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Karl Marx vida e obra

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Karl Marx - vida e obra
Karl Marx desenvolveu, a partir de 1840, obra vasta e complexa, dedicada a estudar a totalidade do capitalismo; sua análise capta a lógica interna desse tipo de organização da sociedade, lógica esta baseada na noção dialética de contradição. Seu objetivo era o de esclarecer como o capitalismo nasceu como se desenvolveu e como seria seu declínio e superação. Sua teoria é ampla, abarcando diferentes aspectos da vida ou existência social. Ela parte da constatação de que o “homem é um ser social”, mas também apresenta uma concepção sobre sua relação com a natureza: ele faria parte desta, mas estabeleceria com ela uma relação dinâmica – dialética – já que a transformaria por meio da prática, ou seja, do trabalho. No entanto, ao fazer isso, ela também o transformaria. A teoria marxista contempla, portanto, uma relação do homem com a natureza, assim como uma teoria da prática social - ou seja, da ação e do trabalho -, além de uma teoria histórico-social, que investiga o modo de organização econômica da sociedade e os conflitos de classes dele decorrentes. 
A vida
Karl Marx nasceu no dia 5 de maio de 1818, em Treves, capital da província alemã do Reno (A Alemanha não era ainda um país unificado, coisa que ocorrerá apenas em 1848), filho de um advogado e conselheiro da justiça. Começou a estudar Direito na Universidade de Bonn, mas em 1836 se transferiu para a Universidade de Berlim, onde abandonou o curso de direito para se interessar por História e Filosofia; nessa cidade começou a frequentar a boêmia local. Em 1837 ficou noivo de Jenny von Westphalen, filha de família de alto prestígio e de grandes posses, com quem posteriormente se casou. Concluiu sua tese de doutorado na Universidade de Iena em 1841. Em 1844 se exilou na França, onde teve contato com os primeiros movimentos operários e socialistas, além de conhecer escritores e políticos como Proudhon, Charles Fourier e, sobretudo, Friedrich Engels, que se tornaria seu parceiro intelectual pelo resto da vida. Expulso da França, buscou exílio na Inglaterra, país em que escreveu sua obra mais densa intitulada O capital, cujo primeiro volume foi publicado em 1867. Foi ainda criador da Primeira Internacional Comunista em 1848 e militante político junto ao movimento operário, então em seus primórdios. Morreu em Londres no dia 14 de março de 1883. 
A obra
Uma teoria racional: Marx elaborou uma teoria racional, cujas partes se articulam racionalmente. Ela foi concebida de acordo com o espírito científico que se disseminou no século XIX por várias áreas de conhecimento. Ou seja, sua ambição era a de criar uma ciência; seu objetivo era o de conhecer cientificamente seu objeto de estudo. Ela não nasceu de um grau zero, mas da assimilação de várias correntes de pensamento ou de teorias que formaram o pensamento moderno, as quais gozavam de grande prestígio e reconhecimento na primeira metade do século XIX.
Antecedentes teóricos: Dentre estas, cumpre citar: a) a filosofia dialética de Hegel e o “hegelianismo de esquerda” de Ludwig Feurbach no campo da filosofia. Hegel elaborou uma teoria sobre o papel e a importância das contradições na história, concebida como um processo, que teve enorme importância para Marx; b) a economia politica clássica de Ricardo e Adam Smith, que havia estudado o papel do trabalho como atividade humana capaz de modificar a natureza, além da própria divisão do trabalho social e o processo de trocas econômicas; c) o materialismo (“o existente é a matéria”) mecaniscista francês, que começara a estudar a natureza como uma realidade objetiva supostamente regida por leis, da qual o homem se originaria - desenvolvido por pensadores como D’Holbach e Helvétius, entre outros; d) o desenvolvimento das ciências da natureza, como a biologia evolucionista elaborada por Charles Darwin; e) as primeiras teorias sociais que estudaram os conflitos sociais, como as elaboradas por socialistas “utópicos” (em oposição ao “científico”) como Charles Fourier, Proudhon ou Saint-Simon, pioneiras no campo dos movimentos operários de crítica ao capitalismo. 
