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51 Habilidades Seções de estudo Capítulo 2 Máquinas térmicas, Entropia e a Segunda Lei da Termodinâmica Seção 1: Máquinas térmicas, refrigeradores e a Segunda Lei da Termodinâmica Seção 2: Ciclo de Carnot Seção 3: Entropia e a Segunda Lei da Termodinâmica A partir do estudo deste capítulo, espera-se que o estudante possa analisar as relações térmicas que envolvem as trocas de calor entre um sistema e o ambiente no qual está inserido; discutir os significados físicos e matemáticos das leis da termodinâmica e aplicar as leis da termodinâmica em problemas que envolvem máquinas térmicas. FREITAS, L. A moral na obra de Piaget: um projeto inacabado. São Paulo: Cortez, 2003, p. 56. 52 Capítulo 2 Seção 1 Máquinas térmicas, refrigeradores e a Segunda Lei da Termodinâmica As máquinas térmicas são dispositivos que convertem energia térmica em outras formas de energia, por meio de processos cíclicos, e são úteis para se estudar a Segunda Lei da Termodinâmica (primeira forma). Por exemplo, o motor de um automóvel pode ser considerado uma máquina térmica que troca calor com duas fontes a temperaturas diferentes. Ele recebe calor da fonte à alta temperatura, constituída pelo cilindro no qual ocorre a combustão da mistura ar-gasolina. Uma parte desse calor é cedida ao ar (a fonte de calor com temperatura mais baixa), em que são despejados o gás de descarga e o calor do radiador. O restante da energia liberada pela combustão da gasolina serve para movimentar o automóvel. O calor descarregado no ar não é utilizado, tendo apenas o efeito de aquecer o ambiente. Uma usina geradora de eletricidade a partir de carvão ou outro combustível também constitui um exemplo de máquina térmica. Nesse caso, a energia gerada na queima do combustível é utilizada para gerar vapor que movimenta turbinas que impulsionam um gerador elétrico. Ou seja, uma máquina térmica opera entre duas fontes de temperatura: transfere calor de uma fonte que se encontra a uma temperatura maior (fonte quente), realiza trabalho e lança calor para uma fonte que se encontra a uma temperatura menor (fonte fria). Podemos esquematizar uma máquina térmica conforme mostra a Figura 2.1. Figura 2.1 - Esquema de uma máquina térmica Fonte: EGERT, PAOLA (2010). 53 Fundamentos de Termodinâmica e Mecânica dos Fluidos A cada ciclo realizado pela substância de trabalho de uma máquina térmica, a energia interna inicial e final é igual ou . Aplicando a Primeira Lei da Termodinâmica, temos: Se , então O trabalho realizado por uma máquina térmica é igual à quantidade de calor líquido absorvido pela máquina. Para uma máquina térmica cuja substância de trabalho é um gás, o trabalho líquido feito pela máquina para um processo cíclico é a área abaixo da curva no diagrama P-V. O rendimento térmico, ou a eficiência térmica “e”, é a razão entre o trabalho líquido realizado pela máquina e o calor absorvido da fonte quente, dada pela equação 2.1. (Eq. 2.1) O rendimento representa a razão entre o que você ganha (trabalho) e o que você fornece (calor obtido da fonte que está a uma temperatura maior). Por meio da equação (2.1), podemos concluir que é possível obter , ou se nenhum calor for transferido para a fonte fria. Portanto, para que uma máquina térmica tenha um rendimento de 100%, deveria transformar todo o calor na forma de trabalho mecânico. A Segunda Lei da Termodinâmica pode ser apresentada pela formulação de Kelvin-Plank: É impossível construir uma máquina térmica que, operando em ciclos, transforme calor completamente em trabalho, com nenhuma outra mudança ocorrendo no ambiente. 