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1 A CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME MILITAR FACE À CONSTITUIÇÃO DE 1946. Karine Pinheiro Barbosa1 Thiala Kércia Barbosa Romualdo de Souza2 Francisco Valdovir Holanda de Almeida3 RESUMO O presente estudo teve por objetivo analisar a constitucionalidade do Regime Militar (1964- 1985), sob o paradigma da Constituição de 1946. Para tanto, empreendeu-se pesquisa bibliográfica e documental, interdisciplinarmente, fazendo-se um retrospecto sobre o período pré-Regime Militar, nos Governos de Jânio Quadros e João Goulart (Jango), situados em uma crise político-institucional, com vistas aos levantes sociais: de um lado, movimentos com inclinações de socialistas (esquerda) e do outro, com perfil capitalista (direita), culminando em conflitos, agravadas pelas propostas reformistas mais incisivas adotadas por João Goulart, e suas relações diplomáticas com países socialistas, temendo uma possível instauração do socialismo no Brasil. No estopim dessa “convulsão” sociopolítica, o cargo de Presidente da República foi declarado vago pelo Congresso Nacional, enquanto Jango visitava a China maoista, pretexto que alçou os militares ao poder novamente. Nesse diapasão, analisa-se a intervenção buscando a previsão Constitucional da posse de Castello Branco no Art. 177 da CEUB, de 1946, a qual se destinam as Forças Armadas, defender e garantir a ordem da pátria, visando prevenir a intervenção comunista/socialista, porém, a legalidade do Regime, que perpetuou durante 21 (vinte e um) anos, não se pode deduzir que a manutenção das forças militares no poder foi legítima. Palavras-chave: Constituição; Regime Militar; Presidente; Comunismo; Forças Armadas. 1 Graduanda do curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá - UNICÁTOLICA 2 Graduanda do curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá - UNICÁTOLICA e Licenciatura Plena em História da Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central – FECLESC/UECE. 3Orientador, Bacharel em Direito pela Unicatólica, Especialista em Direito Tributário; Direito Previdenciário; Direito do Trabalho; Licenciatura Plena em Biologia; Docente do curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá. 2 ABSTRACT The present study aimed to analyze the constitutionality of the Military Regime (1964- 1985), under the paradigm of the 1946 Constitution. For this purpose, a bibliographical and documentary research was undertaken, interdisciplinarily, with a retrospective on the pre- Regime period (Jango), situated in a political-institutional crisis, with a view to social upheavals: on the one hand, movements with socialist inclinations (left) and on the other, with a capitalist profile (right) , Culminating in conflicts, aggravated by the more incisive reformist proposals adopted by João Goulart, and his diplomatic relations with socialist countries, fearing a possible instauration of socialism in Brazil. In the face of this sociopolitical "convulsion", the office of President of the Republic was declared vacant by the National Congress, while Jango visited Maoist China, a pretext that raised the military to power again. In this tuning, the intervention is analyzed seeking the Constitutional forecast of the possession of Castelo Branco in Art. 177 of the CEUB, of 1946, which is intended for the Armed Forces, to defend and guarantee the order of the mother country, aiming to prevent communist / socialist intervention , But the legality of the regime, which it perpetuated for 21 (twenty-one) years, can not be deduced that the maintenance of the military forces in power was legitimate. Keywords: Constitution; Military regime; President; Communism; Armed forces. INTRODUÇÃO O tema trazido é de real importância, pois o presente artigo traz uma motivação diante de alguns desafios e dúvidas encontrados pelos ingressantes na área Jurídica. Ao fazer uma abordagem histórica, encontramos momentos de crise financeira e desestabilização, trazendo fortes consequências ao longo dos anos antecedidos ao Regime