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câíl Editora
uçp Átomo
DIRETOR GERAL
Wilon Mazalla Jr.
COORDENAÇÃO EDITORIAL
Willian F. Mighton
COORDENAÇÃO DE REVISÃO E COPYDESK
Helena Moysés
REVISÃO DE TEXTOS
Giovana Aparecida Tartari
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Adriane Bergantin da Silva
Camila Lagoeiro
Fabio Diego da Silva
Gisele de Cássia Ribeiro Amaral
Tatiane de Lima
CAPA
Ivan Grilo
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Libânio, Marcelo
Fundamentos de qualidade e tratamento de água/ Marcelo
Libânio. - - Campinas, SP: Editora Átomo, 2010. 3a Edição
Bibliografia
1. Água 2. Água - Estação de
tratamento - Equipamento e acessórios 3. Águas
naturais - Purificação 4. Água - Controle de
qualidade I. Título.
05-6323 CDD-628.1 índices para Catálogo Sistemático
1. Água: Tratamento: Controle de qualidade:
Tecnologia: Engenharia sanitária 628.1
ISBN 978-85-7670-165-1
Todos os direitos reservados à
_ r
Editora Atomo
Rua Tiradentes, 1053 - Guanabara - Campinas-SP CEP
13023-191 - PABX: (19) 3232.9340 e 3232.0047
www.atomoealinea.com.br
Impresso no Brasil
Editora
Á tom o
CONSELHO
EDITORIAL
Área | Química
Aécio Pereira Chagas
Universidade Estadual de Campinas -
UNICAMP
Célio Pasquini
Universidade Estadual de Campinas -
UNICAMP
Flávio Leite
T & E Analítica
Mário Sérgio Galhiane
Universidade Estadual Paulista -
UNESP
Pedro Faria
Universidade Estadual de Campinas -
UNICAMP
Ricardo Ferreira
Universidade Federal de Pernambuco - UFPE
Robson Fernandes de Farias
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Ao meu querido tio (Rubens LiSânio, que desempenha há tanto tempo
e com tanto desvefo um papeíque taívez não Che couBesse.
A Leonardo Rarma e (Bernardo Macedo, amigos
exemplares!, peta ventura de uma convivência já
tocada pehos anos.
A Ana Rereza e Mariana. IncondicionaCmente.
Não há como deixar de reconhecer a importância das diversas pesquisas desenvolvidas sob
a chancela de órgãos como Fundunesp, Fapemig, Finep, Capes e CNPq, cujos principais
resultados foram, com êxito variável, transpostos para as páginas deste livro. Da mesma
forma, o papel dos diversos alunos de graduação e pós com os quais tenho tido a satisfação de
trabalhar. Destes, em especial, Maria de Lourdes Fernandes Neto e Vanessa Cristina Lopes. A
primeira pela leitura aguda dos capítulos relacionados à qualidade de água, a segunda pelas
diversas figuras que se espraiam pelas páginas do livro. A ambas pela atenção e delicadeza.
Por fim, agradecimento especial aos colegas do Departamento de Engenharia Hidráulica e
Recursos Hídricos da UFMG pelo constante apoio e acolhimento ao longo de mais de uma
década de convívio tão profícuo quanto prazeroso.
[...] Tudo o que quiserem, porque a terra que andamos puxados pelos
pés, querendo deitar raízes, homens-árvore como no mito de Dafne, é a das serras
em forma das chaminés, lanças, seios, anátemas, agulhas, manoplas, ereções,
castelos, torreões, navios - azuladas pela manhã, quando emergem do mar de
bruma dos vaiados, refulgentes ao sol do meio-dia e recortando-se sobre os tons de
cobre, ouro e púrpura do entre dia-e-noite. Serras, serras, picos... Curral, Piedade,
Rol a-Moça, Caraça, Itacolomi, Vertentes, Mantiqueira. Serras de cujas encostas
descem os rios que vão ao São Francisco e Paraíba para soltar no Atlântico o
nosso sangue mineral. Rios encachoeirados, rápidos ou lentos, turvos ou claros,
limosos, vermelhos, lamacentos, verdes, cheios de ferrugem e de ouro em pó. Rios,
rios, ribeirões... Sapucaí, Paraopeba, Arrudas, Santa Bárbara, Carmo, .Grande, Rio
das Velhas, Rio das Mortes... Rios que levam até o mar o sabor de Belo Horizonte,
Caeté, Sabará, O uro Preto, Mariana, Congonhas do Campo, Santa Bárbara do
Mato Dentro. Rios que pela vida subterrânea dos lençóis d’água drenam do solo
das igrejas e da terra dos cemitérios a substância calcária de meus parentes -
porque deles há sempre um esqueleto em cada cripta ou cada campo santo -
contido naquele círculo que começa e acaba em Queluz, tendo Rio Acima como
centro do seu raio. Essas áreas não posso chamar de pátria, porque não as amo
civicamente. O meu sentimento é mais inevitável, mais profundo e mais alto porque
vem da inseparabilidade, do entranhamento, da unidade e da consubstanciação.
Sobretudo, da poesia... Assim, onde é que já se viu um pouco d'água amar o resto
da água? Se tudo é água...
Pedro Nava - Baú de Ossos
Sumário r •
Apresentação à 3a Edição.............................................. ....................................... ..................13
Introdução.............................. 15 Conceito e
histórico.............................................................................................. 15 Disponibilidade
hídrica............. ...........16 Propriedades das águas naturais.........................................
............................................. 19
Características das Aguas Naturais.................................................... 25 Características
físicas............................ 25 Características
químicas.......................................................................................... 42 Características
biológicas.......................................... ................. .............. ......................63 Características
radioativas............................................................................ 78
índices de Qualidade de A gua................................................................................................. 79
Metodologia Delphi..................................................................................................• -.......80
índice de qualidade de água........................................................................ ......................80
índice de qualidade de água bruta....................................................... .............................84
A Evolução dos Padrões de Potabilidade................................................................................91
Histórico.......................... 91 Evolução dos padrões de potabilidade
americanos.........................................................92 Evolução dos padrões de potabilidade
nacionais.......................... 93 Tendências ...................................... .....98
CvüíAuv 33
Poluição e Contaminação de Mananciais............................................................... .......107
Conceito............................. 107 Tipos de captação e seus efeitos sobre a qualidade de
água.......................................-111 Alterações nas características das águas
superficiais................................. H6 Alterações nas características das águas
subterrâneas.................................................. 123 Proteção de mananciais......
............................................................................... ••••••....... 129
Tecnologias de Tratamento ............
.............................................. . Fatores
intervenientes na definição da tecnologia de
tratamento. Tecnologias de tratamento...........
.................................................
Coagulação.........................................................
.............................. ...... Histórico e conceito.....
................................................... ...............
Mecanismos de coagulação..........................
.............. ................... Fatores intervenientes na
coagulação............................................
Unidades de mistura rápida......... ...............
..................................
Floculação..........................................................
.................................... Considerações
iniciais................
.................................................... Mecanismos
de transporte e intervenientes na
floculação.......... Mecanismos de agregação e
ruptura dos flocos............................ Fatores
intervenientes na
floculação............................................. Tipos
de unidades defloculação.....................................................
TTo 7v
Decantação..........................................................
................................... Conceito e
histórico..............................................................
........... Distribuição de água
floculada........................................................
Sedimentação de partículas
discretas............................................
Sedimentação de partículas
floculentas......................................... Tipos de
unidades de
decantação...................................................
Resíduos gerados nas unidades de
decantação..............................
Cm? tule. Vj
Filtração
............................................................................
...................... Conceito e
histórico..............................................................
........... Mecanismos intervenientes na
filtração.........................................
' Meio
filtrante................................................................
..................... Tipos de filtros empregados no
tratamento de água..................... Sistemas de
drenagem, camada-suporte e calhas de
coleta......... Aspectos operacionais dos filtros
rápidos...................................... Sistemas de
controle de
filtros.........................................................
Adequação e Otimização de
Estações..................................................
Introdução...........................................................
............................... Diagramas de
coagulação..........................................................
...... Ensaios de tratabilidade para estações
existentes......................... Ensaios de
tratabilidade para estações por
construir..................... Procedimentos para
realização dos ensaios em reatores estáticos
Avaliação do desempenho das unidades
filtrantes........................
.135 .135 .146
.153 .153 .157 .162 .196
.209 .209 .211 .216 .221 .237
.257 .257 .258 .262 .269 .270 .302
.309 .309 .311 .318 .332 .359 .365 .378
.385 .385 .387 .391 .401 .406 .408
Filtração em Membrana.................................................................................... .....................411
Introdução........................................................................................................................... 411
Histórico............................................................................................ 413 Aplicação e tipos
de membranas.................... 414 Custos dos sistemas de filtração em
membrana........................................... 417 Eficiência da tecnologia de filtração em
membranas.......................................... 419
Capitulo 13
Desinfecção..............................................................................................................................421
Conceito e histórico.......................................................................................................... 421
Processos e mecanismos de desinfecção................ 423 Fatores intervenientes na eficiência
da desinfecção...................................................... 424 Desinfecção com compostos de
cloro.... ........... 427 Desinfetantes alternativos ao cloro........................ 436
Fluoretação.............. 445 Conceito......................... 445
Histórico.................................................. 445 Atuação preventiva do
flúor............................................................................................. 447 Fluoretação no
Brasil................................. 449 Compostos de
flúor................................................................................................ 450 Aplicação do
flúor.............................................................................................................451 Custo da
fluoretação..........................................................................................................453
Corrosividade e Agressividade.............................................................................................. 455
Aloísio de Araújo Prince
Introdução...........................................................................................................................455
Relevância..........................................................................................................................456
Corrosão metálica..............................................................................................................457
Agressão a concreto..........................................................................................................465
Métodos de combate à corrosão.......................................... 466 Condicionamento
químico............................................................................................... 469
Teste para Determinar o Estágio de Saturação
de Carbonato de Cálcio de uma Água (Teste de Mármore)................................................477
Referências..................................... 479
Apresentação à 3 a
Edição
É difícil precisar quando a motivação para
escrever este livro manifestou-se pela
primeira vez. Talvez tenha surgido de forma
ainda tênue quando ministrei, em nível de
graduação na Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, disciplina
relacionada ao tema no final da década de
1980. Alguns anos depois o mesmo se deu na Universidade Estadual Paulista (Faculdade de Engenharia
de Ilha Solteira). A partir de 1994, passei a ministrá-la com maior frequência no contexto do curso de
Especialização em Engenharia Sanitária e pouco depois, de forma perene, no bojo do Programa de
Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG. Tive também
oportunidade de ministrar diversos cursos de curta duração em vários estados do Brasil, experiência que
ajudou a consolidar o desejo de produzir uma obra que contribuísse para disseminação dos conceitos
relacionados a tão importante tema.
