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125 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Unidade III 7 VIROLOGIA CLÍNICA 7.1 Principais doenças virais de importância clínica Para se compreender melhor algumas doenças de etiologia viral, é importante entender que muitas infecções virais são subclínicas, ou seja, não apresentam sintomas. São o que chamamos assintomáticas e, portanto, difíceis de serem percebidas e/ou diagnosticadas. O mesmo vírus pode provocar uma grande variedade de doenças, o que significa que muitos vírus diferentes são capazes de causar o mesmo quadro clínico, e o mesmo quadro clínico pode ser causado por vírus diferentes, dificultando o diagnóstico e influenciando a implementação de técnicas e procedimentos laboratoriais que visem a uma melhor elucidação dos casos. A doença produzida não tem relação com a morfologia viral, e a evolução de qualquer caso é determinada pela constituição genética do vírus e do hospedeiro. As doenças de etiologia viral, para serem mais bem compreendidas, podem ser divididas em generalizadas, nas quais os vírus se propagam pelo organismo por meio da corrente sanguínea, com comprometimento sistêmico, exemplo: sarampo, rubéola, varicela, febre amarela, dengue e enterovírus, ou doenças órgãos-específicas, como as que acometem o SNC, tais como a poliomielite, meningite (Poliovirus, Coxsackie e Echovirus), raiva, encefalite (rabdovírus, sarampo, caxumba, herpes etc.); o trato respiratório, como as pneumonias, bronquites, bronquiolites, gripes e resfriados (influenza, parainfluenza, vírus sincicial respiratório – VRS); pele e mucosas, como nas infecções por herpes simples tipo 1 (oral) , herpes simples tipo 2 (genital), herpes zoster, sarampo e varicela; hepáticas, por vírus da hepatite tipo A (infecciosa), hepatite B (sérica), tipo C e E; as que acometem as glândulas salivares, como na caxumba e infecção por citomegalovirus; o trato gastrintestinal, típicas da infecção por Rotavirus e adenovírus entérico; e, por fim, as sexualmente transmissíveis, como as causadas pelos vírus da herpes simples, hepatite B, papilomavírus, Retrovirus. A seguir, apresenta-se uma breve explanação acerca de alguns vírus de importância epidemiológica no Brasil e no mundo. Poliomielite – Poliovirus Os Poliovirus multiplicam-se inicialmente nas mucosas, especificamente nas placas de Peyer e nas tonsilas, em que a replicação pode ser detectada em até 3 dias. Os vírus multiplicam-se nos linfonodos, acarretando em uma pequena viremia, invadindo o sistema retículo-endotelial. É nesse momento que o sistema nervoso central pode ser invadido. A maioria dos indivíduos infectados com poliovírus controla a infecção antes da viremia secundária, o que resulta em infecção assintomática. Alguns estudos sugerem que a disseminação para o sistema nervoso central pode ocorrer pelos nervos periféricos ou craniais, por fluxo axonal retrógrado. A infecção pelo Poliovirus no SNC pode acarretar em paralisia flácida 126 Unidade III permanente dos membros inferiores e, portanto, reitera-se a necessidade de se manterem altos níveis de vacinação em razão de o vírus ainda não ter sido considerado erradicado em termos mundiais. Gripes e resfriados Embora se faça confusão entre a gripe (ou influenza) e o resfriado comum, essas doenças são causadas por tipos diferentes de vírus. Os vírus da gripe quase sempre provocam febre, prostração, cefaleia, dores musculares, tosse seca, espirros e obstrução nasal. O resfriado comum é uma doença mais branda, causada por diversos vírus que atacam apenas as partes altas do aparelho respiratório (nariz e faringe). A mucosa nasal inflamada elimina grande quantidade de líquido claro e aquoso (coriza). Geralmente, ocorrem também espirros, cefaleia, secura na garganta e, mais raramente, um ligeiro aumento da temperatura do corpo. Ambas as doenças são transmitidas por gotículas de secreção das vias respiratórias lançadas no ambiente por meio da tosse ou do espirro. A disseminação é facilitada pelas aglomerações humanas, pela poeira, pelo frio (que irritam a mucosa das vias aéreas) e pelas más condições de higiene e alimentação; a doença é autolimitante, durando de 3 a 7 dias. A imunidade natural ou por vacinação não é duradoura, pois novas formas de vírus (mutantes), contra as quais o organismo humano ainda não produziu anticorpos, aparecem rapidamente. Os antibióticos não exercem nenhum efeito e devem ser restringidos, a não ser nos casos de infecções bacterianas secundárias. Recomenda-se apenas repouso, hidratação e tratamento sintomático com analgésicos, antitérmicos e descongestionantes nasais. Influenza pandêmica A/H1N1 virus Muitas epidemias foram originadas pelo Influenza A virus. A linhagem H1N1 circulou entre humanos em 1918 e foi o agente etiológico da pandemia conhecida como gripe espanhola. Esse vírus resultou na morte de 20 a 50 milhões de indivíduos em todo o mundo. O novo subtipo do influenza A virus/ H1N1 virus é resultante de uma recombinação genética do vírus suíno, humano e aviário. Em 2009, foi detectado no México, colocando em alerta a saúde pública mundial, pois essa nova cepa rapidamente se disseminou, causando uma pandemia. No Brasil, até o final do ano de 2009, foram detectados aproximadamente 40 mil casos graves e 1705 óbitos registrados. Sua transmissão ocorre diretamente de pessoa para pessoa por meio de gotículas de saliva que são expelidas pelo indivíduo infectado ao falar, tossir e espirrar. O contágio pode ocorrer ainda de maneira indireta, por meio de contato com secreções do indivíduo doente. Nesse caso, as mãos são o principal veículo, ao propiciarem a introdução de partículas virais diretamente nas mucosas oral, nasal e ocular. Clinicamente, a doença inicia-se com a instalação abrupta de febre alta (perdura por três dias), em geral acima de 38 °C, seguida de mialgia, dor de garganta, prostração, cefaleia e tosse seca. É comum a queixa de garganta seca, rouquidão e queimação retroesternal ao tossir, bem como pele quente e 127 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA úmida, olhos hiperemiados e lacrimejantes. Há hiperemia das mucosas, com aumento de secreção nasal hialina. O quadro clínico em adultos sadios pode variar de intensidade. Nas crianças, a temperatura pode atingir níveis mais altos, sendo comum o aumento dos linfonodos cervicais. Quadros de bronquite ou bronquiolite, além de sintomas gastrointestinais, também podem fazer parte da apresentação clínica em crianças. Os idosos quase sempre se apresentam febris, às vezes sem outros sintomas, mas, em geral, a temperatura não atinge níveis tão altos. Coronavírus Os coronavírus pertencem à subfamília Coronavirinae, família Coronaviridae. São grandes vírus com uma única fita de RNA e um nucleocapsídeo (estrutura composta pelo ácido nucleico do vírus – nesse caso, RNA – e seu invólucro proteico, o capsídeo) helicoidal. Seu nome se deve a espículas (estruturas proeminentes) presentes na superfície do vírus, o que lhe dá a aparência de uma coroa solar (corona, em latim). Os coronavírus são responsáveis por desencadearem infecções respiratórias. Entre os problemas mais conhecidos, estão o resfriado comum, a síndrome respiratória aguda grave (também chamada Sars) e a síndrome respiratória do Oriente Médio (também chamada Mers). Além disso, no final do ano de 2019, um novo tipo de coronavírus foi descoberto na China, sendo responsável por uma série de mortes. A seguir, são descritas algumas das principais características das doenças causadas por esse vírus: Resfriado comum: afeta as vias aéreas superiores e pode ser causado por diferentes vírus, incluindo o coronavírus. Geralmente leva a sintomas como obstrução nasal, coriza, espirro e tosse. Normalmente, as pessoas com resfriado não apresentam febre ou apresentam apenas febre baixa. Síndrome respiratória aguda grave (Sars): é muito grave e foi identificada, pela primeira vez, na China em 2002. A infecção teve início após contato com gatos selvagens doentes. Essa doença evoluía de maneira muito rápidapara insuficiência respiratória e foi responsável por causar a morte de cerca de 800 pessoas. A epidemia foi interrompida em 2003, e, desde 2004, nenhum caso da doença foi registrado. Síndrome respiratória do oriente médio (Mers): foi identificada, pela primeira vez, no ano de 2012, na Arábia Saudita. A transmissão iniciou-se após dromedários serem infectados, os quais são importantes reservatórios dos vírus. Até 22 de maio de 2014, 204 mortes já haviam sido confirmadas em decorrência doença. Coronavírus (Sars-CoV-2): foi isolado no dia 7 de janeiro de 2020 e descoberto após uma série de infecções respiratórias sem explicação iniciar-se na China. Até o dia 27 de janeiro de 2020, 80 mortes já haviam sido confirmadas em decorrência da doença. A principal suspeita é que a infecção pelo novo coronavírus tenha sido iniciada pelo consumo de carne de animais como cobras e morcegos. 128 Unidade III Saiba mais Em janeiro de 2020, foi identificada na China uma nova cepa de coronavírus, formalmente designada coronavírus 2 da síndrome respiratória aguda grave (Sars-CoV-2), causadora da doença denominada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como covid-19. Tornou-se, portanto, urgente compreender e implementar as práticas recomendadas para o diagnóstico laboratorial do Sars-CoV-2 em todo Brasil, e isso inclui, entre outras palavras, conhecer aspectos relacionados com a coleta de amostras, a biossegurança no transporte e no manuseio de amostras clínicas que possam conter o Sars-CoV-2, bem como os testes recomendados em cada situação ou caso suspeito. Leia: PINHO, J. et al. Diagnóstico laboratorial da infecção pelo novo coronavírus (covid-19) posicionamento oficial da sociedade brasileira de patologia clínica/medicina laboratorial (SBPC/ML). Sociedade Brasileira de Patologia Clínica, [s.d.]