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Luciana Vieira Castilho-Weinert Cláudia Diehl Forti-Bellani (Editores) Fisioterapia em Neuropediatria 2011 Copyright c©2011 Omnipax Editora Ltda Caixa Postal: 16532 - 81520-980 Curitiba, PR A editora disponibiliza por acesso livre a versão eletrô- nica deste livro no site: http://www.omnipax.com.br, sob uma licença Creative Commons Attribution 3.0. Capa: Sérgio Alexandre Prokofiev Projeto gráfico e editoração: Omnipax Editora Ltda Impressão: Pix Bureau Gráfica e Editora Ficha catalográfica: Adriano Lopes (CRB9/1429) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação B537 Fisioterapia em neuropediatria / editores: Luciana Vieira Castilho-Weinert, Cláudia Diehl Forti-Bellani. — Curitiba, PR, Omnipax, 2011 338 p. Vários autores Inclui biografias ISBN: 978-85-64619-01-2 eISBN: 978-85-64619-03-6 1. Neurologia pediátrica. 2. Fisioterapia para crian- ças. 3. Crianças – Doenças – Tratamento. I. Castilho- Weinert, Luciana Vieira, ed. II. Forti-Bellani, Cláudia Diehl, ed. III. T́ıtulo. CDD (22. ed.) 618.928 Dedicatória A Deus que me dá forças para continuar a cada manhã... A meu marido Wagner por seu amor incondicional.. A meus pais Loide e Vilson por seus esforços incansáveis para que eu chegasse aqui... L.V.C-W. A meus pais, pelos valores éticos e morais. A meu marido, Paulo Roberto e minha filha Isabela, razões da minha felicidade pessoal! A todos os meus pacientes, razões da minha perseverança cient́ıfica e felicidade profissional. C.D.F-B. . Prefácio A Fisioterapia na área da Neuropediatria tem expandido muito na atualidade. Os avanços técnico-cient́ıficos permitem paulatinamente uma atuação profissional diferenciada, embasada em evidências cien- t́ıficas relacionadas aos aspectos plásticos do SNC e com resultados mais promissores. Considerando-se o desenvolvimento de recursos e técnicas na área, percebe-se uma necessidade iminente de atualização profissional e disseminação do conhecimento cient́ıfico sobre a área. Este volume agrupa trabalhos de pesquisa, revisão de literatura e estudos de caso, com foco na intersecção da Fisioterapia com a Neu- ropediatra. A coletânea de caṕıtulos abrange didaticamente tópicos atuais e relevantes, explorando direções futuras para a pesquisa e a atuação profissional nesta área. Desta forma, este livro vem suprir a carência de material de referência, principalmente sobre técnicas de intervenção, relativas ao assunto. Entre os diversos assuntos abor- dados, destacam-se as correlações da neurofisiologia e da neuroplas- ticidade com os processos de aprendizagem motora e reabilitação, o desenvolvimento motor t́ıpico, as encefalopatias crônicas da infância, acessibilidade e tecnologias assistiva, escalas de avaliação em Neuro- pediatria, e, as principais técnicas e formas de intervenção na área: Kabat, Bobath, psicomotricidade, adequação postural e atuação em terapia intensiva. Luciana Vieira Castilho-Weinert – UFPR-Litoral Cláudia Diehl Forti-Bellani – IBRATE . Sumário 1 Desenvolvimento motor t́ıpico, desenvolvimento motor at́ıpico e correlações na paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . 1 Cláudia Diehl Forti-Bellani e Luciana Vieira Castilho-Weinert 2 Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras: AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS . . . . . . . . . . . . . . . 23 Tainá Ribas Mélo 3 Abordagem fisioterapêutica pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 Luciana Vieira Castilho-Weinert e Cláudia Diehl Forti-Bellani 4 Alcance manual em lactentes t́ıpicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 Aline Martins de Toledo e Elóısa Tudella 5 Função do membro superior em crianças com paralisia cerebral e o uso de tarefas direcionadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87 Sheila Schneiberg e Felicia Cosentino 6 Função motora, fadiga e dor em adolescentes e adultos com paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107 Aline Duprat Ramos, Adriana Ferreira Dias, Rosane Luzia de Souza Morais e Ana Paula Santos 7 Terapia ocupacional e tecnologia assistiva: possibilidades de adaptações para pessoas com paralisia cerebral . . . . . . . 125 Cristina Antunes de Almeida e Paula Valéria da Costa Lima 8 Adequação de mobiliário e controle postural da criança com paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147 Ĺıgia Maria Presumido Braccialli e Franciane Teixeira O. Codogno 9 Variabilidade da frequência card́ıaca em crianças com paralisia cerebral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163 Andréa Baraldi Cunha, Antonio Roberto Zamunér, Marlene Aparecida Moreno, Eloisa Tudella e Ester da Silva 10 A fonoaudiologia e a facilitação neuromuscular proprioceptiva na śındrome de Down . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179 Kariane Eliza Souza, Luciana Vieira Castilho-Weinert e Cláudia Diehl Forti-Bellani 11 Śındrome de Rett: histórico, expectativa de vida, genética e habilidades funcionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193 Carlos Bandeira M. Monteiro, Zodja Graciani, Camila Torriani-Pasin, Emı́lia Katiane Embiruçu e Fernando Kok 12 Fisioterapia na unidade de terapia intensiva: enfoque na criança cŕıtica neurológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213 Adriana Yuki Izumi, Dirce Shizuko Fujisawa e Márcia Regina Garanhani 13 Avaliação neuromotora em pré-escolares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229 Tereza Cristina Carbonari de Faria, Silvia Regina M. Silva Boschi, Janáına Pereira de Souza e Érica Mie Okumura 14 Análise sequencial do desenvolvimento neuropsicomotor infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251 Eliane Roseli Winkelmann, Luciana Meggiolaro Pretto e Elenita Costa Beber Bonamigo 15 Correlações entre o desenvolvimento neuropsicomotor e o estado nutricional infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 269 Fernanda Hack, Elenita Costa Beber Bonamigo e Eliane Roseli Winkelmann 16 Acessibilidade de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 289 Silvia Regina M. Silva Boschi, Tereza Cristina Carbonari de Faria, Jéssica dos Santos Tolentino, Wellington Yoshihide Harada e Cećılia Augusto Ribeiro 17 Adultos com a paralisia cerebral: implicações para intervenção em neuropediatria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 305 Anna Luisa Macedo Margre, Maria Gabriela Lopes Reis, Rosane Luzia de Souza Morais e Aline Duprat Ramos 18 Marcadores de mineralização e formação óssea em crianças com paralisia cerebral. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321 Egle de Oliveira Netto Moreira Alves, Margarida de Fátima F. Carvalho, Tiemi Matsuo e Anne Cristine Rumiatto . . Capítulo 1 Desenvolvimento Motor Típico, Desenvolvimento Motor Atípico e Correlações na Paralisia Cerebral Cláudia Diehl Forti-Bellani∗, Luciana Vieira Castilho-Weinert Resumo: Este caṕıtulo tem como objetivo discutir aspectos rela- tivos à importância do desenvolvimento motor para a prática cĺı- nica do fisioterapeuta. Os conceitos e as etapas do desenvolvimento motor t́ıpico são apresentados e correlacionados com o desenvolvi- mento motor at́ıpico. Também são analisadas as implicações para a intervenção na Paralisia Cerebral (PC). Conclui-se que o desenvol- vimento motor t́ıpico é um referencial importante para a atuação do fisioterapeuta, pois o reconhecimento de seus desvios permite iden- tificar os casos de atraso e anormalidade, como na PC. Além disto, serve como guia para o planejamento e execução da terapia e para que se acompanhe a evolução dos pacientes.Palavras-chave: Fisioterapia, Desenvolvimento Motor, Paralisia Cerebral. Abstract: This chapter aimed at discussing features related to the importance of the motor development to physical therapist’s prac- tice. Concepts and phases of the typical motor development are presented and correlated to the atypical motor development. Also, we analyze the implications in Cerebral Palsy (CP) intervention. We conclude that the typical motor development is an important reference to the physical therapist. The knowledge about its de- viations allows identify delays and abnormal cases, such as CP. Besides, it is a guide for planning and executing the therapy, as well as following the patient’s evolution. Keywords: Physical therapy, Motor development, Cerebral palsy. ∗Autor para contato: cbellani.neuroibrate@gmail.com Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2 2 Forti-Bellani & Castilho-Weinert 1. Introdução O desenvolvimento motor recebe várias denominações: desenvolvimento neuropsicomotor, desenvolvimento motor normal, desenvolvimento neuros- sensoriomotor, ou como recomendam as nomenclaturas recentes, desenvol- vimento t́ıpico ou desenvolvimento motor t́ıpico. O desenvolvimento motor é o conjunto de caracteŕısticas em constante evolução que permite que um bebê que possui atividade motora essencial- mente reflexa ao nascimento, evolua para a motricidade voluntária e realize movimentos complexos e coordenados, tais como a deambulação, a corrida, os movimentos finos de mão, entre outros (Diament et al., 2010). O conhecimento sobre desenvolvimento neuropsicomotor é fundamen- tal para o fisioterapeuta. A partir do momento que se reconhece o de- senvolvimento