O discreto êxito das duas edições anteriores motivou-me, nesta 3a edição, a ampliar o espectro de
abrangência da obra. Assim, como resultado de pesquisas que tive a satisfação de coordenar nos últimos
anos, foram inseridos dois capítulos versando sobre indicadores de qualidade de água e filtração em
membrana como emergente tecnologia de tratamento. Os demais capítulos expandidos centram-se nos
aspectos fundamentais relacionados às características das águas naturais, enfatizando também a poluição
de mananciais passíveis de serem empregados para abastecimento. Os principais processos e operações
unitárias intrínsecos às tecnologias de tratamento mais extensivamente utilizadas ou que cujas
características favoreçam seu emprego no País são abordados nos capítulos subsequentes. Destes, apenas a
flotação por ar dissolvido não foi contemplada, de uso restrito ainda no País, embora em algumas estações
na Região Sudeste esta operação unitária faça-se presente com resultados variáveis.
Cabe destacar que o Capítulo 15 foi elaborado pelo engenheiro Aloísio Prince e os capítulos 9 e 12
contaram, respectivamente, com a colaboração dos engenheiros Nelson Guimarães e Alisson Bragança. O
livro destina-se a profissionais e estudantes (em nível de graduação e pós), apresentando os fundamentos
teóricos das etapas do tratamento e diversos exemplos de cálculo. Cálculos adicionais dos parâmetros
hidráulicos inerentes às tecnologias de potabilização podem ser realizados por meio de software disponível
no endereço www. ehr.ufmg.br.
Por fim, resolvi incluir no início de cada capítulo verbetes hídrico-literários, incomuns em obra que
mais das ciências exatas se aproxima, e que talvez - também pela significativa presença do maior ícone
das nossas letras - possam se constituir deste texto a sua melhor parte.
Introdução
Um homem nunca se banha duas vezes no mesmo rio. Porque
o homem nunca é o mesmo. £ nunca é o mesmo rio.
Heráclito de Éfeso (470 d.C.)
Conceito e histórico
A águaocupa aproximadamente 75 % da superfície da Terra e é o constituinte inorgânico mais
abundante na matéria viva, integrando aproximadamente dois terços do corpo humano e atingindo até 98
% para certos animais aquáticos, legumes, frutas e verduras. Constitui-se também no solvente universal da
maioria das substâncias, modificando-as e modificando-se em função destas. Diversas características das
águas naturais advêm desta capacidade de dissolução, diferenciando-as pelas características do solo da
bacia hidrográfica. Como consequência, o corpo d’água, rio ou lago sempre inclui a bacia hidrográfica
que, por sua vez, imprimir-lhe-á muitas das suas características no que tange à geologia, à pedologia, à
morfologia, à hidrologia, à vegetação, ao clima predominante e, principalmente, às atividades antrópicas
nela desenvolvidas.
Aliada à mencionada capacidade de dissolução, a água atua como meio de transporte - em
escoamento superficial e subterrâneo - permitindo que as características de um mesmo curso d’água
alterem-se temporal e espacialmente. Por fim, as características das águas naturais influenciam e são
também influenciadas pelo metabolismo dos organismos aquáticos, conferindo estreita interação entre
estes e o meio ambiente, base da ciência denominada Ecologia.1
A relação do ser humano com os corpos d ’água data de tempos imemoriais. Estima-se que há
10000 anos, com a revolução da agricultura, o ser humano tenha começado a abandonar a caça como
principal fonte de sustento e iniciaram-se as primeiras culturas e a criação dos rebanhos. Como
consequência, renunciou-se progressivamente ao nomadismo, que caracterizava as primeiras
comunidades, e a busca por fontes de abastecimento culminou com o estabelecimento dos primeiros
povoados às margens dos cursos d’água, provavelmente na região da Mesopotâmia (Iraque). A partir daí
delineou-se clara identificação dos primeiros povoados, e posteriormente das primeiras cidades,
1. Termo de origem grega - íóikos' (casa) + ‘lógos’ (arte, ciência) - que designa a ciência que estuda as relações
dos seres vivos entre si ou com o meio ambiente.
com o curso d’água
que as margeia,
muitas vezes
emprestando-lhes o
próprio nome.
Consolidaram-se
associações de, por
exemplo, Viena e
Budapeste ao
Danúbio, Londres ao
Tâmisa, Paris ao
Sena, Roma ao
Tíbere, entre outras
tantas.
Disponibilidade
hídrica
Estima-se entre 1,36
x 109 a 1,46 x 109
km3 o volume de
água no Planeta e
aproximadamente 97 % correspondem aos mares, oceanos e lagos de água salgada (Von Sperling, 2006).
Ainda que a dessalinização como tecnologia de potabilização tenda a crescer, a água doce disponível, via
de regra, constitui-se na alternativa de abastecimento mais facilmente acessível às populações. No Brasil,
por exemplo, a parcela habitada do arquipélago de Fernando de Noronha/Pe é abastecida durante o
período de escassez de chuvas por meio de uma unidade de dessalinização de osmose inversa, bem como
diversas comunidades de pequeno porte no interior da Região Nordeste. Em nível mundial, diversas
cidades - Riad (Arábia Saudita), Barcelona (Espanha), Cingapura, entre outras - são parcial ou totalmente
abastecidas por meio de captação de água do mar.
Todavia, a parcela mais significativa da água doce, disponível nas calotas polares, é praticamen te
inaproveitável para fins de abastecimento para a quase totalidade da população terrestre, conforme
evidenciado na figura 1.1.
Figura 1.1. Distribuição percentual da água doce disponível na Terra.
Fonte: Borghetti et al. (2004 apud Di Bernardo; Paz. 2009a).
Dos percentuais apresentados na figura 1.1, destaca-se a ínfima parcela referente aos cursos d’água
que se constituem usualmente na principal alternativa ao abastecimento de comunidades de médio e
grande porte e, paradoxalmente, no principal corpo receptor ao lançamento de esgotos domésticos e
industriais.
A parcela referente às águas superficiais distribui-se entre os cinco continentes conforme denota a
figura 1.2.
Figura 1.2. Distribuição das águas superficiais entre os continentes.
Fonte: Borghetti et al. (2004 apud Di Bernardo; Paz, 2009a).
Os percentuais discriminados na figura 1.2 evidenciam o porquê de parcela significativa dos ^ ^ ^
países europeus ser majoritariamente abastecida, por vezes na totalidade como Lituânia e Dinamarca,
i é
por meio de aquíferos subterrâneos e a situação frequentemente dramática vivenciada pela população
africana, estimada, em 2006, superior a 350 milhões de pessoas.
O percentual das águas superficiais localizado nas Américas apresentado na figura 1.3 testifica o
papel de relevo do Brasil no contexto mundial, representando algo como 13 % das reservas mundiais.
Figura 1.3. Distribuição (%) da disponibilidade hídrica nas Américas.
Fonte: Von Sperling (2006).
Todavia, ao relacionar a disponibilidade hídrica à população do país, o Brasil cai para o 9o lugar
em virtude da magnitude da população comparada à de outros países, conforme evidencia a figura 1.5.
Disponibilidade hídrica per capita (mil m3/hab.ano)
Figura 1.4. Relação dos nove países com maior disponibilidade hídrica per capita do planeta.
Uma segunda constatação que emerge da figura 1.4 se reporta à relevância das Américas na
disponibilidade hídrica do globo, uma vez que seis dos nove países listados se localizam neste Continente.
Associada à disponibilidade hídrica apresentada na figura 1.2 insere-se o consumo de água nos
continentes conforme mostra a figura 1.5.
Figura 1.5. Distribuição do consumo de água nos continentes.
Fonte: Borghetti et ai. (2004 apud Di Bernardo; Paz, 2009a).
CAPÍTULO 01
1 7
Com base nos
percentuais
apresentados na
figura 1.5 aflora a
constatação do
elevado consumo
per capita2 nos
Estados Unidos,
pois este país
representa algo
como 4,8 % da
população mundial
e 71 % da
população da América do Norte3. Corrobora esta afirmativa, inferência elaborada com fyase em dados de
1996 nos Estados Unidos, que apontou cota per capita média nos 51 estados americanos. Os valores
extremos variaram de 494 L/hab.dia, no estado de Maine na Costa Leste, atingindo até 1230 L/hab.dia no
desértico estado de Nevada na Costa Oeste, conforme apresentado na figura 1.6. Vale enfatizar que os
valores listados na figura 1.6 referem-se tão somente ao abastecimento doméstico e industrial, não
contemplando o consumo com irrigação.
Figura 1.6. Consumo per capita de abastecimento doméstico e industrial em alguns estados dos EUA, referentes
a 1996.
