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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE DIREITO JULIANA DE ALBUQUERQUE GONÇALVES SARAIVA A LGPD E A HERMENÊUTICA JURÍDICA CONSTRUÍDA PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES BRASILEIROS ATRAVÉS DOS SEUS ENTENDIMENTOS NATAL 2022 JULIANA DE ALBUQUERQUE GONÇALVES SARAIVA A LGPD E A HERMENÊUTICA JURÍDICA CONSTRUÍDA PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES BRASILEIROS ATRAVÉS DOS SEUS ENTENDIMENTOS Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel/Licenciado em Direito. Orientadora: Profa. Dra. Mariana de Siqueira. NATAL 2022 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Saraiva, Juliana de Albuquerque Goncalves. A LGPD e a hermenêutica jurídica construída pelos Tribunais Superiores Brasileiros através dos seus entendimentos / Juliana de Albuquerque Goncalves Saraiva. - 2022. 80f.: il. Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Curso de Direito. Natal, 2022. Orientadora: Profa. Dra. Mariana de Siqueira. 1. Direito Digital - Monografia. 2. Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) - Monografia. 3. Lei nº 13.709/2018 - Monografia. 4. Jurisprudência superior - Monografia. 5. Hermenêutica jurídica - Monografia. I. Siqueira, Mariana de. II. Título. RN/UF/CCSA CDU 342.9 Elaborado por Shirley de Carvalho Guedes - CRB-15/440 JULIANA DE ALBUQUERQUE GONÇALVES SARAIVA A LGPD E A HERMENÊUTICA JURÍDICA CONSTRUÍDA PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES BRASILEIROS ATRAVÉS DOS SEUS ENTENDIMENTOS Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel/Licenciado em Direito. Aprovada em: 11/02/2022 BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Profa. Dra. Mariana de Siqueira Orientadora UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE ______________________________________ Profa. Ma. Lidiane Araújo Aleixo de Carvalho Membro interno UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE ______________________________________ Profa. Ma. Kate de Oliveira Moura Surini Membro externo UNINASSAU NATAL À Adyale Riberio Pessoa de Albuquerque (in memoriam), vulgo Dida, que foi sempre inspiração de força, destreza, sagacidade e beleza, ensinando a todas as mulheres ao seu redor como nascer, viver e morrer. E viva a vida! “Uma mulher, quando reconhece sua força, se torna uma fonte inesgotável de inspiração.” (Rafael Nolêto) AGRADECIMENTOS Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus por sempre gerar as luzes no fim do túnel de cada semestre dessa trajetória. Todo semestre eu quase tranquei! Agradeço à minha família mais presente, Tibério Saraiva, João Victor Saraiva e Laís Saraiva, já pedindo desculpas pela ausência e pelos momentos não compartilhados com vocês, dedicados ao curso. Foi um projeto coletivo que começo a colher os frutos com vocês! Agradeço à minha irmã maravilhosa, Jeanine de Albuquerque, que nesta graduação e em todas as empreitadas pessoais e profissionais que invento, me apoia, me dá força e é suporte essencial. Sem você minha vida não era nem metade do que é. Te amo! Agradeço à minha mainha de Natal - Niza. Sem você, Nizélia Saraiva, não tinha terminado nem o 1o período, pode ter certeza! Mais do que minha babona :p, você é meu suporte, meus braços e minhas pernas. Sou sempre grata a tudo que fez e faz por mim e pelos meus filhos. Te amo, meu chiclete! Agradeço aos meus familiares que direta ou indiretamente, contribuíram para que eu chegasse até aqui. Agradeço às minhas amigas "Relax - 5 é 10". Com trajetórias tão diferentes nos encontramos no curso, nos apoiamos, curtimos nossas conquistas, empurramos umas às outras quando queríamos desistir, e mais do que tudo, soubemos reconhecer as melhores qualidades de cada uma. Somos super mulheres e vocês são eternas! Foram decisivas na trajetória da minha vida e do meu curso. Da UFRN para essa e outras vidas! Obrigada Alanna Princesa, Bia, Dena, Jaci, Jhose, Marcinha e Tatá. Agradeço em especial à minha orientadora e amiga, professora Mariana de Siqueira, que instruiu com maestria a condução deste trabalho, compartilhando seu saber e acolhendo minhas ideias de pesquisa durante todo o processo. Decisiva na escolha do tema, é sem dúvida, uma referência no país em Direito e Tecnologia, o qual eu tenho o prazer inenarrável de trabalhar e vivenciar de perto a evolução do Direito Digital brasileiro como Ciência, através de suas pesquisas, falas, palestras e publicações. Agradeço aos professores do Curso de Direito da UFRN, que contribuíram para minha formação com seus ensinamentos e exemplos, em especial ao professor Morton, que definitivamente é um legado de competência, profissionalismo e inspiração para todos os alunos do curso. Cursar suas disciplinas foi fundamental para a minha permanência nesse curso. Se puder, não deixe nunca a disciplina de Introdução ao Estudo do Direito :D! Agradeço aos amigos do curso, em especial, à turma do "Samba do Crioulo Doido" ou “ZAP 2016.2 RAIZ”, que apesar de sua diversidade conseguiu demonstrar até o fim, como é bom a convivência harmoniosa das diferentes tribos. Sempre me senti parte de vocês. Agradeço ao Grupo de Pesquisa GEDI (Grupo de Estudos de Direito da Internet), que tanto contribuiu para minha formação. Agradeço desde já à banca, professoras Lidiane Aleixo e Kate Oliveira, que são para mim, fontes do saber, honrando-me com seus olhares especiais sobre meu trabalho. Obrigada desde já pelo aceite. Por fim, agradeço ao meu Departamento de Ciências Exatas (DCX) e às Coordenações dos cursos de Licenciatura em Ciência da Computação (LCC) e Bacharelado em Sistemas de Informação (SI), aos quais sou vinculada. Obrigada pela compreensão na distribuição das minhas atividades acadêmicas junto à Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Não foi fácil, por quase 6 anos, trabalhar em outro estado e ser aluna integral de um curso presencial. , O modo como você reúne, administra e usa a informação determina se vencerá ou perderá. Bill Gates RESUMO No contexto da Sociedade 5.0, o desenvolvimento do Direito Digital é crucial na disposição de normas oriundas das relações sociais modernas, no intuito de tentar garantir a validade jurídica das informações trocadas. Nesta conjuntura, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) surge no Brasil para tutelar o tratamento de dados pessoais, realizado por pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, objetivando a proteção dos direitos fundamentais de liberdade, de privacidade e do livre desenvolvimento da personalidade. Uma vez publicada, a eficácia de uma norma perpassa por seu reconhecimento social, a fim de que o “dever ser” preconizado por ela seja cumprido pelos indivíduos e pelo Estado. Considerando a vacância da LGPD aliada à opacidade regulamentadora da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), a segurança jurídica pode ser significativamente comprometida no que tange à aplicação da lei. Neste contexto, no emaranhado de normas brasileiras, é esperada a existência delacunas no ordenamento jurídico que podem ser supridas/minimizadas com o auxílio da hermenêutica jurídica. Assim, o problema de pesquisa abordado é compreender a interpretação que os Tribunais Superiores (STJ e STF) estão dando à LGPD, manifestada através de seus entendimentos jurisprudenciais. Assim, uma pesquisa documental foi realizada para analisar as decisões judiciais desses Tribunais. A coleta de dados delimitou-se no período de 14/08/2018 a 31/07/2021, em engenhos de busca que disponibilizam seus julgados. Resultando em 27 ações, 15 do STJ e 12 do STF, foi possível fazer uma análise de discurso extraindo os entendimentos sobre a aplicação da norma. Como conclusão, observou-se que a hermenêutica e a construção jurisprudencial acerca da LGPD ainda estão em desenvolvimento e assim, as primeiras decisões que referenciam esta norma apresentam-se em caráter principiológico ou trazendo à tona as definições reportadas pelo seu Art. 1o. Ademais, a insegurança jurídica trazida pelas lacunas da lei, aparentemente, não estão sanadas através da jurisprudência dos Tribunais neste momento, uma vez que os entendimentos dos ministros pouco remontam expressamente aos dispositivos lei, e por consequência, não há uma discussão sobre a construção hermenêutica da norma. Entretanto, é importante frisar que a constitucionalidade da LGPD ainda não foi questionada perante o STF, nem seus dispositivos legais foram abordados como pontos controvertidos no ordenamento jurídico, perante o STJ. Palavras-chave: LGPD. Lei 13.709/2018. Jurisprudência Superior. Hermenêutica Jurídica. ABSTRACT In Society 5.0 context, Digital Law development is crucial for the legal norms of digital norms, in order to try to guarantee the legal validity of the information provided. In this scenario, the General Data Protection Law (GDPL) was proposed in Brazil to protect the data processing, carried out by a natural or legal person, of public or private law, aiming at the protection of the fundamental rights of freedom, privacy and free development. of personality. Once published, an attempt at a norm passes through its social recognition, so that the “ought to be” advocated by it is fulfilled by and by the State. Considering the LGPD legislation combined with the opacity of the National Agency for