54 Capítulo 2 O rendimento de qualquer máquina térmica é inferior a 100%. Na realidade, os rendimentos das máquinas térmicas estão situados muito abaixo desse limite. Por exemplo, nas locomotivas a vapor esse rendimento é cerca de 10%, nos motores à gasolina nunca ultrapassa 30%, e nos motores Diesel, que estão entre as máquinas mais eficientes, o rendimento situa-se em torno de 40%. Refrigeradores No estudo das máquinas térmicas, vimos que o fluxo de calor ocorre na direção natural ou espontânea desse, que é da fonte que está a uma temperatura mais alta para uma fonte que está a uma temperatura mais baixa, com a realização de trabalho útil. Para retirar calor de um reservatório que está a uma temperatura mais baixa, para outro que está a uma temperatura mais alta, ou seja, em uma direção contrária à direção espontânea para o fluxo do calor, devemos transferir energia ao dispositivo que realizará essa tarefa. Os dispositivos que têm essa função são os refrigeradores e os condicionadores de ar. Assim como nas máquinas térmicas, podemos representar o funcionamento de um refrigerador por meio de um esquema como o da figura abaixo. Na transferência de calor do reservatório à baixa temperatura para o reservatório à alta temperatura precisamos fornecer energia para o dispositivo na forma de trabalho . Figura 2.2 - Esquema de um refrigerador Fonte: EGERT, PAOLA (2010). A eficiência de um refrigerador é chamada de coeficiente de performance K e representa a quantidade de calor removida pelo dispositivo, com uma determinada quantidade de trabalho realizado, dada pela equação 2.2. 55 Fundamentos de Termodinâmica e Mecânica dos Fluidos (Eq. 2.2) Quanto maior for o valor dessa razão, maior é sua eficiência, ou seja, retira uma maior quantidade de calor por ciclo, com uma menor quantidade de trabalho. Tipicamente, refrigeradores com bom desempenho apresentam um coeficiente de performance entre 5 e 6, e condicionadores de ar entre 2 e 3. A Segunda Lei da Termodinâmica, a partir do estudo dos refrigeradores (segunda forma), pode ser apresentada por meio da seguinte formulação: Não é possível que o calor seja transmitido de um corpo para outro, que esteja à temperatura mais alta, sem que mudanças ocorram no ambiente em que se encontram inseridos. Podemos resumir as duas formas colocadas para a Segunda Lei da Termodinâmica, como segue: • Primeira forma: Não existem máquinas térmicas perfeitas • Segunda forma: Não existem refrigeradores perfeitos Fonte: EGERT, PAOLA (2010). Figura 2.3 (a) - Esquema de uma máquina térmica perfeita Figura 2.3 (b) - Esquema de uma máquina térmica perfeita 56 Capítulo 2 Seção 2 Ciclo de Carnot A eficiência máxima de uma máquina térmica foi estudada por Sadi Carnot (1796- 1832), quando propôs um dispositivo operando por meio de processos reversíveis. Um processo é dito reversível quando tanto o sistema como o ambiente podem ser trazidos de volta ao estado inicial, antes de o processo ocorrer. Para que um processo seja reversível, não pode apresentar mecanismos de dissipação de energia, pois não haveria possibilidade para que o sistema retornasse ao seu estado inicial de energia interna. Também é preciso que se tenha a realização de trabalho para que o fluxo de calor possa fluir do reservatório que está a uma temperatura mais baixa para o reservatório que está a uma temperatura mais alta, conforme estudamos nos refrigeradores. A eficiência de uma máquina térmica é máxima quando opera de forma reversível como a máquina de Carnot. O ciclo de Carnot é constituído por duas transformações isotérmicas reversíveis e dois processos adiabáticos reversíveis. A figura mostra um ciclo de Carnot, com uma substância de trabalho que é um gás ideal dentro de um cilindro com um pistão, composto pelas seguintes etapas: Figura 2.4 - Ciclo de Carnot Fonte: EGERT, PAOLA (2010). 57 Fundamentos de Termodinâmica e Mecânica dos Fluidos • O gás se expande isotermicamente Tq, absorvendo um calor Qq (A até B). • O gás se expande adiabaticamente até que sua temperatura caia para Tf (B até C). • O gás é comprimido isotermicamente na temperatura Tf, liberando o calor Qf (C até D). • O gás é comprimido adiabaticamente até sua temperatura retornar ao estado inicial Tq (D até E). Figura 2.5 - Gráfico do Ciclode Carnot Fonte: EGERT, PAOLA (2010). Nesse ciclo, a eficiência depende somente das temperaturas dos dois reservatórios em que a máquina opera. Essa relação é dada pela equação 2.3. (Eq. 2.3) Essa eficiência constitui um valor máximo ou limite para a eficiência de máquinas térmicas reais. Nenhuma máquina real, operando entre duas temperaturas, poderá superar a eficiência de uma máquina de Carnot, operando entre essas mesmas temperaturas. 