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INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E COMUNICAÇÃO – ICSC CURSOS: LETRAS LICENCIATURA EM LÍNGUA PORTUGUESA E LÍNGUA INGLESA LETRAS BACHARELADO EM TRADUÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA E LÍNGUA INGLESA COORDENAÇÃO GERAL: PROF. Dra. ROSELI GIMENES SEMIÓTICA 2022 Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a)! Os estudos semióticos contribuem para a compreensão das linguagens e seus processos de construção de sentido. Há uma diversidade de perspectivas teóricas que tratam das questões relacionadas ao processo de construção de sentido. Nosso objetivo, nesta disciplina consiste em instrumentalizá-lo sobre as perspectivas semiótica e o processo de construção de sentido dos textos imagéticos, visuais e verbais (multimodais) e proporcionar o contato do aluno com a base teórica e metodológica para a análise dos textos multimodais. Inicialmente apresentaremos a introdução aos estudos semióticos, o conceito de semiótica, signo e semiose. A partir dessa abordagem inicial, apresentaremos a perspectiva da semiótica discursiva de linha francesa e o percurso gerativo de sentido. Em seguida trataremos do conceito da semiótica da cultura e da semiótica de linha Peirceana (Charles Sanders Peirce) e sua aplicabilidade em textos diversos. Por fim, trataremos da semiótica social de linha inglesa, por meio da multimodalidade e da gramática da sintaxe visual. Importante considerar que a proposta da disciplina semiótica é a construção de sentido de textos com base nas diversas perspectivas semiótica e para isso retornaremos a alguns aspectos teóricos que já formam vistos em outras disciplinas do curso e nosso objetivo consiste em que vocês se apropriem desse conhecimento para realizar as atividades práticas propostas por seu professor. A - CONTEÚDOS A SEREM EXIGIDOS NAS AVALIAÇÕES CONTEÚDOS LEITURAS BÁSICAS Módulo 1 - Introdução aos estudos semióticos. Conceito de Semiótica. O signo e a semiose. S33emiótica Peirceana. Semiótica Peirceana: A incompletude do signo. Semióitca Peirceana e aplicação em textos diversos. SANTAELLA, L. O que é semiótica. São Paulo, Brasiliense, 2003. _____________. Semiótica Aplicada. São Paulo: Pioneira homson Learning. Paulus, 2005. _____________. A Teoria Geral dos Signos: semiose e autogeração. São Paulo: Editora Ática, 2005. Módulo 2 – Semiótica discursiva de Linha Francesa. Conceitos introdutórios. BARROS, D.L.P. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática, 2000. FIORIN, J.L. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto, 2005. Módulo 3 – Semiótica discursiva de Linha Francesa - O percurso narrativo do sentido. O quadrado semiótico. LANDOWSK, Eric. A Sociedade Refletida. São Paulo: Pontes,1992. BARROS, D.L.P. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática, 2000. Módulo 4 – Semiótica da Cultura FERRARA, L. A. Semiosfera do espaço vazio. In: MACHADO, I. (Org.). Semiótica da cultura e semiosfera. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2007, p. 10. Módulo 5 - Semiótica Social e Textos Multimodais na perspectiva da Análise de Discurso Crítica e Globalização e a Multimodalidade. VIEIRA, J.A. ET. AL. Discursos nas Práticas Sociais: Perspectivas em Multimodalidade e em Gramática Sistêmico-Funcional. São Paulo: Annablume, 2010. Módulo 6- Multimodalidade e Gramática do Design Visual VIEIRA, J.A. ET. AL. Discursos nas Práticas Sociais: Perspectivas em Multimodalidade e em Gramática Sistêmico-Funcional. São Paulo: Annablume, 2010. Módulo 7 – Semiótica Social: Multimodalidade e a relevância da recontextualização na perspectiva da Análise de Discurso Crítica. VIEIRA, J.A. et Al. Reflexões sobre a Língua Portuguesa: Uma abordagem multimodal. Petrópolis-RJ: Vozes, 2007. Módulo 8 - Semiótica Social: análise por meio das Vozes da Globalização. Artigos produzidos na perspectiva da Semiótica Social e ADC. VIEIRA, J.A. et Al. Olhares em Análise de Discurso Crítica. Ebook. B - AVALIAÇÕES Como é de seu conhecimento, você realizará uma série de avaliações, cabendo a você tomar conhecimento do calendário dessas avaliações e da marcação das datas das suas provas, dentro dos períodos especificados no manual de informações acadêmicas da UNIP e o calendário de provas divulgado pela coordenação local – QUANDO FOR O CASO. Por outro lado, é importante destacar que a realização dos exercícios de autoavaliação, disponibilidados para você neste sistema de disciplinas online, consiste em uma das formas de você se preparar para as avaliações. O que tem que ficar claro, entretanto, é que os exercícios que são disponibilizados em cada avaliação não são a repetição dos exercícos da autoavaliação. Para sua orientação, informamos na tabela a seguir, os assuntos que serão contemplados em cada uma das avaliações às quais você estará sujeito: C – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BÁSICA FIORIN, J.L. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto, 2005. SANTAELLA, L.O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2003. VIEIRA, J.A.,et al.. Discursos nas Práticas Sociais: Perspectivas em Multimodalidade e em Gramática Sistêmico-Funcional. São Paulo: Annablume, 2010. COMPLEMENTAR BARROS, D.L.P. Teoria Semiótica do Texto.v.4. São Paulo: Ática. 2002. LANDOWSK, Eric. A Sociedade Refletida. São Paulo: Pontes,1992. MACHADO, Irene. Escola de Semiótica: A experiência de Tártur-Moscou para o Estudo da Cultura. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. NÖTH, W. A semiótica no século XX. São Paulo: Anablume,2002. NÖTH, W. Panorama da Semiótica: de Platão a Peirce. V. 3. São Paulo: Annablume, 2008. PIETROFORTE,A. V. Semiótica Visual: os percursos do olhar. São Paulo: Contexto, 2004. SANTAELLA, L. Semiótica Aplicada. São Paulo: Pioneira Thomson Learning. Paulus, 2005. ____________.Matrizes da Linguagem e Pensamento: sonora, visual, verbal. São Paulo: Iluminuras FAPESP, 2005. ____________. A Teoria Geral dos Signos: semiose e autogeração. São Paulo: Editora Ática, 2005. ORMUNDO, J.S. Visão Interacionista da Linguagem: Uma proposta pedagógica da Escola Candanga no Distrito Federal. Dissertação de Mestrado, PUC-SP, 1999. TATIT, Luiz. Análise Semiótica através das Letras. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. VIEIRA, J.A. et Al. Reflexões sobre a Língua Portuguesa: Uma abordagem multimodal. Petrópolis-RJ: Vozes, 2007. MÓDULO 1 - Introdução aos estudos semióticos. Conceito de Semiótica. O signo e a semiose. Semiótica como ciência da Linguagem Os estudos semióticos têm como foco a análise das formas de linguagens e a construção de sentido. Há perspectivas da semiótica greimasiana de linha francesa, também denominada como semiótica discursiva. Há a perspectiva da semiótica peirceana – com base nos estudos de Charles Sanders Peirce que apresenta como categorias do pensamento a relação triádica da primeiridade, secundidade e terceiridade (incompletude dos signos) e as obras de Lúcia Santaella discorrem sobre essa última, apresentando suas possibilidades de aplicação. Temos a perspectiva da semiótica da cultura que busca entender a comunicação como sistema semiótico e a cultura como um conjunto unificado de sistemas. Constitui-se na escola da Universidade de Tártu, Estônia, nos anos 60, e explora fronteira com vários campos do conhecimento – linguística – teoria da informação e da comunicação e outros. Para revisitar os aspectos teóricos da Semiótica da Cultura, apresentaremos exemplos e propostas de aplicação em textos diversos. Por fim, nosso foco principal, consiste em apresentar a perspectiva da semiótica social em função da relação estabelecida com as pesquisas em Análise de Discurso Crítica e dos aspectos da Linguagem na Globalização e da Multimodalidade. Para atender a essa última perspectiva, retomaremos alguns conceitos que foram apresentados na disciplina de Análise de DiscursoCrítica com o objetivo de aplicá-los na análise de textos multimodais no desenvolvimento da disciplina Semiótica. Semiótica Peirceana: A incompletude do signo. Semiótica Peirceana Os estudos de Charles Sanders Peirce são a base para introduzirmos o conceito da semiótica. Dessa forma, faremos uma introdução a Peirce com base nas publicações de Lúcia Santaella por meio das obras A Teoria Geral dos Signos: semiose e autogeração, O que é Semiótica e Matrizes da Linguagem e Pensamento: sonora, visual e verbal. Resumiremos alguns conceitos relevantes tratados pela autora e que poderão instrumentalizá-los para aprofundarem o conhecimento e procederem à análise de textos na perspectiva da semiótica peirceana. Breve histórico sobre Charles Sanders Peirce Peirce era um pensador, físico e matemático. Nasceu em Cambride em (1839-1914) constituiu através de seus estudos um pragmatismo, uma fenomenologia e a Teoria dos Signos, sendo esta teoria, o fundamento de toda a sua semiótica. Conforme Ormundo (1999) ao discorrer sobre a visão interacionista da linguagem na perspectiva do campo educacional, se apropriou da perspectiva da semiótica periceana e se referiu ao trabalho de Peirce a base como sendo constituído no estudo sistemático e sistematizado da semiótica enquanto ciência teórica de todas as representações que buscava ser mais vasta que estudos semióticos relacionados à linguística, à semântica e à teoria da comunicação. Santaella (2003, p. 10-13) considerando que “As linguagens estão no mundo e nós estamos na linguagem, a Semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido.” A obra de Peirce tem muito a contribuir com os processos de ensino- aprendizagem, no