. Disponível em: https://bit.ly/3w53kwU. Acesso em: 1º jul. 2021. Varicela (catapora) – vírus da varicela-zoster (HHV-3) O agente etiológico da varicela (catapora) e do herpes-zoster é o Human herpesvirus 3. Na catapora, as células da pele tornam-se os principais sítios para a replicação viral. Surgem as lesões de característica maculopapular, as quais evoluem para vesículas e, depois, para ulcerações e necrose da derme. Os sintomas de febre, mal-estar, cefaleia e dor abdominal frequentemente ocorrem por 24 a 48 horas antes do aparecimento do exantema. Sintomas como febre, irritabilidade, letargia e perda de apetite são comuns e tendem a desaparecer nas primeiras 72 horas após aparecimento do exantema. O exantema se inicia na face ou tronco e gera um prurido intenso. Após 24 a 48 horas, o fluido vesicular torna-se turvo e as crostas aparecem. Lesões da orofaringe, conjuntiva e vagina são comuns. Lesões novas aparecem por até 6 dias e a varicela subclínica é muito rara. A reativação apresenta-se tipicamente como herpes-zoster, um exantema vesicular em geral confinado à distribuição de um ou mais nervos sensoriais. Em indivíduos imunocomprometidos, o exantema é, em geral, mais extenso, e a replicação cutânea é acompanhada por viremia. Novas lesões aparecem por até 7 dias. Doença exantemática (rubéola) – vírus da rubéola O vírus é transmitido principalmente por partículas geradas por pessoas infectadas, podendo ser detectado em secreções nasofaríngeas de 7 a 14 dias após o aparecimento do exantema. 129 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA O início da infecção se dá em células epiteliais do trato respiratório superior, posteriormente alcançando o tecido linfoide da nasofaringe, de onde há disseminação sistêmica envolvendo vários órgãos. O período de incubação varia em média de 8 a 14 dias. O exantema surge em média 16 a 18 dias depois do início da infecção, é de característica bastante benigna, aparecendo inicialmente na face e rapidamente se disseminando para o tronco e extremidades distais. As complicações mais comuns incluem artrite, artralgia, encefalopatia e trombocitopenia. Em gestantes, é temida por sua capacidade de causar má-formação, sendo preconizados, durante o período pré-natal, exames sorológicos para avaliação do status sorológico e monitoração das pacientes susceptíveis. Em recém-nascidos, é reconhecidamente a maior causa de surdez não genética. Hepatite infecciosa do tipo A – vírus da hepatite A (HVA) Sabe-se que o HVA se instala primariamente no fígado, utilizando o aparelho digestivo como via de entrada, sem causar lesão local. A hepatite A é transmitida pela via fecal-oral, e os alimentos e as águas contaminados são os principais veículos de transmissão durante os períodos de epidemias. Nos ambientes familiares e institucionais, o contato pessoal íntimo pode facilitar o contágio, sobretudo pelo compartilhamento de copos e talheres. A transmissão por via parenteral, sob a forma de transfusão ou uso de fármacos, ainda que teoricamente possível, não tem sido verificada. Os pacientes infectados são transmissores da doença por um período que varia de 2 a 3 semanas antes do aparecimento da icterícia, amarelamento típico da pele e das mucosas, característico de infecções hepáticas, até duas semanas após a regressão desse sintoma. A fase ictérica é acompanhada pelo aparecimento de urina escura e fezes descoloradas, manifestações claras de excesso de bilirrubina não conjugada na circulação sanguínea (bilirrubinemia). Essa fase inicia-se após até 10 dias depois do aparecimento dos sintomas iniciais. A doença é mais leve em crianças do que em adultos, e a recuperação em geral é completa, não se observando casos de infecção crônica. Hepatite infecciosa do tipo B – vírus da hepatite B (HBV) A infecção pelo vírus da hepatite B pode resultar em diversas patologias. Mais de 65% a 80% das infecções ocorrem de forma subclínica; 20% a 35% ocorrem na forma de doença com icterícia. Dos indivíduos infectados, 90% a 98% têm recuperação completa e 2% a 10% evoluem para doença crônica. Quanto menor for a idade do paciente infectado, maior a probabilidade de desenvolvimento de infecção crônica. O vírus da hepatite B pode ser transmitido de 3 formas: por meio de contato percutâneo com sangue ou produtos de sangue infectados; através de contato sexual; ou por transmissão perinatal da mãe infectada para a criança. Os pacientes infectados de forma crônica apresentam maior chance de desenvolver situações mais graves, como o carcinoma hepatocelular. A taxa de sobrevivência varia em torno de 25% a 60%, dependendo do tamanho do tumor e da sua possibilidade de remoção. 130 Unidade III Hepatite infecciosa do tipo C – vírus da hepatite C (HCV) O vírus da hepatite C (HCV) é transmitido quase que exclusivamente pela exposição parenteral a sangue, produtos de sangue e objetos contaminados com sangue. A triagem de doadores de sangue quase eliminou a transmissão por essa via, embora o risco mais importante atualmente seja a contaminação de seringas compartilhadas por usuários de fármacos injetáveis. A transmissão sexual e a perinatal já foram encontradas, mas não parecem ser vias de transmissão comuns. No entanto, importante ressaltar que a prevenção com uso de preservativos e os exames pré-natais podem constituir um grande obstáculo à manutenção desse vírus por essas formas de transmissão, e por isso precisam ser constantemente divulgadas e reforçadas. O período ou fase de incubação da hepatite C ocorre em média de 7 semanas. As infecções podem variar desde subclínicas até fulminantes. Os sintomas clínicos são semelhantes aos das demais hepatites virais, mas raramente ocorrem em mais de um terço dos pacientes. Observação Conhecer as características dos vírus, sobretudo das hepatites A, B e C, auxilia e muito no diagnóstico imunológico dessas infecções, sobretudo no que envolve a caracterização da fase de doença. Retrovírus – síndrome da imunodeficiência adquirida (aids/HIV) A aids é causada pelo HIV (Human immunodeficiency virus) e é transmitida por meio de relações sexuais, sangue contaminado (pelo uso de agulhas e seringas contaminadase transfusão sanguínea) e transmissão vertical da mãe para o feto. Há comprometimento da resposta imunológica do organismo infectado, deixando-o desprotegido e suscetível ao desenvolvimento de múltiplas infecções. Diversas características favorecem a propagação do vírus da aids, como o fato de o indivíduo infectado não ficar doente logo no início da contaminação, ou seja, há um período de latência muito grande, variando em média de 2 a 7 anos. A pessoa, por algum tempo, pode ter o vírus sem produzir anticorpos detectáveis pelo exame (janela imunológica). É importante ressaltar que não há evidências de transmissão da aids por meio de fluidos corporais, como saliva, lágrimas e suor; objetos ou ambientes como piscina, sanitários, sabonetes, pratos, talheres e copos; contato pessoal como aperto de mão, abraços e beijos; picadas de insetos como mosquitos e pernilongos. A infecção aguda pode ser tão discreta a ponto de se confundir com um simples processo gripal ou adquirir dimensões mais graves, como alterações neurológicas. Após os sintomas iniciais, o portador do HIV costuma permanecer assintomático durante vários anos. Porém, em 5 anos, em média, começam a surgir os primeiros sinais e sintomas. Observa-se, então, o aumento generalizado dos linfonodos, 131 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA episódios de febre, sudorese, emagrecimento e diarreia, que podem durar de semanas a meses. O aparecimento das conhecidas infecções oportunistas ou de neoplasias costuma ocorrer em estágios mais avançados da doença. No entanto, as infecções oportunistas podem ser as primeiras manifestações clínicas do estado. O diagnóstico baseia-se na história clínica e na sorologia específica anti-HIV (Elisa e western blot). Até o momento, não foi descoberto nenhum medicamento que proporcione cura da doença; o tratamento preconizado por meio do uso de vários fármacos apenas prolonga a vida do doente. Parvovírus O parvovírus é responsável por infecções de vários animais, incluindo cães, raposas, suínos e outros. O Erythrovirus B19, antes descrito como Parvovirus B19, recebeu esse nome por seu tropismo pelas células eritropoéticas. Esse é o mais estudado, por estar associado, em humanos, a doenças como o eritema infeccioso, a artropatia e a crise aplásica. A disseminação do vírus ocorre pelas fezes, urina, saliva, secreções nasais e provavelmente por contato com fluidos genitais. Saiba mais O Parvovirus B19 é um Erythrovirus humano com tropismo para as células progenitoras da medula óssea, sendo responsável por um grande espectro de manifestações clínicas, desde infecções assintomáticas até crises aplásicas graves. No artigo, recomendado a seguir, os autores apresentam o caso de uma mulher de 40 anos, com história de anemia ferropênica por menorragias, que desenvolveu quadro clínico com febre, cefaleias, petéquias e, posteriormente, exantema nas pernas, associado à hipoplasia medular com redução transitória da contagem de todas as linhagens celulares hematológicas. Leia: AGUDO, I. et al. Aplasia medular transitória associada a infecção por Parvovírus B19. Rev. Soc. Bras. Clin. Med., v. 14, n. 3, jul.