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FUNÇÕES MOTORAS DA MEDULA ESPINHAL Profa. Dra. Edmara Aparecida Baroni 1. Introdução: A informação sensorial é integrada em todos os níveis do SNC, gerando respostas motoras adequadas, começando da Medula Espinhal, com reflexos relativamente simples, Tronco cerebral, onde são originadas respostas mais complicadas e, finalmente, indo até o cérebro, onde respostas mais complicadas ainda são controladas. A medula espinhal (ME) está adaptada para a elaboração de atos reflexos somáticos e viscerais. Isto quer dizer que ela depende de informações sensoriais que a alcançam pelos nervos aferentes das raízes dorsais. Estes aferentes são provenientes de receptores localizados nos músculos e articulações (proprioceptores), na pele (exteroceptores), e nas vísceras (viceroceptores), no caso de reflexos autonômicos. Outras informações sensoriais que penetram em níveis superiores do SNC (visão, audição), não causam reflexos medulares, embora tenham um papel importante no controle motor no animal íntegro. Quando se deseja estudar as funções medulares, faz-se uma secção completa da ME em qualquer nível acima daquele no qual vai-se estudar os reflexos medulares. Esta preparação é denominada de “animal medular”, e a transecção libera a ME das influências dos níveis superiores do SNC, que normalmente controlam as funções medulares. Durante a fase aguda dessa preparação ocorre um quadro denominado “choque espinhal”, caracterizado por arreflexia autonômica e somática. Particularmente grave é a queda da pressão arterial que ocorre nesta fase, devido à perda de tônus arteriolar. Esta fase será tão mais grave e prolongada quanto mais avançado o animal estiver na escala filogenética. Durante a fase crônica, o animal recupera os reflexos e muitas vezes, ocorre uma hiperreflexia, e os reflexos medulares podem ser estudados independentemente do controle de centros supramedulares, embora outras deficiências, estas permanentes, continuem presentes: a paralisia e a anestesia. 2. Características dos Reflexos somáticos: a. São Automáticos, ou seja, se repetem sempre da mesma forma; b. São Involuntários; c. São Finalísticos, ou seja, cada qual se presta a uma finalidade especifica; d. A intensidade da resposta é diretamente proporcional à intensidade do estímulo aplicado; e. Todo arco reflexo apresenta um tempo de reação, que para o mesmo reflexo é sempre o mesmo, e equivale ao tempo decorrido desde a aplicação do estimulo até o aparecimento da resposta. O tempo de reação depende da velocidade de condução de impulsos através das fibras aferentes e do retardo sináptico; portanto, quanto mais sinapses tiver um arco reflexo, tanto maior o tempo de reação. 2. Organização Neuronal da Medula Espinhal: Cada segmento da medula espinhal contém vários milhões de neurônios. Tirando os neurônios de retransmissão sensoriais, localizados no corno dorsal da ME, existem ainda dois tipos de neurônios: os motoneurônios anteriores e os interneurônios (ou células internunciais). Motoneurônios: Estão localizados no corno anterior da ME, e são considerados a via final comum do SNM, pois é sobre eles que convergem as informações que se traduzirão num ato motor. Os motoneurônios dão origem a fibras nervosas que saem pelas raízes ventrais da ME e inervam as fibras musculares esqueléticas. Existem dois tipos de motoneurônios: a. Motoneurônios Alfa: Os motoneurônios alfa dão origem a fibras calibrosas do tipo A alfa, e que inervam as fibras musculares esqueléticas. b. Motoneurônios Gama: dão origem a fibras do tipo A gama, que têm a metade do diâmetro das fibras dos motoneurônios alfa. Estas fibras inervam as fibras musculares de um órgão sensorial localizado na intimidade do músculo esquelético – o fuso muscular. Estas fibras musculares do fuso são chamadas de fibras intrafusais. Interneurônios: