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METODOLOGIA DO ENSINO DE HISTÓRIA AULA 4 Prof. Maurício Fonseca da Paz 2 CONVERSA INICIAL Anteriormente, vimos que o ensino de História tem metodologia própria. Ou seja, um conjunto de práticas desempenhadas pelo professor para facilitar e promover o conhecimento histórico na sala de aula. Nosso objetivo é conhecer e nos familiarizarmos com tais formas, a fim de aparelhar o estudante de História ou de Pedagogia a estar plenamente capaz de exercitar diferentes modelos já testados e exitosos no seu cotidiano. É fundamental que você perceba que tais metodologias apresentadas são frutos de pesquisas científicas e do trabalho de muitos outros professores, mas, ao mesmo tempo, sugestões e linhas de pensamento para que você desenvolva o seu trabalho, e não uma forma finalizada e definitiva que será reproduzida por cada professor sobre um grupo de alunos. Sua prática vai demonstrar que algumas metodologias funcionam em alguns grupos e outras, não. Assim, sua experiência e seu cuidado são fundamentais para atingir melhores resultados e tirar proveito de cada metodologia. Muitas vezes, as reflexões e pesquisas iniciais sobre a metodologia do ensino de História estão conectadas a teorias desenvolvidas sobre o processo de cognição humana e foram inicialmente estudadas e desenvolvidas em outras áreas de conhecimento, como a Psicologia e a Pedagogia. Portanto, vamos entender a origem dessas teorias e de que forma elas acabaram contribuído para a geração de metodologias próprias da História. TEMA 1 – CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA E DA PEDAGOGIA PARA O ENSINO DE HISTÓRIA Antes de se pensar em uma metodologia do ensino de História, as áreas do conhecimento que primeiro se dedicaram a estudar e entender a cognição humana foram a Psicologia e a Pedagogia. Nesse sentido, as teorias propostas por Piaget e Vigotsky são dois marcos para esses estudos. Embora parecidas, e durante algum tempo sustentadas como semelhantes, existem diferenças fundamentais entres suas propostas. Em comum, ambas teorias se dedicaram a observar o comportamento infantil a fim de entender como ocorre o processo de aprendizagem do indivíduo. Piaget acabou por elaborar a teoria cognitiva, na qual defende que o conhecimento é adquirido de acordo com uma predisposição biológica e 3 psicológica. Isto é, as crianças carregam etapas de aprendizado da mesma forma que apresentam etapas de desenvolvimento biológico. Sua motricidade e capacidade mental estão condicionadas a etapas do desenvolvimento biológico e assim também ocorre com o aprendizado. Para ele, essa relação estabelecida em etapas era a chave para otimizar o aprendizado de cada pessoa, pois tal aprendizado deveria acompanhar o momento de desenvolvimento biológico de cada um. A orientação de classes seriadas com alunos em proximidade de idade é um exemplo da influência da sua teoria. Alunos devem estar em uma etapa de desenvolvimento biológico semelhantes para que as propostas de ensino sejam adaptadas a essa idade e, assim, obter a cognição adequada. Vigotsky indicava que a cognição adivinha da linguagem e das diferentes formas de comunicação. Para ele, era fundamental que o processo de aprendizagem ocorresse em um ambiente de inter-relações humanas, de maneira coletiva e grupal. Assim, as crianças aprendem mais se colocadas juntas e estimuladas a interagirem entre si. Da mesma forma, para ele, o uso da linguagem era o ponto de partida dos processos cognitivos, de modo que a interação e a resolução de problemas em grupo estavam no eixo da sua proposta. Esses dois pensadores são as maiores contribuições da Psicologia e da Pedagogia ao nosso campo de conhecimento e, provavelmente, você vai estudá- los com maior profundidade em outras disciplinas. Aqui, eles estão nomeados porque seu trabalho produziu efeitos até hoje no nosso cotidiano de professores. São chamadas de escolas construtivistas aquelas que operam com base nas teorias desses pensadores. TEMA 2 – CONSTRUTIVISMO NO ENSINO DE HISTÓRIA As teorias cognitivas de Piaget e Vigotsky ajudaram a construir um modelo de ensino que se contrapunha ao tradicional. Segundo o construtivismo, o ensino seriado, em etapas e entre semelhantes, se manteve, mas a sua principal contribuição foi a ideia de maior participação do aluno no seu processo de aprendizagem. Isso significa que o aluno não deveria ser passivo diante da educação, ele não é alguém que somente recebe o conhecimento que emana do professor. Ele deve ser também ativo na construção do seu próprio conhecimento. 