-set. 2016. Disponível em: https://bit.ly/36kYcuh. Acesso em: 1º jul. 2021. Papilomavírus A família Papillomaviridae é constituída pelos 16 gêneros, incluindo centenas de tipos virais. O papilomavírus humano (HPV) é o mais conhecido, sendo o causador de tumores benignos e malignos de pele e das mucosas. O desenvolvimento desses tumores depende de vários fatores, como tabagismo, alcoolismo, múltiplos parceiros sexuais, início precoce da vida sexual e gravidez, principalmente antes dos 18 anos. 132 Unidade III A transmissão do HPV ocorre, na maioria dos casos, pelo contato sexual, não precisando necessariamente haver a penetração, mas apenas com um contato íntimo. Outras formas de contágio, menos frequentes, podem ocorrer pelo uso de instrumentos ginecológicos não esterilizados, compartilhamento de roupas íntimas contaminadas, entre outros. O diagnóstico pode ser feito por meio de exame clínico e laboratorial, como papanicolau, colposcopia e biópsia das lesões suspeitas. Métodos moleculares, como a PCR, são os mais adequados para a caracterização dos sorotipos virais. Poliomavírus Os poliomavírus humanos, BKV e JCV, são os membros do gênero poliomavírus. As infecções primárias por esses vírus ocorrem principalmente na infância e são geralmente assintomáticas. Os vírus podem persistir após a infecção primária na forma latente em vários órgãos, especialmente nos rins. Em pacientes com deficiência imunológica, associada principalmente à aids, esses vírus podem ser reativados e causar algumas doenças. A reativação do BKV acarreta doenças do trato urinário, como a cistite hemorrágica e outras nefrites, enquanto a reativação do JCV leva a leucoencefalopatia multifocal progressiva. Herpesvírus São vírus extremamente infecciosos, porém de característica normalmente benigna. Estima-se que 97% da população mundial já tenha tido contato com esse vírus, e uma grande parte não apresentou sintomas. Alguns vírus dessa família podem apresentar neurotropismo, levando ao desenvolvimento de encefalites; outros, são linfotrópicos, ou seja, possuem afinidade pelos linfócitos, o que pode desencadear distúrbios do sistema imunológico causando graves infecções em pacientes imunodeprimidos ou suprimidos, como pacientes com aids e transplantados de órgãos e ou de tecidos. São descritos oito tipos de vírus herpes subdivididos em famílias, como descrito a seguir: As subfamílias de herpesvirus são: • Alfa-herpes-virus: — Herpes simplex vírus 1 e 2 (HSV-1 e HSV-2): causadores da doença vulgarmente conhecida por herpes. — Vírus da Varicela-zoster (HHV-3, Human herpesvirus 3): também conhecido por catapora-zoster no Brasil (ver herpes-zoster). • Beta-herpes-virus: — Citomegalovirus (ou HCMV, Human citomegalovirus, ou HHV-5, Human Herpesvirus 5): causa um tipo de mononucleose infecciosa. — Herpesvirus 6 e 7 (HHV-6 e HHV-7, Human herpesvirus 6 e 7): causa da doença infantil infecciosa roséola. 133 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA • Gama-herpes-virus: — Epstein-Barr virus (HHV-4): causa a doença do beijo ou mononucleose infecciosa. Envolvido na patogênese de alguns cancros, como o linfoma de Burkitt e carcinoma de nasofaringe. — Herpesvírus-8 (HHV-8, Human herpesvirus 8, ou KSHV, Kaposi’s Sarcoma-associated Herpesvirus): vírus que pode causar sarcoma de Kaposi (hemangiossarcoma, ou seja, tumor maligno de vasos sanguíneos). Flavivirus A família Flaviviridae é composta por três gêneros: Hepacivirus, Pestivirus e Flavivirus. O primeiro gênero tem como única espécie, até hoje identificada, o vírus da Hepatite C. O segundo agrupa os vírus que infectam mamíferos nos humanos, com destaque para os 187 vírus da diarreia bovina e o vírus da peste suína. Entre eles, o vírus da febre amarela, o grupo do Dengue virus (DENV), o grupo do Mammalian tick-borne virus (TBEV), o grupo do Aroa virus (AROAV) e o grupo do Japanese encephalitis virus (JEV). Os vírus dessa família possuem como ácido nucleico o RNA de cadeia linear simples, polaridade positiva e comprimento médio entre 9,5 a 12,3 kd. Apresentam capsídeo icosaedro, o que lhes confere um aspecto esférico, recoberto pelo envelope. E as partículas virais possuem um diâmetro com cerca de 40 a 60 nm. Os representantes dessa família são considerados arbovírus, pois possuem artrópodes como vetor. A palavra arbovírus é de origem inglesa, arthropod-borne virus, que significa vírus carregado por um artrópode. Os vírus ficam, então, armazenados no vetor e por vezes proliferam sem causar danos. Duas espécies dessa família representam um grande problema de saúde pública no Brasil, o vírus da dengue e o vírus da febre amarela. Paramixovírus Das doenças causadas pelos vírus dessa família, o sarampo constitui uma das mais estudadas e importantes. Essa doença pode causar três formas de encefalite: infecção direta dos neurônios;encefalite pós-infecção, que se acredita ser mediada imunologicamente; e pan-encefalite esclerosante subaguda (SSPE), causada por uma variante defectiva do vírus durante a fase aguda da doença. O vírus SSPE age lentamente e causa sintomas e efeitos citopáticos em neurônios, muitos anos após a fase aguda da doença. O vírus pode ser transmitido desde 5 dias antes, até 4 ou 5 dias depois de as lesões de pele (manchas vermelhas), características da doença, aparecerem. O período de maior transmissibilidade ocorre 48 horas antes e até 48 horas depois do início dessa manifestação da pele. Os sintomas geralmente se manifestam após cerca de 10 dias da infecção. A essa altura, a pessoa poderá apresentar: coriza; tosse; febre ascendente – a cada dia que passa, as temperaturas são mais altas –; conjuntivite; manchas vermelhas – alguns dias depois, aparecem os exantemas ou rash (grosseirão com manchas vermelhas). Eles se espalham por todo o corpo, e começam a partir da parte de trás das 134 Unidade III orelhas e pescoço para, depois, avançarem para os membros superiores e inferiores (braços e pernas) e o abdomen. Essa fase pode durar 3, 4, 5 dias, mesmo período em que a febre começa a abrandar. 7.2 Prevenção de doenças virais – vacinas e drogas antivirais A prevenção de infecções virais não é, em absoluto, uma tarefa fácil, visto que, reconhecidamente, o único método seguro de evitar a infecção viral é evitar a exposição. No entanto, sabe-se que tanto em populações humanas como em animais, a exposição aos diferentes tipos de vírus é um fato que estatisticamente e epidemiologicamente não se consegue evitar. Diante do que conhecemos sobre epidemiologia de infecções virais, sabe-se que a única forma efetiva de se evitar a doença viral, sobretudo a doença grave, é a vacinação, e, para tanto, vacinas são desenvolvidas no mundo todo e sobretudo no Brasil, a fim de garantir essa proteção. Como dito, em algumas situações, a ocorrência de doença pode ser prevenida por meio de vacinação. Embora a vacinação não necessariamente previna a infecção, a sensibilização prévia do sistema imunológico permite uma resposta rápida à eliminação do vírus, antes que a doença ocorra ou faz com que a doença seja leve de curta duração. De fato, a vacinação é o método mais efetivo e com melhor relação custo-benefício. As vacinas precisam ser seguras e, para isso, não devem causar doença nem morte do indivíduo vacinado. As vacinas devem proteger contra a doença, resultante da exposição ao vírus, e a proteção deve durar muitos anos. As vacinas devem, como forma de comprovar sua eficácia, induzir a formação de anticorpos neutralizantes essenciais para prevenir infecção. Além de tudo, as vacinas ainda devem ser de baixo custo, alta estabilidade, fácil administração e provocar nenhum ou poucos efeitos adversos. As vacinas podem ser produzidas a partir de antígenos mortos ou inativados. Antígenos atenuados, subunidades ou, hoje e mais atual, a partir das tecnologias de DNA recombinante e de vacina vetorial. Vacinas inativadas normalmente requerem mais de uma dose para induzir imunidade, e revacinações periódicas para manter imunidade adequada. As vacinas inativadas geralmente induzem imunidade que é menos protetiva e de duração mais curta que aquela induzida pelas vacinas vivas atenuadas. As vantagens das vacinas inativadas: não revertem à virulência e são consideradas mais seguras, com menor possibilidade de efeitos adversos. Um exemplo bastante atual é a vacina para Sars-CoV-2, denominada de CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica de origem chinesa Sinovac. Vacinas vivas modificadas consistem, por exemplo, de vírus tornados menos virulentos, por processos clássicos de atenuação em cultura celular, por múltiplas passagens em diferentes tipos celulares, ovos embrionados, animais de laboratório ou por alteração da expressão genômica pela deleção de genes específicos responsáveis pela virulência. Vacinas atenuadas geralmente conferem longa imunidade, pois a vacinação mimetiza a infecção natural. Uma vacina adequadamente atenuada não deve causar doença, apesar da possibilidade de efeitos adversos. Algumas vacinas vivas atenuadas podem ser administradas pelas vias oral, nasal ou genital (prepucial, vaginal), onde irão induzir resposta humoral secretória local (IgA). 135 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA As vacinas de subunidade são um tipo de vacina inativada que contêm porções (proteínas, fragmentos) do vírus, necessários para induzir imunidade. Tais porções são conhecidas por serem de alto peso molecular e alta complexidade, tendo a condição de estimular de forma adequada uma resposta imune, segura e duradoura. Um exemplo é a vacina contra o tétano. As vacinas recombinantes podem ser divididas em três tipos principais; as produzidas a partir de proteínas recombinantes, nas quais o gene do antígeno viral de interesse é clonado e o cDNA é introduzido no genoma de bactérias ou leveduras por meio de um plasmídeo, que produz a proteína em grandes quantidades, sendo esse antígeno posteriormente utilizado como agente imunizante. As vacinas vetoriais são aquelas em que o gene de um vírus grande, geralmente um poxvírus, adenovírus ou herpesvírus, é deletado e substituído por um gene que codifica o antígeno desejado; o vírus que carrega o gene do antígeno desejado é chamado de vetor. Um exemplo bastante recente dessa tecnologia é a produção e distribuição de vacinas para a prevenção do Sars-CoV-2, as quais utilizam um adenovírus como vetor, sendo elas a vacina da Oxford/AstraZeneca, a da Janssen e a vacina Sputnik V, do Instituto Gamaleya da Rússia. As vacinas com deleções de genes são aquelas em que um vírus com alto potencial de virulência é modificado a um status menos virulento pela deleção de genes ou pela substituição de regiões-chave nos genes com outro material genético. Várias vacinas recombinantes estão sendo