Originalidade e inovação da obra: Apesar de assimilar as fontes acima apontadas, sua obra é original e inovadora em dois aspectos fundamentais: 1) no plano metodológico por realizar um esforço grandioso de síntese dos conhecimentos científicos ou filosóficos dispersos. A inovação formal e metodológica decisiva resulta do fato de ela não se contentar em produzir um conhecimento estanque, fragmentado ou atomizado, como era o caso das demais ciências. Marx integra essas várias teorias ou ciências em sua própria teoria, superando assim a cada uma delas e criando um conhecimento novo, amplo, totalizante. 2) No plano da análise material concreta: ela é também inovadora porque Marx descobre ser a reprodução material da existência – ou seja, a atividade econômica – o fundamento da existência da própria sociedade: a atividade sem a qual as outras não existiriam. Sua obra revela assim o papel decisivo dos processos ou fenômenos econômicos na estruturação da vida social, o que era completa novidade. 
 “Hegel chamava de “espírito universal” ou razão universal a força que impelia a história para frente. Marx achava que este ponto de vista colocava a realidade de cabeça para baixo. Ele queria mostrar que as condições materiais da vida eram decisivas para a história. Nesse sentido, Marx dizia que não eram os pressupostos espirituais numa sociedade que levavam a modificações materiais, mas exatamente o oposto: as condições materiais determinavam, em última instância, também as espirituais. Além disso, Marx achava que as forças econômicas em uma sociedade eram as principais responsáveis pelas modificações em todos os outros setores e, consequentemente, pelos rumos do curso da história.” (Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia, São Paulo, Ed Cia das Letras, 1995, p.419) 
Ciência e Filosofia: Por essa dupla originalidade, muitos pesquisadores sustentam ser sua obra ao mesmo tempo uma ciência - uma economia política – e uma filosofia – a dialética, vista como teoria das contradições. Nesse sentido, é uma teoria que une filosofia e ciência, que até então eram atividades separadas. Em razão desse duplo aspecto, sua teoria implica tanto o materialismo dialético (que se refere ao método, ao procedimento lógico interno da obra baseado na noção de contradição) quanto o materialismo histórico (referente à análise do modo concreto de organização da vida econômica do capitalismo). 
Uma teoria prática: outra novidade da teoria elaborada por Marx é que esta não se contenta apenas em explicar os fenômenos: a explicação exigiria a ação prática a fim de se comprovar, nessa dimensão da existência social, a verdade da teoria. Em uma das 11 “teses sobre Feurbach” Marx afirma “a verdade é uma questão prática”. Esta união entre Teoria e Prática é constitutiva de sua teoria, sendo também um dos fatores que ocasionou muito preconceito contra ela. 
Origens e contexto histórico: historicamente, sua obra resultou da revolução industrial e do consequente processo de industrialização que se espalhou por boa parte da Europa, notadamente na França e na Inglaterra. Esse processo expandiu as cidades e redundou na formação de uma classe de trabalhadores, chamados de operários, cujos primeiros movimentos de oposição ao capitalismo fascinaram Marx, por desmascararem a exploração a que os operários eram submetidos nas indústrias. 
 “Com essas invenções, desde então aperfeiçoadas ano a ano, decidiu-se nos principais setores da indústria inglesa a vitória do trabalho mecânico sobre o trabalho manual e toda a sua história recente nos revela como os trabalhadores manuais foram sucessivamente deslocados de suas posições pelas máquinas. As consequências disso foram, por um lado, uma rápida redução dos preços de todas as mercadorias manufaturadas, o florescimento do comércio e da indústria, a conquista de quase todos os mercados estrangeiros não protegidos, o crescimento veloz dos capitais e da riqueza nacional; poroutro lado, o crescimento ainda mais rápido do proletariado, a destruição de toda a propriedade e de toda a segurança de trabalho para a classe operária, a degradação moral, as agitações políticas e todos os fatos que tanto repugnam aos ingleses proprietários. (“A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra” – Friedrich Engels, São Paulo, Ed. Boitempo, p.50)
O modo de produção capitalista: uma estrutura contraditória (conceitos fundamentais) Ao investigar a importância dos fatos econômicos e a situação efetiva dos trabalhadores no processo de trabalho industrial, Marx constata ser a estrutura econômica da sociedade capitalista radicalmente contraditória. Isto porque a maneira pela qual se organiza a produção ou a vida econômica – que Marx denomina de “modo de produção”- estaria nesse tipo de sociedade assentada, por um lado, na existência de uma classe minoritária cujos membros seriam proprietários dos meios de produção – isto é, dos equipamentos, máquinas, territórios, etc., necessários para a produção econômica; por outro lado, na existência de uma imensa maioria composta por homens livres que não teriam propriedade alguma – ou melhor, teriam como única posse a capacidade de trabalhar, que Marx denomina de “força de trabalho”. Dessa maneira, não restaria a um membro dessa classe de despossuídos alternativa a não ser vender sua força de trabalho – que se tornaria uma mercadoria - ao burguês ou capitalista (ou seja, ao proprietário dos meios de produção) em troca do salário, que nunca corresponderia ao tempo efetivamente trabalhado – fenômeno denominado de “mais valia” (que será adiante examinado em detalhes). 
