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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA INSTITUTO DE QUÍMICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM QUÍMICA ELETRODESCARBOXILAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS PARA PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS Júlia Caroline Celeste Viana Bento Dissertação de Mestrado Natal/RN, junho de 2022 JÚLIA CAROLINE CELESTE VIANA BENTO ELETRODESCARBOXILAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS PARA PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS Dissertação apresentada ao curso de Pós- graduação em Química, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Química. Orientadora: Profa. Dra. Amanda Duarte Gondim. Coorientadora: Profa. Dra. Lívia Nunes Cavalcanti. NATAL/RN 2022 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Francisco Gurgel de Azevedo - Instituto de Química - IQ Bento, Júlia Caroline Celeste Viana. Eletrodescarboxilação de ácidos graxos para produção de biocombustíveis / Júlia Caroline Celeste Viana Bento. - Natal: UFRN, 2022. 80 f.: il. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Exatas e da Terra, Programa de Pós-Graduação em Química. Orientadora: Dra. Amanda Duarte Gondim. Coorientadora: Dra. Lívia Nunes Cavalcanti. 1. Química - Dissertação. 2. Biocombustíveis - Dissertação. 3. Eletrossíntese - Dissertação. 4. Eletrodescarboxilação - Dissertação. 5. Ácidos graxos - Dissertação. I. Gondim, Amanda Duarte. II. Cavalcanti, Lívia Nunes. III. Título. RN/UF/BSIQ CDU 54(043.3) Elaborado por FERNANDO CARDOSO DA SILVA - CRB-15 / 759 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM QUÍMICA DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS Nº 21920/2022 - PPGQ/CCET (12.88.00.05) Nº do Protocolo: 23077.079998/2022-09 Natal-RN, 20 de junho de 2022. JÚLIA CAROLINE CELESTE VIANA BENTO ELETRODESCARBOXILAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS PARA PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em cumprimento às exigências para obtenção do título de Mestre em Química Aprovada em: 15 de junho de 2022 Comissão Examinadora: Dra. Amanda Duarte Gondim – UFRN (Orientadora) Dr. Djalma Ribeiro da Silva – UFRN - Interno Dra. Lívia Nunes Cavalcanti – UFRN - Externa ao Programa Dra. Aruzza Mabel de Morais Araújo – UFRN - Pesquisadora Visitante Dr. João Paulo da Costa Evangelista – UFRN - Pesquisador Visitante Documento não acessível publicamente (Assinado digitalmente em 22/06/2022 21:36) AMANDA DUARTE GONDIM PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR IQ-UFRN (12.88) Matrícula: 2140818 (Assinado digitalmente em 21/06/2022 08:15) DJALMA RIBEIRO DA SILVA PRO-REITOR(A) - SUBSTITUTO PROPLAN (11.07) Matrícula: 348475 (Assinado digitalmente em 20/06/2022 11:17) LIVIA NUNES CAVALCANTI PROFESSOR DO MAGISTERIO SUPERIOR IQ-UFRN (12.88) Matrícula: 2140775 (Assinado digitalmente em 20/06/2022 09:37) JOÃO PAULO DA COSTA EVANGELISTA ASSINANTE EXTERNO CPF: 053.138.884-04 (Assinado digitalmente em 20/06/2022 13:40) ARUZZA MABEL DE MORAIS ARAÚJO ASSINANTE EXTERNO CPF: 065.679.064-48 Para verificar a autenticidade deste documento entre em https://sipac.ufrn.br/public/documentos/index.jsp informando seu número: 21920, ano: 2022, tipo: DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS, data de emissão: 20/06/2022 e o código de verificação: f8eb4da068 Para Danielle, minha pessoa favorita no mundo. AGRADECIMENTOS Ao bom Deus pela vida, saúde e proteção em todos os momentos desta fase. À minha mãe, Wanda, ao meu pai, Jário, e à minha irmã, Danielle. Minha família foi, é e sempre será o meu ponto mais forte de apoio, a base firme que fundamenta meu crescimento em qualquer circunstância. Às minhas amigas e aos meus amigos pelas palavras de encorajamento, risadas e companhia, virtual ou presencialmente, durante a jornada da pós-graduação na pandemia. Às professoras Lívia e Amanda pela orientação e, principalmente, pela confiança e oportunidades que sempre a mim ofereceram. De modo especial, agradeço à professora Lívia pela presença persistente, zelosa e compreensiva mesmo nos dias mais difíceis desta etapa. Às professoras Aruzza Araújo e Polyana Castro e ao professor Carlos Martinez pela colaboração e esclarecimentos em momentos importantes da execução deste trabalho. Aos colegas do Laboratório de Pesquisa em Síntese Orgânica (LAPSO), em especial, Jhudson e Maria, com quem pude contar em muitos momentos de dificuldades e incertezas na aventura da pós-graduação no período de pandemia. Ao PRH-37.1/ANP-FINEP pelo financiamento da pesquisa. À Central Analítica do Instituto de Química da UFRN. Ao Núcleo de Petróleo e Núcleo de Processamento Primário e Reuso de Água Produzida e Resíduos (NUPPRAR-UFRN). A todas as pessoas que contribuíram, direta e indiretamente, para a realização deste trabalho. RESUMO Processos eletroquímicos representam rotas alternativas promissoras para promover a produção de biocombustíveis de forma mais limpa, sustentável e segura. O upgrading descarboxilativo de ácidos de origem renovável via eletrólise de (não-)Kolbe tem demonstrado elevado potencial para obter compostos de maior valor agregado, sobretudo para a indústria de energia. Particularmente, hidrocarbonetos e oxigenados derivados de matérias- primas naturais têm constituído opções para funcionar como aditivos de combustíveis fósseis por apresentarem propriedades de desempenho adequadas e estarem associados a menores índices de emissão de compostos nocivos à saúde e ao meio ambiente. Nesse sentido, este trabalho teve como objetivo aplicar um método eletrocatalítico para descarboxilar uma série de ácidos graxos, possuindo entre 12 e 18 carbonos, abundantes na composição de matérias- primas comumente utilizadas para produzir biocombustíveis. As reações foram acompanhadas por análises de CG/DIC, CG/EM, FT-IR e TG/DTG. Na ausência de catalisadores metálicos ou reagentes redox, o sistema eletroquímico permitiu converter ácidos graxos puros e misturas, incluindo a obtida a partir da hidrólise de um óleo vegetal de origem comercial, quantitativamente (conversão >95%) em misturas compostas majoritariamente de olefinas C11-C17 e éteres graxos, empregando eletrodos de grafite, em temperatura e pressão ambiente. A metodologia demonstrou elevado potencial para funcionar como rota de síntese complementar aos processos termocatalíticos para obter hidrocarbonetos e éteres de origem renovável em condições excepcionalmente brandas de reação. Palavras-chave: Biocombustíveis. Eletrossíntese. Eletrodescarboxilação. Ácidos graxos. ABSTRACT Electrochemical processes are promising alternative routes to promote cleaner, safer, and more sustainable redox transformations. The decarboxylative upgrading of biogenic acids via (non-)Kolbe electrolysis has demonstrated a high potential to produce valuable compounds for the chemical and fuel industries. Notably, bio-derived hydrocarbons and oxygenates have shown adequate properties that enable their use as fuel additives associated with reduced levels of emissions. Therefore, the research reported herein aimed to develop an electrocatalytic method to decarboxylate C12:C18:1fatty acids which are predominant in the composition of liquid biofuel feedstocks. The reaction products were analyzed by GC/MS, GC/FID, FT-IR, and TG/DTG techniques. In the absence of metal-based catalysts, additives, or redox reagents, the electrochemical system enabled the quantitative conversion (>95%) of pure fatty acids, as well as mixtures, including the one produced through Licuri oil hydrolysis, to afford mixtures composed by C11-C17 olefins and fatty ethers at room temperature and pressure, employing graphite electrodes. The electrodecarboxylative protocol demonstrated the potential to serve as an alternative to hydrogen-based thermocatalytic reactions to produce renewable hydrocarbons under exceptionally mild reaction conditions. Keywords: Biofuel. Electrosynthesis. Electrodecarboxylation. Fatty acids. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Desoxigenação de óleos vegetais na presença de hidrogênio................................................................................................. 24 Figura 2 – Mecanismo da reação de Kolbe................................................................ 31 Figura 3 – Esquema reacional da eletrodescarboxilação do ácido levulínico.................................................................................................. 32 Figura 4 – Esquema reacional da eletrodescarboxilação do ácido valérico..................................................................................................... 33 Figura 5 – Acoplamento cruzado de radicais de di-ácidos biogênicos...................... 35 Figura 6 – Materiais utilizados para construção da célula eletroquímica.................. 40 Figura 7 – Esquema representativo da célula eletroquímica utilizada para eletrodescarboxilação de ácidos graxos.................................................... 41 Figura 8 – Cromatograma (CG/EM) referente aos produtos de eletrodescarboxilação do ácido láurico com anodo de grafite........................................................................................................ 47 Figura 9 – Mecanismo de eletrodescarboxilação do ácido láurico utilizando anodo de grafite para formação de olefinas e éteres......................................................................................................... 