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APRENDIZAGEM E COMPORTAMENTO 1 Sumário CONCEPÇÕES DE APRENDIZAGEM .................................................... 3 PRESTAR ATENÇÃO NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO ............. 18 INSTITUIÇÕES ESCOLARES, PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO E ATUAÇÃO PSICOPEDAGÓGICAS ... 31 PSICOPEDAGOGIA ESCOLAR......................................................... 34 PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM ................................................. 35 CARACTERÍSTICAS SOCIAIS E DE COMPORTAMENTO .............. 41 PROBLEMAS DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE........................... 41 ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO E ATUAÇÃO PSICOPEDAGÓGICAS ................................................................................ 42 A PSICOPEDAGOGIA CLÍNICA ........................................................ 43 PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL .............................................. 45 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 46 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 CONCEPÇÕES DE APRENDIZAGEM O conceito de aprendizagem emergiu das investigações empiristas em Psicologia, ou seja, de investigações levadas a termo com base no pressuposto de que todo conhecimento provém da experiência. Isso significa afirmar primado absoluto do objeto e considerar o sujeito como uma tabula rasa, uma cera mole, cujas impressões do mundo, fornecidas pelos órgãos dos sentidos, são associadas umas às outras, dando lugar ao conhecimento. O conhecimento é, portanto, uma cadeia de ideias atomisticamente formada a partir do registro dos fatos e se reduz a uma simples cópia do real. Em virtude de sua epistemológica, tais investigações formam corpo do que se chama associacionismo, cuja expressão mais imponente é o behaviorismo, tanto em sua versão mais clássica, quanto em sua versão contemporânea. A meta do behaviorismo sempre foi a construção de uma psicologia “científica”, livre da introspecção e fundada numa metodologia “materialista” que lhe garantisse a objetividade das ciências da natureza. A objetividade perseguida pelo behaviorismo é a mesma do positivismo em geral e, por isso, termos como consciência, inconsciente e similares banidos da linguagem psicológica. A Psicologia vem definida como a “ciência do comportamento” (observável) e o comportamento é entendido como produto das pressões do ambiente, significando o conjunto de reações a estímulos, reações essas que podem ser medidas, previstas e controladas. Nessa via de interpretação, ganha sentido a definição de aprendizagem como “mudança de comportamento resultante do treino ou da experiência”. Aqui, tem-se uma definição em que a dissolução do sujeito do conhecimento é evidente. Ele é realmente aquela cera mole de que se falou anteriormente e, por isso, a aprendizagem é identificada com o condicionamento. 4 Entende-se, assim, porque o behaviorismo, corrente cujas primeiras sistematizações foram realizadas por Watson, nasce apoiado nos trabalhos de Pavlov acerca do condicionamento respondente. O condicionamento de tipo pavloviano, também conhecido como condicionamento clássico ou respondente, consistindo no esquema ER, foi, em seus primórdios, considerado como o elemento básico de aprendizagem, ponto de partida para a formação de todos os hábitos. Era tempo de euforia geral entre os positivistas, pois as pesquisas de Pavlov ofereciam a possibilidade de se atribuir, às atividades complexas, o sentido de uma composição de simples elos soldados. O condicionamento clássico diz respeito à relação entre um estímulo antecedente e uma resposta que lhe é, naturalmente, consequente. Inicia-se com a observação de respostas incondicionadas a estímulos incondicionados, mas o interesse central se firma na obtenção de uma determinada resposta, provocada por um estímulo previamente neutro, quando este é associado a um estimulo incondicionado. Com o passar do tempo, o condicionamento respondente revelou-se insuficiente para a explicação de aprendizagem complexas, e sua validação restringiu-se à explicação dos comportamentos involuntários e das reações emocionais. Foi, então, superado pelo condicionamento operante (skinneriano), o qual desloca a ênfase do estímulo antecedente para o estímulo consequente (reforço), como recurso para garantir a manutenção ou extinção de certo(s) comportamento(s). O condicionamento operante ocupa-se, pois, das relações entre comportamento a ser aprendido e as suas consequências. Os adeptos da teoria do reforço consideraram-no capaz de explicar a aquisição dos comportamentos voluntários de todos os tipos. O esquema continua muito simples: o organismo emite uma resposta a um estímulo cujo conhecimento não é necessário, e essa resposta, dependendo das consequências geradas por ela, será ou não mantida. Logo, são os estímulos que se seguem à resposta (reforços) que representam o núcleo da teoria, e não os que a antecedem. 5 As pesquisas sobre condicionamento iniciaram-se sempre com experimentos com animais e se aplicaram posteriormente, a sujeitos humanos. Dado o seu grande poder de controle do comportamento, essas pesquisas foram se sofisticando cada vez mais. Têm sido incessantes os esforços para provar que o comportamento é modelado, razão porque devem as investigações fornecer o maior número possível de dados sobre estímulos reforçadores, estímulos aversivos, tipos de reforços, esquemas de reforço, contra-condicionamento, etc. Acredita-se que o aprofundamento dessa linha de análise findará por oferecer um modelo de aprendizagem que resolverá todos os problemas. É notório o fato de que, embora com recursos mais aprimorados e com a possibilidade de lidar com certas aquisições complexas, o condicionamento instrumental não implica nenhuma mudança de pressuposto epistemológico com referência ao condicionamento respondente. O conceito positivista de aprendizagem que acabamos de expor é inteiramente refutado pela gestalt, uma corrente psicológica que nasce na Alemanha, no princípio do século (com Wertheier, Kohler e Koffka) e que encontra terreno fértil nos Estados Unidos, onde passaram a trabalhar três dos seus maiores expoentes: Koffka, Kohler e Lewin. A gestalt opõe-se ao behaviorismo por ter um fundamento epistemológico de tipo racionalista, ou, mais precisamente, por pressupor que todo conhecimento é anterior à experiência, sendo fruto do exercício de estruturas racionais, pré-formadas no sujeito. Se a unilateralidade do positivismo consiste em desprezar a ação sujeito sobre o objeto, a do racionalismo consiste em desprezar a ação do objeto sobre o sujeito.Ambas as posições, portanto, cindem os dois polos do conhecimento de modo irremediável. Qualificar a gestalt como uma teoria racionalista não significa, entretanto, afirmar que ela negue a objetividade do mundo. Significa, isto sim, que ela não postula essa objetividade no sentido de uma interferência na construção das estruturas mentais através das quais o sujeito apreende real. 6 Admite-se que experiência passada possa influir na percepção e no comportamento, mas não a afirma como uma condição necessária para tal. E, por isso, é às variáveis biológicas e à situação imediata que se deve recorrer para explicar a conduta. As variáveis históricas, por não serem determinantes, apresentam pouco interesse para os gestaltistas. Note-se que não falamos em aprendizagem e, sim em percepção. Na verdade, contrariando o pressuposto epistemológico do behaviorismo, a gestalt rejeita a tese de que o conhecimento seja fruto da aprendizagem. De acordo com seus adeptos, os sujeitos reagem não a estímulos específicos, mas a configurações perceptuais. As gestaltens (configurações) são as legítimas unidades mentais, e é para elas que a Psicologia deve voltar-se. Vê-se, pois, que a gestalt lida com o conceito de estruturas mentais, enquanto totalidades, numa extrema oposição ao atomismo behaviorista. É conveniente esclarecer que tais totalidades são organizadas em função de princípios de organização inerentes à razão humana. Logo a estrutura da gestalt é uma estrutura sem gênese, não comportando, pois, uma formação. Vale ainda a pena dizer que o conceito de totalidade com o qual a Gestalt trabalha é irredutível à soma ou ao produto das partes. Por isso, o todo é apreendido de forma súbida, imediata, por reestruturação do campo perceptual (insight). Se a aprendizagem não contribui para a estruturação do conhecimento, justifica-se o pouco interesse que os gestaltistas apresentam pela questão. Aliás, nos estudos de aprendizagem realizados pela gestalt, a aprendizagem se confunde com solução se problema, que, por sinal, não decorre de aprendizagem, e, sim, de insight. Diante disso, torna-se fundamental conhecer os princípios que o regem: relação figura-fundo, fechamento (lei de pregnância), similaridade, proximidade, direção, etc., que são, em síntese, os princípios universais da boa forma. A leitura, mesmo rápida, do que foi exposto, associada ao conhecimento que nós, professores, temos das práticas pedagógicas dominantes, permite- nos ver que, em geral, as referidas práticas se debatem entre as duas 7 concepções de aprendizagem apresentadas, sendo, muitas vezes, difícil identificar se o ensino está fundado numa teoria ou noutra. A ração dissonos parece óbvia: ambas as abordagens conduzem ao mesmo resultado e as práticas pedagógicas equivalentes. Vejamos por quê. O tratamento