usadas, incluindo a proteína do vírus da hepatite B expressa em levedura; proteína do vírus da raiva expressa no vírus da vaccínia. As drogas antivirais são uma alternativa extremamente importante, sobretudo quando o paciente se encontra em uma condição em que requer tratamento efetivo e ostensivo. Vários aspectos sobre a terapia antiviral acabaram por ser revisitados e muitos conceitos novos, assim como novos medicamentos surgiram com o incremento da terapia, sobretudo em pacientes HIV soropositivos, um exemplo do quão eficaz pode ser um tratamento e o quanto isso altera de forma significativa o curso de uma doença. As drogas antivirais podem ser classificadas em duas categorias principais, de acordo com o seu mecanismo de ação. Conhecidas como análogas de nucleosídeos e não análogas de nucleosídeos, cujas principais características e diferenças serão discutidas a seguir. • Nucleosídeos inibidores: várias drogas antivirais comerciais são análogas de bases/nucleosídeos, que interferem com a ação das polimerases de ácido nucleico virais. Os mais comuns são: acicloguanosina (Aciclovir), di-hidroxipropoximetilguanina (Ganciclovir), adenina arabinosida (Vidarabine) e azidotimidina (Zidovudine). • Inibidores não nucleosídeos: interferons e drogas antivirais têm sido utilizados para o tratamento de algumas infecções virais específicas. Os interferons possuem função antiviral importante, pois aparecem cedo na infecção e desempenham um papel importante na recuperação. O mecanismo de ação é a inibição da síntese de proteínas virais. Além dos interferons (IFN), outras drogas que inibem a tradução de RNAm virais são a fomiversina e metisazona. A fomiversina (Vitravene) é uma molécula de DNA antissentido que bloqueia a replicação do citomegalovírus. A metisazona (N-metil-beta-tiosemicarbazone) é específica para RNAm dos poxvírus. A amantadina (Symmetrel) e rimantadina (Flumadine) interferem com a penetração e/ou desnudamento de alguns vírus envelopados, mas é eficaz apenas contra o vírus da influenza A em humanos. Essasdrogas 136 Unidade III não são comumente utilizadas nos EUA. Saquinavir (Invirase), indinavir (Crixivan), ritonavir (Norvir) e nelfinavir (Viracept) são inibidores de proteases virais. Elas atuam ligando-se no sítio ativo das proteases, impedindo a enzima de clivar outras proteínas. Essas drogas são frequentemente utilizadas como parte do coquetel de drogas no tratamento do HIV em humanos. Zanamivir (Relenza) e oseltamivir (Tamiflu) inibem a liberação do vírus das células hospedeiras. São específicos para a proteína neuraminidase do vírus da influenza; impedem a liberação do vírus e, portanto, limitam sua disseminação. Um exemplo importante e eficaz de terapia antiviral foi aquela instituída a partir de 1997, denominada de Haart (terapia antirretroviral de alta atividade) para tratamento de pacientes infectados pelo vírus HIV. A Haart, desde sua introdução, mostrou que consegue promover uma redução da carga viral e imunossupressão, diminui transmissão perinatal e aumenta a sobrevivência. A Haart consiste em um “coquetel” de medicamentos que atuam em diferentes etapas da replicação viral, portanto, esse coquetel é formado por drogas inibidoras da fusão e entrada do vírus nas células-alvo, inibidores de transcriptase reversa, inibidores de integrase, inibidores de protease e inibidores da zinc-finger. Lembrete Os fármacos antivirais atuam interrompendo o processo infeccioso. Dependendo do vírus e do medicamento, o processo de bloqueio pode ocorrer em muitos locais diferentes. Às vezes, são usados vários medicamentos para tratar uma infecção específica, para que mais de um processo viral seja interrompido e as chances de o paciente recuperar-se da infecção aumentem Saiba mais A síndrome da imunodeficiência adquirida (aids, sigla em inglês) é causada por infecção pelo retrovírus vírus da imunodeficiência humana (HIV). Uma etapa-chave no ciclo de vida do HIV é a síntese de uma cópia em DNA do RNA do genoma viral, catalisada por uma enzima chamada transcriptase reversa. A transcriptase reversa é um importante alvo terapêutico, pois não é essencial para as células normais e não faz revisão, portanto, sua taxa de erro é muito maior do que a das DNA polimerases celulares. Em função disso, há um aumento do número de mutantes na população viral em um mesmo paciente. É provável que alguns desses mutantes sejam resistentes a um dado agente terapêutico. Desde a introdução da terapia antirretroviral altamente ativa (Haart) em 1996, tem-se observado em todo o mundo mudanças nas causas de hospitalização em pacientes com HIV/aids. Sobre o assunto, leia: NUNES, A. Análise do perfil de pacientes com HIV/aids hospitalizados após introdução da terapia antirretroviral (Haart). Ciênc. saúde colet., v. 20, n. 10, out. 2015. 137 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA 8 DIAGNÓSTICO DE INFECÇÕES VIRAIS Para o diagnóstico de infecções virais, podemos utilizar de diferentes metodologias, algumas consideradas clássicas ou já em desuso, e outras consideradas técnicas modernas, como as de biologia molecular. Para que se tenha uma percepção clara do que envolve o diagnóstico de infecções virais a seguir, discutiremos as principais técnicas utilizadas, dividindo-as em técnicas clássicas, sorológicas e moleculares. Porém, antes de discutirmos sobre as principais técnicas aplicadas ao diagnóstico virológico, é importante compreendermos algumas problemáticas que envolvem as infecções virais e seu diagnóstico. Note, a seguir, os cinco princípios das doenças virais: I – Muitas infecções virais são subclínicas. II – A mesma doença pode ser produzida por uma variedade de vírus. III – O mesmo vírus pode provocar uma variedade de doenças. IV – A doença produzida não tem relação com a morfologia viral. V – A evolução de qualquer caso é determinada pela constituição genética do vírus e do hospedeiro. Ao analisarmos esses cinco princípios, compreendemos que grande parte das infecções é assintomática, o que, de antemão, propõe-nos uma maior dificuldade em estabelecer diagnóstico em situações em que nem sequer existem sintomas. Também importante salientar que, em grande parte, as chamadas viroses podem não ser viroses, sugerindo, por vezes, diagnóstico errôneo do corpo clínico. Outra questão bastante importante é que diferentes vírus podem causar uma mesma doença, e um vírus pode causar diferentes doenças, aumentando ainda mais a possibilidade de erro no diagnóstico. Outras questões também devem ser observadas quando do diagnóstico de uma infecção viral, e que norteiam, sobretudo, a escolha dos métodos que serão utilizados, a saber: • Podem ocorrer infecções duplas. • Diferentes vírus podem ter a mesma ocorrência sazonal e geográfica. • Pode ocorrer infecção inaparente por um vírus e clínica por outro. • Muitos vírus são facilmente isolados durante os primeiros dias da doença. Observação O conhecimento sobre as questões que envolvem o quadro clínico do paciente é essencial para que o profissional de laboratório possa escolher os métodos que serão utilizados, a fim de diagnosticar uma possível infecção viral. 138 Unidade III 8.1 Técnicas clássicas em virologia Cultivo e isolamento viral Para o isolamento, caracterização, identificação e até mesmo com o objetivo de alcançar a produção de vacinas, uma considerável quantidade de partículas virais é normalmente necessária; assim também a capacidade do isolamento de um vírus a partir de uma material biológico requer grande trabalho e procedimentos bem estabelecidos. Tudo isso pode ser obtido por meio de técnicas de propagação, entre as quais podemos destacar a inoculação em animais, inoculação em ovos embrionados, cultura de células e tecidos e cultivo de explante. A inoculação de animais, durante muito tempo, foi a única maneira de se obterem grandes quantidades de vírus. Atualmente, o uso de animais para multiplicação de vírus é limitado, devido a questões éticas. Somente são utilizados animais para a amplificação viral para aqueles vírus que apresentam dificuldade de adaptação ao cultivo celular in vitro. A inoculação de ovos embrionados foi umas das primeiras alternativas na qual não se utilizava animais, sendo um método amplamente utilizado para a propagação de vírus influenza tipo A e produção de vacinas, visando, sobretudo, a atenuação de vírus, em que a constante passagem por ovos embrionados promove uma alteração dos fatores de virulência, sendo, portanto, utilizadas nas vacinas vivas atenuadas, como no caso da vacina da gripe. A cultura de células e tecidos refere-se ao crescimento e manutenção de células e tecidos vivos in vitro. Existem dois tipos básicos: cultivo de explante e cultivo celular. Cultivo de explantes são pequenos fragmentos de tecidos oriundos do hospedeiro e mantidos em cultivo, enquanto que o cultivo celular é resultado da dissociação do tecido em células individuais, seguido de sua manutenção em cultivo. O cultivo de células utiliza-se de diferentes linhagens celulares especificas como hep, hela, fibroblasto humano, rim de macaco-rhesus ou células Vero (rim de macaco verde africano). Essas células devem ser de fácil manutenção, a fim de propiciar uma utilização continua. A existência de um vírus em uma cultura celular é notada pela presença de efeitos citopáticos característicos (lise, necrose, inclusões, vacuolização, sincícios); aparecimento de proteínas codificadas por vírus, por exemplo, pp64 (CMV). Visualização e caracterização da partícula viral Os dois métodos mais utilizados para visualizar a estrutura e morfologia dos vírus são a microscopia eletrônica e microscopia de força atômica. Outros tipos de microscopia são empregados para observar as alterações celulares induzidas pela replicação viral. Sem as técnicas de visualização dos vírus, existe uma dificuldade muito grande em se estudar a estrutura ou a interação vírus-célula. A capacidade de visualização das partículas permitiu estimar o número de partículas presentes em uma suspensão. Alguns métodospermitem quantificar o número de partículas presentes em uma solução de forma indireta. Em ambos os casos, direta ou indireta, a quantificação é sempre uma estimativa. A estimativa é importante na preparação de vacinas, na determinação do número mínimo para produção de doença ou em investigação viral. 