48 Figura 10 – Cromatograma (CG/EM) referente aos produtos de eletrodescarboxilação do ácido láurico com anodo de Pt............................................................................................................... 51 Figura 11 – Cromatograma (CG/DIC) e espectro de infravermelho dos produtos de descarboxilação do ácido láurico....................................................................................................... 53 Figura 12 – Cromatograma (CG/DIC) e espectro de infravermelho dos produtos de descarboxilação do ácido mirístico.................................................................................................... 54 Figura 13 – Cromatograma (CG/DIC) e espectro de infravermelho dos produtos de descarboxilação do ácido palmítico................................................................................................... 54 Figura 14 – Cromatograma (CG/DIC) e espectro de infravermelho dos produtos de descarboxilação do ácido esteárico.................................................................................................... 55 Figura 15 – Cromatograma (CG/DIC) e espectro de infravermelho dos produtos de descarboxilação do ácido oleico........................................................................................................ 55 Figura 16 – Cromatograma (CG/EM) referente à mistura de produtos de descarboxilação do ácido mirístico.......................................................... 56 Figura 17 – Cromatograma (CG/EM) referente à mistura de produtos de descarboxilação do ácido palmítico.......................................................... 57 Figura 18 – Cromatograma (CG/EM) referente a mistura de produtos de descarboxilação do ácido esteárico.......................................................... 57 Figura 19 – Cromatograma (CG/EM) referente a mistura de produtos de descarboxilação do ácido oleico............................................................... 58 Figura 20 – Curvas de TGA para ácidos graxos puros e produtos de eletrodescarboxilação............................................................................... 59 Figura 21 – Curvas de DTG referentes à degradação térmica de ácidos graxos e produtos de eletrodescarboxilação........................................................... 61 Figura 22 – Cromatogramas (CG/FID) referentes à eletrodescarboxilação das misturas de ácidos graxos M1 e M2......................................................... 62 Figura 23 – Cromatogramas (CG/EM) referentes à eletrodescarboxilação das misturas de ácidos graxos M1 (A) e M2 (B)............................................ 62 Figura 24 – Curvas TG/DTG e dados associados referentes à degradação térmica dos produtos de eletrodescarboxilação das misturas M1 e M2............................................................................................................ 63 Figura 25 – Esquema reacional da hidrólise e eletrodescarboxilação do óleo vegetal 65 Figura 26 – Cromatograma (CG/DIC) referente à eletrodescarboxilação dos ácidos graxos derivados do óleo vegetal............................................................. 66 Figura 27 – Cromatograma referente aos produtos de descarboxilação dos ácidos graxos do óleo vegetal de origem comercial............................................ 67 Figura 28 – Espectros de infravermelho do óleo bruto, óleo hidrolisado (M3) e produtos de eletrodescarboxilação dos ácidos graxos derivados do óleo (EDCX-M3) ............................................................................................. 68 Figura 29 – Curvas de TG/DTG para o óleo vegetal bruto, hidrolisado e transesterificado e para os produtos de eletrodescarboxilação dos ácidos graxos derivados ........................................................................... 69 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Rotas e matérias-primas para produção de diesel verde regulamentadas pela ANP.................................................................................................. 20 Quadro 2 – Tipos de querosene de aviação alternativos e proporções permitidas pela ANP para misturas com o querosene de aviação de origem fóssil......................................................................................................... 22 Quadro 3 – Exemplos de compostos orgânicos produzidos industrialmente via eletrossíntese............................................................................................ 27 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Exemplos selecionados das condições de hidroprocessamento de óleos vegetais....................................................................................................... 25 Tabela 2 – Condições experimentais para conversão de ácidos graxos via reação de (não-)Kolbe................................................................................................. 36 Tabela 3 – Estudo das condições da reação de eletrodescarboxilação do ácido láurico......................................................................................................... 50 Tabela 4 – Distribuição relativa dos produtos (CG/EM) de eletrodescarboxilação dos ácidos graxos........................................................................................ 58 Tabela 5 – Temperaturas Ti (inicial), Tmáx (temperaturas de degradaçãona taxa máxima de perda de massa), Tf (final) e respectivas porcentagens de perda de massa associadas às curvas TG/DTG para ácidos puros e produtos de eletrodescarboxilação.................................................................................. 60 Tabela 6 – Distribuição relativa dos produtos (CG/EM) de eletrodescarboxilação dos ácidos.................................................................................................... 64 Tabela 7 – Perfil graxo de óleos vegetais promissores para produção de biocombustíveis a partir de processos desoxigenativos.............................. 64 Tabela 8 – Composição da mistura de ácidos graxos derivados da hidrólise do óleo vegetal de origem comercial....................................................................... 65 Tabela 9 – Distribuição dos produtosa da descarboxilação dos ácidos graxos derivados de óleo........................................................................................ 67 Tabela 10 – Temperaturas Ti (inicial), Tmáx (temperaturas de degradação na taxa máxima de perda de massa), Tf (final) e respectivas porcentagens de perda de massa associadas às curvas TG/DTG para o óleo vegetal bruto, ácidos graxos (M3), biodiesel e produtos da eletrodescarboxilação dos ácidos graxos derivados.............................................................................. 70 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 14 2 OBJETIVOS....................................................................................................... 17 2.1 OBJETIVO GERAL............................................................................................ 17 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS............................................................................... 17 3 REFERENCIAL TEÓRICO............................................................................. 18 3.1 HIDROCARBONETOS RENOVÁVEIS............................................................ 18 3.1.1 Diesel renovável.................................................................................................. 19 3.1.2 Combustível de aviação sustentável.................................................................. 21 3.2 HIDROPROCESSAMENTO DE ÓLEOS VEGETAIS.......................................................................................................... 22 3.3 PROCESSOS ELETROQUÍMICOS NA INDÚSTRIA DE ENERGIA............. 26 3.4 ELETRO-VALORIZAÇÃO DE COMPOSTOS DERIVADOS DA BIOMASSA......................................................................................................... 29 3.4.1 Eletrodescarboxilação de ácidos biogênicos para produção de biocombustíveis.................................................................................................. 30 4 MATERIAL E MÉTODOS............................................................................... 40 4.1 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS........................................................... 41 4.1.1 Eletrodescarboxilação do ácido láurico............................................................ 41 4.1.2 Eletrodescarboxilação dos ácidos graxos C14- C18(1).................................................................................................................. 42 4.1.3 Eletrodescarboxilação de misturas de ácidos graxos...................................... 43 4.2 ANÁLISE CROMATOGRÁFICA (CG)............................................................. 44 4.3 ANÁLISE TERMOGRAVIMÉTRICA (TGA)................................................... 44 4.4 ANÁLISE DE INFRAVERMELHO (FT-IR)...................................................... 45 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO....................................................................... 46 5.1 Estudo da eletrodescarboxilação do ácido láurico.......................................... 46 5.2 Eletrodescarboxilação de ácidos graxos C14-C18(1) ..................................... 53 5.3 Eletrodescarboxilação de misturas de ácidos graxos ..................................... 62 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 71 REFERÊNCIAS................................................................................................. 