4 A proposta pode ser basicamente identificada pelo seu nome: construtivismo, ou seja, o aprendizado é um ato de construção, de etapas e de progresso. Assim, o aluno deve aprender a aprender e tomar parte no seu processo individual de crescimento. Construtivismo significa isto: a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que, especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância, como algo terminado. Ele se constitui pela interação do indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia, na bagagem hereditária ou no meio, de tal modo que podemos afirmar que antes da ação não há psiquismo nem consciência e, muito menos, pensamento (Becker, 1993. p. 88). A proposta dessa metodologia parte do pressuposto de oferecer ao aluno formas de interação e busca por respostas. Esse trabalho, no entanto, é feito sempre em conjunto, uma vez que, "na ausência do outro, o homem não se constrói homem" (Vigotsky, 1998). Isso significa que trabalhos em grupo e diferentes formas de interação devem ser estimuladas pelos professores. A metodologia construtivista avançou, ao longo dos anos do século XX, pela mão de diversos outros pesquisadores das mais diferentes áreas de conhecimento. A ideia central é que as aulas tragam formas de estímulo de busca de conhecimento de maneira que o aluno seja parte do processo de aprendizado. Ao iniciar nos anos básicos do Ensino Fundamental, a concepção de história passou a ser desenvolvida de maneira escalonada, muitas vezes junto do desenvolvimento do conhecimento geográfico, relacionando tempo e espaço. Assim, as crianças iniciam seus estudos conhecendo e experimentando a cronologia e os efeitos do tempo aliados, a um conhecimento espacial de mundo. Geralmente, a cronologia é estudada por meio de uma lógica familiar: quem sou eu na minha família? São desenvolvidos exercícios de montagem de árvores genealógicas remetendo ao passado com consequências diretas sobre o presente. Evidentemente, esse exercício tem limitações diante das diferentes configurações familiares que se apresentam na atualidade de nossa sociedade. Ainda assim, ele é um exemplo clássico de como começar a estudar a história por meio do construtivismo. Trabalhos que envolvam fotografias mais antigas da família também são um bom exemplo dessa metodologia que se propõe a trazer a lógica da linha temporal para o aluno de maneira que ele construa a sua própria linha do tempo. 5 Depois, o estudo sobre a História se relaciona ao espaço ocupado e se estuda a cidade onde se vive, sua história e sua ocupação. Essa lógica de estudo se expande e se estudam a história do estado e a história do país. Trata-se de uma forma muito usada até hoje e que garante bons resultados. Esse modelo considera aspectos essenciais das teorias cognitivas porque escalonam o conhecimento e trazem a busca por respostas como forma de incentivo. Outro exemplo da influência do construtivismo são trabalhos realizados em grupo pelos alunos, quando o professor divide a turma em grupos de trabalho e atribui a cada um uma atividade. Nesse caso, o professor se torna alguém que acompanha a evolução de seus alunos diantede um objetivo em comum. Ele deixa de lado a aula expositiva e leva os alunos a buscarem formas de resoluções diante de textos ou fontes históricas. Aliás, foi no construtivismo que o trabalho com fontes históricas na sala de aula começou a ser utilizado. A ideia inicial era colocar o aluno em contato com a fonte histórica para que ele compreendesse o processo de construção de conhecimento dos historiadores por meio dela. Muitas vezes, esse recurso acabou se tornando apenas uma forma de ilustração e as fontes históricas eram dispostas nos livros didáticos ao lado de textos explicativos, mas sem um questionamento sobre a fonte. Ela apenas estava lá. Hoje, existem materiais mais apropriados e os livros didáticos valorizam e exploram as possibilidades do uso da fonte histórica nas metodologias de ensino. TEMA 3 – METODOLOGIA DE ENSINO ATIVA Embora a metodologia de ensino ativa surgiu no final do século XIX como um desdobramento do construtivismo, foi somente no início do século XXI que ela chegou às escolas brasileiras. Sua base está na