de uma Política Nacional de Educação Popular? Aproximar a Educação Popular da Educação ao Longo da Vida vai trazer benefícios para a Educação de Jovens e Adultos? Essas são algumas das preocupações que direcionam minha reflexão neste texto. 1. A ideia de uma aprendizagem ao longo da vida é muito antiga. Seiscentos anos antes de Cristo, Lao-Tsé sustentava que “todo estudo é interminável” (LAO-TSEU, 1967: 84). Podemos encontrar esta ideia no mito de Prometeu e na república ideal de Platão. A educação, diz Platão, “é o primeiro dos mais belos privilégios. E se sucede a este privilégio de desviar de sua natureza e que seja possível retificá-lo, eis aí o que cada um deve sempre fazer no decorrer de sua vida segundo a sua possibilidade” (PLATON, 1970: 666). A Educação ao Longo da Vida é a expressão recente de uma preocupação antiga. O que é novo é tudo o que vem por trás desse princípio antropológico e como ele é instrumentalizado. Daí a enorme importância de tomarmos posição frente a esse tema. Pode-se dizer que, deste Aristóteles, a educação tem sido entendida como permanente, integral, e que se dá ao longo de toda a vida. Este é um princípio básico da pedagogia e existe praticamente em todas as culturas. Como diz Paulo Freire, “não é possível ser gente senão por meio de práticas educativas. Esse processo de formação perdura ao longo da vida toda, o homem não para de educar-se, sua formação é permanente e se funda na dialética entre teoria e prática” (FREIRE, 2000: 40). Ao sustentar que o ser humano é inacabado, Paulo Freire conclui que o processo de aprendizagem é essencial para a sua sobrevivência. Aprendemos ao logo de toda a vida. Somos seres inacabados, incompletos, inconclusos. Por isso, precisamos nos conhecer melhor, conhecer os outros e a natureza, buscando sempre sermos Introdução Tópico TEXTO 04 2 melhores, agir e refletir sobre o que fazemos. É assim que avançamos, coletivamente, construindo nossa própria humanidade. Assim passamos de uma consciência primeira, mágica, do mundo, para uma consciência refletida, científica, crítica, do mundo. Pela educação. Todos e todas buscamos nos tornar melhores e mais felizes. Não podemos ser gente, tornarmo-nos melhores, sem educação, sem formação permanente. Aprendemos ao longo de toda a vida, não só na escola, conhecendo nossas circunstâncias e o mundo em que vivemos, mas “em todos os cantos” (PADILHA, 2007). A educação procura superar o nosso inacabamento, a nossa incompletude. Se a expressão “aprendizagem ao longo da vida” é antiga, o mesmo não ocorre com a expressão “educação ao longo da vida”. No processo de pesquisa que fiz para meu doutorado, constatei que o conceito de “educação ao longo da vida” apareceu pela primeira vez, num documento oficial, na Inglaterra, em 1919 (Lifelong Education, Education for Life), associado à formação profissional (“vocacional”) dos trabalhadores. A expressão Lifelong Education foi traduzida, na França, por “Éducation permanente”. É assim que ela aparece nos anos 50 e 60 na literatura pedagógica e foi consagrado no Relatório Edgar Faure, da Unesco, Aprender a ser, em 1972, como “pedra angular” da “cidade educadora” e “ideia mestra” das futuras políticas educativas. A matriz fundadora da Educação ao Longo da Vida é a Educação Permanente. Há total coerência entre essas duas expressões. Uma pode ser substituída pela outra sem qualquer perda de significado. Na França, a noção de educação ao longo da vida não era novidade. A ideia de uma educação continuada, progressiva, “para todas as idades”, era a base do programa educativo da Revolução de 1789. Condorcet, em seu relatório apresentado à Assembleia Legislativa, dia 20 de Abril de 1792, observa que a “instrução não deveria abandonar os indivíduos no momento em que saem da escola, deveria abranger todas as idades já que não há idade em que não seja útil e possível aprender” (Concordet. Apud TRICOT, 1973:88). Em 1938, Gaston Bachelard, insistia na educação “contínua no decorrer da vida inteira”: “uma cultura bloqueada no tempo escolar”, afirmava ele, “é a negação da própria cultura científica. Sem escola permanente não existe ciência. É essa escola que a ciência deve fundar” (BACHELARD, 1970: 252). As reflexões de Bachelard não ficaram letra morta. Em 1955 a Liga Francesa de Ensino elaborou um projeto de reforma que emprega pela primeira vez, oficialmente, a expressão “Educação Permanente”, na mesma concepção do que no Reino Unido se chamada de “Lifelong Education”. Em 1960 Gaston Berger lança as bases de uma “filosofia de Educação Permanente” (BERGER, 1962) “educação ao longo da vida”, como “ideia mestra” e “fator integrador” de todas as políticas educativas. Mas, nesse ínterim, vieram os acontecimentos de Maio de 1968, iniciados pelos estudantes de Paris, que se espalharam pelo mundo e acrescentaram um componente político novo à ideia de uma Educação ao Longo da Vida. As ruas preocuparam as autoridades internacionais responsáveis pelo “bom comportamento” da educação. “Estudem, mas não façam a guerra”, ironizava meu orientador de tese, Claude Pantillon, nos primeiros anos da década de 70. Não é por mero acaso que a Unesco, o Conselho da Europa e a OCDE (Organização da Cooperação e Desenvolvimento Econômico), após 1968, apresentaram novos projetos para substituir o sistema “tradicional” (considerado obsoleto) de ensino, por um sistema de Educação Permanente. O princípio da educação ao longo da vida precisava ser “operacionalizado”. Acabou sendo “instrumentalizado”, transformado num “programa”. O que deve ser consumido, pensado, já fora decidido. Era preciso colocar a casa em ordem. Num primeiro momento, a Educação Permanente (ou Educação ao Longo da Vida) nada mais era do que um termo novo aplicado à Educação de Adultos, principalmente no que se referia à formação profissional continuada. Depois passou por uma fase que poderíamos chamar de “utópica”, integrando toda e qualquer ação educativa e visando a uma transformação radical de todo o sistema educativo (FURTER, 1972). Finalmente, nas últimas décadas, nos países do Norte, os organismos internacionaisconseguiram realizar o seu sonho de uma educação “para o desenvolvimento”, focando-se na “adaptação funcional dos aprendentes individuais à empregabilidade, flexibilidade e competitividade econômica, no quadro da 'sociedade da aprendizagem' e da 'economia do conhecimento'” (LIMA, 2010). Criticando essa ideologia da competitividade, Henri Hartung, afirma: “para satisfazer a sede de poder é necessário fazer mais e melhor que o vizinho, considerado tão logo como instrumento dócil ou como perigoso adversário” (HARTUNG, 1972: 1-2). A ideia da Educação Permanente (Educação ao Longo da vida) impôs-se rapidamente. A França gastava um terço do seu orçamento da educação à educação para a formação profissional continuada, já em 1975. Ivan Illich e Etienne Verne (1975) denunciaram “a armadilha da escola por toda a vida” ("le piège de l'école à vie"), criticando o discurso e a prática da Educação Permanente (Lifelong Education) chamando- a de “educação interminável”, acusando-a de promover a ideologia da “escolarização” (redução de toda a educação à educação escolar). Para eles, a Educação Permanente promove a “infantilização da vida” e da educação, prolongando durante toda a vida uma visão da educação da infância. A crítica de Ivan Illich foi bem fundo num encontro organizado (paradoxalmente) pelas instituições guardiãs desse pensamento, diante de um auditório eminentemente representativo do “sistema” (Palácio 3 das Nações Unidas, Genebra, 5 de setembro de 1974) e que tive o privilégio de assistir. Concepção perfeitamente “imperialista”, dizia Illich, “determinada pela vontade das sociedades ocidentais de conservar a cultura acorrentada, fazendo crer na democratização que não existe de fato”. Illich falava com paixão, como era do seu feitio: a escola é um “ópio do proletariado”, a Educação Permanente está “vendida ao sistema”, portanto é “perigosa e perversa”. O que aconteceu depois com a Educação Permanente deu razão a Illich. 