the Protection of Legislation (ANPD), security can be significantly altered with regard to the application of the LGPD. In this context, with the tangle of Brazilian norms, it is expected in any order the existence of gaps that can be filled/minimized with the help of legal hermeneutics. Thus, the problem through his research is to understand the interpretation that the higher courts and STF are manifested from jurisprudential understandings. Thus, a documentary research was carried out to analyze the decisions of these courts. Data collection was limited to the period from 08/14/2018 to 07/31/2021, in search engines that make their judgments available. Resulting in 27, 15 of the STJ and 12 of the STJ, it was possible to carry out a discourse analysis extracting the understandings on the application of the norm. As a conclusion, it can be concluded that hermeneutics and jurisprudential construction are in development and thus the first decisions that refer to this norm to present themselves in a principled character or to the surface as definitions reported by its art. 1st The judicial decision is related to gaps in the law, possibly not remedied through the jurisprudence of the courts. However, it is legalized that the provisions of the constitutionality of the LGPD have not yet been questioned before the STF, nor its legal provisions have been informed as important controversial points in the ment, before the STJ. Keywords: LGPD. 13.709/2018 Law. Superior Jurisprudence. Legal Hermeneutics. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Visão geral das decisões do STJ e STF ................................................................. 455 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Correlação das QPs com os dados extraídos das Decisões................................ 43 Quadro 2 – Habeas Corpus e Recursos de Habeas Corpus: Decisões do STJ que mencionam LGPD .....................................................................................................................................48 8 Quadro 3 – Mandado de Segurança (MS), Recursos em MS e Suspensão de Segurança: Decisões do STJ que mencionam LGPD .................................................................................. 50 Quadro 4 – Demais Decisões do STJ que mencionam LGPD.............................................. 58 Quadro 5 – ADIs: Decisões do STF que mencionam LGPD ............................................... 61 Quadro 6 – Demais Decisões do STF que Mencionam LGPD ............................................ 62 Quadro 7 – Mandado de Segurança (MS) e Medida Cautelar de MS: Decisões do STF que Mencionam LGPD .................................................................................................................... 65 LISTA DE SIGLAS ADC Ação Declaratória de Constitucionalidade ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ANPD Autoridade Nacional de Proteção de Dados CF Constituição Federal CPI Comissão Parlamentar de Inquérito CPC Código de Processo Civil CNPD Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais CONAQ Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas GDPR General Data Protection Regulation (Regulamento Geral de Proteção de Dados) LINDB Lei de Introdução às normas do Direito LGPD Lei Geral de Proteção de Dadas MP Ministério Público MS Mandado de Segurança OIT Organização Internacional do Trabalho PEC Proposta de Emenda à Constituição PGR Procuradoria Geral da República STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TJGO Tribunal de Justiça de Goiás TRF3 Tribunal Regional Federal da 3a Região SUMÁRIO 1 CONTEXTO E MOTIVAÇÃO .......................................................................................... 16 2 A LGPD COMO TEXTO JURÍDICO INOVADOR NO BRASIL ................................ 20 2.1 A Inovação da LGPD ......................................................................................................... 20 2.2 Validade e eficácia da LGPD no ordenamento jurídico brasileiro ..................................... 25 2.3 A (In)segurança jurídica acerca da LGPD .......................................................................... 28 2.4 A Opacidade Legislativa no Tratamento de Dados Pessoais: Indefinições da ANPD........29 3 O PAPEL HERMENÊUTICO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ................................................................... 32 3.1 Heterointegração e autointegração: complementação do Ordenamento Jurídico............... 32 3.2 Hermenêutica jurídica para auxiliar a interpretação do Direito.......................................... 34 3.3 Hermenêutica Legislativa do Superior Tribunal de Justiça (STJ).......................................36 3.4 Hermenêutica constitucional do Supremo Tribunal Federal (STF) .................................... 38 4 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA .......................................................................... 41 5 METODOLOGIA DA PESQUISA .................................................................................... 42 5.1 Abordagem metodológica ................................................................................................... 42 5.2 Coleta de dados ...................................................................................................................42 5.3 Extração e Análise de dados ............................................................................................... 42 6 JURISPRUDÊNCIA SUPERIOR ACERCA DA LGPD ................................................. 44 6.1 Visão geral das decisões Tribunais Superiores ................................................................... 44 6.2 Jurisprudência do STJ acerca da LGPD ............................................................................. 46 6.3 Jurisprudência do STF Acerca da LGPD............................................................................ 59 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 68 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 72 ANEXO A – RESUMO/LINKS DE AÇÕES DO STJ QUE REFERENCIAM A LGPD...78 ANEXO B – RESUMO/LINKS DE AÇÕES DO STF QUE REFERENCIAM A LGPD...80 16 1 CONTEXTO E MOTIVAÇÃO A conjuntura atualmente globalizada é marcada pela revolução digital, vindo à tona a Sociedade 5.0, que busca a priorização da humanidade em detrimento do universo das tecnologias e suas máquinas (RAMOS et al., 2020). Isto coloca o ser humano no centro da discussão, empregando a tecnologia para otimizar a qualidade de vida das pessoas. Neste contexto de evolução para uma sociedade superinteligente, o desenvolvimento e aprimoramento do Direito Digital é crucial para tratar de um conjunto de normas, aplicações, conhecimentos e relações jurídicas, oriundas do universo digital, no intuito de tentar garantir a validade jurídica das informações prestadas, bem como das transações, através do uso por exemplo, de certificados digitais. Neste cenário, no Brasil, surge a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, realizado por pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, objetivando a proteção dos direitos fundamentais de liberdade, de privacidade e do livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural (BRASIL, 2018). Na forma da Lei nº 13.709, sancionada em agosto de 2018, a LGPD estabelece no ordenamento jurídico brasileiro, direitos aos titulares das informações pautados nos Direitos Fundamentais de Liberdade, de Intimidade e de Privacidade, a fim de equilibrar o relacionamento entre estes titulares e os controladores de dados, a quem competem as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais (CANTO et al., 2020). Dentre outras instruções, esta lei traz a definição de dados (e de dados sensíveis), seu tratamento, formas de consentimento para este tratamento, os agentes no processo de tratamento dos dados, além de prever a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais (CNPD). Todo esse aparato legal visa subsidiar a regulação das relações sociais em torno dos dados e informações pessoais. A despeito do que visa a LGPD, o meio pelo qual as pessoas, e principalmente, as empresas e as instituições públicas devem se adequar para estar em conformidade com esta norma, ainda é um grande desafio, uma vez que ela apresenta uma série de condutas a serem adotadas. Entretanto, existem lacunas acerca da aplicação de algumas normas que advêm da LGPD, fazendo-se necessário criação de portarias e regulamentos pela ANPD. Sob esta ótica, o compliance digital é fundamental na observância de deveres e da análise de riscos, através da adoção de uma cultura corporativa ética e transparente nas atividades organizacionais, identificando funções e responsabilidades no que tange ao tratamento de dados 17 (MULLHOLAND, 2020) (SILVA, 2020). Neste cenário, o papel da ANPD destaca-se como fundamental no processo de orientação, fiscalização e aplicação de sanções previstas nesta lei1. Levando em conta que a ANPD foi criada e está em processo de constituição, além de ter sua natureza transitória (Art. 55-A § 1º), é possível observar uma lacuna no que se refere à diretrizes, normas, orientações e procedimentos que deem suporte à adequação das pessoas, organizações e instituições a esta lei. O perfil orientador e fiscalizador da ANPD é essencial para execução e aplicação da LGPD, pois sem esse marco regulatório e fiscalizador, não há efetividade nem garantia de funcionamento. Este cenário pode inclusive acarretar o comprometimento da segurança jurídica que dá condições às pessoas a gerarem conhecimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus atos e de seus fatos, à luz da liberdade reconhecida no ordenamento jurídico pátrio (DI PIETRO, 2019). Como consequência, esta insegurança jurídica pode inclusive comprometer o desenvolvimento tecnológico e empreendedor no país, independentemente da área de atuação (PECK, 2020). A eficácia de uma norma jurídica perpassa por seu reconhecimento social, a fim de que o “dever ser” preconizado por ela seja cumprido pelos indivíduos e pelo Estado. Assim, o tempo de vacância da LGPD pode ter sido um impasse na sua implementação de forma eficaz na sociedade. Aliado a isto, a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que assume um papel regulatório, fiscalizatório e sancionatório, foi criada, mas está em processo de constituição e organização para pleno funcionamento. Esses dois fatores podem influenciar significativamente na segurança jurídica acerca da LGPD, que teve sua previsão legal para entrar em vigor conforme Art. 652. 