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0 0 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido Resumo Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido 1 1 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido 1. Introdução A Síndrome do desconforto respiratório (SDR) ou Doença da membrana hialina (DMH) é uma doença respiratória que resulta da imaturidade pulmonar pela deficiência e inatividade do surfactante, desenvolvimento pulmonar incompleto e complacência exagerada da caixa torácica. Trata-se da maior causa de morbidade e mortalidade de crianças prematuras. Ocorre principalmente nas crianças prematuras e sua incidência está inversamente relacionada à idade gestacional e ao peso no nascimento. Ocorre em 60 a 80% das crianças com idade gestacional (IG) inferior a 28 semanas, em 15-30% naquelas entre 32 e 36 semanas, e raramente nas crianças com IG superior a 37 semanas. O risco da SDR aumenta com o diabetes materno e na ocorrência asfixia. A incidência é mais elevada em crianças prematuras brancas ou do sexo masculino. O risco é reduzido nas gestações com hipertensão crônica ou associada à gravidez, ruptura prolongada de membranas e profilaxia pré-natal com corticosteroides. 2. Fisiopatologia A principal causa da SDR é a deficiência do surfactante pulmonar. O pulmão fetal é preenchido com fluido e é responsável pela função respiratória até o nascimento. Na preparação para a respiração aérea, o surfactante é expresso no pulmão a partir da 20ª semana de gestação pelos pneumócitos do tipo II. O surfactante reduz a tensão da superfície alveolar, o que diminui a pressão necessária para manter o alvéolo inflado, facilitando sua expansão e mantendo sua estabilidade durante a expiração. A produção do surfactante em quantidades suficientes depende de um aumento nos níveis de cortisol do feto, o que acontece entre 32 e 34 semanas de gestação. Ao redor das 34 a 36 semanas há material de superfície ativo e suficiente secretado no lúmen alveolar e excretado no fluido amniótico. Por causa desse desenvolvimento temporal, a causa mais comum de deficiência de surfactante é o parto prematuro. Mais 2 2 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido raramente, mutações nos genes que codificam as proteínas surfactantes também podem causar deficiência e/ou disfunção e insuficiência respiratória em crianças nascidas a termo. A síntese do surfactante depende, ainda, em parte, de pH, temperatura e perfusão normais. Asfixia, hipoxemia, isquemia pulmonar, especialmente em associação com a hipovolemia, hipotensão e estresse causado pelo frio também podem inibir sua síntese. A atividade inadequada do surfactante resulta em alta tensão superficial dos alvéolos, levando à instabilidade do pulmão na expiração final, com colabamento dos alvéolos e diminuição da complacência pulmonar. A deficiência do surfactante também causa inflamação pulmonar e lesão epitelial respiratória, o que pode resultar em edema pulmonar e aumento da resistência das vias aéreas. Esses fatores exacerbam ainda mais a lesão pulmonar e pioram a função. A atelectasia alveolar, a formação de membrana hialina e o edema intersticial tornam os pulmões menos complacentes. Desse modo, é exigida uma pressão maior para expandir os alvéolos e as pequenas vias aéreas. A parede torácica da criança prematura, altamente complacente, oferece menor resistência do que a parede torácica da criança nascida a termo, apresentando uma tendência natural para o colapso pulmonar. Assim, no final da expiração, o volume do tórax e dos pulmões tende a se aproximar do volume residual e pode se desenvolver a atelectasia pulmonar (colapso de porções do pulmão). Essas alterações na função pulmonar causam hipoxemia devido ao desequilíbrio entre a ventilação e a perfusão (alvéolos são perfundidos, mas não ventilados) e também hipercapnia. A combinação de hipercapnia, hipoxemia e acidose produzem vasoconstrição arterial pulmonar com aumento do shunt direita/esquerda através do forame oval e canal arterial e dentro do próprio pulmão. O dano progressivo às células epiteliais e endoteliais a partir da atelectasia (atelectrauma), volutrauma, isquemia, e toxicidade de oxigênio resulta na efusão de material proteico para o interior dos espaços alveolares. 