139 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Com o uso da microscopia óptica comum, não é possível a observação das partículas virais. No entanto, pode-se observar a formação de efeitos citopáticos característicos da presença de vírus em células cultivadas e mantidas em laboratório. Os efeitos citopáticos observáveis quando em cultura normalmente incluem: I – Arredondamento celular e agregados semelhantes a cachos de uva. Exemplo: adenovírus. II – Arredondamento celular, retração celular, ruptura com a liberação de debris celulares. Exemplo: enterovírus. III – Entumecimento e arredondamento celular em áreas localizadas. Exemplo: herpesvirus. IV – Fusão de várias células e formação de células gigantes multinucleadas (sincício). Exemplo: paramixovírus. Adicionalmente, a formação de corpúsculos de inclusão pode ser observada, sendo características de alguns vírus, como no caso do vírus da raiva ou na citomegalovirose. Figura 67 – Efeito citopático do sarampo em caso de encefalite: note células grandes e arredondadas Fonte: https://bit.ly/2Ultdes. Acesso em: 1º julho 2021. A microscopia de fluorescência pode ser utilizada para a visualização de células ou tecidos infectados por vírus. Nesse caso, empregam-se anticorpos específicos para determinados antígenos, normalmente associados a um fluorocromo (geralmente fluoresceína). Figura 68 – Imunofluorescência positiva para a presença de vírus Fonte: UFRN (s.d.). 140 Unidade III A microscopia eletrônica emprega a aceleração dos elétrons com grande energia magnética, tornando possível a visualização da amostra. Os elétrons com alta energia possuem comprimentos de ondas curtos, e isso faz com se obtenha uma melhor resolução de estruturas muito pequenas. A microscopia eletrônica possui resolução capaz de se visualizarem grandes polímeros, como DNA, RNA e grandes proteínas. Para facilitar a visualização, as amostras podem ser previamente tratadas com metais pesados, como o ósmio. Os elétrons chocam com o metal, os quais são visualizados na tela fluorescente. Com microscopia eletrônica, é possível a obtenção de imagens tridimensionais dos vírus e de sua localização dentro da célula hospedeira (núcleo ou citoplasma) em um determinado momento após a infeção. Como as amostras são tratadas com metais pesados, a observação dos vírus em células vivas não é possível. Figura 69 – Microscopia eletrônica do coronavírus Disponível em: https://bit.ly/3xef95b. Acesso em: 1º jul. 2021. Adaptada. A microscopia de atômica de força mede a propriedades locais (tamanho, absorção, magnetismo etc.) mediante a proximidade da sonda com a amostra. Isso faz com que seja possível medir pequenas áreas da amostra. Os elétrons são impulsionados entre os átomos, resultando em uma pequena, mas mensurável, força. O resultado da força medida é transformado no contorno da superfície da estrutura analisada. A vantagem da microscopia atômica de força é o uso de células ou tecidos vivos e de requerer uma quantidade mínima de amostra. Esse método tem sido útil para imagens detalhadas de estruturas de capsídeos e de interações entre o vírus e a célula. 141 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA 8.2 Técnicas moleculares em virologia Reação de polimerização em cadeia (PCR) A reação em cadeia da polimerase (PCR – polimerase chain reaction) é considerada uma técnica de biologia molecular revolucionária. Desenvolvida por Kary Banks Mullis (prêmio Nobel de química de 1993) em abril de 1983, essa técnica consiste na síntese enzimática de cópias de ácidos nucleicos. A PCR apresenta ampla gama de aplicações em vários ramos da pesquisa científica e diagnóstico e é muito utilizada no diagnóstico de infecções virais. A utilização da PCR permite que uma determinada região do genoma de qualquer organismo possa ser amplificada e multiplicada em milhões de cópias. Os elementos envolvidos na reação de PCR, basicamente, são os mesmos presentes no processo de replicação que ocorre nas células. Para que seja possível o processo de amplificação de um segmento de DNA especifico, é necessário que as extremidades da sequência de pares de bases sejam conhecidas. Os iniciadores (ou primers), que delimitam e são complementares à região alvo de amplificação, apresentam cerca de 15 a 25 nucleotídeos de extensão. Os primers são projetados de modo que um é complementar ao filamento de uma molécula de DNA em um lado da sequência alvo, e o outro é complementar ao outro filamento da molécula de DNA no lado oposto da sequência alvo. Para que ocorra a PCR, é necessária a presença dos seguintes componentes: DNA genômico total ou uma população de cena, DNA polimerase termoestável, primers, tampão (10 mm Tris-Hl, pH 8,3, 50 mm kcal), cloreto de magnésio (cofator da reação) e nucleotídeos necessários para a síntese das novas fitas de DNA (dNTPs: dATPs, dTTPs, dCTPs e dGTPs). Durante o procedimento, as amostras devem ser submetidas à combinação adequada de temperatura e de tempo. Cada ciclo da PCR apresenta três fases fundamentais: desnaturação, anulamento e extensão. A desnaturação ocorre por meio da elevação da temperatura para cerca de 94 a 95 °C. Nessa fase, o DNA perde sua estrutura de dupla hélice, separando as duas fitas. Dessa forma, o DNA e os primers podem se ligar à região complementar a sua sequência na fita simples que foi exposta. Uma vez desnaturado o DNA, a temperatura da reação é reduzida para a temperatura de anulamento (50 a 70 °C), e ocorre o pareamento dos primers por meio de ligações de hidrogênio ao DNA alvo de fita simples. A temperatura de anulamento é sempre específica para cada par de primers e depende da quantidade de citosina e guanina da sequência a ser amplificada. A última etapa do processo é a extensão. Nesse momento, a temperatura é elevada até cerca de 72 ºC, para que a enzima DNA polimerase (Taq-DNA-polimerase) se posicione junto dos primers que se anelaram anteriormente e seja iniciada a síntese da cadeia complementar. A síntese da nova fita de DNA se inicia a partir dos primers ou iniciadores. A enzima DNA polimerase catalisa a reação que insere os nucleotídeos (dNTPs) complementares à fita-molde. Dessa maneira, novas fitas de DNA de dupla hélice são formadas, correspondentes à região alvo de amplificação (delimitada pelos primers). A figura a seguir esquematiza as etapas de um ciclo da PCR. 142 Unidade III Primeiro ciclo de amplificação Produtos do primeiro ciclo + DNA - polimerase + dATP + dGTP + dCTP + dTTP Etapa 3 Síntese de DNA Região do DNA de fita dupla a ser amplificada 5’ 5’ 5’ 3’ 3’ 3’ 3’ 3’ 3’ 5’ 5’ 5’ Etapa 1 Aquecer para separar as fitas Etapa 2 Resfriar para anelar os iniciadores Par de iniciadores Figura 70 – Ciclo de PCR. Cada ciclo da PCR inclui três etapas: o DNA de fita dupla é aquecido brevemente para separar as duas fitas; o DNA é exposto a uma quantidade excessiva de um par de iniciadores específicos projetados para limitar a região do DNA a ser amplificada – e a amostra é resfriada para permitir que os iniciadores hibridizem com as sequências complementares nas duas fitas de DNA; essa mistura é incubada com DNA-polimerase, de modo que o DNA possa ser sintetizado a partir dos dois iniciadores. Para amplificar o DNA, o ciclo é repetido muitas vezes por meio do reaquecimento da amostra para separar as fitas de DNA recém-sintetizadas O processo de desnaturação, anulamento e extensão é repetido várias vezes, até que se obtenha grande quantidade do DNA a ser amplificado. Os filamentos de DNA recém-sintetizados, mesmo complementares, formam uma segunda cópia da sequência alvo original, gerando, assim, uma amplificação exponencial (2, 4, 8, 16, 32… cópias).A PCR é uma reação em cadeia, pois as fitas de DNA, recentemente sintetizadas, atuarão como molde para mais uma síntese de DNA nos ciclos subsequentes. Após cerca de 25 ciclos de síntese de DNA, os produtos da PCR incluem, além do DNA que iniciou a reação, cerca de 105 cópias da sequência alvo especifica. Na PCR convencional, para visualização do produto da reação, também chamado de amplicon, é necessário realizar uma eletroforese, e os resultados são qualitativos. Além da análise do DNA, pequenas amostras de RNA podem ser analisadas pela reação em cadeia da polimerase. Nesse caso, é utilizada a RT-PCR, uma reação da transcriptase reversa seguida de PCR. A partir do RNA (fita simples), a enzima transcriptase reversa sintetiza uma cadeia de DNA complementar (chamada de cDNA). Ao cDNA, aplica-se a técnica de PCR. Uma vez que analisa o RNA responsável pela síntese de proteínas, a RT-PCR é amplamente utilizada para verificar a expressão gênica. PCR em tempo real Derivada da PCR convencional, a PCR em tempo real é uma inovação tecnológica e vem conquistando espaço nos diagnósticos clínicos e nos laboratórios de pesquisa por apresentar a capacidade de gerar resultados quantitativos, além de ser mais rápida e precisa, quando comparada à PCR convencional, que apresenta resultados qualitativos. O método original de PCR apresenta algumas limitações sérias ao amplificar primeiro a sequência de DNA e depois analisar o produto; a quantificação era extremamente difícil, uma vez que, independentemente da quantidade inicial de moléculas de DNA, ao fim de toda a reação, era originada essencialmente a mesma quantidade de produto. Essa limitação foi resolvida em 1992 pelo desenvolvimento da PCR em tempo real. 143 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Na PCR em tempo real, o produto formado é monitorado durante o curso da reação. A fluorescência de corantes ou sondas introduzidas na reação é monitorada em tempo real e é proporcional à quantidade de produto