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POLÍTICAS SETORIAIS III Carolina Melati Gandolfi Programas e serviços de atendimento ao idoso Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar as ações de atenção à população idosa na política de saúde. Descrever os serviços e programas para a garantia de direitos da população idosa nos atendimentos e estabelecimentos públicos e na área dos transportes. Analisar os desafios interinstitucionais e as estratégias internacionais de atenção à saúde do idoso. Introdução A longevidade da população tem se constituído como uma conquista ao longo dos anos, com a expectativa de vida aumentando gradativa- mente. Entretanto, é necessário refletir sobre o modo como o processo de envelhecimento é amparado legalmente pelo Estado e visto pela sociedade. Além disso, é interessante analisar como se constituíram as políticas públicas com relação aos idosos ao longo do tempo e de que forma a perspectiva do Estado sobre essa faixa etária se alterou. Neste capítulo, você vai estudar a organização das políticas sociais públicas referentes aos idosos, considerando o trabalho realizado por assistentes sociais junto a essa população. Você também vai ver como são estabelecidos legalmente os direitos sociais desse setor. Por fim, você vai verificar como a proteção social aos idosos é realizada em outros países e também se confrontar com alguns desafios do cenário brasileiro. Cuidado da pessoa idosa: complexidades e particularidades O debate em torno do cuidado da pessoa idosa envolve muitas dimensões e diversas políticas sociais públicas. A preocupação com os idosos, de maneira ampla, por muito tempo se restringiu apenas a instituições sem fi ns lucrativos ou até religiosas. Levou algum tempo até que o Estado assumisse o compro- misso de observar essa população. Como um todo, o sistema de proteção social no Brasil teve um breve início com a Lei Elói Chaves, de 1923, legislação precursora e que organizava as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), responsáveis pela garantia de direitos específi cos aos trabalhadores assala- riados. Em seguida, entre os anos 1930 e 1945, o governo Vargas começou a organizar as relações entre a população e os empregadores e também a reconhecer os direitos dos trabalhadores. Com relação à organização da proteção social do Brasil, conforme Silva e Yazbek (2014), houve dois grandes marcos regulatórios: o primeiro, nos anos que se seguiram a 1930, com o estabelecimento de legislações diretamente relacionadas ao mercado de trabalho, o que influenciou os direitos dos trabalhadores; o segundo, a partir da Constituição de 1988, que apresentou um novo horizonte com relação à proteção social no Brasil, estabelecendo legalmente o tripé da seguridade social: saúde, assistência social e previdência social. Ambos os marcos tratavam os idosos como parte da população de forma geral, não atentando para as especificidades dessa etapa do ciclo de vida. Aqui, o foco é no que ocorreu após a promulgação da Constituição de 1988, encarada como o ponto inicial do estabelecimento de uma proteção social ampliada no País, ou seja, de uma proteção social que não abrange apenas trabalhadores assalariados. Antes de mais nada, você deve ter em mente o conceito de proteção social. Esta, quando realizada por meio do Estado, [...] é socialmente assumida como função do poder público e representa a existência de um conjunto de garantias, mais ou menos extensas, através de intervenção política e administrativa. Isso supõe a correção de rumos e estratégias no atendimento às necessidades sociais identificadas, supe- rando um modelo de proteção social seletivo e excludente (GIOVANNI, 2008 apud SILVA; YAZBEK, 2014, p. 4, grifo nosso). Programas e serviços de atendimento ao idoso2 Assim, buscando a superação do modelo excludente de proteção social, du- rante toda a década de 1990 foram regulamentados dispositivos constitucionais referentes às políticas setoriais de proteção aos idosos. Conforme Camarano e Pasinato (2004), em 1991, foram aprovados planos de custeio e benefícios da Previdência Social. As maiores mudanças foram: o estabelecimento de regras para a manutenção do valor real dos benefícios, a uniformidade dos riscos cobertos pela Previdência, o estabelecimento