72 14 1 INTRODUÇÃO Os biocombustíveis são produtos valiosos para promover matrizes energéticas mais limpas, seguras e sustentáveis. O fortalecimento desse setor contribui para assegurar o suprimento de energia de segmentos importantes para a economia, reduzindo o impacto das flutuações de preço e oferta associadas aos aspectos geopolíticos do mercado do petróleo. Além disso, o uso de biocombustíveis permite atenuar emissões de gases do efeito estufa (GEF) e outros poluentes atmosféricos que comprometem a saúde e a qualidade do ar. No entanto, uma parcela ainda pequena da demanda de setores estratégicos é atendida pelos combustíveis de baixo carbono. O setor de transportes, por exemplo, é responsável por cerca de um quarto do total de emissões de CO2 relacionados à geração de energia, mas a perspectiva é de que biocombustíveis sejam capazes de abastecer o correspondente a apenas 5,4% da demanda de energia para transporte rodoviário em 2025 (SIMS et al., 2014; IEA, 2020). Nesse sentido, a implementação de políticas públicas direcionadoras e, particularmente, investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação se fazem necessários para aumentar a capacidade produtiva dos biocombustíveis convencionais, investigar a viabilidade técnica de novas alternativas de produtos e processos e facilitar a entrada dessas tecnologias no mercado (GASPAR, 2021; UNGLERT et al., 2022). No Brasil, por exemplo, a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) representa um instrumento norteador fundamental para fortalecer o setor, auxiliando no cumprimento do compromisso de redução de emissão de gases do efeito estufa firmado no Acordo do Clima de Paris (2016) e promovendo a expansão da participação dos biocombustíveis na matriz energética brasileira (BRASIL, 2017). Nas últimas décadas, o avanço no desenvolvimento de tecnologias para produção de biocombustíveis líquidos tem permitido o acesso a diversos produtos que se qualificam como opções eficientes para reduzir o uso de combustíveis fósseis e, como consequência, tornar as matrizes energéticas mais limpas. Por exemplo, além de ésteres de ácidos graxos que compõem o biodiesel tradicionalmente utilizado como aditivo do petrodiesel, óleos e gorduras também podem fornecer misturas de hidrocarbonetos com propriedades semelhantes àquelas associadas a combustíveis derivados do petróleo através de processos desoxigenativos termocatalíticos (SMAGALA et al., 2013; VÁSQUEZ; SILVA; CASTILLO, 2017). A origem renovável e a alta compatibilidade dessas misturas com a infraestrutura relacionada aos combustíveis convencionais tornam a produção de hidrocarbonetos a partir da biomassa uma 15 rota de elevada importância para a indústria, de modo que os óleos hidroprocessados (HVO, do inglês, Hydrotreated Vegetable Oil), por exemplo, constituem o terceiro biocombustível mais produzido no mundo, sendo responsável por 6% da produção mundial de biocombustíveis em 2020 (REN21, 2021). Para ter acesso a essas misturas combustíveis de origem renovável, a desoxigenação de óleos vegetais representa uma das estratégias mais promissoras. Esses processos, que se baseiam em reações de descarboxilação, decarbonilação ou hidrodesoxigenação, permitem melhorar propriedades como a viscosidade, estabilidade oxidativa e o escoamento a frio dessas matérias-primas, dando origem a misturas renováveis compostas de n- e isoparafinas, com baixo teor de oxigênio, nitrogênio, enxofre e aromáticos e com capacidadede combustão em misturas com o diesel, por exemplo, com menor emissão de CO e material particulado (LACKNER; WINTER; AGARWAL, 2010). No entanto, para promover essas transformações, condições severas de temperatura (300-400 °C) e pressão de hidrogênio (>20 bar), usualmente, devem ser aplicadas, necessitando de sistemas catalíticos complexos e estruturas de reatores específicas (VÁSQUEZ; SILVA; CASTILLO, 2017). Além disso, a utilização de gás hidrogênio como reagente principal para promover reações desoxigenativas contribui para reduzir a sustentabilidade global do processo de produção do biocombustível através desses processos, já que esse insumo é, em geral, proveniente de fontes não- renováveis (DUFOUR et al., 2011). Considerando essas limitações técnicas das rotas de síntese termocatalíticas, protocolos eletrocatalíticos têm fornecido resultados que permitem explorá-los como vias alternativas promissoras para obter bicombustíveis em condições brandas, sem a necessidade de reagentes redutores ou oxidantes, catalisadores ou aditivos à base de metais ou de natureza tóxica (SCHRÖDER et al., 2015). Com efeito, recentemente, a eletroquímica tem sido revisitada a fim de fornecer ferramentas para resolução de problemas de síntese orgânica ou para contribuir com o aumento da sustentabilidade na indústria de geração de energia e beneficiamento da biomassa (YAN; KAWAMATA; BARAN, 2017; LUCAS et al., 2021). Uma grande quantidade de reações eletroquímicas é conhecida por ser empregada para produção de compostos orgânicos e inorgânicos em larga escala na indústria química (SEQUEIRA; SANTOS, 2009). Particularmente para a produção de biocombustíveis, as reações de (não-)Kolbe têm demonstrado alto potencial a partir de protocolos que permitem descarboxilar ácidos derivados da biomassa, fornecendo hidrocarbonetos e misturas de produtos de maior valor agregado (HOLZHÄUSER; MENSAH; PALKOVITS, 2020). Sendo assim, a aplicação de transformações eletrocatalíticas para obter combustíveis renováveis 16 pode representar uma estratégia valiosa na direção de processos mais sustentáveis e eficientes no contexto da indústria de biocombustíveis. 17 2 OBJETIVOS 2.1 OBJETIVO GERAL • Demonstrar a aplicação de transformações em condições eletroquímicas para obter biocombustíveis a partir de óleos vegetais. 2.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Definir condições reacionais eletroquímicas para descarboxilar o ácido láurico (ácido graxo saturado modelo, C12); • Aplicar a metodologia desenvolvido para eletrodescarboxilação de outros exemplos de ácidos graxos saturados e insaturado; • Eletrodescarboxilar misturas de ácidos graxos pré-calculadas, além de uma obtida a partir da hidrólise de um óleo vegetal de origem comercial; • Caracterizar os produtos obtidos em todas as reações por CG/EM; • Descrever o comportamento térmico das misturas de produtos obtidas por TG/DTG. 18 3 REFERENCIAL TEÓRICO 3.1 HIDROCARBONETOS RENOVÁVEIS Os hidrocarbonetos renováveis são uma das classes mais notáveis de biocombustíveis denominados drop-in. Esses produtos são definidos como misturas de diferentes tipos de hidrocarbonetos de origem renovável, com desempenho equivalente ao dos combustíveis fósseis e de uso compatível com a infraestrutura do petróleo (refinarias, canais de distribuição e estruturas de motores a combustão) (IEA BIOENERGY, 2019). A equivalência entre essas misturas e os combustíveis convencionais é avaliada comparando suas propriedades com as normas especificadas para combustíveis convencionais, como a gasolina, o diesel ou combustível de aviação. A determinação de parâmetros físico-químicos, como faixa de pontos de ebulição, número de carbonos, ponto de fulgor e das propriedades de escoamento permite caracterizar as diversas misturas de hidrocarbonetos renováveis, indicando para que tipo de aplicação são viáveis (KARATZOS et al., 2017). Um dos aspectos mais importantes dessa classe de biocombustíveis é o baixo teor de oxigênio, assim como a ausência de enxofre, nitrogênio e aromáticos (LACKNER; WINTER; AGARWAL, 2010). Em relação a combustíveis oxigenados convencionais, como o biodiesel, os hidrocarbonetos de origem renovável possuem maior estabilidade química, o que permite a manutenção da sua qualidade frente a longos períodos de estocagem (KARATZOS et al., 2017). Além disso, esse tipo de biocombustível apresenta maior capacidade calorífica, o que possui efeito direto na massa de combustível necessária para suprir uma demanda (CHIONG et al., 2018; KARATZOS et al., 2017). Para o setor de aviação, por exemplo, esse é um fator crucial no planejamento econômico e técnico da operação. Essas vantagens permitem um uso mais abrangente dos hidrocarbonetos renováveis em relação ao biodiesel e ao bioetanol, que são empregados apenas em determinadas proporções em misturas com a gasolina e o óleo diesel. No Brasil, por exemplo, a proporção de biodiesel adicionada ao diesel fóssil variou entre 10–12% ao longo do ano de 2020, enquanto a de etanol anidro adicionada à gasolina produzida em refinarias, centrais petroquímicas ou formuladores permanece em 27% desde 2015 (ANP, 2021). Nesse cenário, torna-se crescente a procura por rotas de síntese eficientes e matérias- primas viáveis para combustíveis drop-in de origem renovável e explorar suas aplicações como alternativas complementares aos biocombustíveis oxigenados (REN21, 2021). Os exemplos mais promissores incluem o diesel renovável e o combustível de aviação 19 sustentável (SAF, do inglês, Sustainable Aviation Fuel), produzidos e caracterizados de acordo com padrões estabelecidos por normas técnicas como as fixadas pela American Society for Testing and Materials (ASTM) ou pelo European Committee for Standardization (CEN). 