são neurônios muito pequenos e auto excitáveis, presentes em todas as regiões da ME, e apresentam múltiplas conexões entre si, sendo que muitos deles inervam diretamente motoneurônios anteriores. Na realidade, a grande maioria dos impulsos, ou sensoriais, ou provenientes de níveis supramedulares, incide sobre interneurônios . Nos interneurônios estes impulsos são processados antes de serem transmitidos aos motoneurônios. Assim, os interneurônios representam o primeiro local onde ocorre o processamento da informação sensorial (1ª estação sináptica), é o ultimo local para o controle da função muscular, a partir de impulsos originados em níveis mais elevados do SNC. Células de Renshaw: No corno anterior da ME, existe um grande número de pequenos interneurônios inibitórios, em íntimo contato com os motoneurônios anteriores – são as células de Renshaw. O axônio do motoneurônio alfa, antes de deixar a ME, emite colaterais que estabelecem sinapses com células de Renshaw vizinhas. Estas, por sua vez, transmitem impulsos inibitórios para os motoneurônios adjacentes ao estimulado. Assim, a estimulação de um motoneurônio tende a inibir os motoneurônios adjacentes. Isto mostra que o SNM se utiliza do princípio da inibição lateral para focalizar ou dar nitidez aos seus impulsos. 3. Arco Reflexos Somáticos: As fibras sensoriais penetram na ME pelas raízes dorsais, e podem estabelecer sinapses diretamente com motoneurônios alfa, formando o arco reflexo monossináptico. Portanto, o arco reflexo somático mais simples, tem no mínimo dois neurônios: o neurônio aferente, que traz a informação sensorial de um receptor e um neurônio eferente ou motor, cujas fibras terminam em um músculo esquelético. As únicas fibras aferentes que fazem sinapses diretamente com motoneurônio alfa são aquelas que trazem informações dos fusos musculares. As fibras das demais modalidades sensoriais estabelecem sinapses com interneurônios, e só por meio destes, excitam motoneurônios alfa. Sempre que houver, pelo menos, um interneurônio entre o neurônio aferente e o motoneurônio, diz-se que o arco reflexo é polissináptico. No caso de arco reflexo polissináptico, as fibras aferentes podem estabelecer sinapses com interneurônios localizados no próprio segmento de entrada, e o reflexo é denominado intrasegmentar, pois seus segmentos se situam no mesmo segmento da medula; quando as fibras aderentes estabelecem sinapses com interneurônios localizados em segmentos vizinhos, em direção rostral ou caudal, diz-se que o reflexo polissináptico é intersegmentar, pois abrange segmentos diferentes da ME. As fibras sensoriais podem ainda estabelecer sinapses com neurônios supramedulares, gerando as sensações conscientes a nível cortical. 4. Reflexo Medulares: a) Respostas Reflexas Decorrentes da Estimulação de Receptores Localizados no Músculo Esquelético – Reflexo Miotático ou de Estiramento: O órgão sensorial do músculo esquelético é o fuso muscular, que mede o comprimento e a velocidade de contração do músculo. O fuso muscular é composto por 3 a 10 fibras musculares delicadas, chamadas de fibras intrafusais, em contraposição com as demais fibras musculares comuns, chamadas de extrafusais. As fibras intrafusais estão situadas em paralelo com as fibras extrafusais. As porções centrais das fibras intrafusais possuem poucos ou nenhum elementos contrateis de actina e miosina, portanto, as porções centrais do fuso não encurtam, enquanto que as extremidades possuem estes elementos e podem encurtar, através da ativação de motoneurônios gama, que inervam estas extremidades. A porção central das fibras intrafusais é a porção receptora, e possui dois tipos de terminações sensoriais: Terminação Primária ou Anuloespiral:Envolve as porções centrais das fibras intrafusais (zona receptora). A terminação anuloespiral dá origem a uma fibra