Fonte: AWWA (1998).
Em nível mundial, do volume total utilizado para consumo humano, o abastecimento responde
pela menor parcela (10 %) quando cotejada ao uso agrícola (69 %) e industrial (21 %). No Brasil, tais
percentuais apresentam-se ligeiramente distintos conforme mostra a figura 1.7.
Figura 1.7. Consumo de água por setor em nível nacional.
Embora dotado de significante disponibilidade hídrica comparada à da maioria dos países, o Brasil
apresenta expressiva desuniformidade na distribuição no que tange às regiões mais populosas. A quase
totalidade da população brasileira (95 %) habita as quatro regiões que respondem por aproximadamente
27 % da disponibilidade hídrica superficial do País. A classificação da disponibili
dade per capita em nível dos estados brasileiros apresenta-se conforme evidenciado pela tabela 1.1.
2. Volume de água diário, requerido por indivíduo, usualmente expresso em L/hab.dia. Esse valor é adotado, nos
projetos de sistemas de abastecimento de água, para satisfazer ao consumo doméstico, ao consumo comercial
e industrial, ao consumo público e às perdas.
3. Estimativa elaborada baseada em populações de 420 milhões e 6,3 bilhões de pessoas para os EUA e o
Planeta, respectivamente.
CAPITULO 01
1 Q AO ..... ' ■ ' ' ■ ■ - ' ‘ -................. ............................................................................... . .....
Tabela 1.1. Classificação da disponibilidade hídrica per capita dos
estados da Federação.
. Situação
Abundância > 20.000
m3/hab.ano
Muito rico > 10.000 m3/hab.ano
Rico > 5000 m3/hab.anoSituação correta > 2500
m3/hab.ano Pobre < 2500
m3/hab.ano
Situação crítica < 1 500
m3/hab.ano
Estado
Roraima
Amazonas
Amapá
Acre
Mato Grosso
Pará
Tocantins
Rondônia
Goiás
Mato Grosso do Sui Rio Grande
do Sui Maranhão
Santa Catarina
Paraná
Minas Gerais
Piauí
Espírito Santo
Bahia
São Pauio
Ceará
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte Distrito
Federal
Alagoas
Sergipe
Paraíba
Pernambuco
Esta constatação evidencia-se mais significativamente pelo fato dos mananciais das regiões
Sudeste e Sul, em especial, serem os mais fortemente impactados pelo lançamento dos despejos
domésticos e industriais, tendendo a tomar progressivamente mais conflituosa a questão da prioridade de
uso dos recursos hídricos. Em semelhante contexto, o consumo regional de água divide-se conforme a
figura 1.8.
Figura 1.8. Consumo de água (%) nas cinco regiões brasileiras.
Propriedades das águas naturais
Importante distinção deve ser feita entre as propriedades e as características (físicas, químicas, biológicas e radioativas) das
águas naturais. As propriedades da água - ou, por definição, característica do que é próprio - constituem-se no que lhe é inerente
e a distingue dos demais fluidos. CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 01 2 2
Já as características diferenciam as águas naturais entre si,
podendo se manifestar em uma ou outra circunstância. Por
exemplo, para o abastecimento público, a estrutura de captação
haverá de influenciar nas características da água bruta, mas não
interfere nas suas propriedades. Vale também mencionar que
uma importante característica das águas, a temperatura,
influenciará em algumas das Suas propriedades. Neste aspecto,
há controvérsia se a temperatura seria uma propriedade ou
característica física. Optou-se pela última pela importância no
tratamento e pela mencionada influência em algumas das
propriedades das águas naturais, além do fato da temperatura
não a diferenciar dos demais fluidos.
\
Calor específico
O calor específico é a quantidade de energia requerida, por
unidade de massa, para elevar a temperatura de um fluido ou
substância e, neste contexto, uma caloria (cal) é a energia
requerida para elevar em 1,0 °C a temperatura de um grama de
água. O elevado calor específico da água (1,0 cal/g °C),
superado apenas pelo hidrogênio líquido e amoníaco, permite
absorver grande quantidade de calor sem apresentar
significativa variação de temperatura. Esta propriedade adquire
crucial importância para a biota do meio aquático e também
para o abastecimento público, pois significativa amplitude
térmica do ar atmosférico manifesta-se em muito menor
magnitude em termos da alteração da temperatura da água.
Ilustra esta assertiva o fato de serem raros os casos de
congelamento da água nas redes de distribuição nos países frios,
mesmo para temperaturas do ar inferiores a 30 °C negativos. No
contexto nacional, a recorrente limitação de algumas
tecnologias ou etapas da potabilização raramente se manifesta
no Brasil (reápectivamente, a filtração lenta e a coagulação),
onde temperaturas médias mensais das águas naturais inferiores
a 15 °C somente ocorrem em algumas cidades serranas das
regiões Sul e Sudeste.
Massa específica, densidade e peso
específico
Define-se massa específica4 (kg/m3) como o quociente entre a
massa e o volume de um fluido ou de determinada substância,
diferindo do conceito de densidade. Este adimensional refere-se
à razão entre a massa específica do líquido ou sólido e a da água
a 4 °C, e, para os gases, considera-se como referência a massa
específica do ar atmosférico a 0 °C. Associa-se também ao
conceito de massa específica, o peso específico (N/m3) como o
produto desta e a aceleração da gravidade.
Interessante particularidade da água manifesta-se em relação à
massa específica, quando comparada aos demais líquidos, por
apresentar o valor máximo a 4 °C (1000 kg/m3), ao passo que
para os demais tal ocorre na temperatura de congelamento. À
temperatura de 20 °C, usual na maioria dos sistemas de
abastecimento do. País, a massa específica da água é 998 kg/m3
e o peso específico 9789 N/m3.
A variação da massa específica da água com a temperatura
assegura a manutenção da vida aquática e a constância do
próprio abastecimento de água em diversos países; do
hemisfério norte nos quais os invernos são muito rigorosos. Por
ser mais densa a 4 °C do que a 0 °C, para temperaturas
negativas a água termina por ocupar as camadas profundas de
rios e lagos, permitindo que a superfície do corpo hídrico se
congele. Desta forma, garante-se a preservação da comunidade
aquática e a perenidade no abastecimento durante este período
do ano.
Conforme a tabela 1.2 a seguir mostra, as maiores variações na
densidade da água verificam- -se para temperaturas superiores a
20 °C. Por exemplo, a diferença de densidade da água entre as
temperaturas de 24 e 25 °C é 26 vezes maior da observada no
intervalo de 4 a 5 °C. Esta propriedade
4. Utilizar-se-á sempre o Sistema Internacional (SI) como referência
para as unidades das propriedades das águas naturais.
assegura a estratificação de corpos d’água, principalmente lagos e represas. Dependendo da magnitude da
diferença de temperatura, e de densidade, formam-se três camadas distintas, denominadas epilímnio,
metalímnio e hipolímnio. A primeira camada superficial de maior temperatura e menor densidade, uma
camada intermediária - na qual ocorre queda acentuada da temperatura - e a terceira ao fundo de menor
temperatura e maior densidade.
Evidentemente que quanto menor temperatura externa menor também será a diferença de
densidade ao longo da profundidade e, portanto, menos significativa a estratificação térmica do corpo
d’água. Desta forma, nos períodos mais frios do ano a densidade tenderá a apresentar menor variação ao
longo da profundidade e nestas circunstâncias pode ocorrer o fenômeno do turn over,
inversão térmica ou virada do lago ou reservatório, caso a ação dos ventos favoreça a circulação da água
no seu interior. Quando da virada do reservatório, pode ocorrer o revolvimento do fundo e significativa
alteração nas características da água bruta com efeitos negativos na eficiência do tratamento. Captações
realizadas em reservatórios de acumulação, comumente apresentam torres de tomada que permitem a
captação da água bruta a distintas profundidades da coluna d’água, visando a minimizar tais efeitos. A
estratificação voltará a se estabelecer com aumento da temperatura da superfície.
Esta propriedade da água, denominada anomalia térmica, decorre das variações na estrutura
molecular da água com a temperatura. Na forma de gelo, a água apresenta estrutura tetraédrica ou
cristalina, caracterizada pela existência de espaços vazios. A medida que a temperatura se eleva, a água
assume gradativamente a estrutura conhecida como compacta, na qual as moléculas estão acondicionadas
sem espaços vazios. Isto significa que com o incremento de temperatura valendo-se do congelamento, a
água vai se tomando progressivamente mais densa. Em contrapartida, este aumento da temperatura
provoca a expansão molecular nos corpos. Desta forma, dois fenômenos contrapõem- -se quando ocorre
um aumento de temperatura. Por um lado a densidade aumenta, em razão de alterações na estrutura
molecular, e ao mesmo tempo diminui, em decorrência da expansão molecular. A superposição destes dois
fenômenos conduz à obtenção do mencionado ponto de densidade máxima a 4 °C, reduzindo-se
posteriormente com o aumento da temperatura (Von Sperling, 2006).
Viscosidade dinâmica
Aviscosidade dinâmica ou absoluta (Pa.s) de um líquido traduz a sua resistência ao escoamento (ou
ao deslocamento no interior da massa líquida), e o quociente entre esta e a massa específica denomina-se
viscosidade cinemática (m2/s). Entre os líquidos, a água apresenta viscosidade baixa, superior apenas a do
benzeno e da gasolina. A viscosidade dos líquidos é inversamente proporcional à temperatura, pois, com o
aumento desta reduz-se a coesão entre as moléculas e consequentemente a resistência ao escoamento.
Interessanteconstatar que para os gases, como as forças de coesão são muito menores, a viscosidade é
diretamente proporcional à temperatura (Streeter; Wylie, 1981). Da mesma forma, para temperatura de 20
°C, a água apresenta viscosidade dinâmica de 10"3 Pa.s e viscosidade cinemática de 10'6 m2/s.