ideia da aprendizagem presente em projetos desenvolvidos por John Dewey, que tinha um princípio comprometido com a função política da educação. Segundo ele, somente se os estudantes conseguissem exercer seus direitos e suas ações em um microcosmo como a escola por meio do processo educativo, poderiam se preparar para exercer o mesmo papel ativa diante da sociedade. Sua ideia era impregnar os estudantes com capacidades autônomas e estimular o altruísmo, possibilitar a eles que pudessem tomar decisões, desenvolver projetos, executar ideias e transformar a realidade escolar com suas ações. No entanto, essa metodologia necessita, segundo ele, da liberdade de 6 expressão e de ação dos alunos como eixo fundamental do ensino. Nesse contexto, o papel do professor não é expor o conhecimento que ele tem, mas levar o aluno a encontrar o conhecimento por meio de atividades prepositivas e práticas, respeitando o interesse e o tempo de cada aluno. Aqui temos uma diferença entre o construtivismo e a metodologia de ensino ativa: enquanto o primeiro espera um desenvolvimento em grupo harmonioso e escalonado, a metodologia de ensino ativa entende que há interesses e tempos diferentes entre os indivíduos. Até hoje, muitas escolas norte-americanas utilizam essa metodologia como diretriz escolar. Em seu currículo, os alunos podem escolher algumas disciplinas de acordo com seu interesse, bem como qual esporte será praticado. Além disso, a avaliação dessa metodologia é marcada pelo desenvolvimento contínuo de um projeto e com a presença reduzida de provas e testes objetivos. Entre algumas práticas dessa metodologia, estão a aula invertida e a peer instruction. A aula invertida (flipped classroom) leva em consideração que o aluno aprende de maneira mais profunda e eficaz quando está ensinando. Ou seja, o aluno toma o papel de ensinar a todos algo que ele aprendeu. Assim, ele é orientado pelo professor sobre determinado tema ou conteúdo e deve buscar as informações suficientes a fim de construir o seu conhecimento para expô-lo diante da turma por meio de debates ou dinâmicas. Já o peer instruction foi desenvolvido nos anos 1990 nos EUA e considera que o aprendizado é mais efetivo quando acontece em pares ou grupos. Nessa metodologia, o professor inicia a aula com o desenvolvimento de um conceito por um breve momento de tempo, aplica um teste referente a este conceito para um pequeno grupo de alunos e, imediatamente, após poucos minutos, confere a resposta. Se há um acerto superior a 60%, ele dá andamento a um próximo conceito, caso contrário, ele apresenta um novo teste. Os alunos discutem a resposta e reelaboram as suas e segundo seus idealizadores, esse mecanismo garante um processo efetivo de aprendizado. TEMA 4 – MÍDIAS NO ENSINO DE HISTÓRIA A presença de diferentes mídias no nosso cotidiano levou o ensino de História a considerar o seu uso para a sala de aula. Assim, não somente os usos de vídeo, cinema, hipertexto, entre outras mídias, como a produção de mídias para o ensino da História, cresceram. Assim como o uso de fontes históricas, 7 muitas vezes tais médias acabam sendo utilizadas de forma superficial, com função ilustrativa. Enquanto toda mídia deve ser utilizada com um olhar crítico. De fato, essa é a principal característica com o trabalho que envolva mídias: oportunizar e treinar o olhar crítico de nossos alunos. Segundo Flavio Trovão (2018), “ter acesso a essas tecnologias não é suficiente para garantir um bom processo educativo, visto que é importante adotar uma postura crítica diante desses avanços”. É preciso dizer que a definição de mídia indica que qualquer forma ou suporte de informações é uma mídia. Assim, textos escritos, livros dos mais diversos formatos, músicas, vídeos dos mais diversos, cinema, teatro e até mesmo clips de música, desenhos animados ou os famosos youtubers podem ser inclusos nessa categoria. Entre as possibilidades de trabalhar com a mídia, está também a de os próprios alunos criarem uma peça de mídia, tal como um esquete em vídeo, um podcast ou uma animação. Nesse contexto, o uso das mídias funciona como um meio para um fim, o processo de ensino de História. Igualmente, é preciso que o educando desenvolva um olhar crítico e não observe uma mídia como um fato consumado, mas que entenda que por detrás de cada mídia há um processo produtivo e intencional. As mídias são capazes de estimular