Militar. Foram analisadas as situações políticas e econômicas caracterizadas, em cada governo e os motivos que tornaram a tomada de poder essenciais e constitucionais para o contexto histórico na época, tomando como base a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946, analisando a culminância de cada governo e a situação política para que se chegasse a ocupação militar. Assim, este artigo irá analisar a Constituição de 1946, buscando deduzir se a ocupação do poder presidencial pelos militares foi constitucional ou não, e se no decorrer do regime isso se perpetuou ou se houveram alterações. Inicialmente será apresentada a historicidade do Brasil, começando por JK e seu governo, caracterizado por uma crise econômica, fruto de um plano equivocado que gerou grandes 3 consequências. Em seguida, serão analisados os governos de Jânio Quadros e João Goulart, abordando a continuidade da crise financeira, as características presentes em cada gestão e a grande repressão militar, com apoio civil, por medo de uma possível aliança comunista, agravada no governo de Jango. Na segunda parte, será apresentada a Constituição de 1946, começando por seus momentos históricos e finalizando com a análise dos resultados obtidos através do Art. 177, onde “destinam-se as Forças Armadas a Pátria e garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem”, concluindo que a ocupação dos militares foi constitucional. 1. MOMENTOS PRÉ-REGIME MILITAR Os momentos históricos pré-regime militar são marcados, principalmente, pelo impedimento do governo de Café Filho causado por problemas de saúde4 e suspeita de envolvimento na conspiração para evitar a posse de Juscelino Kubitschek e de João Goulart, eleitos, respectivamente, presidente e vice-presidente por voto direto em outubro de 1954, vindo, assim, a assumir o presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz e logo depois seu vice, Nereu Ramos. A União Democrática Nacional exigiu novas eleições sob a alegação de que JK não conseguira a maioria absoluta dos votos, mesmo assim o general Lott garantiu que JK e Jango tomassem posse em 31 de janeiro de 1956, dando-se, assim, o primeiro “golpe da legalidade”. (GARSCHAGEN. 2015.) Juscelino Kubitschek5 ficou famoso por suas realizações na área econômica brasileira e por sua política de nacionalismo desenvolvimentista. Observa-se sua aproximação pragmática a uma economia mista, visando uma taxa de crescimento alta e rápida nos setores públicos e privados, dando maior ênfase às indústrias básicas e de bens de capital. (SKIDMOR. 1982) Em consequência da forte atuação do governo na economia, não tardaram a surgir às dificuldades, tais como o endividamento junto ao Fundo Monetário Internacional. (HOUAISS, 1979). Ocasionando vários problemas, tais como: o aumento de gastos públicos, desestabilização monetária, inflação, aumento de impostos, desequilíbrio da balança comercial e subsídios e concessão de empréstimos. Sendo acusado de corrupto e economicamente inepto, JK findou o seu governo em 31 de janeiro de 1961. (LINHARES, 1990) 4 Um distúrbio cardiovascular. 5 Conhecido como o segundo presidente que conseguiu ocupar o cargo inteiro depois de 1945. 4 1.1. GOVERNO JÂNIO QUADROS Jânio Quadros, com seu carisma populista, conseguiu vencer as eleições para presidente da República em 03 de outubro de 1960 com a maioria dos votos (48%), e João Goulart, novamente, como vice-presidente. (GARSCHAGEN, 2015) Jânio chegou à presidência da República de forma muito veloz. Em São Paulo saiu da suplência de vereador para a Presidência da República, onde exerceu, sucessivamente, os cargos de prefeito (1953 a 1955) e governador do Estado (1955-1959). Tinha um estilo político próprio,baseado em um discurso moralizador, conquistando votos ao se apresentar como alguém que não pertencia à elite política tradicional. (NAPOLITANO, 2013) Herdando do governo anterior uma inflação de 25% ao ano e uma dívida externa alta para a época (1 bilhão e 365 milhões de dólares), Jânio adotou um programa de ajuste das finanças públicas e organização de