Para o ambiente aquático esta propriedade interfere na sobrevivência de diversos organismos,
como algumas espécies de algas que não apresentam movimentação própria, sendo assim forçadas a viver
próximas à superfície, utilizando-se da viscosidade da água como meio de sustentação. Durante os
períodos mais quentes do ano, com a redução da viscosidade, estes organismos tendem a se aprofundar na
coluna d’água, onde há menor disponibilidade de luz e oxigênio. Na potabilização, em contrapartida, o
aumento da temperatura da água e consequente redução da viscosidade favorecem a sedimentação de
partículas, embora o aporte à estação de tratamento tenda a se elevar em virtude da concomitância das
precipitações com o período mais quente do ano.
CAPÍTULO 01
Pressão de vapor
A evaporação sucede-se quando as moléculas de água escapam através da superfície líquida. Em
ambiente fechado, o equilíbrio é atingido quando o número de moléculas que deixam a superfície
iguala-se ao número de moléculas de vapor que se condensam ao atingir a superfície livre. Neste contexto,
denomina-se pressão de vapor à pressão exercida no espaço pelas moléculas de vapor. A magnitude desta
pressão é governada pela pressão reinante e pela temperatura, de forma que quando a pressão acima da
superfície líquida iguala-se à pressão de vapor o líquido entra em ebulição, mesmo à temperatura
ambiente.
As mencionadas propriedades da água estão listadas na tabela 1.2 em função da tempe ratura.
Tabela 1.2. Propriedades físicas da água no Sistema Internacional de Unidades.
Temperatura (°C) Massa Específica
(kg/m3)
Peso Específico
(N/m3)
Viscosidade
Dinâmica (IO'3
Pa.s)
V iscosidade
Cinemática (1 0 6
m 2/s)
Pressão de V apo r
(Pa)
0 999,9 9805 1,79
1,79 611 5 1000,0
9805 1,52 1,52
873 10 999,7 9803
1,31 1,31 1266 15
999,1 9798 1,14
1,14 1707 20
998,2 9789 1,01 1,01 2335 25 997,1 9779 0,89 0,90 3169 30 995,7 9767 0,80 0,80 4238 35 994,j 9752 0,72
0,73 5621 40 992,2 9737 0,66 0,66 7377 45 990,2 9720 0,60 0,61 9584 50 988,1 9697 0,55 0,56 12331 55
985,7 9679 0,51 0,51 15745 60 983,2 9658 0,47 0,48 19924 65 980,6 9635 0,44 0,44 25015 70 977,8 9600
0,41 0,42 31166 75 974,9 9589 0,38 0,39 35563 80 971,8 9557 0,36 0,37 47372 85 968,6 9529 0,34 0,35
57820 90 965,3 9499 0,32 0,33 70132 95 961,9 9469 0,30 0,31 84552 100 . 958,4 9438 0,28 0,30 101357
Tensão superficial
Na interface entre um líquido e um gás, ou dois líquidos imiscíveis, desenvolve-se uma fina
película em virtude das forças de atração entre as moléculas do líquido abaixo da superfície. Como
consequência, da mesma forma que a viscosidade, a tensão superficial da água é inversamente
proporcional à temperatura. Exemplo clássico refere-se à colocação de um pequeno alfinete sobre a
superfície da água e constata-se que esta fina película suportará seu peso.
Esta propriedade permite que diversos pequenos organismos possam sobreviver na interface
água-ar atmosférico e desempenham importante papel na cadeia trófica do ambiente aquático. Além do
efeito da temperatura, a tensão superficial da água pode ser afetada pelo lançamento de despejos contendo
sabões e detergentes que causará o desequilíbrio deste ecossistema.
Condutividade
térmica
A condutividade térmica de fluido constitui-se no coeficiente de transferência de calor em função
do gradiente de velocidade, ou em outras palavras, é a capacidade de um fluido ou substância transmitir a
energia térmica por meio das colisões moleculares. Diferentemente do calor específico, a água apresenta
baixa condutividade térmica e a difusão de calor na massa líquida somente ocorre por convecção graças a
variação da densidade (massa específica) com a temperatura na coluna d’água.
Capacidade de dissolução
Conforme salientado, as águas naturais apresentam capacidade de dissolução de grande
diversidade de substâncias químicas e gases. A solubilidade das primeiras é significativamente
influenciada pelo aumento da temperatura e redução do pH do ambiente aquático. A solubilidade dos
gases na água, e a concentração por consequência, depende da denominada pressão parcial do gás e esta
da temperatura.
A relevância das substâncias dissolvidas presentes nas águas naturais relacionar-se-á com o tipo de
uso e com as atividades desenvolvidas na bacia hidrográfica. Para fins de consumo humano, os compostos
orgânicos têm adquirido progressivamente maior relevância pela dificuldade na remoção nas estações de
tratamento, pela perspectiva de conferir odor e sabor à água tratada - favorecendo a rejeição da
comunidade abastecida - e pela formação de subprodutos da desinfecção com compostos de cloro.
No Brasil, principalmente pa região central do estado de Minas Gerais, os compostos de ferro e
manganês representam outra importante característica, pois, quando se apresentam na forma dissolvida
(Fe+2 e Mn+2) podem não ser adequadamente removidos no tratamento e, ao se oxidarem na rede de
distribuição (Fe+3 e Mn+4), conferir cor à água de consumo. Corpos d’água em regiões de garimpo ou
sujeitos ao lançamento de efluentes industriais tendem a apresentar concentração mais significativa de
metais pesados - sobretudo, mercúrio, chumbo e cromo. Finalmente, vale mencionar os compostos de
fósforo e nitrogênio (amônia, nitrito, nitrato) - originários do arraste de fertilizantes de solos
agriculturáveis ou do lançamento de despejos - responsáveis pela eutrofização de lagos e reservatórios,
bem como alguns ânions (carbonatos, bicarbonatos, cloretos e sulfatos) responsáveis pela alcalinidade e
dureza das águas naturais.
Em relação aos gases dissolvidos nas águas naturais, evidente importância recai para o oxigênio
dissolvido (OD) pelo fundamental papel na manutenção da diversidade do ecossistema aquático. Embora
existam organismos anaeróbios, capazes de utilizar o oxigênio contido em compostos como sulfatos (S
04'2) e nitratos (N 03~), a diversidade da biota de um ecossistema é assegurada pela concentração de OD.
Reforça esta assertiva o fato da respiração anaeróbia favorecer a emanação de gases mal cheirosos como
sulfeto de hidrogênio (H2S) e metano (CH4).
Características das Águas Naturais
[...] Como os rios não dormem. 0 rio não quer ir a nenhuma parte, ele
quer é chegar a ser mais grosso, mais fundo. [...] Rebebe o encharcar
dos brejos, verde a verde, veredas, marimbús, a sombra separado dos
buritizais, ele. Recolhe e semeia areias.
Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas (1956)
s características físicas, químicas, biológicas e radiológicas das águas naturais traduzem uma
série de processos que ocorrem no corpo hídrico e na bacia hidrográfica, como consequência
das mencionadas capacidades de dissolução de ampla gama de substâncias e de transporte
pelo escoamento superficial e subterrâneo. Nas características físicas, químicas e biológicas listadas nos
tópicos a seguir, far-se-á menção aos padrões de potabilidade nacional (Ministério da Saúde, 2004),
americano (AWWA - American Water Works Association, 2006) e da Organização Mundial de Saúde
(OMS) (World Health Organization, 2004).
Características físicas
As características físicas das águas de abastecimento encerram comumente o impacto de imediato
ao consumidor, podendo, com alguma frequência, concorrer para recusa da água distribuída pela
concessionária. Quando tal se sucede, a opção de abastecimento recai para fonte alternativa, não
necessariamente segura. Esta percepção imediata abarca os sentidos da visão (turbidez e cor), paladar e
olfato (sabor e odor).
Temperatura
A temperatura da água e dos fluidos em geral, indica a magnitude da energia cinética do
movimento aleatório das moléculas e sintetiza o fenômeno de transferência de calor à massa líquida. As
forças de coesão intermolecular são de natureza eletrostática e,em princípio, independentes da
temperatura. Caso seja fornecida energia em forma de calor (aquecimento) à massa líquida, atingir- -se-á
estado no qual as forças inerciais das moléculas em movimento serão de mesma magnitude às de
coesão
intermolecular.
O novo aumento
da temperatura
fará com que
ocorra a
expansão e
mudança de
estado para gás
ou vapor.
A temperatura é
diretamente
proporcional (i)
à velocidade das
reações
químicas - qpe
praticamente
dobra para
elevação de 10
°C na
temperatura das
águas (ii) à
solubilidade das
substânciàs,
(iii) à
concentração do
oxigênio
dissolvido, (iv)
ao metabolismo
dos organismos
presentes no
ambiente
aquático, (v) à
formação de
subprodutos da
desinfecção, (vi)
ao
recrudescimento
microbiológicç e
(vii) à taxa de
corrosão nas
tubulações
integrantes dos
sistemas de
abastecimento
(Dezuane,
1997).
A alteração da temperatura das águas naturais decorre em especial da insolação, esta influen ciada
significativamente pelo clima e latitude, e, quando de origem antrópica, do lançamento de despejos
industriais - em especial originários de indústrias de bebidas - e/ou de águas de refrigeração de máquinas e
caldeiras.