outros conhecimentos além da história, bem como de estabelecer relações entre conteúdos e a realidade. Mas alguns cuidados são fundamentais. Um deles é de que o professor observe a classificação indicativa do filme ou da música a ser utilizado. Que observe se a linguagem e a exposição de imagens estão de acordo com a turma. TEMA 5 – PAULO FREIRE: AUTONOMIA E REALIDADE DO ALUNO O pensamento freiriano é muito influente nos processos de ensino do Brasil e do mundo. Por meio das suas reflexões, novas formas de enxergar a sala de aula contribuíram para uma mudança de paradigma e trouxeram novos olhares sobre a realidade do aluno. Entre tais contribuições, a noção de que o aluno não é uma folha de papel em branco, mas que um sujeito cheio de experiências e ações de sua própria história. Essa noção de protagonismo individual do aluno é o grande ponto do pensamento de Freire. Para ele, essa realidade do aluno deve ser percebida pela escola e pelo professor. 8 Mais do que isso, somente se o professor observar e acessar a realidade dos estudantes será possível a construção de conhecimento. Portanto, o ensino da História precisa passar por temas da realidade da turma. Pois “dar uma aula” sobre as diferentes ordens religiosas do medievo europeu do século XX só fará sentido em uma lógica de proximidade com a realidade de uma escola da periferia de Manaus dos dias atuais. Igualmente, o ensino de História ganha, na teoria freiriana, um espaço de destaque, uma vez que por meio do estudo do passado o oprimido desvela as estruturas opressoras da sociedade e pode se habilitar a buscar a libertação. NA PRÁTICA Na aula de hoje, você investigou algumas metodologias de ensino. A ideia agora é que você escolha uma dessas metodologias apresentadas e desenvolva um novo plano de aula, observando as possibilidades de desenvolvimento de um trabalho aos seus alunos com os usos dessa metodologia escolhida. Você pode escolher a faixa etária e ano de ensino, bem como o conteúdo a ser trabalhado. Entre as metodologias, você pode escolher: Construtivismo; Metodologia de ensino ativa; Aula invertida; Peer instruction; Uso de mídias. FINALIZANDO O uso de diferentes metodologias de ensino teve sempre o mesmo objetivo: proporcionar uma melhor forma de aprendizado aos alunos. Dito isto, é importante que você perceba que tais metodologiasnão são regras explicitas e fechadas de como fazer. Elas são sugestões de trabalho, de modo que você não deve se dedicar a aprender apenas uma, pois suas aulas serão baseadas em apenas um aporte teórico. Assim, quanto mais metodologias você conhecer e experimentar, melhor estará preparado para a sala de aula. Aliás, esse é nosso desejo e nossa expectativa. Que um amplo conhecimento sobre as metodologias proporcione a você uma bagagem suficiente para orientá-lo quando chegar o momento de 9 observar uma sala de aula e, posteriormente, quando chegar a sua vez de conduzir uma aula de ensino de História. Faça sempre as leituras recomendadas, elas trazem as experiências e reflexões nas palavras de cada pesquisador sobre um ponto específico. 10 REFERÊNCIAS BECKER, F. O que é construtivismo. Ideias. São Paulo: FDE, n. 20, p. 87-93, 1993. BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de história: fundamentos e métodos. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2009. (Coleção Docência em Formação). CAVAZZANI, A. L; CUNHA, R. P. da. Ensino de história: itinerário histórico e orientações práticas. Curitiba: Editora InterSaberes, 2017. DIAS, S. de F. História temática como metodologia do ensino de história: percepções de professores em um processo de formação continuada. Curitiba: Secretaria de Educação do Estado do Paraná, 2006. FONSECA, T. N. de L. História e ensino de história. Belo Horizonte: Autêntica, 2003, p. 37-71. GHIRALDELLI JUNIOR, P. História da educação brasileira. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2015. LAVILLE, C. A guerra das narrativas: debates e ilusões em torno do ensino de história. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 19, n. 38, p. 125-138, 1999. PAZ, M.; PAULINO, C.; MOTTA, R.; TROVÃO, F. Perspectivas do ensino de história. Teorias, metodologias e desafios para o século XXI. Curitiba: InterSaberes, 2018. VASCONCELOS, J. A. Metodologia do ensino de história. Curitiba: Editora InterSaberes, 2012.
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