dado à aprendizagem pelas duas correntes em foco é, antes de tudo, reducionista. O behaviorismo, como toda teoria positivista, reduz o sujeito ao objeto. A gestalt, como uma teoria racionalista, faz o contrário. O behaviorismo, por ter condenado a introspecção e se voltado para o observável, o materializado, gerou a crença de que se tratava de uma teoria materialista, que superava a metafísica da psicologia precedente. Na Rússia, após a Revolução de 1917, tal perspectiva foi abraçada com entusiasmo. Entretanto, não tardou que se descobrisse o seu caráter idealista. Dicotomizando o homem no que é e no que não é observável, e escolhendo ocupar-se do que é observável, o behaviorismo expõe-se à constatação de sua fragilidade, pelo menos por três razões: • Por separar o que é inseparável, fragmentando a unidade indissolúvel do sujeito e do objeto; • Porque, procedendo a tal cisão e ocupando-se apenas da ação do objeto, deixa o sujeito à mercê das especulações metafísicas; e • Porque seu materialismo é uma forma de mecanismo, um falso materialismo, uma vez que ignora as condições históricas dos sujeitos psicológicos, tendo descartado a consciência, a subjetividade, ao invés de provar seu caráter de síntese das relações sociais. Não é necessário dizer mais nada para concluirmos que o behaviorismo acentua o primado do objeto, mas ignora a objetividade, destruindo-se, portanto, pela sua própria prática. Essas considerações esclarecem, consequentemente, o fracasso das ações pedagógicas assentadas na concepção positivista de aprendizagem, as quais silenciam os alunos, isolam-nos e os submetem à autoridade do saber dos professores, dos conferencistas, dos textos, dos livros, das instruções 8 programadas, das normas ditatoriais da instituição, e tudo isso para chegar a um único resultado: ao falso conhecimento e à subordinação. Dissemos que a gestalt não levaria a práticas e efeitos diversos. É possível que duas teorias com bases epistemológicas antagônicas possam ser equivalentes? As evidências falam por nós. A gestalt, ao preconizar as estruturas mentais como totalidades organizadas segundo princípios inerentes à razão humana, toma partido pela “pré-formação”. Se as estruturas são, de fato, pré-formadas e não fruto da ação do sujeito sobre o mundo objetivo e do mundo objetivo sobre o sujeito, não há por que apelar para a atividade desse sujeito. Fica patente que, assim como o behaviorismo é um objetivismo sem objetividade, a gestalt é um subjetivismo sem subjetividade, o que dá no mesmo. Em virtude dessa autonegação, as práticas pedagógicas que apostam numa “intuição racional” de tipo gestaltista apoiam-se, também, em técnicas que não apelam para a atividade do sujeito, e, portanto, para a sua vida concreta. O saber acumulado é tranquilamente transmitido, respeitando os princípios da boa forma, e os alunos podem incorporá-los, pois a experiência apresentada sob boas formas é isomorfa às estruturas mentais, ou seja: as estruturas mentais têm sempre, na experiência, o seu equivalente. Apesar disso, estruturas mentais e experiências persistem como dois polos distintos. É claro que essa cisão entre subjetividade e objetividade nada mais é que o reflexo da divisão social do trabalho, da separação entre o fazer e o pensar, da prática e da teoria. E, nesses casos, assiste-se a uma supervalorização da teoria, porque, sendo aquela que sabe, tem o direito de comandar a prática. A esta, como ignorante, nada mais resta do que obedecer à teoria. E dada a falsidade da relação de dominação entre teoria X prática, não poderíamos esperar que a escola, instituição legitimadora e produtora desse tipo de dominação, pudesse ter encarado a transmissão do conhecimento de uma forma diversa daquelas que impedem a autonomia intelectual e a produção de um conhecimento verdadeiro e, por isso, libertador. 9 Após termos apresentado as concepções de aprendizagem de teor mecanicista e idealista, cumpre-nos averiguar se se encontram, na Psicologia, formulações que as superem. Nesse sentido, acreditamos que grupo de pesquisas que compõe aquilo a que chamamos psicologia genética tenha muito a contribuir. Desse grupo, salientamos as que mais se voltaram para o problema da aprendizagem segundo uma perspectiva que nos parece extremamente promissora: as inauguradas por Piaget, Vygotsky e Wallon. Aqui nos deteremos mais na posição de Piaget, por ser, entre nós, a mais divulgada (embora não bem conhecida) e, em razão dessa mesma divulgação, a que mais dominamos. Começamos por afirmar que a posição de Piaget com relação à aprendizagem não pode ser entendida senão no contexto de sua produção teórica mais geral. Fazem-se necessárias, então, algumas considerações sobre essa produção. Na qualidade de epistemólogo, Piaget dedicou toda a sua vida à investigação de um problema central: a formação e o desenvolvimento do conhecimento. Afirmar isso, entretanto, é muito pouco. É precisoexplicitar melhor a significação dessa sua preocupação. Inicialmente, merece realce o fato de que, ao pesquisar a formação e o desenvolvimento do conhecimento, Piaget inaugura a Epistemologia Genética, definindo-a como [...] pesquisa essencialmente interdisciplinar que se propõe estudar a significação dos conhecimentos, das estruturas operatórias ou de noções, recorrendo, de uma parte, a sua história e ao seu funcionamento atual em uma ciência determinada (sendo os dados fornecidos por especialistas dessa ciência e sua epistemologia) e, de outra, ao seu aspecto lógico (recorrendo aos lógicos) e enfim à sua forma psicogenética ou às suas relações com as estruturas mentais (esse aspecto dando lugar às pesquisas de psicólogos de profissão, interessados também na Epistemologia). (PIAGET, 1977, p. 77). 10 Por essa definição, vê-se que a perspectiva epistemológica de Piaget é extremamente complexa e original. Ao contrário dos epistemólogos de Piaget é extremamente complexa e original. Ao contrário dos epistemólogos neopositivistas, os mais fiéis ao sentido literal do termo epistemologia (teoria da ciência), Piaget não se interessa apenas pelo conhecimento científico. A razão disso situa-se no fato de que a explicação das formas de conhecimento típicas da ciência só é possível, para Piaget, recorrendo-se à gênese dessas formas e ao estudo dos caminhos percorridos. Isso significa, pois, tratar, também, das formas de conhecimento que são hoje consideradas como características do conhecimento pré-científico, mas que, do ponto de vista cognitivo, não se podem negligenciar, porque foram precursoras dos progressos posteriores. A tese exposta conduz Piaget à pesquisa sobre a psicologia gênese do conhecimento, não só porque a psicogênese completa a sociogênese (o ponto de partida de qualquer ciência foi fruto de um pensamento já formado), como também porque ela pode constituir um mecanismo experimental capaz de caracterizar a Epistemologia Genética como uma disciplina científica. Os trabalhos iniciados por Piaget e os que incorporam as contribuições dos especialistas do Centro de Epistemologia Genética forneceram os elementos necessários à sustentação do que ele qualifica como idéia central de sua teoria: a de que “[...] o conhecimento não procede nem da experiência única dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de construções sucessivas com elaborações constantes de estruturas novas”. (PIAGET, 1976, prefácio). Essa afirmação não deixa dúvidas quanto à recusa de Piaget em relação ao behaviorismo e à gestalt, mas não esclarece, de uma vez por todas, como essas construções sucessivas têm lugar e quais os elementos nelas envolvidos. Para Piaget, elas são resultantes da relação sujeito X objeto, relação essa em que os dois termos não se opõem, mas se solidarizam, formando um todo único. As ações do sujeito sobre o objeto e deste sobre aquele são recíprocas. O ponto de partida não é o sujeito, nem o objeto, e, sim, a periferia 11 de ambos; assim, o desenvolvimento da inteligência vai-se operando da periferia para o centro, na direção dos mecanismos centrais da ação do sujeito (dando lugar ao conhecimento lógico-matemático) e das propriedades intrínsecas do objeto (dando lugar ao conhecimento do mundo). Essa direção no sentido do sujeito e do objeto não deve ser entendida como uma polarização: o conhecimento lógico-matemático e o conhecimento do mundo objetivo se relacionam mutualmente. É fácil verificar, pois, que, para Piaget, o sujeito constitui como o meio uma totalidade, sendo, portanto, passível de desequilíbrio, em função das perturbações desse meio. Isso o obriga a um esforço de adaptação, de readaptação, a fim de que o equilíbrio seja restabelecido. A adaptação, ou o restabelecimento do equilíbrio, comporta dois processos distintos, porém indissociáveis, que são a assimilação e a acomodação. A assimilação cognitiva consiste na incorporação, pelo sujeito, de um elemento do mundo exterior às suas estruturas de conhecimento, aos seus esquemas sensório-motores ou conceituais. Na assimilação, portanto, o sujeito age sobre os objetos que o rodeiam, aplicando esquemas já constituídos ou já solicitados anteriormente. A acomodação, termo complementar da relação sujeito/objeto, representa o momento da ação do objeto sobre o sujeito. A solicitação do meio não é atendida pelos esquemas de assimilação, para que a adaptação possa efetivar-se, impondo-lhe a modificação de seu ciclo assimilador, para que a adaptação posso efetivar-se. Chamamos a atenção para o fato de que a assimilação/acomodação, desde os seus primórdios, apresenta-se como um ponto de partida relativo, como suporte para uma equilibração majorante, isso é, para o restabelecimento do equilíbrio não apenas como uma volta ao equilíbrio anterior, mas como formação de um novo equilíbrio, ou, mais precisamente, de um melhor equilíbrio. Esse equilíbrio de nível superior funciona, então, como um novo ponto de partida, e assim sucessivamente. 