entendimento dos efeitos de sentido, representação, semiose e ação do signo e na definição triádica do signo como continuum conforme aponta Ormundo (1999, p. 40). Semiose Ormundo (1999) discorre que o modo como o signo age e/ou é interpretado constitui a semiose, ou seja, a ação do signo, que é a ação de ser interpretado, apresenta com perfeição o movimento autogerativo, pois ser interpretado é gerar um outro signo que gerará outro, e assim infinitamente, num movimento similar ao das coisas vivas conforme aponta Santaella (2003). Vivemos em um mundo repleto de signos e por signo entendemos não apenas os verbais. Há signos por toda parte, em crescimento desordenado, aguardando interpretação. Portanto, no contexto da sociedade globalizada e com mudanças profundas no campo da linguagem devido ao avanço tecnológico, os signos se configuram por meio da multimodalidade. Fenomenologia Serson (1996, apud Ormundo, 1999) aponta que os trabalhos de Peirce apresentam o conceito de fenômeno como tudo o que está diante de nossa mente em qualquer sentido, ou seja, a ideia do autor fundamenta-se no princípio de que o fenômeno é simplesmente o que é em função de sua apresentação, tornando-se não o que “verdadeiramente” é, mas o que parece aparecer – eis o conceito de representação. Será na categoria fenomenológica que implica em crescimento contínuo e que se verá a semiose (ação do signo), em que o signo gera e também produz e se desenvolve num outro signo, denominado de interpretante do primeiro e assim infinitamente. Signo Todo pensamento se processa via signo. O signo é definido como “qualquer coisa que, de um lado, é assim determinada por um objeto e, de outro, assim determina uma ideia na mente de uma pessoa, esta última determinação, (...) o interpretante do signo, é, desse modo, mediatamente determinada por aquele objeto. Um signo, assim, tem uma relação triádica com seu objeto e com seu interpretante, conforme aponta Santaella (1995). O modo de ser de um signo depende do modo como esse signo é apreendido, isto é, depende do ponto de referência de quem o apreende. Exemplo, educar é uma questão prioritariamente estética a qualidade daquilo que é admirável, que embute necessariamente uma ética. A estética não decorre da ética, ao contrário, é a ética que se resolve na estética, conforme aponta Santaella (1995). Ormundo (1999, p. 41) aponta que o entendimento da relação entre signo e objeto permite que o professor, ao ol]har o texto do aluno e ao estabelecer procedimentos metodológicos para a construção e melhoria do desempenho de seu aluno possa fazer uso desta relação contextual, visando estabelecer o sentido do texto, o que a linguística textual denomina como coerência e coesão. Portanto, o contexto como mediador de alguma coisa contribuirá para estabelecer o sentido nos textos escolares, verificando qual é o contexto dentro do qual o signo funciona para sua comunidade de interpretantes. E o que, dentro desse contexto, faz diferença entre verdadeiro e falso, correto e incorreto, aceitável e inaceitável no funcionamento do signo (o interpretante do signo). Conforme aponta Santaella (1995, p. 30) A relação triádica é o esquema analítico elementar de um processo de continuidade que tanto regride quanto se prolonga ao infinito. Considera que se a série de interpretantes sucessivos vier a ter fim, perdendo seu caráter significante perfeito, genuíno, implica o fato de que nenhum interpretante de nenhum signo pode ser tido como absoluto ou definitivo. Faz parte da própria forma lógica da geração do signo que ela seja a forma de um processo ininterrupto, sem limites finitos. Ou seja: faz parte da natureza do próprio signo que ele tenha o poder de gerar um interpretante, e assim por diante. Qualquer interpretação no processo degenera o caráter significante perfeito do signo que é o de gerar um interpretante que gerará outro, e assim indefinidamente. Como se processa alguns conceitos da semiótica Peirceana. Apontaremos a seguir: Da Fenomenologia à semiótica O interesse de Charles Sanders Peirce consistia na investigação da relação entre objetos e o pensamento. Peirce era físico e matemático e se apropriou desse conhecimento para formular sua teoria da semiótica – o estudo dos signos. A fenomenologia consiste em uma quase-ciência que tem como propósito investigar os modos como apreendemos qualquer coisa que aparece a nossa mente, tais como um cheiro, ruído, imagem publicada em algum meio de comunicação, a formação de nuvens no céu e de forma mais abstrata temos a lembrança de algo já vivido. A fenomenologia como quase-ciência fornecerá a base para as ciências normativas (abstratas e gerais ) denominadas estética, ética e lógica, sendo que a primeira está relacionada ao estudo das idéias (orientam nossa forma de pensar); a segunda está relacionada ao estudo dos valores ( está relacionada a nossa conduta); e a terceira está relacionada ao estudo das normas (conduz o nosso pensamento). Quanto à lógica também denominada como Semiótica, consiste na ciência das leis necessárias do pensamento e das condições para que se chegue à “verdade”. Para ser atingida, deve-se focar sobre as condições gerais dos signos e como ocorre a circulação de significados de uma mente para outra e a representação tem um papel fundamental na representação do signo. Para Peirce, o signo é uma coisa que representa uma outra coisa e seu objeto produzirá um efeito interpretativo. O signo está diretamente relacionado ao poder de representação. Para o autor os objetos possuíam uma qualidade intrínseca, mas quando relacionado com o sujeito por meio da linguagem esses resultavam em uma forma de representação da realidade. Em sua perspectiva teórica a unidade semiótica consiste no signo e apresentou três modos de o signo ser o mediador dos significados (sentidos). Vamos a eles: 1) ÍCONE: consiste em um parâmetro que tem uma semelhança ao objeto. Podemos citar como exemplo uma Foto ou comoícones verbais temos as onamatopeias. As limitações referentes ao ícone ocorrem por meio de que nem todos os seres têm a capacidade de reconhecerem um ícone como ocorre no caso de animais se autoreconhecerem em uma pintura. Há a dependência da qualidade da representação (retrato cubista). Ele se apresenta com simples qualidade na sua relação com seu objeto. Há alguma semelhança com o objeto representado por meio de formas e sentimentos, podendo ser substituto de algo que a ele apresenta uma relação de semelhança. 2) ÍNDICE: ocorre quando o signo e o referente apresentam uma relação de proximidade, sendo que o signo indica o referente e aponta para ele. Há uma relação direta. Para tratarmos do índice temos que pensar em uma relação de causalidade sensorial que indicará seu significado. Por exemplo, a fumaça que indica a existência de fogo (pode ser interpretado por animais). Outro exemplo consiste na estrutura linguística, por meio da coesão textual - o uso de pronomes demonstrativos e advérbios (os pronomes relativos) podemos dizer que há a equivalência verbal do índice. 3) Símbolo: Trata-se de uma representação arbitrária do objeto por força de uma associação de ideias. Há uma espécie de lei convencionada que determina que determinado signo represente seu objeto. Trata-se de uma aceitação coletiva , ou seja, uma forma de relação convencional. Há símbolos verbais e não verbais. Podemos considerar que nas línguas as palavras são símbolos pois representam algo tanto por natureza nominal (substantivo e adjetivos) ou por uma ação (verbos). Alguns exemplos sobre o símbolo verbal podemos encontrá-los nas definições de um dicionário – quando um símbolo é explicado ad infinitum por outros referentes (sempre remetendo a outras definições). Como exemplo de símbolo não verbais, temos a cruz que pode ter várias simbolizações (religião, hospital e outras). O fundamento do signo Santaella apresenta que o signo consiste no primeiro relato da relação triádica e está relacionado à fenomoenologia, mas trata-se do primeiro com o caráter da qualidade e possibilidade correspondente à primeira categoria fenomenológica. A questão problemática que se apresenta consiste no fato de que a noção de representação (conforme a tríade semiótica) só é introduzida na fenomenologia por meio da terceira categoria (terceiridade). Dessa forma, entendemos que a noção de signo se constitui triadicamente. O signo em si seria o representante que transmitirá a ideia do objeto representado ao interpretante. Não se trata da pessoa que transmite, mas sim dos pressupostos e percepções de quem o recebe. Dessa forma, essa relação de interpretante e formas de representação ocorre por meio das três categorias básicas formuladas por Peirce. São elas: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade. Vamos entender as possibilidade de funcionamento dessas categorias na consciência. São elas: 1) A Primeiridade (monádicos) está relacionada ao novo, a possibilidade, a qualidade de um ser que não teria existência por si só, sem referência a outro ser, ou seja, trata-se da abstração. Em síntese, temos os aspectos fenomenais “puramente qualitativos”, uma abstração pura, pré- reflexiva, fora do consciente, não elaborada, podendo ser traduzida como um sentimento, sensação não consciente. (ÍCONE) 2) A secundidade temos a categoria da ocorrência, da existência, está relacionada a oposição, negação, apropriação de semelhança e contraste com o outro, trata-se da concretude no qual a relação assume uma materialidade – existência. Podemos definir qualquer coisa como um segundo por existir e decorrer da relação com um