Para fins de tratabilidade, esta característica representa vantagem ainda maior para os países
tropicais, nos quais as variações de temperatura da água são menos significativas. A etapa de coagulação,
presente na quase totalidade das tecnologias de tratamento, realiza-se de forma menos exitosa a baixas
temperaturas. No Brasil, à exceção de alguns mananciais das regiões Sul e Sudeste, nos quais a
temperatura da água em períodos de inverno pode baixar a valores entre 5 e 15 °C - atingindo, em alguns
casos excepcionais, até o ponto de congelamento -, as médias diárias das águas naturais afluentes às
estações de tratamento nas demais regiões do País raramente apresentam-se inferiores a 18 °C. Em
contrapartida, diversos países do hemisfério norte apresentam amplitude térmica anual frequentemente
superior a 20 °C. Estas assertivas são ilustradas pela figura 2.1, na qual se apresentam as médias
aritméticas mensais de 2004 da temperatura da água bmta afluente a uma estação de tratamento de água
no estado de Minas Gerais (latitude 18S) e a outra na província de Alberta no Canadá (latitude 54N).
O ETA Brasil
□ ETA Canadá
Meses (2004)
Figura 2.1. Médias aritméticas mensais da temperatura da água bmta em duas estações no Brasil e Canadá.
Na figura 2.1 evidencia-se a significativa menor variação da temperatura da água em países
tropicais, no caso praticamente restrita ao intervalo de 20 a 25 °C, ao passo que na estação canadense, a
temperatura da água bruta apresenta-se inferior a 1 °C em cinco meses do ano, superando 15 °C apenas
durante os três meses de verão.
A associação com águas naturais correntes favorece a maior aceitabilidade do consumidor a águas
de baixa temperatura. O controle da temperatura da água natural inviabiliza-se e águas com temperatura
elevada tendem a ser rejeitadas pela população em termos de consumo, também pela maior percepção
gustativa do ser humano nestas condições aos problemas de odor e sabor. Adicionalmente, temperaturas
mais altas tendem a favorecer a dissolução de uma mi rí ade de constituintes inorgânicos e compostos
orgânicos passíveis de conferir às águas tais características.
Aguas subterrâneas captadas a grandes profundidades, frequentemente necessitam de unidades de
resfriamento a fim de adequá-las ao abastecimento, como ocorre em diversas cidades do interior do CAPÍTULO 02
estado de São Paulo. Para os sistemas de maior porte, é comum a conjunção de captações superficiais e
subterrâneas, com a mistura ocorrendo na própria rede de distribuição. Com incremento do consumo de
água envasada, mineral ou não, sobretudo nas classes economicamente mais abastadas, tem-se verificado
menor rejeição do consumidor a águas de temperatura elevada, por reduzir o gasto doméstico de energia
elétrica durante os banhos e por tomar a lavagem dos utensílios de cozinha menos dispendiosa.
Em virtude dos insignificantes efeitos à saúde e extrema dificuldade de alteração na temperatura da
água para abastecimento de maiores populações, os padrões de potabilidade brasileiro e da OMS não
estabelecem temperatura máxima para água de consumo, limitada em 15 °C no padrão canadense e
americano.
Cor
A cor da água é produzida pela reflexão da luz em partículas minúsculas, denominadas coloides,
finamente dispersas de origem predominantemente orgânica e dimensão inferior a 10 pm, relacionando-se
com a concentração de carbono orgânico presente no ambiente aquático. Pode também ser resultado da
presença de compostos de ferro e manganês ou do lançamento de diversos tipos de resíduos industriais.
Quando a cor se manifesta em águas subterrâneas, via de regra é resultado da presença destes compostos
de ferro e manganês.
Os compostos orgânicos que conferem cor às águas naturais são provenientes basicamente de duas
fontes:
i) em maior magnitude, da decomposição de matéria orgânica de origem predominantemente
vegetal e do metabolismo de microrganismos presentes no solo;
ii) de atividades antrópicas, tais como, descargas de efluentes domésticos ou industriais, lixiviação
de vias urbanas e solos agriculturáveis.
Corrobora afirmativa anterior, levantamento realizado no rio Mississipi (EUA) em 1977 apontando
percentual da ordem de 80 % da matéria orgânica presente em virtude das substâncias húmicas de origem
natural e elevado peso molecular, para apenas 15 % oriunda das atividades antrópicas. A prevalência das
primeiras manifestava-se nas concentrações referenciadas em mg/L, ao passo que a matéria orgânica de
origem antrópica em pg/L (Cohn; Cox.; Berger, 1999).
Confere-se a genérica denominação de substâncias húmicas ao conjunto de compostos orgânicos
de elevado peso molecular, de origem predominantemente vegetal e de dimensões coloidais, cuja
constituição em média apresenta 87 % de ácidos fúlvicos, 11 % de ácidos himatomelânicos e apenas 2 %
de ácidos húmicos, propriamente ditos. A supremacia dos primeiros, de cor amarela característica e menor
peso molecular comparado aos demais, justifica-se por se constituir na fração mais solúvel do húmus
natural dos solos (Branco, 1986).
Para efeito de caracterização de águas para abastecimento, distingue-se a cor aparente, na qual se
consideram as partículas suspensas, da cor verdadeira. A determinação da segunda realiza-se após
centrifugação (a 3500 rpm por 30 min) ou filtração da amostra em filtro de papel para remoção das
partículas suspensas. A determinação da intensidade da cor da água é realizada comparando-se a amostra
com um padrão de cobalto-platina, sendo o resultado apresentado em unidades de cor (uC) ou unidade
Hazen (uH).
Desta forma, visando a facilitar a determinação da cor verdadeira, para sete amostras de águas
naturais, com turbidez variando de 2,1 a 44 uT e cor aparente de 50 a 120 uH, foram realizadas
determinações deste parâmetro após filtração em filtros de café (número 102) comumente encontrados no
mercado e em filtros Whatman 40, o segundo de custo muito superior. Não foi detectada diferença
significativa nos valores obtidos para cor verdadeira, indicando a possibilidade do uso do filtro de café
para tais determinações na rotina de operação das estações de tratamento de água (Leal; Libânio, 2002).
CAPITULO 02
Embora teores mais significativos de cor concorram para
dificultar a manutenção da concentração residual do cloro nas
redes de distribuição - além de favorecer a formação de
subprodutos motivos eminentemente estéticos justificam o
limite de 15 uH estabelecido pela Portaria 518 e pelo padrão
americano.5 Valores acima do qual comumente são mais
facilmente perceptíveis ao olho humano, concorrendo para
rejeição da água fornecida pela concessionária pela população
abastecida. Aguas com teores superiores a 100 uH, usualmente
apresentam coloração semelhante ao chá e, salvo situações
extremas de escassez, são plenamente rejeitadas pelo
consumidor.
A cor verdadeira constitui-se em importanteindicador da
concentração de matéria orgânica presente nas águas naturais,
embora não haja menção a este parâmetro para água tratada no
atual Padrão de Potabilidade. Além da cor verdadeira, a
inferência da concentração de matéria orgânica pode ser
efetuada por meio da determinação do carbono orgânico total
(COT), do oxigênio consumido, da demanda (bio)química de
oxigênio - dois últimos raramente empregados em estações de
tratamento de água - e da absorbância por raios ultravioleta6 a
comprimentos de onda de 254 nm. Todavia, a cor ainda é
monitorada na maioria das estações de tratamento do País por
meio do emprego do disco comparador e, nos sistemas de maior
porte, por espectrofotometria. Apesar da obsolescência e da
imprecisão intrínseca decorrente da habilidade do operador da
estação de tratamento, a confiabilidade do método de
comparação visual é corroborada pelo Standard Methods.
Recomenda-se que tal determinação deva ser realizada
conjuntamente à do pH, pois a menores valores de pH
associam-se maior intensidade da cor verdadeira.
As águas naturais apresentam, em geral, cor verdadeira variando
de 0 a 200 uH, e valores inferiores a 10 uH são praticamente
imperceptíveis. Corpos d’água de cor naturalmente escura
ocorrem em regiões ricas em vegetação e, consequentemente,
de solos menos erodíveis. Neste contexto, o Rio Negro, afluente
do Rio Amazonas, constitui-se exemplo paradigmático cujo
nome alude à cor escura causada pela presença de produtos de
decomposição vegetal e pigmentos de origem bacteriana. O
intemacionalmente famoso encontro das águas reporta-se ao
evidente contraste das águas escuras do primeiro com as turvas
do segundo, conforme denota a figura 2.2.
Figura 2.2. Encontro das águas entre o Rio Negro e o Rio
Amazonas (Foto: Márcio B. Baptista, 2002).
A importância da cor como parâmetro de qualidade de água
adquiriu maior evidência após a confirmação, no início da
década de 1970, da perspectiva de formação de produtos
potencialmente
5. A Organização Mundial da Saúde não estabelece limite
(denominado valor-guia) para cor. Recomenda o mesmo valor (15
uH) e estabelece máximo admissível de 50 uH.
6. É frequente no meio científico, menção à concentração de
matéria orgânica em termos da adsorbância específica (SUVA -
Specific Ultraviolet Light Asorbance) que consiste na razão entre a
absorbância determinada a 254 nm e o carbono orgânico dissolvido
(L/mg-m). Este por sua vez é a fração dissolvida do COT após
filtração em membrana de 0,45 um.
28 ■ ■ ' ■ . ■
cancerígenos (trihalometanos - THM) como consequência da cloração de águas coloridas com a finalidade
de abastecimento. Vale ressaltar que os THM não são os únicos subprodutos da desinfecção, mas,
especialmente, verifica-se maior prevalência na formação de espécies halogenadas do que de outros
subprodutos, e seus efeitos na saúde têm sido avaliados há mais de três décadas, a despeito da amplitude
de variação deste parâmetro nos diversos países.