t́ıpico ou normal se está apto para reconhecer situações de desenvolvimento at́ıpico. Estas situações incluem os atrasos e as condições patológicas, que requerem intervenção, com o objetivo de prevenção (es- timulação precoce) ou reabilitação (no caso de grandes atrasos) (Halpern et al., 2000). É necessário que se considere que o nome neuropsicomotor remete ao fato do desenvolvimento possuir aspectos neurológicos, ou seja, as estrutu- ras do sistema nervoso devem amadurecer para que haja desenvolvimento. O desenvolvimento também possui aspectos psicológicos ligados as emo- ções, ao afeto e as motivações que levam ao aprendizado do ato motor. E ainda, o desenvolvimento possui o próprio aspecto motor, que diz respeito às especificidades do movimento humano (Willrich et al., 2009). Segundo Papalia et al. (2000) o desenvolvimento infantil é influenciado por uma tŕıade, a tŕıade de Newell (Newell, 1991), que considera o papel do indiv́ıduo, do ambiente e da tarefa. Assim, também cabe ao fisiotera- peuta, identificar que condições podem ser modificadas nesta tŕıade para aprimorar o desenvolvimento neuropsicomotor infantil. Este caṕıtulo motiva-se no fato de que mesmo com todo o avanço e respaldo tecnológico para se obter dados objetivos e mensurações, ainda existem questões subjetivas e qualitativas muito importantes à atuação do Fisioterapeuta, uma delas é o desenvolvimento neuropsicomotor. O fisio- terapeuta precisa reconhecer quando há desvios no desenvolvimento, prin- cipalmente nas condições patológicas em que a atividade reflexa (predomi- nantemente a tônica) permanece e impede a evolução motora voluntária. Além disto, o desenvolvimento neuropsicomotor repercute em outras ques- tões do desenvolvimento, pois é a base para o desenvolvimento cognitivo e para o aprendizado escolar (Mansur & Neto, 2006). O objetivo deste caṕıtulo é descrever brevemente o desenvolvimento motor t́ıpico e relatar as alterações no desenvolvimento at́ıpico, mais espe- cificamente na Paralisia Cerebral (PC). Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 3 2. Fundamentação Teórica O objetivo principal da Fisioterapia é promover e restaurar a funciona- lidade. Segundo Gusman & Torre (2006) o fisioterapeuta, por meio de seu diagnóstico, identifica os distúrbios cinéticos-funcionais prevalentes, elabora a programação progressiva dos objetivos fisioterapêuticos, elege e aplica recursos e técnicas mais adequadas e mantém o controle da evolução cĺınica. Salienta-se a importância da atuação do fisioterapeuta nos diferentes ńıveis de complexidade de atenção à saúde. O profissional está presente desde o ńıvel da baixa complexidade, onde atua na promoção da saúde, até a média complexidade, como na reabilitação em cĺınicas, e a alta comple- xidade, como nas unidades de terapia intensiva. As tendências atuais em saúde são de se retirar o foco do conceito de doença (prevenção) e visualizar um ser humano biopsicossocial (promoção da saúde). Para Czeresnia & Freitas (2003) a principal diferença encon- trada entre prevenção e promoção está no olhar sobre o conceito de saúde. Na prevenção a saúde é vista simplesmente como a ausência de doenças. Na promoção, a saúde é encarada como um conceito positivo e multidi- mensional, que resulta em um modelo participativo de saúde na promoção em oposição ao modelo médico de intervenção. Segundo esta visão, a importância da avaliação ou do diagnóstico fi- sioterapêutico, além de determinar o grau de comprometimento ou déficit funcional do indiv́ıduo doente, também está em realizar o levantamento dos fatores determinantes para a saúde do indiv́ıduo saudável ou vulnerá- vel (por exemplo, nos recém-nascidos prematuros). O diagnóstico fisioterapêutico é subśıdio para que se trace uma conduta de intervenção, cuja finalidade é habilitar o indiv́ıduo e capacitá-lo a man- ter sua independência funcional. Uma avaliação correta é fundamental, pois é ela que fornece o diagnóstico fisioterapêutico preciso que, por sua vez, estabelece as diretrizes para a intervenção adequada e individualizada (Levitt, 1995). Quando se trabalha com crianças que apresentam alteração ou defasa- gem do desenvolvimento motor, para que se realize um diagnóstico é neces- sário conhecer o desenvolvimento t́ıpico e assim, reconhecer o at́ıpico. Para tal, as etapas do desenvolvimento infantil servem como guia no processo de diagnóstico, prevenção e promoção em saúde e reabilitação (Gusman & Torre, 2006). 3. Metodologia Este caṕıtulo caracteriza-se por ser um estudo de discussão e revisão da literatura. Para tal, realizou-se uma revisão a cerca do desenvolvimento motor t́ıpico, agrupando dados relevantes da evolução motora da criança 4 Forti-Bellani & Castilho-Weinert no primeiro ano de vida. Procurou-se estabelecer subśıdios qualitativos representativos desta evolução, que sirvam como parâmetros de suspeita ou reconhecimento do atraso do desenvolvimento motor. Posteriormente discutiu-se alguns conceitos sobre PC, e relatou-se bre- vemente a sua caracterização e a provável evolução do desenvolvimento at́ıpico nesta população. Na busca de um aprofundamento a cerca do tema correlacionou-se a intervenção em fisioterapia neuropediátrica para o tratamento da PC ba- seada nas teorias modernas de comportamento e aprendizagem motora. 4. Discussão 4.1 O desenvolvimento motor típico O desenvolvimento motor, descrito por vários autores como Diament et al. (2010), Levitt (1995), Bly (1994), Bobath (1971), Milani-Comparetti & Gidoni (1967) e outros, serve como guia e parâmetro para que se avalie a alteração e a disfunção que a criança com distúrbio neurológico pode apresentar no funcionamento do seu Sistema Nervoso Central (SNC). Segundo Gusman & Torre (2006), ao longo do desenvolvimento motor infantil, a grande variabilidade de movimentos é normal e a diminuição desta variabilidade leva a suspeitar de sinais patológicos. As mudanças durante o primeiro ano de vida são as mais importantes modificações, onde se processam os maiores saltos evolutivos em curtos peŕıodos de tempo (Bly, 1994). No primeiroano, a criança passa de uma posição horizontal para uma posição vertical, quando aprende a se mover contra a gravidade (caminhar) (Levitt, 1995). Também é nesta faixa etária motora que se encontram a maior parte das crianças que possuem atrasos motores, devido à permanência de reflexos tônicos (Levitt, 1995). As modificações nos marcos do desenvolvimento t́ıpico geralmente são percebidas e relatadas pela literatura mês a mês, de forma que as crianças podem ser classificadas como pertencentes a uma determinada faixa etária motora (Flehmig, 2005; Bly, 1994). Segundo Castilho-Weinert & Lopes (2010), para determinar a faixa etária motora se considera a presença dos seguintes critérios que compõem o desenvolvimento t́ıpico: reações, reflexos, planos de movimento, padrões de movimento e habilidades motoras voluntárias (Figura 1). Cada um destes critérios pode assumir diferentes caracteŕısticas, com variações mês a mês. Estes critérios são analisados para que o fisioterapeuta determine a faixa etária motora de seu paciente ou cliente, e verifique se esta é condizente com sua idade cronológica, ou se há defasagem (Castilho- Weinert & Lopes, 2010). A Figura 1 apresenta os principais marcos do desenvolvimento t́ıpico agrupados segundo estas categorias. Um reflexo pode ser conceituado como uma mesma resposta motora a um determinado est́ımulo sensorial. Os reflexos são movimentos simples, Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 5 Figura 1. Marcos do desenvolvimento t́ıpico. 6 Forti-Bellani & Castilho-Weinert cujo controle motor é realizado principalmente pela medula, e, algumas vezes com modulação mesencefálica. Ao longo do desenvolvimento t́ıpico eles são suprimidos ou substitúıdos por reações automáticas (Papalia et al., 2000). As reações são movimentos automáticos controlados pelo mesencéfalo e que incluem padrões ŕıtmicos, já bem aprendidos, como a mastigação, a preensão e até mesmo a marcha. As reações posturais de equiĺıbrio, prote- ção e retificação, são movimentos ativos ou mudanças de tônus automáticas. Estas atuam em conjunto para fornecer o mecanismo de controle postural normal, cujo papel é fundamental para que o movimento voluntário ocorra (Shumway-Cook & Woollacott, 2001). Os padrões de movimento se referem às posturas adotadas para pos- sibilitar a execução das habilidades motoras, tais como: supino, prono, sentado, gatas, em pé, entre outros. Estes padrões dependem do com- ponente neuromaturacional e permitem o ajuste e a adaptação de acordo com o contexto. Desta forma, os padrões motores básicos, inerentes a todos, ocorrem pelos mecanismos de feedback e feedforward. O feedback fornece as pistas sensoriais necessárias e o feedforward realiza os ajustes posturais antecipados, após a automatização do feedback (Shumway-Cook & Woollacott, 2001). As habilidades motoras se referem aos movimentos com controle corti- cal, que demandam intenso aprendizado motor, e são o foco principal da intervenção do fisioterapeuta. Estas são consideradas o ńıvel mais elevado de controle motor (Papalia et al., 2000). Os planos de movimento fazem parte de uma categoria que tem mere- cido atenção recentemente e dizem respeito à aquisição de movimentos nos planos sagital, coronal e transverso. Somente após dominar o plano trans- verso é que se consegue realizar movimentos complexos, como as rotações, e até mesmo a escrita (Castilho-Weinert & Lopes, 2010). Todos estes itens abordados na Figura 1 possuem relação direta com o desenvolvimento motor importante que ocorre no primeiro ano de vida. Por exemplo, a criança quando nasce responde ao meio ambiente de maneira reflexa. Isto ocorre porque o SNC ainda é imaturo e as vias da motricidade voluntária não possuem mielinização suficiente na cápsula interna para que o córtex motor tenha ação principal. Assim, mesmo que intencional qualquer resposta será meramente reflexa, comandada pela medula e pelo mesencéfalo. Durante seu amadurecimento o SNC estabelece novas sinapses, e pro- gressivamente o comportamento motor se transforma. Alguns reflexos se automatizam e se transformam em reações (como o reflexo de sucção que se transforma no sorver voluntário). As reações de equiĺıbrio, proteção e retificação evoluem e proporcionam estabilidade para que os padrões de movimento voluntários se estabeleçam (Lent, 2010). Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 7 Ao mesmo tempo, durante a movimentação espontânea a criança ad- quire mobilidade nos diferentes planos de movimento. Inicialmente domina o plano sagital pelo desenvolvimento da extensão e da flexão em prono e supino, respectivamente. Posteriormente o plano coronal, com as transfe- rências de peso latero-laterais, por exemplo. Por último, adquire o plano transverso ou rotacional. Este proporciona os movimentos de dissociação que são imprescind́ıveis para as transferências de postura, para a marcha cruzada, entre outras habilidades (Flehmig, 2005). Na sequência deste caṕıtulo aborda-se os principais aspectos motores evolutivos do desenvolvimento motor t́ıpico durante o primeiro ano de vida. Agrupou-se os dados da seguinte forma: recém-nascido (do primeiro ao vi- gésimo oitavo dia de vida), primeiro trimestre (do ińıcio do primeiro ao final do terceiro mês), segundo trimestre (ińıcio do quarto ao final do sexto mês), terceiro trimestre (ińıcio de sétimo ao final do nono mês) e, por úl- timo, o quarto trimestre (ińıcio do décimo até o final do décimo segundo mês de vida). Considerou-se o recém-nascido um bebê t́ıpico quando nas- cido a termo, ou seja, entre trinta e oito e quarenta e duas semanas de idade gestacional. 4.1.1 O recém-nascido O recém-nascido possui como caracteŕıstica fisiológica a hipotonia de tronco que facilita sua passagem pelo canal de parto materno e a hipertonia flexora apendicular oriunda no crescimento e na permanência no útero da mãe (Diament et al., 2010). Em supino sua cabeça encontra-se lateralizada, e observa-se retração da cintura escapular, com elevação, adução e rotação externa ou interna dos ombros. Há flexão de cotovelos com pronação de antebraços, flexão de pu- nhos e dedos, e adução de polegares. Os membros superiores movimentam- se em bloco e as mãos podem se abrir, porém os polegares são menos mó- veis e muitas vezes encontram-se aduzidos dentro das palmas das mãos. Os membros inferiores são mais móveis e apresentam flexões e extensões alternadas. A pélvis fica em retroversão com os membros inferiores fletidos sobre o abdômen, quadris em abdução e rotação externa, flexão de joelhos, dorsiflexão dos tornozelos e inversão dos pés. No puxado para sentar, a cabeça cai para trás sem controle, os braços, a coluna lombar e o tronco permanecem em flexão (Bly, 1994). Em prono o peso do corpo se encontra mais transferido sobre a cabeça e o tronco superior. Isto impede a ampla mobilidade dos membros superiores. Há flexão dos membros inferiores com os quadris sem tocar o plano de apoio. O bebê pode virar a cabeça para liberar as vias aéreas e levantá-la por alguns segundos (Flehmig, 2005). Embora o recém-nascido assuma este comportamento na maioria das vezes, ele não é um ser estático, pois realiza movimentos amplos, variados, 8 Forti-Bellani & Castilho-Weinert e normalmente estereotipados. Esta movimentação é reflexa, pode ser in- tencional pela variedade de adaptação às exigências do ambiente, mas é involuntária (Shepherd, 1996). Os principais reflexos observados na avaliação do recém-nascido são: de sucção, dos quatro pontos cardeais, de Moro, de preensão tônica pal- mar e plantar, de liberação de vias aéreas, de Galant, de sustentação do membro inferior, de colocação do membro e de marcha automática. O Reflexo Tônico Cervical Assimétrico (RTCA) pode estar presente, porém quando aparece é fraco,ocasional e não interfere na habilidade do bebê colocar à mão na boca. Observa-se também a reação cervical de retificação (Shepherd, 1996). 4.1.2 O primeiro trimestre Em prono o reflexo de liberação das vias aéreas evolui para a reação labi- ŕıntica de retificação. Progressivamente, com a elevação da cabeça se ativa os músculos extensores de tronco e diminui-se o padrão flexor. A descarga de peso desce em direção ao abdome e no final deste trimestre, há controle cefálico, descarga de peso dos membros superiores nos antebraços, e estabi- lidade da cintura escapular. Ainda há encurtamento de flexores de quadril com abdução e rotação externa de coxo-femoral (Bly, 1994). Em supino, pela mobilidade frente à gravidade, o padrão flexor fisioló- gico diminui aos poucos. O marco deste trimestre é a presença do RTCA que confere uma caracteŕıstica assimétrica ao bebê. No final do trimestre a cabeça e os membros superiores estão na linha média, pois o RTCA de- saparece. Há chutes alternados que causam trabalho ativo dos abdominais (Shepherd, 1996). Ocorre evolução da reação labiŕıntica de retificação, que repercute em uma melhora progressiva do controle cervical. No final do trimestre, no pu- xado para sentar a cabeça acompanha o movimento. Há também aumento do controle extensor em prono, do controle flexor em supino, e transferência de peso no sentido ântero-posterior, no plano sagital (Bly, 1994). Neste trimestre diminuem os reflexos de sucção, dos quatro pontos car- deais, de Moro e de preensão tônica palmar. Os reflexos de sustentação, colocação e marcha automática desaparecem, e a reação labiŕıntica de reti- ficação surge e se fortalece. Ainda, o RTCA fica evidente, mas desaparece ao longo do trimestre. Deve-se ressaltar que é positivo encontrar posturas assimétricas, devido ao RTCA, mas estas devem ser suprimidas no final do trimestre (Flehmig, 2005). 4.1.3 O segundo trimestre Este é um trimestre extremamente significativo para a aquisição de com- ponentes indispensáveis ao desenvolvimento de um comportamento motor coordenado e sinérgico. Durante este peŕıodo as reações posturais estão Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 9 em pleno desenvolvimento e a criança experimenta as sensações de trans- ferência de peso latero-lateral (plano coronal ou frontal) e de rotações de tronco (plano transversal) (Bly, 1994). Chama-se atenção para a substituição da reação cervical de retificação, existente desde o nascimento, pela reação corporal de retificação. Esta reação proporciona que a criança passe de supino para decúbito lateral e para prono, por meio da rotação do tronco (Flehmig, 2005). Observa-se isto espontaneamente quando se coloca um brinquedo ao lado da criança e ela roda a cabeça e o tronco roda simultaneamente com dissociação de cinturas. Em supino verifica-se as mãos na linha média, a extensão dos cotovelos contra a gravidade, a retirada da cabeça do plano de apoio, a ponte, a colocação das mãos nos joelhos e nos pés, o levar os pés à boca, e o rolar para decúbito lateral e para prono (Shepherd, 1996). Em prono ocorre a posição de balconeio dos membros superiores. O peso do corpo se transfere para a pelve, desenvolve-se a anteroversão e ocorre a liberação de um membro superior para explorar o ambiente, com descarga de peso no hemicorpo contralateral. Observa-se também a posição de avião, a descarga de peso nas mãos com cotovelos estendidos, a reação de anf́ıbio, o pivoteio e o treino da posição de gatas (Shepherd, 1996). É comum que a partir do anf́ıbio a criança inicie o sentar lateral, pela transferência de peso a partir dos MMSS. No final deste trimestre passa para sentada de maneira independente e mantém-se nesta posição com au- mento da cifose dorsal, da base de sustentação e com os membros inferiores em abdução e rotação externa de quadril. Apóia-se nas mãos à frente do corpo por meio da reação de proteção pra frente (Bly, 1994). A partir do quarto mês observa-se uma tentativa de endireitamento du- rante a suspensão ventral. Nesta posição, a partir do quinto mês verifica-se a cabeça alinhada com o tronco e o tronco alinhado com os membros infe- riores em extensão. Esta é uma tentativa de vencer a gravidade conhecida como reação de Landau. Quando isto ocorre a criança passa a sustentar o peso nos membros inferiores quando colocada em ortostase, o que signi- fica um evidente fortalecimento de seus músculos antigravitacionais e um amadurecimento dos seus sistemas neurofisiológicos (Flehmig, 2005). Este peŕıodo caracteriza-se pela simetria corporal, com variedade de padrões motores e ampla mobilidade nas posições supina e prona. Isto se deve ao aumento das reações posturais e à aquisição dos planos sagital e transversal, que proporcionam as transferências e as dissociações. Este pe- ŕıodo é importante para a exploração do meio ambiente e tem repercussões significativas nos peŕıodos subsequentes (Bly, 1994). Entre os reflexos apenas o de preensão tônica plantar permanece, porém mais fraco. A reação corporal de retificação em supino, de anf́ıbio em prono, de Landau na suspensão ventral, e de proteção para frente no sentado, são 10 Forti-Bellani & Castilho-Weinert eventos significativos e que devem ser observados neste trimestre (Flehmig, 2005). 