outro (relação diádica). (ÍNDICE) 3) A terceiridade está relacionada a generalidade. Está relacionada ao que pode ser interpretado por meio do que está estabelecido no sistema do signo como primeiridade (ícone), secundidade (índice) e a terceiridade (símbolo). Esta categoria completa a tríade (relação triádica) consiste na capacidade que algo tem de interpretar, por que esse algo existe (secundidade) e é primeiridade. A terceiridade aponta para o futuro, tratando-se do efeito de sentido que o signo provocará em um possível interpretante. Representa a incompletude do signo. (SÍMBOLO). As categorias apresentadas acima estão relacionadas aos estudos de Peirce sobre o papel do interpretante dessa forma a ação dos signos como uma semiose constitui em um processo contínuo de criar sentidos aos objetos- ressignificando-os sempre e o signo está sempre em movimento, nunca podendo ser retomado com o mesmo sentido, traduzindo sempre como incompleto (incompletude do signo). Apontamos aqui uma síntese da perspectiva teórica da Semióitca Peirceana e que poderá ser aprofundada com base nas referencias bibliográficas indicadas no plano de ensino da disciplina. MÓDULO 2 – Semiótica discursiva de Linha Francesa. Conceitos introdutórios. Na perspectiva da Semiótica Discursiva de Linha Francesa, temos que atentar a algumas definições conforme apontado por Diana Luz pessoa de Barros no livro Teoria Semiótica do Texto. Noção de Texto Entendemos que o objeto da semiótica é o texto, ou seja, a descrição e explicação sobre o que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz. Segundo Barros (2000), o texto se define em duas formas que se complementam pela organização ou estruturação que o torna um todo de sentido. A primeira concepção apontada pela autora apresenta o texto como objeto de significação por meio da análise interna ou estrutural do texto em função da busca de um “todo de sentido”. A segunda caracterização de texto apontada pela autora, entende o texto como objeto de comunicação entre dois sujeitos. Para esta concepção de texto, a autora esclarece que: O texto encontra seu lugar entre os objetos cultuais, inserido numa sociedade (de classes) e determinado por formações ideológicas específicas. Nesse caso, o texto precisa ser examinado em relação ao contexto sócio- histórico que o envolve e que, em última instância, lhe atribui sentido. Teorias diversas têm também procurado externa do texto.(BARROS, 2000, p. 7) Conforme apontado acima, podemos correlacionar a definição apontada pela autora com aspectos teóricos que já foram discutidos em outras disciplinas do nosso curso. Trata-se de uma retomada que teremos no decorrer da nossa disciplina, ou seja, retornaremos aspectos teóricos já trabalhados por exemplo nas disciplinas de Análise de Discurso Crítica, Teorias do Texto e outras abordagens teóricas. Percurso Gerativo do Sentido (Semiótica Francesa) Para os estudos da semiótica discursiva de linha francesa, é relevante estabelecer a diferença do plano do conteúdo e o plano de expressão. Quanto ao plano do conteúdo (abstrato – tematização), entende-se o percurso gerativo para o processo de construção de sentido. O conteúdo consiste em um dos planos da linguagem segundo Hjelmslev ou o plano do significado segundo Saussuere que será veiculado ou materializado pelo plano da expressão. Quanto ao plano da expressão (concreto – figuratização) consiste em um dos planos da linguagem (Hjelmslev) ou o plano do significante segundo Saussure definido por Diana (2000, p. 87) como o “que suporta ou expressa o conteúdo, com o qual mantém relação de pressuposição recíproca” Recorreremos aos conceitos apresentados por Barros (2000) para nos instrumentalizar na análise de textos na perspectiva teórica da Semiótica Francesa. Actante: “é uma entidade sintática da narrativa que se define como termo resultante da relação transitiva, seja ela uma relação de junção ou de transformação. O actante funcional, por sua vez, caracteriza-se pelo conjunto variável dos papéis que assumem em um percurso narrativo.” Ancoragem: “é o procedimento semântico do discurso por meio de que o sujeito da enunciação ‘concretiza’ os atores, os espaços, e ostempos do discurso, atando-os às pessoas, lugares e datas que seu destinatário reconhece como ‘reais’ ou ‘existentes’ e produzindo, assim, o efeito de sentido de realidade ou de referente.” Competência: É um tipo de programa narrativo, em que o destinatário-sujeito recebe do destinador a qualificação necessária à ação. Esquema narrativo: “é a unidade maior na hierarquia sintática da narrativa, que se define pelo encadeamento lógico dos percursos narrativos da manipulação (ou do destinador-maniulador), da ação (ou do sujeito) e da sanção (ou do destinador-julgador”. Figura: “é um elemento da semântica discursiva que se relaciona com um elemento do mundo natural, o que cria, no discurso, o efeito de sentido ou a ilusão da realidade” Figuratização: “é o procedimento semântico pelo qual conteúdos mais ‘concretos’ (que remetem ao mundo nautral) recobrem os percursos temáticos abstratos.” Isotopia: “é a reiteração de quaisquer unidades semânticas (repetição de temas ou recorrência de figuras) no discurso.” Isotopia figurativa: “caracteriza-se pela redundância de traços figurativos, pela associação de figuras aparentadas e correlacionadas a um tema, o que atribui ao discurso uma imagem organizada da realidade.” Isotopia temática: “é a repetição de unidades abstratas em um mesmo percurso temático”. Manipulação: “é aquele em que o destinador atribui ao destinatário-sujeito a competência semântica e modal necessárias à ação. Há diferentes modos de manipular, e quatro grandes tipos de figuras de manipulação podem ser citados: a tentação, a intimidação, a provocação e a sedução”. Modalidades veridictórias: “determinam a relação do sujeito com o objeto, dizendo a verdadeira ou falsa, mentirosa ou secreta.” Modalização: “é a determinação que modifica a relação do sujeito com os valores (modalização do ser) ou que qualifica a relação do sujeito com o seu fazer (modalização do fazer). Narrador: “é o simulacro discursivo do enunciador, explicitamente instalado no discurso pelo narrador.” Narratário: “é o simulacro discursivo do enunciatário, explicitamente instalado no discurso pelo narrador”. Percurso gerativo: “para construir o sentido do texto, a semiótica concebe seu plano do conteúdo sob a forma de um percurso de engendramento do ou dos sentidos, que vai do mais simples ao mais complexo, do mais abstrato ao mais concreto e que se organiza em níveis ou lugares de articulação da significação, passíveis, cada qual, da descrição autônoma.” Percurso narrativo: “é uma sequência de programa narrativos de tipos deferentes (de competência e de performance), relacionados por pressuposição simples.” Performance: “é o programa narrativo que representa a ação do sujeito que se apropria, por sua própria conta dos objetos-valor que deseja.” Programa narrativo: “é o sintagma elementar da narrativa, que integra estados e transformações, e que se define como um enunciado de fazer que rege um enunciado de estado.” Quadrado semiótico: “é o modelo lógico de representação da estrutura elementar, que a torna operatória. No quadrado representa-se a relação de contrariedade ou de oposição entre os termos e, a partir, dela, as relações de contradição e de complementaridade.” Sintaxe: “é um dos componentes, com a semântica, da gramática semiótica e estuda as relações e regras de combinação dos elementos linguísticos, tendo em vista a construção de unidades variáveis (frase, discurso, texto, narrativa etc.), conforme o nível de descrição linguística ou semiótica escolhido.” Sintaxe discursiva: “explica as relações do sujeito da enunciação com o discurso- enunciado e também as relações ‘argumentativas’ que se estabelecem entre enunciador e enunciatário.” Sintaxe narrativa: “estuda o ‘espetáculo’ narrativo oferecido pelo fazer do sujeito que transforma o ‘mundo’, à procura dos valores investidos nos objetos, e pela sucessão de estabelecimentos e de rupturas de contratos entre um destinador e um destinatário, de que decorrem a comunicação e os conflitos entre sujeitos e a circulação de objetos-valor. Sujeito: “é o actante sintático da narrativa que se define pela relação transitiva de junção ou de transformação que o liga ao objeto e graças a que o sujeito se relaciona com os valores. Enquanto actante funcional, o sujeito caracteriza-se por um conjunto variável de papéis actanciais, em que ocorrem algumas determinações mínimas, tais como os papéis de sujeito competente para ação e de sujeito realizador da performance.” Tema: “é um elemento da semântica narrativa que não remete a elementos do mundo natural, e sim às categorias ‘linguísticas’ ou ‘semióticas’ que o organizam.” Tematização: “é o procedimento semântico do discurso que consiste na formulação abstrata dos valores narrativos e na sua disseminação em percursos, por meio da recorrência de traços semânticos.” Texto: “resultado da junção do plano do conteúdo, construído sob a forma de um percurso gerativo, com o plano da expressão, o texto é um objeto de significação e um objeto cultural de comunicação entre sujeitos.” Veridicção (ou dizer-verdadeiro): “um discurso ou um texto será verdadeiro quando for interpretado como verdadeiro, quando for dito verdadeiro.” Teoria da significação Para Greimas (cf. PIETROFORTE: 2012), a teoria da significação diferencia-se das demais semióticas por não enfatizar somente as relações entre os signos e sim no processo de significação capaz