3 3 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido FIGURA 1: Fatores contribuintes na patogênese da doença da membrana hialina FONTE: Nelson, 2018 3. Manifestações Clínicas Resultam principalmente da função pulmonar anormal e hipoxemia. Apresentam-se nos primeiros minutos ou horas após o nascimento. Se não tratada, piora progressivamente nas primeiras 48 horas de vida. Em alguns casos, os bebês podem não parecer doentes imediatamente após o parto, mas desenvolvem desconforto respiratório e cianose nas primeiras horas de vida. Esses bebês podem ter uma quantidade limítrofe de surfactante que é consumida ou se torna inativada. Os prematuros de muito baixo peso também podem ter expressão clínica de desconforto respiratório pouco evidente, sendo frequente o aparecimento precoce de crises de apneia e cianose. O recém-nascido afetado é quase sempre pré-termo e apresenta sinais de desconforto respiratório que incluem: • Taquipneia; 4 4 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido • Batimento de asa do nariz: reflete o uso dos músculos respiratórios acessórios e diminui a resistência total do sistema respiratório; • Gemidos: resulta da exalação através de uma glote parcialmente fechada na tentativa de prevenir o colapso alveolar ao final da expiração; • Retrações intercostal, subxifoide e subcostal: ocorrem porque a caixa torácica altamente complacente é retraída durante a inspiração pelas altas pressões intratorácicas necessárias para expandir os pulmões com baixa complacência; • Cianose: devido à hipoxemia. Exame físico: • Murmúrio vesicular reduzido; • Palidez pode estar presente; • Pulsos periféricos podem estar diminuídos; • Débito urinário pode estar reduzido nas primeiras 24 a 48 horas; • Edema periférico é comum. Sem tratamento, a SDR não complicada progride por 48 a 72 horas com aumento do desconforto respiratório e da hipóxia e tipicamente se resolve em 1 semana de idade, devido ao aumento da produção endógena de surfactante. O tratamento com o surfactante exógeno melhora dramaticamente a função pulmonar, levando à resolução dos sintomas e encurtando o curso clínico. O uso de Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas (CPAP) também melhora o curso da SDR, mesmo em crianças que não receberam a terapia com o surfactante. 4. Diagnóstico Baseado no quadro clínico de um recém-nascido pré-termo com início de insuficiência respiratória progressiva logo após o nascimento, associado a uma radiografia de tórax característica. 5 5 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido A radiografia de tórax típica mostra infiltrado retículogranular difuso distribuído de maneira uniforme (aspecto de vidro moído ou vidro fosco), broncograma aéreo e aumento de líquido pulmonar. Os prematuros de extremo baixo peso podem apresentar, no início, poucas alterações radiológicas, decorrente da imaturidade de seus pulmões. Em outros casos, a aparência inicial da radiografia eventualmente é normal, com o padrão típico se desenvolvendo ao longo do primeiro dia. Outros achados laboratoriais associados, mas não diagnósticos: • Gasometria arterial: revela hipoxemia importante em ar ambiente, que responde a administração de oxigênio suplementar. Com a evolução do quadro há retenção de CO2, que pode estar inicialmentenormal ou até diminuído em razão da taquipneia compensatória. A acidose, inicialmente do tipo respiratório, costuma progredir para acidose mista. • Eletrólitos: pode ocorrer hiponatremia com a progressão da doença, que resulta na retenção de água. Diagnóstico diferencial: pneumonias congênitas, em especial pelo estreptococo do grupo B, taquipneia transitória do recém-nascido, cardiopatias congênitas e malformações pulmonares. 5. Tratamento A utilização de métodos de ventilação assistida, reposição de surfactante exógeno, medidas gerais de controle térmico, metabólico, hídrico e ainda a importância de um suporte nutricional agressivo e precoce são fundamentais. A meta primordial é manter uma boa oxigenação, e, para isso, é necessário um rápido e efetivo recrutamento das áreas colapsadas. O suporte ventilatório e o uso de oxigênio complementar deve ser o mínimo possível, de forma a evitar uma maior agressão pulmonar. • Reanimação adequada visando minimizar a lesão pulmonar • Admissão na UTI neonatal e aquecimento, mantendo o bebê na zona térmica neutra 6 6 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido • Suporte ventilatório: o CPAP nasal: a ventilação não invasiva (VNI) e o CPAP vêm sendo adotados, em alguns casos, como 1ª escolha. Tem-se recomendado sua utilização precoce, muitas vezes na sala de parto, para prevenir colapso dos alvéolos ainda abertos e reduzir a necessidade de suporte ventilatório no curso da doença. Exerce importante ação fisiológica, por meio do aumento da capacidade residual funcional e promoção do crescimento pulmonar do prematuro. Melhora a complacência pulmonar, reduz a resistência das