controles de crédito para reduzir os gastos do governo, congelamento dos salários e redução de emissões de papel-moeda, permitindo empréstimos externos. (GARSCHAGEN, 2015) Segundo Bruno Garschagen (2015): “As decisões pareciam ser acertadas, mas o resultado foi diferente do esperado. Apesar de a arrecadação ter aumentado “consideravelmente no trimestre seguinte”, as despesas, ao contrário do que fora planejado, aumentaram “nas mesmas proporções, enfraquecendo o programa de ajuste das finanças públicas”. Há três possíveis explicações para isso: a inexistência de instituições adequadas para as decisões tomadas, a limitação dos instrumentos de política econômica e de técnicos na época e a necessidade de Jânio de adotar medidas populistas para estimular o crescimento econômico e assim agradar empresários e a população, mas que inviabilizam o projeto de estabilização.” Apesar de todo o esforço, a crise interna já estava plantada. Sem o apoio da população, Jânio perdeu toda a sua credibilidade. Investiu nos planos, mas não haviam estruturas necessárias e pessoas capacitadas que pudessem ser usadas em favor do Estado, causando um fraco desempenho na economia. Adotando, assim, uma política externa independente e restabelecendo relações democráticas com países comunistas, apoiando o governo cubando de Fidel Castro e condecorando, no Brasil, o guerrilheiro Che Guevara, Jânio perdeu todo o apoio político. 5 Via, então, como único meio de salvação a renúncia, esperando que o Congresso não aceitasse e tivesse o amparo da população. Sentindo-se traído, saiu do poder no dia 25 de agosto de 1961, onde o Congresso aceitou sua renúncia e impôs o sistema parlamentarista na tentativa de limitar o poder do novo presidente. (GARSCHAGEN, 2015) 1.2. GOVERNO JOÃO GOULART Após a renúncia de Jânio, o poder efetivo passou para as mãos de três ministros militares: General Odílio Denys6, Brigadeiro Moss7 e o Almirante Silvio Heck8. Estes declararam Estado de Sítio 9 tentando impedir a posse de João Goulart. O Congresso, no entanto, negou-se a vetar a posse de Jango, em vez disso, a Comissão do Congresso recomendou a criação de um sistema parlamentar. (SKIDMOR, 1982) Como estava em visita oficial à China no dia da renúncia, João Goulart encontrou dificuldades em assumir o cargo quando regressou. Não sendo bem visto por militares, políticos e conservadores, houve uma tentativa de impedimento sob a justificativa de que seu governo seria uma ameaça à ordem do país. Entretanto, no dia 2 de setembro, foi aprovada uma ementa constitucional que permitia a participação popular, optando por um dos sistemas políticos de governo propostos, presidencialismo ou parlamentarismo. (MAIA, 2008) A vitória de Goulart, com mais de 10 milhões de votos, e a vitória do bloco de esquerda nas eleições regionais em 1962, dava por fim a curta experiência do parlamentarismo no Brasil. (GARSCHAGEN, 2015) Como presidente, tentou emplacar reformas sociais, econômicas e políticas que previam a geração de empregos e a diminuição da inflação para por fim à crise econômica, devendo tornar o país menos desigual e mais democrático. A tentativa de contornar a situação foi esvaziada, perdendo todo o apoio e sendo visto como um “incompetente administrativo” e irresponsável. (NAPOLITANO, 2013) 6 Ministro de Guerra 7 Ministro da Aeronáutica 8 Ministro da Marinha 9 Instrumento burocrático e político onde o Governo Federal suspende por um período temporário a atuação dos poderes legislativo e judiciário. 