1 Conforme Art. 55-J, compete à ANPD, dentre outras funções: [...] III - elaborar diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade; [...] VII - promover e elaborar estudos sobre as práticas nacionais e internacionais de proteção de dados pessoais e privacidade; VIII - estimular a adoção de padrões para serviços e produtos que facilitem o exercício de controle dos titulares sobre seus dados pessoais, os quais deverão levar em consideração as especificidades das atividades e o porte dos responsáveis; [...] XIII - editar regulamentos e procedimentos sobre proteção de dados pessoais e privacidade, bem como sobre relatórios de impacto à proteção de dados pessoais para os casos em que o tratamento representar alto risco à garantia dos princípios gerais de proteção de dados pessoais previstos nesta Lei; [...] XVIII - editar normas, orientações e procedimentos simplificados e diferenciados, inclusive quanto aos prazos, para que microempresas e empresas de pequeno porte, bem como iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclarem startups ou empresas de inovação, possam adequar-se a esta Lei [...]; XXIV - implementar mecanismos simplificados, inclusive por meio eletrônico, para o registro de reclamações sobre o tratamento de dados pessoais em desconformidade com esta Lei. (BRASIL, 2018) 2 Art. 65. Esta Lei entra em vigor: 18 As sanções administrativas, que serão aplicadas pela ANPD (art. 52), estão previstas no CAPÍTULO VIII - Seção I - arts. 52 a 54, que por sua vez, entraram em vigor apenas em 01/08/2021, conforme prevê o art. 65. Neste cenário, é possível perceber uma lacuna jurídico- administrativa no que tange às sanções, tendo em vista que as regras de comportamento sobre o tratamento dos dados tinham vigência desde 14/08/2020 - quase 1 ano antes. Ou seja, ao se descumprir às normas da LGPD nesse período, as sanções administrativas não poderiam ser aplicadas direcionando os conflitos a serem decididos pelo Judiciário. Conforme prevê o doutrinador Lemke (2005), considera-se lacuna da lei quando há ausência de regra determinada que se espera dentro do sistema jurídico global (LEMKE, 2005).Ao se falar em lacuna, observa-se que o direito objetivo não oferece, em princípio, uma solução para determinada questão. Essa incompletude é contrária ao plano normativo no âmbito do direito positivo, mensurada pelo critério aferidor de todo o ordenamento jurídico (AVILA, 2006). Dessa forma, Diniz (2002) esclarece que quando há faltas ou falhas de conteúdos de regulamentação jurídico-positiva para determinadas situações fáticas, admite-se sua remoção por uma decisão judicial jurídico-integradora. Ademais, é sabido que atos administrativos que venham a ser executados pela ANPD serão definitivos quando os interessados não interpuserem os recursos cabíveis para questionar as decisões proferidas; na hipótese de já haverem sido manejadas todas as peças previstas pelo ordenamento jurídico, cuja finalidade seja a discussão quanto à deliberação formulada pelo Poder Executivo; por vício de legalidade ou por revogação da própria ANPD, por questões de conveniência ou oportunidade (PEREIRA, 2009). Entretanto, estes atos administrativos podem ser modificados a qualquer momento caso o Judiciário seja provocado, pleiteando o novo julgamento da mesma matéria discutida anteriormente. Nestes casos, os atos serão submetidos à análise do Poder Judiciário, cabendo a este manifestar-se definitivamente sobre os conflitos. A partir daí surge uma problemática jurídica sobre a posição do Judiciário, no que se refere a aplicação da LGPD, junto aos Superiores Tribunais, uma vez que nem as sanções administrativas poderiam ter sido aplicadas pela ANPD no período de 14/08/2020 a 01/08/2021 – vigência parcial da norma. Nesta conjuntura, é mister ressaltar a importância do papel hermenêutico dos Tribunais Superiores, Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF), no ordenamento jurídico brasileiro. Ademais, levando em conta que o STJ tem I - dia 28 de dezembro de 2018, quanto aos arts. 55-A, 55-B, 55-C, 55-D, 55-E, 55-F, 55-G, 55-H, 55-I, 55-J, 55- K, 55-L, 58-A e 58-B; e I-A – dia 1º de agosto de 2021, quanto aos arts. 52, 53 e 54; II - 24 (vinte e quatro) meses após a data de sua publicação, quanto aos demais artigos. 19 por objetivo proteger leis federais, como é o caso da LGPD, suas decisões repercutem nos Tribunais Federais e Estaduais, para que harmonizem seus entendimentos sobre determinado assunto. 20 2 A LGPD COMO TEXTO JURÍDICO INOVADOR NO BRASIL 2.1 A Inovação da LGPD O cenário de inovação tecnológica atual que impulsiona a Sociedade 5.0, impõe ao Direito a necessidade de adequação ou criação de normas que protejam os direitos fundamentais dos indivíduos nesta nova conjuntura (DONEDA, 2011). Nesta toada, no dia 20 de outubro de 2021, foi aprovada pelo Plenário do Senado Federal a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 17/20193, tornando um direito fundamental a proteção de dados pessoais, a ser promulgada no dia 10/02/2022 4 . Neste cenário, as informações, consumidas e trafegadas pelas redes interconectadas, podem possuir características que vinculam de forma objetiva os indivíduos (UNIAO EUROPEIA, 2018), passando assim a serem informações pessoais. Muitas dessas informações estão associadas à privacidade da pessoa, fato esse que foi acolhido no ordenamento jurídico brasileiro através da tutela do direito à privacidade. Seguindo padrões internacionais de inovação normativa, no que tange à tecnologia e aos dados pessoais, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) - Lei n° 13.709/2018, surge no Brasil contemplando padrões de proteção semelhantes aos preconizados pelo Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados - General Data Protection Regulation (GDPR) (UNIAO EUROPEIA, 2018). Este regulamento dispõe sobre a proteção dos dados pessoais e possibilidades de tratamento deles, prevendo também sanções quando descumpridas regras de conduta previstas. Vale ressaltar que a LGPD não trata apenas de dados pessoais digitais, mas também dados captados e tratados por meios de cadastros físicos, por exemplo. Pela LGPD, a aplicação de multas muito altas é um dos fatores que demonstra a preocupação do legislador originário com a tutela dos dados pessoais dos indivíduos. Além disso, seu Art. 6o elenca 10 princípios que ressaltam o fundamento basilar adotado na construção dessa lei5. 3 Proposta de Emenda à Constituição n° 17, de 2019 Proposta de Emenda à Constituição n° 17, de 2019 - Ementa: Acrescenta o inciso XII-A, ao art. 5º, e o inciso XXX, ao art. 22, da Constituição Federal para incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos fundamentais do cidadão e fixar a competência privativa da União para legislar sobre a matéria. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/135594. Acesso em 15 jan. 2022. 4 Agência de Notícia do Senado: Emenda que inclui proteção de dados pessoais na Constituição será promulgada na quinta Fonte: Agência Senado https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/02/04/emenda-que-inclui- protecao-de-dados-pessoais-na-constituicao-sera-promulgada-na-quinta Acesso em 04 fen. 2022. 