4.1.4 O terceiro trimestre Este trimestre é um peŕıodo de ampla exploração, em que a criança possui controle dos três planos de movimento. Ela já não permanece muito tempo em supino e, se assim colocada, rola para prono com dissociação de cin- turas. O engatinhar ocorre inicialmente de forma primitiva e depois com dissociação de cinturas. A criança senta nos calcanhares, senta de lado, passa para ajoelhada e semi-ajoelhada e, segurando-se nos móveis, fica em ortostase (Flehmig, 2005). Neste peŕıodo a criança refina suas reações posturais, possui bom equiĺı- brio sentado e tem grande liberdade de movimento de tronco e em membros superiores. Ocorre descarga de peso nos membros superiores, estabilidade em cintura escapular e trabalho da musculatura intŕınseca da mão. As mãos se moldam aos objetos pelo mecanismo de feedforward. Senta-se em long- sitting funcional e apresenta a reação de proteção para os lados. Também pode sentar-se entre os calcanhares (em W), e isto faz parte das variações do comportamento motor t́ıpico, porém nem todas as crianças têm esta tendência. Quando em ortostase transfere peso para lateral e ativa os mús- culos plantares intŕınsecos, pois não há mais o reflexo de preensão tônica plantar (Bly, 1994). 4.1.5 O quarto trimestre Neste trimestre a criança aperfeiçoa a posição de ortostase, surge a re- ação de proteção para trás nos membros superiores, há transferência de peso e passos para a lateral com apoio, e, finalmente realiza a marcha in- dependente. A marcha inicial ocorre com a base de sustentação alargada, abdução e rotação externa da coxo-femoral, elevação dos membros superio- res e fixação da cintura escapular. A criança tem este comportamento para aumentar a sua estabilidade, pois neste momento suas reações de equiĺıbrio ainda precisam ser aprimoradas (Bly, 1994). No final deste peŕıodo a maioria das crianças t́ıpicas deambula. Porém, há uma preferência pelo engatinhar, que possibilita uma exploração mais rápida do mundo que a rodeia (Flehmig, 2005). 4.1.6 Considerações gerais sobre o desenvolvimento típico Embora esta sequência do desenvolvimento t́ıpico seja um consenso entre a maioria dos autores, sabe-se que o desenvolvimento motor depende de questões neuromaturacionais, genéticas e ambientais. Assim, durante a avaliação da criança estas caracteŕısticas também devem ser consideradas (Shumway-Cook & Woollacott, 2001; Papalia et al., 2000; Newell, 1991). Qualquer fator que interfira nas questões orgânicas eambientais da cri- ança pode repercutir no seu comportamento motor. Por exemplo, uma cri- Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 11 ança t́ıpica sem a experiência da posição prona, provavelmente terá atraso na reação labiŕıntica de retificação nesta postura. Da mesma forma, uma criança t́ıpica que não explora o ambiente e não interage com o mesmo, pode ter um atraso na aquisição dos marcos básicos do desenvolvimento, se comparada àquela que teve esta oportunidade. Ainda, qualquer lesão que interfira na evolução neuromaturacional das áreas motoras do encé- falo, provoca repercussão no desenvolvimento e no comportamento motor (Fonseca & Lima, 2008; Levitt, 1995). 4.2 Paralisia cerebral A PC é caracterizada por uma lesão no SNC em desenvolvimento que cursa com alteração no comportamento motor. Alguns autores consideram-na como uma desordem do tônus, da postura e do movimento. Esta é uma lesão não progressiva e estática, porém com repercussões cĺınicas mutáveis (Bax et al., 2005). Deve-se compreender que as causas da PC ocorrem nos peŕıodos pré, peri ou pós-natal. Nesta época o SNC é um sistema imaturo que sofre uma agressão e continua a se desenvolver na presença de uma lesão. Esta é uma situação complexa, pois envolve sintomas patológicos em um contexto de desenvolvimento do SNC (Rosenbaum et al., 2007). 4.2.1 Classificações da paralisia cerebral A classificação cĺınica da PC embasa a intervenção cĺınica, bem como a compreensão e a troca de informações entre os diferentes profissionais que atuam com estas crianças. Porém, para Ostenjo et al. (2003), crianças com classificações similares têm padrões de comportamento motor distin- tos. Isto se deve a assimetria das lesões e às respostas individuais dos or- ganismos que recebem influências dos aspectos neuromaturacionais e plás- ticos do SNC, da genética, da demanda do meio ambiente e dos aspectos sensoriais, perceptivos e cognitivos próprios. A classificação usual da PC é baseada tanto na qualidade quanto na distribuição topográfica do tônus (Shevell et al., 2009), e foi inicialmente sugerida pelo casal Bobath. 4.2.1.1 Tipos de tônus em paralisia cerebral Na PC o tônus pode ser classificado em espasticidade, hipotonia, flutuações, ataxia e misto (Diament et al., 2010; Fonseca & Lima, 2008), conforme se segue: Espasticidade: é uma condição cĺınica relacionada à lesão de neurônios da via córtico-espinhal (antiga via piramidal) que modula os mo- toneurônios no corno ventral da medula espinhal. O paciente com espasticidade apresenta aumento de tônus, acompanhado de hiperre- flexia, e resistência ao movimento passivo que varia de acordo com o 12 Forti-Bellani & Castilho-Weinert grau de hipertonia. Clinicamente, a observação mostra que a espasti- cidade pode mudar de grau, relacionar-se à qualidade do movimento, e se expressar em padrões diferentes de acordo com o movimento vo- luntário e com o posicionamento assumido. Esta alteração de tônus aparece normalmente a partir dos quatro meses de idade e pode ser leve, severa ou moderada. Há uma tendência preferencial que a es- pasticidade flexora seja mais evidente nos membros superiores e a extensora nos membros inferiores; Hipotonia: é o tônus postural baixo, com co-contração insuficiente de tronco e pescoço, o que impede a aquisição de posturas frente à gra- vidade. O corpo apresenta-se excessivamente no plano de apoio, e há falta de alinhamento devido a uma insuficiente estabilidade proxi- mal. Em PC é normalmente um estado transitório, cuja persistência pode ser sinal de atraso cognitivo ou prognóstico reservado; Flutuações ou Atetoses: são um grupo de alterações de tônus variável, cujo prejúızo motor é resultado da lesão nos núcleos da base, ou nas vias aferentes e eferentes a estes núcleos. A principal caracte- ŕıstica deste grupo é a alteração no planejamento da função motora com consequentes movimentos involuntários associados ao quadro cĺınico. Pode se manifestar de maneiras diferentes. Na atetose pura o tônus varia de normal para baixo, há presença de movimentos involuntários mais distais, sem grandes prejúızos nas reações de ba- lance (equiĺıbrio, proteção e retificação). Na coreoatetose ou atetose com coréia o tônus varia de baixo para alto, há presença de mo- vimentos involuntários mais proximais e maior prejúızo nas reações de balance. Na atetose com distonia ocorrem mudanças repentinas no tônus que varia de hipertônico para hipotônico, com flutuações extremas, grande assimetria e influência do RTCA. Os movimentos involuntários são proximais e normalmente em grandes amplitudes, e as reações de balance são ausentes ou inadequadas. Na atetose com espasticidade o tônus flutua entre aumentado e normal, ocorre espasticidade proximal e movimentos involuntários distais; Ataxia: normalmente está associada a uma lesão cerebelar e caracteriza- se pelo tônus postural baixo, falta de co-contração, incapacidade de manter posturas e grande instabilidade durante o movimento. Há alteração na coordenação motora, com padrões de movimentos sem seletividade, tremor, dismetria, disdiadococinesia, oscilação de cabeça e tronco, marcha com a base alargada e nistagmo. Pode haver associação com a espasticidade; Misto: a maioria dos pacientes possui mais de um tipo de tônus. É co- mum se observar que na região axial (tronco), o tônus seja diferente daquele observado na região apendicular (membros) Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 13 4.2.1.2 Topografia funcional e paralisia cerebral A classificação topográfica clássica em PC diz respeito ao local de predo- mı́nio da atividade tônica e está relacionada com a espasticidade. Embora classificações como triplegia e dupla-hemiparesia sejam descritas na lite- ratura as classificações mais usualmente utilizadas são as que se seguem (Fonseca & Lima, 2008; Bobath, 1971): Hemiparesia: quando há comprometimento de apenas um hemicorpo, membro superior, tronco e membro inferior e, usualmente, o prejúızo é mais acentuado no membro superior; Diparesia: quando há comprometimento de tronco, membros superiores e membros inferiores, porém o prejúızo é mais evidente em tronco inferior e membros inferiores; Quadriparesia: quando há envolvimento global dos membros superiores, inferiores e do tronco e, não raramente, os membros superiores são mais comprometidos do que os inferiores. Convém ressaltar que inicialmente o casal Bobath classificou topogra- ficamente o tônus em hemiplegia, diplegia e quadriplegia. Porém, atual- mente estas expressões são utilizadas somente quando há comprometimento dos segmentos corporais como descrito anteriormente, somado a ausência de movimento voluntário. A plegia é considerada a total falta de força para a realização da movimentação ativa. Como exemplo, um hemiplégico é aquele indiv́ıduo com acometimento em um hemicorpo e com a total au- sência de movimento voluntário nos segmentos afetados. Se houver alguma movimentação ativa preservada, o indiv́ıduo será um hemiparético. 