6 2. CRISE INSTITUCIONAL NO BRASIL Com o crescimento baixo, inflação acelerada e a perda dos investimentos externos, elites civis e grupo militares viam a intervenção para depor Goulart como a melhor solução para o país. (GARSCHAGEN, 2015) O país vivia um momento econômico muito grave, conforme descreve Elio Gaspari (2002): “Os investimentos estrangeiros haviam caído à metade. A inflação fora de 50% em 1962 para 75% no ano seguinte. Os primeiros meses de 1964 projetavam uma taxa anual de 140%, a maior do século. Pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra a economia registrara uma contração na renda per capita dos brasileiros. As greves duplicaram, de 154 em 1962, para 302 em 63. O governo gastava demais e arrecadava de menos, acumulando um déficit de 504 bilhões de cruzeiros, equivalente a um terço total das despesas. Num país onde a tradição dava aos ministros da Fazenda uma média de vinte meses de permanência no cargo, Goulart dera pouco mais de seis meses a seus cinco ministros.” Jango vinha com a promessa de varrer a crise brasileira e acabar com a corrupção, mas o que estava ruim, começando no governo de JK, começou a piorar, trazendo um grande aumento na inflação e grandes consequências na economia. Nessas condições, Goulart, com o apoio das organizações sindicais, dos nacionalistas e dos partidos de esquerda, passou a buscar força nas ruas com manifestações de massa e comícios. Procurou diminuir a participação de empresas estrangeiras, cessando os investimentos externos, e seguiu as orientações do FMI (Fundo Monetário Internacional). (LINHARES, 1990) 2.1 LEVANTES SOCIAIS E “AMEAÇA VERMELHA” No dia 13 de março de 1964, em frente ao Edifício Central do Brasil, no Rio de Janeiro, reunindo mais de 150 mil pessoas, Goulart realizou um comício onde predominava no palanque os líderes comunistas e no meio do povo, faixas com símbolos comunistas e pinturas que retratam este pensamento político fazendo acusações à elite política e pressionando os adversários e membros do Congresso, anunciando uma série de leis, entre elas a lei da Reforma Agrária, e a assinatura de dois decretos. (GARSCHAGEN, 2015) O primeiro declarava: 7 “De interesse social para fins de desapropriação as áreas rurais que ladeiam os eixos rodoviários federais, os leitos das ferrovias nacionais, e as terras beneficiadas ou recuperadas por investimentos exclusivos da União em obras de irrigação, drenagem e açudagem, atualmente inexploradas ou exploradas contrariamente à função social da propriedade, e dá outras providências.” Desapropriando as terras disponíveis das margens das rodovias e açudes que pertenciam ao governo. O segundo estatizava as refinarias particulares de petróleo em atividade no país, alegando que as empresas devem pertencer ao povo. (GARSCHAGEN. 2015) Após os decretos e a Revolta dos Marinheiros, que aconteceu no dia 25 de março, onde a Associação estava traçando parcerias com comunistas, a população, que era contra o governo de João Goulart e contra o comunismo, respondeu com uma passeata de um milhão de pessoas, as “Marchas de Deus e pela Família”, e outra prevista para o dia 1° de abril no Rio. (BALEEIRO, SOBRINHO, 2001) 2.2. DESTITUIÇÃO DE JOÃO GOULART Levando à manifestação de tropas, na madrugada do dia 31, levantaram-se em armas, sob o comando do general Olímpio Mourão Filho (1900-1972), o estado de Minas Gerais, seguido por Pernambuco, Rio e São Paulo. Jango esperava ter o apoio do 2° exército, governado pelo General Amaury Kruel, seu amigo pessoal. (BALEEIRO, SOBRINHO, 2001). Mas as tropas não encontraram resistência e os que estavam apoiando Jango, passaram a aderir o movimento rebelde. Com a governabilidade frágil, inflação em alta e uma crise complexa e profunda. O general Olympio Mourão Filho derruba o governo federal. (COUTO, 1999) No dia 1° de abril,sendo deposto por uma Revolta Militar, com a perda dos aliados e a pressão dos que eram contrários ao governo, o presidente fugiu para o sul do país e, no dia 4, foi para o exílio em Uruguai e depois Argentina, onde faleceu em 1976, vítima de um infarto. (GARSCHAGEN, 2015) Nos dias consecutivos à fuga do Presidente, houveram reuniões para decidir o futuro do Brasil e para buscar saídas para contornar a crise. A Constituição determinava novas eleições dentro de 30 dias, se os cargos de presidência e vice-presidência estivessem vagas. Enquanto alguns discutiam a sucessão do governo, os militares pressionavam para que o legislativo fosse “limpo” dos elementos considerados “inaceitáveis”. Com a aceitação da 8 pressão por meio dos militares, a legislação daria amplos poderes para expurgar o funcionalismo civil e