2. A noção de “Educação ao longo da vida”, tal como foi proposta, posteriormente, pelo Relatório Jacques Delors (1996), publicado no Brasil em 2010 (UNESCO, 2010a), com seus quatro pilares (aprender a aprender, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a ser) não segue, propriamente, a matriz original do Relatório Edgar Faure (1972). A Educação ao longo da vida perdeu sua característica de ser uma educação voltada para a participação e para a cidadania como, de alguma forma, encontrava-se no Relatório Edgar Faure. Aos poucos, a referência deixou de ser a cidadania para se focar nas exigências do mercado. Com amparo na teoria do capital humano, a aprendizagem passa a ser uma responsabilidade individual e a educação, um serviço, e não um direito. Esse “ethos” mercantil deslocou a educação para a formação e para aprendizagem. A visão humanista, inicial, foi substituída, nas políticas sociais e educativas, por uma visão instrumental, mercantilista, apesar de declarações em contrário. Essa visão instrumental do conceito de Educação ao Longo da Vida (Educação Permanente) manteve-se na Declaração de Hamburgo (CONFINTEA V, 1997), apesar de seus reconhecidos avanços no campo do conceito de Educação de Adultos e, particularmente, no conceito ampliado de alfabetização. Em Hamburgo não se superou inteiramente a visão da “neutralidade” do conceito de “Educação Permanente” dos anos 70 do século passado. Paulo Freire, no prefácio a minha tese de doutorado, publicada em 1981, com o título A educação contra a educação, afirma que a Educação Permanente não surgiu “por acaso nem por obra voluntarista de educadores, mas como resposta necessária a certos problemas das sociedades capitalistas avançadas” e que era preciso “resgatar o caráter permanente da educação como quefazer estritamente humano”. Ele tinha lido minha tese quando estava em Luanda (Angola) e se preocupava com a Educação Permanente pois poderia ser mais um discurso da “pedagogia do colonizador” e chamava a atenção para o “perigo da invasão cultural, o perigo da infiltração da ideologia veiculada através da chamada Educação Permanente” (FREIRE, 1981:15-19). A preocupação de Paulo Freire se justificava. O conceito de Educação/Aprendizagem ao longo da vida, no mínimo, apresentava certas ambiguidades. Não poderia ser considerado um conceito “neutro”. Era preciso saber de que educação e de que aprendizagem ao longo da vida se tratava. A educação sempre foi entendida como um processo que se dá ao longo de toda a vida, como a aprendizagem, e não um processo que se reduz à população jovem. O que é novo hoje é que o conceito de “aprendizagem ao longo da vida” está se tornando uma ideia-força em torno da qual se estruturam as políticas públicas de educação, condicionando os currículos, a avaliação e o próprio sentido da educação em geral, reduzindo toda a educação a esse princípio estruturante. Uma das potencialidades do princípio da “aprendizagem ao longo da vida” é que ele quebra uma visão estanque da educação, dividida por modalidades, ciclos, níveis etc. Ele articula a educação como um todo, independentemente da idade, independentemente de ser formal ou não-formal. Se a educação e a aprendizagem se estendem por toda a vida, desde o nascimento até a morte, significa que a educação e a aprendizagem não se dão somente na escola e nem no ensino formal. Elas se confundem com a própria vida, que vai muito além dos espaços formais de aprendizagem. Assim, podemos dizer que tanto a educação quanto a aprendizagem não podem ser controlados pelos sistemas formais de ensino. Este princípio nos obriga a termos uma visão mais holística da educação. A Educação ao longo da vida não pode ser confundida com a Educação de Adultos pois o próprio princípio “ao longo da vida” indica que a educação ocorre em todas as idades e não só na idade adulta. Por outro lado, se a educação ao longo da vida se dá em espaços formais e informais, reduzir esse conceito à educação formal seria, também, privá-lo de uma de suas grandes potencialidades. Por isso não devemos confundir Educação ao Longo da Vida como a Educação Formal. Como afirma Rosa Maria Torres, autora do Relatório Síntese Regional da América Latina e Caribe, preparatório à CONFINTEA VI (2009), o conceito de aprendizagem ao longo da vida “permanece obscuro ao redor do mundo e tem sido entendido e utilizado das mais diversas maneiras. Ele surgiu no hemisfério norte, intimamente relacionado ao crescimento econômico e à competitividade e empregabilidade, uma estratégia para preparar os recursos necessários para a sociedade da informação e para a economia baseada no conhecimento” (TORRES, 2009:56). O conceito de “Lifelong learning”, como vimos, surgiu na Europa logo depois da primeira Guerra Mundial. Ele atendia, de um lado, à necessidade de reeducar os adultos, cuja escola não havia sido capaz de educá-los para a paz e, de outro lado, à crescente expectativa de vida. Era preciso oferecer mais oportunidades de aprendizagem à população idosa cada vez mais numerosa. Na América Latina, o conceito teve pouca repercussão. Para Rosa Maria Torres (2009:57), “o fato é que a mudança de paradigma Tópico 4 proposta mundialmente – de educação para aprendizagem, de educação de adultos para aprendizagem de adultos – não foi internalizada na região, não só em relação à educação de jovens e adultos como em relação à educação em geral”. Por aqui aparece como um “conceito obscuro”, onde aprendizagem se confunde com educação, “um conceito distante, associado com o hemisfério Norte, faltando relevância e contextualização no hemisfério Sul” (Idem, p. 91). Trata-se de um conceito com diferentes interpretações e diferentes práticas que continua com a mesma ambiguidade da Educação Permanente. Nada de novo em relação a isso. Mas, predomina uma visão instrumental, voltada para a eficácia produtiva e à competitividade. O que é novo é que a aprendizagem ao longo da vidaé apresentada como um “princípio organizador e norteador” da educação para o século XXI, “operacionalizando” o conceito de Educação Permanente. Era a resposta que Establishment dava ao movimento mundial dos estudantes de 1968. Para entender esse conceito precisamos historicizá-lo. Em 1968, a UNESCO publicou o documento A crise mundial da educação, uma análise sistêmica, no qual Philip H. Coombs, diretor do Instituto Internacional de Planificação da Educação (IIPE) da UNESCO, analisa os problemas da educação no mundo e faz algumas recomendações. A “crise mundial da educação” (COOMBS, 1968) é atribuída principalmente ao “desajuste” dos sistemas educativos face às novas exigências da economia capitalista globalizada. O mercado necessitava de trabalhadores formados como “sujeitos empreendedores”, visando à “conformar uma relação dos sujeitos na história, almejando, no horizonte deste projeto educacional, um sujeito despolitizado, atomizado, sem qualquer capacidade organizativa e sem condições de pensar-se como sujeito coletivo” (RODRIGUES, 2009: 15). A resposta à “crise mundial da educação” vem quatro anos depois, no Relatório Edgar Faure, que apresenta a Educação Permanente como um princípio “norteador” (sic, “orientar para o norte”) da educação do futuro. 