Ora, essa estrutura econômica ou modo de produção típica da sociedade capitalista geraria dessa forma uma enorme contradição: os produtos dos trabalhos seriam resultado do trabalho coletivo nas fábricas, mas a apropriação da riqueza social – dos produtos resultantes das atividades fabris – seria privada, pertencendo tão somente ao capitalista. 
Esta contradição constituiria uma situação de conflito permanente entre as duas classes sociais, já que seus interesses materiais objetivos seriam antagônicos; ela configuraria a luta de classes típica (e fundamental) do modo de produção capitalista: o conflito entre o capital e o trabalho.
Marx descobriu também que essa contradição não seria estática, não permanecendo sempre igual ou do mesmo modo: ao contrário, constatou ser ela dinâmica, adquirindo em determinadas situações diferentes aspectos ou formas. Mais do que isso, acompanhando o dinamismo da contradição no desenvolvimento do capitalismo Marx notou que ela apontaria para uma efetiva possibilidade histórica nessa sociedade: a de resolução da contradição por meio da ação consciente dos proletários. Unidos, estes formariam o proletariado, que, como classe, agiria histórica e politicamente de modo consciente - já que para Marx desde que a burguesia se constituiu e agiu como classe os homens não fariam mais a história às cegas, mas conscientemente. Em outras palavras: eles se organizariam politicamente para agir em defesa de seus interesses materiais precisos, que se oporiam de maneira fundamental aos interesses da burguesia. Nessa direção, eles agiriam para fazer com a burguesia o que ela mesma fez com a nobreza: eliminá-la a fim de superar o capitalismo. Dessa maneira, a teoria de Marx pretendia provar cientificamente como e porque o capitalismo poderia deixar de existir: sua ambição era a de solucionar as contradições fundamentais desse modo de produção. 
O materialismo dialético: a dialética. A noção de contradição
Origens da dialética: A noção de dialética teve diferentes acepções na história da filosofia. Segundos alguns estudiosos, suas origens mais antigas remontariam aos filósofos pré-socráticos da Grécia antiga, notadamente a Heráclito, que afirma ser o movimento a realidade fundamental da qual todos os seres e coisas dependeriam para existir. Segundo ele, “um homem não se banharia duas vezes nas águas do mesmo rio, porque ou mudaria o homem ou as águas não seriam as mesmas”. Outros estudiosos da filosofia, porém, sustentam ter ela se iniciado com a filosofia de Platão, que a usou como método de pensamento ou do diálogo, no qual ideias opostas são confrontadas a fim de se chegar à verdade. Em sentido moderno, ela aparece na obra de Hegel, constituindo a lógica do processo de formação do Ser ou Absoluto (Ou Espírito), lógica esta baseada na noção de contradição. Ou seja, para esse filósofo o Espírito se constituiria historicamente por meio de sucessivas contradições que, resolvidas, originariam novas contradições. Essa concepção seria teleológica – ou seja, dirigida a uma finalidade última, a realização do Espírito Absoluto – e progressiva porque a resolução das contradições gerariam “saltos de qualidade” responsáveis pela instauração do novo nesse processo. Nesse sentido, cada nova contradição representaria a superação (no sentido de conservar e ao mesmo tempo ultrapassar) da contradição anterior. 
A dialética como lógica da contradição: Para Hegel, a dialética não é uma simples oposição de ideias. Ela sempre começaria envolvendo dois termos, que manteriam entre si uma relação lógica ou dialética, isto é, se implicariam mutuamente. Por exemplo, veja-se o caso da relação entre o senhor e o escravo (no sentido de “valete” ou escravo pessoal): o senhor só poderia ser senhor caso existisse o escravo; do mesmo modo, a existência deste pressuporia a existência do senhor (não se pode ser escravo se não houver um senhor, obviamente). Ao primeiro termo dessa relação Hegel chama de tese; ao segundo, de antítese. 