de valores mínimos e máximos dos benefícios e a concessão de pensão ao homem em caso de morte da esposa segurada. Em 1994, foi instaurada a Política Nacional do Idoso, legislação que tinha como objetivo “[...] assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade [...]” (BRASIL, 1994, documento on-line). Essa política também instituiu o Conselho Nacional do Idoso. O princípio central dessa normativa é que a família, o Estado e a sociedade têm o dever de assegurar o bem-estar do idoso, garantindo-lhe os direitos de cidadania e evitando que sofra qualquer tipo de discriminação. Além disso, a Política Nacional do Idoso aponta que as diferenças econômicas, sociais, regionais e as contradições entre o meio urbano e o rural devem ser levadas em conta por parte do Estado na aplicação da lei. O texto que compõe essa política marca questões centrais para garantir a proteção social do idoso, indicando especificamente pontos a serem trabalhados nas políticas de assistência social, saúde, educação, trabalho e previdência social, habitação, justiça, cultura e lazer. Nesse sentido, é possível observar a amplitude do trabalho a ser desenvolvido com essa população, considerando as especificidades do ciclo de vida e das condições econômicas e sociais de cada idoso. Além disso, essa legislação define que a pessoa idosa é aquela que possui 60 anos ou mais. Em 1999, foi organizada uma portaria ministerial que estabelecia a Política Nacional de Saúde do Idoso, que passaria a ser regulamentada anos depois, em 2006, sendo renomeada como Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (BRASIL, 2006). Uma das principais diretrizes dessa política é o “[...] enve- lhecimento ativo e saudável, de acordo com as recomendações da Organização das Nações Unidas [...]” (SILVA; YAZBEK, 2014, p. 6). É interessante você notar que a compreensão de saúde parte de um conceito ampliado, buscando articulação com as demais políticas sociais públicas e direitos de cidadania a fim de atingir o cuidado integral dessa população. 3Programas e serviços de atendimento ao idoso O conceito ampliado de saúde diz respeito ao entendimento de que o processo saúde-doença não é linear. Ele se desenrola a partir de condicionantes e determinantes sociais em saúde. Portanto, está além da compreensão de que saúde é apenas a ausência de doença. O art. 3º da Lei nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre a organização do Sistema Único de Saúde (SUS), afirma que a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais. A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa também tem como finalidade a recuperação, a manutenção e a promoção da autonomia e da independência dos idosos, “[...] direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde [...]” (BRASIL, 2006, documento on-line). Considerando a importância da autonomia e da independência dos idosos, cabe notar que nem toda pessoa acima de 60 anos tem plenas condições de dar conta de suas atividades diárias ou possui respaldo para isso em seu núcleo familiar. Assim, a normativa reconhece que os idosos podem estar em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs). As ILPIs são criadas com base na tipificação dos serviços socioassisten- ciais — a partir do estabelecimento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) — para atender às pessoas idosas em condiçõesde vulnerabilidade social. Elas são organizadas por um regulamento técnico da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e devem atender às premissas estabelecidas nesse documento (BRASIl, 2005). Por exemplo: preservar a identidade e a privacidade do idoso, buscando um ambiente de respeito e dignidade; pro- mover a convivência entre os residentes de diversos graus de dependência, objetivando a integração; incentivar e promover a participação da família e da comunidade na atenção ao idoso residente; promover condições de lazer para os idosos; e desenvolver atividades e rotinas para prevenir e coibir qualquer tipo de violência e discriminação. Contudo, as ILPIs são a última alternativa com relação ao cuidado com os ido- sos. Antes de optar por elas, é necessário considerar três modalidades de cuidado: a) Ambiente domiciliar: com o objetivo de estimular a permanência do idoso com algum nível de