5Art. 6º As atividades de tratamento de dados pessoais deverão observar a boa-fé e os seguintes princípios: I - finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades; II - adequação: compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao titular, de acordo com o contexto do tratamento; https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/135594 https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/02/04/emenda-que-inclui-protecao-de-dados-pessoais-na-constituicao-sera-promulgada-na-quinta https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/02/04/emenda-que-inclui-protecao-de-dados-pessoais-na-constituicao-sera-promulgada-na-quinta 21 Apesar da LGPD abordar especificamente a proteção dos dados pessoais, o Brasil já possuía legislações que tratavam de privacidade e proteção de dados. Entretanto, a LGPD veio congregar essas normas, que antes eram apresentadas de forma transversal no Ordenamento Jurídico Brasileiro num contexto expandido de uma Sociedade majoritariamente digital. A Constituição Federal, através da tutela da dignidade da pessoa humana como direito fundamental, reveste as garantias fundamentais de imprescritibilidade, inalienabilidade, inviolabilidade, universalidade, complementaridade (CALADO, 2019). O direito à privacidade por exemplo, encontra-se no Art. 5o- X, impondo que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (BRASIL, 1988). Buscando assegurar a proteção da individualidade humana, os direitos à personalidade, também parte das garantias e direitos fundamentais, englobam o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem. A garantia desses direitos dá a oportunidade aos indivíduos de desenvolver livremente suas aptidões pessoais, inclusive no que se refere ao pleno exercício da democracia. Ressalta-se que o direito à personalidade é uma construção contínua e inacabada, retratado através do tempo e espaço em que uma sociedade se enquadra. Desta maneira, a Sociedade da Informação atual incrementa uma característica antes não vislumbrada como parte da personalidade humana: seus dados pessoais. Assim, ao ver os dados pessoais como um prolongamento do próprio sujeito, as garantias previstas para a proteção da personalidade, também são aplicáveis a eles pois se associam objetivamente aos indivíduos, podendo interferir na sua intimidade, vida privada, honra e imagem. Por conseguinte, as tutelas concernentes à personalidade previstas na Constituição também são extensíveis aos dados pessoais (DONEDA, III - necessidade: limitação do tratamento aomínimo necessário para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados; IV - livre acesso: garantia, aos titulares, de consulta facilitada e gratuita sobre a forma e a duração do tratamento, bem como sobre a integralidade de seus dados pessoais; V - qualidade dos dados: garantia, aos titulares, de exatidão, clareza, relevância e atualização dos dados, de acordo com a necessidade e para o cumprimento da finalidade de seu tratamento; VI - transparência: garantia, aos titulares, de informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento e os respectivos agentes de tratamento, observados os segredos comercial e industrial; VII - segurança: utilização de medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão; VIII - prevenção: adoção de medidas para prevenir a ocorrência de danos em virtude do tratamento de dados pessoais; IX - não discriminação: impossibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos; X - responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das normas de proteção de dados pessoais e, inclusive, da eficácia dessas medidas. (BRASIL, 2018) (grifos da autora) 22 2011). Uma outra previsão de proteção de dados prevista na Constituição se refere ao habeas data (Art. 5o - LXXII), onde prevê o conhecimento das informações relativas à pessoa, mantidas nos bancos de dados das entidades governamentais ou de caráter público. Complementarmente, o Código Civil é outro dispositivo legal que trata da privacidade da pessoa humana e consequentemente dos seus dados, quando em seu Art. 21 preceitua que “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma” (BRASIL, 2002). Seguindo nessa linha, o Código de Defesa do Consumidor também pressupõe a proteção de acesso aos dados pessoais que estejam arquivados (BRASIL, 1990): Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. § 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos. § 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele. § 3° O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas. § 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público. § 5° Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores. § 6° Todas as informações de que trata o caput deste artigo devem ser disponibilizadas em formatos acessíveis, inclusive para a pessoa com deficiência, mediante solicitação do consumidor. (BRASIL, 1990) Mais recente do que os dispositivos supracitados, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) regula o uso da Internet no Brasil por meio da previsão de princípios, garantias, direitos e deveres para quem usa a rede, bem como da determinação de diretrizes para a atuação do Estado (BRASIL, 2014). Esta lei aparece como disruptiva para a época, pois estabeleceu um regime claro de acesso de dados cadastrais, logs e conteúdo que trafegam na internet (FRAGOSO, 2022) (CORREIA, 2019). Especificamente relacionado com a proteção de dados, segundo o Marco Civil, os dados cadastrais podem ser requisitados por autoridades com competência legal, mesmo sem ordem judicial prevista. Adicionalmente, os usuários possuem o direito ao consentimento livre, expresso e informado sobre a coleta, uso, armazenamento e 23 tratamento de dados pessoais (Art. 7º, VII e IX). Em contrapartida, para o fornecimento de registros de acesso e conexão, há previsão da necessidade de ordem judicial e há a discriminação sobre os requisitos formais e materiais para sua concessão (Art. 22). Concernente a este cenário, porém essencialmente voltada ao direito público, a Lei de Acesso à Informação - LAI (12.527/2011) surge em 2011. Aplicada de maneira obrigatória a todos os entes a Administração Pública - Direta ou Indireta, regulamenta o direito constitucional de acesso às informações públicas criando mecanismos que possibilitam, a qualquer pessoa, física ou jurídica, sem necessidade de apresentar motivo, o recebimento de informações públicas dos órgãos e entidades (BRASIL, 2011) (TEIXEIRA, 2020). Pautada nos princípios de transparência da Administração Pública, a LAI deixa de fora a regulamentação dos vínculos empresariais privados com os cidadãos, sem previsões legais para controle e proteção de dados pessoais nestas relações (DONEDA, 2017). Destaca-se que a economia atual se fundamenta na comercialização de dados e informações, fato este que não é abordado pela referida lei. Como é possível observar, a regulamentação da proteção de dados pessoais está disposta em vários dispositivos legais no ordenamento jurídico, o que pode dificultar sua compreensão e consequente aplicação de forma eficaz. Além de resolver a transversalidade da abordagem no que tange à proteção de dados, a LGPD inova quando espera uma responsabilidade proativa dos operadores dos dados, organizações e Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD (Art. 46, §2o da LGPD). Assim sendo, a preocupação maior da LGPD não é com o dado em si, mas com o seu tratamento (BRASIL, 2018). O tratamento de dados é previsto no Art. 5o, X da LGPD, que traz um rol de atividades, meramente exemplificativo, sobre a intervenção que o dado pode sofrer6. Outra novidade trazida pela LGPD é que o tratamento dos dados só é permitido quando há consentimento livre, informado e inequívoco do titular, e que esse tratamento tenha uma finalidade específica (Art. 7o, I da LGPD). Entretanto, há disposições que se excetuam a essa regra, a citar: para cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador (II), quando a Administração Pública necessita de dados para a execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos, convênios ou instrumentos congêneres (III), para a realização de estudos por órgão de pesquisa (IV), quando necessário para a execução de contrato ou de procedimentos preliminares relacionados a contrato do qual seja parte o titular, 6 X - tratamento: toda operação realizada com dados pessoais, como as que se referem a coleta, produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação, transferência, difusão ou extração; [...] (BRASIL, 2018) 24 a pedido do titular dos dados (V), para o exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo ou arbitral (VI), para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiros (VII), para a tutela da saúde, exclusivamente, em procedimento realizado por profissionaisde saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária (VIII), quando necessário para atender aos interesses legítimos do controlador ou de terceiros, exceto no caso de prevalecerem direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais (IX), ou para a proteção do crédito (X). Iniciando-se pelo consentimento de tratamento de dados, perpassando pelo término e direito ao esquecimento, um outro ponto inovador da LGPD é permitir que decisões individuais prevaleçam em detrimento do interesse de outrem (GIANNOTTI, 2019). Uma vez que os dados afetem os interesses pessoais, profissionais, de consumo, de crédito ou qualquer outro aspecto da personalidade, o cidadão assume a posição de um controle maior sobre seus próprios dados. Neste universo, a definição de agentes de tratamento acaba sendo primordial para elencar os envolvidos no processo de tratamento de dados e inclusive, subsidiar o correto direcionamento das sanções previstas. Assim, o Art. 5º (VI, VII, VIII, IX) prevê os agentes de tratamento (e encarregado) e traz suas definições7. O delineamento da responsabilidade civil sobre o tratamento de dados pessoais é um outro ponto inovador da LGPD. Os agentes de tratamento possuem a obrigação de indenizar na falta de um dever de conduta imposto a ele (GIANNOTTI, 2019) (SCHAEFERa et al., 2020) (SCHAEFERb et al., 2020). É possível observar, portanto, a adoção da teoria subjetiva da responsabilidade civil, sendo necessário haver a prova da conduta culposa do agente quando ocorrido o dano. Os Arts. 42 a 54 abordam padrões de conduta que devem ser seguidos pelos agentes de tratamento (sigilo, segurança, boas práticas e gerência de dados) e com isso sustentam a possibilidade de responsabilidade por omissão na adoção de medidas de segurança ou descumprimento das obrigações impostas na lei8. 