3.1.1 Diesel renovável Denomina-se diesel renovável ou diesel “verde”, o biocombustível próprio para motores do ciclo Diesel, composto por uma mistura de alcanos, obtido a partir de processos de transformação de matéria-prima renovável e que possui propriedades semelhantes às especificadas para o diesel de origem fóssil. Dependendo do país onde é comercializado, as especificações do diesel verde podem ser orientadas pelas mesmas normas que estabelecem padrões de qualidade para o petrodiesel ou por regulamentação específica. Por exemplo, o diesel verde produzido nos Estados Unidos obedece aos padrões delimitados pela ASTM D975, relacionada ao diesel fóssil, enquanto no Brasil, apesar de ainda não haver produção nacional, os requisitos técnicos e de comercialização são regulamentados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) através da Resolução n° 842/2021 (ANP, 2021). Um aspecto importante do diesel verde é a sua distinção em relação ao biodiesel. Apesar de ambos serem biocombustíveis eficientes para o uso em motores do ciclo Diesel, podendo ser adicionados ao diesel convencional, esses produtos diferem entre si tanto no que se refere à composição química, quanto às suas propriedades (EPE, 2020). O biodiesel corresponde a misturas de ésteres alquílicos de ácidos graxos, obtidas a partir da transesterificação de óleos vegetais ou gorduras de origem animal (ANP, 2014). Devido a sua origem, esse biocombustível difere dos hidrocarbonetos renováveis na faixa do diesel por uma série de parâmetros. Por exemplo, em relação ao diesel verde, a maior viscosidade do biodiesel reduz sua capacidade de escoamento e a menor estabilidade à oxidação dificulta a manutenção da qualidade durante sua estocagem. Além disso, o biodiesel apresenta propriedades de escoamento a frio consideravelmente inferiores ao diesel, de modo que os pontos de nuvem e de fluidez, por exemplo, chegam a estar cerca de 20 °C acima dos associados ao diesel fóssil. Esses aspectos limitam seu uso em misturas com o combustível fóssil em proporções inferiores a 20% paraaplicações convencionais (LACKNER; WINTER; AGARWAL, 2010). De acordo com o marco legal brasileiro, o diesel verde pode ser obtido através de cinco tipos de processos, apresentados no quadro 1 (ANP, 2021). Dentre essas rotas sintéticas, o hidrotratamento possui adesão expressiva no mercado produtivo internacional. As misturas 20 de hidrocarbonetos parafínicos obtidas a partir do hidrotratamento de óleos vegetais, ácidos ou ésteres graxos são popularmente conhecidos como HVO (Hydrotreated Vegetable Oil) e HEFA (Hydroprocessed Esters and Fatty Acids). A produção de HVO experimentou um crescimento de 12% em 2020, alcançando cerca de 7,5 bilhões de litros produzidos apesar das baixas no setor de biocombustíveis durante a pandemia de Covid-19. Desse modo, esse tipo de diesel renovável se estabelece como uma forte tendência do setor, com capacidade para ultrapassar o biodiesel e se tornar o biocombustível de segunda maior produção mundial, atrás apenas do bioetanol (REN21, 2021). Quadro 1 – Rotas e matérias-primas para produção de diesel verde regulamentadas pela ANP Processo Matérias-primas Hidrotratamento Óleo vegetal (in natura ou residual), óleo de algas, óleo de microalgas, gordura animal e ácidos graxos de biomassa. Fischer-Tropsch Gás de síntese proveniente de biomassa. Fermentação Carboidratos derivados da biomassa. Oligomerização Álcool etílico e álcool butílico. Hidrotermólise catalítica Óleo vegetal (in natura ou residual), óleo de algas, óleo de microalgas, gordura animal e ácidos graxos de biomassa. Fonte: adaptado de ANP (2021). Embora a indústria europeia seja responsável por uma boa parcela da capacidade produtiva de HVO, os Estados Unidos têm desempenhado papel de destaque no crescimento da produção e consumo dos produtos do hidrotratamento. Nesse país, os investimentos em tecnologias para impulsionar a produção de HVO incluem a adaptação de refinarias de combustíveis fósseis e são consequências de políticas públicas que promovem a maior participação dos combustíveis renováveis no setor de transporte (IEA, 2020). Além dos projetos de expansão de capacidade e de construção de novas plantas industriais em países já produtores, mercados emergentes de produção de HVO, incluindo o Brasil e a Indonésia, também demonstram potencial para contribuir com a consolidação desse tipo de biocombustível. Considerando esses investimentos na tecnologia do hidrotratamento, uma estimativa promissora indica que a capacidade instalada e planejada para produção de HVO 21 pode chegar a cerca de 60% da produção de etanol em 2020, o que representa um avanço importante no que se refere ao uso dos biocombustíveis, sobretudo no setor de transportes (REN21, 2021). 3.1.2 Combustível de aviação sustentável O combustível de aviação sustentável consiste nos hidrocarbonetos derivados de matérias-primas renováveis, obtidos por meio de rotas regulamentadas e que podem compor misturas com o querosene derivado do petróleo para uso em turbinas de aeronaves, atendendo a especificações previstas em normas, como a ASTM D7566. No Brasil, a Resolução n° 778/19 da ANP regulamenta características e padrões de qualidade para querosenes de aviação alternativos, que incluem os cinco tipos apresentados no quadro 2. Conforme o quadro 2, os tipos de bioquerosene de aviação são definidos de acordo com o processo utilizado para obtê-los. Além disso, para cada tipo, diferentes proporções, entre 10%-50% em volume, são indicadas para compor a mistura com o querosene de aviação de origem fóssil (QAV-1 ou JET-A1) a fim de fornecer um combustível para abastecer aeronaves, associado a menores índices de emissão de gases poluentes (ANP, 2019). Internacionalmente, as blendas devem atender os parâmetros delimitados pela norma ASTM D1655. O uso de combustíveis drop-in na aviação é um aspecto decisivo para promover a descarbonização do setor de transportes por uma série de motivos. Em primeiro lugar, a aviação é responsável por cerca de 3% do total de emissões globais de CO2 anualmente. Além disso, um crescimento na demanda por combustíveis de aviação de mais de 50% (em relação ao consumo antes da pandemia) é esperado até 2050. O longo tempo para renovação de frotas comerciais também requer que os combustíveis alternativos não necessitem de qualquer modificação de infraestrutura para o bom funcionamento das aeronaves, o que pode ser contornado pela escolha de biocombustíveis drop-in (WORLD ECONOMIC FORUM, 2020; LEE et al., 2020). Outro obstáculo para diversificar os meios de suprir essa demanda energética é a impossibilidade de utilizar opções como as baterias, que, apesar da eficiência crescente, ainda apresentam baixa densidade de energia, o que limita o uso devido à necessidade de controle severo do peso das aeronaves em voos comerciais. Nesse contexto, os SAFs representam alternativas cada vez mais competitivas para redução de emissões na indústria de aviação. Como consequência, investimentos em pesquisa e desenvolvimento, no fortalecimento da cadeia produtiva com a garantia de pleno fornecimento de matérias-primas, além da construção de plantas industriais, orientam os 22 esforços para reduzir os custos de produção em larga escala dos SAFs em relação aos combustíveis derivados do petróleo (WORLD ECONOMIC FORUM, 2020; LEE et al., 2020). No Brasil, por exemplo, a Lei 14.248/21 reforça o incentivo e fortalece o papel dos biocombustíveis na aviação do país, estabelecendo a Política Nacional do Bioquerosene (BRASIL, 2021). Quadro 2 – Tipos de querosene de aviação alternativos e proporções permitidas pela ANP para misturas com o querosene de aviação de origem fóssil Tipo de QAVa alternativo Descrição do QAV % permitida de QAV alternativo na mistura com QAV-1b SPK-FT Parafínico hidroprocessado e sintetizado por Fischer-Tropsch Até 50% SPK-HEFA Parafínico sintetizado por ácidos graxos e ésteres hidroprocessados. Até 50% SPK/A Parafínico sintetizado com aromáticos. Até 50% SPK-ATJ Parafínico sintetizado por álcool. Até 50% SIP Iso-parafinas sintetizadas de açúcares fermentados e hidroprocessados. Até 10% aquerosene de aviação; bquerosene de aviação de origem fóssil, internacionalmente, JET A-1. Fonte: adaptado de ANP (2019). 3.2 HIDROPROCESSAMENTO DE ÓLEOS VEGETAIS Um dos processos mais industrialmente promissores para produzir hidrocarbonetos renováveis com alto potencial para funcionar como biocombustíveis drop-in é a desoxigenação de óleos vegetais ou ésteres correspondentes, através do hidroprocessamento. Devido a sua viscosidade 10-20 vezes superior ao diesel e baixa volatilidade, os óleos vegetais puros não são viáveis para aplicação em motores a diesel e, por isso, passam pelo processo de transesterificação para fornecer um biocombustível de melhor qualidade. Apesar de ser um biocombustível de uso proeminente, o biodiesel composto pelos ésteres resultantes ainda possui alta viscosidade, baixa estabilidade oxidativa e propriedades de escoamento a frio inferiores ao diesel fóssil (LACKNER; WINTER; AGARWAL, 2010). Dessa forma, a 23 desoxigenação dos óleos vegetais ou do biodiesel através do hidrotratamento constitui uma abordagem alternativa para o aproveitamento da biomassa oleaginosa, fornecendo misturas associadas a melhores propriedades de combustível. O hidroprocessamento consiste em um conjunto de reações termocatalíticas que ocorrem na presença de hidrogênio (LI, D. et al., 2015). Nesses sistemas, reações de descarboxilação (DCX), descarbonilação (DCN) e hidrodesoxigenação (HDO) são possíveis, usualmente, fornecendo hidrocarbonetos na faixa do diesel ou querosene a depender do perfil graxo da matéria-prima utilizada e de outras variáveis de processo (tabela 1) (GOSSELINK et al., 2013). De acordo com a figura 1, na presença de hidrogênio, a redução das ligaçõesduplas presentes nas cadeias carbônicas que compõem a estrutura dos triglicerídeos, chamada de saturação, é a primeira reação que ocorre durante o hidroprocessamento. Em seguida, o hidrogênio promoverá a quebra da molécula do triglicerídeo, dando origem ao propano e a três moléculas de ácidos graxos saturados livres. A partir desse ponto, os ácidos graxos podem reagir com o hidrogênio de três modos distintos. A primeira possibilidade consiste em uma reação de descarboxilação, que implica na perda de CO2 e formação de n-alcanos com um carbono a menos na cadeia em relação ao ácido graxo. A segunda possibilidade é a reação de hidrodesoxigenação, que ocorre com a liberação de H2O, resultando em n-alcanos com o mesmo número de carbonos dos ácidos graxos de partida. A terceira reação alternativa é a descarbonilação. Nesse caso, os n-alcanos também contendo um carbono a menos na cadeia são obtidos mediante a perda de CO e H2O. O mecanismo através do qual a desoxigenação ocorrerá, bem como o tipo de produto formado, depende de uma série de fatores experimentais, como a natureza dos catalisadores, temperatura e pressão do sistema, tipo de matéria-prima e quantidade de H2. Os produtos gerados podem, ainda, ser submetidos a reações de craqueamento, isomerização e ciclização a fim de melhorar as propriedades da mistura para aplicação como combustível (VÁSQUEZ; SILVA; CASTILLO, 2017). 