4.3 Desenvolvimento motor típico e atípico e a paralisia cerebral A função do SNC em relação à motricidade é proporcionar a habilidade do movimento, as atividades especializadas, e manter simultaneamente a postura e o equiĺıbrio (Bobath, 1971). Para se executar isto com elegância, fluidez e uma base de sustentação em relação às variações do centro de gravidade são necessários diferentes mecanismos de controle motor. Es- tes mecanismos são acionados para que se tenha mobilidade, estabilidade (equiĺıbrio estático), mobilidade controlada (transferência de peso e disso- ciações) e habilidade. Tais elementos do controle motor são dependentes do tônus postural normal, da variedade de interação entre as forças mus- culares opostas com ação da inervação rećıproca e davariedade de padrões de postura e movimentos que são a herança comum do homem (neuroma- turacional, genética e ambiental) (Shumway-Cook & Woollacott, 2001). A evolução fisiológica neuromaturacional do SNC, em relação às es- truturas do controle motor, provoca o desenvolvimento e capacita para a ocorrência dos atos motores. Este desenvolvimento motor, entre outros fa- tores, também estimula a evolução do SNC que evolui e adapta as destrezas adquiridas de acordo com a demanda do meio ambiente (Lent, 2010). 14 Forti-Bellani & Castilho-Weinert Quando há lesão no SNC, como na PC, há falha ou interrupção em um sistema neuromaturacional em pleno desenvolvimento. O resultado disto é a ocorrências de padrões motores at́ıpicos em competição com os padrões t́ıpicos. Quando os primeiros prevalecem, as alterações do comportamento motor observável tendem a ser limitantes e prejudicam o desenvolvimento global da criança (Fonseca & Lima, 2008). Embora se utilize o termo at́ıpico para designar os padrões inadequados e compensatórios que se observa em crianças com alterações neurológicas, deve-se lembrar que estes são resultados de um SNC que tenta se adaptar a uma situação inesperada (Rosenbaum et al., 2007; Bax et al., 2005). A Tabela 1 representa um paralelo entre o desenvolvimento motor t́ıpico e o at́ıpico. Compara-se as principais aquisições que são observáveis na evolução motora durante o primeiro ano de vida. Ao observar-se uma criança t́ıpica durante o primeiro trimestre do seu desenvolvimento verifica-se que ela tem intensa atividade reflexa, apresenta posturas assimétricas, desenvolve a flexão em supino, melhora a extensão em prono, e possui algum controle cefálico pela reação labiŕıntica de retifi- cação. Há harmonia nos seus movimentos, e os planos coronal e transverso ainda não estão presentes. No desenvolvimento at́ıpico, principalmente nos quadros mais leves, o primeiro trimestre se assemelha ao da criança t́ıpica (Flehmig, 2005). O segundo trimestre é um peŕıodo importante para a detecção de risco de lesão no SNC ou atraso no desenvolvimento. Neste peŕıodo ocorrem aquisições motoras, reações posturais, transferências de peso e rotações de tronco. A criança com PC tem dificuldades de ultrapassar este peŕıodo. É comum que seu desenvolvimento fique estagnado no primeiro trimestre do desenvolvimento t́ıpico, onde realiza movimentos apenas no plano sagital, devido a sua grande instabilidade postural (Flehmig, 2005; Levitt, 1995). Tabela 1. Caracteŕısticas do desenvolvimento motor t́ıpico e at́ıpico. Desenvolvimento motor t́ıpico Desenvolvimento motor at́ıpico Reflexos primitivos são suprimidos Permanência de reflexos primitivos Reações de balance integradas Insuficiência de reações de balance Normotonia Hipotonia, hipertonia ou flutuação Ausência de reflexos tônicos Presença de reflexos tônicos Movimentos em padrões sinérgicos, coordenados e variados Movimentos estereotipados, pobres, sem seletividade Desenvolve habilidades motoras Dificuldade nas habilidades motoras Variedade de movimentos Padrões compensatórios e fixações Sem encurtamentos e deformidades Alterações músculo esqueléticas Controla três planos de movimento Não aquisição de algum plano Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 15 As Figuras 2 e 3 apresentam padrões at́ıpicos em supino e prono, que são observados no desenvolvimento de crianças com lesão no SNC. Figura 2. Comportamentos no desenvolvimento at́ıpico em supino. Adaptado de Levitt (1995). Figura 3. Comportamentos no desenvolvimento at́ıpico em prono Adaptado de Levitt (1995). A extensão do déficit funcional na PC depende da época, da locali- zação e do grau da lesão encefálica. De maneira geral, ocorre atraso ou 16 Forti-Bellani & Castilho-Weinert interrupção no desenvolvimento sensoriomotor, com mecanismos de rea- ções posturais insuficientes (Diament et al., 2010). Os reflexos primitivos e patológicos exacerbados podem estar presentes, com maior frequência dos reflexos tônicos (Fonseca & Lima, 2008). Com relação ao tônus postural, a criança com PC geralmente apresenta hipotonia axial (principalmente de tronco) e espasticidade ou espasmos intermitentes em região apendicular (membros) (Bobath, 1971). Assim, o tipo de alteração do tônus não é uni- forme em todos os segmentos corporais. Na PC não ocorrem os diferentes graus de inervação rećıproca, e em lugar da variedade de movimentação ocorrem os padrões anormais de coordenação devido à liberação dos pa- drões reflexos anormais (Levitt, 1995). Na PC há deficiência no mecanismo de controle postural normal, com alterações nas reações posturais que são a base estável para a realização dos movimentos contra a gravidade (Cunha et al., 2009). O papel das reações posturais de equiĺıbrio, proteção e retificação são fundamentais ao movi- mento humano. As reações de retificação alinham o olhar, a cabeça sobre o tronco, e o tronco sobre os membros durante os movimentos. Assim, proporciona-se a capacidade de rotação dos eixos corporais para separar o tronco superior do inferior e dissociar os movimentos. As reações de equiĺıbrio causam os ajustes adaptativos corporais durante o deslocamento do eixo da gravidade, e as reações de proteção atuam quando as reações de equiĺıbrio falham, para proteger o corpo das quedas. Na falha destas reações, o produto final é um corpo com poucas possibilidades de movi- mento, pois não há a base postural necessária. Torna-se dif́ıcil realizar as transferências de peso lateralmente, bem como realizar movimentos no plano coronal e transverso. Além da instabilidade postural, a criança com PC pode apresentar a permanência de reflexos primitivos (Flehmig, 2005). Por exemplo, a não exploração do meio, a falta de descarga de peso nas mãos e a alteração do tônus, faz com que o reflexo de preensão tônica palmar permaneça. Isto dificulta ainda mais a exploração manual e todas as atividades perceptivo-motoras que dependem desta. O mesmo ocorre com o reflexo de preensão tônica plantar, cuja permanência dificulta o ali- nhamento do pé no chão, impede a postura de ortostase e inviabiliza a ocorrência da marcha. Outro problema muito comum na PC é a permanência dos reflexos tônicos desencadeados pelo estiramento dos proprioceptores dos músculos e dos ligamentos da cabeça e pescoço. O RTCA impede o alinhamento dos membros superiores, dificulta as atividades em linha média, e causa assimetrias em tronco e membros inferiores (Fonseca & Lima, 2008). O Reflexo Tônico Cervical Simétrico (RTCS) produz o aumento da hipertonia extensora em membros superiores e flexora em membros infe- riores com a extensão da cabeça, e causa flexão dos membros superiores e extensão dos membros inferiores com a flexão da cabeça. Este reflexo é bastante frequente no paciente com diparesia e pode ser observado quando Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 17 este é tracionado para sentado pelos membros superiores e permanece fixo nesta posição com flexão de cabeça e membros superiores, e forte padrão de adução e rotação interna de coxo-femoral. O RTCS também surge quando este mesmo paciente passa para sentado entre os calcanhares (sentado em W) e mantém a cabeça e os membros superiores em extensão. Ressalta-se que este último padrão deve ser evitado ao máximo, por não ser funcional e principalmente pelo risco de subluxação e luxação de coxo-femoral, que torna o prognóstico de marcha obscuro (Shepherd, 1996). O Reflexo Tônico Labiŕıntico (RTL) é um reflexo patológico desenca- deado pelos órgãos otoĺıticos do labirinto durante as mudanças de posição da cabeça no espaço. A flexão da cabeça, que comumente ocorre em prono, leva a um padrão de flexão corporal total; e a