58 Capítulo 2 Seção 3 Entropia e a Segunda Lei da Termodinâmica Ao estudarmos a Lei Zero da Termodinâmica, compreendemos o conceito de temperatura a pela Primeira Lei da Termodinâmica, o conceito de energia interna, ambas variáveis de estado que descrevem o estado termodinâmico de um sistema qualquer. A Segunda Lei da Termodinâmica envolve também uma variável de estado, a entropia. Entropia é uma medida da desordem de um sistema e a Segunda Lei da Termodinâmica pode ter assim sua terceira forma fundamentada no conceito de entropia ou na desordem apresentada por um sistema isolado. Seu enunciado é: Em qualquer processo termodinâmico que vai de um estado de equilíbrio para outro, a entropia do conjunto sistema+ambiente permanece constante ou, então, aumenta. Podemos compreender esse enunciado se avaliarmos alguns exemplos, observando que esses evoluem naturalmente para estados mais desordenados. Um sistema ordenado é aquele em que seus constituintes (sejam átomos ou objetos) estão dispostos de forma regular, previsível. Para exemplificar, podemos utilizar o caso de um estacionamento com os automóveis em perfeita organização ou a rede cristalina em um sólido, em que os átomos estão também ordenados. Um sistema desordenado apresenta seus constituintes dispostos de forma irregular. Portanto, quanto maior é o estado de desorganização do sistema, maior é sua entropia; quanto menos extensa for a desorganização, menor é a sua entropia. • Em um copo com água pingamos umas gotas de anilina. As moléculas de anilina iniciam um processo irreversível de dispersão na água, que resultará em uma mistura de água e anilina desordenada, que naturalmente não será desfeita. • Você utiliza um perfume pela manhã. Com o passar do tempo, esse é disperso desordenadamente no ar e não retorna mais a sua pele. • Dois sistemas gasosos são mantidos isolados a diferentes temperaturas. Lembramos que a temperatura é medida pela energia cinética das moléculas desses sistemas. Ao permitirmos que moléculas desses sistemas sejam misturadas, temos como resultado um sistema a uma mesma temperatura, ou seja, a energia é distribuída entre todas as moléculas e os sistemas não retornarão aos seus estados iniciais ordenados. 59 Fundamentos de Termodinâmica e Mecânica dos Fluidos a. Quando conduzimos um carro, a energia armazenada na gasolina é convertida em calor por combustão e, depois, em energia mecânica, no motor. A energia mecânica produzida dá origem ao movimento do carro. Porém, parte dessa energia é dissipada sob a forma de calor, na estrada, como resultado do atrito dos pneus, no aquecimento do ar por meio da exaustão de gases e para vencer a resistência do vento. Perdemos essa energia para sempre. Observamos que, por meio do universo, a energia tende a ser dissipada, passando para estados desordenados, de difícil captação e reutilização. Não existe possibilidade de haver uma diminuição da entropia de um sistema isolado em um processo. Se houver uma diminuição na entropia de um sistema, essa será acompanhada por um aumento maior ou igual da entropia do ambiente onde está. Vejamos o exemplo de um recipiente contendo água, ao ser colocado em um congelador. A água que se encontra em um estado desordenado transforma-se em um cubo de gelo que se apresenta de forma mais ordenada. Nesse caso, embora haja uma diminuição na entropia do sistema, precisamos compreender que nesse processo o sistema não está isolado. Esse ocorreu no interior de um refrigerador, e esse, através de seu motor, realizou trabalho para que o processo ocorresse. Assim, uma parte do sistema apresentou uma diminuição na desordem, mas o sistema como um todo (refrigerador+água) apresentou um aumento na desordem. Boltzmann, utilizando a teoria das probabilidades, relacionou o conceito de entropia por meio da equação matemática 2.4. (Eq. 2.4) Onde S é a entropia, k é a constante de Boltzmann, já mencionada na Seção 5(Capítulo 1), e W é a medida da desordem do sistema. W pode ser definida como o número de arranjos diferentes, possíveis para os átomos de um sistema, sem alterar as propriedades macroscópicas externas desse sistema. Concluindo, a Segunda Lei da Termodinâmica nos conduz a uma ideia de que toda a energia do universo será um dia transformada em calor e que todo universo ficará a uma mesma temperatura. A energia total do universo tende a se tornar cada vez mais desordenada e, por consequência, podemos afirmar que a entropia do universo cresce continuamente. 