sensorial calibrosa do tipo Ia, cujo corpo celular está localizado no gânglio da raiz dorsal da ME. A terminação Ia transmite impulsos para a ME a velocidades elevadas e fazem sinapses diretamente com motoneurônio alfa ou podem se dirigir a porções supramedulares do SNC. Terminação Secundária ou em Ramalhete: De cada lado da terminação anuloespiral, está uma terminação secundária em forma de buquê, e que dá origem a uma fibra sensorial mais delgada, do tipo II, cujo corpo celular está localizado no gânglio da raiz dorsal. Entre a terminação secundária e o motoneurônio alfa existem, pelo menos, dois interneurônios. Estímulo: as fibras sensoriais do fuso são estimuladas quando a porção central das fibras intrafusais são estiradas; isto pode ser conseguido de duas maneiras: 1. Por estiramento de todo o músculo; 2. Pela contração das extremidades das fibras intrafusais, através da ativação de mtoneurônios gama. A terminação anuloespiral é do tipo fásica (adaptação rápida) e transmite impulsos ao SNC somente enquanto o comprimento do músculo está realmente aumentando; a partir do momento que não há mais alteração no comprimento deste, a terminação anuloespiral deixa de transmitir impulsos, ainda que o músculo seja mantido espirado. Portanto, a terminação anuloespiral é responsável pela resposta dinâmica do fuso. A terminação secundaria é do tipo tônica (adaptação lenta) e transmite impulso ao SNC enquanto o músculo estiver estirado, e é, portanto responsável pela resposta estática do fuso. Reflexo Miotático: O estiramento de um músculo causa a contração reflexa das fibras extrafusais de onde partiu o estímulo, através da ativação de motoneurônios alfa, quer direta (terminação Ia) quer indiretamente (terminação II). Este é o reflexo miotático ou de estiramento. Uma vez que o fuso apresenta uma resposta dinâmica e uma resposta estática, o reflexo de estiramento também consiste de um reflexo estático e um dinâmico. Importância do Reflexo Miotático Dinâmico: Detecção de velocidade de movimento, informando diversas áreas do SNC, principalmente o cerebelo, que a partir destas informações, é capaz de predizer a duração de um movimento, fazendo correções posturais adequadas. Em clínica neurológica, costuma-se testar o reflexo miotático dinâmico, percurtindo-se com um martelo o do quadríceps. Isto causa estiramento do músculo e, em conseqüência, o estiramento também do fuso, excitando terminação Ia, que causa contração reflexa do músculo. Importância do Reflexo Miotático Estático: Manutenção da Postura: os músculos extensores ou antigraviatcionais, estão sujeitos continuamente a um certo grau de estiramento exercido pela força da gravidade. Isto causa excitação de terminações secundarias que causam a contração reflexa do músculo. Assim, o reflexo miotático estático provê a estes músculos antigraviotacionais, o tônus ou grau de contração necessária para que o organismo não colabe a nível de articulações. Músculos que elevam a mandíbula: Os músculos que fecham a boca (masseteres e temporais), estão sujeitos a um certo grau de estiramento contínuo, causado pelo peso da mandíbula. Assim, o estiramento mantido causa contração reflexa mantida. Reflexo de Carga: Quando um peso é colocado sobre a mão de um indivíduo, esta praticamente não cede. Isto porque a carga causa o estiramento do músculo, determinando sua contração reflexa. Importância do Sistema Eferente Gama: Toda vez que impulsos sensoriais, corticais, ou de outras áreas do SNC, ativam motoneurônios alfa, os motoneurônios gama são, quase que invariavelmente, estimulados ao mesmo tempo. A importância desta co-ativaçao alfa-gama é que, se quando as fibras extrafusais contraíssem em resposta a ativação de motoneurônio alfa e as fibras intrafusais não, durante a contração muscular as fibras intrafusais se tornariam flácidas e o fuso “silenciaria”, ou seja, deixaria de transmitir impulsos ao SNC acerca do comprimento e da velocidade da contração. Portanto, o eferente gama (eferente fusimotor) tem duas funções: 1. Mantém o fuso “sintonizado” durante a contração muscular. 