extensão, que ocorre com frequência em supino, causa um padrãode extensão total. Este reflexo é sempre associado à hipertonia espástica e aos espasmos intermitentes, e ocorre bastante entre os espásticos quadriparéticos ou mais graves. O RTL causa grande dificuldade nas transferências de postura, pois qualquer movimento de cabeça desencadeia um padrão global corporal (Shepherd, 1996). Quando há interrupção na evolução do SNC, como na PC, a hipotonia fisiológica da criança para a passagem pelo canal de parto perdura. Esta hipotonia proximal resulta em instabilidade de sustentação do alinhamento corporal pela baixa co-contração muscular. Então a criança busca padrões compensatórios de fixações para que consiga algum tipo de movimento e sustentação contra a gravidade. Esta repetição dos movimentos inadequa- dos, com falta de seletividade, e fixações, gera aprendizado inadequado de padrões não funcionais de movimentos, encurtamentos e deformidades. Tais alterações no sistema musculoesquelético podem causar dor, ser es- teticamente inaceitáveis, dificultar o manuseio da criança pelos familia- res, e prejudicar ainda mais a funcionalidade e a exploração do ambiente (Murphy., 2009). A criança com PC com comprometimento leve ou moderado utiliza mecanismos compensatórios para vencer a força da gravidade. Assim, so- licita ação de grupos musculares habitualmente não requisitados, para que consiga a estabilidade que originalmente lhe falta pelo déficit de controle postural de tronco. A repetição na realização destas compensações gera desequiĺıbrios musculares, deformidades, aumento da hipertonia e prejúızo na funcionalidade da criança. A falta de controle de cabeça, tronco superior e tronco inferior faz com que a criança tenha desequiĺıbrios musculares, e consequente alteração nas curvaturas fisiológicas da coluna vertebral, como hipercifose dorsal, retificação lombar e escoliose. A hipercifose prejudica a respiração e a deglutição, dificulta as habilidades manuais, limita o olhar horizontal e prejudica a marcha da criança. A escoliose causa assimetria de tronco, 18 Forti-Bellani & Castilho-Weinert dificulta o sentar e a utilização das mãos, e pode facilitar a luxação do quadril do paciente (Murphy., 2009). Na PC do tipo diplegia espástica é comum haver padrões motores anor- mais. Na coluna ocorre hipercifose dorsal ao sentar, nos membros inferio- res adução e rotação interna de coxo-femoral com flexão de joelhos e pés equino-valgos, e, nos membros inferiores há fixação e flexão na busca de estabilidade, o que dificulta as atividades manuais. Este padrão também pode aparecer na quadriparesia espástica leve, com tendência a assimetria e escoliose, devido à permanência do RTCA. Nos pacientes com hemiparesia as deficiências sensório-motoras, a ne- gligência do lado comprometido e a repetição dos movimentos em padrão flexor de membro superior e extensor de membro inferior, tendem a causar contraturas e deformidades, escoliose de tronco e prejúızo da funcionalidade manual do paciente. Quando ocorre flutação tônica, como nas atetoses e na ataxia, há ins- tabilidade proximal que compromete a utilização funcional dos segmentos distais. Isto causa prejúızo nas habilidades manuais e no controle do tronco contra a gravidade, e pode comprometer a aquisição de habilidades motoras como o sentar e o deambular. O paciente gravemente comprometido, que não consegue desenvolver mecanismos compensatórios para se sustentar contra a gravidade tende a ficar mais restrito às posturas menos evolúıdas, e a permanecer sentado com apoio. 5. Considerações Finais Sabe-se que o aprendizado motor ocorre pela experimentação, pela repe- tição e pela prática das atividades funcionais. Isto ocorre com a criança durante seu desenvolvimento t́ıpico, conforme ela interage com o meio e evoluem as suas capacidades de controle motor. Na criança com PC isto não existe de maneira satisfatória, pois há repetição de atos motores em padrões primitivos, falta seletividade de movimentos, ocorre poucas trans- ferências de peso e rotações de tronco, e permanecem reflexos patológicos associados à movimentação. Isto acarreta em um aprendizado motor ina- dequado e consolida os desequiĺıbrios musculares, e o déficit funcional e de interação social. As teorias modernas sobre o controle motor reconhecem que não é ape- nas o sistema nervoso que amadurece e dita os comportamentos motores. Há uma dependência da interação entre os sistemas orgânicos (nervoso e musculoesquelético) e os est́ımulos do ambiente onde a criança está inse- rida. Ou seja, o controle motor é dependente de questões orgânicas neurais e não neurais, do meio que o rodeia e de variáveis determinadas de acordo com o código genético do indiv́ıduo. Esta teoria, chamada de Teoria dos Desenvolvimento motor típico, atípico e correlações na PC 19 Sistemas Dinâmicos, orienta os profissionais que trabalham em neurorea- bilitação. Ela recomenda que se analisem todas as variáveis relacionadas ao desenvolvimento motor, desde a entrevista com os pais, até a avaliação do paciente e a seleção de parâmetros e técnicas a serem utilizadas. Outro fator que deve ser observado pelos profissionais que trabalham em neurologia é a capacidade que o SNC tem de se adaptar a novas si- tuações, mecanismo conhecido como plasticidade. A neuroplasticidade é um evento fisiológico que ocorre durante toda a vida, mas é mais evidente durante a embriogênese e nos primeiros anos do desenvolvimento. Nela existem eventos macro e microscópicos variados, como a substituição fun- cional de áreas lesadas por outras similares não lesadas e a reorganização das sinapses por mecanismos moleculares espećıficos. Desta forma, um sistema nervoso em desenvolvimento tem maiores chances de se adaptar plasticamente e buscar estratégias de reorganiza- ção após uma lesão. O fisioterapeuta deve estar atento para este evento, estimular as estratégias que reforçam os mecanismos plásticos do SNC e lembrar que: quanto mais precoce se iniciar a intervenção, mais plástico será o sistema nervoso e haverá melhor potencial de recuperação. Com base nestas premissas, uma abordagem efetiva em PC deve: con- siderar o meio onde o indiv́ıduo está inserido como parte de sua avaliação e intervenção, buscar a automatização do aprendizado motor durante a terapia, despertar o interesse da criança com atividades lúdicas prazero- sas e adequadas ao seu desenvolvimento cognitivo, orientar aos familiares e cuidadores sobre manuseios e posicionamentos, reforçar a importância dos pais assistirem aos atendimentos de seus filhos para que possam dar continuidade ao processo. Conclui-se que o estudo do desenvolvimento t́ıpico possibilita identificar e intervir precocemente nas situações em que há atraso no desenvolvimento. A compreensão da sequencia do desenvolvimento motor t́ıpico permite de- terminar a faixa etária motora da criança. Isto é fundamental, pois na terapia deve-se estimular o paciente a evoluir para a próxima faixa, ou idade motora. Assim, o conhecimento das etapas do desenvolvimento elu- cida quais são as próximas habilidades motoras que devem ser estimuladas e que reflexos devem ser suprimidos durante o tratamento. Reforça-se que a estabilidade é a base do movimento voluntário, e não adianta treinar a função motora se não há postura para realizá-la. O estabelecimento das reações automáticas é o que proporciona a ocorrência das posturas de base, como o controle de cabeça e tronco, que são indispensáveis à estabilidade e à função. 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Philadelphia, USA: Lippincott Williams & Wilkins, 2001. Willrich, A.; Azevedo, C.C.F. & Fernandez, J.O., Desenvolvimento motor na infância: influência dos fatores de risco e programas de intervenção. Revista Neurociências, 17(1):51–56, 2009. 22 Forti-Bellani & Castilho-Weinert Notas Biográficas Luciana Vieira Castilho-Weinert é Fisioterapeuta (PUC-PR, 2003), Espe- cialista em Fisiologia Humana e da Nutrição (PUC-PR, 2006), Mestre e Doutor em Ciências – Engenharia Biomédica (UTFPR, 2004 e 2010, respectivamente) e tem formação pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é Professor Adjunto da UFPR – Setor Litoral, no Curso de Fisioterapia. Claudia Diehl Forti-Bellani é Fisioterapeuta (ULBRA-RS, 2001), Mestre em Ciências Biológicas – Neurociências (UFRGS, 2005) e tem formação pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath. Atualmente é coordenadora e docente do Curso de Pós- Graduação Lato Sensu em Neurologia com ênfase em Neuropediatria do IBRATE. Capítulo 2 Escalas de Avaliação do Desenvolvimento e Habilidades Motoras: AIMS, PEDI, GMFM E GMFCS Tainá Ribas Mélo ∗ Resumo: O desenvolvimento motor é caracterizado por mudanças qualitativas e quantitativas de ações motoras ao longo da vida. As- sim, o objetivo deste caṕıtulo é elucidar as principais caracteŕısticas e aplicabilidade de algumas escalas relacionadas ao desenvolvimento motor: AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS. Além disto, busca-se esti- mular a utilização de tais escalas pelos profissionais de reabilitação. O material utilizado foi obtido por acesso a livros e artigos publi- cados entre os anos 2000 e 2011, nos portais PUBMED e SciELO. Pode-se observar que a escolha e a