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Os atos falhos

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Os atos falhos
A psicanálise freudiana ficou mundialmente famosa, e apesar dela já ter muitos anos de existência, ainda assim muitos conceitos e termos são entendidos de modo equivocado e distorcido por muitas pessoas.
   O principal assunto que a psicanálise traz é a compreensão de que não temos só a consciência, mas que esta é apenas uma pequena parte de uma totalidade do que somos, e que nessa totalidade há uma parte imensa que é só dos processos psíquicos inconscientes.
   "Ato falho" é o assunto escolhido que será aprofundado aqui. Ato falho é lapso, "erro", "falha", distração, esquecimento, e provém do inconsciente através de acesso enigmático, mascarado e labiríntico, e ele pode ser verbal, de audição, de memória, de leitura, de extravio ou perda de objeto, e também pode ser de equívocos ou enganos.
   Freud (1916) aponta ao psicanalista o papel de fazer uma investigação ao inconsciente do paciente, ele se refere a busca de sentido, indo na direção de reconhecer que certos fenômenos psíquicos não são exclusivos de neuróticos, mas em qualquer pessoa, saudável ou não, isto é, Freud apontou que existem processos psíquicos universais e que inclusive estes são inconscientes. Assim como investigadores policiais, as pistas dadas pelo paciente devem ser seguidas (Freud, 1916), e questionadas sobre qual o motivo de determinados lapsos acontecerem dessa maneira exata e não de outra.
   O ato falho verbal é o mais visado por Freud, pois ele se refere a este como o melhor para investigação, porque quando alguém enuncia algo diferente do que era intencionado falar, o que essa pessoa sente é irritação, raiva e até surpresa e perplexidade, como uma resposta afetiva mesmo. Por muitas vezes, a pessoa que teve a fala nem reconhece que cometeu tal lapso, e isso é mostrado pela reação da pessoa e isso leva a mesma a pensar o porquê isso aconteceu e o que significa.
   O foco principal não são os atos falhos em si, mas o estudo em cima disso, investigando a intencionalidade de quem o faz diante de tal fenômeno, tais intenções são desconhecidas da atenção consciente, mas é suposto terem vindo de uma noção inconsciente.
   Sigmund Freud apontou que o sentido, a intencionalidade e o significado aqui são equivalentes e propôs existir mais que uma intenção em jogo. Pois quando duas intenções ou mais se interferem e "batem de frente", é onde acontece a expressão ou a palavra ou a frase falada de forma "falha" e distorcida ou trocada. É o confronto entre as intenções que fez surgir a suposição de que existe uma diferenciação entre sistemas do psiquismo humano, e dá para notar um possível conflito no meio do fenômeno em si, tudo isso considerado pelos estudos freudianos entre 1893 e 1895. O ato falho permite uma forma de acessar conteúdos inconscientes que até então seriam recusados pelo consciente do interlocutor.
   Sigmund relata que o prazer seria vivenciado por uma instância em detrimento de outra instância, através de um princípio econômico e considerando uma adequação para com a realidade. O afeto ou a polaridade econômica seria a relação prazer-desprazer desregulada no âmbito consciente. É possível ao falante reconhecer a ambivalência de seu lapso, e também quando ele se der conta da inadequação de sua fala ou comportamento mostrado, é possível do mesmo sentir um mal-estar no quesito social.
   É imprescindível ter o depoimento do falante quanto as suas intenções e contradições dos atos falhos, pois sem esse depoimento o sentido do lapso especificado pode se mostrar de forma obscura e não ser entendido. É nesse contexto que Freud recorre para a ideia geral de determinada ligação com a linguagem, esta que é identificada nos chistes, nas deformações e possíveis descargas afetivas da agressividade (Freud, 1916), e é onde se faz possível a compreensão do ato falho em seu aspecto revelador que se encontra além do que o sujeito conhece conscientemente até então.
   Freud também considerou que nem sempre o sujeito vai reconhecer a coexistência das tendências opostas. Sendo assim, convém questionar ao mesmo sobre como e por quais razões as intenções perturbadoras aparecem na fala dele.
   A respeito dos atos falhos de cunho verbal, Freud compreende que existem três grupos de pessoas: o das pessoas que conhecem a tendência perturbadora ali contida e que antes mesmo do lapso verbal acontecer, tal tendência foi sentida; o grupo das que reconhecem igualmente a tendência perturbadora mas não sabe que não pouco antes do lapso, ela já existia; e o grupo cujo a intenção perturbadora é rechaçada com vigor pelos falantes (Freud, 1916).
   Acerca desta temática, é mister mencionar sobre o recalque, que supõe uma operação do psiquismo que impede ou barra o material psíquico acessar a consciência, porque tal material traria desprazer. Freud afirma que a repressão da intenção de dizer alguma coisa é condição indispensável para o lapso verbal acontecer (Freud, 1916).
   Freud (1916) considerou que o lapso verbal seria o representante de todo o gênero de atos falhos. E essa dinâmica dos fenômenos psíquicos mostra um jogo de tensões que se mostra não só no campo do sentido, como também o dos afetos.
   Em suma, é impossível discorrer sobre os atos falhos e não falar sobre o inconsciente e seu jogo de forças psíquicas. Se menciona-se um assunto, automaticamente puxa-se o outro também.

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