Conforme mencionado, a matéria orgânica presente nas águas naturais é composta de substâncias
húmicas e não húmicas. As primeiras referem-se ao mencionado conjunto de compostos orgânicos de
dimensões coloidais e de origem predominantemente vegetal cuja constituição média congrega ácidos
fúlvicos, em maior monta, e ácidos húmicos, propriamente ditos. Já proteínas, carboidratos, algas e seus
produtos metabólicos, aminoácidos, ácidos carboxílicos e hidrocarbonetos, em especial, constituem as
substâncias não húmicas. Há controvérsia acerca da parcela predominante na matéria orgânica, embora as
substâncias húmicas tendam a prevalecer em mananciais menos impactados por atividades antrópicas ou
nos quais não se verificam florações de algas.
A distinção da parcela concernente aos ácidos fúlvicos na matéria orgânica natural ganhou
projeção no meio científico pela menor susceptibilidade destes à coagulação. Por outro lado, os ácidos
húmicos, de maior peso molecular, apresentam capacidade de ao complexarem traços de metais, como
ferro por exemplo, contribuir ainda mais significativamente para cor das águas naturais e, embora mais
facilmente removidos na coagulação, formam maiores concentrações de THM e ácidos haloacéticos
(AHA) (Shomey; Freeman, 2004). Nesta perspectiva, o emprego de diversos processos oxidativos -
ozônio, ultravioleta, peróxido de hidrogênio, isoladamente ou série - tende a reduzir o peso molecular
destas substâncias tomando-as menos reativas com o cloro e reduzindo a coloração da água tratada (Owen;
Amy; Chowdhury, 1993).
A presença de matéria orgânica, além de fomentar a formação de subprodutos, pode conferir odor
e sabor às águas, interferir na remoção de ferro e manganês e propiciar condições para o recmdescimento
de microrganismos na rede de distribuição. Já há alguns anos, pesquisadores têm investigado os fatores
intervenientes no crescimento dos biofilmes nas redes de distribuição, concluindo que o mesmo ocorre
quando a matéria orgânica e os sedimentos acumulam-se nas redes e a temperatura da água eleva-se.
Atribui-se à parcela não húmica da matéria orgânica papel mais relevante no desenvolvimento destes
biofilmes. Fatores hidráulicos e ambientais - tais como pH, temperatura e pluviosidade, além da presença
de resíduos de desinfetantes, a corrosão e a acumulação de sedimentos - têm sido relacionados ao
crescimento de bactérias nas águas de abastecimento.
Turbidez, sólidos suspensos e contagem de partículas
Estes três parâmetros, em última instância, referem-se predominantemente à mesma carac terística, qual
seja, a concentração de partículas suspensas e coloidais presentes na massa líquida e apresentam
significados semelhantes em termos de qualidade de água, embora apenas a turbidez se insira nos padrões
de potabilidade nacional e internacional. Comumente, respondem pela turbidez das águas naturais,
fragmentos de argila, silte, plâncton, microrganismos, e matéria orgânica e inorgânica particulada. Ainda
que com menor frequência, a turbidez pode também ser causada pela precipitação de carbonato de cálcio
para águas duras, de óxido de ferro e de compostos de alumínio em águas tratadas.
A determinação da turbidez adquiriu primazia como parâmetro de monitoramento do afluente e
efluente da quase totalidade das estações de tratamento de água do Planeta pela simplicidade e rapidez da
determinação, além do significativo menor custo do equipamento envolvido comparado aos necessários à
determinação de sólidos suspensos e da contagem de partículas.
A turbidez como característica física acaba por se constituir em uma inferência da concentração de
partículas suspensas na água obtida por meio da passagem de um feixe de luz através da amostra,
sendo expressa
por meio de
unidades de
turbidez (uT),
também
denominadas
unidades
nefelométricas
de turbidez
(UNT) ou, em
tempos idos,
unidades
Jackson. A
despeito da
miríade de
materiais que
confere turbidez
às águas, a
prevalência das
partículas de silte e argila testifica-se pelo fato de 1,0 uT representar 1,0 mg Si02/L.
Originalmente, constituía-se em um parâmetro de natureza limnológica por meio do qual se inferia
a profundidade de penetração da luz no corpo d’água (Burlingame; Pickel; Roman, 1998). Posteriormente,
segundo American Public Health Association, a turbidez passou a ser definida como expressão da
propriedade óptica que faz a luz ser dispersa ou absorvida em vez de ser transmitida em linha reta através
da amostra. Portanto, águas de mesma intensidade de turbidez podem apresentar partículas suspensas com
características diferentes - em termos de tamanho, composição e forma -, de modo que os tipos de
partículas hão de interferir na transmissão da luz (APHA; AWWA; WEF, 2005).
O princípio básico do funcionamento dos equipamentos de determinação nefelométrica de turbidez
consiste em um detector disposto a um determinado ângulo em relação ao raio de luz incidente. A
posterior detecção da luz refletida pelas partículas suspensas e coloidais é convertida em sinal elétrico e
registrada no painel doequipamento. Para o ângulo de 90°, o equipamento denomina- -se nefelômetro ou
turbidímetro, e a técnica de determinação nefelometria. Aliado às características das partículas suspensas,
o comprimento de onda da luz incidente interfere na transmitância da luz. Além disso, outros fatores
podem afetar os valores de turbidez medidos por diferentes equipamentos. Destacam-se o tipo de lâmpada,
as lentes, as células para amostragem, a deterioração e a mencionada orientação da fonte de luz e do
detector, o número de detectores, a limpeza interna do medidor, a susceptibilidade a vibrações e a
interferências eletrônicas, e a capacidade de fornecer estabilidade nas leituras.
Neste contexto, alguns fabricantes têm procurado aprimorar a qualidade e a precisão de seus
equipamentos, dotando-os de múltiplos detectores que compensam a interferência de fatores como a cor
na amostra, flutuações de desvio de luz, entre outros fatores (Hach; Vanous; Heer, 1989).
A turbidez natural das águas superficiais está geralmente compreendida na faixa de 3 a 500 uT, e
inferior a 1,0 uT para águas subterrâneas com significativa frequência decorrente da presença de ferro e
manganês como também ocorre para a cor. Em lagos e represas, onde a velocidade de escoamento da água
é menor, a turbidez tende a ser bastante baixa, com muita frequência inferior a 10 uT. Além da ocorrência
de origem natural, a turbidez da água pode também ser causada por lançamentos de esgotos domésticos ou
industriais.
No Brasil, a turbidez dos corpos d’água é particularmente elevada em regiões com solos erodíveis,
onde as precipitações podem carrear partículas de argila, silte, areia, fragmentos de rocha e óxidos
metálicos do solo. Grande parte das águas de rios brasileiros é naturalmente turva em decorrência das
características geológicas das bacias de drenagem, dos índices pluviométricos e do uso de práticas
agrícolas muitas vezes inadequadas. Por outro lado, regiões de clima frio menos susceptíveis a
precipitações intensas apresentam águas naturais de turbidez significativamente mais baixa.
Esta discrepância confirma-se na análise das figuras 2.3 e 2.4 nas quais estão apresentadas as
médias mensais da turbidez da água bruta afluente a duas estações de tratamento no Brasil e no Canadá,
respectivamente. Na figura 2.3 reporta-se à média geométrica mensal dos dados diários de turbidez da
água bruta no período 1997-2000 afluente a uma estação de médio porte na Região Sudeste do País (vazão
média de 145 L/s), ao passo que a figura 2.4 refere-se à média aritmética no período 2002-2004 para uma
das estações da cidade de Edmonton (vazão média de 1,7 m3/s) na província de Alberta (Canadá). Cabe
ressaltar que ambas captações realizam-se diretamente no curso d’água sem qualquer estrutura que
minimize o aporte de sólidos às estações e a segunda unidade localiza-se
praticamente na região central da cidade.
CAPITULO 02
3 ® ................... ■ ........................... ■ • ...................................................................... .....................................................
Meses
Figura 2.3. Média geométrica mensal da turbidez da água bruta afluente a uma estação de médio porte
brasileira.
Figura 2.4. Média aritmética mensal da turbidez da água bruta afluente a uma estação de grande porte canadense.
A magnitude dos valores de turbidez para estação brasileira manifesta-se pelo próprio emprego da
média geométrica como medida de tendência central, menos susceptível à influência de valores
extremamente elevados que a média aritmética, e motivou a elaboração da figura 2.5. A significativa
variação da turbidez da água bruta ao longo do período amostrado para estação brasileira motivou
realização de uma análise de consistência dos dados, tendo sido detectado em períodos esparsos a
improvável repetição de elevados valores de turbidez da água bruta, cujo descarte ou inserção, não
comprometería o resultado das análises estatísticas realizadas em virtude do tamanho da amostra. A
definição dos intervalos desiguais de frequência relativa estabelecidos para os valores da turbidez da água
bruta, embora inusuais, objetivou inferir o tempo de funcionamento da estação para o qual tecnologia de
potabilização mais simples pudesse ser empregada (Viana; Libânio, 2002).
Enquanto a turbidez da água bruta afluente à estação canadense foi determinada por meio de
equipamento de escoamento contínuo - inferindo-se a cada hora os valores máximo, mínimo e médio -, na
estação brasileira a análise realizava-se por meio de equipamento de bancada. Para a segunda, ainda que
possam ter ocorrido variações significativas entre duas análises sucessivas desta característica física, a
magnitude do universo amostrai (mais de 34 mil resultados) permite associar os valores de turbidez ao
tempo de funcionamento da estação. Desta forma, pode-se afirmar que em mais de,26 % do tempo de
funcionamento da estação afluiu a mesma água com turbidez superior a 200 uT e, no período chuvoso,
frequentemente valores superiores a 1000 uT. Paradoxalmente, verificaram-se apenas 60 eventos pontuais
desta natureza na estação canadense (turbidez superior a 200 uT) e em
apenas três vezes este parâmetro superou 1000 uT quando do início do degelo.