24 Figura 1 – Desoxigenação de óleos vegetais na presença de hidrogênio Fonte: adaptado de VÁSQUEZ; SILVA; CASTILLO (2017). No que se refere às condições operacionais, no geral, bons rendimentos de hidrocarbonetos são reportado na faixa de temperatura de 300-400 °C e pressão de hidrogênio de 30-200 bar, empregando sulfetos bimetálicos de metais de transição, como Ni, Co e Mo, suportados em óxidos como Al2O3 ou TiO2, ou materiais monometálicos a base de Ni, Pt, Pd e Rh como catalisadores (tabela 1) (SONTHALIA; KUMAR, 2019; VÁSQUEZ; SILVA; CASTILLO, 2017; GALADIMA; MURAZA, 2015). Nessas condições, o hidrotratamento de uma variedade de óleos vegetais, preferencialmente óleos não-comestíveis, tem sido reportado para gerar misturas de hidrocarbonetos com potencial para funcionar como biocombustível de alta qualidade. A tabela 1 sumariza as condições experimentais para o hidroprocessamento de exemplos dos principais óleos vegetais utilizados como matéria-prima para a produção de biocombustíveis. 25 Tabela 1 – Exemplos selecionados das condições de hidroprocessamento de óleos vegetais Óleo vegetal T/°C PH2/bar catalisador Rendimento n-alcanos (%) Referência Girassol 300 20 Mo2C/CA 76% (major. C18) HAN et al., 2011 Girassol 350- 370 20-40 NiMo/Al2O3/F 73,2-75,6% (C15-C18) KOVÁCS et al., 2011 Pinhão- manso 360 30 Ni-W 63,5% (major. C6–C18) YANG et al., 2019 Palma 300 30 NiMoS2 75,3% (major. C15–C18) BURIMSITTHIGUL et al., 2021 Macaúba 300 10 Pd/C 85% (major. C11, C12, C14) SILVA et al., 2016 Colza 350 80 NiMo/Al2O3 86,3% (C15– C24) SOTELO-BOYÁS; LIU; MINOWA, 2011 Soja 390 10 Ni-Mo/HY 48,2% (biojet) CHENG et al., 2014 Soja residual 400 30 Ni-MesoY 40,5% (biojet) LI, T. et al., 2015 Canola 250 31 MoWC/C-550 86,8% (major. C17 e C18) TRAN; AKMACH; KALIAGUINE, 2020a Licuri, biodiesel 300 7,36 Pd/C 39,2% (C7– C17) ARAÚJO et al., 2019 Licuri 300 7,36 Pd/C 32,3% (C7– C17) ARAÚJO et al., 2019 De acordo com a tabela 1, a composição dos produtos é fortemente dependente do perfil graxo do óleo e das condições da reação, principalmente, da temperatura e da atividade do catalisador empregado. A variação desses parâmetros determina o mecanismo predominante da desoxigenação (GOSSELINK et al., 2013). Por exemplo, na conversão do óleo de girassol, utilizando catalisador de carbeto de molibdênio suportado em carvão ativado (entrada 1, tabela 1), a reação de hidrodesoxigenação foi o processo predominante, sendo responsável por cerca de 90% dos produtos obtidos. Já para o hidroprocessamento da mesma matéria-prima com auxílio de um catalisador bimetálico suportado em óxido de alumínio considerando uma faixa de temperaturas e pressões (entrada 2, tabela 1), aproximadamente, 45% dos produtos foram resultados de reações de descarboxilação/decarbonilação (HAN et al., 2011; KOVÁCS et al., 2011). 26 Nesse sentido, um ponto central de estudo é o desenvolvimento de novos sistemas de catalisadores heterogêneos para promover a desoxigenação de forma eficiente e com bons níveis de seletividade para hidrocarbonetos na faixa do diesel ou do querosene. No entanto, a atividade dos catalisadores está estritamente relacionada a seu modo de preparo e sínteses cada vez mais específicas e laboriosas, envolvendo uma série de etapas, incluindo processos a altas temperaturas (400-700 °C), têm sido demonstradas (DING et al., 2020; MALINS, 2021; TRAN; AKMACH; KALIAGUINE, 2020b). Além disso, estruturas diversificadas de catalisadores a base de metais preciosos, de custo elevado, como a Pt e o Ru são reportados como alternativas para alcançar melhores atividades, reduzindo a desativação nas condições da reação, enquanto favorecem o processo de hidrodesoxigenação, o qual é preferível por proceder sem a perda de carbono e resultar em água como subproduto (JANAMPELLI; DARBHA, 2018; JEONG et al., 2021; MONDAL, S. et al., 2018). Assim, apesar da vasta aplicabilidade do hidrotratamento na indústria, os sistemas complexos de catálise heterogênea, as condições severas de temperatura e pressão, que interferem no design de reatores e nos custos energéticos do processo, e a origem não- renovável do hidrogênio, principal insumo empregado na transformação, ainda representam inconvenientes práticos para o upgrading de óleos vegetais e ésteres via hidroprocessamento. 3.3 PROCESSOS ELETROQUÍMICOS NA INDÚSTRIA DE ENERGIA Sistemas eletroquímicos são amplamente empregados na produção de compostos químicos em grande escala e, por isso, representam uma categoria de processos de grande relevância industrial (PETROVIC, 2021). Exemplos de processos eletrolíticos consolidados na indústria incluem a síntese de compostos inorgânicos como alumínio, cloro-álcalis, flúor, peróxido de hidrogênio, ozônio, hipoclorito, dicromato e óxidos metálicos, além da eletrodeposição de metais como Zn, Cu, Mg, Li, Na e K (SEQUEIRA; SANTOS, 2009). A eletrólise também permite acessar compostos orgânicos através de rotas de síntese que priorizam a eficiência e o baixo custo operacional. Por exemplo, a síntese da adiponitrila, precursora do nylon, se baseia na eletro-hidrodimerização da acrilonitrila, empregando eletrodos de cádmio (catodo) e de aço (anodo). Esse processo é um dos mais bem sucedidos na indústria, sendo responsável por uma produção anual de cerca de 200 mil toneladas de adiponitrila a partir de um consumo de energia estimado de 50 MW. O quadro 3 apresenta outros compostos orgânicos produzidos em grande escala por meio de processos 27 eletroquímicos bem estabelecidos, evidenciando a importância das transformações promovidas por elétrons no contexto de síntese industrial (SEQUEIRA; SANTOS, 2009). Quadro 3 – Exemplos de compostos orgânicos produzidos industrialmente via eletrossíntesea Matéria-prima Produto Companhia Butanona Acetoína BASF Acrilonitrila Adiponitrila BASF, Asahi Chemical 4-Cianopiridina 4-Aminometilpiridina Reilly Tar Nitrobenzeno Azobenzeno Johnson Matthey Company L-Cistina L-Cisteína Wacker Chemie AG Naftaleno 1,4-Dihidronaftaleno Clariant Furano 2,5-Dimetoxi-2,5-dihidrofurano BASF p-Metoxitolueno p-Metoxibenzaldeído BASF Ácido maleico Ácido succínico CERCI India a Processos em escala comercial. Fonte: adaptado de SEQUEIRA; SANTOS (2009). De modo particular, na perspectiva de produção industrial, os sistemas eletroquímicos estão associadosa uma série de benefícios. Em primeiro lugar, as transformações que envolvem transferência de elétrons podem ser conduzidas em condições reacionais brandas. Esse fator contribui para garantir processos mais seguros, já que é comum células eletroquímicas operarem a temperatura e pressão ambientes a partir de uma instrumentação de baixa complexidade. Outro fator positivo para esses sistemas é a ausência de reagentes químicos em quantidades estequiométricas para promover as reações de natureza redox. Oxidantes ou redutores são substituídos pelas superfícies eletroativas de diversos materiais a depender do potencial de redução/oxidação do substrato e da transformação pretendida. Nesse sentido, é possível reduzir a quantidade de resíduos gerados no processo, sobretudo aqueles que podem possuir natureza tóxica ou poluente. Além disso, catalisadores heterogêneos ou homogêneos também são comumente dispensáveis nas reações eletroquímicas. Uma ampla gama de procedimentos pode ser empregada para fabricar eletrodos a partir de materiais que conferem propriedades eletrocatalíticas a esses componentes, possibilitando a otimização do rendimento, da seletividade ou da eficiência energética das reações (YUAN; LEI, 2020). Com base nesses aspectos, uma característica proeminente do uso de reações eletroquímicas na indústria é a promoção de processos mais sustentáveis (ANASTAS; 28 EGHBALI, 2010; YUAN; LEI, 2020). Como a eletricidade é um elemento primordial para converter os substratos em produtos, as transformações eletroquímicas se tornam uma alternativa interessante de armazenar na forma de energia química e transportar por longas distâncias a energia proveniente de fontes renováveis intermitentes, como a energia solar e eólica (WANG; LU; ZHONG, 2021). Dessa forma, a eletroquímica se mostra como uma valiosa ferramenta no design de processos eficientes, mais seguros e sustentáveis em escala industrial. No contexto da indústria de energia, as reações induzidas por eletricidade permitem obter alguns produtos de valor notável. Dentre esses produtos destaca-se o hidrogênio verde, produzido através da eletrólise da água (BREEZE, 2018). Além de compor o gás de síntese (syngas) em misturas com o monóxido de carbono para