utilização do instrumento de- pendem tanto dos objetivos quanto da população alvo. As escalas de avaliação são ferramentas cĺınicas importantes. No entanto, não se deve desconsiderar a experiência e o julgamento cĺınico do tera- peuta. Palavras-chave: Desenvolvimento motor, Escalas, Avaliação. Abstract: The motor development has qualitative and quantitative changes of motor activities throughout life. This chapter aims at presenting the main topics and the applicability of some scales rela- ted to the motor development: AIMS, PEDI, GMFM and GMFCS. Besides, we also encourage the use of such scales by the rehabi- litation professionals. The research material was from books and articles published between 2000 and 2011, accessed in PUBMED and SciELO portals. We observed that the choice and the use of those scales depend on the needs and the target population. They are important clinical tools, but one should not ignore the experi- ence and clinical trial of the therapist. Keywords: Motor development, Scales, Assessment. ∗Autor para contato: ribasmelo@gmail.com Castilho-Weinert & Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (2011) ISBN 978-85-64619-01-2 24 Mélo 1. Introdução O desenvolvimento motor é um fenômeno que permeia a vida de todas as pessoas, possibilitando as habilidades motoras e a realização de ativi- dades diárias em padrões de movimento que são adquiridos ao longo da vida. Estes padrões de movimento são caracterizados por duas mudanças fundamentais: o aumento de diversificação e o aumento de complexidade (Mascarenhas, 2008). Na infância o desenvolvimento motor caracteriza-se pela aquisição de um amplo espectro de habilidades motoras que possibilitam à criança um domı́nio do seu corpo em diferentes posturas (estáticas e dinâmicas). Por- tanto, considera mudanças qualitativas e quantitativas das ações motoras do ser humano ao longo de sua vida (Connolly, 2000; Santos et al., 2004). Piper & Darrah (1994) afirmam que o desenvolvimento motor pode ser considerado como um dos melhores indicativos do desenvolvimento e bem estar da criança no seu primeiro ano de vida. Assim, dar atenção ao de- senvolvimento e aos fatores que o influenciam é de extrema importância. Aqueles autores afirmam, ainda, que a avaliação motora do desenvolvi- mento infantil difere dos paradigmas de outras avaliações motoras, porque sua estrutura conceitual tem mais ênfase no processo que no resultado. Portanto, os terapeutas devem usar abordagens modificadas para avaliar o desenvolvimento motor na infância. Assim, o conhecimento das escalas que atendam às diversas demandas referentes à população avaliada e estudada torna-se necessário, não só em ambiente de pesquisa, mas como ferramenta cĺınica importante. Existem várias escalas que avaliam o desenvolvimento infantil t́ıpico ou com alterações.Neste caṕıtulo, aborda-se as escalas AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS, amplamente citadas em pesquisas, e bastante utilizadas na prá- tica cĺınica. O objetivo deste caṕıtulo é elucidar quais as principais ca- racteŕısticas e aplicabilidade destas escalas e estimular sua utilização pelos profissionais de reabilitação, ressaltando a importância de se utilizar men- surações para que a área da Fisioterapia Neuropediátrica tenha respaldo em estudos cient́ıficos. 2. Fundamentação Teórica Inicialmente o bebê é bastante reflexivo (Cole & Cole, 2004) e com o de- senvolvimento, o crescimento e os est́ımulos do meio passa a ser cada vez mais ativo, com movimentação voluntária. Esta movimentação se aperfei- çoa até que com um ano a criança apresente marcos importantes como a deambulação independente e a fala. Vieira et al. (2009) relatam que devido aos avanços tecnológicos há uma diminuição de mortalidade de bebês de alto risco, e em decorrência disto um aumento de incidência de patologias infantis relacionadas ao sofrimento Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 25 pré, peri e pós-natal. Isto causa grande impacto para a saúde e demanda maior atenção a novas formas de abordagem no que se refere à avalia- ção e acompanhamento do desenvolvimento neuropsicomotor. Este fato corrobora a necessidade da atuação preventiva com detecção precoce das anormalidades, por meio de avaliações espećıficas, visando um tratamento adequado. Quando algum fator acarreta lesão no Sistema Nervoso Central (SNC) pode-se esperar a ocorrência de sequelas que afetam o desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) normal, ou numa nomenclatura mais atualizada, o desenvolvimento t́ıpico. Ao considerar este aumento de incidência de patologias infantis, no Brasil, existem programas de acompanhamento (originado do inglês, pro- gramas de follow-up) do crescimento e desenvolvimento do bebê de risco. Estes programas surgiram na década de 80 por meio da iniciativa de pe- diatras e neonatologistas e propõem estratégias de avaliação e intervenção precoce (Vieira et al., 2009). Os profissionais de reabilitação devem possuir um conhecimento apro- fundado sobre o processo das aquisições t́ıpicas do desenvolvimento global da criança, o qual é composto por diversas categorias: tônus muscular, pos- tura, reflexos primitivos, reações posturais, coordenações sensório-motoras e movimentos espontâneos. Além disto, o profissional deve estar familiari- zado com os diversos instrumentos de avaliação existentes, para selecionar o mais adequado para o seu serviço de prevenção, ou reabilitação ou pes- quisa. Devido à escassez de instrumentos padronizados para a avaliação de crianças no Brasil, há a necessidade de utilização de testes e escalas internacionais que, na maioria dos casos, possuem manuais publicados em ĺıngua inglesa (Vieira et al., 2009), sendo que alguns foram traduzidos e/ou têm adaptação cultural, como é o caso da PEDI (Pediatric Evaluation of Disability Inventory). Dentre as patologias infantis que ocasionam alterações no desenvolvi- mento, Stanley et al. (2000) relatam que a Paralisia Cerebral (PC), tam- bém denominada de Encefalopatia Crônica Não-Progressiva da Infância (ECNPI) é a mais comum. Isto motiva estudos para o desenvolvimento de escalas que atendam às capacidades diferenciadas destas crianças. Mascarenhas (2008) investigou dentre as diversas escalas que avaliam o desenvolvimento e as habilidades motoras, quais seriam espećıficas para PC. As escalas PEDI e AIMS (Alberta Infant Motor Scale) avaliam o dé- ficit motor de um modo geral, verificam a função motora independente da doença, e, não são espećıficas para PC. Já as escalas GMFM (Gross Motor Function Measure) e GMFCS (Gross Motor Function Classification Sys- tem) são escalas que podem ser utilizadas na avaliação do déficit motor causado pela PC, de forma espećıfica. Estas duas escalas proporcionam maior coleta de dados, pois permitem o enfoque direto na deficiência mo- tora e a avaliação quantitativa do movimento e de sua evolução. 26 Mélo Para Piper & Darrah (1994), autores da escala AIMS, a GMFM e a PEDI avaliam mudanças em atividades funcionais em crianças com desor- dens neuromotoras, enquanto a AIMS analisa a maturação motora infantil em crianças com desenvolvimento t́ıpico ou em risco. 3. Metodologia O material utilizado foi obtido por meio do acesso as bases de dados PUB- MED e SciELO, pelos unitermos AIMS, PEDI, GMFM, GMFCS, deve- lopmental e cerebral palsy. Foram selecionados artigos e livros publicados entre os anos de 2000 e 2011. 4. Resultados e Discussão Neste estudo descreve-se e discute-se uma revisão sucinta sobre as escalas AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS. Relata-se sua aplicabilidade, seus bene- f́ıcios e alguns estudos que as utilizaram. 4.1 Alberta motor infant scale (AIMS) No departamento de Medicina e Reabilitação da Universidade de Alberta, Canadá, Pipper e colaboradores constrúıram e validaram1 a escala Alberta com o objetivo de avaliar o desenvolvimento motor (Piper & Darrah, 1994). Para validar a escala avaliaram uma amostra de 506 crianças. Esta escala foi publicada em 1994 e tem como objetivo avaliar o desenvolvimento motor amplo, ao longo do tempo, de recém-nascidos a termo e pré-termo, com idade entre zero e dezoito meses. A escala identifica bebês cujo desempenho motor esteja atrasado ou at́ıpico em relação ao grupo normativo. Ela é uma medida observacional da performance motora infantil que aborda conceitos do desenvolvimento motor, tais como: neuromaturação, perspectiva da dinâmica motora e avaliação da sequência do desenvolvimento motor. As crianças que apresentem lesões no SNC podem apresentar desen- volvimento motor dentro do repertório t́ıpico, e a avaliação infantil não deve ter como foco apenas as limitações ou restrições. Assim, é necessário que os profissionais da reabilitação (fisioterapeutas, fonoaudiólogos, tera- peutas ocupacionais, e demais) conheçam as habilidades que as crianças apresentam e de que maneira estas podem ser aperfeiçoadas. A ênfase da avaliação deve ser no processo e não somente no resultado. Isto significa uma mudança de paradigma importante no processo de avaliar e observar o desenvolvimento das crianças (Piper & Darrah, 1994). Dentro desta concepção, o objetivo principal da AIMS é avaliar o desen- volvimento sequencial das crianças com relação ao controle de movimento em quatro posturas ou decúbitos (Saccani, 2009). A escala considera tanto 1 Validade é a adequação de um instrumento. Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 27 aspectos da neuromaturação como da teoria motora dinâmica (Piper & Darrah, 1994). As crianças devem ser avaliadas pela observação de seus movimentos espontâneos, sem restrições, manuseios ou facilitações. Os pais devem estar próximos e os seus próprios brinquedos podem ser utilizados. Caso seja ne- cessário, a avaliação pode ser interrompida e posteriormente retomada. As observações são realizadas em diferentes posturas antigravitacionais (Piper & Darrah, 1994). A escala possui cinquenta e oito itens que avaliam os padrões motores e as posturas utilizando três critérios: o alinhamento postural, os movi- mentos antigravitacionais e a superf́ıcie de contato (sustentação de peso). As sub-escalas da AIMS são então determinadas por cada decúbito: prono, supino, sentado e em pé. A pontuação é anotada como passou ou como falhou e, ao final, os pontos em cada postura são somados em uma pon- tuação total dos itens observados (Manacero & Nunes, 2008). Estes itens são ilustrados com figuras e com a descrição de cada postura, como exem- plificado na Figura 1. Esta pontuação total é então comparada a escores referenciais para a idade de acordo com percentis (Anexo I). A AIMS é uma escala observacional, de fácil aplicabilidade, baixo custoe que não exige manuseio excessivo do lactente. É necessário conhecimento sobre desenvolvimento infantil e prática para a utilização da escala (Al- meida et al., 2008). A escala permite também o aprendizado sobre desen- volvimento ao mesmo tempo em que se aprende a usá-la. Figura 1. Primeiros itens avaliados em supino (Adaptado de Piper & Darrah (1994)). Durante a aplicação da escala pontua-se os itens observados em cada postura ou decúbito (1 ponto para cada item observado). Caso um item não seja observado, mas a criança se encontre num item mais avançado ou mais “maduro”, os itens anteriores mesmo não sendo observados são 28 Mélo computados. Deve-se observar que as posturas evoluem em dificuldade no sentido horizontal da escala, para cada postura. Os itens motores obser- vados no momento da avaliação são considerados como a janela motora da criança. A pontuação final é composta pela soma de pontos obtidos em cada um dos quatro decúbitos. A Tabela 1 apresenta a forma de pontuação da escala. Segundo Piper & Darrah (1994), para calcular a pontuação posicional da criança é necessário: • Identificar o item menos maduro em cada posição; • Identificar o item mais maduro em cada posição; • O item entre o mais e o menos maduro é considerado a janela motora; • Soma-se os pontos para obter uma pontuação posicional; • Soma-se as quatro pontuações posicionais para obter a pontuação final. Tabela 1. Pontuação da escala AIMS. Posturas ou decúbitos Itens prévios creditados Itens creditados na janela Pontuação da sub-escala Prono Supino Sentado Em pé Total de pontos: O instrumento fornece um gráfico (Anexo I) para identificar o percentil do desempenho motor da criança comparada com amostras normativas da mesma idade. No gráfico deve-se utilizar a interseção da idade corrigida da criança (eixo horizontal do gráfico) e a pontuação total da AIMS (eixo vertical). Quanto mais alta a posição do percentil, menos provável será a existência de um atraso (Piper & Darrah, 1994). Quanto às propriedades psicométricas, a AIMS apresenta alta confia- bilidade2 interobservadores (0,96-0,99) e de teste-reteste (0,86-0,99). A sensibilidade varia de 77,3 a 86,4% aos 4 meses e a especificidade é de 65,5% aos 8 meses (Santos et al., 2008). Este é um teste de critério de referência, não de diagnóstico, com a classificação percentual normatizada 2 Confiabilidade representa a consistência ou reprodução dos resultados quando o mesmo grupo de indiv́ıduos é acessado mais de uma vez com o mesmo ins- trumento (mesmo observador em momentos diferentes ou entre observadores diferentes) (Piper & Darrah, 1994). Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras 29 para permitir a determinação de onde o indiv́ıduo se encontra em uma me- dida de habilidade comparado com aqueles do grupo de referência (Vieira et al., 2009). O uso da classificação percentil deve ser feito com cautela, pois uma pequena mudança na pontuação bruta pode resultar em uma grande mu- dança no percentil da classificação. Devido às influências das questões culturais sobre o repertório motor Manacero & Nunes (2008) relataram que enquanto a AIMS não fosse tra- duzida oficialmente seu uso teria limitações com relação à população bra- sileira. Porém, Valentini & Saccani (2011) a validaram nesta população. Saccani (2009) estudou a AIMS em 561 crianças gaúchas encontrando validade e fidedignidade para esta população. Almeida et al. (2008) uti- lizaram a AIMS para a avaliação de prematuros e verificou sua grande utilidade na rede pública de saúde brasileira, tanto para o acompanha- mento do desenvolvimento motor de lactentes prematuros no primeiro ano de vida como para a utilização em pesquisas. Harris et al. (2009) utilizaram a AIMS para comparar com a escala de validação de crianças propostas por estes autores e encontraram boa validade para a mesma. Assim, a AIMS também é utilizada como escala de referência para a elaboração de novas escalas, é abrangente aos profissionais da reabilitação e facilita a comunicação e o trabalho multidisciplinar e interdisciplinar. A escala também é utilizada como forma de acompanhar a evolução do desenvolvimento de crianças submetidas a determinadas intervenções. Silva et al. (2006) utilizaram a AIMS para verificar o efeito das práticas maternas sobre o desenvolvimento de crianças nascidas a termo e saudáveis e observaram que a escala é uma ferramenta útil para este objetivo. Mancini et al. (2002) utilizaram a AIMS e a PEDI para comparar a movimentação espontânea, as habilidades e a independência de crianças a termo e pré-termo. Neste estudo verificaram que na ausência de outros distúrbios, e, com a correção da idade em pré-termos, o desenvolvimento motor pode ser semelhante ao de crianças nascidas a termo. Embora o objetivo da AIMS seja identificar atrasos de desenvolvimento e seu uso seja maior em crianças ditas t́ıpicas ou prematuras, alguns estudos utilizam a escala para caracterizar o perfil de populações com condições especiais. O estudo de Pereira (2008), em lactentes com śındrome de Down, observou com a AIMS que apesar de existir um atraso na aquisição de marcos de referência, o desenvolvimento motor ocorreu de forma crescente e permitiu descrever o perfil de desenvolvimento para esta população. Assim, além da utilização para detectar atrasos e acompanhar a evo- lução do desenvolvimento motor, esta escala também pode ser estudada quanto a sua aplicação em condições especiais de saúde e desenvolvimento. 30 Mélo 4.2 The pediatric evaluation of disability inventory (PEDI) A PEDI, cuja tradução é avaliação pediátrica do inventário de incapacida- des, foi desenvolvida por Haley e colaboradores com o propósito de avaliar as capacidades funcionais e o desempenho t́ıpico em crianças jovens com limitações funcionais (Mascarenhas, 2008). Este instrumento é utilizado para descobrir déficits funcionais, acom- panhar progressos e analisar o resultado de intervenções. A PEDI é um instrumento de avaliação infantil que caracteriza o desempenho funcional de crianças com idade cronológica entre 6 meses e 7 anos e 6 meses. Po- rém, pode ser utilizada quando apesar da idade cronológica ser superior ao limite indicado, o indiv́ıduo apresentar desempenho funcional condi- zente com esta faixa etária. com objetivo de acompanhamento evolutivo da criança (Mancini, 2005; Silva & Daltrário, 2008). De acordo com Mancini et al. (2002) e Silva & Daltrário (2008) o teste PEDI é uma avaliação realizada através de entrevista estruturada com os pais ou responsáveis pela criança, ou através da observação dos profissi- onais. O tempo para observação varia entre 30 e 40 minutos conforme a habilidade do observador. No caso das entrevistas, estas podem durar cerca de 60 minutos ou mais (Mancini, 2005). Este teste foi recentemente traduzido para o português e adaptado para contemplar as especificida- des sócio-culturais do Brasil, com permissão e colaboração dos autores da avaliação original. O perfil documentado pelo PEDI informa três aspectos importantes do desenvolvimento funcional: as habilidades presentes no repertório da criança (parte I), a independência no desempenho de atividades diárias ou a influência do cuidador (parte II) e as modificações do ambiente utilizadas para facilitar o desempenho funcional (parte III). Os construtos de mensuração que deram origem às escalas do teste foram definidos com base nas abordagens desenvolvimental, contextual e ambiental. Eles foram criados a partir de uma versão adaptada do modelo de disfunção proposto pela Organização Mundial de Saúde, e influenciados pela Classificação Internacional de Deficiência, Incapacidade e Limitação Social (Mancini, 2005). A escala possibilita identificar as alterações no desempenho funcional precocemente, pois
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