3. Apesar da aparente continuidade entre os Relatório Edgar Faure (“Aprender a ser”) e o Relatório Jacques Delors (Educação, um tesouro a descobrir, em inglês, Learning: the treasure within), existe uma profunda diferença: o foco deixa de ser a educação e passa a ser a aprendizagem. Rosanna Barros (2011), analisando essa passagem e essa evolução de conceitos, sustenta que a ênfase dada, inicialmente, pela Unesco e pelo Banco Mundial ao conceito de “Educação Permanente” passou a ser dada, depois, ao conceito de “Aprendizagem ao Longo da Vida”. O curioso é que o título do Relatório Delors em inglês é “Learning” (Aprendizagem) e no francês é “Éducation” (Educação). E mais: em nenhum momento neste relatório se fala de “Aprendizagem ao longo da vida”, mas, simplesmente, em “aprendizagem”. Entretanto, não se tratava apenas de ênfase, passando de uma expressão para outra, mas de uma mudança de paradigma educacional. Houve um esvaziamento do conceito originário de Educação Permanente, como era entendido na França (BERGER, 1962; LENGRAND, 1970), rompendo com sua visão de uma educação voltada para a participação e a cidadania democrática. Para Rosanna Barros, nas últimas duas CONFINTEAs da Unesco, houve uma progressiva valorização da Aprendizagem ao Longo da Vida em detrimento da Educação de Adultos, que passou a ser encarada como uma expressão da Educação ao longo da vida. Apesar das possíveis críticas ao conceito de Educação Permanente, este conservava ainda uma visão humanista da educação, voltada para a construção de uma “sociedade democrática”, como se vê nas obras de Paul Lengrand (1970) e no próprio Relatório Edgar Faure (1972). Este não é o caso da Educação ao Londo da Vida, cuja referência é o mercado e não a cidadania. Deixa-se de pensar numa “sociedade democrática”, voltada para a justiça social, para se pensar numa “sociedade do conhecimento”, voltada para os interesses privados e para a competitividade do mercado. O que é essa “sociedade do conhecimento”? Muniz Sodré responde a essa pergunta dizendo que não existe uma “sociedade do conhecimento”: “esta expressão – que às vezes se emprega como um refinamento de 'sociedade da informação' – tornou-se recorrente no discurso publicitário das grandes empresas de tecnologia da informação e da comunicação, porém se revela mais um slogan do que um conceito, na medida em que reduz a diversidade dos modos de conhecer ao modelo maquínico” (SODRÉ, 2012:31). Embora a Educação ao Longo da Vida tenha sua matriz na Educação Permanente, há diferenças. Há uma certa compreensão da Educação ao Longo da Vida que subordina a educação à lógica mercantil, revivendo a Teoria do Capital Humano de 50 anos atrás, reduzindo a Educação Permanente à formação profissional a serviço das empresas. O Estado neoliberal imprimiu um ethos mercantilista ao conceito de Educação ao Longo da Vida, reconceituando a Educação Permanente, e a Unesco não se posicionou claramente em favor de uma concepção de Educação ao Longo da Vida que defendesse outros princípios. Quando eu estava escrevendo minha tese de doutorado, nos anos 70, não havia distinção entre “Educação Permanente”, “Educação ao Longo da Vida” e “Aprendizagem ao Longo da Vida”, que traduziam a expressão inglesa “Lifelong Education” e Lifelong Learning. Essas expressões traduziam as mesmas intenções, os mesmos pressupostos. O que aconteceu nas décadas seguintes foi um completo distanciamento das raízes humanistas iniciais. Conforme mostram os estudos de Licínio Lima (2007; 2010; Tópico 5 2012) e Rui Canário (2003), essa expressão foi se reconceituando ou desvirtuando, a partir do receituário da OCDE e do Banco Mundial, acomodando-se cada vez mais à racionalidade econômica. O princípio universal de que aprendemos ao longo de toda a vida foi substituído por uma “formação profissional ao longo da vida”. Na visão desses autores, o conceito nasceu no contexto do Estado-Previdência e acabou sendo reconceituado pelo Estado-Neoliberal. Licínio Lima (2010) critica os “discursos apologéticos” em torno da Educação/Aprendizagem ao longo da vida como se bastasse criar um novo conceito para mudar a ordem das coisas e como se a educação pudesse fazer tudo. Para ele, essa apologia da aprendizagem individual tende a individualização das relações de trabalho na empresa. Esses discursos apresentam a Educação/Aprendizagem ao longo da vida como uma panaceia, que “tudo pode”, uma solução milagrosa para a “crise mundial da educação”. A educação é ensino e aprendizagem. Não há educação sem educador-educando. O conceito de “Adult learning” e “Lifelong learning” deslocou o tema da educação para um único polo: o da aprendizagem. Segundo Licínio Lima (2007, quarta capa) a “educação ao longo da vida” revela-se, no limite, como “um projeto político-educativo inviável, já definitivamente em ruptura com as suas raízes humanistas e críticas”. Ele vê “fortemente diluídas as suas dimensões propriamente educativas”. Para ele, a expressão “Lifelong learning”, tal como é entendida pela Comunidade Europeia, opõe-se à tradição humanista-crítica, emancipatória e transformadora da educação popular: “subordinada aos imperativos globais da modernização e da produtividade, da adaptação e da empregabilidade, a educação popular está sitiada. Ou é objeto de uma reconfiguração de tipo funcional e vocacionalista, evoluindo para uma formação de tipo profissional e contínuo, articulada com a economia e com as empresas (e nesse caso prospera), ou insiste na sua tradição de mudança social e de “conscientização”, articulando-se com movimentos sociais populares e renovando os ideais de educação política e de alfabetização crítica (e nesse caso corre sérios riscos)” (LIMA, 2007:55-56). A aprendizagem, na ótica neoliberal, realça apenas o chamado “conhecimento útil” e os aspectos individualistas e competitivos. Não se trata de deslocar a tônica da educação para a aprendizagem. Trata-se de garantir, por meio de uma educação com qualidade social, a aprendizagem de todos os cidadãos e cidadãs que deve ser “sociocultural” e “socioambiental” (PADILHA, 2007). Não há como não recordar, neste altura, da famosa tese defendida por Paulo Freire em seu livro mais conhecido, escrito em 1968, Pedagogia do oprimido: quando a educação não é transformadora, o sonho do oprimido é ser o opressor (FREIRE, 1970). Era a resposta que Paulo Freire dava à teoria do capital humano que se resumia em outra tese, diametralmente oposta: “estude muito, ao longo de toda a vida, arrume um bom emprego e fique rico”. A questão não está apenas no ato de aprender, mas no que se aprende. Trata-se de garantiruma “aprendizagem transformadora”, como sustenta Edmund O'Sullivan (2004), no conteúdo e na forma. Ao contrário dessa visão, a concepção da aprendizagem sustentada pelas políticas neoliberais centra-se na responsabilidade individual. A solidariedade é substituída pela meritocracia. Por isso, temos que concordar com Licínio Lima (2006:66): na pedagogia neoliberal “o indivíduo é aquele que, em primeiro lugar, é responsável pela sua própria aprendizagem e por, naquele momento, gerir seu processo de aprendizagem e encontrar estratégias mais interessantes para ele próprio, numa base individual, competitiva. Quer dizer que o cidadão dá lugar muito mais ao cliente e ao consumidor”. A educação é dever do Estado e a responsabilidade por ela não deve recair exclusivamente sobre o indivíduo. Em 2015, o Instituto da Unesco para a Aprendizagem Longo da Vida, com sede em Hamburgo, na Alemanha, publicou, na edição de número 61 de sua International Review of Education: Journal of Lifelong Learning, um artigo de Kapil Dev Regmi (REGMI, 2015), da University of British Columbia (Canadá), que faz um balanço dos “modelos” teórico-práticos atuais de “Aprendizagem ao Longo da Vida”. Baseado em extensa pesquisa, o autor chega a dois “modelos” fundamentais que chama de “modelo do capital humano” e de “modelo humanitário” que são verdadeiras concepções opostas de “aprendizagem ao longo da vida”. Para o modelo do capital humano, a Aprendizagem ao Longo da Vida é uma “estratégia” para acelerar o crescimento econômico e a competitividade. Para o modelo humanitário, a Aprendizagem ao Longo da Vida reforça a democracia e a proteção social, valorizando a educação cidadã. O primeiro modelo é sustentado pela União Europeia, pela OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico), pelo Banco Mundial e pela Organização Mundial de Comércio. Para o autor, a sociedade civil “abraçou” o modelo humanitário e aponta o ICAE (Associação internacional de Educação de Adultos) como defensor deste modelo, vinculando a Aprendizagem ao Longo da Vida à justiça econômica, equidade, respeito aos direitos humanos, reconhecimento da diversidade cultural. O ICAE sempre defendeu o direito à Educação de Adultos como direito humano “ao longo da vida”. A Assembleia Mundial do ICAE, reunida em Montreal no dia 14 de junho de 2015, termina sua Declaração Final defendendo enfaticamente esse direito: “nós, no Conselho Internacional para a Educação de Pessoas Jovens e Adultas, reafirmamos nossa determinação coletiva de atuar e garantir que o direito à educação e a aprendizagem ao longo da vida, em todas as suas dimensões e profundidade, seja reconhecido publicamente e se converta numa ferramenta permanente para o empoderamento de todas as mulheres e de todos os homens do planeta”. Para o ICAE, a educação e a aprendizagem ao longo da vida não pode 6 limitar-se à formação profissional, mas deve incidir sobre a vida como um todo, “em todas as suas dimensões”. A teoria do capital humano, que fundamenta o primeiro modelo, concebe a educação como um investimento, um “bem privado”, uma mercadoria, visando à competitividade entre indivíduos e nações, com estratégias como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) e a privatização da educação, incentivando que o setor privado invista na educação e faça a gestão não só da educação privada mas também da educação pública. Este modelo, “colonizador”, segundo Kapil Dev Regmi, não oferece oportunidades iguais para todos, não emancipa e reforça a injustiça social e econômica. Esse modelo formaria os cidadãos para aceitarem “as estruturas políticas e econômicas existentes”, beneficiando as grandes corporações que buscam obter lucro com a educação. É um modelo que cria ainda maior distância entre os que tem acesso e os que não tem acesso à educação. O modelo humanitário se baseia na Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) e se opõe à concepção/realização “neoliberal” da educação promovida pelos organismos internacionais, propondo o desenvolvimento integral do ser humano. Este modelo defende a educação como um direito e não como um serviço a ser comprado pelos indivíduos que podem pagar por ele, tornando o indivíduo responsável pela sua própria educação; sustenta, ainda, que a educação é dever do estado e direito do cidadão e que deve promover a cooperação e a colaboração entre os cidadãos e não reforçar o individualismo. 4. Creio que a América Latina avançou mais do que os países hegemônicos na concepção emancipatória da educação, consolidada na nossa tradição da Educação Popular (GADOTTI & TORRES, 1994; TORRES, 2011) como educação para a justiça social. Não precisamos buscar os modelos dos países “do Norte”, com seus discursos hegemônicos e neocolonizadores. Por isso, é importante o Brasil discutir, o tema da Educação ao Longo da Vida a partir do referencial da Educação Popular. Como tem dito Arlindo Cavalcanti de Queiroz, coordenador da CONFINTEA BRASIL + 6, a Educação ao Longo da Vida pode se tornar a “porta de entrada” para discutir a Educação Popular. Precisamos acompanhar esse debate para colocar a Educação Popular na agenda mundial, via Unesco e via organizações da sociedade civil como o ICAE, o CEAAL (Conselho de Educação Popular da América Latina e do Caribe) e a Internacional da Educação, enfrentando o pensamento hegemônico neoliberal do Banco Mundial e da OCDE. Mas, cuidado: isso nada tem a ver com adaptar as nossas prioridades e a nossa agenda aos ditames da agenda das organizações internacionais. O Brasil, em seu Documento Nacional Preparatório à VI Conferência Internacional de Educação de Adultos (VI CONFINTEA), apontou a “Educação Popular de matriz freiriana” (BRASIL, 2009:92) como perspectiva da Educação ao Longo da Vida, abrindo espaço para reconceituá-la. Esse espírito não foi mantido no documento final da CONFINTEA VI. O Marco de Ação de Belém ignorou a visão da EJA na perspectiva da Educação Popular proposta no documento preparatório do Brasil; abandonou a expressão “Educação ao Longo da Vida” em favor da expressão “Aprendizagem ao Longo da Vida”, definindo-a como “uma filosofia, um marco conceitual e um princípio organizador de todas as formas de educação, baseada em valores inclusivos, emancipatórios, humanistas e democráticos, sendo a abrangente e parte integrante da visão de uma sociedade do conhecimento”. (UNESCO, 2010: 6). Reconhecemos que essa definição de Aprendizagem ao Longo da Vida é um avanço, certamente, uma contribuição da América Latina, mas, isso não vem se traduzindo na prática. Vista sob a ótica da nossa grande referência que é a Educação Popular, a Aprendizagem ao Longo da Vida, deveria voltar-se para a participação, para a cidadania, para a autonomia dos cidadãos. Deveria englobar o respeito e a defesa dos direitos humanos, a pedagogia crítica, os movimentos sociais, a comunicação e a cultura popular, a educação