12 Para que essa equilibração majorante tenha lugar, Piaget acentua uma função paralela à adaptação: a função da organização. A adaptação não pode ser dissociada da função de organização, pois, à medida que o indivíduo assimila/acomoda, a organização se faz presente, para integrar uma nova estrutura a uma outra estrutura pré-existente, que, mesmo total, passa a funcionar como subestrutura. Constata-se então, que a função de organização garante a totalidade, através da solidariedade dos mecanismos de diferenciação e de integração, preservando a continuidade e a transformação. As considerações feitas tornam patente o relativismo dialético no qual se assenta a Epistemologia Genética. Lefebvre esclarece o sentido do relativismo dialético, quando diz: “O relativismo dialético admite a relatividade de nossos conhecimentos, não no sentido de uma negação da verdade objetiva, mas no sentido de uma perpétua superação dos limites de nosso conhecimento.” (LEVEBVRE, 1979, p. 98). É esse o significado do relativismo dialético que permeia as elaborações de Piaget, tanto no que se refere à sociogênese, quanto no que diz respeito à psicogênese. Apesar disso, entre o desenvolvimento psicogenético e o sociogenético existe uma diferença fundamental: aquele é limitado, enquanto este aparece como uma possibilidade real de superação dos limites individuais. Vale mais uma vez invocar Lefebvre, por expressar essa diferença de maneira lapidar, ao afirmar: O pensamento humano pretende, legitimamente, deter a possibilidade, o poder de atingir a verdade absoluta. O pensamento humano pretende possuir a soberania sobre o mundo e o direito absoluto sobre a verdade ‘infinita’. O pensamento dos indivíduos não pode ter tais pretensões; é sempre finito, limitado, relativo. Mas essa contradição é resolvida pela sucessão das gerações humanas e pela cooperação dos indivíduos nessa obra coletiva que é a ciência. (LEVEBVRE, 1979, p. 100). Essa citação expressa exatamente a tese de Piaget acerca da sociogênese e da psicogênese. 13 No que se refere à psicogênese, Piaget a considera um processo dialético, colocando a atividade como ponto de partida da vida psíquica, e concebendo o desenvolvimento cognitivo como resultante de estruturações e reestruturação progressivas da ação. Localizando, portanto, a gênese das operações do pensamento na inteligência sensório-motora, Piaget pesquisa curso do desenvolvimento psicoge-genético, passando pelas atividades que preparam e organizam a inteligência operatória concreta e, por fim, a inteligência operatória formal, que marca os limites do desenvolvimento individual. Piaget faz questão de afirmar que tais limites constituem uma realidade do presente e não um fechamento definitivoe que mesmo esses limites atuais só o são do ponto de vista psicogenético, pois a perspectiva sociogenético abre possibilidades de geração para geração. A essa altura, vale lembrar que a teoria de Piaget tem tido as mais diversas interpretações: a de uma forma de empirismo, de kantismo evolutivo, de hegelianismo, havendo, até quem afirme sua tendência marxista. Somos de opinião que a Epistemologia Genética, como uma produção coletiva e vastíssima, é, parcialmente, tudo isso. Mas lembramos, com Agnes Heller, que “[...] não há nada mais belo e sábio do que poder escolher, numa teoria, o que é mais necessário”. (HELLER, 1982, p. 22). É na perspectiva de escolher o que é necessário na a teoria de Piaget que nos colocamos, sem impedimentos radicais, já que suas elaborações muito contribuem para resgatar a condição libertadora do conhecimento. Tememos, por outro lado, que, na falta de teorias mais completas, seja colocada na teoria de Piaget uma expectativa que ela não estará à altura de concretizar. Por isso, achamos que é o momento de explicitar alguns pontos mais problemáticos. Apesar de a referida teoria acentuar a unidade do sujeito com o mundo, ela não se preocupou em qualificar esse mundo como o meio social concreto, sendo seus resultados isentos do compromisso com a luta de classes. Piaget 14 esteve mesmo interessado em fornecer um quadro de referência para a compreensão do sujeito epistêmico, entendido como possibilidade humana de conhecer, uma possibilidade que é, assim, humano-genérica. Por outro lado, essa perspectiva não anula a outra, mas, ao contrário, dela necessita, mesmo para fins de enriquecimento dessa compreensão. Em função desse seu interesse, Piaget se preocupa com a formação dos instrumentos do pensamento que propiciam o conhecimento, e acaba por afluir na Lógica Formal, negligenciando a Lógica Dialética. No que tange a uma concepção de aprendizagem, é claro que Piaget discorda das concepções anteriormente discutidas, tendo sido essas discordâncias exaustivamente expressas em toda sua obra. Ele nega que sua teoria seja uma teoria de aprendizagem, classificando-a como uma teoria do desenvolvimento. Admite, porém, que ela possa ser vista também como uma teoria da aprendizagem, desde que tenha o seu conceito ampliado, de maneira a incorporar os processos de equilibração, que não internos, mas não hereditários. Quanto às aprendizagens conceituais tipicamente escolares, Piaget as subordina às estruturas já formadas, sugerindo que aquelas devam apoiar-se nestas, porque só assim podem contribuir para sua consolidação e ampliação. Por força de tais limitações, e principalmente pelo fato de Piaget não ter tido uma preocupação incisiva com a totalidade psicológica (já que sua meta era a compreensão do sujeito epistêmico), julgamos necessário que se compete a sua abordagem com outras que lhe sejam compatíveis. É aí que apontamos para as linhas de investigação iniciadas por Wallon e Vygotsky. Os estudos de Wallon, apesar de pouco divulgados nos últimos tempos, conduzem ao reconhecimento de uma enorme contribuição à Psicologia. Voltados para a evolução psicológica da criança, o seu legado ultrapassou os limites desse momento da vida, ao fornecer elementos para a compreensão da dinâmica do processo de conhecimento. Wallon vai à gênese desse processo, teorizando sobre a passagem do orgânico ao psíquico e apontando caminhos 15 para a análise dialética de teorias reducionistas que privilegiam ora o orgânico, ora o social, no curso do desenvolvimento humano. A passagem do orgânico ao psíquico, que equivale à síntese entre individual e o social, é, para o Wallon, um dos problemas cruciais da Psicologia. Ela tenta explicá-la por meio de quatro elementos estreitamente interligados: a emoção, a motricidade, a imitação e o socius. A emoção permite à criança nascer para a vida psíquica, por ter como função inicial a comunhão como outro, a união entre os indivíduos, em virtude das suas reações orgânicas, da sua fragilidade. No princípio, ela é indistinta, mas engendrará as oposições e os desdobramentos que gradualmente vão dando origem às estruturas da consciência. A primeira expressão da emoção é o movimento, que é, ao mesmo tempo, o seu substrato. A motricidade é, então, para Wallon, o tecido comum e original de onde procedem as realizações da vida psíquica. Essa primeira fase das trocas do indivíduo com os outros, e com mundo em geral, corresponde a um tipo de inteligência discursiva, cuja manifestação inicial é a representação. A imitação é o elemento responsável pela superação d um tipo de inteligência pelo outro. Ao tratar das origens do pensamento, entendido como inteligência discursiva, Wallon se volta para uma descrição psicologia de crianças de 5 a 7 anos, pois todas as etapas anteriores tinham sido já estudadas exaustivamente, nas obras precedentes. E ele privilegia, nessa descrição, os obstáculos com os quais as crianças deparam para explicitar seu pensamento, e as contradições entre o instituído e suas experiências, entre o formalismo da linguagem e a fluidez dos dados empíricos, em si mesmos contraditórios, em última análise, entre o real e a sua representação. Em toda a extensão da obra de Wallon, encontra-se a preocupação de concentrar suas análises em processos, por considerar que é o confronto do indivíduo com a sociedade que à construção da inteligência. A afirmação a seguir é basilar para confirmar isso: 16 Jamais pude dissociar o biológico do social, não porque os creia redutíveis um ao outro, mas porque me parecem, no homem, tão estreitamente complementares desde o nascimento que é impossível encarar a vida psíquica de outro modo que não seja sob a forma de suas relações recíprocas. (WALLON, 1951 apud ZAZZO, 1978, p. 51). Apenas essa afirmação nos basta para constatarmos que, apesar de sua teoria se centrar no desenvolvimento, não exclui a aprendizagem, cujo sentido positivista é superado pela dissociação do biológico e do social. Com respeito a Vygotsky (1984), merece realce, inicialmente, o fato de ele ter uma posição que representou um avanço para a psicologia soviética. Sabe-se que, após a Revolução de 1917, as formulações de Pavlov imperaram na Rússia, por sua característica antiidealista. Em contrapartida, abandona-se o estudo da consciência, implicando isto, segundo Vygotsky, uma limitação da Psicologia a problemas poucos complexos, além de fazer perdurar o caráter dualista e espiritualista do