A contradição é dinâmica: A relação entre estes termos - entre a tese e a antítese - não seria jamais estática, contudo. No exemplo dado, nem o senhor nem o escravo permaneceriam iguais o tempo todo: eles se transformariam no interior da relação. Explicando melhor: o senhor tenderia a ser completamente senhor, a dominar cada vez mais o escravo, mas ao mesmo tempo isso implicaria que o escravo se realizasse como escravo, ou seja, fosse completamente escravo, não possuindo sua própria vida e nem agindo para si mesmo. 
Em consequência, esse movimento ou dinamismo da contradição provocaria uma alteração qualitativa no ser dos dois termos implicados na relação dialética: no do senhor e no do escravo (no caso do exemplo dado), pois chegaria um momento em que o senhor dominaria tão completamente o escravo que ele não saberia mais prover seus dias e suas necessidades materiais por si mesmo, já que dependeria do escravo para tudo – tornando-se assim autocontraditório, pois dependente do escravo do qual é senhor; ao mesmo tempo, o escravo seria tão completamente escravo, visto realizar para o seu senhor todas as atividades por ele requeridas, que ele se perceberia como não-escravo, ou seja, como capaz de superar seu ser ou posição.
O momento dialético: autocontradição: Esse momento seria para Hegel –e para Marx – o momento dialético propriamente dito, em que o dinamismo da contradição entre dois termos (antitéticos) transforma cada um dos dois termos em autocontraditórios: no caso do exemplo dado, o senhor passaria a ser um senhor não-senhor (já que também dependente do escravo) enquanto o escravo passaria a ser um escravo não-escravo (já que controlaria a vida do senhor, provendo-a completamente). 
A resolução da contradição: a síntese. Ora, este momento criaria a ocasião propícia para a resolução lógica da contradição: obviamente, o senhor não poderia eliminar o escravo, pois deixaria de ser senhor – o que equivaleria a sua própria supressão; em contrapartida, o escravo poderia eliminar o senhor, retendo deste uma qualidade: a de ser senhor de si mesmo, ou seja, de sua própria vida; dessa forma ele também eliminaria a qualidade negativa do senhor: a de possuir a vida de outrem. Além disso, ao eliminar o senhor o escravo transforma também a si mesmo retendo, porém, sua qualidade básica: a de saber agir e prover a existência. Simultaneamente, eliminaria sua qualidade negativa: ade não ser proprietário de sua própria existência ou vida. 
Consequentemente, ao eliminar o senhor o escravo reteria de um e de outro as qualidades positivas (ser senhor de si mesmo, saber agir e prover a existência) eliminando ao mesmo tempo as qualidades negativas de ambos (possuir a vida de outrem, não ser dono de sua própria vida e ação), o que resultaria em uma novidade, em um salto qualitativo: no aparecimento de uma figura social dona de sua própria vida e capaz de agir para prover sua própria existência – ou seja, na figura do homem livre. 
Em outras palavras: a contradição seria resolvida com o nascimento de um terceiro termo, um termo novo e original, resultante do desenvolvimento lógico da contradição entre tese e antítese (senhor e escravo, no exemplo que estamos examinando): este terceiro termo é chamado por Hegel de síntese (no caso do exemplo, a síntese seria a figura do homem livre, ou seja, nem senhor nem escravo) 
A Dialética: em resumo, a dialética seria um processo lógico que envolveria três termos: a tese, a antítese e a síntese. A contradição dialética envolveria os dois primeiros termos, que não seriam estáticos; ao se desenvolverem, eles confeririam dinamismo à contradição acabando por tornarem-se eles próprios autocontraditórios, fato que propiciaria a criação do momento adequado para a superação da contradição, que seria a síntese. Esta eliminaria as qualidades negativas de cada um dos termos da contradição retendo suas qualidades positivas, ocasionando assim o aparecimento do novo, do “salto qualitativo”. 
Dialética: Razão e História. A dialética, enquanto processo lógico apresenta uma novidade decisiva: ela torna possível pensar a história como racional, ou seja, esta não seria um amontoado caótico de acontecimentos desconexos. Essa visão da relação íntima entre Razão e história teve em Hegel um pioneiro; de fato, nenhum outro filósofo até então tinha postulado a possibilidade desse vínculo; Marx se apoiará amplamente nessa concepção para pensar, por exemplo, a possibilidade da revolução, uma vez que, há uma dimensão lógica no processo histórico. 