de adultos, a educação não-formal e a educação formal em todos os níveis, a educação ambiental, enfim, a educação integral e inclusiva. Mas isso não é o que está acontecendo. A Educação Popular leva em conta as diferentes expressões da vida humana, sejam elas artísticas ou culturais, sejam elas ligadas ao desenvolvimento local e à economia solidária, à sustentabilidade socioambiental, à afirmação das identidades dos diferentes sujeitos e de seus coletivos, à inclusão digital e o combate a qualquer tipo de preconceito. O Brasil, ao indicar, no Documento Nacional Preparatório à CONFINTEA VI, a “Educação Popular de matriz freiriana” como sua referência de Educação de Jovens e Adultos, estava também indicando o seu entendimento da Educação/Aprendizagem ao Longo da Vida. Desde 2009, busca-se consolidar uma Política Nacional de Educação Popular capaz de garantir os princípios defendidos pelos coletivos de EJA nos diferentes fóruns e demais espaços de atuação. Essa políticanada mais faz do que instituir o que já ocorre nas práticas da EJA no Brasil. A questão é complexa: não é tão simples assim pensar a Educação ao Longo da Vida na perspectiva da Educação Popular como se isso fosse suficiente para mudar os rumos consolidados daquele conceito nas políticas públicas neoliberais. Como pode existir um vínculo entre a Educação Popular que tem suas origens nos movimentos sociais e a Educação ao Longo da Vida, fortemente marcada pelo ensino Tópico 7 formal, oficial, e associada aos sistemas de ensino? A Educação ao Longo da Vida, entendida sob o ponto de vista da Educação Popular, valoriza exatamente o tema da “vida” como pilar da educação. Portanto, entende a educação não como um processo formal, burocrático, cartorial, mas ligado essencialmente à vida cotidiana, ao trabalho, à cultura, valorizando processos formais e não formais. Trata-se de uma educação como um processo ligado à vida, ao bem viver das pessoas, à cidadania. Não é um processo ligado apenas às Secretarias de Educação, ao MEC, mas aos movimentos sociais, populares, sindicais, às ONGs etc, reafirmando a educação, a aprendizagem como uma necessidade vital para todos e todas, um processo que dura a vida inteira. Está claro que a Educação ao Longo da Vida, mesmo estando vinculada ao sistema educacional, pode se referendar também na Educação Popular. Ela poderia beneficiar-se da enorme riqueza produzida por esse movimento durante décadas. Por isso, a pergunta persiste: como a Educação ao Longo da Vida pode ser uma educação contra-hegemônica como a Educação Popular, ficando no campo da educação oficial, formal? A correlação de forças está em franca desvantagem para a Educação Popular. Diante de tudo isso, os educadores populares têm razões de sobra para se preocuparem: será que ao debatermos uma Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida não estamos abandonando a luta por uma Política Nacional de Educação Popular? Em que esse novo debate pode ajudar ou prejudicar a nossa causa? Não podemos agora arriar as nossas bandeiras da Educação Popular e da Educação de Jovens e Adultos e nos aventurar a hastear a bandeira da Educação/Aprendizagem ao Longo da Vida ingenuamente. A “armadilha” apontada por Ivan Illich, há mais de quarenta anos, continua montada até hoje à espera de incautos. A Educação Popular valoriza a diversidade e defende a cultura popular, o saber popular. Para que a Educação ao Longo da Vida seja assumida na perspectiva da Educação Popular será necessário que se quebre a hierarquia entre saberes tradicionais (quilombolas, indígenas etc) e o saber acadêmico, superando a visão neoliberal e colonizadora da educação. Só uma Educação/Aprendizagem ao Longo da Vida entendida a partir da cidadania pode incorporar as teses da Educação Popular referentes aos princípios da diversidade, da inclusão, do desenvolvimento local e da economia solidária. Mas se isso acontecer, será ainda necessário falar de Educação ao Longo da Vida? Não seria melhor falar simplesmente de Educação Popular? Por que, então, falar de uma Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida se bastaria uma Política Nacional de Educação Popular? 5. A pergunta que podemos nos fazer agora que a agenda da Educação ao Longo da Vida foi assumida pelo MEC é a seguinte: vale a pena disputar uma concepção popular de Educação ao Longo da Vida? Já perdemos essa disputa em 2009 quando o Brasil indicou a Educação Popular como base de uma Educação ao Longo da Vida e a posição brasileira não foi levada em conta. Vamos tentar de novo? Vale a pena agora na CONFINTEA BRASIL + 6? A resposta é simples: não vamos saber se não tentarmos. Agora estamos em melhores condições do que em 2009 já que a SECADI (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão) tem aberto canais de diálogo com a Educação Popular. A partir do lançamento do Marco de Referência da Educação Popular para Políticas Públicas (BRASIL/SGPR, 2014), todo um debate vem ocorrendo em torno dos riscos e das possibilidades da Educação Popular como política pública (PONTUAL, 2011). Alguns são francamente contra “institucionalizar” a Educação Popular. Essa não era, porém, a visão de Paulo Freire que buscou instituir a Educação Popular como política pública em 1964, com o Programa Nacional de Alfabetização e, anos mais tarde, quando foi Secretário Municipal de Educação em São Paulo (1989-1991) defendendo a “Educação Pública Popular” e criando o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA-SP), em parceria com os movimentos sociais e populares. É sabido que ao instituir a Educação Popular como política pública pode tanto ocorrer um possível “desvirtuamento” quanto potencializar sua capacidade emancipatória. Podemos tanto olhar para os riscos como para as potencialidades. Ambos estão presentes. Ao inserir a Educação Popular nos espaços formais da educação podemos ampliar a possibilidade de formação de educadores populares, como aconteceu com a educação do campo, a educação em saúde, a educação indígena, a educação quilombola etc. Além da Educação Popular que se realiza em espaços informais com grupos populares, contrapondo-se ao projeto educacional dominante, é também importante ampliar a presença da Educação Popular nos espaços formais das políticas públicas: “isto é parte do projeto histórico de, um dia, toda a educação realizar-se, em uma sociedade plenamente democrática, como Educação Popular” (BRANDÃO, 2006: 54). Os movimentos de Educação Popular não se recusaram a disputar sua concepção de educação no interior do estado e não estão agora se recusando a disputar sua concepção diante de uma possível Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida. Se ficassem de fora desse debate, certamente perderiam espaço e aliados importantes. Estar dentro desse debate pode ajudar a impulsionar a Política Nacional de Educação Popular e uma concepção de EJA na perspectiva da Educação Popular. É estratégico ocupar o espaço, brigar por ele, quando o Estado discute educação. Devemos levar para dentro do Estado a bandeira da Educação Popular. Tópico 8 Embora o pensamento da OCDE e do Banco Mundial seja hegemônico hoje nas políticas de Educação ao Longo da Vida, não