revogar mandatos das legislaturas federais e estaduais. Assumindo assim, um Ato Institucional como Supremo Comando Revolucionário. (CASTRO, 2014) 3. A CONSTITUIÇÃO DE 1946 A constituição dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1946, foi criada para restaurar a pureza da doutrina norte-america e a soberania do Poder Judiciário em questão ao controle da constitucionalidade, após o fim do regime de Getúlio Vargas e de sua deposição pelos militares. Com o fim da 2º Grande Guerra Mundial aumenta um sentimento de valorização do regime democrático em todo o mundo. Na Assembleia Constituinte convocada para a reformulação da nova constituição, todos os debates usaram como base a Constituição de 1934. Essa nova Constituição tinha como base a democracia- social. (CUNHA JÚNIOR. 2013) Assim a Constituição passava por mudanças, como descreve Aliomar Baleeiro e Barbosa Lima Sobrinho (2001): “Reformas, propriamente, não se continham nos textos constitucionais, que não faziam mais, tanto em 1934, como em 1946, do que resumir o que já vinha expresso na legislação ordinária e, sobretudo, no Código de 1932, que tem, na evolução de nosso direito eleitoral, a função de uma espécie de marco revolucionário, equiparável, pela sua importância, pelo seu alcance, pela sua influência, àquela famosa Lei Saraiva, que em 1881 conseguira instituir o voto direto, quebrando a tradição de um regime em diversos graus de votação, que datava de pleitos anteriores à própria independência nacional.” Sendo assim podemos ter a constituição de 1946 como a segunda mais democrática, perdendo, no entanto para a constituição de 1988. Pode-se ainda dizer, que todos os direitos para quebrar a tradição do regime, como o direito ao voto direto, foram garantidos ao povo. 3.1. PREVISÃO CONSTITUCIONAL PARA A SUCESSÃO PRESIDENCIAL 9 Apesar da forte resistência dos militares João Goulart sobe à presidência, aprova-se a EC nº 04 de 02 de setembro de 1961, essa que reduzia o poder do presidente implantava o parlamentarismo no Brasil, o que durou pouco tempo em razão da aprovação no Congresso Nacional após plebiscito popular a EC nº 06 de 23 de janeiro de 1963, que era contra o sistema parlamentar, revogando a emenda 04. (CUNHA JÚNIOR. 2013) A constituição de 1946 manteve o presidencialismo, porém o Poder Executivo mudou, agora o Vice-Presidente da República seria o substituto do Presidente, como podemos ver nos Artigos: 78 e 79.10 Algo fora do normal também pode ser visto nessa nova Constituição assim como descreve Flávia Lages de Castro (2014): “Uma questão envolvendo a vice-presidência também causa estranheza para o modelo atual. O Vice era também o Presidente do Senado Federal, portanto do congresso. Isso poderia ser uma ingerência do Executivo no Legislativo, mas, conforme afirmado anteriormente, o Vice-Presidente não fazia parte do Poder Executivo: Art.61. O Vice-Presidente da República exercerá as funções de Presidente do Senado Federal, onde só terá voto de qualidade.” João Goulart foi presidente até 1964, os militares conseguiram alcançar seu objetivo, tirar Jango da presidência. O general Mourão Filho exigiu sua renúncia. A Revolução de 1964 foi inegavelmente um golpe de Estado organizado pelos militares descontentes com as políticas reformistas que João Goulart vinha fazendo. (CUNHA JÚNIOR. 2013.) Logo os militares por causa do momento político, capitalismo versus socialismo, Guerra-Fria, tensões internas e reformas populistas, temiam que Jango implantasse o comunismo no Brasil, fazendo com que seu governo virasse uma ditadura comunista como as que estavam surgindo ao redor do mundo. Jango naquele momento aparecia em comícios com líderes comunistas notórios e viam-se inúmeras faixas com slogans comunistas. (BALEEIRO, SOBRINHO. 2001.) O apoio ao golpe cresce entre os empresários, maior parte da imprensa e igreja, e da classe média e rica. Os militares prometiam em seus discursos o fim do comunismo, a salvação da democracia e o fim da corrupção. (COUTO. 1999.). Logo toda a classe conservadora apoiava e via com bons olhos a ocupação militar, o que tornou mais fácil a posso de um militar na presidência. 