dependência na sua própria família ou em famílias que estejam dispostas a acolher idosos abandonados pela família natural, a es- Programas e serviços de atendimento ao idoso4 tratégia adotada é a oferta de uma suplementação financeira à família com recursos insuficientes para a manutenção do idoso e visitas domiciliares de cuidadores especializados. [...] b) Ambiente comunitário: [...] atendimentos prestados durante todo o dia nos centros-dia e desenvolvimento de atividades que promovam a sociabilidade em “centros de convivência”. Os centros-dia são um programa de atenção integral às pessoas idosas que, por suas necessidades e/ou de seus familiares, não podem ser atendidas nos seus próprios domicílios. Possibilita à pessoa idosa ser atendida durante o dia e retornar à noite para sua residência, propiciando a manutenção dos vínculos familiares, a sua socialização a custos financeiros mais baixos do que o atendimento institucional. Os centros de convivência consistem em atividades que visam ao fortalecimento de atividades associa- tivas, produtivas e de promoção da sociabilidade. Visam contribuir para a autonomia, o envelhecimento ativo e saudável, a prevenção do isolamento social e a geração de renda. c) Ambiente integral institucional: são atendimentos prestados por instituições asilares, prioritariamente, aos idosos sem família, em situação de vulnerabili- dade. São oferecidos serviços de atenção biopsicossocial, em regime integral, priorizando o vínculo familiar e a integração comunitária (DIOGO; DUARTE, 2002 apud CAMARANO; PASINATO, 2004, p. 280–281). De acordo com essa organização, uma ILPI se caracteriza como um am- biente integral institucional, pois as pessoas idosas inseridas nela possuem algum grau de dependência. Assim, necessitam de uma equipe técnica para auxiliá-las nas atividades da vida diária. Além disso, é necessário considerar que os vínculos com a família e a comunidade estão fragilizados, colocando os idosos em uma situação de vulnerabilidade. Como você viu, o cuidado da pessoa idosa possui certas particularidades. Além de considerar o momento de vida da pessoa idosa, é necessário levar em conta as legislações específicas e os mecanismos das políticas sociais públicas direcionados estritamente a esse público, como as instituições de longa permanência, os centros-dia e os serviços de convivência e fortaleci- mento de vínculos. Direitos sociais do idoso e arcabouço legal Como você já sabe, o Brasil demorou certo tempo para estabelecer uma prote- ção social mais ampliada, o que se refl etiu diretamente na área da assistência social. Por muito tempo, essa política pública permaneceu com status de caridade e benesse por parte dos mais ricos em relação aos mais pobres, sendo operacionalizada em grande parte por instituições religiosas. Porém, 5Programas e serviços de atendimento ao idoso com a Constituição de 1988, a assistência social passa a fazer parte do tripé da seguridade social, junto à saúde e à previdência social. Além disso, passa a ter legislação própria com a criação da Lei nº. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS): Essa lei estabeleceu programas e projetos de atenção ao idoso, em corresponsa- bilidade nas três esferas de governo, e regulamentou a concessão do benefício de prestação continuada às pessoas maiores de 70 anos de idade pertencentes a famílias com renda mensal per capita inferior a 1/4 do salário mínimo. Em 1998, a idade mínima para o recebimento do benefício foi reduzida para 67 anos e em 2004 para 65 anos (CAMARANO; PASINATO, 2004, p. 268). Considerando a Lei Orgânica de Assistência Social, foi estabelecida a Política Nacional do Idoso (Lei nº. 8.842, de 4 de janeiro de 1994). Essa política parte do pressuposto fundamental de que o idoso é um sujeito de direitos, como qualquer outro cidadão. Assim, deve ser atendido de maneira ampliada, levando-se em conta cada uma de suas necessidades: físicas, sociais, políticas e econômicas. A Política Nacional do Idoso tem como principais diretrizes norteadoras: incentivar e viabilizar maneiras alternativas de cooperação in- tergeracional e de atuação junto às organizações da sociedade civil para a formulação, a implementação e a avaliação de programas/planos/projetos; priorizar o atendimento de idosos em