significa que não haja espaço para a disputa de uma outra concepção da educação. Devemos nos concentrar na retomada da Educação Popular como política pública, portanto, na construção de uma Política Nacional de Educação Popular com vistas a um futuro Plano Nacional de Educação Popular. Um grande passo foi dado com o Marco de Referência da Educação Popular para Políticas Públicas. Precisamos ir além. Entretanto, para não entrar nesse debate de forma subordinada, precisamos defender a Educação ao Longo da Vida na perspectiva da Educação Popular e não na perspectiva do Banco Mundial, da OCDE e da União Europeia, que subordinam a educação à logica do mercado e desprezam a cidadania. A Educação/Aprendizagem ao longo da vida vista pelo olhar dos princípios da Educação Popular adquire um significado bem diferente do que tem sido definido pelos documentos oficiais dos organismos internacionais. Ao apresentar uma visão de Educação ao Longo da Vida pela ótica da Educação Popular estamos disputando, legitimamente, um conceito de Educação do Longo da Vida, apostando numa educação transformadora, entendendo a educação como um processo de conscientização e de transformação social, num movimento permanente de superação da desumanização. 6. Parece que estamos diante de um grande desafio que se apresenta também como um grande dilema. Disputar uma concepção popular de Educação ao Longo da Vida não está isento de riscos. Onde se situa o problema? Na inversão de prioridades. Em vez de dar continuidade aos esforços e avançar na implementação das políticas públicas de Educação Popular estamos introduzindo outra pauta, pior ainda,estamos invertendo prioridades. A partir de 2003 até setembro de 2014, caminhou-se na direção de políticas públicas com base na visão da Educação Popular. Chegou-se até à proposta, em 2014, de uma Política Nacional de Educação Popular, interrompida por uma disputada eleição presidencial. Acreditava-se que essa discussão pudesse ser retomada no início do segundo mandato de Dilma Rousseff, sob a égide da “Pátria Educadora”, mas não foi o que aconteceu. Em vez disso, depois da troca da vários Ministros da Educação, o que vimos foi a volta ao passado da Educação Permanente ou da Educação ao Longo da Vida. A pauta agora é a Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida. Depois de duas Conferências Nacionais de Educação, centradas na construção de um Sistema Nacional de Educação, é preciso dar prosseguimento ao esforço de consolidar um regime de colaboração entre os entes federados e monitorar as metas do Plano Nacional de Educação. Agora, a urgente prioridade em relação à Educação de Jovens e Adultos será substituída pela prioridade à Educação ao Longo da Vida? Já estamos vendo como o tema da EJA vem sendo tratado pelas políticas de Educação ao Longo da Vida. A EJA já vem sendo subsumida pela Educação ao Longo da Vida. Argumenta-se que a EJA, no Brasil, seria ineficiente porque seria uma política “compensatória”, uma política desatualizada face aos compromissos assumidos pelo Brasil com a CONFINTEA VI e face às exigências da “sociedade do conhecimento”. Então, seria preciso ressignificar o conceito de Educação de Jovens e Adultos (EJA) a partir da visão da Educação ao Longo da Vida. Até mesmo os Fóruns de EJA e os ENEJAS (Encontros Nacionais de EJA) foram seduzidos por essa proposta, mesmo sendo eles um espaço plural e contraditório (D'ÁVILA, 2012). Como observa Jaqueline Ventura (2013:35) “a associação, no Brasil, entre educação de jovens e adultos (EJA) e educação ao longo da vida tornou-se comum na última década... A atual ênfase na 'educação continuada ao longo da vida', que tem como pressuposto a 'sociedade do conhecimento', permeia tanto os documentos das agências internacionais, advindos principalmente das parcerias com a UNESCO, como aparece, de forma recorrente, na literatura especializada e em documentos governamentais”. Uma Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida já está em curso na EJA com a justificativa de que precisamos de um “novo paradigma”. A Educação Popular tem sido um paradigma orientador de muitas experiências de Educação de Jovens e Adultos. Estaríamos abandonando esse paradigma para que a EJA assuma definitivamente o paradigma da Educação ao Longo da Vida? Esse debate pode nos ajudar, como sustenta Paulo Gabriel Nacif, secretário da SECADI, a potencializar as ações da EJA e avançar na construção de uma nova política para essa modalidade de educação. Entretanto, uma Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida que orientasse a Educação de Jovens e Adultos na visão que os organismos internacionais estão imprimindo a essa política, estará na contramão dos movimentos de Educação Popular e de EJA. Nesse sentido, mais do que uma “porta de entrada” para a Educação Popular, essa política significaria uma “porta de saída” da Educação Popular da EJA, rompendo com uma tradição que tem mais de 50 anos de existência. Esperamos que, depois de Paulo Freire ser nomeado patrono da educação brasileira (2012), de comemorarmos 50 anos de Angicos (2013) e de celebrarmos os 50 anos do Programa Nacional de Alfabetização (2014), isso não aconteça. Antes de mais nada, temos que dar conta dos nossos grandes desafios da EJA, fazer a nossa lição de casa. Inverter as prioridades só vai atrasar nossa agenda. Apesar de alguns avanços na institucionalidade da EJA, os resultados estão aquém do esperado. Já foi um grande equívoco criar esse Tópico 9 conceito de “idade certa” gerando preconceito contra os que não conseguiram se alfabetizar na chamada “idade certa”. Cria-se o mito de que existe uma idade certa para aprender. Além disso, assistimos ao equívoco da reformatação do Programa Brasil Alfabetizado, em 2007, afastando a sociedade civil historicamente comprometida com a EJA (igrejas, MST, CUT, movimentos populares). A EJA, assim, foi retirada da agenda do movimento social e sindical. Não é por nada que, segundo dados do PNAD 2009, entre 2007 e 2008 houve um aumento do número absoluto de analfabetos no Brasil de mais de 250 mil, contrariando tendência histórica de redução do analfabetismo. Sem dúvida, são numerosos os programas estaduais e municipais e alguns deles são muito bons (ALVES & GADOTTI, orgs, 2014), mas são ainda muito fragmentados e marcados pela descontinuidade. A situação da Educação de Jovens e Adultos (EJA) é de crescente abandono e precarização: entre 2007 e 2011, houve redução de quase 20 mil turmas de EJA (eram 166 mil e passaram a 147 mil) com perda de 1 milhão de matrículas (eram 4,97 milhões e tornaram-se 3,98 milhões). Só no Estado de São Paulo, a redução do número de matrículas, no mesmo período, foi superior a 45%, passando de 832 mil em 2007 para 511 mil em 2011. Os estudantes da EJA estão desmotivados não só pelo fechamento de turmas, mas pela falta de pessoal preparado e porque a prioridade sempre foi as ditas modalidades “regulares”. O analfabetismo continua fora da agenda política. Parece que cansamos de alfabetizar adultos. É a política da desistência. Não respeitando a biografia dos analfabetos adultos, tentamos “letrá-los” e não conseguimos. Então, coloca-se a culpa nos próprios