formado e ao número de ciclos de amplificação necessários para obter a amostra. A quantificação desses materiais ocorre com maior precisão e com maior reprodutibilidade, uma vez que os valores são determinados na fase exponencial da reação. Assumindo que a amplificação ocorra com eficiência, que normalmente é quase uma duplicação do número de moléculas por ciclo de amplificação, é possível calcular o número de moléculas de DNA da sequência amplificada que estavam inicialmente presentes na amostra. A principal característica da PCR em tempo real é a sua capacidade de monitorar o progresso da PCR enquanto ocorre a reação, e os dados são coletados ao longo dos ciclos. A detecção da formação das ampliações ocorre por meio de ampliações com sistema ótico para a captação da fluorescência em um computador com um software para aquisição de dados e análise da reação. Existe grande variedade e fabricantes desses equipamentos que apresentam diferenças quanto à capacidade da amostra, ao método de captação da fluorescência, à sensibilidade e aos softwares para a análise dos dados. Os usos típicos da PCR em tempo real incluem quantificação e análise de patógenos (viral, bacteriana ou de protozoários), análise de expressão gênica, análise de polimorfismo de nucleotídeo único (SNP), análise de produtos transgênicos, análise de aberrações cromossômicas e, mais recentemente, também, detecção de proteínas por PCR em tempo real. Saiba mais Os recentes surtos epidêmicos de doenças emergentes e reemergentes têm demonstrado a importância da aplicação de medidas de controle e prevenção. Para que tais medidas sejam eficazes, o desenvolvimento de métodos de diagnóstico acurados é essencial. Os métodos decorrentes do aprimoramento da biologia molecular e celular têm propiciado a utilização de técnicas diagnósticas que produzem um resultado confiável em poucos minutos ou horas. Os ensaios imunocromatográficos, a PCR e suas variações, a tecnologia de micro arranjos de DNA, a citometria de fluxo e a análise do proteoma constituem exemplo. Leia: CAVALCANTI, M.; BARROS, V.; GOMER, Y. Avanços biotecnológicos para o diagnóstico das doenças infecciosas e parasitárias. Revista de Patologia Tropical, v. 37, n. 1, p. 1-14, jan.-abr. 2008. Disponível em: https://bit.ly/3dxjgRW. Acesso em: 1º jul. 2021. 144 Unidade III 8.3 Técnicas imunosorológicas aplicadas em virologia Serão descritos, a seguir, diversos métodos utilizados em imunologia clínica, que possuem características semelhante, como utilizar da formação do complexo antígeno-anticorpo para quantificar a presença de diferentes analitos. Contudo, esses métodos têm várias diferenças na sua constituição e finalidade do uso, por isso, para melhor entendimento de cada método e seus princípios, eles serão divididos em não marcados e marcados. Os métodos não marcados são mais simples. Eles quantificam antígenos e anticorpos apenas pela formação dos complexos imunes. São as imunoprecipitações, as aglutinações e os ensaios líticos. Já os métodos marcados têm um antígeno ou anticorpo “marcado”, ou seja, que estará conjugado com uma molécula, o que é capaz de aumentar a sensibilidade e a visualização das reações. As técnicas marcadas são mais modernas e conseguem detectar menores concentrações do analito nas amostras. Os conjugados utilizados podem ser enzimas, isótopos radioativos ou fluoróforos. Os métodos são nomeados de ensaio imunoenzimático (Elisa), radioimunoensaio (RIA) e imunofluorescência (IFA). Todas as técnicas descritas a seguir, sobretudo as técnicas marcadas, podem ser utilizadas no diagnóstico de inúmeras doenças de etiologia viral. Imunoprecipitação As técnicas de imunoprecipitações permitem identificar e quantificar, semiquantitativamente, as precipitações que ocorrem com a formação de complexos imunes, que são ligações de antígenos a anticorpos. Nessa técnica, que foi observada pela primeira vez em 1897 por Rodolf Kraus, vai ocorrer a mistura de antígenos e anticorpos solúveis, que preferencialmente devem ter antígenos multivalentes quanto ao número de epítopos, e os anticorpos devem ser policlonais. Para anticorpos monoclonais, é essencial que o epítopo esteja em uma posição acessível e em grande concentração no antígeno ao qual o anticorpo se ligará. A formação dos imunocomplexos vai acontecer com uma mistura de um antígeno solúvel com um anticorpo, até que o número de ligação se torne grande o suficiente, e, com isso, insolúvel, que precipita. Os anticorpos em solução vão precipitar com a adição gradual de antígenos solúveis na mistura. No início da adição, haverá excesso de anticorpos na reação e, com isso, as ligações em poucos antígenos não serão suficientes para formarem imunocomplexos para a precipitação, é a zona de excesso de anticorpos. Com a adição de mais antígenos, será atingida a concentração equivalente entre as duas moléculas, o que vai permitir a formação de complexo imune e a máxima precipitação, é a zona de equivalência. Contudo, quando houver o excesso de antígenos, um anticorpo ficará ligado em suas duas regiões Fab, não ocorrendo a formação do imunocomplexo, diminuindo a precipitação, é a zona de excesso de antígenos 145 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Ac ≡ Ag Excesso Ag Excesso Ac Concentração do analito Im un op re ci pi ta çã o Figura 71 – Imunoprecipitação. A adição de antígeno solúvel em uma mistura de anticorpos irá permitir a formação de imunocomplexos insolúveis que irão precipitar. No início, na zona de excesso de anticorpos haverá pouca precipitação. Na zona de equivalência, ocorre a formação de muito complexo imune, havendo muita precipitação. Na zona de excesso de antígeno, novamente a formação de imunocomplexo é comprometida, diminuindo a precipitação Porém a visualização do imunoprecipitado em meio líquido é difícil, pois já há uma turvação e coloração natural das amostras, que é variável. Por essa razão, é uma metodologia de difícil padronização, mas esse inconveniente é resolvidopelas possibilidades de utilizar esse princípio nas técnicas de automação, que são os métodos de nefelometria e turbidimetria, muito mais sensíveis do que o olho humano, e são capazes de corrigir ou anular os interferentes inerentes das amostras. Imunodifusão As técnicas de imunodifusões são aquelas em que substâncias solúveis se difundem ao acaso em meios gelificados, como a agarose ou o ágar. Essas moléculas livres se movimentam até encontrarem o seu ligante e formarem o imunocomplexo insolúvel, que vai se precipitar no gel, ficando imobilizado, permitindo a visualização como uma turvação. Assim como na imunoprecipitação líquida, as imunodifusões possuem vários interferentes, os já citados anteriormente e, principalmente, a pureza dos reagentes e a distribuição homogênea dos componentes no gel. Existem quatro técnicas de imunodifusão: • Simples: um componente está fixo no gel e o outro, solúvel. • Dupla: os dois elementos são móveis e migram simultaneamente. • Linear ou unidimensional: uma corrente elétrica direciona a migração. • Radial: o movimento ocorre em todas as direções. Na imunodifusão simples, descrita por Oudin em 1946, o anticorpo é adicionado na fase gelificada, que é sólida, em um tubo, e o antígeno é adicionado no topo da coluna. Depois, os tubos deverão ser vedados e mantidos em temperatura constante. Depois de aproximadamente sete dias, será possível 146 Unidade III observar se ocorreu a formação do imunocomplexo pela visualização de turvação. Nesses ensaios, a concentração de antígeno será proporcional à espessura da linha de turvação formada, assim como a distância percorrida pelo antígeno até a formação do imunocomplexo. A imunodifusão simples pode ser do tipo radial, descrita em 1965 por Carbonara e Heremans. Nessa técnica, uma quantidade fixa de anticorpo específico é adicionada em meio, que é gelificado. Depois, serão realizados orifícios sobre a superfície desse gel, onde são adicionados os antígenos a serem testados, além de uma amostra controle com o antígeno de interesse em concentração conhecida. O antígeno vai se difundir no gel até encontrar com anticorpos, formando o imunocomplexo, porém, se uma grande quantidade de antígeno chegar à região, terá a zona de excesso de antígeno. Com isso, os imunocomplexos se desfazem, migram mais, encontram novos anticorpos e precipitam novamente. Somente quando o antígeno estiver na zona de equivalência, haverá a precipitação dos imunocomplexos e turvação do gel. Ao redor do orifício, no local em que há precipitação, vai se formar um halo, que, quanto mais distante do centro, maior será a concentração de antígeno. É uma técnica utilizada para quantificação de proteínas de fase aguda e de imunoglobulinas. A sensibilidade dessa técnica é de aproximadamente 10 μg/dl. Além disso, exige uma rigorosa padronização das condições e dos reagentes usados. Pode ser usada para quantificação, desde que seja realizada uma curva padrão com o antígeno controle, com a implementação de técnicas de automação de nefelometria e turbidimetria. O método, que demorava até 72 horas, pode ser realizado em alguns minutos. Aglutinação Os ensaios imunológicos de aglutinação partem do princípio de que é possível aglutinar partículas com a formação de agregados visíveis como resultado da interação de anticorpos específicos com partículas insolúveis, que contêm determinantes antigênicos em sua superfície. A aglutinação vai acontecer em dois estágios. No primeiro, uma mistura das partículas insolúveis recobertas pelos antígenos vai se ligar com os anticorpos. No segundo estágio, como resultado das colisões que ocorrem entre essas partículas, os anticorpos já ligados a uma partícula se ligam a determinantes antigênicos de outra, formando agregados que serão visualizados (figura seguinte). 