de gerá-las. Sendo assim, a teoria dá significação a todo o plano da linguagem. O linguista Greimas prevê que toda linguagem é constituída de expressão e conteúdo. O foco central da teoria é identificar como uma estrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de texto; para isso, o discurso é estudado neste enfoque pelo autor, seja ele verbal ou não verbal. Ainda nas concepções teóricas greimasianas, o signo é denominado “aspecto textual”, a teoria da significação e seu objeto não é o signo, mas os sistemas semióticos. Greimas nos lega que: “Cada ciência tem sua semiótica particular”. Ele criou o percurso gerativo de sentido, que é o resultado de vários estudos em busca de uma estruturação do plano do conteúdo. A busca do estudioso é a do sentido das coisas, do conteúdo concreto. O percurso gerativo de sentido é dividido em três níveis. As estruturas profundas recebem o nome de nível fundamental e neste surge a significação como uma oposição semântica mínima (dominação x liberdade, amor x ódio). As estruturas superficiais se denominam o nível narrativo e neste se organiza a narrativa do ponto de vista de um sujeito, implicados sempre a sucessão, o encadeamento e a transformação de estados. A estrutura de manifestação observa o encadeamento de temas e figuras e os efeitos de sentido e será no nível narrativo que os actantes exercem a performance e seus elementos competência, manipulação e sanção. A teoria da significação surgiu na década de sessenta, sobretudo com base nas obras de alguns autores, dos quais, entre este podemos destacar Greimas (1973) que efetivamente abordou a semântica estrutural como ciência, com os seus próprios postulados e metodologia. Para tanto, emprestou da linguística os conceitos de dicotomias, em especial expressão/conteúdo, e o modelo fonológico, desenvolvido pelo círculo linguístico de Praga (Trubetzkói, Jakobson, entre outros), estipulando um paralelismo entre formas de expressão (cujo elemento mínimo e o fema) e formas de conteúdo (tendo no seu sema seu traço mínimo) (v.semema). Se, conforme Pietroforte (2012), a linha de Pottier se volta mais propriamente para os estudos gramaticais, sem ultrapassar os limites da frase, Greimas parte do texto em sua maior abrangência e acaba por enveredar numa área de pesquisas bem mais ampla, a da semiótica ou semiologia.Ainda inacabada, a semântica estrutural realiza esforços no sentido de estipular universais semânticos, passo indispensável para seu maior êxito. O objetivo central da semiótica greimasiana é o estudo do discurso com base na ideia de que uma estrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de texto. Nesta linha de estudos semióticos aponta-se para percepção e significação. A percepção refere-se à reação discriminativa entre estímulos implica, portanto, o relacionamento entre elementos e estímulos comparados. É a mediadora entre o mundo dos objetos (matéria) e o mundo das significações (forma do conteúdo). Já a significação é o resultado desta comparação decodificada. Liga-se ao mundo sensorial: do visual (gestos, mímica) do táctil (alfabeto braile) do auditivo (música). Tendo essas definições sobre percepção e significação é possível através da semântica estrutural compreender de que forma acontece o processo de decodificação de textos, sejam eles de tanto de ordem visuais quanto os de origem não visuais. Segundo Greimas (2008: 21): A estrutura elementar da significação se dá pela articulação de dois semas contrários, através do eixo semântico. Dois polos extremos manifestam oposição unida por um mesmo eixo semântico que é o denominador comum dos dois termos, a partir do qual se manifesta a articulação da significação. Importante entender como se processam os elementos do percurso narrativo de sentido e cada uma das suas fases. Nível fundamental – planos de conteúdo e plano de expressão; o nível narrativo – a ação dos actantes – poder fazer, a performance e as relações de competência, manipulação e sanção ; e o nível discursivo – as categorias opositivas. MÓDULO 3 - Semiótica discursiva de Linha Francesa: O percurso narrativo do sentido. O quadrado semiótico. 1. A dicotomia do signo e o quadrado semiótico O signo definido por Hjelmslev (PIETROFORTE: 2011) se compõe de uma característica dicotômica, na qual reside o plano de conteúdo e o plano de expressão. Cada uma dessas duas grandezas se constitui em duas outras entidades mais específicas. Para isso, Hjelmslev divide o conteúdo em forma do conteúdo e substância do conteúdo e a expressão em substância da expressão e forma da expressão. Para Hjelmslev, a essência da língua se constitui pela inter-relação desses dois planos. Cada um desses planos em determinada língua tem sua própria estrutura. O quadro abaixo conceitua uma das entidades dos planos de conteúdo e expressão. S I G N O Plano da expressão Forma do conteúdo É a estruturação da língua na fala/escrita Substância do conteúdo O pensamento/ideia/significação Plano do Conteúdo Forma da expressão São os fonemas/cenemas Substância da expressão São articulados pela fala Quadro: Plano de conteúdo e plano de expressão Se, por exemplo, durante um seminário acadêmico, o coordenador de pesquisa diz “O tempo esgotou!”, tanto o coordenador quanto o apresentador do trabalho fazem o uso das quatro manifestações sígnicas. Portanto, na expressão e/ou na recepção da frase “O tempo se esgotou” existe uma relação sintática entre o “artigo”, o “sujeito” e o “verbo” que é natural da estrutura da língua, e constitui a forma do conteúdo. Há também uma projeção mental “ideia”, manifestando aviso/informação/advertência, que constitui a substância do conteúdo e uma sequência de relações fonêmicas/cenêmicas, fases de significado, que constitui a forma da expressão e por fim existem articulações sonoras manifestadas pelos fonemas/cenemas que constitui a substância da expressão. Segundo Pietroforte (2012, p. 11): A semiótica estuda a significação, que é definida no conceito de texto. O texto, por sua vez, pode ser definido como uma relação entre um plano de expressão e um plano de conteúdo. O plano de conteúdo refere-se ao significado do texto, ou seja, como se costuma dizer em semiótica, ao que o texto diz e como ele faz para dizer o que diz. O plano de expressão refere-se à manifestação desse conteúdo em um sistema de significação verbal, não verbal ou sincrético. Podemos definir as línguas naturais (idiomas) como sistemas verbais e os sistemas não verbais como, por exemplo, música e as artes plásticas. Existem também os sistemas sincréticos que são aqueles que requerem várias linguagens de manifestação, assim como ocorre entre um sistema verbal e um não verbal nas músicas e nas histórias em quadrinhos. Um conteúdo idêntico pode ser expresso por meio de planos de ordens distintas, sendo assim, podemos manifestar um mesmo conteúdo em um plano de expressão de ordem verbal, não verbal ou sincrético. O conteúdo abordado em uma obra literária, por exemplo, pode ter uma versão adaptada para o cinema, por meio de um plano de expressão sincrético, ou pode até mesmo inspirar um artista a fazer uma representação pictórica do conteúdo, o que demandaria a utilização de um plano de expressão não verbal. Podemos concluir então que o sentido do texto está em seu plano do conteúdo. Ao ser definido neste plano, o sentido pode ser estudado em uma teoria semiótica, que objetiva descrever os processos de sua formação, ou seja, a significação. A semiótica proposta por Greimas (2008) concebe o sentido como um processo gerativo, em um percurso que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto. Essa geração é formalizada no modelo teórico do percurso gerativo do sentido. Para Hjelmslev há na linguagem uma solidariedade entre conteúdo e expressão, de tal modo que uma separação entre os planos seria impossível. Segundo Hjelmslev (1968, p. 66/7) “uma expressão não é expressão se não porque é expressão de um conteúdo e um conteúdo não é conteúdo senão porque é conteúdo de uma expressão”. Em semiótica as proposições de Hjelmslev são adotadas como plano de conteúdo e plano de expressão. O plano do conteúdo é o significado do texto e o plano da expressão é a manifestação do conteúdo. Notamos que o plano do conteúdo trata do que o texto diz e o plano da expressão se refere a como ou através de qual código, seja: verbal, icônico, gestual, é expresso o conteúdo do texto. Tomamos como exemplo a ideia que o semáforo nos traz de acordo com cada cor apresentada. Por meio das cores sabemos se é permitido seguir (verde), ou se é para termos atenção (amarelo) ou ainda se é proibido seguir (vermelho). Ou seja, por meio da estrutura de um semáforo sabemos que as cores verde, amarelo e vermelho têm um significado simbólico, essas mensagens; verde (siga), amarelo (atenção) e vermelho (pare) orienta o trânsito, possibilitando desta forma o livre direito de ir e vir das pessoas e ao mesmo tempo protegendo a integridade física durante o exercício deste direito do indivíduo, sendo assim, o semáforo é um exemplo de linguagem não verbal e dicotômica, pois no plano da expressão cada cor possui um significado. O quadrado semiótico situa-se no nível fundamental do processo gerativo. Nele consiste a trajetória de produção do objeto semiótico, das estruturas profundas às estruturas superfície, do mais simples ao mais complexo, do mais abstrato ao mais complexo. No percurso gerativo do sentido existem três níveis: o profundo, superfície das estruturas narrativas e o nível das estruturas discursivas. Os distintos níveis são estudados respectivamente pela