analfabetos. Eles são inalfabetizáveis! Não podemos considerar os adultos e os idosos como seres inalfabetizáveis. Não acredito na política da inalfabetizabilidade. Por causa desta política, 13 milhões de brasileiros vão morrer sem nunca ter lido um livro. Mas não serão só eles a terem perdido a leitura dos livros. O Brasil perderá também 13 milhões de histórias que não encontraram papel, lápis e caneta para serem registradas. Isso empobrece um país. É a renúncia a um Brasil alfabetizado. O Ministro da Educação Aluízio Mercadante tem dito que um dos principais desafios da educação brasileira é a Educação de Jovens e Adultos. Por isso, esperamos que a EJA seja uma de suas prioridades. E aqui surge mais uma pergunta: devemos, então, concentrar nossos esforços na Educação de Jovens e Adultos, buscando eliminar o analfabetismo, ou colocar nossas energias na criação de uma nova Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida? Essa é a pergunta que os educadores populares se fazem hoje. Se for para perder terreno já conquistado no campo da Educação Popular e na Educação de Jovens e Adultos, é preferível ignorar o debate da Política Brasileira de Educação ao Longo da Vida. Nosso grande desafio já foi apontado nos resultados do PNAD-2013: temos 13 milhões de brasileiros e brasileiras com mais de 15 anos “sem instrução” (analfabetos) e, com mais de 18 anos, temos 58 milhões que não completaram o ensino fundamental e 81 milhões que não completaram o ensino médio. Esse é o balanço a ser feito agora na CONFINTEA BRASIL + 6. E esse desafio não será enfrentado simplesmente por meio de uma adaptação da nossa política pública de EJA à ideologia da Educação ao Longo da Vida. Caminhamos muito na construção de uma Política Nacional de Educação Popular, para retroceder agora. O Brasil não pode perder a hegemonia do projeto educacional frente aos organismos internacionais. Frente a eles o Brasil deve posicionar-se criticamente e não de forma subordinada. A concepção de Educação ao Longo da Vida do Banco Mundial e da União Europeia aponta para uma direção oposta a um munto justo e sustentável. A aposta desses organismos é a uniformização e não a conectividade na diferença, o individualismo e não a solidariedade. Por isso, essa visão da Educação ao Longo da Vida não pode ser considerada como um princípio da educação do futuromas um princípio da educação do passado. Nesses termos, dificilmente podemos vislumbrar uma Educação/Aprendizagem ao longo da vida desde a perspectiva da Educação Popular. Nossa esperança, de todos os que estamos nos perguntando sobre "o que está acontecendo", é que, juntos(as), movimentos de Educação Popular e da EJA, possamos contribuir para reverter essa tendência, inserindo-nos criticamente nesse debate, sustentando nossas propostas de uma educação emancipadora em benefício dos que mais necessitam dela e ainda a ela não tiveram acesso. Referências ALVES, Francisca Elenir e Moacir Gadotti, orgs, 2014. TOPA, Todos Pela Alfabetização: Bahia 2007-2014. São Paulo: Instituto Paulo Freire. ARENDT, Hannah, 1972. La crise de l'éducation: extrait de la crise de la culture. Paris: Galimard. BACHELARD, Gaston, 1970. La formation de l'esprit scientifique. Paris: Vrin. BARROS, Rosanna, 2011. Da Educação Permanente à Aprendizagem ao longo da Vida. Genealogia dos conceitos em Educação de Adultos: um estudo sobre os fundamentos político-pedagógicos da prática educacional. Lisboa: Chiado Editora. BERGER, Gaston, 1962. L'homme moderne et son éducation. Paris: PUF. 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UNESCO - CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO DE ADULTOS - CONFINTEA Contextualização dos CONFINTEA’s anteriores à CONFINTEA VI por Timothy Ireland, assessor da UNESCO-Brasil, em reunião da CNAEJA/MEC, 25 e 26/02/08, Salvado-BA (do Relatório de Jerry Adriani da Silva – representante dos Fóruns EJA do Brasil) CONFINTEA ANO LOCAL CONTEXTO TEMA PARTICIPAÇÃO I 1949 Elsinore, Dinamarca logo depois da segunda guerra e da criação da UNESCO – reconciliação e paz. Educação de Adultos e entendimento internacional e cooperação necessária para desenvolver EDA. menos de 30 estados membros + ONGs. Aproximadamente 100 participantes. II 1960 Montreal, Canadá rápido crescimento econômico. Papel do estado na EDA; EDA como uma oportunidade remedial, como parte do sistema educacional. em torno de 50 estados membros + ONGs. Aproximadamente 200 participantes III 1972 Tóquio, Japão rápido crescimento econômico, pós- independência para muitos países, especialmente da África. EDA e alfabetização; EDA, mídia, cultura; Aprendizagem ao Longo da Vida (Relatório Faure: aprender a ser) 80 estados membros e ONGs.400 participantes (Influência de Paulo Freire/ Roby Kidd funda o ICAE (Conselho Internacional de educação de Adultos)/ Presença de Cuba/ considerada uma conferência progressista. IV 1985 Paris, França crise econômica, contenção nos orçamentos públicos. EDA e Aprendizagem ao Longo da Vida, Declaração sobre o direito a aprender, Papel de estados e ONGs, O direito do adulto aprender, Novas tecnologias da informação. mais que 100 estados membros + ONGs. Aproximadamente 800 participantes (ICAE cria um ‘caucus’ de ONGs paralelo à CONFINTEA e recebe apoio dos governos da China, Canadá, países Nórdicos, Índia, Liga Árabe para a adoção da Declaração/aliança entre ONGs e governos progressistas). V 1997 Hamburgo, Alemanha Conferências Internacionais da década de 90. Aprendizagem de Adultos como direito, ferramenta, prazer e responsabilidade compartilhada; Aprendizagem de adultos e participação ativa em todas as dimensões do desenvolvimento sustentável com eqüidade; Papel da Alfabetização: equidade e reconhecimento das diferenças. mais de 150 estados membros + 500 ONGs. Em torno de 1.300 participantes (Papel da UIL, Liderança do ICAE, as ONGs participam plenamente, sem direito a voto, aliança com governos ‘progressistas’, contribuição do movimento de mulheres, mobilização que atravessa fronteiras temáticas e de ação). + 6 2003 Bancoc, Tailândia as conferências pós 5 e pós 10 anos, Fórum Social Mundial em 2002 e 2003. chamada de responsabilização para os estados membros implementarem a Agenda de Hamburgo + chamada para CONFINTEA VI em 2009. ONGs. Estados membros não enviaram delegações de alto perfil. ONGs chegam organizadas na Conferência (ex. Relatório do ICAE). VI 2009 Brasil pós Conferências e décadas e MDGs (Metas da década do milênio) Fóruns Mundiais Sociais (2003 – 2007), Assembléia Mundial do ICAE em 2007. elos perdidos das MDGs – ferramenta imprescindível para o desenvolvimento. Monitoramento necessário para garantir ação e implementação. Estados membros e ONGs. Portal dos Fóruns de Educação de Jovens e Adultos do Brasil – www.forumeja.org.br ANEXO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS /8ºBLOCO/CARGA HORÁRIA: 60 PROFESSOR Me. JOSÉ ADERSINO ALVES DE MOURA QUESTÕES ORIENTADORAS SOBRE O ESTUDO DOS TEXTOS GRUPO: Responder um mínimo de 26/37 QUESTÕES __________________________TEXTO I HADDAD, S.; DI PIERRO, M. C. Escolarização de jovens e adultos.São Paulo: Revista Brasileira de Educação, n.14, p.108-130, 2000b.Disponível em http://www.scielo.br; 1. Conceitue Educação de Jovens e Adultos com base em Di Pierro e Haddad (2000). 