subjetivismo anterior. Visando, então, a uma coerente psicologia materialista, Vygotsky e seus colaboradores se empenham em recuperar o estudo da consciência, inserindo as contribuições de Pavlov numa perspectiva mais ampla de investigação. Instauram-se, a partir daí, a reação ao comportamentismo vulgar e a luta pela instituição de um método que tratasse a consciência de maneira objetiva e concreta. A hipótese que norteia suas sucessivas pesquisas é expressa nos seguintes termos: Os processos psíquicos mudam no homem do mesmo modo como mudam os processos de sua atividade prática. Vale dizer que também aqueles são mediatizados. É exatamente pelo uso dos meios, é pela relação mediata com as condições de existência que a atividade psíquica do homem se distingue radicalmente da atividade psíquica animal. (LEONTIJEV; LURIA, 1973) Utilizando-se do método histórico-crítico, Vygotsky empreende um estudo original e profundo do desenvolvimento intelectual da criança, cujos resultados demonstraram ser o desenvolvimento das funções psicointelectuais 17 superiores um processo absolutamente único. A esse respeito, conclui Vygotsky: Todas as funções psicointelectuais superiores se apoiam de dois modos no curso do desenvolvimento da criança: por um lado, nas atividades coletivas,como atividades sociais, isto é, como funções interpsíquicas; por outro lado, nas atividades individuais, como propriedades do pensamento da criança, isto é, como funções intrapsíquicas. (VYGOTSKY, 1973, p. 160). Do ponto de vista do conceito de aprendizagem, a importância dos estudos de Vygotsky é inquestionável, destacando-se o seu trabalho sobre “[...] o problema da aprendizagem do desenvolvimento intelectual na idade escolar”. Aqui, Vygotsky critica as teorias que separam a aprendizagem do desenvolvimento, e conclui, afirmando: [...] não há necessidade de sublinhar que a característica essencial da aprendizagem é que dá lugar à área do desenvolvimento potencial, isto é, faz nascer, estimula e ativa, na criança, processos internos de desenvolvimento no quadro das interrelações com outros que, em seguida, são absorvidas, no curso do desenvolvimento interno, tornando-se aquisições próprias da criança... A Aprendizagem, por isso, é um momento necessário e universal para o desenvolvimento, na criança, daquelas características humanas não naturais, mas formadas historicamente. (VYGOTSKY, 1973, p. 161) A concepção de aprendizagem que resulta do confronto e da colaboração entre essas três últimas abordagens, e das correções a que se pode submetê-las conduz, inevitavelmente, à superação da dicotomia transmissão X produção do saber, porque essa concepção permite resgatar: • A unidade do conhecimento, através de uma visão da relação sujeito/objeto, em que se afirmar, ao mesmo tempo, a objetividade do mundo e a subjetividade, (SCHAFF, 1975) considerada como um momento individual de internalização da objetividade; • A realidade concreta da vida dos indivíduos, como fundamento para toda e qualquer investigação. Nesses termos, chega-se à conclusão de 18 que as práticas pedagógicas que respeitem a concepção de aprendizagem em foco devem apoiar-se em duas verdades fundamentais: - A de que todo conhecimento provém da prática social e a ela retorna; - A de que o conhecimento é um empreendimento coletivo, nenhum conhecimento é produzido na solidão do sujeito, mesmo porque essa solidão é impossível. PRESTAR ATENÇÃO NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO A "atenção", seja como uma capacidade mental, como um com-portamento ou como uma condição para um comportamento, é um termo largamente utilizado tanto na linguagem coloquial quanto na científica. Na literatura psicológica, seu uso é comum e refere-se, normalmente, a algum processo cognitivo de seleção dos estímulos aos quais um organismo deve responder. A Análise do Comporta-mento (AC), de B. F. Skinner, é uma perspectiva psicológica que rejeita explicações cognitivas como entidades iniciadoras do com-portamento e, portanto, rejeita a noção de que o "prestar atenção" possa ser entendido como uma instância mental selecionadora de estímulos. Por outro lado, Strapasson & Dittrich (2008) indicam que Skinner atribuía grande importância ao estudo do tema, interpre-tando teoricamente esse fenômeno em diversos momentos de sua obra. Entretanto, Skinner nunca pesquisou empiricamente quais seriam as propriedades desse comportamento. Este trabalho pretende analisar os usos da expressão "prestar atenção" na literatura da AC na tentativa de avaliar a coerência en-tre as propostas de estudo do tema desenvolvidas por analistas do comportamento inspirados em Skinner e a filosofia que sub jaz à AC, Behaviorismo Radical. Espera-se criar, com este texto, subsídios a serem utilizados (1) pelo professor que ensina AC quando este é imbuído da tarefa de ensinar o que é o "prestar atenção" para esta perspectiva e (2) pelo professor de outras áreas que precise explicar qual é a visão da AC para o referido fenômeno. 19 A AC como disciplina científica deve avaliar as práticas de seus próprios membros nos mesmos termos que utiliza para avaliar os comportamentos de outrem, cientistas ou não (Hineline, 1992). Nesse sentido, a avaliação do "prestar atenção" na AC perpassa a análise do comportamento verbal dos próprios analistas do compor-tamento. Tal tarefa se mostra importante ao se constatar que diver-sos autores da área utilizam a expressão "prestar atenção" sob con-trole de eventos diferentes. Por vezes tenta-se estabelecer uma identidade entre o "prestar atenção" e alguns processos comporta-mentais como controle de estímulos (Skinner, 1953/1965, 1971/ 2002; Donahoe, Palmer & Burgos, 1994; sério, et al., 2002), o que tornaria a expressão desnecessária. Outras vezes o "prestar atenção" é considerado como um comportamento em si mesmo, como um caso de resposta de observação (Wyckoff, 1952; Skinner, 1954/1999; 1957 /1999; 1961/1999; 1968; Shahan, et al., 2003). Há, ainda, quem defenda que o "prestar atenção" deve ser interpretado como um pro-cesso cerebral, não observável diretamente, ainda que, hipotetica-mente, seja governado pelos mesmos princípios do comportamento operante aberto (Dinsmoor, 1985). A diversidade de interpretações disponíveis denuncia a dificul-dade da AC em explicar os eventos tradicionalmente considerados mentais. O desacordo entre os analistas do comportamento sobre quais relações comportamentais estão envolvidas no fenômeno "prestar atenção" dificulta também a comunicação entre os próprios pesquisadores e entre eles e as comunidades científicas afins: Psi-quiatria, Neurologia etc. Neste texto, utilizar- se-á da estratégia de reconstrução conceitual, tal como proposta por Zuriff (1985), para avaliar o quanto as proposições conceituais presentes na literatura da AC sobre o "prestar atenção" são coerentes com os pressupostos filosóficos do Behaviorismo Radical. Considerações preliminares Como demonstraram Strapasson & Dittrich (2008), Skinner trata do "prestar atenção" em diversos momentos de sua obra. Entretan-to, dispõe diferentes interpretações em seus textos. A possibilidade de se encontrar uma 20 coerência interna na obra do autor foi analisada alhures (idem, ibidem). Neste trabalho, os argumentos de Skinner serão considerados apenas na medida em que contribuírem para a reconstrução conceitual aqui empreendida. Outra consideração a ser explicitada é que este texto é produto de uma análise sistemática da literatura (Strapasson, 2008), entretanto a abrangência e estratégias metodológicas adotadas em tal revisão não serão aqui apresentadas. Essa opção se expressa no uso seletivo da bibliografia, de modo que se fará referência apenas às exposições mais emblemáticas dos argumentos aventados. Caso o leitor se interesse por detalhes da revisão ou por quais são os textos representativos de cada posição discutida, sugere-se recorrer a Strapasson (2008). O "prestar atenção" na AC Os analistas do comportamento têm investigado o "prestar atenção" a partir de três níveis diferentes de análise: (1) como equivalen-te à relação de controle de estímulos, (2) como equivalente à respos-ta de observação e (3) como um comportamento recorrente encoberto capaz de interferir no estabelecimento da relação de con-trole de estímulos. O "prestar atenção" como relação de controle de estímulos É comum encontrar em textos de analistas do comportamento a interpretação de que o "prestar atenção" corresponde à existência do controle de estímulos. Sugere-se, nesse caso, que o "prestar aten-ção" não seria um comportamento propriamente dito, mas sim uma relação de controle: “[...] atenção não é uma forma de comporta-mento. [...] Atenção é uma relação de controle - a relação entre uma resposta e um estímulo discriminativo. Quando alguém está pres-tando atenção ele está sob controle especial de um estímulo" (Skinner, 1953/1965, p.123). Reynolds (1961, p.208) corrobora essa interpre-tação: " [...] atenção se refere à relação de controle entre os estímulos e o responder. Um organismo atenta a um estímulo quando seu res-ponder estásob controle daquele estímulo". Os autores que suge-rem essa interpretação (Sério, et al. 2002) supõem que um psicólogo (ou outro sujeito qualquer), ao atestar que um organismo presta aten-ção, está sob controle do 21 efeito diferencial que um estímulo tem so-bre o comportamento do organismo, ou seja, ele verifica a ocorrên-cia de controle de estímulos. Nesse sentido, praticamente todo comportamento operante envolveria o "prestar atenção" e o termo seria