60 Capítulo 2 Atividades de autoavaliação 1. Uma máquina de Carnot trabalha entre as temperaturas e . A máquina realiza um trabalho de 1300 J em cada ciclo de calor que leva 0,30s. a) ( ) Qual é a eficiência da máquina? b) ( ) Qual é a potência média da máquina? c) ( ) Qual é a energia extraída em forma de calor da fonte quente durante cada ciclo? d) ( ) Qual é a energia liberada em forma de calor da fonte fria durante cada ciclo? e) ( ) Qual é a variação da entropia da substância de trabalho devida à energia recebida da fonte quente? E qual é a variação da entropia da substância de trabalho devida à energia fornecida à fonte fria? 2. Uma máquina térmica opera entre dois reservatórios térmicos com temperaturas e . a) ( ) Qual é o maior rendimento(eficiência) possível dessa máquina? b) ( ) Qual é o trabalho que ela pode realizar em cada ciclo? c) ( ) Qual é o maior coeficiente de eficiência possível de um refrigerador que opera entre os reservatórios com temperaturas de e ? Saiba mais Podemos aplicar os conceitos discutidos no capítulo e mostrar o modelo apresentado pelos autores Raymond A. Serway e John W. Jewett Jr em “Princípios de Física” para mostrar que a atmosfera terrestre se comporta como uma máquina térmica. A energia que entra na atmosfera pela radiação do sol é submetida a diferentes processos mostrados na Figura 2.6 abaixo. 61 Fundamentos de Termodinâmica e Mecânica dos Fluidos Figura 2.6 - Comportamento da atmosfera terrestre como uma máquina térmica Fonte: Egert, Paola, 2010. A radiação incidente ou 100% da energia entra na atmosfera pela radiação solar. Parte dessa energia ou 30% dela é refletida de volta para o espaço, em que 6% são espalhados pelas moléculas do ar, 20% são refletidos pelas nuvens e 4% são refletidos pela superfície da Terra. Os 70% restantes são absorvidos pelo ar ou pela superfície. Porém, antes de atingir a superfície, 20% são absorvidos pelo ar, 4% pelas nuvens e 16% pela água e pelas partículas de poeira e pelo ozônio da atmosfera. A energia absorvida pelo solo é 50% da radiação original que atinge o topo da atmosfera. O solo emite radiação para a atmosfera por diferentes processos: 6% voltam ao espaço, 14% são absorvidas por moléculas de água e dióxido de carbono. O ciclo hidrológico resulta em 24% da energia original, que são carregados como vapor d’água e liberados na atmosfera, quando esse se condensa sob forma de água líquida. Esses processos totalizam 64% e 6% passam diretamente de volta para o espaço. A emissão desses 64% de energia para o espaço é dividida em dois tipos: 38% por radiação infravermelha das moléculas na atmosfera (vapor de água, dióxido de carbono e moléculas de nitrogênio e oxigênio do ar) e 26% como radiação infravermelha das nuvens. A quantidade de energia incidente iguala à quantidade de energia emitida. Os processos descritos na figura abaixo resultam em uma pequena quantidade de trabalho realizado sobreo ar, que aparece como energia cinética dos ventos que existem na atmosfera. 62 Capítulo 2 Essa parcela compreende 0,5% da energia solar original. Isso não altera o equilíbrio, conforme mostrado na figura, pois essa energia cinética do vento é convertida em energia interna, já que massas de ar se movimentam uma sobre às outras e acabam produzindo uma maior emissão infravermelha da atmosfera para o espaço. Assim podemos compreender a atmosfera como uma máquina térmica, cujo reservatório quente é a superfície e a atmosfera, e o reservatório frio é o espaço vazio. Figura 2.7 - Modelo de uma máquina térmica Fonte: Egert, Paola, 2010. O rendimento é calculado abaixo: Esse rendimento pode parecer baixo, porém, precisamos pensar que uma grande quantidade de energia emitida pelo sol entra na atmosfera. Então, mesmo uma fração pequena, compreende um sistema de ventos gerando uma quantidade de energia considerável.
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