147 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Complexo aglutinado Látex sensibilizado com anticorpo Antígeno A) B) Anticorpo Figura 72 – As duas etapas da aglutinação. Primeiro, irá ocorrer a ligação do antígeno ao anticorpo, para a posterior ligação entre as partículas: a aglutinação ocorre por antígeno livre (A); a aglutinação ocorre por anticorpo livre (B) Como está ilustrado na figura anterior, a caraterística principal da aglutinação, que se diferencia da técnica de precipitação, é a presença de uma partícula insolúvel, que será o “suporte” para a reação. Essas partículas, ao se ligarem a um componente livre, que pode ser antígeno ou anticorpo, formarão uma rede tridimensional que aglutinará. Essas partículas insolúveis podem ser: partículas que apresentam antígenos naturais em sua superfície, como as hemácias, bactérias, protozoários, entre outros. Partículas inertes, látex, poliestirenos, cristais de colesterol. Células antigenicamente não relacionadas, às quais se adsorvem ou se fixam antígenos insolúveis, como hemácias e bactérias. Vários fatores podem interferir no ensaio, por isso, é importante saber o tipo do anticorpo que estará presente, pois o IgM se liga muito mais facilmente aos antígenos do que o IgG. Logo, quando se deseja detectar apenas os IgG, será necessário utilizar reagentes que neutralizam o IgM, como o 2-mercaptoetanol. As técnicas de aglutinação podem ser divididas em direta, passiva ou indireta, inibição da aglutinação e floculação, dependendo das etapas que ocorrem para a formação do aglutinado. Na aglutinação direta, são utilizadas partículas antigênicas insolúveis em sua forma íntegra ou fragmentada. Essas partículas podem ser hemácias, bactérias, fungos, protozoários e vírus, os quais possuem antígenos em sua superfície de forma natural, por isso podem ser aglutinados diretamente pelo anticorpo. Para a aglutinação acontecer, é utilizado um antissoro, que é uma solução de anticorpos específicos. Após um período de incubação, a adição do antissoro vai permitir a formação da aglutinação completa. 148 Unidade III Por isso, é uma técnica de detecção de antígenos. Quando o resultado for positivo, ele geralmente é expresso como um título que corresponde à diluição usada do antissoro, o resultado será a máxima diluição em que ocorrer a aglutinação. Em 1951, Boyden verificou que proteínas podem ser adsorvidas em hemácias quando tratadas com ácido tânico. Essas células poderiam aglutinar-se com anticorpos específicos, o que permitiria a detecção de presença de anticorpos, em uma amostra, contra antígenos. Para a realização dessa técnica, que utiliza a hemácia como a partícula insolúvel, a aglutinação indireta é nomeada de hemaglutinação passiva. É uma técnica de simples execução, não exige a utilização de nenhum equipamento especial. Como esse método é comumente utilizado para a detecção de anticorpos de algumas doenças, como Chagas, toxoplasmose, entre outras, a amostra de escolha é o soro. Apesar das facilidades, é necessária, sempre, a realização, juntamente com o teste, de um controle positivo e um negativo, garantindo a confiabilidade do resultado obtido. O uso de diluição seriada da amostra de soro testada permite a realização de uma semiquantificação da presença do analito investigado, ou seja, terá como resultado um título de reação, que representa a diluição máxima em que há anticorpos presentes na amostra. Quanto maior a diluição em que ocorrer a reação positiva, maior é a concentração de anticorpos na amostra. Para que seja possível visualizar a reação de aglutinação, é preciso realizar o ensaio em uma placa própria que possui o fundo em V. Lembrando que, quando a reação de aglutinação ocorre, há a formação de uma rede tridimensional. O resultado positivo será visualizado como um “tapete”, já o resultado negativo será observado com a presença da formação de um “botão”. Esse botão nada mais é do que as hemácias livres que não se ligaram a anticorpos, sedimentadas no fundo do poço (figura seguinte). Um exemplo prático da utilização da técnica de aglutinação é para o diagnóstico de diarreia e/ou disenteria em crianças suspeitas de infecção porrotavírus. Neste caso, colhe-se uma amostra de fezes contendo supostamente as partículas do vírus e, utilizando de monoclonais específicos, detecta-se por método de aglutinação a presença dele. Figura 73 – Resultados da hemaglutinação. À esquerda, resultado positivo, há a formação de um tapete, no fundo do poço em V, devido à ligação de anticorpos nas hemácias, formando um complexo, uma rede tridimensional. À direita, resultado negativo, na ausência de ligação de anticorpos aos antígenos, as hemácias livres sedimentam Adaptada de: Montassier (s.d.). 149 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Por ser um teste semiquantitativo, esse método sempre é realizado com o soro diluído em diferentes títulos. A positivação em diferentes diluições permite dizer se há pouco ou muito anticorpo na amostra testada. Além disso, a diluição da amostra elimina a ocorrência do efeito prozona, que é quando o resultado é falsamente negativo (FN) devido à reação estar acontecendo na zona de excesso de anticorpos. Nesses casos, a amostra possui muitos anticorpos, mas, como todas as regiões Fab ficam ligadas por antígenos e vários anticorpos ficarão livres, não é possível haver a ligação entre as hemácias, consequentemente, a amostra que é positiva não vai formar complexo imune. A diluição do soro consegue resolver esse falso negativo, pois vai fazer com que a reação aconteça na zona de equivalência, em um título maior, sendo possível visualizar o resultado positivo Paciente Título1/ 2 1/ 16 1/ 12 8 1/ 10 24 1/ 4 1/ 32 1/ 25 6 Po s. 1/ 8 1/ 64 1/ 51 2 N eg . 1 64 2 8 3 512 4 <2 5 32 6 128 7 32 8 4 Figura 74 – Título de positividade da hemaglutinação Na figura anterior, todas as amostras estão positivas, porém a amostra que possui maior concentração de anticorpos é a 3, que foi positiva até o título de diluição 1/512, já a que possui menos concentração de anticorpos é a 8, que deu positivo apenas até a diluição 1/8. A amostra 6 é a representação do efeito prozona, as primeiras duas diluições são falsamente negativas, por ter excesso de anticorpo, quando a amostra é diluída, a reação acontece na zona de equivalência e se torna positiva. A hemaglutinação indireta é usada para a detecção de anticorpos contra vários parasitas, entre eles, anticorpos de Trypanosoma cruzi, Toxoplasma gondii e Treponema pallidum. As hemácias utilizadas como suporte da reação antígeno-anticorpo são de baixo custo, fácil de serem obtidas e mantidas, permitem a ligação de vários antígenos e podem ser suspensas em soluções estabilizadoras que evitam reações inespecíficas. As hemácias utilizadas, preferencialmente, são de aves, e antígenos, de polissacarídeos, que se ligam prontamente a essas hemácias. Já os proteicos precisam de tratamento com ácido tânico ou cloreto de cromo. Quanto mais puros, maior a sensibilidade e especificidade do sistema, mas, mesmo com antígenos purificados, é necessário tratar a amostra, ou seja, o soro do paciente, com soluções que extinguam as IgM. Comumente, é usado o mercaptoetanol para quantificar apenas as IgG. Caso não 150 Unidade III haja o tratamento da amostra, será quantificado qualquer anticorpo contra o antígeno em questão, independentemente da classe. Outra aplicação de hemácia como suporte para a aglutinação é usá-las para a detecção de pequenas quantidades de antígenos solúveis, haptenos ou anticorpos que competem com a substância na qual a hemácia foi sensibilizada. É um teste de competição pelo anticorpo, no qual a reação de aglutinação será inibida na presença do analito na amostra, inibição da hemaglutinação passiva. A aplicação dessa técnica é para detectar a presença de antígenos da hepatite e da hemofilia. Apesar da aplicabilidade dos ensaios não marcados que foram apresentados anteriormente, muitas vezes, a eficácia e a confiabilidade do ensaio não podem ser asseguradas, pois nem sempre é possível realizar a visualização sem a ajuda de equipamentos, da formação do complexo imune in vitro. Porém, devido aos avanços tecnológicos pelos quais, desde 1950, é possível detectar com maior sensibilidade e especificidade a formação dos complexos imunes com o uso da conjugação de moléculas aos componentes dos testes, a detecção das reações imunológicas ficou mais fácil de ser mensurada. A conjugação é a ligação de um componente, de forma covalente, a uma molécula do teste, que será uma proteína, que pode ser tanto um antígeno como um anticorpo. A ligação do conjugado deve ser realizada de uma forma que mantenha a funcionalidade das moléculas. As moléculas que podem ser utilizadas como conjugados são: fluorocromos, radioisótopos, substâncias luminescentes, enzimas, com diferentes substratos, podendo ser fluorescente, cromogênicos ou luminescentes. A ligação do conjugado pode ser realizada tanto em antígenos purificados como naqueles produzidos por recombinação genética. Já os anticorpos que serão conjugados podem ser monoclonais ou policlonais, independentemente de qual é a molécula que será conjugada. Quanto maior o seu grau de pureza, maior será a eficiência do teste em questão. Além de propiciar uma maior eficácia e confiabilidade aos testes, as marcações permitiram o desenvolvimento de diversos sistemas de automação. Lembrete As técnicas não marcadas são tidas como menos específicas e, portanto, seu uso vem caindo em desuso, mas vale a pena lembrar que, ainda em laboratórios de pequeno porte, tais metodologias ainda são uma alternativa viável para que se possa dar atendimento a populações menos favorecidas. Imunofluorescência Os ensaios que empregam o uso de fluorocromos permitem a ligação do conjugado em antígenos ou em anticorpos. Essas moléculas vão emitir fluorescência quando estimuladas em um determinado comprimento de onda, pois a molécula fluorescente absorve uma grande quantidade de energia, elevando o nível de energia nos seus elétrons, que, quando retornam ao nível basal, emitem luz, a fluorescência, em um comprimento de onda maior. A emissão dessa luz poderá ser observada em um microscópio de fluorescência. 