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Teorias do conhecimento filosófico Márcio Tadeu Girotti Introdução A filosofia, longe de ser uma ciência exata, procura caminhos reflexivos que envolvam pensa- mento e conhecimento para buscar soluções, causas, fundamentos para todos os fenômenos que ocorrem no mundo da experiência. Mais do que procurar a causa última de todas as coisas, a filosofia é um ramo do conhe- cimento que tem por base o pensar, o refletir, o dialogar, a busca por um método do conhecer, transformando o mundo em uma representação para o sujeito, constituindo conceitos de objetos representados no campo da experiência sensível. Objetivos de aprendizagem Ao final desta aula, você será capaz de: • entender o que é o conhecimento na vertente filosófica; • entender que a filosofia não busca soluções, mas sim busca reflexão e entendimento para perceber o problema que confronta a realidade em determinado momento; • identificar o método filosófico para o conhecimento. 1 O que é conhecimento O conhecimento está na relação entre aquele que conhece e aquilo que é conhecido, entre o sujeito do conhecimento e o objeto. O mundo se apresenta ao sujeito de forma desorganizada e é ele quem organiza o mundo em forma de pensamento, a fim de conhecer a coisas. Não se conhece do nada, ninguém inicia o conhecimento a partir do nada, pois há conhecimento acumu- lado, que é transmitido e trabalhado pelo ser humano. Desde a Antiguidade, o ser humano buscava conhecer o ser das coisas, o que são as coisas, a relação que elas estabelecem entre si e com o mundo, o ato de refletir levava o ser humano ao conhecimento. Essa busca pelo ser das coisas é a ontologia, o estudo do ser enquanto ser, que orientou, por séculos, o desenvolvimento do pensamento filosófico. Os primeiros filósofos iniciaram o descobrimento da natureza pelo ato de conhecer, bus- cando conhecer as coisas como elas são, a partir disso criaram teorias sobre as coisas e sobre o mundo, tudo dentro de um processo do pensar, do conhecer. A passagem do mito para a razão representou um grande avanço dentro da teoria do conhecimento, rompendo com a forma sobre- natural de interpretar o mundo, estabelecendo um novo mecanismo de conhecimento a partir da razão, com a investigação da natureza sem o auxílio do sobrenatural. Figura 1 – Conhecimento humano Fonte: Chinnapong/Shutterstock.com O próprio conhecimento é objeto de conhecimento. Para tanto, é criticado, questionado, busca-se refletir sobre o conhecimento adquirido promovendo no ser humano uma autorrefle- xão que o leva a constituir novos saberes, uma reflexão sobre o conhecer e sobre si mesmo, um autoconhecimento. FIQUE ATENTO! O conhecimento está na relação entre o sujeito e o objeto, entre o eu e o mundo, na forma de representação das coisas, criando conceitos de objetos. SAIBA MAIS! A ontologia, o estudo do ser enquanto ser, foi fundamental para o desenvolvimento do método em filosofia, que mais tarde transformou-se em epistemologia, um saber sobre como conhecemos, e não mais o que conhecemos. 2 Filosofia e conhecimento A filosofia sempre se ocupou com o processo do conhecimento. Desde sua origem, a busca pelo saber conduziu os pensadores a procurarem formas de conhecimento, bem como a origem de todo o saber. A partir da investigação da natureza, a filosofia tentava entender o mundo e as coisas que nele estão. Investigava o princípio de todas as coisas, o elemento primordial, a arché, essência que compõe tudo o que existe. Figura 2 – Busca pelo saber Fonte: PHOTOCREO Michal Bednarek/Shutterstock.com O conhecimento filosófico é constituído por indagações sobre o ser e sobre o mundo, buscando na natureza a compreensão da existência das coisas, ultrapassando o mundo sensível, o mundo da experiência, à procura da causa última de todas as coisas a partir de fundamentos metafísicos. No mundo do conhecimento, a ontologia fundamentou o pensamento filosófico por séculos, com a continua tentativa de conhecer o ser em sua essência, refletindo sobre o ser e sua existên- cia enquanto ser, em sua relação com o mundo. Posteriormente, com a epistemologia, a filosofia começa o processo de conhecimento a partir de como podemos conhecer. A preocupação não é mais pelo que pode ser conhecido, mas sim quais são os instrumentos estabelecidos para o pro- cesso de conhecimento. Nesse sentido, o conhecimento, essa relação do eu com o mundo, promove a conceituação do mundo, a transformação da abstração dos objetos em ideias, em conceitos, em formas de conhecimento, que, aos poucos, foi se constituindo em teorias do conhecimento, o processo de como conhecemos as coisas. FIQUE ATENTO! Desde os primórdios, a filosofia buscava uma teoria para o conhecimento, e viu na arché a primeira possibilidade de estabelecer um elemento essencial para a com- posição das coisas. EXEMPLO Arché, elemento primordial, para o filósofo pré-socrático Tales de Mileto, era a água. Tudo o que existe contém água ou já passou em algum momento de sua transfor- mação pelo estado da água. 3 O método na filosofia O método do conhecimento surge a partir do problema em