situação de vulnerabilidade junto a suas famílias, evitando a institucionalização; priorizar o atendimento do idoso em órgãos públicos e privados; e fomentar a discussão e a produção de conhecimento sobre o envelhecimento (BRASIL, 1994). Para compreender melhor a criação da LOAS e os impactos que ela teve na sociedade brasileira, consulte Sposati (2010). Essa política foi o início do arcabouço legal de garantia de direitos à pessoa idosa, demarcando o reconhecimento do Estado a respeito das individualidades dessa população. Alguns anos depois, em 2003, foi organizada a normativa que iria unir o conjunto de leis que dizem respeito aos idosos em todas as políticas sociais públicas: o Estatuto do Idoso (Lei nº. 10.741, de 1º de outubro de 2003). Esse estatuto aponta, no seu art. 3º, que o idoso deve ser tratado como Programas e serviços de atendimento ao idoso6 prioridade em vários níveis da sociedade, como nos atendimentos em serviços públicos e privados, na formulação de políticas sociais públicas específicas e também com relação à viabilização de formas alternativas de participação nos espaços de convívio. É importante pontuar que, como esse estatuto resulta da união das várias legislações sobre o tema, por vezes alguns pontos podem ser repetidos ou aparentar ser similares aos indicados anteriormente. Essa mesma normativa estabelece, no inciso II do Capítulo IV, que versa sobre o direito à saúde do idoso, a incumbência do Estado de “[...] fornecer aos idosos, gratuitamente, medicamentos, especialmente os de uso continu- ado, assim como próteses, órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação [...]” (BRASIL, 2003, documento on-line). Ou seja, a legislação garante o acesso a medicações de uso contínuo, tendo em vista que os idosos costumam ter mais agravos à saúde e necessitam de acesso facilitado a esse tipo de medicação. Para que os idosos tenham acesso facilitado à cultura e ao lazer, o Esta- tuto, no seu art. 23, determina que existirão descontos de pelo menos 50% nos ingressos para eventos culturais, esportivos e de lazer, bem como acesso preferencial a essas atividades para a população idosa, considerando que a cultura, o esporte e o lazer também são compreendidos como direitos dos idosos. Esse entendimento é importante pois se refere à inserção dos idosos nos espaços de convivência da comunidade, para além de apenas atividades predeterminadas em virtude da faixa etária. Também se pode observar no Estatuto a referência à priorização de idosos em programas habitacionais governamentais. O documento ainda se refere às instituições de longa permanência mencionadas em outras legislações. No que tange aos programas habitacionais, públicos ou subsidiadoscom recursos públicos, o art. 38 aponta as seguintes questões: I – reserva de 3% (três por cento) das unidades residenciais para atendimento aos idosos; II – implantação de equipamentos urbanos comunitários voltados ao idoso; III – eliminação de barreiras arquitetônicas e urbanísticas, para garantia de acessibilidade ao idoso; IV – critérios de financiamento compatíveis com os rendimentos de aposen- tadoria e pensão (BRASIL, 2003, documento on-line). Isto é, os idosos não só têm instituições para apoiá-los quando eles e/ou suas famílias já não têm condições financeiras e sociais de dar conta das suas atividades, como também têm prioridade nos programas habitacionais. A ideia é que possam obter uma moradia digna e com espaços adaptados. 7Programas e serviços de atendimento ao idoso O Capítulo X dessa normativa trata dos direitos dos idosos com relação ao transporte público, demarcando que, a partir dos 65 anos de idade (podendo ser a partir dos 60 anos caso haja legislação local que informe essa diferenciação), fica assegurada a gratuidade nos transportes mediante a apresentação do do- cumento de identidade do idoso. No que se refere ao transporte interestadual, deve ser observada a reserva de duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos. Além disso, é oferecido desconto de 50%, no mínimo, para os idosos na mesma faixa de renda que excederem as vagas gratuitas. O Estatuto ainda indica que seja assegurada a reserva de 5% de vagas de estacionamentos públicos e privados para idosos, sendo que estas devem ser posicionadas de forma