10 Art. 78. “O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República.” Art. 79. “Substitui o Presidente, em caso de impedimento, e sucede-lhe, no de vaga,o Vice-Presidente da República.” 10 “Brasília, 9 de abril de 1964. A cúpula militar baixa ato institucional que dá poderes excepcionais ao governo, inclusive os de suspensão arbitraria de direitos políticos e de cassação de mandatos populares. Há uma escalada de cassações em nome da democracia e do combate à subversão e à corrupção. É a ruptura com o sistema político democrático implantado no final de 1945- imediatamente após a queda da ditadura Vargas (1930-45) – e formalmente pactuado na Constituição de 1946. E também i inicio da institucionalização do regime autoritário. (COUTO.1999.)” Observa-se a principio que a ocupação militar não parecia ofensiva, estava apenas cassando mandatos de pessoas que ameaçavam o propósito maior, a democracia, e assim obedecendo ao sistema político democrático da Constituição de 1946. Couto ainda enfatiza o começo do regime autoritário: “Brasília, 11 de abril de 1964. O Congresso Nacional elege novo presidente deposto. É o marechal Humberto de Alencar Castello Branco, principal líder do movimento militar, de linha moderada, referência principal do chamado Grupo da Sorbonne, ligado à Escola Superior de Guerra. Depois dele virão mais quatro generais- presidentes indicados pelas Forças Armadas e eleitos indiretamente: Costa e Silva (1967-69), Emílio Garrastazu Médici (1969-74), Ernesto Geisel (1974-79) e João Baptista de Oliveira Figueiredo (1979-85). (COUTO. 1999.)” Castello Branco assumiu o poder amparado nos artigos: 179 e 177 da Constituição de 1946, onde explicitava que eles deviam garantir a ordem e defender a Pátria de qualquer ameaça, principalmente de regimes ditatoriais como era o caso naquele momento da China comunista, onde Goulart tinha simpatizantes, e assim poderia implantar no Brasil.11 11Art.177. Destinam-se as Forças Armadas a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem. Art.179. Os problemas relativos à defesa do País serão estudados pelo Conselho de Segurança Nacional e pelos órgãos especiais das Forças Armadas, incumbidos de prepará-las para a mobilização e as operações militares. §1º O Conselho de Segurança Nacional será dirigido pelo Presidente da República, e dele participarão, no caráter de membros efetivos os ministros de Estado e os chefes de Estado-Maior que a lei determinar. Nos impedimentos, indicará o Presidente da República o seu substituto. §2º A lei regulará a organização, a competência e o funcionamento do Conselho de Segurança Nacional. 11 3.2. CONSTITUCIONALIDADE DA POSSE DE CASTELLO BRANCO Analisando assim o Art.177, vemos que a posse de Castello Branco foi constitucional. Seu governofoi marcado pelo combate à corrupção e à subversão, recuperação da economia e das finanças públicas. Até meados de 1967, sempre apresenta a intervenção militar como corretiva e temporária. Castello Branco foi eleito pelo Congresso Nacional de forma constitucional e previsto em lei. (COUTO. 1999.) Mas essa realidade tende a mudar com o general Costa e Silva, ministro do Exército, o mesmo não abre mão da permanência dos militares no poder, e se impõe como sucessor. Castello Branco induz o Congresso a elaborar nova Constituição, que assim incorpora os principais comandos da legislação autoritária, elegendo assim o presidente de forma indireta. (COUTO. 1999.). Nota-se a partir de então, que no ato da criação dessa nova constituição a intervenção militar toma novos caminhos. No governo de Costa e Silva a tensão aumenta, a violência cresce, as forças de segurança passam a reagir, os grupos de esquerda aderem à luta armada. Em dezembro de 1968, o congresso baixa o AI-512. Está dado o começo do regime militar autoritário, para muitos o 12 Art. 5º - A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em: (Vide Ato Institucional nº 6, de 1969) I - cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função; II - suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais; III - proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política; IV - aplicação, quando necessária, das seguintes medidas de segurança: a) liberdade vigiada; b) proibição de frequentar determinados lugares; c) domicílio determinado, § 1º - O ato que decretar a suspensão dos direitos políticos poderá fixar restrições ou proibições relativamente ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados. (Vide Ato Institucional nº 6, de 1969) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-06-69.