sintaxe e semântica fundamentais, narrativas e discursivas. A semântica fundamental unida à sintaxe fundamental estuda as estruturas da significação designados pelos conceitos de língua, na linha saussuriana, e da competência, segundo a visão chomskiniana. As estruturas semânticas podem ser formuladas como categorias e são suscetíveis de ser articuladas pelo quadrado semiótico. É por meio do quadrado semiótico que nos confere um estatuto lógico-semântico e as torna operatórias. A articulação lógica de qualquer categoriasemântica é representada visualmente por meio do quadrado semiótico. Partindo da noção saussuriana de que o significado é primeiramente obtido por oposição no mínimo entre dois termos, constituindo uma estrutura binária. Chega-se ao quadrado semiótico por uma combinatória das relações de contradição e asserção. Podemos afirmar que esse procedimento é estruturalista na medida em que um termo não se define isoladamente, mas sim por meio de relações entre outro elemento que contraria o primeiro. Segundo Pietroforte (2012:): Tomando S1 como masculino e S2 como feminino, o primeiro passo e negar S1, produzido assim a sua contradição ~S1, que se caracteriza por não poder coexistir simultaneamente com S1 (a uma impossibilidade de os dois termos estarem presentes ao mesmo tempo). A seguir afirma-se ~S1 e obtenha-se S2. Isto é, se não é masculino é feminino. Está é uma relação de implicação. O passo assim descrito representa-se graficamente do seguinte modo: S1 S2 ~S1 Gráfico: Contradição ~S1 – S2 O segundo passo consiste no mesmo procedimento a partir de S2, pelo que se obtém o seguinte esquema: S1 ~S2 ~S1 Gráfico: Obtenção de ~S2 Os dois esquemas constituem então o quadrado semiótico. S1 S2 ~S1 ~S2 Gráfico: O quadrado semiótico No quadrado (representado, as linhas bidirecionais continuam representam uma relação de contradição, as bidirecionais tracejadas uma relação de contrariedade e as linhas unidirecionais uma relação de complementaridade). Desta representação surgem seis relações: S1 S2, que constitui o eixo dos contrários; ~S1 ~S2, que constitui o eixo das subcontrárias; S1 ~S1, que constitui o esquema positivo; S2 ~S2, que constitui o esquema negativo; S1 ~S2, que constitui a dêixis positivas; S2 ~S1, que constitui a dêixis negativa. Figura: contradição/contrariedade/complementaridade Segundo Pietroforte (2012:): O quadrado semiótico permite indexar todas as relações diferenciais que determinam o nível profundo do processo generativo. A combinação das relações de identidade e alteridade, figuradas pelo quadrado semiótico, constitui o modelo ou esquema a partir do qual se geram as significações mais complexas da textualização. O nível fundamental sintático–semântico articula e da forma categórica ao micro-universo suscetíveis de produzir as significações discursivas. Contudo, as categorias desenhadas pelo quadrado semiótico constitui valores virtuais cuja seleção e concretização pertence a semântica narrativa. A tarefa desta consiste essencialmente em fazer uma seleção dos valores disponíveis e atualiza-los mediante uma junção com os sujeitos da sintaxe narrativa de superfície. As fundamentações estáveis de todo o processo gerativo têm a sua representação articulada pelo quadrado semiótico, que tem grande poder operatório, quanto fundamental, aplicando a qualquer instância significativa. As relações de identidade encontram-se a partir da estabelecidas nas estruturas de profundidade. Contrapartida, possui uma dinâmica relacional que induz ao processo generativo. A aplicação do quadrado semiótico é universal a todos os objetos. A análise de Greimas constitui a forma como um texto programático que se ergue sobre estruturas elementares simples e esquematizadas pelo quadrado semiótico pode ser aplicado a qualquer temática. Greimas constrói um programa narrativo que parte das relações base e utiliza como exemplo para aplicar está teoria a “receita de sopa”, destacando a relação dicotômica entre elementos para o preparo da sopa; cozinheiro/convidados e cru/cozido. 2. Semiótica da arte Estudar a semiologia na arte é essencial para entender o processo de produção do autor e de percepção do receptor em relação a essa mensagem, ao conteúdo significativo da obra. O tema é de extrema relevância para evitar avaliações equivocadas sobre as obras de arte e para entender como uma mesma obra pode atingir os receptores de diferentes maneiras. Para exemplificação do referido estudo, apresentamos a obra de Henrique Alvim Correia (1876-1910), que foi um dos expoentes da pintura brasileira na virada do século XIX para século XX. A obra sem título é confeccionada em carvão e aquarela sobre papel (21,7 x 29,3 cm). Figura: Gravura sem título, de Henrique Alvim Correia Trata-se de uma jovem, praticamente nua, atada a um poste e exibida para a multidão de mulheres, bem mais velhas, que por sua vez bradam contra ela com gestos impetuosos e expressões agressivas. Para uma sátira de costumes, a cena pintada é bem violenta, pois mostra a beleza de uma jovem sendo massacrada covardemente pela feiura de uma multidão. Segundo Pietroforte (2012), há uma tímia construída em torno dessa beleza que, devido a uma sensibilização fórica, ou seja, sensibilização negativa por parte da multidão, que coloca em questão a derrota das opressoras e torna a personagem castigada, de certo modo vencedora. Podemos caracterizar um tema pela recorrência de motivos. Os temas são o produto de um conjunto de discursos sobre os mesmos tópicos culturais. Os temas variam nos domínios de abrangência e podem também se relacionarem entre si. E os tópicos culturais podem ser; ideológicos, políticos, sexualidade, justiça etc. Na Gravura sem título de Alvim Correia identificamos dois temas principais, o mais evidente é o tema do castigo sofrido pela exposição pública da condenada o outro tema é o da sexualidade e do tratamento dado à mulher dentro de uma concepção determinada de seu papel sexual. O fato de expor publicamente a tortura e até mesmo a morte de um condenado é comum na história das penalidades. O que se representa nesse rito social é o exemplo, de um costume moral que é violado resulta em um rito de castigo como consequência. Obtém-se, portanto, duas orientações possíveis: Opressão → não opressão → liberdade Liberdade → não liberdade → opressão Na teoria semiótica, essas operações são sistematizadas no quadrado semiótico: S1= liberdade S2= opressão ~S1= não opressão ~S2= não liberdade Gráfico: Aplicação do quadrado semiótico na sistematização de opressão/liberdade O que aparece na imagem da pintura é o percurso da negação da liberdade, a não liberdade, é a afirmação da opressão, de modo que a condenada presa é uma figura que representa a não liberdade, a multidão, a confirmação da opressão. Esse percurso no plano do conteúdo divide o plano da expressão do quadro, verticalmente, em dois espaços, fazendo com que a da esquerda seja o espaço da não liberdade e a direita o espaço da opressão. PC não liberdade → opressão PE esquerda Direita Figura: Percurso da negação da liberdade P C não liberdade → opressão P E não luz → sombra Figura: Percurso semissibólico não liberdade/não luz – opressão/liberdade São essas as orientações de sentido que constroem o tema do castigo. Há, então,a categoria da semântica fundamental vida x morte no tema da sexualidade. No desenho, o que é pintado e a negação da vida e a afirmação da morte, respectivamente, representadas na moça amarrada e na plateia que a condena de acordo com o quadrado semiótico, o que aparece no desenho, no seu plano de conteúdo, é o percurso não vida → morte. PC não vida → morte Figura: Percurso não vida/morte Ainda segundo Pietroforte (2012, p. 75), orientado o sentido no plano do conteúdo, a categoria vida x morte também está relacionada com a categoria de expressão luz x sombra. Utilizamos a semiótica para dissipar dúvidas e unir ideias expostas de formas diferentes, introduzindo novos conceitos relativamente aos tipos de signo que consideramos existir. São os “diagramas”, signos que representam relações abstratas, tais como fórmulas lógicas, (figuras) que associamos a um conjunto de conceitos para assim concluirmos a teoria da semiótica. Segundo Pietroforte (2012, p.70): Embora haja uma relação entre expressão e conteúdo, ela não é construída colocando em paralelo a afirmação dos termos das categorias envolvidas. A categoria de conteúdo liberdade x opressão não está em paralelo com a categoria de expressão esquerda x direita o que ocorre é que a etapa de negação da liberdade e a consecutiva afirmação da opressão é desenhada no caminho do olhar que vai da esquerda para a direita, na disposição das imagens na tela. Isso delimita a zona de sentido para a colocação das personagens que tematizam o castigo, e também caracteriza uma relação semissimbólica, já que relaciona formas da expressão e formas do conteúdo. A relação semissimbólica entre os termos contrários, no caso, dá-se com a luz. No lado esquerdo do desenho a moça é desenhada de tal modo que ela é um ponto de luz englobado por sombras que, no lado direito, vão se transformar na multidão. Se a luz pode ser descrita por meio da categoria de expressão luz x sombra, a figura da moça realiza o termo luz e a figura da multidão, o termo sombra. A figura que realiza a liberdade é a moça desnuda, relacioná-la à não liberdade deve-se ao fato dela estar amarrada em um tronco para ser castigada. Já a multidão é a figura que realiza a opressão, pois a confirma em seu julgamento sobre a condenada. Portanto, a figura da moça realiza no plano do conteúdo a liberdade e no plano da expressão, a luz; contrariamente, a figura da multidão realiza no plano do conteúdo a opressão, e, no plano da expressão a sombra. PC liberdade x opressão PE luz x sombra Figura: Relação entre os elementos liberdade/opressão no PC e luz/sombra PE A gravura pode ser lida em um percurso a partir da esquerda no plano do conteúdo como a liberdade que está sendo negada, quando a moça é amarrada e exposta nua, já no plano da expressão, a luz é negada pela sombra quando a luz englobada é envolvida pelas sombras englobantes; no espaço direito há no plano do conteúdo a opressão afirmada pela multidão julgadora e no plano da expressão a afirmação da sombra. Também é possível articulas as categorias de expressão em um quadrado semiótico de modo que o semissimbolismo determinado vai seguir o percurso da não liberdade/não luz para a opressão/sombra. Você deve aprofundar nas aulas e nas bibliografias indicadas todos os níveis do percurso gerativo de sentido, como já mencionamos neste texto, Nível fundamental – planos de conteúdo e plano de expressão; o nível narrativo – a ação dos actantes – poder fazer, a performance e as relações de competência, manipulação e sanção ; e o nível discursivo – as categorias opositivas. GREIMAS, Alguirdas Julien. COURTES, Joseph. Dicionário de semiótica. São Paulo: Contexto, 2008. HJELMSLEV, Louis. Prolegômenos a uma teria da linguagem. 