7 VI - controlador: pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, a quem competem as decisões referentes ao tratamento de dados pessoais; VII - operador: pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, que realiza o tratamento de dados pessoais em nome do controlador; VIII - encarregado: pessoa indicada pelo controlador e operador para atuar como canal de comunicação entre o controlador, os titulares dos dados e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD); IX - agentes de tratamento: o controlador e o operador; 8 Art. 42. O controlador ou o operador que, em razão do exercício de atividade de tratamento de dados pessoais, causar a outrem dano patrimonial, moral, individual ou coletivo, em violação à legislação de proteção de dados pessoais, é obrigado a repará-lo. [...] Art. 46. Os agentes de tratamento devem adotar medidas de segurança, técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou qualquer forma de tratamento inadequado ou ilícito. 25 A fim de dar suporte ao cenário tão complexo de implantação desta lei, a própria LGPD previu a criação da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Ela é responsável pela regulação de setores específicos da atividade econômica e governamental a fim de assegurar o cumprimento de suas atribuições com a maior eficiência, além de promover o adequado funcionamento dos setores regulados, conforme legislação específica, e o tratamento de dados pessoais, na forma da lei (XXIV, § 3º da LGPD). Adicionalmente, esta agência desempenha um papel fiscalizatório e sancionatório quando acaba sendo responsável pela aplicação das sanções previstas nesta lei (Art. 55-K). 2.2 Validade e eficácia da LGPD no Ordenamento Jurídico Brasileiro Dentre as várias formas de normas presentes no Ordenamento Jurídico Brasileiro, a regra jurídica de conduta se caracteriza por disciplinar formas de atividades e de conduta, delimitando o comportamento do Estado e dos indivíduos (REALE, 2001). As regras caracterizam-se por serem normas que estabelecem imperativamente uma obrigação, sendo aplicáveis por completo e de modo absoluto (DWORKIN, 1999). Deste modo, as regras, assim como os princípios, podem ser vistas no ordenamento jurídico como uma maneira de garantir a segurança jurídica e viabilizar os valores preconizados pela sociedade. Neste sentido, esse tipo de regra pré configura a ocorrência de um fato/ato e associa uma consequência pré-determinada - objetividade e obrigatoriedade: o “dever-ser”. Embasada num juízo hipotético, ela parte do pressuposto do livre arbítrio dos indivíduos no que tange a cumprir ou descumprir o previsto da regra. É importante ressaltar que toda regra de conduta possui uma alternativa de adimplemento em caso de violação do dever que ela anuncia. Neste cenário, a estrutura da regra jurídica por si só não é autocontida e suficiente para sua adoção, sendo necessário que ela satisfaça uma série de requisitos de validade (REALE, 2001): validade formal (vigência), validade social (eficácia) e validade ética (fundamento). [...] Art. 50. Os controladores e operadores, no âmbito de suas competências, pelo tratamento de dados pessoais, individualmente ou por meio de associações, poderão formular regras de boas práticas e de governança que estabeleçam as condições de organização, o regime de funcionamento, os procedimentos, incluindo reclamações e petições de titulares, as normas de segurança, os padrões técnicos, as obrigações específicas para os diversos envolvidos no tratamento, as ações educativas, os mecanismos internos de supervisão e de mitigação de riscos e outros aspectos relacionados ao tratamento de dados pessoais. (BRASIL, 2018) 26 Portanto, ela deve ser elaborada e aprovada por um órgão competente previsto pela Constituição Federal, com legitimidade subjetiva - quanto ao órgão em si - e legitimidade também quanto à matéria versada. Adicionalmente, o legislador deve respeitar o regimento interno de funcionamento do órgão, fazendo com que a regra criada deva respeitar também um requisito procedimental. Apenas atendendo a esses três requisitos de legitimidade, é possível afirmar que ela se torna formalmente válida, podendo se manifestar como norma jurídica dentro do ordenamento jurídico. Por outro lado, a validade social está ligada à conduta humana, a partir do momento em que a sociedade vive o Direito e o incorpora na maneira de ser e agir da coletividade. Portanto, há uma clara distinção entre a validade formal (vigência) da validade social (eficácia) que se refere ao cumprimento do Direito por parte da sociedade, tendo em vista que há um reconhecimento da regra e dos seus efeitos na comunidade suscitada através do seu cumprimento. Por fim, destaca-se a necessidade de fundamentação de toda regra de conduta. Esse fundamento deve sempre se pautar no senso de justiça e de coletividade. Ele é a razão de ser da norma, onde é possível compreender a finalidade que legitima inclusive a vigência e a eficácia. Sob essa perspectiva, é possível observar a correlação dessas características da regra jurídica de conduta com a visão tridimensional da norma: vigência - norma, eficácia - fato, fundamento - valor. As regras de conduta podem ser formalizadas através de leis, que no sentido técnico, introduzem algo novo de caráter obrigatório no sistema jurídico em vigor, disciplinando comportamentos individuais e até mesmo de entes públicos. O ordenamento jurídico brasileiro se estrutura a partir da Constituição Federal, que por sua vez delimita a competência e a estrutura de todo o sistema normativo. Portanto, a inovação do Direito já existente se dá através da criação de novas leis, respeitando o processo legislativo legal. Sendo assim, a lei assume um papel de destaque na construção sistemática das fontes do Direito e na sua consequente aplicação através da elaboração de normas no ordenamentojurídico. A despeito da criação da LGPD em 2018, sua vigência parcial ocorreu apenas em agosto de 2020, e total, em agosto de 2021, após várias modificações e discussões legislativas sobre a matéria. Esse tempo entre a publicação da lei e sua vigência teve como justificativa o grande desafio à sua implementação pelas entidades públicas e privadas, em razão da pandemia do coronavírus de COVID-19. A despeito de ela assumir um papel de inovação no Direito Brasileiro, a sua validade social ficou comprometida, logo numa época em que o mundo gira 27 em torno de economia majoritariamente digital, trafegando dados pessoais em redes de computadores ao redor do mundo. Levando em consideração que a aplicação da norma pressupõe seus três requisitos de validade - formal, social, ético - a LGPD ainda apresenta lacunas a serem preenchidas, repercutindo na sua efetividade social. Neste cenário, apesar de ela tardiamente ter entrado em vigência, estudos apontam que empresas começaram a mapear as recomendações previstas na lei e implementar medidas de segurança e proteção de dados, mesmo que de forma ad hoc (VENTURA, 2019). Levando em consideração a complexidade de implantação da lei e os altos valores de multas em caso de sanções, as organizações, principalmente do setor financeiro e do varejo, estão tentando se adaptar à LGPD. Porém, as indefinições acerca da LGPD e a falta de recomendações previstas para serem publicadas pela ANPD, dificulta esse processo de forma prática. O processo adaptativo no que se refere à LGPD para empresários brasileiros é algo custoso, apesar da temática se apresentar solidificada ao redor do mundo (DIAS, 2020). Alguns estudos apontam o atraso da vigência da LGPD como uma tragédia, ampliando os riscos do Brasil como país atrativo para investidores pois muitas empresas acabam tendo um desalinhamento em relação às melhores práticas internacionais no tocante ao tratamento de dados. Adicionalmente, a pandemia de COVID-19 fez crescer o volume de dados compartilhados virtualmente, criando-se um ambiente propício para a disseminação de condutas impróprias. Desta maneira, a vigência desta lei poderia servir como uma salvaguarda ao desordenado relacionamento de entidades públicas e privadas com os dados dos cidadãos. Nesta conjuntura, a cultura da proteção de dados precisa ser concebida na sociedade e servirá como uma garantia aos titulares dos dados (também consumidores), onde será possível saber quais organizações ele poderá ou não confiar suas informações (PILOTO, 2020). Assim, a implementação de um programa que seja adequado à LGPD acaba sendo uma corrida empresarial. Sairá na frente a organização que se adaptar melhor à prestação de serviços prevendo a proteção de dados dos indivíduos. Ressalta-se que para a implantação desse programa faz-se necessário a existência de uma equipe multidisciplinar e ao mesmo tempo especializada em proteção de dados, a fim de assegurar o pleno funcionamento do negócio, desde a conscientização da empresa, passando por mapeamento de dados e verificação de equipamentos de segurança e privacidade (GARCIA, 2020). 