Prévia do material em texto
FACULDADE ESTÁCIO – CAMPUS NATAL CURSO DE DIREITO TEORIA DA DECISÃO JURISDICIONAL E RECURSOS NO PROCESSO CIVIL 2022.2 AULA 01 – TEORIA GERAL DOS RECURSOS NO PROCESSO CIVIL: PARTE 01 Docente: Fernando Gomes Júnior TEORIA GERAL DOS RECURSOS NO PROCESSO CIVIL (PARTE 01): CONCEITO, FUNDAMENTOS, CLASSIFICAÇÃO E PRINCÍPIOS 1. Conceito: recurso é o instrumento processual passível de ser utilizado pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado ou pelo Ministério Público que visa impugnar uma decisão judicial, objetivando que esta seja submetida a um novo julgamento, culminando em sua reforma, modificação, invalidação ou esclarecimento pela autoridade hierarquicamente superior (em regra) ou pelo próprio órgão prolator da decisão, dentro de uma mesma relação processual. • OBS1: quanto à natureza jurídica dos recursos, prevalece o entendimento de que não são meios autônomos de impugnação da decisão, pois são apresentados dentro da mesma relação processual, diferente do que se observa em ações autônomas, por vezes ajuizadas em face de decisões contra as quais não se cabe mais recurso, a exemplo da Ação Rescisória. 2. Fundamentos dos recursos 2.1 Inconformismo do ser humano: necessidade de modificação do julgado. 2.2 Falibilidade humana: possibilidade de o magistrado errar no julgamento. • OBS1 – Reforma e invalidação da decisão e os possíveis erros do Juiz: um dos objetivos do recurso é a reanálise da decisão no processo, disciplinando a doutrina que o Juiz poderá cometer erros, que se classificam como: I – Error in judicando: é o equívoco cometido no julgamento da causa pelo Magistrado, que, na visão da parte recorrente, proferiu decisão errada e injusta. Quando alegado error in procedendo no recurso, tem-se o objetivo de questionar o conteúdo jurídico da decisão. II – Error in procedendo: nesta situação, o recorrente constrói a tese de que o Juiz errou na condução do processo, buscando demonstrar a falta de observância de uma formalidade na decisão, apontando para um defeito, com o objetivo de invalidá-la. 2.3 Aprimoramento das decisões judiciais: tornando-as mais eficazes. • OBS1 – Esclarecimento e integração da decisão: o aprimoramento das decisões judiciais, por meio de recursos, pode demonstrar a necessidade de que elas sejam esclarecidas ou integradas. I – Esclarecimento: faz-se necessário quando a decisão é contraditória ou obscura, recorrendo-se com o objetivo de deixá-la com maior clareza. II – Integração: quando a decisão se mostra incompleta, o recurso pode ter o objetivo de fazer com que ela seja completada. 2.4 Controle das decisões judiciais pelas instâncias superiores: as quais podem modificar o julgado, visando, com isso, a uniformização da jurisprudência. 3. Classificação dos Recursos 3.1 Quanto à finalidade 3.1.1 Ordinários: objetivam impugnar todos os capítulos da decisão e corrigir os erros de procedimento e os de julgamento, discutindo-se não só as matérias de direito, mas, também, a questão fático-probatória. Ex.: Apelação, Embargos de Declaração, Agravo de Instrumento etc. 3.1.2 Extraordinários: visam à impugnação de matérias de ordem constitucional, com o objetivo de uniformizar a interpretação da legislação federal e da CF. Ex.: Recurso Especial, Recurso Ordinário Constitucional, Recurso Extraordinário etc. 3.2 Quanto à fundamentação 3.2.1 De livre fundamentação: a matéria nele alegada pode ser livre, não exigindo a lei que o recorrente aponte erro ou vício específico, a exemplo da Apelação. 3.2.2 De fundamentação vinculada: são os que a lei exige que seja apontado um vício específico, preencha um determinado pressuposto ou faça a impugnação de certa matéria da decisão, como é o caso do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário. 3.3 Quanto ao inconformismo (art. 1.002, CPC) 3.3.1 Total: neles, o recorrente impugna totalmente a decisão recorrida, objetivando modifica-la por inteiro. 3.3.2 Parcial: verifica-se quando, no recurso, busca-se a modificação de parte da decisão, mantendo-se inalterada em algum ou alguns aspectos. 4. Princípios recursais 4.1 Princípio da Legalidade ou Taxatividade (art. 994, CPC): todos os recursos deverão estar previstos no ordenamento jurídico vigente, de forma que as partes não poderão criar recursos, tendo em vista que é competência da União legislar sobre direito processual (art. 22, I, CF/88). Assim, são previstos no CPC os recursos de Apelação, Agravo de Instrumento, Agravo interno, Embargos de Declaração, Recurso Ordinário, Recurso Especial, Recurso Extraordinário, Agravo em Recurso Especial ou Extraordinário e Embargos de Divergência. 4.2 Princípio do Duplo grau de Jurisdição: esse princípio defende a ideia do direito à parte recorrente de um novo julgamento da decisão impugnada. Não encontra previsão expressa na CF/88, mas decorre de interpretação sistemática do ordenamento jurídico vigente. Com efeito, compete às leis infraconstitucionais a definição das regras processuais. 