CAPÍTULO 02
30,00 i r 120
26,26
- 100
0,00 0
0 < x < 5 5 < x < 15 15 < x < 50 50 < x < 200 >200
Turbidez da água bruta (uT)
Figura 2.5. Frequências relativas simples e acumulada dos valores de turbidez da água bruta afluente a uma
estação de médio porte brasileira.
Para fins de potabilidade, a turbidez da água filtrada vem progressivamente consolidando-se em
todo Planeta como um dos principais parâmetros na avaliação do desempenho das estações de tratamento,
transcendendo o aspecto estético a ela associado. Há muito no meio técnico consolidou-se a premissa da
maior eficiência da desinfecção, independente do desinfetante empregado, para águas com turbidez baixa,
em virtude da proteção conferida aos microrganismos pelas partículas suspensas na massa líquida, por
vezes denominada efeito-escudo. Em outro contexto, as partículas suspensas podem ser capazes de
adsorver substâncias tóxicas, tais como agrotóxicos organoclorados e outros compostos orgânicos, e sua
remoção reduziría de roldão a concentração destes compostos.
Esta assertiva comprova-se pelo padrão de potabilidade estabelecido pela Portaria 518, embora
águas com turbidez inferior a 5,0 uT, comumente não cause rejeição pela população abastecida. Consoante
com padrões internacionais, esta Portaria estabelece para águas de consumo humano, limite máximo
permissível de 1,0 uT7 no efluente da estação de tratamento - recomendando enfaticamente valores
inferiores a 0,5 uT em 95 % das amostras mensais -, essencialmente objetivando assegurar o êxito das
etapas de clarificação na remoção física e da desinfecção nâ inativação de patogênicos mais resistentes.
Limites ainda mais restritivos são empregados nos EU A -jam ais exceder 1,0 uT e 0,3 uT em 95 % das
amostras em um dado mês - e províncias do Canadá, embora o padrão neste país também seja 1,0 uT.
Contudo, diversos estados americanos e províncias canadenses adotaram voluntariamente limite de 0,1 uT.
Por fim, embora a OMS não estabeleça valor limite em termos de risco à saúde (o valor de 5,0 uT é
mencionado em termos de aceitabilidade pelo consumidor), há recomendação de se produzir água tratada
com turbidez média inferior a 0,1 uT, como forma de avaliação da performance do tratamento e visando à
otimização da desinfecção.
O emprego da turbidez como parâmetro indicador da eficiência do tratamento encontra respaldo
em recentes estudos associando a remoção desta característica física à de cistos e oocistos de protozoários.
Nesta perspectiva, as normas mundiais para água de consumo têm-se tomado progressivamente mais
restritivas para os limites da turbidez da água filtrada.
A afirmativa anterior é corroborada por pesquisa (Patania et al., 1995), avaliando a remoção de
cistos e oocistos de protozoários, Giardia muris e Cryptosporidium parvum, realizadaem diversas
unidades-piloto, totalizando 105 pontos de amostragem, em três estados americanos - Oregon,
7. A Portaria 518 estabelece que até 5 % das amostras do efluente da estação de tratamento podem apresentar
turbidez superior a 1,0 uT assegurando-se o valor máximo permissível de 5,0 uT na rede de distribuição.CAPÍTULO 02
Washington e Califórnia empregando águas naturais com
turbidez inferior a 10 uT. Embora os resultados apontassem
baixa correlação entre a remoção de turbidez e ad e
protozoários, a elevação de 0,1 a 0,3 uT da turbidez da água
filtrada esteve associada à redução de 1,0 log8 na remoção
destes microrganismos.
Também com intuito de inferir a concentração de partículas nas
águas naturais, a partir da década de 1990 inseriu-se na rotina
das estações de tratamento dos EUA e Canadá a contagem de
partículas (n°/mL). O fundamento do emprego dos contadores
de partículas calca-se na bidimensionalidade desta medida, ao
passo que a determinação da turbidez - como o próprio princípio
de funcionamento dos turbidímetros evidencia - ê uma medida
unidimensional do grau de transparência da água. Esta
determinação objetiva associar a remoção de partículas de
determinada faixa de tamanho à de microrganismos
patogênicos, uma vez que os contadores são capazes de detectar
alterações na concentração de partículas não detectáveis pelos
turbidímetros, especialmente para valores de turbidez inferiores
a 0,1 uT.
Exemplo do emprego dos contadores de partículas visou a
avaliar a ocorrência de cistos de Giardia e oocistos de Crypto
na água tratada em estudo realizado em 66 estações de
tratamento localizadas em 14 estados dos EUA e uma província
do Canadá. Em relação à água bruta, detectou- -se a presença
dos mesmos, respectivamente, em 81 e 87 % das amostras
oriundas de mananciais superficiais. A ocorrência de cistos e
oocistos destes protozoários foi verificada em 39 % das
amostras dos efluentes de estações de tratamento de água cuja
turbidez média era de 0,19 uT. Em 78 % dos casos de detecção
dos protozoários os efluentes apresentavam turbidez inferior a
0,5 uT. Embora as estações envolvidas nesta pesquisa
apresentassem efluentes com turbidez média de mesma
magnitude, a contagem do número de partículas apontou
diferenças de até 1000 vezes (LeChevallier; Norton, 1997). Esta
constatação também aflorou em pesquisa anterior utilizando
contadores de partículas e turbidímetro de escoamento contínuo
para o monitoramento da água filtrada. Verificou-se que
variações de 0,01 uT redundavam em alterações da ordem de
550 partículas/mL com dimensão superior a 0,7 pm
(Hargesheimer; Lewis; Yentsch, 1992).
Uma vez que a maioria dos equipamentos detecta somente
partículas maiores que 1 pm, esta contagem acaba centrando-se
sobretudo nas partículas suspensas causadoras de turbidez.
Desta forma, há significativa correlação entre a determinação
de turbidez e a contagem de partículas, em especial para águas
com turbidez superior a 0,1 uT. Tal correlação confirmou-se no
mencionado estudo durante o monitoramento de 220 h da água
filtrada com turbidez de 0,07 a 0,15 uT, apresentando
coeficiente de determinação (R2) de 0,985.
O emprego dós contadores de partículas de escoamento
contínuo, para águas com turbidez consistentemente inferior a
0,1 uT, foi objeto de avaliação em outra estação de tratamento
de grande porte da província de Alberta (Canadá). Neste
estudo, diferentemente dos citados, objetivava-se aferir o
resultado das alterações nas dosagens de produtos químicos
valendo-se da contagem de partículas da água filtrada com
dimensão maior ou igual a 2 pm, compatível à de cistos e
oocistos de protozoários. Aplicaram-se dosagens de sulfato de
5, 6, 8 e 10 mg/L, e comprovou-se a maior acurácia da
contagem de partículas em relação à determinação da turbidez
na detecção de pequenas variações nas dosagens de
coagulantes. A avaliação norteou-se nas análises de frequência
acumulada de partículas detectadas nos efluentes dos filtros,
culminando - após definição da melhor dosagem - com sensível
redução do aporte de partículas na água filtrada (Hargesheimer
et al, 1998).
No Brasil o custo destes equipamentos praticamente os tem
restringido às instituições de pesquisa e em raríssimas estações
de tratamento de sistemas de maior porte estes se fazem
presentes.
8. Há mais de uma década verifica-se a tendência de se reportar à
redução de microrganismos em unidades logarítmicas, ou seja, 1
log corresponde a uma eficiência de 90 %, 2 log a 99 %, e assim
sucessivamente.
CAPITULO 02 33
Desta maneira,
comparação
entre o contador de partículas e o turbidímetro de bancada foi objeto de estudo englobando água bruta
natural, decantada e filtrada em unidade-piloto instalada em uma estação de tratamento de água. Para as
90 amostras, a concentração de partículas - nesta pesquisa atipicamente referenciada em cm3/L -
reportava-se o número de partículas ao diâmetro médio de caia uma das oito faixas de tamanho variando
de 2 a 350 pm. Os resultados evidenciaram significativa correlação entre os dois parâmetros para água
bmta e com menor significância para as águas decantada e filtrada, conforme evidencia a figura 2.6
(Pádua; Di Bernardo, 2001).
Concentração de partículas (cm3/L)
Figura 2.6. Relação entre a turbidez e volume médio de partículas para as águas bruta (a) e filtrada (b).
A diferença significativa entre os dois coeficientes de determinação apontam para dois cenários. O
primeiro evidencia a menor relevância do emprego dos contadores de partículas no monitoramento de
água bruta, pois, a determinação da turbidez fornece informação expedita e fidedigna acerca da
concentração de sólidos suspensos. Por outro lado, para os efluentes das estações de tratamento a
contagem de partículas guarda maior especificidade, pois águas de turbidez de mesma magnitude podem
apresentar predominância de tamanhos de partículas que tomem a desinfecção mais ou menos eficiente.
Tal se deve ao mencionado efeito-escudo que protege os microrganismos da ação do desinfetante. Para
valores praticamente equânimes de turbidez, a predominância de partículas cujas dimensões superam à dos
microrganismos patogênicos tenderá a tomar a desinfecção por agente químico menos efetiva.
É intrínseca a correlação entre a turbidez e a concentração de sólidos suspensos, como parcela dos
sólidos totais cuja distribuição é apresentada na figura 2.7.
Sedimentáveis
Em suspensão
Não sedimentáveis
Sólidos totais <
Voláteis
Dissolvidos
Fixos
Figura 2.7. Distribuição genérica dos sólidos presentes nas águas naturais.