28 2.3 A (In)segurança Jurídica acerca da LGPD A eficácia de uma norma jurídica perpassa por seu reconhecimento social, a fim de que o “dever ser” preconizado por ela seja cumprido pelos indivíduos e pelo Estado. Neste cenário, o tempo de vacância da LGPD acabou sendo um impasse que dificultou sua própria implementação, como mencionado anteriormente. Aliado a isto, a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que assume um papel regulatório, fiscalizatório e sancionatório, foi criada, mas está em processo de constituição e organização para pleno funcionamento. Esses dois fatores podem influenciar significativamente a segurança jurídica acerca da LGPD. O Princípio da Segurança Jurídica não está presente de forma expressa na Constituição Federal, mas é encontrado quando se observa o respeito ao ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido (SOUZA, 2010). Desta forma, ela constitui um princípio fundamental para a ordem jurídica internacional (BRAGA e NOGUEIRA, 2020). Possui uma natureza objetiva que versa sobre a irretroatividade da interpretação de lei no âmbito da Administração Pública e uma natureza subjetiva, que aborda a confiança da sociedade nos atos, procedimentos e condutas proferidas pelo Estado. Assim sendo, a estabilidade jurídica está diretamente relacionada com a irretroatividade do Direito, não sendo aceitável que a sociedade seja surpreendida por punições estatais devido a novas interpretações de fatos passados. Neste sentido, o Estado Democrático de Direito precisa aspirar a legalidade das suas ações, sob a égide da proteção da segurança jurídica, boa- fé e expectativas criadas pelas leis e pelas decisões judiciais. Outros dispositivos legais também se referem a este princípio, como a Lei do Processo Administrativo (Lei nº 9.784/99) que dispõe em seu Art. 2º “A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência”. Seguindo o venire contra factum proprium (não pode a Administração Pública ir de encontro aos seus próprios atos), o entendimento dos Tribunais Superiores é de que o Princípio da Segurança Jurídica supera o próprio Princípio da Legalidade (DI PIETRO, 2019). A Segurança Jurídica como princípio foi reforçado com a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), reforçando sua aplicação do Ordenamento Jurídico (LOPES e TOMAZ, 2019). Dando suporte a ele, o Princípio da Confiança desencadeia a boa-fé do cidadão, que crê na prática de atos lícitos por parte da Administração Pública e Privada. Nesta seara, o 29 Princípio da Segurança Jurídica objetivamente leva à estabilização do ordenamento, e subjetivamente busca proteger a confiança das pessoas em relação às expectativas geradas por promessas e atos estatais. Alguns doutrinadores trazem a compreensão dele como um corolário do Direito, se comportando como uma norma de pacificação social (CARVALHO, 2017). Portanto, uma das suas funções é tentar garantir a estabilidade das relações jurídicas consolidadas, fazendo com que todos tenham a certeza das consequências dos atos praticados pelos indivíduos nas suas relações sociais. Levando em conta que a legislação infraconstitucional, normalmente, estabelece novas regras, a segurança jurídica precisa ser observada com cautela, a fim de garantir a sua aplicabilidade de forma eficaz. A existência de novas interpretações é indiscutível, uma vez que o Direito se molda à sociedade, assim como a sociedade se molda ao Direito. Por conseguinte, os efeitos das novas regras precisam ser modulados para decisões futuras, de modo a estabelecer um regime de transição, instituindo a estabilidade esperada (BARBOSA, 2022). Entretanto, a responsabilidade sobre a estabilidade nas relações jurídicas não cabe apenas aos operadores do Direito, quando em suas práticas jurídicas estabelecem regimes de transição e ponderam suas decisões para evitar erros grosseiros de interpretação, mas deve começar pelos legisladores, na construção da própria norma. Assim, as lacunas deixadas pela LGPD, com previsão de serem preenchidas por outras leis, regulamentos e portarias a serem emitidos pela ANPD, dificulta ainda mais a estabilidade dessas relações jurídicas, gerando um estado de incertezas no que tange à validade e eficácia social de aplicação da lei. Apesar de algumas normas de conduta estarem previstas na LGPD, a presunção e necessidade de publicação de fontes do direito que subsidiem a conformidade das pessoas físicas, organizações e instituições, junto à LGPD ainda é um problema. Consequentemente, os limites legais sobre o tratamento de dados ainda geramum abismo entre o que se espera com a implantação da lei e o que é, ou “dever-ser” praticado pela sociedade. Deste modo, a eficácia de uma legislação pode levar em consideração vários fatores sociais, a citar, a quantidade de julgados que abordam aquela lei, a repercussão social, efeitos causados nas empresas, a utilização dela para criação de outros institutos jurídicos, dentre outros (GALVÃO et al., 2019). 2.4 A Opacidade legislativa no tratamento de dados pessoais: indefinições da ANPD A ANPD é um órgão da Administração Pública, da Presidência da República (Art. 55- A). Sua natureza jurídica é transitória, podendo ser transformada pelo Poder Executivo em entidade da administração pública federal indireta, submetida a regime autárquico especial e 30 vinculada à Presidência da República (Art. 55-A - § 1º). Ela é formada pelos seguintes órgãos: Conselho Diretor, órgão máximo de direção, Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, Corregedoria, Ouvidoria, Órgão de assessoramento jurídico próprio e Ouvidoria (BRASIL, 2018). É importante ressaltar a natureza jurídica da transitória da ANPD que atualmente é órgão do Poder Executivo, mas que tem previsão legal de se transformar em autarquia independente, podendo ou não chegar a ser Agência Reguladora. Entretanto, a própria LGPD já assegura que ela possui natureza estatal voltada a tomar decisões técnicas sem interferências políticas, não sendo subordinada hierarquicamente a qualquer ente da Administração Pública Direta, inclusive mantendo a estabilidade dos seus dirigentes, a fim de dar suporte à tomada de decisões independentes. Uma vez que a LGPD se baseia na GDPR, a criação da ANPD foi motivada pela exigência, por parte da Comissão de Proteção de Dados Pessoais da União Europeia, da existência de uma autoridade nacional com independência decisória para a proteção de dados (LIMA, 2020). O primeiro problema que se pode observar com a previsão legal sobre a ANPD é a natureza transitória da Autoridade. Uma vez que ela é órgão integrante da Presidência da República, questionamentos acerca da independência administrativa, financeira, funcional e decisória ainda são levantados. Ademais, levando em consideração o seu papel regulatório, fiscalizatório e sancionatório, a opacidade legislativa em torno da LGPD esteve, e ainda está presente, desde a criação da LGPD, uma vez que a ausência da ANPD repercutiu na falta de regulamentação sobre questões importantes, como por exemplo, prazos para atendimento dos requerimentos dos titulares, base legal de dados pessoais, normas específicas para micro e pequenas empresas ou mesmo transferências internacionais (ABRUSIO et al., 2020). Aliado a isso, é notório como as mudanças tecnológicas ocorrem rapidamente, exigindo aos operadores do direito, uma atualização constante acerca do tratamento de dados pessoais em meios digitais. O mercado é dinâmico e os softwares dominam o mundo. Assim, a apuração das responsabilidades civis necessitará de conhecimento técnico profundo sobre informática, exigindo-se a adoção de prova pericial (Art. 464, I do CPC) (CORREIA, 2019). Essas provas técnicas afastarão o automatismo da responsabilização objetiva pura e o ativismo judicial, quando este é prejudicial à segurança jurídica, uma vez que ele é demandado pela ausência de norma que se adeque a determinados casos concretos. Por conseguinte, as bases teórico- jurídicas e os guias práticos de implantação da ANPD serão naturalmente ajustados frente às demandas de negócio, de diferentes setores econômicos, inclusive daqueles decorrentes de 31 questões tecnológicas que estão sempre em contínua evolução (GARCIA, 2020) (LOPES et al., 2020). Estudos apontam que uma das maiores dificuldades no compliance digital, no que se refere à LGPD, é a falta de clareza sobre o efetivo e o material regulatório da ANPD, para a execução de suas atribuições: estabelecimento de normas, padrões técnicos e ações educadoras junto às empresas (REUTERS, 2019) (CELIDONIO, 2020). A omissão da ANPD atualmente pode ser vista como um dos maiores problemas de implantação da LGPD, do ponto de vista interno, uma vez que a regulamentação sobre o tratamento de dados ainda possui lacunas, e do ponto de vista externo, tendo em vista que o Brasil acaba tendo dificuldades em estar em conformidade com padrões internacionais de proteção de dados pessoais (LOPES et al., 2020). 