desnecessário em uma ciência do comportamento. A reivindicação pelo abandono da expressão parece seguir a mesma lógica disposta por Skinner (1938/1991, p.6-8) quanto ao uso de termos não comportamentais: A maioria desses termos [os do senso comum e os de outras teorias psicológicas] deve ser evitada na descrição científica do comportamen-to. [ ... ] A objeção importante ao vernáculo na descrição do comporta-mento é que muitos desses termos implicam esquemas conceituais. Isso não significa que nós devemos abandonar completamente o discurso ordinário em uma ciência do comportamento. O único critério para a rejeição de um termo popular é a implicação de um sistema ou de uma formulação estendida para além das observações imediatas. O "prestar atenção", nessa lógica, seria um termo demasiado comprometido com outros esquemas conceituais e deveria ser eli-minado do vocabulário da AC em prol do uso de expressões mais descritivas, como "controle de estímulos". Caso adotada, essa es-tratégia teria a vantagem de garantir, sem a necessidade de recorrer a muitos condicionantes, a coerência com a avaliação do evento den-tro de uma análise de contingências, evitando- se recorrer a instân-cias volitivas e/ ou mentalistas (Zuriff, 1985). Outro efeito positivo da adoção dessa estratégia é a possibilidade de o analista do compor-tamento, mesmo sem modificar os métodos clássicos empregados em suas pesquisas, poder reivindicar que está estudando a atenção, eliminando assim uma eventual acusação de negligência do tema. Por fim, a pesquisa sobre as condições necessárias para a produção de controle de estímulos pode gerar tecnologia que permitirá a in-tervenção em situações em que é preciso aumentar as chances de que um estímulo ganhe controle sobre o comportamento do sujeito. 22 Por outro lado, algumas objeções podem ser levantadas contra a eliminação do conceito de "prestar atenção" na Análise do Compor-tamento. A primeira delas se refere ao fato de que alguns analistas do comportamento continuaram usando a expressão "prestar atenção" para descrever relações de controle de estímulos (Fantino & Logan, 1979; Nevin, et al., 2005) e, portanto, a recomendação simplesmente parece não ter afetado os pesquisadores da área. Uma segunda crítica é que Skinner abandona a postura eliminativista ao longo de sua car-reira em favor da análise de termos psicológicos como uma análise do comportamento verbal dos cientistas (Skinner, 1945/1984). Nenhu-ma dessas objeções é expressiva, pois o fato de que uma recomenda-ção não foi adotada não significa que ela não seja pertinente e o fato de que Skinner deixou de eliminar termos de outras teorias não implica a necessidade de outros autores fazerem o mesmo. Outro conjunto de objeções, entretanto, tem implicações mais significativas para a discussão do tema. A primeira delas diz respei-to à impossibilidade da igualação do "prestar atenção" com o con-trole de estímulos em explicar o efeito dos sistemas auxiliares de res-posta que alteram o próprio estabelecimento de controle de estímulos (e.g. respostas de orientação etc.). Olhar para o local onde os estí-mulos serão dispostos é condição necessária para o estabelecimento de uma relação de controle entre os estímulos dispostos e as respos-tas do organismo. Seguindo esse raciocínio, é fácil supor que outras respostas equivalentes, mas mais sutis, como diferenciar figura e fundo, possam ser tão importantes quanto olhar para os estímulos. A segunda, derivada da primeira, se refere ao fato de que ignorar respostas recorrentes que permitam ou melhorem o controle de estímulos implica ignorar parte do que se pesquisa sob o rótulo de "atenção" na Psicologia como um todo e deixa espaço para críticas de que a AC, apesar de não negligenciar o tema, analisa-o apenas parcialmente. "Prestar atenção" como comportamento precorrente Uma proposição alternativa à anterior é interpretar o "prestar atenção" como uma resposta auxiliar que estabelece ou aprimora controle de estímulos. 23 Essa proposição implica um modelo de dois estágios no estudo da "atenção": primeiro, o organismo atenta a um estímulo ou a uma propriedade de um estímulo e depois res-ponde apropriadamente a esse estímulo (Wyckoff, 1952, 1969; Zeaman & House, 1963; Mackintosh, 19656, 1975; Skinner, 1968; Hamlin, 1975). O primeiro elo nessa cadeia de comportamentos, que estamos indicando aqui como o "prestar atenção", foi concei-tuado de várias formas (resposta de orientação, resposta de aten-ção, resposta de observação, atentar etc.), mas essas conceituações podem ser separadas em dois grupos diferentes: (1) Respostas de observação e (2) "Atentar". Esses agrupamentos se aproximam ao defender a análise do fenômeno em dois estágios, mas diferem con-ceitualmente quanto à abrangência do fenômeno e em suas impli-cações filosóficas. "Prestar atenção" como resposta de observação A expressão "resposta de observação" (doravante RO) foi cunha-da por Wyckoff (1952, p.431) para estudar o que os teóricos da apren-dizagem de discriminação vinham chamando, à época, de predispo-sição para aprender respostas diferenciais a um par de estímulos: Tal predisposição vem sendo frequentemente atribuída a alguma reação do [sujeito] como uma resposta de atentar, resposta de orienta-ção, resposta de percepção, atividade de organização sensorial, etc. [...] vamos adotar o termo "resposta de observação" para fazer referência a qualquer resposta que resulta na exposição a um par de estímulos dis-criminativos. (grifo acrescido) Wyckoff utilizou uma caixa operante para pombos na qual ani-mais eram ensinados a responder em um disco sob um esquema misto MIX -V13/EXT que poderia ser transformado em esquema múlti-plo com os mesmos componentes (MULT-V13/EXT3) enquanto o animal mantivesse pressionado um pedal que ficava próximo ao dis-co. Nesse delineamento, a emissão da RO não altera as possibilida-des de obtenção de reforço pelo animal. Segundo Wyckoff (1952, p.240), "em certo sentido, o sujeito não ganhava nada além de infor-mação ao emitir a resposta de observação". A proposição de Wyckoff criou um paradigma experimental, que posteriormente foi utilizado principalmente no estudo do 24 reforçamento condicionado (Dinsmoor, 1983a) e caracterizou claramente uma abordagem de dois estágios no estudo do "prestar atenção". É comum encontrar na literatura quem aponte uma identidade entre a RO e o comportamento atentivo (Kelleher, 1958; Zearman & House, 1963), bem como quem negue essa identificação (e.g. Mackintosh, 19656, 197 5; Hendry, 1969; Dinsmoor, 1985): "ARO tem sido considerada como 'comportamento atentivo', mas o papel da atenção na percepção e aprendizagem animal certamente fica aquém do que é exemplificado pelo comportamento aberto" (Hendry, 1969, p.23). A dificuldade em identificar a RO com o "prestar atenção" está ligada ao uso que se tem feito dela na pesquisa experimental. A no-ção de RO surge na tentativa de operacionalizar a "predisposição dos sujeitos a responder diferencialmente a um par de estímulos dis-criminativos" (Wyckoff, 1952, p.431), de modo que a pesquisa empí-rica sobre o assunto fosse possível. Em sua proposição original, o conceito não se limita às respostas abertas observadas pelos pesqui-sadores, mas, na prática, os cientistas utilizama expressão para se referir apenas a essas respostas.4 Desse modo, a maior parte das crí-ticas sobre a insuficiência desse conceito em explicar o "prestar aten-ção" se dirige à reivindicação de que a RO não englobaria as respos-tas encobertas possivelmente componentes do(s) "sistema(s) atentivo(s)" (Hendry, 1969). Mackintosh (19656) defende essa po-sição ao debater resultados experimentais publicados por ele mes-mo em 1965 (idem, 1965a): Se ratos são treinados em discriminações entre um retângulo hori-zontal preto e um vertical branco, não há maneira concebível em que eles possam se orientar para olhar para a diferença na orientação entre os estímulos sem ver a diferença no brilho (e vice-versa). Assim, de-monstrações de atenção seletiva entre essas dimensões decisivamente excluem qualquer interpretação em termos de respostas de orientação. (idem, 19656, p.143) Em vista dessa dificuldade em se identificar a noção de "prestar atenção" com o uso comum que se dava ao conceito de RO, traba-lhos como os de Dinsmoor (19836, 1985), Shahan, Magee & Dobberstein (2003) e Nevin, 25 Davidson & Shahan (2005), entre outros, assumem a postura de que a RO deve ser considerada ape-nas um análogo do "prestar atenção": Nós somos obrigados a considerar processos análogos [à observa-ção] [...] comumente conhecidos como atenção. Os processos envolvi-dos na atenção não são prontamente acessíveis à observação como são os ajustamentos mais periféricos, mas é minha esperança e minha hipó-tese de trabalho que eles obedecem a princípios similares. (Dinsmoor, 1985, p.365) Assim, ainda que " [a noção de prestar] atenção seja usualmente construída como um processo cognitivo, nós vemos a atenção como um comportamento operante (possivelmente encoberto) não men-surado que acompanha o comportamento mensurado de observa-ção" (Nevin et al., 2005, p.281). Portanto, o "prestar atenção" se diferencia do RO na medida em que o primeiro é encoberto e o se-gundo é aberto. A interpretação do "prestar atenção" como RO tem como van-tagens: (1) a identificação de ao menos um sistema auxiliar de res-postas que determina (ainda que apenas parcialmente) o estabeleci-mento de controle de estímulos; (2) aprimora nosso conhecimento sobre o reforçamento condicionado; (3) na medida em que identifi-ca essas respostas auxiliares, permite o desenvolvimento de tecnolo-gias que as prevejam e manipulem em contextos aplicados; e ( 4) enfa-tiza o papel ativo do sujeito no estabelecimento de controle de estímulos ( não é mais apenas a configuração/ disposição dos estímulos ou propriedades destes que determina o controle de estímulos, o sujeito emite respostas que interferem nesse controle). Por outro lado, ao assumir que as ROs não representam a totalidade das respostas auxiliares precorrentes que determinam o controle de estímulos, essa proposta parece incompleta e adicionalmente cria a dificuldade para pesquisador de ter que diferenciar os efeitos desses dois compo-nentes precorrentes (as ROs e o "prestar atenção"): "do ponto de vista comportamental, nós podemos abordá-la [a atenção] apenas indiretamente, e nós devemos enfrentar a difícil tarefa de distinguir os efeitos comportamentais em cada instância daqueles a serem atri-buídos a mudanças na observação" (Dinsmoor, 1985, p.365). 