fornecer compostos oxigenados como o metanol, o hidrogênio é um importante combustível, podendo ser empregado na produção de energia a partir de células a combustível, no abastecimento de transportes terrestres, marítimos ou aéreos e na geração de calor ou eletricidades em plantas domésticas e industriais (DA ROSA; ORDÓÑEZ, 2022). O hidrogênio também desempenha papel fundamental na obtenção de biocombustíveis em processos de desoxigenação de produtos líquidos do processamento de biomassa (LI, D. et al., 2015). A principal rota para produzir hidrogênio é a reforma a vapor de hidrocarbonetos derivados do petróleo. Essa transformação envolve a conversão do gás natural a altas temperaturas, fornecendo uma mistura de hidrogênio e monóxido de carbono. A partir desses produtos, a produção de hidrogênio pode ser elevada através da reação de deslocamento água- gás (water-gas shift), realizada com o auxílio de catalisadores de óxidos metálicos, como Fe2O3, CuO, Al2O3 e Cr2O3 e que resulta na formação de dióxido de carbono como subproduto (DUFOUR et al., 2011). O dióxido de carbono gerado representa um inconveniente do processo, considerando que a maior parcela do gás é liberada para a atmosfera, onde o aumento de sua concentração contribui para intensificar o efeito estufa. No processamento do gás natural, por exemplo, são produzidas 10 toneladas de CO2 por tonelada de H2 obtido (IEA, 2019). Nesse contexto, a eletrólise da água se apresenta como um método alternativo promissor, pois elimina a necessidade do uso de matérias-primas derivadas do petróleo, neutraliza a formação de CO2 e permite realizar o processo em condições mais brandas de reação em meio homogêneo, sem necessidade de catalisadores à base de metais. Além disso, a produção do hidrogênio de baixo carbono através da eletrólise pode ser considerada como uma forma de armazenar energia de fontes renováveis (eólica, solar) em um produto 29 combustível limpo. Uma ampla gama de eletrocatalisadores tem sido avaliada quanto a sua atividade na reação de evolução de hidrogênio e de oxigênio, o que demonstra o crescimento no interesse da indústria nesse tipo de processo eletroquímico (WANG; LU; ZHONG, 2021). No entanto, apenas 2% da produção mundial de hidrogênio tem como base a eletrólise devido, principalmente, ao custo da eletricidade, limitação que pode ser atenuada, direcionando a produção para regiões onde as condições para geração de energia renovável são favorecidas (IEA, 2019). Além das células eletrolíticas, sistemas galvânicos também constituem dispositivos úteis para explorar vias de aplicação da eletroquímica na indústria energética. Neste caso, o principal objetivo é a geração ou armazenamento de energia a partir de mecanismos baseados nas reações de transferência de elétrons. Um exemplo notável de célula galvânica é a célula a combustível, que opera de modo a converter energia química em energia elétrica com eficiência energética, em geral, superior a sistemas tradicionais, como placas fotovoltaicas e aerogeradores. Diferentes tipos de células podem ser construídos, variando condições operacionais, como temperatura, eletrólito e material dos eletrodos. O principal combustível utilizado para alimentar esses dispositivos é o hidrogênio, mas hidrocarbonetos, o metanol e a hidrazina também podem funcionar como combustíveis, dependendo do tipo de célula (MAHAPATRA; SINGH, 2014). Comumente, as células a combustível são associadas em série a fim de atender a demandas energéticas relacionadas tanto a aplicações de pequena escala, para alimentar circuitos de equipamentos eletrônicos, veículos e residências, quanto de grande escala, por exemplo, em centrais de geração de energia. 3.4 ELETRO-VALORIZAÇÃO DE COMPOSTOS DERIVADOS DA BIOMASSA Uma outra vertente de aplicação dos processos eletroquímicos é a transformação de substratos derivados do processamento da biomassa, principalmente de origem lignocelulósica, em produtos de maior valor agregado (DU et al., 2018; LUCAS et al., 2021). Com efeito, a eletrossíntese tem emergido como uma estratégia altamente eficiente para explorar novos padrões de reatividade de vários grupos funcionais e diversificar metodologias de síntese (WIEBE et al., 2018; YAN; KAWAMATA; BARAN, 2017). Por isso, importantes avanços tem sido reportados para o upgrading, de diversas classes de compostos biogênicos, como furanos, aminoácidos, derivados aromáticos da lignina, polióis e ácidos carboxílicos via reações redox promovidas pela eletrocatálise (LUCAS et al., 2021). 30 Particularmente, os ácidos carboxílicos representam uma classe de compostos altamente valiosa para esse propósito. Esse grupo funcional está presente de forma abundante na natureza, compondo unidades fundamentais dos lipídios, principais constituintes dos óleos e gorduras de origem vegetal e animal. Dentre o vasto número de compostos originados do beneficiamento da biomassa, os triglicerídeos e ácidos graxos derivados da sua hidrólise são importantes matérias-primas para a indústria de alimentos, cosméticos, polímeros e biocombustíveis. Dessa forma, transformações que tenham como base a reatividade dos ácidos carboxílicos a fim de produzir intermediários sintéticos de interesse para diversas aplicações são importantes alvos de pesquisa (BIERMANN et al., 2021). Recentemente, abordagens fundamentadas em reações eletrocatalíticas têm sido exploradas para promover a reatividade de ácidos carboxílicos e derivados (LEECH; LAM, 2020). Para os ácidos carboxílicos, o tipo mais comum de transformação em sistemas eletroquímicos é a descarboxilação anódica,gerando espécies radicalares ou catiônicas, que, uma vez formadas, estão propensas a reações de adição radicalar, substituições nucleofílicas e eliminações (figura 2) (SCHÄFER, 2012). Holzhäuser, Mensah e Palkovits (2020) reforçaram o papel dessas reações no contexto da valorização de ácidos biogênicos a partir da discussão dos aspectos gerais de uma série de resultados, que comprovam a eficiência dessas metodologias em converter ácidos de origem renovável em produtos de valor para a indústria. 3.4.1 Eletrodescarboxilação de ácidos biogênicos para produção de biocombustíveis A reação de Kolbe é um dos métodos sintéticos mais antigos para converter compostos orgânicos utilizando eletricidade (KOLBE, 1849). Desde a publicação original, o mecanismo e a seletividade da reação foram amplamente investigados (SCHÄFER, 1990; ANDRIEUX; GONZALEZ; SAVÉANT, 2001; KLOCKE et al., 1993). Nesses sistemas, íons carboxilatos são oxidados em uma superfície anódica eletroativa e, após a descarboxilação, radicais de carbono são formados (figura 2). Esses radicais são capazes de participar de diferentes tipos de reação. A primeira possibilidade é a formação de ligações C-C a partir da dimerização (caminho A). Na presença de ácidos carboxílicos de naturezas distintas no meio reacional, o acoplamento de radicais de origens diferentes também é possível (caminho B). Além disso, produtos de reações de desproporção, gerando compostos de cadeia saturada e insaturada (caminho C), ou de adição dos radicais diretamente a espécies deficientes em elétrons (caminho D) podem ser obtidos a partir da reação de Kolbe. 31 Figura 2 – Mecanismo da reação de Kolbe Fonte: elaborado pela autora (2022). Dependendo do material do anodo e da estrutura do substrato, um processo de dois elétrons também é possível. Neste caso, os radicais são oxidados no eletrodo de trabalho, resultando na formação de um intermediário carbocátion, que poderá se envolver em rearranjos, eliminações ou substituições nucleofílicas, gerando produtos como alquenos, éteres ou álcoois na presença de solventes alcoólicos ou água, respectivamente (produtos de Hofer-Moest) (figura 2). Os produtos formados a partir dos intermediários radicalares são denominados de produtos de Kolbe. Já os compostos derivados do mecanismo de dois elétrons são conhecidos como produtos de não-Kolbe. Recentemente, um número considerável de exemplos vem demonstrando a aplicabilidade da reação de (não-)Kolbe na conversão de diversos ácidos carboxílicos de origem renovável em hidrocarbonetos ou em produtos de maior valor agregado (HOLZHÄUSER; MENSAH; PALKOVITS, 2020). Um aspecto interessante desses protocolos é a possibilidade de serem utilizados como etapas complementares no processamento da biomassa para obter combustíveis. Por exemplo, correntes ácidas geradas a partir dos processos de fermentação de biomassa de milho puderam ser transformadas em misturas de alcanos com potencial para aditivos do diesel (HARNISCH et al., 2017). Além disso, o eletro-upgrading de efluentes 32 ácidos produzidos durante a liquefação hidrotérmica de biomassa residual permitiu obter hidrocarbonetos voláteis que podem ser usados como substitutos do gás natural para geração de energia para alimentar o processo (LOPEZ-RUIZ et al., 2020). Entretanto, a baixa concentração dos ácidos nas correntes residuais pode limitar a eficiência energética da reação de Kolbe, o que foi relatado na tentativa de tratar soluções aquosas de ácido acético obtidas como subprodutos do processo de Fischer-Tropsch. Neste caso, o alto consumo de energia e uma eficiência de corrente menor que 5% foram observadas (AHAD; KLERK, 2018). Apesar de ainda representarem processos em estágios primários de desenvolvimento, na maioria dos casos, estudados em escala de laboratório, a ideia de incluir a reação de Kolbe como etapa em biorrefinarias é atrativa devido à diversidade de matérias-primas renováveis que podem ser convertidas em produtos valiosos para a indústria química e de combustíveis através da eletrólise (PALKOVITS, S.; PALKOVITS, R., 2019). Nesse sentido, resultados promissores foram demonstrados empregando a química de (não-)Kolbe na conversão do ácido levulínico, derivado da hidrólise da celulose, e do ácido valérico, produto da sua redução. Esses compostos são importantes plataformas para a síntese de biocombustíveis compatíveis com a infraestrutura de transportes (LANGE et al., 2010; SERRANO-RUIZ; DUMESIC, 2011). Nilges e colaboradores (2012) reportaram a síntese da 2,7-octanodiona a partir da descarboxilação anódica do ácido levulínico com a seletividade de 47% e eficiência de Coulomb de 86% em condições amenas de reação (figura 3). Esse composto pode ser convertido em combustíveis em potencial por meio de duas abordagens distintas, que levaram à produção do n-octano ou de uma mistura de alcanos cíclicos ramificados com pontos de ebulição na faixa da gasolina e octanagem (estimada em termos de RON, do inglês, Research Octane Number) de 89, considerando 10% de etanol (NILGES et al., 2012; SANTOS et al., 2015; WU et al., 2017). Figura 3 – Esquema reacional da eletrodescarboxilação do ácido levulínico Fonte: adaptado de NILGES et al. (2012) Além da oxidação direta através da reação de Kolbe, a eletro-redução da carbonila de cetona do ácido levulínico fornece o ácido valérico, que também pode ser convertido no n- 33 octano a partir da dimerização de Kolbe (figura 4) (NILGES et al., 2012). A baixa seletividade dessa transformação representa uma limitação do protocolo reacional, já que o 1- butanol e o valerato de etila foram detectados como subprodutos. Nesse sentido, a utilização de um sistema em fluxo permitiu reduzir as reações indesejadas e elevar a seletividade para hidrocarbonetos de 50% para 81% (SANTOS et al., 2015). Figura 4 – Esquema reacional da eletrodescarboxilação do ácido valérico Fonte: adaptado de NILGES et al. (2012) A seletividade das reações de (não-)Kolbe está fortemente relacionada a aspectos reacionais como a natureza da superfície anódica e da solução eletrolítica. Por exemplo, a conversão do ácido valérico utilizando um eletrodo de boro dopado com diamante (BDD) forneceu éteres C4 com 96% de seletividade em solução metanólica de KOH. No entanto, a substituição do KOH pelo NaClO4 suprimiu completamente a descarboxilação, fornecendo apenas o produto de esterificação do ácido (LIU et al., 2018). Já em meio aquoso, o papel da solução eletrolítica na conversão do ácido valérico via eletrólise de Kolbe foi discutido por Harnisch e Stang (2015), que concluíram que, neste caso, o pH não afeta a eficiência da reação e que a presença de um sal inerte como o Na2SO4 contribuiu para o aumento da taxa de consumo do material de partida. Além de ácidos de cadeia curta e dos ácidos levulínico e n-valérico, o eletro- upgrading através de um protocolo reacional de não-Kolbe pode ser realizado partindo do ácido 3-hidroxidecanóico, derivado de resíduos da fermentação da glicose e xilose. Nesse caso, uma mistura de oxigenados C9 foi obtida com 71% de rendimento total a partir da eletrólise do substrato em solução de metanol, utilizando o KOH como eletrólito auxiliar. A conversão do hidroxi-ácido também foi demonstrada com sucesso diretamente em um meio reacional composto por uma mistura de caldo fermentativo diluído e metanol (15:85), permitindo obter os produtos com 61% de rendimento. Notavelmente, os autores ressaltaram, ainda, que a mistura de oxigenados possui propriedades, como número de cetano e ponto de flash, que atendem aos valores especificados na norma EN590, sugerindo que os produtos de não-Kolbe avaliados representam candidatos promissores a aditivos do diesel (MEYERS et 34 al., 2019). Ademais, o aumento em 5 vezes da produção por hora dos produtos da conversão do ácido 3-hidroxidecanóicofoi reportado, utilizando um sistema contínuo (KURIG et al., 2021). Ambas as abordagens de reação descritas anteriormente indicam que, mesmo com baixa seletividade, os diversos produtos resultados da eletrólise podem oferecer alternativas de interesse para aplicação em biocombustíveis, independente dos grupos funcionais que os constituem. Além disso, melhoras na produtividade das reações, permitindo processos cada vez mais eficientes do ponto de vista energético, são alcançadas explorando reatores em fluxo. Esses dois aspectos são vertentes de pesquisa que contribuem para superar desafios comuns associados à química de (não-)Kolbe para aplicações em larga escala, como a dificuldades para purificação devido a seletividade limitada das reações e a otimização da eficiência energética (PALKOVITS, S.; PALKOVITS, R., 2019). Outros ácidos orgânicos derivados da biomassa, como o ácido iso-valérico, ácido 4- etoxi-4-oxobutanóico e o ácido 4-metoxi-3-metil-4-oxobutanóico, também funcionaram como blocos de construção para acessar produtos de valor para aplicação como aditivos da gasolina ou do diesel, através de uma série de acoplamentos cruzados em condições de eletrólise de Kolbe (figura 5) (HOLZHÄUSER et al., 2019). Os resultados demonstram que o eletro- upgrading de ácidos com estruturas diversas através da reação de Kolbe também representa uma possibilidade de reação para obter biocombustíveis em potencial, expandindo o portfólio de substratos viáveis para esse tipo de transformação. 35 Figura 5 – Acoplamento cruzado de radicais de di-ácidos biogênicos Fonte: adaptado de HOLZHÄUSER et al. (2019) A produção de hidrocarbonetos a partir da eletrólise de ácidos graxos também está bem fundamentada na literatura. A tabela 2 apresenta os principais resultados obtidos através desses sistemas, auxiliando na compreensão dos aspectos que governam a seletividade e eficiência desse tipo de reação. Rangarajan, Velayutham e Noel (2011) reportaram a influência de variáveis associadas ao sistema eletroquímico, como material do anodo, quantidade de carga e densidade de corrente, na seletividade da descarboxilação do octanoato de sódio (entradas 1 e 2, tabela 2). Dentre esses parâmetros, a superfície anódica se mostrou decisiva para definir a distribuição dos produtos. A utilização de um anodo de grafite permitiu obter exclusivamente produtos de não-Kolbe, majoritariamente, álcoois C7. Nas condições investigadas, uma mistura de ésteres isômeros do octanoato de heptila também foi observada, resultado da reação do íon carboxilato com o carbocátion formado após a descarboxilação e rearranjos sucessivos. Esses resultados ilustram a dificuldade de induzir a seletividade no caminho reacional de 2 elétrons, o que é esperado para sistemas em que há a formação do intermediário carbocátion (figura 2). Modificando o material do anodo para a platina, a produção do alcano C14 foi favorecida, permitindo obter esse composto com rendimento de até 98% apesar da conversão inferior a 70% em todas as condições estudadas. 36 Tabela 2 – Condições experimentais para conversão de ácidos graxos via reações de Kolbe e (não-)Kolbe entrada substrato anodo condições experimentais Conversão (%) Principais produtos (rend.) 1 n-C7COOH grafite MeOH/H2O (40% v/v), LiClO4 (10 mol%), 4 F mol-1, 400 mA cm-2 38,6% 2-heptanol (17,1%) 2 n-C7COOH Pt MeOH/H2O (40% v/v), LiClO4 (10 mol%), 1-10 F mol-1, 200- 600 mA cm-2 30-66,4% n-C14 (22,3-98%) 3 n-C7COOH Pt@Ir sol. aquosa 0,5 M de ácido e 0,5 M KOH, 0,25 A cm-2, 1 F mol-1 - hidrocarbonetos C7 e C14 (49,5%) 4 n-C7COOH nano Pt sol. aquosa 0,5 M de ácido e 0,5 M KOH, 0,25 A cm-2, 1 F mol-1 - hidrocarbonetos C7 e C14 (27,8%) 5 n-C7COOH Pt@TS sol. aquosa 0,5 M de ácido e 0,5 M KOH, 0,25 A cm-2, 1 F mol-1 - hidrocarbonetos C7 e C14 (60%) 6 n-C7COOH nano Pt sol. aquosa 0,5 M de ácido e 0,5 M KOH, 0,25 A cm-2, 1 F mol-1 - hidrocarbonetos C7 e C14 (35%) 7 n-C7COOH Pt piridina:MeOH:MeCN (1:1:2), ciclohexano, sol. saturada de KOH, 48 °C, 25 mA cm-2 n.r. n-C14 (95%) 8 Mistura de ácidos n-C5- C10COOH Pt sol. aquosa KOH, pH 9-10, fluxo de 10-30 mL min-1, 1,6-2,8 kA m-2. Microrreator eletroquímico flexível. quant. n-alcanos (96,6%) 1-olefinas (3,2%) 9 Mistura de ácidos n- C6COOH, isononanóico, C17COOH Pt sol. aquosa KOH, pH 9-10, fluxo de 20 mL min-1, 2,85 kA m-2. Microrreator eletroquímico flexível. quant. hidrocarbonetos parafínicos ramificados (98%) 10 Mistura de ácidos n-C4- C10COOH Pt sol. aquosa 1,5-2 M de n- alcanoatos, pH 9,3-10, tempo de residência 0,83 s, 2 kA m-2. Microrreator em fluxo. 