2. Pesquise e avalie também a compressão conceitual de EJA a partir da LDB de 1996 e da 5ª CONFINTEA, bem como suas funções de acordo com o Parecer 11/00(Parecer CURY); 3. Faça uma análise da situação da EJA no Brasil colonial e imperial, durante a Primeira república e na Era Vargas. 4. Quais circunstancias justificam o fato de que apenas na década de 40 a educação de adultos tenha se tornado um problema para a política nacional? 5. Porque o período situado entre 1559 a 1964 é considerado um período de luzes para a EJA de acordo com Di Pierro e Haddad (2000)? Argumente. 6. Quais propostas ideológicas surgidas nesse período, acabaram por ser pano de fundo de uma nova forma de pensar a EJA? Qual seria essa nova forma? Analise. 7. Identifique os movimentos surgidos em prol da EJA na década de 1960, destacando sua importância. 8. Avalie a ruptura causada pelo golpe militar de 1964, em relação aos movimentos de educação de e cultura populares. 9. Explique as circunstancias de criação do MOBRAL e suas características básicas de implantação, bem como sobre o objetivo da convergência dessas características. 10. Fale sobre a natureza do ensino supletivo introduzido pela Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971. 11. Qual o sentido político da educação de adultos no período militar? Argumente. 12. Qual o tratamento dado à EJA pós-1985, por ocasião da redemocratização da sociedade brasileira. Explique. 13. O que marcou a década de 1990, em relação à EJA? Quais programas federais são consolidados no período? 14. Fale sobre os desafios presentes e futuros em relacionados à educação de Jovens e Adultos. __________________________TEXTO II FÁVERO, O.; FREITAS, M. Educação de Adultos e Jovens e Adultos: um olhar sobre o passado e o presente. Inter-Ação, Goiânia, v. 36, n. 2, p. 365-392, jul./dez. 2011. Disponível em http://www.revistas.ufg.br/index.php/interacao/article/viewFile/16712/10703; 15. Em relação ao passado histórico, cite e explique os passos seguidos pelo Fávero(2011) para contextualizar a educação de Adultos (EDA) / Educação de Jovens e Adultos(EJA) http://www.scielo.br/ através dos tempos. 16. Você concorda com Fávero (2011), quando afirma que “a educação, especialmente nos últimos 150 anos, serviu- no seu todo ao propósito de não só fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à máquina produtiva em expansão do sistema do capital, como também gerar e transmitir um quadro de valores que legitima os interesses dominantes”? Justifique. 17. Analise a visão de Paschoal Lemme, em relação à educação de adultos, na obra “Educação Supletiva, educação de adultos”. 18. Em “O Problema da Educação de Adultos”, qual a concepção de educação de adultos de Lourenço Filho? Quais funções para a educação de adultos esse autor aponta? 19. Ema relaçõa á educação de adultos, qual a importância dos Movimentos de Cultura Popular do Início da Década de 1960? O que pode ser destacado a partir desses movimentos? 20. Analise os impactos dos conceitos de educação permanente e educação continuada, surgidos no final dos anos de 1960, década de 1970 e início dos 80, sobre a EJA no Brasil. 21. Quais perspectivas foram introduzidas no pó-constituição de 1988 em relação à EJA? O direcionamento do contexto social estabelecido no período da década de 1990 foi concretizado? 22. Avalie os anos de 2000 em relação à EJA e a situação atual, destacando suas novas funções. __________________________TEXTO III DI PIERRO, M. C. Luta social e reconlhecimento jurídico do Direito Humano dos jovens e aduitos à educação: Educação Manta Maria, v.33, n.3, p.395-410, set./dez. 2008 .Disponível em http://www.ufsm.br/revistaeeducação; (painel integrado, produção de texto, fichamento) 23. Porque Di Pierro (2010) enfatiza, com base nos pressupostos da CONFINTEA V de que: “mais que um direito a EJA é chave para o século XXI. Argumente. 24. Reconstrua e analise os três momentos da luta social pelo direito dos adultos á educação no Brasil. 25. Fale sobre o direito humano dos jovens e adultos à educação na legislação nacional; 26. Qual inovação pode ser atribuida à LDB de 1996 em relação à EJA? Em sua opinião essa inovação é positiva ou negativa?:Argumente. 27. Discorra sobre compromissos internacionais que garantem o direito humano dos jovens e adultos á educação; 28. Dentre os desafios da gestão de políticas e programas de educação de joves e adultos, quais aqueles que se sobressaem, segunodo Di Pierro (2010)? Analise. 29. Quais os eixos de reivindicação e mobilização apontados pela autora como possibilidade de atualização da agenda de lutas pelo direito humano na juventude e na vida adulta ? Analise. TEXTO IV/ ANEXO GADOTTI, Moacir. Educação popular e educação ao longo da vida. 2016. Disponível em:<http://www.paulofreire.org/images/pdfs/Educacao_Popular_e_ELV_Gadotti. Pdf>. 30. A partir de Gadotti (2016), analise a ideia de educação ao longo da vida, observando as visões de Platão, Aristóteles e Paulo Freire. 31. Por que o autor afirma que a visão instrumental de educação ao longo da vida manteve- se na Declaração de Hamburgo (CONFITEA V,1997), apesar dos avanços nocampo do conceito da educação de adultos e da ampliação do conceito de alfabetização? 32. Porque a educação ao longo da vida não pode ser confundida com educação de adultos? 33. Considerando os Relatórios de Edgar Faure (“Aprender a ser”) e o de Jacques Delors (Educação, um tesouro a descobrir,) podemos afirmar que existe alguma diferença entre os termos “educação ao longo da vida” e “educação permanente”? Argumente. 34. Dois “modelos” teóricos práticos de aprendizagem ao longo da vida foram apresentados por kapil Dev Regmi em 2015: o modelo do capital humano e o modelo humanitário. Analise o contexto desses dois modelos, a partir dos interesses de seus defensores e o lugar da EJA nesses processos. 35. A adoção da educação ao longo da vida em nosso processo educacional (ver Lei 13.632/18), coloca em risco o projeto de educação popular a muito defendido por educadores brasileiros. Será uma inversão de prioridades? Argumente. Posicione-se. 36. Faça uma análise de um futuro possível para EJA, ante a adoção, em nosso Sistema Educacional, do princípio da educação ao longo da vida ou do projeto de educação popular de matriz freiriana. Argumente. 37. Contextualize as CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS DE EDUCAÇÃO DE ADULTOS (ver ANEXO). f2360708248385ffb46c6fa17e1b1cfa0a42e20414055255460f1bd8b4b9987a.pdf 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf f2360708248385ffb46c6fa17e1b1cfa0a42e20414055255460f1bd8b4b9987a.pdf f2360708248385ffb46c6fa17e1b1cfa0a42e20414055255460f1bd8b4b9987a.pdf 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS /8ºBLOCO/CARGA HORÁRIA: 60 h/ a PROFESSOR Me. JOSÉ ADERSINO ALVES DE MOURA 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf 82cff0f120d1c4827921b2e5a79280adeaf12a15ce8b3851b211127ef288730b.pdf 82cff0f120d1c4827921b2e5a79280adeaf12a15ce8b3851b211127ef288730b.pdf 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf 248f0c4c47af55a5213bbb70ec040a0541f3d36fd5a923f422aa96471bd963dc.pdf