As frações de sólidos podem ser assim definidas (Piveli; Kato, 2006):
• sólidos totais constituem nos resíduos após evaporação em banho-maria e posterior secagem a
103-105 °C;
• sólidos suspensos constituem-se a porção em massa com dimensões superior a 1,2 pm, retida
após filtração;
• sólidos voláteis é a porção dos sólidos totais, dissolvidos ou suspensos que se volatiliza após
calcinação a 550-600 °C, por 15 min para sólidos suspensos ou 60 min para sólidos
totais e dissolvidos;
CAPÍTULO 02
A o i ) ^
•
sólidos fixos, analogamente, constituem-se a porção dos sólidos totais, dissolvidos ou suspensos
que resta após calcinação a 550-600 °C, por 15 min para sólidos suspensos ou 60 min para
sólidos totais e dissolvidos;
• sólidos sedimentáveis é a porção de sólidos suspensos que se sedimenta quando mantida em
repouso em cone Imhoff de um litro durante uma hora.
A parcela dissolvida dos sólidos haverá de conferir em especial cor verdadeira às águas naturais e
o padrão de potabilidade estabelecido pela Portaria 518 reporta-se à concentração máxima de 1000 mg/L
(como sólidos dissolvidos totais). A correlação entre a turbidez e a concentração de sólidos suspensos
pôde ser demonstrada valendo-se do monitoramento da água bruta afluente a uma unidade-piloto de
filtração lenta, conforme mostra a figura 2.8.
A correlação entre sólidos suspensos para com a turbidez e a cor aparente foi objeto de uma
avaliação mais abrangente contemplando18 anos de dados operacionais (1980-97) de duas estações de
tratamento responsáveis pelo abastecimento de Vitória e Cariacica (ES) com base no mesmo curso d’água.
A amostra constou de 312 determinações de sólidos totais e a análise balizou-se em quatro cenários:
considerando todos os dados, e separando-os em dias de chuva, sem chuva e por faixas de concentração de
sólidos suspensos. Os resultados para os três primeiros cenários estão apresentados na tabela 2.1,
destacando-se os valores mais elevados do coeficiente de detenninação para cada cenário em função do
tipo de modelo de regressão empregado (Piccolo; Pinto; Teixeira, 1999).
Tabela 2.1. Valores de R2 valendo-se dos diferentes tipos de regressão e três cenários de análise.
RegressãoTodos os dados Dados com chuva Dados sem chuva 55 x C. A 55x Turb. 55 xC. A 55 x iu rb . 55
x C. A 55x Turb.
Linear 0,7837 0,7970 0,8669 0,8859 0,3516 0,4041 Potência • 0,6531 0,7464 0,8138 0,8627 0,4035 0,5231
Exponencial 0,5779 0,5819 0,5996 0,5848 0,4363 0,5329
Obs.: SS - sólidos em suspensão (mg/L); C. A. - cor aparente (uC); Turb. - turbidez (uT).
Como seria de esperar, os coeficientes de determinação para regressão linear foram significativos
tanto para cor aparente quanto para turbidez, e de mesma magnitude, para a totalidade dos dados e para os
coletados em dias com chuva.
Ao analisar os dados gerados em dias sem chuva, a correlação para com a cor aparente foi mais pronunciadamente inferior à da
turbidez, pois, a parcela dos sólidos dissolvidos - não contemplada na análise de sólidos suspensos - contribuiu mais
significativamente para aquele parâmetro. As baixas CAPÍTULO 02
35
correlações
também para a
turbidez podem
ser explicadas
pelo emprego de
apenas uma
estação pluvio
métrica,
podendo chuvas
não detectadas
por esta estação
terem
contribuído para
a maior
dispersão dos
resultados.
Os resultados da
correlação por
faixa de de concentração de sólidos suspensos são apresentados na tabela 2.2.
Tabela 2.2. Valores de R2 por faixa de valores de sólidos suspensos.
RegressãoSS < 30 mg/L 31 mg/L < S5 < 69 mg/L 70 mg/L < SS <28s mg/L S 5 x '€ A 55 x Turb. 55 x C. A. 55 x
Turb. : 55 xC. A 55 x Turb. Linear 0,5372 0,8194 0,2272 0,1664 0,8803 0,9618 Potência 0,5725 0,8374 0,1664
0,1335 0,7905 0,8811 Exponencial 0,3517 0,6520 0,1921 0,1645 0,8955 0,9675
Os resultados da tabela 2.2 confirmam a estreita correlação entre os parâmetros avaliados para os
valores mais elevados de sólidos suspensos, correspondendo aos períodos de precipitação o maior
carreamento de partículas ao corpo d’água. E, como não podia deixar de ser, sempre que a correlação
mostrou-se mais significativa, o coeficiente de determinação foi superior para turbidez.
A determinação da concentração de sólidos, nos seus diversos matizes, não é comumente realizada
nas estações de tratamento em virtude da morosidade das análises, aos equipamentos necessários e à
menor precisão pra menores concentrações, sendo substituídas pelas análises de cor, aparente e
verdadeira, e turbidez.
Por fim, outro parâmetro diretamente associado à turbidez é a transparência, utilizada sobretudo
no caso de lagos e represas, parâmetro obtido mergulhando-se na água um disco de 20 a 30 cm de
diâmetro9 e anotando-se a profundidade de desaparecimento. Lagos turvos apresentam transparências
reduzidas, da ordem de poucos centímetros até um metro, ao passo que em lagos cristalinos, a trans
parência pode atingir algumas dezenas de metros.
A estimativa da profundidade atingida pela luz, denominada zona fótica e de crucial importância
para o desenvolvimento da comunidade fitoplanctônica, dá-se considerando aproximadamente o triplo da
profundidade de desaparecimento do disco.
Sabor e odor
A conceituação de sabor envolve uma interação de gosto - salgado, doce, azedo e amargo - com o
odor, sendo portanto imensuráveis. Apesar de sensações distintas, usualmente são referenciadas
conjuntamente. Embora possam existir odores agradáveis, de ervas ou de terra, frequentemente associa-se
o odor nas águas de consumo sob o ponto de vista negativo. Sua origem está associada tanto à presença de
diversas substâncias químicas ou gases dissolvidos10, algumas das quais utilizadas no próprio tratamento
como o cloro e, mais raramente, o ozônio.
As manifestações de odor e sabor apresentam causas distintas para águas superficiais e
subterrâneas. Para as primeiras, compostos orgânicos resultantes do metabolismo de alguns
microrganismos - em especial algas, cianobactérias e actinomicetos11 -, decomposição de folhas e plantas
aquáticas, lançamento
9. Disco de Secei, denominação em homenagem a seu inventor, naturalista italiano.
10. Gás carbônico, oxigênio, nitrogênio, amônia, sulfeto de hidrogênio e, em menor frequência, metano
constituem-se os gases mais usualmente encontrados nas águas naturais, alguns dos quais passíveis de
conferir odor e sabor. Os três primeiros perfazem a quase totalidade da composição do ar atmosférico e os
demais decorrem da decomposição da matéria orgânica presente pela ação das bactérias.
11. Bactérias filamentosas comumente presentes no solo que apresentam odor característico de terra e capazes
de produzir os compostos denominados Geosmina e 2-metilisobomeol (MIB).
de efluentes industriais e lixiviação de solos agriculturáveis habitualmente constituem-se nas principais
causas de sabor e odor nas águas superficiais.
Diferentemente, para as águas subterrâneas odor e sabor advêm usualmente de fenômenos naturais,
ainda que as ações antrópicas possam agudizar tais características. Em primeira instância, destaca-se a
ação bacteriana na decomposição anaeróbia de enxofre orgânico, sulfatos e sulfitos gerando ácido
sulfídrico - produzindo odor característico de ovo podre - e na redução de compostos de ferro e manganês
(a ser detalhado em item subsequente). Inserem-se também nesta vertente, a dissolução de sais e minerais
pa percolação da água através de solos e rochas, a intrusão de água do mar - usual nas regiões costeiras,
especialmente onde se aduz vazão superior à capacidade do aquífero, elevando a concentração de cloretos
- e, mais recentemente de característica eminentemente antrópica, a percolação do lixiviado de aterros
sanitários (Montgomery, 2005).
Diversos compostos podem conferir sabor e odor às águas e mesmo não causando dano à saúde
fazem com que estas águas sejam prontamente rejeitadas pela população, situação que se não manifesta
quando da presença de metais pesados, com maior frequência mais deletérios à saúde humana.
Adicionalmente, sabor e odor podem estar também associados:
• a compostos orgânicos aromáticos, majoritariamente presentes em efluentes industriais, como
fenóis e nitrofenóis;
• ao crescimento microbiano, e subsequente subprodutos do metabolismo, nas redes de
distribuição;
• a concentrações significativas de cloro residual e resultante reação com compostos orgânicos
e/ou microrganismos na rede de distribuição.
' A importância do sabor e odor testifica-se na significativa possibilidade da mencionada rejeição
pela população abastecida conduzir ao consumo e uso de outra fonte de qualidade duvidosa, mas insípida
e inodora. No famoso surto de cólera ocorrido em Londres em meados do século XIX - que se constituiu
em um marco para epidemiologia pela confirmação da cólera como doença de transmissão hídrica -, a
população abastecia-se da água contaminada do poço no distrito de Broad Street devido ao seu gosto
agradável. Mesmo moradores residentes próximos a outras fontes de abastecimento optavam pelo poço
contaminado (Olcun, 1996).
Dentre os compostos orgânicos naturais responsáveis por conferir odor e sabor às águas de
consumo, destacam-se MIB (2-metilisobomeol) e geosmina - compostos produzidos por algas,
cianobactérias e actinomicetos -, não associados a efeitos deletérios à saúde e passíveis de serem
percebidos a concentrações inferiores a 5 ng/L. Além de naturalmente produzidos no ambiente, estes
compostos apresentam padrão variável de ocorrência e difícil remediação com as tecnologias

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