2ª ed.Tradução J.Teixeira Coelho Netto} – São Paulo: Perspectiva, 1968. PIETROFORTE, Antonio Vicente. Semiótica Visual: o percurso do olhar. 3ª ed. São Paulo, Contexto, 2012. MÓDULO 4- Semiótica da Cultura. Semiótica Russa. Para tratar do conceito de semiótica da cultura, sugerimos atentar aos pontos elencados abaixo e fazerem exercícios práticos. SEMIOSFERA As várias formas de linguagem não estão separadas, mas interconectadas, uma vez que a linguagem é como um grande ecossistema, cheio de pequenos nichos distintos, sendo cada nicho possuidor de características próprias, garantindo autonomia em relação aos demais e ao mesmo tempo compartilhando características comuns. Assim, o teatro, a literatura, os quadrinhos e tantas outras formas de linguagem compõem ambientes próprios e autônomos e compartilham elementos de outras linguagens, cada uma a sua maneira. Essas linguagens ou signos formam o que Lótman (MACHADO: 2007) chama de semiosfera. Assim como a biosfera designa a esfera da vida no planeta, a semiosfera designa o espaço cultural habitado por esses signos. Na verdade, fora desse espaço, os processos de comunicação e o desenvolvimento de linguagens em diferentes domínios da cultura seriam impossíveis. A relação entre as linguagens e o espaço em que estão inseridas é de necessidade, pois sem o espaço, as linguagens não teriam existência nem funcionariam. Trata-se de um mundo fechado, que evoca imagens de territórios fechados, separados por limites, dentro de outros espaços tais como matriochcas, as bonecas russas inseridas uma dentro da outra, ou espaços refletindo outros espaços dentro deles próprios. Figura – Bonecas russas about:blank É importante ressaltar que o caráter espacial da semiosfera não é um termo tomado em sentido figurado, uma alegoria, pois, segundo Lótman, en modo alguno significa que el concepto de espacio se emplee aquí en un sentido metafórico. Estamos tratando con una determinada esfera que pose los rasgos distintivos que se atribuyen a un espacio cerrado en sí mesmo. Sólo dentro de tal espacio resultan posibles la realización de los procesos comunicativos y la produccipon de nueva información (apud MACHADO: 2007, p. 34). A semiosfera pode ser considerada como um ambiente, no qual diversas formações semióticas se encontram imersas em diálogo constante, um espaço- tempo, cuja existência antecede tais formações e viabiliza o seu funcionamento, enquanto torna possível o seu próprio ciclo vital. As linguagens transformam o espaço, ainda que, ao mesmo tempo, são transformados por ele. Em contrapartida, Lótman caracteriza o espaço semiótico como contínuo, no qual a heterogeneidade de sistemas se encontra em interação, exprimindo a condição potencial da semiosfera em gerar informação nova. Somente com o desalinhamento total do sistema é que se pode vislumbrar a emergência da imprevisibilidade. Nesse sentido, as imagens evocadas são de espaços abertos, de dimensões galácticas. Figura - Dimensão galáctica about:blank Diante dessa proposta, conforme Machado (2007, p. 16), semiosfera é o conceito que se constitui para nomear e definir a dinâmica dos encontros entre diferentes culturas e, assim, construir uma teoria crítica da cultura. Os estudos da semiosfera valorizam as conexões capazes de aproximar sistemas tão diferentes nos encontros culturais movidos pelas mais diferentes causas, sejam choques, expansão ou emergenciais. Também nos ajudam a pensar mecanismos básicos da constituição do espaço semiótico tais como a irregularidade, heterogeneidade, a fronteira e transformação da informação em texto e, sobretudo, do hibridismo, características fundamentais da cultura contemporânea. É próprio da cultura promover aproximações até mesmo entre diversidades. Por isso, ela está povoada de mitos, religiões, artes, arquitetura, filmes, entretenimento, poesia, dança, jogos, línguas, linguagensartificiais, ciência, tecnologias e por tudo o que ainda não conseguimos sistematizar. Nesse contexto, o texto possui um mecanismo dinâmico na cultura. Texto é um espaço semiótico em que há interação, em que as linguagens interferem-se e auto-organizam-se em processos de modelização. O texto tem três funções: comunicativa, geradora de sentidos e mnemônica. A função comunicativa envolve o processo de realização da língua natural. Nesse enfoque, o texto é homo-estrutural e homogêneo, apresentando- se como a manifestação de uma única linguagem. Na função de geração de sentidos o texto é, nesse caso, heterogêneo e hétero-estrutural, constituído como a manifestação de várias linguagens. A terceira função está ligada à memória da cultura, sendo o texto capaz de conservar e reproduzir a lembrança de estruturas anteriores e, ao mesmo tempo, produzir algo novo. Em síntese, interessa à semiótica da cultura o exame dos complexos sistemas de signos que estão modelizados sob forma de texto. O papel da semiótica da cultura é a descrição da semiosfera. 1. Espaço vazio: comercial e filme Pesquisadora brasileira Lucrecia D’Aléssio Ferrara (In: MACHADO: 2007) propôs-se delinear o espaço como uma semiosfera para a qual convergem diferentes bases de processos comunicativos contemporâneos – arte, design, publicidade, cinema, fotografia, por exemplo – e enxergar as intersecções que colocam em evidência os ruídos que podem ou não ser posteriormente absorvidos pelos sistemas modelizantes, ou seja, pelo próprio espaço. Assim em estudo intitulado Semiosfera do espaço vazio, ela analisa duas linguagens distintas: anúncio publicitário e um filme. A peça do colírio Lerin, feita em página dupla, é composta por duas pimentas vermelhas alocadas uma em cada página, sendo a disposição de ambas similar à posição ocupada pelos olhos no rosto de um indivíduo. No canto inferior direito da segunda página há a frase “Ardeu? Use”, aliada à representação imagética do produto anunciado. Na peça, a pimenta, que provoca ardor quando degustada, é correlacionada à ardência dos olhos, sendo este aspecto acentuado pela cor vermelha vibrante do bago, por meio da qual, busca-se enfatizar o principal problema que o colírio promete resolver e, em consequência, sua eficácia. Nessa correlação, percebe-se que o efeito de sentido provocado pela percepção gustativa é transposto para a percepção tátil, sendo esta relação materializada na peça por meio da representação imagética. A relação entre as duas páginas é do tipo causa e consequência, ou seja, se ardeu então use, ou a percepção gustativa é causa da percepção tátil que é sua consequência. A espacialidade em duas páginas condiciona esta linearidade entre antes e depois. Figura – Anúncio publicitário Lerin A relação da pimenta àquilo que arde, não apenas no plano físico, mas também no afetivo, compõe um paralelo há muito já trabalhado na comunicação cotidiana. Essa forma associativa não é meramente arbitrária, uma vez que a pimenta realmente possui um sabor picante. Sua utilização na construção de determinados paralelismos nos permite reconhecer um traço simbólico, que perpassa a correlação estabelecida, pois a recorrência associativa evidencia um hábito já estabelecido e uma convenção quando se busca estabelecer uma associação a algo que é quente, forte, picante, ardido ou sensual. O efeito de sentido − resultante da associação da pimenta com os olhos − é acentuado se considerarmos um provérbio muito utilizado na comunicação oral espontânea quando se busca enfatizar que a dificuldade alheia é branda para quem a observa à distância. Trata-se da expressão “Pimenta nos olhos dos outros é refresco”. Apesar do anúncio não fazer uma remissão direta a esta frase, pode-se atentar para a recorrência do provérbio e sua acentuada difusão nos diálogos informais, de cuja decodificação depende a apreensão metafórica materializada visualmente na espacialidade do anúncio, facilitando assim sua inteligibilidade. Nesse caso, a possível associação do provérbio à composição presente no anúncio, e, anteriormente, a transposição de diferentes efeitos de sentido, implicam recriações da associação presentificada na metáfora, até culminar numa composição codificada pelos recursos gráfico-visuais característicos do sistema