151 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA Por usarem fluorescência ligados a antígenos ou anticorpos, os ensaios são nomeados de imunofluorescência. Podem ser do método competitivo ou não competitivo, homogêneos ou heterogêneos ou, ainda, realizados em fase líquida ou sólida. As técnicas de fluorescência ainda são utilizadas em laboratório de diagnóstico, contudo, vêm sendo substituídas pelas técnicas imunoenzimáticas, pois, para a visualização da fluorescência, é necessário o uso de microscópios próprios. Porém, em laboratórios de pesquisa, a imunofluorescência ainda é amplamente utilizada, já que permite uma grande variabilidade de aplicações para um mesmo método. A detecção de um antígeno diretamente em uma célula ou em um tecido é realizada pelo método da imunofluorescência direta. A única limitação do teste é a necessidade de utilizar um anticorpo monoclonal conjugado para cada antígeno que se desejar detectar. A utilização de imunofluorescência direta é feita em: imuno-histoquímicas; pesquisa de Chlamydia trachomatis, Treponema pallidum, Legionella sp., Influenzavirus A, Influenzavirus B e demais vírus respiratórios, entre outros patógenos; determinação de subgrupos de linfócitos; presença de depósitos proteicos específicos na doença autoimune lúpus. Já na técnica para detecção de anticorpos, na imunofluorescência indireta (IFI), serão utilizados anticorpos anti-imunoglobulina conjugados, nomeados de anticorpo secundário. É necessário que uma lâmina com os antígenos fixados previamente seja incubada com a amostra biológica, que é o soro, contendo uma mistura de anticorpos, porém apenas o anticorpo específico vai se ligar aos antígenos da lâmina. Após a incubação, será adicionado o anticorpo secundário conjugado, que se ligará na porção Fc do anticorpo específico que se ligou ao antígeno presente na lâmina. O conjugado estará ligado à porção Fc na anti-imunoglobulina,permitindo a ligação pela porção Fab. Para garantir que não haverá ligações inespecíficas entre anticorpos da amostra e o antígeno da lâmina, entre cada etapa do procedimento, é necessário realizar lavagens com soluções próprias. Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Etapa 4 Antígeno Anticorpo Conjugado A) B) Figura 75 – Imunofluorescência Indireta. A amostra não possui anticorpos específicos contra o antígeno da lâmina, é negativa (A); a amostra possui anticorpos específicos contra os antígenos da lâmina, é positiva (B) Fonte: TESTES... (s.d.) e Schwanke et al. (2014). 152 Unidade III A detecção do anticorpo específico é possível, pois, quando ele está presente na amostra, irá se ligar ao antígeno que foi previamente fixado em uma lâmina, para que a ligação antígeno-anticorpo seja visualizada, adiciona um anticorpo anti-imunoglobulina conjugado com um fluoróforo, depois, a imagem será visualizada no microscópio de fluorescência. Ensaios imunoenzimáticos (Elisa e western blotting) O principal imunoensaio heterogênico é o Elisa (enzyme linked immunosorbent assay), que foi desenvolvido nos anos de 1970 e se popularizou comercialmente nos anos de 1985 com o ensaio para detecção de anticorpos anti-HIV. Esses ensaios possuem diversas apresentações, porém têm como base a imobilização de um antígeno ou um anticorpo em uma fase sólida e a utilização de um conjugado, que também poderá ser antígeno ou anticorpo ligado a uma enzima com atividade catalítica preservada. A formação de um produto colorido pode ser observada visivelmente ou por meio de espectrometria pela medida de absorbância. A observação visual permite determinar resultados qualitativos ou semiquantitativos, se houver titulação da amostra, já a leitura da absorbância permite a quantificação do analito. Foi um método criado em alternativa ao radioimunoensaio. O Elisa, apesar de não detectar concentrações em pictogramas, possui alta sensibilidade e especificidade, é de rápida execução, baixo custo e altamente adaptável a diferentes graus de automação. Contudo, é sempre necessário observar a padronização, as condições de execução da técnica em cada etapa do teste, deve ser considerada a concentração ideal de cada reagente, as concentrações iônica e proteica, o pH, que podem interferir na eficiência do teste. O western blotting vem sendo empregado desde 1980, mas, recentemente, foi incluída a técnica no diagnóstico e passou a ser vendido comercialmente. É utilizado para caracterizar antígenos, além de distinguir perfis de especificidades dos anticorpos. É um método qualitativo. Para a realização da técnica, inicialmente, deverá ser realizada uma eletroforese, que vai separar uma mistura complexa de proteínas, a amostra terá suas proteínas solubilizadas, desnaturadas, e as pontes dissulfetos reduzidas, aplicadas em um gel de poliacrilamida, no qual estará submerso em um tampão. O sistema vai ser submetido a uma corrente elétrica, que vai separar as proteínas pelo peso molecular. Para a desnaturação das proteínas e neutralização das cargas das cadeias laterais dos aminoácidos, pode ser utilizado um detergente, o dodecil sulfato de sódio. Quando ele é utilizado, a corrida eletroforética é nomeada de SDS-PAGE. Após a eletroforese, a amostra é transferida para uma membrana e ficará imobilizada, pode ser uma membrana de nitrocelulose ou acetato. O resultado na membrana será revelado com o uso de um anticorpo primário, que é específico para o antígeno, uma proteína que estava presente na amostra, que já está imobilizada na membrana, porém essa ligação será visualizada sem a presença de um revelador. Será necessário adicionar um anticorpo secundário, uma anti-imunoglobulina, conjugado com uma enzima ou um radioativo ou um fluoróforo. Dependendo do conjugado, o método de revelação vai mudar, podendo ser o uso de substrato cromogênico ou de equipamentos que revelem a radiação ou, ainda, que detectem a fluorescência. 153 MICROBIOLOGIA E MICOLOGIA CLÍNICA A metodologia de western blotting é usada na aplicação clínica, principalmente no diagnóstico do HIV. Além de ser um dos métodos confirmatórios de escolha, ela pode ser utilizada para determinar o sorotipo do vírus, diferenciando em HIV-1 e HIV-2. Já em pesquisa científica, essa metodologia é utilizada sempre que se deseja confirmar a presença de uma proteína em uma amostra, podendo ter diversas aplicações. Como foi visto anteriormente, ela pode ser utilizada na produção de anticorpos monoclonais e também em clonagem de proteínas, estudos de expressão gênica, entre outros. Posteriormente, essas técnicas serão utilizadas no diagnóstico de doenças virais, congênitas e autoimunes, assim como em imuno-hematologia, com a aplicação em banco de sangue. Lembrando que as aplicações se estendem para diversas outras patologias, e são os métodos utilizados nas sorologias. Além disso, podem ser utilizados com diferentes propósitos na pesquisa. Porém, antes de as aplicações na clínica serem descritas, será necessário entender como esses métodos são avaliados de acordo com a sua confiabilidade, ou seja, capacidade de acertar um resultado, e quanto a sua reprodutibilidade. Observação A técnica de Elisa, desde sua padronização e difusão, sobretudo com o início da pandemia de HIV, já apresentou grandes e profundas modificações. Sabe-se que, hoje, falamos de técnica de Elisa de quarta e até de quinta geração, sempre buscando um maior grau de sensibilidade e especificidade. Infelizmente, o custo continua elevado e, por vezes, requer de equipamentos nem sempre acessíveis a todo tipo de laboratório. Saiba mais Quando nos dirigirmos à “testagem” para Sars-CoV-2 (covid-19), é de suma importância identificar o tipo de teste ao qual estamos nos referindo. Os testes possuem aplicações diferentes, e os resultados podem sofrer interferências de acordo com a metodologia de cada teste. As opções de testes são: os testes de RT-PCR (aqueles que pesquisam o vírus no nariz e orofaringe) e os testes sorológicos (aqueles que pesquisam anticorpos contra o vírus no sangue). Para saber mais sobre as vantagens e desvantagens de cada um e a importância no diagnóstico da infecção pelo Sars-CoV-2, leia: PROTO-SIQUEIRA, R. As diferenças entre os testes disponíveis para covid-19. Laboratório Antonello, maio 2020. Disponível em: https://bit.ly/3waIex2. Acesso em: 1º jul. 2021. 154 Unidade III Resumo Nesta unidade, aprendemos mais sobre a importância clínica dos vírus, pudemos comprender, por exemplo, que a grande maioria das infecções virais são subclínicas e podem ser, por vezes, superestimadas. Entendemos que o diagnóstico de uma infecção requer muito conhecimento e habilidade, além do dominio de técnicas clássicas em virología, bem como interface com as áreas de biologia molecular e imunologia. Reconhecemos as principais infecções virais que atingem a seres humanos e vimos um pouco sobre o impacto da pandemia de Sars-CoV-2 na população mundial. Entendemos que o tratamento de infecções virais requer muito conhecimento sobre a clínica do paciente. A melhor forma de se prevenir contra uma infecção viral é por meio da vacinação. Sobre esse tema, abordamos os diferentes tipos de vacinas, suas vantagens e desvantagens. Exercícios Questão 1. Leia o texto a seguir. “A pandemia de covid-19 tem nas vacinas a esperança mais promissora e ansiosamente esperada. Uma vacina eficaz será crucial para controlar a pandemia, que já acometeu cerca de trinta e um milhões de indivíduos em todo o mundo e matou um milhão de pessoas. A garantia de imunidade nos permitirá menor preocupação com o distanciamento social e todas as suas grandes implicações socioeconômicas. A sequência genética do vírus divulgada precocemente em 11 de janeiro de 2020 desencadeou intensa atividade global de pesquisa para desenvolver uma vacina contra a doença. A escala do impacto humanitário e econômico da pandemia de covid-19 impulsionou a utilização de novas plataformas de tecnologia
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