vias aéreas, aumentando seu diâmetro e mantendo-as abertas, diminui a frequência respiratória, melhora a aposição do diafragma e a sua contratilidade e apresenta um papel na conservação do surfactante exógeno. Objetiva-se manter uma PaO2 entre 50 e 70 mmHg e, se necessário, realizam-se aumentos graduais da FiO2 (5 a 10%) até cerca de 80% e do CPAP até, no máximo, 10 cmH2O. Naqueles casos com insuficiência respiratória grave (hipóxia acentuada e acidose respiratória grave com PCO2 > 60 mmHg), apesar do uso de CPAP nasal, a ventilação mecânica (VM) deve ser indicada. o Ventilação mecânica: as evidências mais atuais têm demonstrado a preferência por modos sincronizados, os quais diminuem o trabalho respiratório do RN. Parâmetros Pressão positiva expiratória final (PEEP) Iniciar com 4 a 6 cmH2O Pressão inspiratória (PIP) Mínima necessária para que haja boa expansão torácica (15 a 25 cmH2O), ajustar conforme evolução Tempo inspiratório (TI) O menor possível (0,4 a 0,5s) TI muito prolongado está intimamente associado com lesões tipo escape (pneumotórax) 7 7 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido FiO2 A necessária para manter uma oxigenação adequada Frequência respiratória (IMV) Entre 30 e 60 TABELA 1: Parâmetros iniciais para a ventilação mecânica convencional FONTE: Sociedade Brasileira de Pediatria, 2017 • Surfactante exógeno: uso precoce é benéfico, principalmente quando administrado nas primeiras 2 horas de vida. O intervalo mínimo entre as doses deve ser de 6 horas, e os pacientes que permanecem entubados, com padrão radiológico apresentando pouca melhora e com dificuldade de diminuir os parâmetros do respirador, são os candidatos a novas doses da medicação. A dose inicial varia de 100 a 200 mg/kg e uma dose adicional (100 mg/kg) deve ser feita se, 6 horas após, continuar em VM e com FiO2 acima de 30%. A melhor maneira de administrar o surfactante seria em bolus associado a algumas estratégias ventilatórias antes e depois de seu uso: Manter o RN em decúbito dorsal Aumentar a pressão em 1 a 2 cmH2O no respirador, 5 minutos antes da aplicação, ou utilizar ventilador manual com 1 a 2 cmH2O acima da pressão utilizada previamente Desconectar do TOT Aplicar no terço médio da traqueia, em bolo (em 10 a 20”) em 1 a 2 alíquotas com intervalo de 30 a 60” entre elas Ventilar com frequência de 60 ipm e pressão suficiente para empurrar para dentro das vias aéreas Tentar não aspirar o TOT nas 2 horas seguintes, a menos que tenha sinais de obstrução das vias aéreas 8 8 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido 6. Prevenção Estratégias: • Evitar o parto por cesariana sem indicação ou antecipado de forma insatisfatória (< 39 semanas) ou a indução precoce do parto; • Controle adequado da gravidez e do trabalho de parto de gestantes de alto risco (incluindo a administração de corticosteroides no período pré-natal); • Predição de imaturidade pulmonar com possível aceleração da maturação ainda intraútero; • Monitoramento pré-natal e intraparto: pode reduzir o risco de asfixia fetal; • Administração de corticosteroides no período pré-natal às mulheres antes de 34 semanas de gestação sob risco de trabalho de parto prematuro: reduz acentuadamente a incidência e a mortalidade da SDR, bem como a mortalidade neonatal geral, é recomendada para todas as mulheres em trabalho de parto prematuro com probabilidade de nascimento do feto dentro do período de 1 semana, a betametasona e a dexametasona têm sido usadas; • CPAP (pressão positiva contínua nas vias aéreas) iniciada no nascimento: tão eficaz quanto a administração profilática ou precoce do surfactante. É a abordagem de escolha para o manejo na sala de parto de um recém-nascido prematuro em risco para a SDR. 9 9 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido Referências bibliográficas Martin R. Pathophysiology, clinical manifestations, and diagnosis of respiratory distress syndrome in the newborn. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Acesso em 14 de novembro de 2018) Martin R. Overview of neonatal respiratory distress: Disorders of transition. Post TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Acesso em 14 de novembro de 2018) Nelson. Tratado de Pediatria. 20. ed. – Rio de Janeiro : Elsevier, 2018. Nelson. Princípios de pediatria. 7. ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. Tratado de pediatria: Sociedade Brasileira de Pediatria. 4. ed. Barueri, SP : Manole, 2017. http://www.uptodate.com/ 10 10 www.sanarflix.com.br Síndrome do Desconforto Respiratório do Recém-Nascido
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