32 3 O PAPEL HERMENÊUTICO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 3.1 Heterointegração e Autointegração: complementação do ordenamento jurídico Mesmo numa conjuntura complexa, com emaranhado de normas constitucionais e infraconstitucionais, é esperado em qualquer ordenamento jurídico a existência de lacunas. Elas existem quando o sistema jurídico não atende ao caso concreto e o operador precisa decidir sobre o tema. Quando elas ocorrem, há uma ausência de norma específica, ou mesmo de um critério para a aplicação de outras normas (EQUIPE SAJ ADV, 2018). Nestes cenários, os operadores do Direito podem se apoiar em técnicas de integração. Essa técnica foi uma forma que o Direito achou para atingir sua efetividade, mesmo diante de grandes transformações sociais. É importante destacar que as lacunas não devem ser compreendidas como uma falha no ordenamento, mas uma omissão involuntária que resulta de uma limitação natural da norma. Isto ocorre naturalmente nos sistemas jurídicos porque é inconcebível elaborar normas jurídicas que se apliquem de forma atemporal e para todas as situações. Levando em conta a Teoria do Ordenamento Jurídico de Bobbio, existem dois tipos frequentes de lacunas: (i) próprias e (ii) impróprias (BOBBIO, 2014). As próprias dizem respeito às hipóteses de inexistência de norma específica para um caso concreto. Nestes casos, a existência de uma lacuna própria pressupõe um ordenamento formado por normas exclusivas gerais e por normas gerais inclusivas, e portanto, diante de um caso concreto, é esperado que ele seja enquadrado em qualquer uma delas por atividade interpretativa do jurista. Por outro lado, as lacunas impróprias existem quando um caso não regulamentado é enquadrado por uma norma geral exclusiva do sistema, mas a prática não condiz com o ideal. Quando isto ocorre, faz-se necessária a formulação de novas normas por ação do legislador. Nesta conjuntura, as técnicas de integração visam auxiliar os advogados em suas argumentações, uma vez que há necessidade de preenchimento dessa ausência de regulamentação. Segundo o doutrinador Bobbio (2014), existem dois métodos de complementação do ordenamento jurídico através das técnicas de integração: heterointegração (costumes e princípios gerais), que consiste na integração operada através de recurso a ordenamentos diversos daquele que é dominante e a autointegração (analogia), que consiste na integração 33 cumprida através do mesmo ordenamento. O Art. 4o da LINDB9 e o art. 140 do Código de Processo Civil (CPC)10 dispõem sobre técnicas de integração, podendo o operador de direito recorrer à analogia, costumes e princípios gerais do Direito para solucionar as questões. Os costumes são regras sociais praticadas reiteradamente e de forma generalizada que acabam se tornando obrigatórias dentro de uma sociedade, sendo consideradas como fontes do direito. Em contrapartida, a analogia não é apenas um método de interpretação, e sim uma fonte de Direito (MARQUES, 2021). No caso de lacunas da lei, a função da analogia é encontrar, no ordenamento jurídico vigente, as hipóteses que sejam previstas pelo legislador e que contem com uma semelhança ao fato existente. Nesta toada, a equidade para muitos estudiosos está relacionada com a ideia de justiça em um caso particular. Pode ser vista como uma adaptação geral e abstratada norma jurídica ao caso concreto, que apenas pode ser utilizada nos casos em que a lei autoriza, conforme previsão expressa do parágrafo único, art. 140 do Novo CPC. Considerados basilares como fontes do direito, os princípios gerais são preceitos, ou fundamentos, que servem para orientar a compreensão sobre um determinado tema. Esses princípios valem como alicerces para sedimentarem uma completude do ordenamento jurídico. Ressalta-se que os princípios informam o sistema de forma independente, mesmo que não estejam positivados de forma expressa na norma. Em consequência disso, vale considerar as tendências jurisprudenciais e o histórico de julgamento dos juízos competentes na formulação da argumentação. Por outro lado, a jurisprudência é uma outra forma de solucionar questões envolvendo lacunas da lei. Ela é um conjunto de decisões e análises que são feitas pelo Judiciário a respeito de um determinado tema, que serve como uma diretriz para os operadores do Direito, orientado à construção de teses e até o posicionamento em novas decisões. Pode-se compreender então que a jurisprudência tem três funções principais: (i) aplicação da lei, (ii) adaptar a lei, colocando-a em harmonia com as ideias contemporâneas da sociedade e as necessidades modernas e por fim, (iii) uma função criadora, destinada a preencher as lacunas da lei (MAXIMILIANO, 1984). Como consequência, a jurisprudência acaba sendo a fonte mais geral e extensa de exegese, propondo soluções mais adequadas às necessidades sociais. Ademais, ela evita que uma questão doutrinária se torne eternamente aberta, fazendo com que se abra margens à novas demandas, uma vez que não se saberá qual o resultado das controvérsias. Em destaque, a jurisprudência, apesar de falhas algumas vezes, adaptar os textos às condições da 9 Art. 4º (LINDB) Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. 10 Art. 140 (CPC). O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico. 34 sociedade atual, tornando-se a grande renovadora do Direito, erradicando ideias dominantes e retrógradas. Entretanto, é importante ressaltar que a jurisprudência auxilia o trabalho do intérprete, mas não o substitui, nem dispensa. Assim, os julgados se tornam fatores de jurisprudência somente quanto aos pontos questionados e decididos, e não quanto ao raciocínio, exemplificações e referências (MAXIMILIANO, 1984). Como efeito, o mais importante do julgado está em seus fundamentos, devendo haver inclusive confronto de várias decisões acerca do tema. Por fim, é importante destacar que as sentenças de primeira instância formam jurisprudência, mas na medida em que se aumenta a altura do tribunal mais aumenta o prestígio das discussões sobre o tema, e inutilizam os juízes inferiores. O STF ocupa o primeiro lugar e depois vêm os Tribunais de segunda instância. Neste cenário, a jurisprudência acaba sendo a causa mais geral da formação de costumes jurídicos em tempos modernos, contribuindo para precedentes legislativos e para o Direito Consuetudinário. Ao observar as lacunas jurídicas e as alternativas em lidar com as situações que são postas à prova, a dogmática jurídica é uma forma que os operadores do Direito têm de observar, analisar e atuar conforme as orientações e pressupostos provados de forma cognitiva, ou levantados através de experiências reais geradas por casos ocorridos anteriormente. Ela não apenas orienta, mas estabelece limites relacionados à interpretação e aplicação da norma. 3.2 Hermenêutica Jurídica para auxiliar a interpretação do direito A Hermenêutica Jurídica tem o objetivo de sistematizar os processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito (MAXIMILIANO, 1984). Portanto, ela acaba sendo uma ciência que estuda princípios metodológicos de interpretação e explicação da norma jurídica, sistematizando os meios pelos quais se preencham as lacunas existentes no Sistema jurídico vigente (GARCIA, 1996). Neste cenário, ela exerce um papel fundamental para o Direito Positivo, uma vez que este precisa ser bem compreendido para então, ser corretamente aplicado nos casos concretos. À primeira vista, os conceitos de interpretação e hermenêutica podem parecer sinônimos, mas no campo jurídico, a Hermenêutica abrange a Interpretação, a Integração e a aplicação do Direito propriamente dito, que vem a ser a finalidade maior (ROCHA, 2022). Assim, de maneira geral, a interpretação é de cunho prático, aplicando os ensinamentos da hermenêutica, enquanto esta última descobre e fixa os princípios que regem a interpretação. Para alguns doutrinadores, 35 interpretar é apreender ou compreender os sentidos implícitos das normas jurídicas, revelando o pensamento que está por trás das palavras11. Ao interpretar, o aplicador do direito não somente deixa claro o que a norma representa, mas consegue revelar o sentido apropriado para o caso concreto. É importante destacar que a interpretação e a legislação convivem em uma forma cíclica, uma vez que se eleva da realidade à norma e retorna-se da norma para realidade 12 . Consequentemente, há a compreensão de que toda norma jurídica necessita de interpretação, tendo consciência de que nenhuma lei é capaz de prever a todos os casos possíveis. Aí está o papel da hermenêutica jurídica, procedendo como uma forma de adaptar a lei rígida e abstrata aos fatos e casos concretos do cotidiano da vida em sociedade. Portanto, a hermenêutica visa determinar não só o sentido das normas, seu alcance e sua adaptação aos casos concretos. Existem várias espécies de interpretação, condicionadas quanto à sua origem, sua natureza e seus efeitos. Entretanto, como foco deste trabalho é analisar a interpretação jurisprudencial dos Tribunais Superiores, é mister destacar a interpretação judicial, também conhecida como usual. Ao adotar este tipo de interpretação, o julgador faz prévia condição para a aplicação do Direito, ocorrendo quando os Juízes de Direito das instâncias inferiores sentenciam, bem como nas ocasiões em que os Tribunais de instâncias superiores proferem suas decisões na forma de Acórdãos (ROCHA, 2022). Adicionalmente, as súmulas que esclarecem conceitos normativos também compõem este rol. Por outro lado, para a doutrina e jurisprudência mais atual, a adoção da hermenêutica deixa de ser simplesmente um ato de revelação de sentido para a construção deste sentido, considerando não só o texto normativo, mas o interlocutor e sua forma de vida (REGO, 2009). Neste contexto surge o Pragmatismo Jurídico que se concebe como um método de elaboração teórica de pensamento, sustentando-se numa lógica baseada na experiência. Possui como características13 (i) o antifundacionalismo, que consiste na rejeição de asserções absolutas previamente concebidas, estáticas, perpétuas e imutáveis, como alicerce do pensamento e do conhecimento; (ii) o consequencialismo, que se manifesta na acepção de que a avaliação de ações e proposições deve se dar através da investigação de suas decorrências atuais e de possibilidades futuras, e (iii) o contextualismo, que importa em conferir a necessária relevância 11 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria Geral do Direito Civil. 