impresso. Esse “criar de novo” àquilo que é dado numa outra estrutura sígnica configura não apenas um movimento distintivo da cultura, resultante do diálogo existente entre diferentes sistemas sígnicos, mas também evidencia a possibilidade de ressignificar determinadas metáforas, que passam a ser percebidas de modo não-usual, em virtude do modo como são materializadas por um sistema ou suporte específico. A introdução de novos suportes midiáticos e a consequente produção de novas formas de significado propiciam uma espécie de “reatualização” de certas relações associativas, acarretando a desautomatização do modo como são percebidas. Esta atualização, por sua vez, não exclui a superposição de sentidos que formam a composição. No anúncio do colírio Lerin, torna-se possível reconhecer distintas camadas de sentido superpostas, decorrente de diferentes formas perceptivas - gustativa, tátil, visual, oral- que coexistem na materialidade sígnica da página. Um traço recorrente nas metáforas construídas pela publicidade visando incitar a rápida percepção dos anúncios refere-se à utilização de elementos prosaicos, característicos da comunicação interpessoal cotidiana mais ordinária. Nestes casos, torna-se possível apreender o diálogo existente entre sistemas e gêneros discursivos distintos. De acordo com Mikhail Bakhtin (apud MACHADO: 2007), a peculiaridade de um gênero deve-se, dentre outros fatores, à diferença existente entre o gênero primário e o gênero secundário. O primeiro refere-se às formas discursivas mais elementares, frutos da comunicação interpessoal verbal espontânea, sem artificialismos. Os gêneros secundários, por sua vez, referem- se a construções textuais vinculadas a relações comunicativas mais complexas, e, por isso, requerem uma feitura discursiva mais “elaborada”. Eles são uma expansão do primeiro e acrescentam aos dois uma incorporação do segundo significado no primeiro. A inter-relação entre os gêneros primário e secundário pode ser visto no anúncio produzido em 1993 para o inseticida em spray Baygon. A peça, feita em página dupla possui, do lado esquerdo, a representação imagética do produto e, sobre o frasco, há a expressão verbal “Pá.”. A página ao lado é composta por uma espiral e, no final dela, há um inseto morto. Na parte superior da espiral há a expressão “Pum.”. A assinatura do anúncio possui a logomarca do anunciante e o slogan da marca. Figura – Anúncio publicitário Baygon A estrutura da peça estabelece um paralelo entre a eficácia do produto e uma expressão oral muito utilizada no dia a dia para se referir a algo cuja ação é excessivamente rápida. Um dos principais traços característicos da comunicação oral deve-se à proximidade existente entre os enunciados e a vida cotidiana, ao contrário do que ocorre com a comunicação escrita e tipográfica, cujas formas de verbalização impressa propiciam o distanciamento entre os textos e seu contexto de produção. Por isso, em geral, as formas discursivas orais tendem a ser mais situacionais, uma vez que a relação comunicativa expande a oralidade até a configuração do anúncio. A proximidade entre experiência e texto é facilmente reconhecível na expressão “Pá. Pum.”, pois a concisão da frase estabelece, de antemão, um paralelo com a agilidade. Ou seja, a própria materialidade do enunciado já incorpora traços daquilo que pretende significar. No entanto, ao ser incorporada pelo anúncio, a expressão reveste-se de uma forma sonoro-visual. A palavra impressa tanto é percebida pormeio do som, pois a apreensão do anúncio dificilmente ocorre sem um mínimo de sensibilidade à sonoridade da expressão inscrita, como por meio da visualidade espacial e gráfica das unidades verbais, relacionadas aos elementos figurativos presentes na peça: é a relação de causa e consequência metaforizada na página dupla. O verbal-oral inscrito na mensagem contrapõe-se à forma linear característica do verbal escrito, pois dificilmente uma sentença verbal caracterizada pela contiguidade poderia, por meio da sua materialidade sígnica, estabelecer uma relação de similaridade com a velocidade, especialmente se considerarmos o tempo que demanda a leitura de uma sequência linear. Na peça, há ainda uma outra correlação estabelecida, dessa vez, entre formas geométricas, cuja presença reforça a associação estabelecida no plano figurativo. Toda espiral é composta por uma linha curva, que tem início num ponto e afasta-se dele gradualmente, afunilando aos poucos a figura. Se contornarmos a espiral presente no anúncio com linhas retas, temos a formação de um triângulo, cuja base se encontra voltada para a parte superior da página. Essa figura estabelece um paralelo esquemático com o triângulo vermelho presente na embalagem do produto, cuja base também está voltada para a parte superior do frasco. A similitude de ambas as formas é acentuada pela presença de insetos na ponta dos dois triângulos, por meio do qual, se busca enfatizar tanto o problema que o produto resolve quanto a sua infalibilidade. A repetição de um mesmo elemento, tal como acontece com os triângulos presentes no anúncio do inseticida Baygon, é um dos meios utilizados pelo discurso publicitário. O intuito é ratificar positivamente o valor do objeto anunciado, evitando opiniões contrárias ou, ainda, uma possível dúvida sobre aquilo que se afirma sobre o produto e, em consequência, sobre a validade da sua compra. Nas mensagens, é muito comum que a repetição seja efetivada pelo código verbal, em virtude da precisão do modo como este código representa algo, evitando assim qualquer interpretação que não seja aquela prevista pela crença no consumo. Vista como um recurso persuasivo, a enunciação das mesmas ideias anteriormente apresentadas num texto pode ser entendida como um outro traço característico das regras ordenadores do sistema publicitário e, por isso, sua “ação” torna-se recorrente nos anúncios, ainda que esta repetição não seja realizada apenas por meio do código verbal. No anúncio, esta correlação sígnica possui ainda uma especificidade, pois a composição em página dupla orientada pela expressão oral “Pá. Pum.” indica a presença de dois tempos distintos: o primeiro designa o “antes”, isto é, o uso do produto, e o segundo apresenta o “depois”, em que é enfatizado o bom resultado decorrente da ação do inseticida. A sucessão presente na peça não apenas interage com a expressão oral, que também abriga uma sequência temporal; mas a reiteração imagética presente nas duas páginas estabelece um vínculo visual entre ambos os tempos, acentuando, de modo incisivo, o diferencial do inseticida. A correlação dos dois triângulos acarreta a espacialização da sequência temporal, do qual também resulta a espacialização do modo como a peça é percebida. Ao minimizar a lógica da sucessão, este anúncio evidencia um traço distintivo central do atual ambiente midiático, ou seja: impressão simultânea de diferentes signos, acarretando formas de apreensão imediatas e instantâneas, características de uma comunicação cada vez mais intensa e veloz, em detrimento da temporalidade característica da hierarquização de uma construção linear discursiva. Dando continuidade ao “preenchimento da semiosfera do espaço vazio” por meio das construções das espacialidades, perguntamo-nos como são construídas as imagens e como elas se modelizam e são modelizadas pelas espacialidades em outro sistema midiático: o cinema. Para isso, como recurso metodológico de análise, foram selecionadas duas cenas pertencentes ao longa-metragem Central do Brasil, filmado por Walter Lima Jr, e lançado no ano de 1998. Suas categorias epistemológicas de análise devem ser ressaltadas ao se tentar compreender a complexidade da construção da imagem: a primeira é denominada como visualidade, cuja concretude imagética “frouxamente se insinua”, pois a relação entre a percepção e a imagem é modelizada pelas qualidades do signo visual. A segunda categoria, denominada como visibilidade, não está diretamente relacionada à imagem, mas se constrói a partir dela, isto porque, por meio da leiturabilidade da iconicidade do signo visual são construídas relações prováveis através de diagramas que permitem o surgimento de signos mais elaborados. Dessa maneira, o diagrama constrói e é construído por uma espacialidade entre à elaboração perceptiva e reflexiva das marcas visuais que ultrapassam o recorte icônico para serem flagradas em sutis indícios, e as transduções das relações diagramáticas que permitem a construção de sínteses interpretativas. Ao ressaltar o diagrama como elemento mediador entre a imagem e sua leitura, é possível perceber uma operação lógica da visibilidade que funciona como uma fronteira existente entre a materialidade do signo visual e a síntese construída por uma mente interpretadora, por meio de índices que desempenham o papel de mecanismos tradutores. Os índices filtram determinados aspectos da imagem em detrimento de outros, ao estabelecer relações de dominância na sua superfície, fazendo com que ela passe por dois procedimentos semióticos dialógicos: o processo de hierarquização e o de fragmentação do todo. Ambos possibilitam criar o descontínuo no continuo, ao traduzirem as qualidades estruturais e não adjetivas do signo em quantidade informacional por meio de signos relacionais da estrutura, isto porque a estrutura atinge os padrões estruturais de um organismo e não as suas propriedades. Assim, a totalidade da imagem passa a ser transduzida e, portanto, vista de uma outra maneira, pela alteridade das relações existentes entre os nexos informacionais