26 Alguns autores aproveitaram -se do fato de que o uso experimental da noção de RO deixava parte do "prestar atenção" de fora para propor mais um evento precorrente mediador do controle de estí-mulos. Utilizaremos o termo "Atentar" (entre aspas e com a letra inicial maiúscula) para designar esse evento daqui em diante. "Atentar" A necessidade do conceito de "Atentar" pode ser exemplificada pelo primeiro conjunto de resultados relatados no estudo de Zeaman & House (1963). Nesse trabalho, os autores analisaram os desem-penhos em treinos de discriminação simultânea simples de cinquenta crianças com problemas de desenvolvimento e perceberam gran-de variabilidade quanto ao número de sessões necessárias para os sujeitos alcançarem o critério de discriminação estabelecido (de dez a 150 blocos de treino distribuídos em até seis dias de treino). Con-tudo, observou-se também que, se agrupados quanto ao número de blocos de treino necessários para atingir o critério após o início de mudança no desempenho, os sujeitos exibiam padrões bastante pró-ximos ( todos os grupos melhoraram rapidamente o desempenho nos últimos dez ou vinte blocos de treino, independentemente do número to-tal de blocos necessários). Os grupos permaneceram tempos consi-deravelmente diferentes com desempenhos de discriminação pró-ximos do acaso, mas uma vez que começavam a melhorar a performance, atingiam o critério de forma relativamente rápida. Zeaman & House (idem) interpretaram esses resultados como sen-do efeito do comportamento de "Atentar": os sujeitos permanece-ram" discriminando" em níveis próximos do acaso porque não atentaram às propriedades relevantes dos estímulos na tarefa; uma vez que aprendam a atentar a tais estímulos aprimoram seus desempe-nhos atingindo rapidamente o critério estabelecido (idem, ibidem). Uma das principais conclusões do estudo é que parte do que deve ser ensinado em uma tarefa de discriminação é o "prestar atenção" aos estímulos discriminativos relevantes. Essa proposição sobre o "prestar atenção" é também um modelo de dois estágios na interpretação do fenômeno, entretanto difere da RO na medida em 27 que não pretende investigar empiricamente o pri-meiro elo da cadeia (o "Atentar"). Os teóricos da "atenção" assim compreendida (Zeaman & House, 1963; Mackintosh, 1965, 1975; Hendry, 1969) recorrem a diversos experimentos empíricos para avaliar o "prestar atenção", mas esses experimentos não avaliam di-retamente as respostas de "atentar", apenas inferem o primeiro elo a partir dos desempenhos obtidos. Teorias do "Atentar" diferem da identificação do "prestar aten-ção" com o controle de estímulos por assumirem dois estágios na explicação do comportamento e diferem da explicação que se utiliza do conceito de RO por não avaliarem diretamente o primeiro dos dois estágios assumidos. Adicionalmente, é comum encontrar entre autores desse grupo o argumento de que é vantajoso interpretar o "prestar atenção" dessa forma justamente por não se prender aos resultados obtidos com respostas abertas como as ROs: Não há evidências que suportem o pressuposto de que a atenção e respostas de escolha [ou de observação] obedeçam exatamente às mes-mas leis, e a possibilidade de alterar os parâmetros independentemente um do outro gera explicações que abrangem uma maior variedade de dados comparativos [entre espécies]. (Mackintosh, 19656, p. 145) Com essa liberdade teórica pode-se indicar, por exemplo, que o "prestar atenção" tem natureza diversa dos processos comportamen-tais operantes (i.e., é um evento cognitivo ou neurofisiológico): Presume-se que ROs seguem as mesmas leis [do comportamento operante], tal como aquisição e extinção, como qualquer outra resposta, enquanto que hipóteses [sobre o Atentar] são estados cognitivos, não necessariamente vinculados às leis do hábito. (Zeaman & House, 1963, p.214) Em outro momento do mesmo texto, ao avaliar os efeitos da no-vidade (novelty) dos estímulos sobre o "prestar atenção", Zeaman & House (idem, p.200) defendem que o "Atentar" é um processo cen-tral, possivelmente neurofisiológico: 28 Os efeitos da novidade nos apresentam um paradoxo, que só pode ser resolvido assumindo-se que a atenção é um processo central. [...] um estímulo não pode ser julgado novo exceto em relação a séries ante-riores ou a um contexto de estímulos antigos (familiar). Mas esse julga-mento deve requerer que o sujeito mantenha algum traço, gravação ou engrama dos estímulosprévios (familiares) para contrastar com o sinal novo presente. [...] sujeitos que falham na discriminação por causa da intenção estão armazenando informações sobre o estímulo em algum lugar. Atenção é, portanto, um processo central. O fato de teóricos que defendem as teorias do "Atentar" (não se prenderem aos resultados obtidos com respostas observáveis e não terem a mesma natureza dos processos comportamentais até então estudados) é contrário, ao menos em alguns aspectos, às proposi-ções do Behaviorismo Radical. Skinner diferencia o Behaviorismo Radical de outros behavioris-mos, entre outros argumentos, defendendo que não se deve ignorar os eventos que não se pode observar ou medir (Skinner, 1963/1984). Na medida em que se afasta do Operacionismo Clássico e do Positivismo Lógico, Skinner permite e incentiva o uso da inferência como recurso legítimo da ciência em geral e da AC em particular (Skinner, 1984; Dittrich et al., 2009 ); contudo, usa uma concepção específica de infe-rência: "eu a definiria como o uso de termos e princípios científicos para falar de fatos sobre os quais se sabe muito pouco para tornar pos-síveis a previsão e o controle" (Skinner, 1984, p.578), e alerta para os perigos de se inferir sem tomar os resultados experimentais conheci-dos como base última da interpretação (idem, 1953/1965). Se Skinner concebe que a inferência sobre os eventos privados deve ser baseada nos resultados experimentais obtidos até o momento, é possível argu-mentar que, para ele, assumir a postura "não há motivos para se infe-rir que os eventos inobserváveis têm natureza diferente dos eventos observáveis" (postura semelhante à de Dinsmoor, 198 5) seria preferí-vel em relação à postura "não há motivos para se assumir que os even-tos encobertos seguem as mesmas leis dos comportamentos abertos", como parece ser a posição de Mackintosh ( 29 1965b ), por exemplo. Ob-viamente, a posição de Dinsmoor (1985) de que o "Atentar" segue as mesmas leis do comportamento operante também é uma inferência, mas é uma inferência muito mais próxima daquela defendida por Skinner (1971/2002, p.22-3), afinal: Muitas vezes referimo-nos a coisas que não podemos observar ou medir com a precisão demandada por uma análise científica, e, ao fazê-lo, há muito a se ganhar ao usar termos e princípios que foram forjados em condições mais precisas. Quanto ao assumir que o "Atentar" é necessariamente um pro-cesso central (i.e. neurofisiológico), os argumentos apresentados por Zeaman & House (1963) parecem refletir séria incompreensão das propostas behavioristas radicais. Se o fato de os organismos respon-derem diferencialmente a certos estímulos que foram apresentados no passado, mas não estão presentes na situação atual, fosse prova da existência de uma unidade conceitual como engrama ou repre-sentação, a AC não teria o que dizer sobre o fenômeno da memória sem recorrer à neurofisiologia, o que, não obstante, ela faz com fre-quência. Para a AC, um organismo que passou por certa experiên-cia com um determinado estímulo teve seu comportamento modifi-cado pelo papel que esse estímulo desempenhou naquele ambiente (seja como reforçador, como contextos etc.). O que resulta dessa interação é um organismo modificado que reagirá diferentemente caso venha a ser exposto a um ambiente parecido no futuro. Não é necessário assumir um "julgamento interno" do estímulo que avalie se ele é novo ou familiar. O organismo reage diferencialmente a ele porque foi ( ou não) exposto a contingências que o tornaram impor-tante. Os detalhes sobre como o organismo é modificado não são de competência da AC, apenas disciplinas como a Fisiologia e a Bio-química têm os métodos adequados para descrever esse fenômeno. Contudo, a AC pode perfeitamente prescindir desses métodos e con-tinuar a prever e controlar o comportamento dos organismos. Nesse caso específico, é necessário apenas conhecer a história que o orga-nismo tem em relação ao estímulo de interesse. 