2. Muitos dos impulsos supramedulares incidem sobre motoneurônios gama. b. Respostas Reflexas Decorrentes da Estimulação de Receptores Localizados nos Tendões – Reflexo Tendinoso ou de Alongamento: Os receptores dos tendões são os órgãos tendinosos de Golgi, e estão localizados em serie com as fibras musculares esqueléticas. Enquanto o fuso detecta velocidade de contração e grau de contração do músculo, o órgão tendinoso de Golgi detecta tensão muscular. O aumento da tensão excita receptores tendinosos que transmitem impulsos ao SNC através de fibras calibrosas do tipo Ib. Enquanto a estimulação do fuso ativa motoneurônios alfa, a estimulação do órgão tendinoso de Golgi os inibe. Isto porque, entre o aferente Ib e o motoneurônio alfa existe, no mínimo, um interneurônio inibitório. Assim, quando se desenvolve uma tensão excessiva no músculo esquelético a excitação do órgão tendinoso de Golgi causa o relaxamento reflexo do músculo. Este efeito é denominado de reação de alongamento ou reflexo tendinoso, e é um reflexo protetor, que impede o esgarçamento do músculo. Em laboratório, a estimulação elétrica direta de músculos consegue causar estes efeitos destrutivos. Fisiologicamente, entretanto, o reflexo tendinoso não deve ter esta função protetora, uma vez que ninguém, voluntariamente, consegue desenvolver uma tensão muscular tão grande a ponto de produzir o esgarçamento do músculo. Assim, o órgão tendinoso deve fazer parte de um sistema de controle, que, juntamente com o fuso muscular, informa ao SNC acerca da tensão muscular, comprimento e velocidade de contração do músculo. a. Respostas Reflexas Decorrentes da Estimulação de Receptores Localizados na Pele: Reflexo Flexor ou de Retirada: Quando um estímulo de grande intensidade é aplicado em um membro de um animal medular, ocorre a contração dos músculos flexores deste membro para afastá-lo do estímulo. O estímulo mais eficaz para desencadear este reflexo é o doloroso; por isso este reflexo é chamado de reflexo da dor. O reflexo Flexor é um reflexo polissináptico, pois existem muitos interneurônios entre o neurônio aferente e o motoneurônio alfa. Reflexo Extensor Cruzado: É um reflexo que ocorre em conseqüência ao reflexo flexor. Quando o estímulo algesiógeno é muito intenso, cerca de 0,2 a 0,5 seg. após a flexão de um membro, o membro oposto começa a se distender, na tentativa de afastar o corpo do estímulo nocivo, e mantê-lo em equilíbrio. Mecanismo Neuronal do Reflexo Extensor Cruzado: As aferências nociceptivas cruzam para o Iado oposto da ME, divergindo para outros circuitos neuronais contralaterais que vão incidir sobre motoneurônios extensores. De acordo com o fenômeno da inervação recíproca, deve ficar claro que as aferências nociceptivas que determinam a contração de músculos flexores, devem, ao mesmo tempo, inibir aqueles músculos que são antagônicos a este movimento (músculos extensores). Assim, as aferências nociceptivas, incidem sobre motoneurônios flexores, excitando-os, e sobre motoneurônios extensores, inibindo-os – isto no membro lesado. No membro oposto ao lesado, as aferências nociceptivas excitam motoneurônios extensores e inibem motoneurônios flexores, para permitir que haja extensão deste membro. b. Reflexos Posturais: Reação de sustentação Positiva: quando uma pressão é aplicada à pata deum animal medular, ocorre a extensão do membro de encontro à pressão que está sendo aplicada. Reação de endireitamento: quando um gato medular é colocado em decúbito lateral, ele faz movimentos incoordenados na tentativa de assumir a posição ereta.
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