a garantir o fácil acesso. Desafios da atenção integral ao idoso e aspectos internacionais do cuidado O processo de envelhecimento da população mundial não aconteceu de maneira similar em países desenvolvidos e em países em desenvolvimento. Nos primeiros, a longevidade aumentou em virtude da melhoria da qualidade de vida, possibilitando uma reorganização social. Entretanto, nos segundos, esse processo ocorreu de forma rápida, difi cultando a readaptação da sociedade e principalmente a atenção do Estado para com essa população. Além disso, no período de maior aumento da expectativa de vida, a economia dos países desenvolvidos estava mais estável e em um cenário favorável, o que permitiu que os sistemas de proteção social se adaptassem. Já nos países em desenvolvimento, o “[...] este fenômeno do rápido envelhecimento da população ocorre em meio a uma conjuntura recessiva e a uma crise fi scal que difi cultam a expansão do sistema de proteção social para todos os grupos etários e, em particular, para os idosos [...]” (NUNES, 2018, p. 46). Diante disso, você já pode notar como os processos de proteção social foram diferentes e apresentaram desafios distintos. Para você compreender melhor as discrepâncias, que tal conhecer o funcionamento da proteção social em Portugal e na Espanha? Cardoso et al. (2012 apud NUNES, 2018) indicam que, desde o início da década de 1970, em Portugal, as instituições criadas têm como eixo norteador os princípios de prevenção da dependência e de integração da população idosa à comunidade. Veja: Eles seguem afirmando que é a partir de 1978 que se constata que a proteção social aos idosos, por parte do Estado, não se restringe apenas ao apoio eco- nômico sob a forma de prestações pecuniárias, de modo a garantir as condi- Programas e serviços de atendimento ao idoso8 ções mínimas de sobrevivência. Começa a denotar-se uma preocupação, até então inexistente, em desenvolver infraestruturas de apoio ao idoso que favorecessem a sua integração e participação na sociedade (NUNES, 2018, p. 47, grifo nosso). Dessa forma, Portugal passou a expandir e a organizar as redes de prote- ção social existentes a partir da década de 1980, quando o governo observou objetivamente que apenas atualizar o valor monetário de pensões não era o suficiente para garantir que os idosos tivessem qualidade de vida. Contudo, Barbosa (2016 apud NUNES, 2018) comenta que Portugal, atualmente, não apresenta uma estratégia para todo o país com relação ao envelhecimento, e os municípios têm total autonomia na gestão da proteção social à população idosa. Apesar dessa heterogeneidade de práticas e metodologias de cuidado, o envelhecer em Lisboa é visto como um processo ativo, tendo como norte [...] uma visão holística e heterogênea deste, bem como a valorização do papel das pessoas idosas na sociedade — já que muitas são vistas como fonte de capital social e riqueza para o país. [Barbosa] também destaca a importância das relações intergeracionais para o equilíbrio social, e do estímulo ao cuidado com a saúde ao longo da vida (BARBOSA, 2016 apud NUNES, 2018, p. 49, grifo nosso). A proteção social na Espanha se parece com a de Portugal no sentido de haver a heterogeneidade de ações, ou seja, não há uma organização padrão para todos os municípios e regiões. Entretanto, existem várias experiências consolidadas, como aponta Nunes (2018). Na cidade de Argamasilla de Calatrava, por exemplo, a prefeitura mantém vários programas voltados para o atendimento aos idosos, destacando-se os serviços de ajuda em domicílio e a teleassistência, que tem como foco proporcionar o atendimento necessários aos idosos, garantindo a sua permanência em sua residência (NUNES, 2018). Esse serviço de ajuda em domicílio se caracteriza como um apoio doméstico e social, com a finalidade de evitar internações desnecessárias e também contribuir para que os idosos não se desapeguem do seu ambiente habitual, auxiliando nas tarefas domésticas ou nas atividades fora de casa. Outro exemplo citado por Nunes (2018) é a cidade de Gandia, onde existe o Centro Especializado de Atenção aos Idosos (CEAM), que se configura como um centro-dia de atenção preventiva. Ele atende aproximadamente 7 mil pessoas, que têm à sua disposição uma equipe multiprofissional de téc- nicos de diversas áreas de atuação, como manutenção da saúde, reabilitação, informação e formação, atividades físicas e esportivas, cursos ocupacionais, lazer e convivência. 