30 Uma síntese possível da reconstrução conceituai De modo geral, parece que restam duas opções ao analista do comportamento quando tenta conceituar o "prestar atenção": ou (1) ele segue uma postura "eliminativista" e assume que, havendo um termo menos carregado historicamente de características mentalistas (i.e. controle de estímulos), a expressão "prestar atenção" não é neces-sária e deve ser evitada, ou (2) ele segue uma postura mais "compre-ensiva" e conceitua o "prestar atenção" como um sistema complexo de comportamentos que pode ser analisado em vários níveis, como a verificação da presença de controle de estímulos ou o estudo de com-portamentos precorrentes, sejam eles encadeados ou ROs, mas que interfiram no controle diferencial exercido por um estímulo. A dife-rença nas duas proposições pode ser interpretada como uma diferença na abrangência da classe de respostas a que se refere a expressão "prestar atenção" (Strapasson & Dittrich, 2008), contudo a coexis-tência das duas proposições não resolve o principal problema da pes-quisa sobre o tema, a multiplicidade de sentidos em que a expressão é utilizada. É necessário, portanto, avaliar os benefícios alcançados com cada uma das formas de abordar o "prestar atenção" e, eventual-mente, optar por uma delas. Assumir a primeira postura evita os sistemas conceituais comu-mente associados à expressão "prestar atenção" na literatura psico-lógica ampla e no senso comum, e é coerente com a prática skinneriana de se abandonar os termos que carregam esses esque, mas conceituais, retomando-os apenas quando justificativas siste-máticas tiverem sido obtidas (Skinner, 1938/1991). Entretanto, o fato de os estudos experimentais ainda não terem conseguido acessar diretamente os eventos (até o momento) encobertos considerados como influentes no estabelecimento de controle de estímulos, pode ser indicado como uma justificativa para a permanência da expres-são. Com efeito, para se alcançar plenamente os benefícios dessa postura, seria necessário substituir a expressão "prestar atenção" pela expressão "comportamento precorrente", pois só assim a AC pode-ria descrever os fenômenos sob esse rótulo apenas com termos pró-prios, desvinculados dos problemáticos 31 esquemas conceituais diver-gentes. Essa é uma postura legítima na AC, mas pode contribuir com o que Krantz (1971) indicava como isolamento da AC da Psi-cologia como um todo e a dificuldade cada vez maior de comunica-ção entre a AC e áreas afins (ver debate no JEAB, v.60, de 1993, sobre a possibilidade de a AC se reaproximar da Psicologia sem abrir mão de suas características fundamentais). Assumir a segunda postura, apesar de exigir do pesquisador que clarifique o sentido em que usa a expressão "prestar atenção" (para não ser acusado de recorrer a instâncias mentalistas), se aproxima mais da interpretação, a qual se sugeriu ser a de Skinner (Strapasson & Dittrich, 2008), de que o "prestar atenção" pode ser avaliado em vários níveis de análise. Essa postura também é plenamente legíti-ma no Behaviorismo Radical, uma vez que não inclui nenhum evento mentalista, mediador ou iniciador do comportamento de "prestar atenção". Além disso, em se tratando de uma tradução conceitual dessa expressão, as consequências úteis de uma tradução poderão ser mais amplamente alcançadas (Strapasson et al., 2007), especial-mente as consequências políticas de maior disseminação das pro-postas da AC e a consequente melhor comunicação entre esta e dis-ciplinas afins. Sendo as duas propostas compatíveis com a AC, na medida em que uma prescrição política possa ser indicada como critério de es-colha entre as duas proposições, dever-se-ia optar pela segunda em prol da sobrevivência da AC enquanto prática cultural. INSTITUIÇÕES ESCOLARES,PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO E ATUAÇÃO PSICOPEDAGÓGICAS No Brasil das desigualdades, algumas pessoas conseguem beneficiarem-se pelas boas condições proporcionadas pelos pais, mas muitos, entretanto, são desavantajados, vivendo desagregação familiar, desemprego, subnutrição, falta de acesso a cultura, exposição à violência, baixa autoestima, drogadização e outros. É ai que se encontram muitos dos preconceitos, 32 gerados pela ignorância e pela incapacidade de compreender e aceitar as diferenças individuais. Estas, não deveriam ser negligenciadas pelas famílias, escolas e sociedade, mas são verificadas na falta de preparação, apoio e suporte aos professores para lidar com a diversidade de alunos presentes nas escolas. No caso das repetências e abandono escolar, podendo-se caracterizar a falência do ensinar. As tradicionais ciências educacionais como a Pedagogia e a Psicologia, têm se mostrado insuficientes para resolver os novos problemas de aprendizagem que circundam as instituições educacionais, do ensino fundamental ao superior, daí a necessidade de um novo profissional, o psicopedagogo, este, encarregado de estudar e entender os problemas relacionados à aprendizagem e seu entorno. A falta de conhecimento acerca da real problemático da educação, por pessoas envolvidas com a questão, conduz muitas vezes a ações inadequadas e insuficientes, sendo isto aplicável ao cotidiano das instituições que diretamente estão envolvidas no atendimento de alunos com dificuldades de aprendizagem. Para tanto, não se pode falar em aprendizagem sem considerar todos os aspectos relevantes na vida do sujeito que se relaciona e troca a partir da formação de vínculos afetivos e cognitivos. Sem um progresso acelerado na direção de uma educação para todos, prevista em lei, milhões de crianças continuarão sem acesso ao ensino primário, outros milhões de adultos permanecerão analfabetos, demonstrando assim, a fragilidade do sistema educacional brasileiro e que a qualidade da aprendizagem e da aquisição de valores e habilidades humanas apresenta-se, longe das aspirações e das necessidades dos indivíduos e sociedades. O que ocorre, em algumas escolas, é a transmissão de conhecimentos de forma homogênea, ignorando-se a diversidade humana, as diferenças individuais e sociais, os diferentes ritmos de aprendizagem, as histórias, as origens, enfim, a singularidade, a heterogeneidade. Faz-se necessário, então, repensar qual é a real função das escolas, que concepção de aprendizagem permeia as práticas pedagógicas dos professores, como intervirem nessa relação e como reverter à situação em que essas práticas se apresentam como excludentes. Cabe salientar que a exclusão dos diferentes não se dá apenas no contexto escolar, mas também nas relações sociais e profissionais. A 33 aceleração das mudanças tecnológicas, as transformações na organização do trabalho e a gestão dos recursos humanos têm provocado um grande impacto na demanda da qualificação nos diversos setores da economia. Com base na abordagem mencionada, compreende-se o processo de aprendizagem e desenvolvimento como um processo interativo, de troca de aquisições, respeitando os diferentes ritmos e as diferentes realidades explícitas no ser humano, com comportamentos que precisam ser estudados, entendidos e aceitos pelo educador. Faz-se vital que compreendamos como educadores que temos certas ambiguidades que só poderão ser compreendidas, quando analisadas à luz das situações vividas no dia a dia do aluno. Somos um conjunto integrado de visões de mundo, formados por herança genética; completados por relações com familiares e amigos; influenciados por pessoas que, ao se apresentarem em nosso mundo, nos ajudam a moldar ações e comportamentos; por influência de grupos de referência, que nos fornecem subsídios e ajudam na construção de nossos paradigmas. O educador deve então, estar consciente das diversas dimensões que estão presentes no comportamento do aluno e, principalmente, no seu próprio. Portanto, a partir da reflexão sobre como “eu” educador sinto e reajo aos efeitos do processo de aprendizagem e, principalmente, do relacionamento interpessoal, aluno- professor-colegas, é que pode-se ter insights de como conduzir o aluno ao aprendizado harmônico. Segundo Rubem Alves: Educar é desinstalar. O educador não é aquele que reproduz os sermões prontos e acabados, mas aquele que desperta consciência, motiva para existência. Diz ainda: o educador fala com o corpo. É no corpo de cada educador e de cada educando que estão escritas suas histórias. Daí a necessidade de lê-lo constantemente, uma situação de permanente interação. E continua afirmando: o corpo é o primeiro livro que devemos descobrir, por isso é preciso reaprender a linguagem do amor, das coisas belas e das coisas boas, para que o corpo de levante e se disponha a lutar (apud GADOTTI, 1987, p. 49). 