99% n-alcanos C8-C20 (94-95%), n- alquenos C4-C9 (2,4-3,2%) 11 n-C17COOH (esteárico e oleico) Grafite 0,025-0,25 M de ácidos em MeOH ou EtOH, sol. equimolar de KOH, 17 mA cm-2, 4 Farad equiv >95% C17 olefinas e éteres (70:30) 12 óleo de colza Grafite 0,025-0,25 M de óleo em água, sol. equimolar de KOH, ultrassom, 3 V no eletrodo de trabalho, 2 Farad equiv 50% olefinas 13 ácido acético e ácido 10- undecilênico Ir, Pt, liga Pt- 10%Ir, grafite, grafite pirolítico, carbono vítreo 0.017–0.027 M ácido 10- undecilênico, 0,078-0,08 M ácido acético, 0,0078 M NaOAc, 0,015-0,025 A cm-2, 50 °C n.r. 3-metildodecano (58%), mistura de alcanos, olefinas e álcoois Fonte: elaborado pela autora (2022). mailto:Pt@TS 37 Dada a maior seletividade para hidrocarbonetos frente à superfície da platina e considerando o alto custo desse material, uma série de estudos se dedicou ao design de eletrodos à base de nanoestruturas de platina em cooperação com outros metais para promover a produção de alcanos a partir do ácido n-octanóico em meio aquoso (entradas 3-6, tabela 2). Os exemplos incluem anodos de Pt nanoestruturada em suportes de substratos porosos 3D, em sinergia com metais como titânio (suporte de esponja de Ti, Pt@TS) ou irídio (nanopartículas core-shell Pt@Ir) (WANG et. al., 2020; WANG et. al., 2019). Notavelmente, a própria estrutura cristalina dos eletrodos nanoestruturados compostos apenas pela Pt também se mostrou um fator importante para favorecer o mecanismo de 1 elétron (entradas 4 e 6, tabela 2) (XU et al., 2021; YUAN et al., 2020). Empregando esses anodos, misturas de alcanos C7 e C14 foram produzidas com até 60% de rendimento, o que representa resultado promissor, considerando que uma quantidade reduzida de platina foi necessária para fabricar os eletrodos nanoestruturados em comparação com as superfícies convencionalmente utilizadas nas transformações de Kolbe. Além disso, os protocolos reportados foram conduzidos em meio aquoso, facilitando a separação dos produtos da solução eletrolítica. Além dos eletrodos, o sistema de solvente-eletrólito utilizados nas reações de (não- )Kolbe também é um parâmetro de estudo de elevada importância. Para a maior parte das aplicações, o metanol é empregado devido a sua resistência à oxidação nas condições da eletrólise, o que é consequência do acúmulo dos íons carboxilatos na superfície do anodo (SCHÄFER, 1990). Uma alternativa ao uso do metanol tem sido realizar as reações em meio aquoso, sobretudo, para a produção de hidrocarbonetos. A principal vantagem da água como solvente durante a eletrólise é permitir a separação dos compostos apolares espontaneamente do meio reacional, permitindo o reuso da solução eletrolítica sem que seja necessário incluir no processo etapas elaboradas de separação ou purificação (HARNISCH; SCHRÖDER, 2019). No entanto, a baixa solubilidade dos ácidos de cadeia longa em solventes polares se torna um desafio a essa abordagem. Nesse sentido, Okada, Kamimura e Chiba (2012) demonstraram, em um exemplo pouco usual, a utilização de um sistematermomórfico de solventes composto por 1:1:2 (em volume) de metanol, piridina e acetonitrila e igual volume de ciclohexano para converter o ácido n-octanóico no dímero C14. A mistura de solventes foi eficaz para promover a reação com um rendimento de 95% em um sistema homogêneo a 48 °C. Com o resfriamento do meio reacional até 25 °C, a separação espontânea de duas fases permitiu recolher os produtos isolados da solução eletrolítica, provando a viabilidade de utilizar o sistema termomórfico como alternativa aos solventes convencionais apesar de serem ainda pouco explorados nesse tipo de transformação. 38 O melhoramento das condições reacionais para produção de hidrocarbonetos a partir de fontes renováveis, como os ácidos graxos, a partir da reação de (não-)Kolbe tem como um de seus principais objetivos viabilizar a adaptação dos protocolos reacionais desenvolvidos em escala de laboratório para a escala industrial. Com base nessa premissa, microrreatores eletroquímicos capazes de operar em fluxo contínuo foram desenvolvidos, representando avanços importantes que contribuem para a concepção de processos eletrodescarboxilativos em maiores escalas (entradas 8-10, tabela 2) (ZIOGAS et al., 2020; ZIOGAS; PENNEMANN; KOLB, 2020). Por exemplo, Ziogas, Pennemann e Kolb (2020) aplicaram um microrreator eletroquímico em fluxo para produzir alcanos na faixa do diesel ou de combustível de aviação a partir da eletrólise de Kolbe de misturas pré-calculadas de ácidos graxos com diferentes números de carbono (entradas 8 e 9, tabela 2). A partir dessa estratégia, a produção dos hidrocarbonetos pode prosseguir com eficiência de Faraday superior a 70% e excelentes rendimentos, evidenciando a possibilidade de aplicar as condições de Kolbe para o acoplamento de radicais originados de substratos distintos, produzindo misturas de alcanos com número de carbonos na faixa correspondente à aplicação desejada. O hetero-acoplamento de radicais também foi estudado por Stepanov e colaboradores (2013), que utilizaram uma série de eletrodos para promover a conversão de soluções contendo ácido 10-undecilênico e ácido acético em uma mistura complexa de produtos, sendo o 3-metildodecano o componente majoritário, obtido com 58% de rendimento (entrada 13, tabela 2). O ácido 10-undecilênico é encontrado no óleo de rícino e apresenta insaturações na sua estrutura. A reação entre os radicais metila e os radicais derivados do ácido de cadeia longa insaturada suprimiu a formação do dímero com 20 carbonos na cadeia. Esse fator torna- se importante no eletro-upgrading de ácidos graxos de cadeias longas para uso como biocombustíveis, já que compostos parafínicos de alta massa molecular possuem altos pontos de ebulição e viscosidade elevada, o que os torna inviáveis para esse tipo de aplicação (ZHANG; LIU; WU, 2018). Nesse sentido, em um estudo sem precedentes, Schröder e colaboradores (2015) reportaram a síntese de alcenos e éteres, produtos de não-Kolbe, a partir da eletrólise de ácidos graxos C18 e de triglicerídeos, utilizando eletrodos de grafite. A mistura de produtos contendo 70% de alcenos, obtida através da conversão dos ácidos oleico e esteárico, apresentou ponto de ebulição e poder calorífico inferior estimados semelhantes ao diesel fóssil. Além disso, utilizando uma metodologia complementar, os autores demonstraram a eletrólise direta de uma emulsão de óleo de colza em um potencial de 3 V, fornecendo alcenos com 20% de eficiência de Coulomb. No entanto, a conversão do substrato se manteve em 39 50%, provavelmente, devido a presença de glicerol como subproduto eletroativo da hidrólise dos triglicerídeos. Notavelmente, os autores estimaram que a razão entre a energia empregada para a conversão química dos substratos e a energia contida nos produtos das sínteses eletro- orgânicas pode se equiparar à da produção de biodiesel e à do hidrotratamento, especialmente no caso das reações de descarboxilação dos triglicerídeos em meio aquoso, demonstrando a utilidade da reação de não-Kolbe para acessar produtos de interesse para a indústria de biocombustíveis. Apesar disso, a utilização de eletrodos de grafite de baixo custo para promover a descarboxilação de ácidos biogênicos ou óleos vegetais com o objetivo de produzir misturas com propriedades de combustível permanece pouco explorada. De acordo com o levantamento bibliográfico realizado até o momento, as metodologias de reação para obtenção de misturas de alquenos e éteres a partir de ácidos graxos limitam-se a esses exemplos (SCHRÖDER et al., 2015). No entanto, a conversão de um escopo reduzido de ácidos graxos puros é descrita. Considerando que o perfil graxo de óleos vegetais promissores no contexto da produção de biocombustíveis contém triglicerídeos compostos por ácidos com número de carbonos majoritariamente na faixa C12 a C18 (apenas números pares), demonstrar a eletro-conversão desses ácidos graxos contribui para preencher a lacuna e investigar a viabilidade desse tipo de processo aplicado a biomassas com composições de elevado interesse para produção de biocombustíveis (DEMIRBAŞ, 2003). 40 4 MATERIAL E MÉTODOS Todos os reagentes e solventes foram obtidos comercialmente e utilizados sem etapas adicionais de purificação. Para as reações de eletrólise, eletrodos de platina com dimensões de 10 mm × 10 mm × 0,1 mm e de grafite com dimensões de 10 mm × 50 mm × 3 mm foram utilizados (figura 6). Durante a eletrólise, a superfície submersa do grafite correspondeu às dimensões de 10 mm × 20 mm × 3 mm. Os experimentos em potencial constante foram conduzidos empregando uma fonte de alimentação DC de bancada (Politerm, POL-16C) em uma cela eletroquímica composta de um tubo de vidro (9 cm, Ø 2 cm); fios conectores do tipo jacaré; eletrodos com distância entre si de 8 mm, suportados por fios de material condutor e fixados a partir de uma peça de ácido polilático fabricada em impressora 3D; e agitador magnético. A figura 7 ilustra a montagem da célula eletroquímica. Os eletrodos de grafite adquiridos comercialmente foram submetidos a um procedimento de limpeza da superfície, utilizando uma lixa d’água grão 600. Em seguida, permaneceram mergulhados no banho ultrassônico por 15 minutos em ácido sulfúrico (ISOFAR, 98%) e, então, por 10 minutos em água destilada. Para o eletrodo de platina, apenas a etapa de limpeza utilizando o banho ultrassônico foi necessária. Após as reações, as superfícies foram lavadas com água destilada ou submetidas à limpeza nas duas etapas citadas anteriormente em caso de depósito de ácido nas superfícies durante a reação. Figura 6 – Materiais utilizados para construção da cela eletroquímica Fonte: arquivo da autora (2021). 41 Figura 7 – Esquema representativo da célula eletroquímica utilizada para eletrodescarboxilação de ácidos graxos Fonte: elaborado pela autora (2022). 4.1 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS 4.1.1 Eletrodescarboxilação do ácido láurico Procedimento padrão (tabela 3, entrada 1): em um tubo de vidro, foram adicionados ácido láurico (160 mg, 0,8 mmol, 1 equiv) e 9,0 mL de metanol (Dinâmica, 99,8%). A essa mistura, foram adicionados 1,0 mL de uma solução preparada dissolvendo-se hidróxido de potássio (Quimex, 85%; 448 mg, 8,0 mmol) em 10 mL de metanol. A reação foi mantida a temperatura ambiente, sob agitação, até completa dissolução do ácido. Em seguida, a fonte foi conectada aos eletrodos (anodo de grafite e catodo de platina) e o potencial constante de 10 V foi aplicado à cela eletroquímica por 3 horas a temperatura ambiente. No curso da reação, a temperatura do sistema se elevou até 35 °C (aferidos com um termômetro de mercúrio), mantendo-se constante por meio de um banho de água a temperatura ambiente. Para determinar a conversão do ácido láurico nas reações apresentadas na tabela 3,
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