relacionar o sujeito e o mundo, como relacionar os objetos do mundo à ideia deste objeto em forma de conceito e abstração. Com isso, a filosofia procurava estabelecer a relação do sujeito com o objeto a partir da representação. A intermediação entre sujeito e mundo é a representação que o sujeito faz do mundo, esse modo de relacionar o objeto ao sujeito, essa representação, é o que promove a origem do método. Em toda esfera do conhecimento, o método busca solucionar problemas, para o eu, para o outro, para o mundo, mas o método não é único. Em especial, na filosofia nunca se chegou a um método que resolvesse todos os problemas, ou que fosse o único para a obtenção do conhecimento. Figura 3 – Pensamento reflexivo Fonte: imtmphoto/Shutterstock.com O filósofo Sócrates acreditava na dialética como método para o conhecimento, a maiêutica socrática, o método de perguntar, partindo de premissas, da desconstrução do conhecimento para chegar a um resultado, ao conhecimento pretendido. Platão aprimorou o método de Sócrates, pro- movendo uma dialética que envolvia uma rememoração, a reminiscência, conhecimentos outrora adquiridos e relembrados no processo do conhecer. Aristóteles, contrário a Platão, via no mundo da experiência o processo de conhecimento, constituindo o conceito das coisas do mundo a par- tir da abstração desses objetos, comparando objetos e abstraindo deles suas semelhanças for- mando o conceito do objeto. O método de Sócrates e Platão, assim como de Aristóteles, são exemplos de como a filosofia procura conhecer por meio de um método. Na história da filosofia, o método se adapta à forma do conhecimento. Seja racional ou empírico, ele evolui, se modifica, se transforma, é aprimorado, mostrando que não há um método pronto e acabado para o conhecimento. FIQUE ATENTO! O método se estabelece na relação entre o sujeito e o objeto, com a intermediação do objeto e sua ideia/conceito por meio da representação. EXEMPLO Pelo método de Platão, somente conheço uma cadeira porque há uma ideia de cadeira no mundo ideal. Essa cadeira que vejo é somente uma cópia imperfeita da ideia de cadeira, uma sombra da ideia perfeita. 4 A filosofia e o filosofar Filosofia e filosofar são coisas distintas, a filosofia é uma forma de pensamento, de conheci- mento, uma maneira de adquirir saber; enquanto o filosofar é uma forma de reflexão, de buscar o conhecimento, de contrapor verdades, de relacionar saberes. A principal diferença entre filosofia e filosofar foi estabelecida por Immanuel Kant (1724- 1804) na sua obra “Crítica da razão pura” (1781), quando trata sobre o conhecimento e o processo de aquisição do saber. A Kant se atribui a expressão “não se ensina filosofia, se ensinafilosofar”. Com isto, ele pretende mostrar que o ensino da filosofia está relacionado ao processo de filosofar, de construir conhecimento a partir da reflexão, já que a filosofia é um conhecimento racional que parte de princípios e a partir deles se constitui o conhecimento. O filosofar está presente em nosso dia a dia, quando ponderamos, refletimos sobre deter- minada escolha, quando buscamos resolver um problema, a todo momento estamos refletindo, pensando e, com isso, fazemos conhecimento. A filosofia parece ser um saber já constituído, que a todo tempo é questionado, desconstruído, revigorado, refletido e reflexivo, que nos conduz a raciocinar, a utilizar a razão para questionar e adquirir novos saberes. Figura 4 – Reflexão Fonte: ChristianChan/Shutterstock.com A busca por conhecimento é um processo do filosofar. É com reflexão que adquirimos conhe- cimento e a filosofia fundamenta a aquisição do saber por meio do método, transformando o mundo em uma representação que será trabalhada pela razão a fim de constituir uma ideia, um conceito, formando um conhecimento. No âmbito do conhecimento, é o sujeito que constrói sua representação de mundo, formando conceitos para objetos da natureza, procurando entender o mundo por meio de algum método que oriente seu conhecimento. SAIBA MAIS! Leia o artigo “A história da filosofia e o filosofar: um olhar a partir de Kant” para melhor entender como o pensador articulava a diferença entre filosofia e filosofar. Disponível em: <https://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/FILOGE- NESE/elitonsilva.pdf>. Fechamento Nesta aula, você teve a oportunidade de: • compreender o que é o conhecimento; • entender o método na filosofia; • diferenciar a filosofia do filosofar. Referências ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria. Helena Peres. Filosofando: introdução à filoso- fia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993. CHAUI, Marilena de Souza. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2005. KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1983. SILVA, Éliton Dias da. A história da filosofia e o filosofar: um olhar a partir de Kant. Filogênese, Marília, v. 6, n. 2, p. 163-170, 2013. Disponível em: <https://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasE- letronicas/FILOGENESE/elitonsilva.pdf>. Acesso em: 16 jan. 2017.
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