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-06-69.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-06-69.htm#art2 12 golpe dentro do golpe. O AI-5 suspende todos os direitos civis comuns. (COUTO. 1999.). Dessa maneira uma ocupação legal e constitucional, passa a ser uma ditadura, um regime autoritário e violento. CONSIDERAÇÕES FINAIS Visto as previsões na Constituição de 1946, a situação política e econômica do país, as ameaças de invasões comunistas, o pedido de estado de sítio pelo então Presidente João Goulart, os simpatizantes políticos associados a Jango e toda uma manifestação comunista contra sua destituição, podemos deduzir que o ato em si, dos militares assumirem a presidência foi constitucional, pois era o papel dos mesmos defender o país e manter a ordem, e um governo comunista naquela situação, só afundaria mais a economia e a ordem brasileira, para isso os militares tinha o apoio da maior parte da população. Contudo, essa constitucionalidade não demorou muito para acabar, eis que surge o segundo golpe em dezembro de 1968, quando Costa e Silva fecha o Congresso e cria o AI- 5, esse dá quase poder absoluto ao presidente e seus efeitos não passam pela apreciação judicial, tirando todos os direitos à liberdade da população e proibindo manifestações que fossem contra o Regime Militar. § 2º - As medidas de segurança de que trata o item IV deste artigo serão aplicadas pelo Ministro de Estado da Justiça, defesa a apreciação de seu ato pelo Poder Judiciário. (Vide Ato Institucional nº 6, de 1969) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-06-69.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-06-69.htm#art2 13 Com as manutenções na Constituição, a legislação autoritária e ditatorial, eleições indiretas e o AI-5, o governo militar passou de uma posse constitucional para inconstitucional, ou seja, com abusos exercidos por parte dos militares para evitarem uma ditadura comunista, eles acabaram criando um regime ditatorial, algo maior que um golpe, acabaram fazendo o que deveriam evitar. Podemos então dizer que a intervenção militar foi constitucional, no entanto, no decorrer dos anos por meio do regime autoritário, das abusivas reformas na Constituição e autoritarismo exacerbado foi tornando-se inconstitucional. REFERENCIAS BALEEIRO, Aliomar e SOBRINHO, Barbosa Lima. Constituições Brasileiras :1946/Aliomar Baleeiro e Barbosa Lima Sobrinho. – Brasília: Senado Federal e Ministério da Ciência e Tecnologia, Centro de Estudos Estratégicos, 2001. CASTRO, Flávia Lages de, História do Direito Geral e Brasil, 10° edição – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. COUTO, Ronaldo Costa, Memória Viva do regime militar- Brasil: 1964-1985/Ronaldo Costa Couto .- Rio de Janeiro: Record, 1999. CUNHA JÚNIOR, Dirley da- Curso de Direito Constitucional, 7º edição – Salvador, Bahia: JusPODIVM, 2013. HOUAISS, Antônio – Enciclopédia Mirador Internacional, 1° edição - São Paulo – 1979. LINHARES, Maria Yedda - HISTORIA GERAL DO BRASIL, 9° edição, 1991, Rio de Janeiro: Campos, 1990. MAIA, Raul - ESTUDANTE NOTA 10, 1° reimpressão, São Paulo, 2009. NAPOLITANO, Marcos - 1964: Histórias do Regime Militar Brasileiro, 1° edição, São Paulo, 2013. SKIDMOR, Thomas E. – Brasil: de Getúlio Vargas a Castelo Branco, 1930-1964, 7° edição, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. SITES: 14 www.camara.gov.br www.planalto.gov.br http://www.camara.gov.br/ http://www.planalto.gov.br/
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