que compõem o diagrama, o que implica em dizer também que é no plano da visibilidade que se constrói a temporalidade da imagem, isso porque, é nela que se estabelecem as probabilidades combinatórias entre as relações temporais. Do filme Central do Brasil, foram selecionadas duas sequências, que ocorrem aproximadamente aos 13:00 e 59:25 da projeção do filme. Na primeira sequência, o menino Josué, senta em um banco localizado na estação Central do Brasil, após perder sua mãe em um acidente com um ônibus circular. Na segunda, Dora, personagem interpretada por Fernanda Montenegro, vê o caminhoneiro César, Othon Bastos, partindo em seu caminhão. Ela o vê através do vitrô de um banheiro de um bar de beira de estrada, quando ela foi se arrumar lá, justamente na intenção conquistar o caminhoneiro. Figura – Cenas do filme Central do Brasil Na cena do menino Josué, o desamparo e sofrimento dele compõem um plano médio fixo, frontal e centralizado da personagem que está chorando a morte de sua mãe. A imagem da personagem e a imagem do encosto do banco unem-se devido à baixa iluminação da cena e da curta distância focal, construindo a imagem diagramática na forma de cruz por meio da verticalidade do corpo de Josué adicionada à horizontalidade do banco. A presença acentuada dos transeuntes que atravessam os planos durante toda a sequência destaca a horizontalidade, tornando a cruz mais visível. Com a reiteração da verticalidade por meio de dois planos fixos de pessoas em pé, paradas no local, aparecem, alternadamente, sempre após o plano de Josué, como se fossem contra-planos do plano principal. A construção da imagem diagrama da cruz traz ao texto toda simbologia que envolve o signo cruz, pois, a história de Josué parece-secom a história de Cristo; ambos, crucificados, percorrem o mundo à espera do encontro com o pai. Não podemos esquecer que, no enredo do filme, o nome do pai do menino é Jesus, levando a construção de uma história dentro da outra: o filho em busca do filho do filho do Pai. Apesar dessa procura pelo seu pai, o encontro de Josué acaba sendo com Dora, que se solidariza com a causa do menino e passa a acompanhá-lo em sua busca. Assim, a cruz que o menino carrega se transforma na encruzilhada de Dora, ao ter o seu percurso dividido entre o antes e o depois do encontro com o garoto. Dora passa, então, de vilã a provedora, contaminada com a esfera de ação do herói, e a cruz que ela carrega se deixa ver. A imagem diagrama da cruz acontece novamente na narrativa; agora, com enquadramento em Dora. Esta, por meio de um plano centralizado, é enquadrada na altura do cotovelo para cima. O corpo de Dora, pendurada no vitrô do banheiro do bar de estrada, em pé, forma a verticalidade, a qual é reforçada por um movimento da câmera que realiza uma breve panorâmica vertical de cima para baixo, ao acompanhar um leve abaixar-se de Dora. A horizontalidade, por sua vez, é composta por meio das folhas basculantes do vitrô e das várias ondulações existentes no vidro canelado disposto horizontalmente. Ao ser refeita em outra personagem, a cruz acaba por promover uma espacialidade diagramática entre Dora e Josué, cuja visibilidade é modelizada pela analogia. Esta é exatamente a faculdade de variar as imagens, de combiná-las, de fazer que a parte de uma coexista com a parte da outra e de perceber, voluntariamente ou não, a ligação de suas estruturas. A semelhança estrutural por meio do signo cruz aproxima sequências distintas, permitindo com que a carga simbólica do texto mítico também dialogue com o percurso da segunda personagem. Segundo Walter Salles Jr: As opções formais de Central foram claramente definidas antes do filme. Havia também um desejo de que os planos dialogassem entre si. Os planos, tanto do ponto de vista da imagem quanto do som, desejavam ser ‘grávidos’ dos planos antecedentes, o que também possibilitava ‘engravidar’ os planos seguintes. O filme é construído em torno de rimas visuais e sonoras, que foram idealizadas antes da filmagem. (apud MACHADO: 2007, p.14). Apesar da relação de semelhança feita por meio da imagem diagrama da cruz estabelecida entre as duas sequências funcionar como uma rima visual, conforme ressalta Salles, é preciso o retorno ao plano da visualidade para perceber também as relações distintivas. Primeiramente o movimento da personagem Dora que, ao abaixar-se, tem o seu rosto cortado pelas várias texturas do vidro canelado. Cada relevo formado por uma elevação no vidro, ao ser percorrido pelo rosto de Dora, forma níveis distintos em relação à verticalidade do corpo, construindo uma cruz atrás da outra e sobrepondo uma à outra com base no eixo da similaridade. Dessa maneira, enquanto Josué carrega a sua primeira grande cruz em razão da sua pouca idade, é possível perceber que a trajetória de vida de Dora já está marcada por outras tantas. No caso da sequência em questão, a desilusão afetiva provocada pela fuga do caminhoneiro César, não foi e tampouco aponta ser a última a ser carregada por ela. Por fim, outra característica visual distintiva entre as imagens analisadas refere-se à disposição dos atores em relação à horizontalidade. No caso de Josué, o signo da cruz é composto pela junção entre a verticalidade do seu corpo sobreposta à horizontalidade do encosto do banco. Dora, por sua vez, tem sua imagem construída por trás da imagem do vitrô basculante. Assim, além de compor o signo cruz, também constrói, por meio da horizontalidade das linhas do vitrô, uma espécie de cerca que aprisiona a personagem, porque, apesar de os caminhos das personagens se entrecruzarem, a busca de cada uma é motivada por razões distintas: Josué tenta encontrar o pai e Dora, no processo de sua metamorfose, busca se libertar do peso das cruzes que carregou antes do seu encontro com Josué. Na conclusão da estudiosa, a questão fundamental para as pesquisas segundo uma semiosfera do espaço não é necessariamente ressaltar um ou outro tipo de modelização como se ele fosse símbolo único da cultura mundializada, mas sim compreender a intricada e contínua relação entre as espacialidades que constroem uma semiosfera. 2. Linguagens interconectadas: vídeo-texto O microconto Tragédia, do escritor chileno Vicente Huidoro, foi unido a outras artes – música e pintura – e, unidos, foram transformados em outra arte: filme. Tragédia é uma obra de vídeo-arte realizado pelo artista argentino Victor Arancibia. O texto, criado pelo Arancibia, surgiu da interação de várias linguagens entre que apresentam uma interpretação conflitiva da realidade por meio da qual atuam e se comunicam. O conto de Huidoro está transcrito a seguir, acompanhado de uma tradução: Tragédia María Olga es una mujer encantadora. Especialmente la parte que se llama Olga. Se casó con un mocetón grande y fornido, un poco torpe, lleno de ideas honoríficas, reglamentadas como árboles de paseo. Pero la parte que ella casó era su parte que se llamaba María. Su parte Olga permanecía soltera y luego tomó un amante que vivía en adoración ante sus ojos. Ella no podía comprender que su marido se enfureciera y le reprochara infidelidad. María era fiel, perfectamente fiel. ¿Qué tenía él que meterse con Olga? Ella no comprendía que él no comprendiera. María cumplía con su deber, la parte Olga adoraba a su amante. ¿Era ella culpable de tener un nombre doble y de las consecuencias que esto puede traer consigo? Así, cuando el marido cogió el revolver, ella abrió los ojos enormes, no asustados sino llenos de asombro, por no poder entender un gesto tan absurdo. Pero sucedió que el marido se equivocó y mató a María, a la parte suya, en vez de matar a la otra. Olga continuó viviendo en brazos de su amante, y creo que aún sigue feliz, muy feliz, sintiendo sólo que es un poco zurda. HUIDORO, Vicente. Tragédia. In: MACHADO, I. (Org.). Semiótica da cultura e semiosfera. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2007, p. 243. Tragédia (tradução) Maria Olga é uma mulher encantadora. Especialmente a parte que se chama Olga. Casou-se com um rapaz grande e fornido, um pouco desajeitado, cheio de ideias honoríficas, ordenadas como árvores de passeio. Mas a parte que ela casou era sua parte chamada Maria. Sua parte Olga permanecia solteira e logo arrumou um amante que vivia em adoração diante de seus olhos. Ela não podia compreender por que seu marido se enfurecera e reprovara-lhe a infidelidade. Maria era fiel, perfeitamente fiel. O que tinha ele que ver com Olga? Ela não compreendia que ele não compreendesse. Maria cumpria com seu dever, a parte Olga adorava seu amante. Era culpada de ter um nome composto e das consequências que isto pode trazer? Assim, quando o marido sacou o revólver, ela abriu os olhos enormes, não assustados e sim cheios de assombro, por não poder entender um gesto tão absurdo. Mas aconteceu que o marido se equivocou e matou Maria, a parte dele, em lugar de matar a outra. Olga continuou vivendo nos braços de seu amante, e creio que ainda hoje é feliz, muito feliz, sentindo-se apenas um pouco canhota. HUIDORO, Vicente. Tragédia. In: MACHADO, I. (Org.). Semiótica da cultura e semiosfera. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2007, p. 243. O próprio microconto tem um caráter híbrido ou transgenérico, capaz de se pôr entre os limites da poesia e da prosa. O microconto consiste em narração breve e expressa uma linguagem precisa, que exclui a retórica. Tanto a palvra expressa quanto os silêncios adquirem um significado sustancial. Os microcontos primam uma espécie de lei de economia
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