4.1.2 Duplo grau de jurisdição e Remessa Necessária (art. 496, CPC) a) Conceito: também chamado de Reexame Necessário, Remessa obrigatória, Recurso de Ofício ou Duplo grau de jurisdição obrigatório, é o fenômeno por meio do qual o processo julgado em primeiro grau de jurisdição deve subir para o segundo grau de maneira obrigatória, independentemente de oferecimento de recurso pelas partes, quando a ação envolver a Fazenda Pública, respeitados os requisitos legais. Assim, a decisão somente produzirá efeitos depois de confirmada pelo Tribunal, que poderá avocar os autos caso o Juízo de origem não o encaminhe (art. 496, §1º, CPC). b) Requisitos b.1) Condenação da Fazenda Pública ou procedência dos Embargos à Execução Fiscal (art. 496, I e II, CPC): a Remessa Necessária ocorrerá quando algum dos Entes de Direito Público da Administração Pública for condenada, em sentença, ao pagamento de valor pecuniário, ou quando mover uma execução fiscal e o executado for vencedor nos embargos. Os Entes sujeitos ao Reexame Necessário são: União, Estados, Distrito Federal, Municípios e suas Autarquias e Fundações de Direito Público. b.2) Inexistência de impedimento legal (art. 496, §§ 3º e 4º, CPC): a lei traz exceções à incidência do Reexame Necessário, que não ocorrerá em qualquer condenação da Fazenda Pública. Os impedimentos podem ser classificados em dois: I – Impedimento pecuniário (§3º): não ocorrerá a remessa quando a condenação ou o proveito econômico obtido for de valor certo e líquido INFERIOR a: I.1 – 1.000 (mil) salários-mínimos: quando for condenada a União ou suas autarquias e fundações de direito público. I.2 – 500 (quinhentos) salários-mínimos: se condenado o Estado ou o Distrito Federal, bem como suas autarquias e fundações de direito público, além de Municípios que sejam capitais de Estados. I.3 – 100 (cem) salários-mínimos: para os demais municípios. II – Impedimento jurisprudencial (§4º): quando a decisão estiver em consonância com Súmula de Tribunal Superior, com acórdão proferido em julgamento de Recursos Repetitivos no STF e no STJ, com entendimento firmado em IRDR ou assunção de competência e com orientação vinculante no âmbito administrativo do próprio Ente, também não incidirá o reexame. 4.3 Princípio da Fungibilidade ou Conversibilidade recursal: é a possibilidade do conhecimento de um recurso erroneamente interposto como se fosse o recurso cabível (Princípio da Instrumentalidade das formas – arts. 188 e 277 do CPC). Entretanto, para que esse princípio seja aplicado na prática, a doutrina e a jurisprudência elencam três requisitos cumulativos: 4.3.1 Inexistência de erro grosseiro ou de má-fé: para viabilizar a fungibilidade. Há erro grosseiro quando a lei expressamente prevê um recurso e a parte interpõe outro apelo recursal. 4.3.2 Existência de dúvida objetiva (na doutrinae na jurisprudência): sobre qual recurso utilizar. Não se trata da dúvida subjetiva do advogado a respeito do correto recurso a ser manejado em face de certa decisão, mas sim da existência de fundada discussão doutrinária e jurisprudencial acerca de qual recurso cabível para a decisão. 4.3.3 Observância do prazo do recurso correto: sendo diferentes os prazos e ultrapassado o prazo do recurso que se desejava interpor, não será aplicada a fungibilidade. 4.4 Princípio da Unirrecorribilidade, da Singularidade ou da Unicidade recursal: esse princípio defende a ideia do cabimento de um único recurso para cada decisão proferida. Parcela da doutrina entende que esse princípio comporta exceções, quais sejam: Embargos de declaração e recurso principal; Recurso Especial e Recurso Extraordinário. 4.5 Princípio proibição da reformatio in pejus (non reformatio in pejus): a parte recorrente não poderá ter a sua situação agravada no julgamento de um recurso por ela interposto (art. 1.008, CPC – efeito substitutivo dos recursos – o julgamento de um recurso substituirá a decisão recorrida na parte que foi objeto de impugnação). • OBS1: atualmente, prevalece o entendimento de que esse princípio não é absoluto, comportando a seguinte exceção: I – Matérias de ordem pública: as chamadas objeções processuais (aquelas que devem ser reconhecidas de ofício pelo juiz e que podem ser alegadas em qualquer tempo e grau de jurisdição) poderão modificar o julgado em desfavor do recorrente (ex.: ausência de condições da ação ou de pressupostos processuais, prescrição ou decadência etc). 4.6 Princípio da Voluntariedade: os recursos devem ser interpostos pelas partes, de forma voluntária. É corolário do Princípio da Inércia, contendo exceção na remessa necessária, mencionada acima. • OBS1 – Desistência do recurso (art. 998, CPC): por não ser obrigatória a interposição de recurso, a parte recorrente também está desobrigada de continuar com o processamento do apelo, podendo, assim, desistir do recurso. A desistência pode se dar a qualquer tempo e não precisa da anuência do recorrido ou dos litisconsortes. Entretanto, a desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos. 4.7 Princípio da Dialeticidade/Discursividade: ensina que cabe ao recorrente fundamentar suas razões recursais conforme seu inconformismo, apontando os capítulos da decisão que pretende reformar, possibilitando à parte contrária contrarrazoar o recurso. 4.8 Princípio da Primazia do Julgamento do Mérito Recursal (art. 932, parágrafo único, CPC): é corolário do primado contido no art. 4º do CPC (Primazia do Julgamento de Mérito), ensinando que o órgão julgador deverá, em caso de ausência de requisitos do recurso apresentado, intimar a parte para consertar o vício, no prazo de 5 dias, para que se dê prioridade ao julgado do mérito recursal.