7. ed. São Paulo: Francisco Alves, 1955, p. 37. 12 COELHO DE SOUZA, Daniel. Introdução à ciência do Direito. 4. ed. rev. aum., São Paulo: Saraiva, 1983, p. 386. 13 FOSCHIANI, Clayton. O legado de William James. Cognitio-Estudos: Revista Eletrônica de Filosofia. São Paulo, vol. 7, n. 2, jul-dez.2010. Disponível em: http://revistas.pucsp.br/index.php/cognitio/article/view/3857/3017. Acesso em: 10 de jan. 2022, p. 238-239. 36 aos aspectos culturais, que não podem e não devem ser apartados do processo de investigação filosófica ou científica. Com o Pragmatismo, os julgadores passama ter um papel fundamental no universo jurídico, uma vez que a aplicação do Direito será comprometida com a intervenção que ele faz da realidade social, suas tendências e aspirações. No entanto, há de se ressaltar que isto não pode ser feito de forma arbitrária, mas conforme sua habilidade de olhar para o futuro, tendo consciência das consequências que seu julgamento irá provocar (FRANK, 1993). Sendo este um modo de se exercer a prática do Direito, através de uma hermenêutica dialógica, ele se manifestará através das atividades cotidianas nos aplicadores, que aos poucos irão construindo sentido às normas, que somente a análise e compreensão da realidade da vida podem conduzir ao objetivo principal, a Justiça. 3.3 Hermenêutica legislativa do Superior Tribunal de Justiça (STJ) O Superior Tribunal de Justiça é um órgão do Poder Judiciário, composto por 33 ministros, nomeados pelo presidente da República, aprovados em sabatina, por votação absoluta, pelo Senado Federal (DA SILVA, 2020). Sua competência é disciplinada em três áreas: (1) originária, para processar e julgar as questões relacionadas no inc. l do art. 105; (2) competência para julgar, em recurso ordinário, as causas referidas no inc. II; (3) competência para julgar, em recurso especial, as causas indicadas no inc. III. Promulgada a Constituição de 1988, o Art. 105 incumbiu o STJ de proteger o direito federal, tendo a função constitucional de determinar o entendimento das leis federais para orientar a jurisprudência14. Doutrinadores, a citar Nelson Luiz Pinto, traz de forma clara a função do STJ que é “de zelar pela aplicação correta e uniforme do direito federal, sem contentar-se com interpretações dadas por outros Tribunais tidas apenas como razoáveis, mas que não coincidam com aquela que o STJ entenda como a correta e única possível”15. O que caracteriza propriamente o STJ são suas atribuições no controle de incertezas positivas em matéria de lei federal (DA SILVA, 2020). Desta forma, ele consubstancia a jurisdição de tutela do princípio da incolumidade do Direito objetivo. Como consequência, levando em conta sua competência de julgar, em forma de recurso especial, as causas decididas 14 ALVIM, Arruda. Recursos no Superior Tribunal de Justiça (Coord. Sálvio de Figueiredo). São Paulo: Saraiva, 1991. p. 155 15 PINTO, Nelson Luiz. Recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça teoria geral e admissibilidade. São Paulo: Malheiros Editores, 1992. p. 174. 37 em única ou última instância, pelos TRFs ou Tribunais Estaduais e Distrital, ele (i) observa se a referida lei discutida contraria outra lei federal ou tratado, (ii) julga válido ato de governo local contestado em face de lei federal e (iii) dá interpretação à lei federal (ou interpretação divergente) da que lhe haja atribuído em outro tribunal. É assegurado tanto ao Superior Tribunal de Justiça quanto ao Supremo Tribunal Federal a possibilidade de analisar se a interpretação de uma lei viola ou não a Constituição (MARINONI, 2021). Como consequência, eles têm proferido decisões de inadmissibilidade contraditórias, que não apenas violam o direito à tutela jurisdicional, como prejudicam o desempenho das suas próprias funções. As decisões das duas Cortes demonstram que nem uma nem outra parecem ter claro quem deve definir a interpretação da lei conforme à Constituição. As Cortes Superiores possuem mais responsabilidades do que as cortes de instância ordinária, possuindo as seguintes funções: (i) nomofilática16, que possibilita o equilíbrio entre o interesse público e a necessidade de correção das decisões para as partes envolvidas no processo, com a preponderância do interesse público para preservar a higidez das normas; (ii) uniformizadora17, a fim de assegura a igualdade, a previsibilidade e a segurança jurídica, com foco na uniformidade na aplicação e interpretação de regras e princípios em todo território nacional; (iii) paradigmática18, que fornece padrões decisórios para o julgamento isonômico dos casos; e (iv) dikelógica19, que preserva a resolução justa do caso concreto. Ressalta-se que o STJ é a Corte incumbida de definir a interpretação da lei nos termos da Constituição. Portanto, interpretar a lei nos termos da Constituição é primordialmente, conferir sentido à lei, já que a Constituição, ainda que também seja compreendida e vista com determinado significado, no processo interpretativo, se coloca como parâmetro e não como o objeto a que a atividade de interpretação busca atribuir sentido (MARINONI, 2021). Assim, é impossível pensar que o STJ define a interpretação da lei sem levar em conta sua adequação quanto à Constituição. 16 MEDINA, José Miguel Garcia. Prequestionamento, repercussão geral da questão constitucional, relevância da questão federal: admissibilidade, processamento e julgamento dos recursos extraordinário e especial [livro eletrônico] . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. [n.p.]. 17 RANÑA, Leonardo Fernandes. Ordem pública nos recursos extraordinários e especial: observância do devido processo legal. Brasília: Gazeta Jurídica, 2018. p. 85. 18 ALVIM, Teresa Arruda; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e nova função dos tribunais superiores precedentes no direito brasileiro [livro eletrônico]. 4. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. [n.p.]. 19 O termo “dikelógico” deriva da junção de duas palavras gregas, sendo elas dike (justiça) e lógiko (relativo à razão). (ALVIM, Teresa Arruda; DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e nova função dos tribunais superiores precedentes no direito brasileiro [livro eletrônico] 4. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. [n.p.].; e RANÑA, Leonardo Fernandes. Ordem pública nos recursos extraordinários e especial: observância do devido processo legal. Brasília: Gazeta Jurídica, 2018. p. 87.). 38 No ordenamento jurídico brasileiro, foram estabelecidas duas Cortes para a revisão das decisões dos Tribunais, uma para rever as decisões que contrariam “a lei federal” e outra para rever as decisões que contrariam o "dispositivo da Constituição” (MARINONI, 2021). Hodiernamente, levando em conta as modernas teorias da interpretação e da transformação do civil law, a definição da interpretação da lei está centrada na necessidade de se garantir a segurança jurídica e a coerência do direito. Consequentemente, os precedentes obrigatórios ou vinculantes nada mais são do que uma consequência do dever de a Corte outorgar a todos um mesmo Direito. 3.4 Hermenêutica constitucional do Supremo Tribunal Federal (STF) O STF tem sua formação semelhante ao do STJ, sendo composto por 11 ministros, também nomeados pelo presidente, depois de aprovada a escolha por sabatina no Senado Federal. Das competências do STF, cabe (i) processar e julgar originariamente as questões relacionadas ao inciso I do Art. 102 da constituição, (ii) julgar recursos ordinários indicados pelo inciso II e (iii) julgar em recurso extraordinário causa decididas em única e última instância que envolvem questões constitucionais referidas nas alíneas do inciso III, Art. 102 (DA SILVA, 2020). É importante ressaltar, todavia, que o conteúdo dos litígios devem ter caráter constitucional, sendo de competência do Pretório Excelso a (a) Jurisdição constitucional com controle de constitucionalidade, onde cabe ao STF processar e julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, assim também o pedido de medida cautelar nas ações diretas de inconstitucionalidade; (b) a jurisdição constitucional da liberdade, podendo o STF para processar e julgar, originariamente o habeas corpus, habeas data, mandado de segurança e mandado de injunção; e (c) jurisdição constitucional sem controle de constitucionalidade, nos
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