9Programas e serviços de atendimento ao idoso Apesar dos pontos positivos das experiências de Portugal e da Espanha, conforme Nunes (2018), por vezes a política de cuidados adotada responsa- biliza a família e direciona o seu foco para o atendimento a pessoas “iso- ladas, carentes e sem família”. Além disso, algumas regiões desses países encontram-se mais desenvolvidas do que outras. Na região da Catalunha, na Espanha, a política de cuidados privilegia a articulação entre serviços de saúde e sociais, em conjunto com os serviços complementares, sendo reali- zado bastante investimento nos serviços prestados a domicílio, na formação e na qualidade dos serviços como um todo. Já em Portugal, Nunes (2018) afirma que a maioria dos cuidados é prestada pela família, sendo a política pública deficiente em comparação a outros países europeus. Como você viu até aqui, o processo de envelhecimento por vezes foi en- carado como um problema na sociedade, mas hoje passa a ser compreendido como uma vitória. Nessa dinâmica, recupera-se “[...] o papel do Estado como espaço estratégico e equalizador de oportunidades de reinserção da pessoa idosa como sujeito de direitos e como eixo de preocupação das políticas públicas [...]” (SILVA; YAZBEK, 2014, p. 108). Além de ser encarada como vitória, a fase idosa abrange um período muito heterogêneo da vida, dos 60 anos em diante, e precisa ser observada nas suas particularidades dentro da especificidade já ressaltada do ciclo de vida, necessitando de políticas diferenciadas. Nesse sentido, você deve considerar o seguinte: Os programas, serviços e equipamentos sociais disponibilizados pelo poder público nos diferentes níveis de gestão em âmbito federal, estadual e municipal, embora representando avanços institucionais, são ainda insuficientes diante das necessidades crescentes (SILVA; YAZBEK, 2014, p. 109). A conclusão a que se podechegar é que, apesar de muitos avanços terem sido alcançados no que tange à proteção social aos idosos no Brasil, ainda há muito espaço para avançar. Afinal, alguns direitos podem estar garantidos por lei, mas na prática não são assegurados e operacionalizados. Além disso, por vezes as políticas, programas e projetos criados para atender a essa população são organizados de maneira individual, sem prever uma interlocução com as demais políticas. Isso torna a proteção deficitária, pois todas as políticas devem estar interligadas para garantir o bem-estar e a qualidade de vida dos idosos. Programas e serviços de atendimento ao idoso10 BRASIL. Lei nº 8.842, de 4 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8842.htm. Acesso em: 07 jul. 2019. BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/ l10.741.htm. Acesso em: 07 jul. 2019. BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 283, de 26 de setembro de 2005. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/ anvisa/2005/res0283_26_09_2005.html. Acesso em: 07 jul. 2019. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html. Acesso em: 07 jul. 2019. CAMARANO, A. A.; PASINATO, M. T. O envelhecimento populacional na agenda das políticas públicas. In: CAMARANO, A. A. (org.). Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60. Rio de Janeiro: IPEA, 2004. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/images/ stories/PDFs/livros/Arq_16_Cap_08.pdf. Acesso em: 07 jul. 2019. NUNES, I. M. P. A questão social da velhice: o envelhecimento na agenda das políticas públicas de saúde no Brasil. Salvador: [s. n.], 2018. SILVA, M; R. F.; YAZBEK, M. C. Proteção social aos idosos: concepções, diretrizes e reco- nhecimento de direitos na América Latina e no Brasil. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 17, n. 1, p. 102-110, jan./jun. 2014. Leituras recomendadas BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promo- ção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/l8080.htm. Acesso em: 7 jul. 2019. SPOSATI, A. A menina LOAS: um processo de construção da assistência social. [S. l.: s. n.], 2010. 11Programas e serviços de atendimento ao idoso
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