34 PSICOPEDAGOGIA ESCOLAR A escola é a parte central da vida de toda criança ou jovem que tem a oportunidade de frequentá-la. Para alunos que tem dificuldade de aprendizagem, a vida escolar pode ser bem dura e muitas vezes frustrante. Quase todos os alunos pertencentes a estes problemas, têm sentimentos de incompetência e inadequação, que nestes casos incorporam o fracasso crônico, a baixa autoestima e o stress, sendo difícil, mas necessário, acreditar que esses alunos, que parecem abatidos, desmotivados, agitados e por vezes agressivos, tenham alguma promessa de sucesso. É necessário um profissional que conheça a problemática enfrentada pelo aluno, estratégias de intervenção, experiências técnicas e atividades motivadoras para que haja uma mudança nas ações desses alunos. A ajuda, na maioria dos casos, implica na individualização do ensino e um trabalho colaborativo por parte dos profissionais da educação e de um plano de trabalho conjunto, uma equipe multidisciplinar. Segundo Bossa (2000), a psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, que adveio de uma demanda: o problema de aprendizagem, colocado num território pouco explorado, situado além dos limites da psicologia e da pedagogia. A psicopedagogia tenta descobrir um caminho para que alunos e professores possam atingir suas verdadeiras potencialidades. Hoje, tem-se a certeza de que os educadores, trabalhando em conjunto, têm condições de promover o sucesso e quebrar o ciclo do fracasso. Para atingir esse objetivo é fundamental o trabalho de vários profissionais: professor: responsável por cuidar do ensino em sala de aula; psicólogo: responsável por cuidar dos problemas emocionais; psicopedagogo: responsável em saber como se aprende, por que não se aprende, como se ensina e porque não se consegue ensinar; fonoaudiólogo: cuida das dificuldades da fala; fisioterapeuta: trabalha as dificuldades físicas e motoras; médico: trabalha as patologias; entre outros. Essa equipe profissional ocupa diferentes posições em diversos momentos do processo de avaliação e diagnóstico, sempre visando derrubar as barreiras que impedem o sucesso escolar. 35 A psicopedagogia tem um caráter preventivo, questionando o porquê do fracasso escolar, do não aprender, do aprender diferente, numa visão multidimensional e terapêutica, não só do indivíduo, como também, num caráter mais totalizante, das instituições de ensino. A psicopedagogia, embora sendo uma nova área de conhecimento, tem tido avanços relevantes nos estudos dos problemas de aprendizagem. Sua prática está voltada à prevenção dos problemas escolares, à terapêutica dos problemas de aprendizagem e à pesquisa psicopedagógica. PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM Cada dia ouve-se mais falar em multidisciplinaridades. Um saber em constante mutação, em razão do dinamismo e das constantes alteraçõesdo mundo escolar, relacionadas às mudanças socioeconômicas e culturais que atingem as comunidades escolares. A problemática da aprendizagem escolar está neste momento merecendo a atenção e preocupação de pais e professores. OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM SÃO ABORDADOS EM TRÊS NÍVEIS: Nas Deficiências de Aprendizagem São aquelas pessoas que possuem incapacidade intelectual; Nas Dificuldades de Aprendizagem São aquelas pessoas com capacidade cognitiva média ou acima da média, mas apresentam resultados insuficientes na aprendizagem, relativo ao meio, emocional, relacionamento, privação cultural ou ainda problemas sensoriais perturbadores da recepção da mensagem; Nos Distúrbios de Aprendizagem São operações neuropsicológicas manifestando-se em uma ou mais habilidades, como transtornos de leitura, tradicionalmente chamados de “dislexia”; de escrita, conhecido como “disgrafia”; e “disortográfica”; e de matemática, conhecidos como “discalculia”. 36 A psicopedagogia busca uma compreensão mais integradora dos problemas de aprendizagem. Atualmente podemos distinguir, pelo menos, quatro enfoques psicopedagógicos diferentes referentes ao estudo e à intervenção dos problemas de aprendizagem: o enfoque ecológico, ligado às alterações pedagógicas e institucionais, incluindo o enfoque sócio-histórico- cultural, contribuições baseadas em Luria e Vygotsky; o enfoque neuropsicológico, integrando as contribuições da Neurologia e Psicologia; o enfoque cognitivo, ligado à aprendizagem de cada sistema conceitual, preocupando-se com a psicogênese dos sistemas com os quais estamos atuando; o enfoque condutal, voltado às mudanças na conduta. O El fracasso escolar se produze por variados motivos, siendo causado la mayoria de las veces por agentes causantes de fracaso escolar: factores biológicos, psicopatológicos, pedagógicos y socioculturales. Los biológicos y psicopatológicos son de tipo personal. Los pedagógicos e socioculturales dependen fundamentalmente de factores exógenos que actúan sobre el niño (PEREZ, 1989, p. 37). Os fatores etiológicos dos problemas de aprendizagem derivam da interação entre a hereditariedade e o meio, resultando num déficit integrado e cumulativo. Assim, os problemas só podem ser tratados aprofundando-se os estudos sociais, com o auxílio dos estudos dos fatores patogênicos do desenvolvimento, de um estudo interdisciplinar e um estudo interdisciplinar integrado. Os fatores etiológicos podem ter influências ligadas aos fatores: emocionais, visuespaciais, auditivos, motores, conceituais; as causas formais: padrões de maturação herdados ou adquiridos, fatores fisiológicos, saúde e nutrição, envolvimento físico; causas materiais: hormonais, disfunção neurológica e fisiológica, distúrbios motivacionais e emocionais, pobreza de linguagem e desconhecimento; causas originais; genes dos pais, acontecimentos perinatais, doenças e acidentes com lesões cerebrais (Bannatyne, apud FONSECA, 1995, p.10). 37 APRENDER Aprender envolve processos complexos e interativos, nos quais vários componentes genéticos, neurológicos, psicológicos, educacionais e sociais se inter-relacionam. A aprendizagem é uma função do cérebro, e uma resultante de complexas operações neurofisiológicas. Portanto, o indivíduo e seu sucesso escolar estão na base de todo esse trabalho. Indivíduos com problemas de aprendizagem geralmente possuem inteligência normal ou acima da média, porém não atingem um nível acadêmico semelhante ao de seus colegas, apresentando um desempenho acadêmico mais fraco, principalmente no que diz respeito à leitura, escrita e matemática. Os problemas são normalmente encontrados na memória, na metacognição e nas habilidades sociais e de comportamento. Analisemos algumas destas áreas: Linguagem A linguagem aparece de diversas formas: oral, ler e escrever. Elas estão todas interligadas no sistema de linguagem. A aprendizagem destas formas também acontece de maneira sequencial, começando pelo ouvir, falar, ler e escrever. Cada uma destas aprendizagens são pré-requisitos para as outras. Linguagem Oral Consciência fonológica, mais conhecida como a capacidade de reconhecer que as palavras são feitas de elementos de som, chamados de fonemas. Problemas nesta linguagem podem ser encontrados no atraso do começar a falar e na dificuldade da aquisição de vocabulário, na compreensão do significado das palavras e na desordem na formação de frases. Estudos demonstram que crianças que apresentam problemas na linguagem oral na pré-escola muitas vezes apresentam dificuldades em outras formas de linguagem, tanto na leitura como na escrita. Leitura Problemas de aprendizagem na leitura têm efeitos em todos os aspectos da vida da pessoa, afetando desde os primeiros anos da vida escolar até os estágios subsequente, pois para a aprendizagem de todos os 38 conteúdos, sejam eles ou não, a leitura é fundamental e requisito para exercício pleno da cidadania. Segundo Fonseca, “Aprender a ler exige não só uma maturação de estruturas de comportamento como também uma aprendizagem prévia que possibilite à criança o prazer dessas experiências” (1995, p.108). Indivíduos que possuem problemas de aprendizagem na leitura normalmente possuem dificuldades no reconhecimento das palavras, omitindo sons e letras, fazendo inserções, substituições e reversões, ou na compreensão, apresentando dificuldades para lembrar, sequenciar e discernir fatos básicos, ideias principais ou temas centrais. Além dessas, podem ainda apresentar outras como não conseguir acompanhar a leitura, problemas de fixação dos olhos na linha que está sendo lida ou ler sem ritmo e de maneira entrecortada, dificultando a compreensão. O problema de leitura que persiste a diferentes intervenções pedagógicas pode ser diagnosticado como dislexia, tipo de disfunção cerebral detectada por meio de exames neurológicos. A dislexia também pode ser herdada, ou seja, tem caráter genético. Durante a infância, crianças com dislexia têm dificuldades com a aquisição da fala. Na escola, apresentam extrema dificuldade em reconhecer letras, palavras e em interpretar textos. Escrita A linguagem escrita é a mais alta e a mais complexa forma de comunicação. É a última a ser aprendida e é com ela que integramos a aprendizagem prévia e as experiências de ouvir, falar e ler. A falta de facilidade em expressar ideias pela escrita talvez seja a mais comum das dificuldades na área da linguagem. Os alunos com aprendizagem na linguagem escrita apresentam dificuldades que vão desde a caligrafia, a ortografia, a estruturação da frase, o uso de vocabulário, o volume de informação produzido e a organização das ideias. Às vezes, as dificuldades apresentam-se em apenas uma dessas áreas. 39 Muitos indivíduos com problemas na leitura também apresentam na escrita, visto que são áreas interligadas. Assim como na leitura, os problemas na escrita atingem toda vida acadêmica do indivíduo. Por exemplo, alunos com problemas na linguagem escrita podem entender os conceitos estudados em ciências e estudos sociais, mas não conseguem expressar essa compreensão num projeto escrito ou numa redação. Podem também participar ativamente em discussões em grupo e da realização de uma tarefa escolar, porém ao escrever sobre o assunto não apresentam clareza e realização. Matemática A matemática é considerada uma linguagem universal. É uma linguagem simbólica que permite aos homens pensar, anotar e comunicar ideias que dizem respeito aos elementos e às relações de qualidade. Para muitos indivíduos com problemas de aprendizagem, a matemática é a área que mais apresenta complicações, que podem se manifestar
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