A verdade é o todo: A dialética, assim concebida, teria enorme importância no modo de se conceber o conhecimento. Ela se oporia às filosofias ou teorias que pretenderiam captar a suposta essência de cada ser ou objeto, que seria imutável. Para tanto, recorreriam ao uso de definições, que é sempre a limitação e a imobilização de um ser ou objeto. A definição retira o ser ou coisa definida da ação do tempo. Em contrapartida, a dialética concebe cada ser ou objeto em seu dinamismo, em seu processo de nascimento, de desenvolvimento e de morte. A dialética se interessa pelas transformações, portanto. Nesse sentido, a verdade é o todo: somente a consideração da totalidade dos momentos de um ser ou um objeto pode revelar o que ele é. 
A dialética Marxista: Como já foi sugerido acima, Marx interpreta a filosofia de Hegel como resultante de uma espécie de “ilusão de ótica”: para ele, Hegel postulou a existência de um sujeito abstrato – o Espírito Absoluto, que se realizaria na história - porque não conseguiu entender ser o sujeito a própria sociedade. Como resultado dessa ilusão, a filosofia hegeliana inverteria o mundo, apresentando-o “de cabeça para baixo”. Ou seja, Marx considera valiosa e fecunda a dialética hegeliana, mas desde que “colocada em pé” – isto é, liberta da ilusão de ótica cometida por Hegel.
Nessa direção, a dialética marxista encara a sociedade como contraditória. Nela, não haveria lugar para a harmonia. Além disso, a dialética marxista não é apenas um método de pensamento: a contradição existiria fora do pensamento, sendo constitutiva da realidade.
Em resumo: o materialismo dialético constituiria o método do marxismo, que forneceria a ele a maneira de encarar os acontecimentos sociais ou a vida das sociedades como resultantes dos modos de organização da vida material, que sempre implicariam o aparecimento de contradições dinâmicas passíveis de soluções, que, por sua vez, originariam novas contradições.
O método dialético em ação (1): Em 1848, Marx escreveu conjuntamente com Engels o Manifesto do Partido Comunista. Nessa obra, a noção de contradição dialética tem enorme importância, sendo mesmo o nervo vital da análise, conforme se pode ler abaixo: 
“A história de todas as sociedades até agora tem sido a história das lutas de classe. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, membro das corporações e aprendiz, em suma, opressores e oprimidos, estiveram em contraposição uns aos outros e envolvidos em uma luta ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que terminou sempre com a transformação revolucionária da sociedade inteira ou com o declínio conjunto das classes em conflito”. (Ed. Expressão popular, São Paulo, 2008, p.10) 
Essa passagem resume admiravelmente a história social em todas as épocas, já que em qualquer momento de seu desenvolvimento seria encontrável um aspecto comum: o conflito de classes, ou seja, a existência da contradição. Ela também registra o dinamismo da história, já que apontaria para as transformações revolucionárias das sociedades assim como para o aparecimento e desaparecimento de diferentes classes sociais. 
O método dialético em ação (2): A dialética também opera unindo o que aparece separado na realidade social. Ou seja, ela se opõe ao conhecimento que atomiza ou isola os acontecimentos ou os fenômenos sociais, estudando-os apenas em relação a si mesmos. Em oposição a esse procedimento, a dialética busca relações entre os fenômenos procurando explicar cada um deles por meio de sua integração em uma totalidade viva e dinâmica. O Manifesto do Partido Comunista mostra bem o alcance desse procedimento, em vez de se descrever ou analisar em si mesma a grande indústria, ela é relacionada a outros fenômenos a ela interligados, como a criação do mercado mundial (que também não é estudado separadamente) e à descoberta da América, por exemplo. Ao mesmo tempo, o mercado mundial é relacionado a um conjunto de fenômenos novos em expansão, que acaba novamente por incidir na expansão da grande indústria. Além disso, esses fenômenos são associados ao aparecimento e desenvolvimento da burguesia – ou seja, ao dinamismo do objeto estudado, o capitalismo. Veja o trecho a seguir: 
“A grande indústria criou o mercado mundial, preparado pela descoberta da América. O mercado mundial promoveu um desenvolvimento incomensurável do comércio, da navegação e das comunicações. Esse desenvolvimento, por sua vez, voltou a impulsionar a expansão da indústria. E na mesma medida em que indústria, comércio, navegação e estradas de ferro se expandiam, desenvolvia-se a burguesia, os capitais se multiplicavam e, com isso, todas as classes oriundas da Idade Média passavam a um segundo plano”. (Ed. Expressão popular, São Paulo, 2008, p.13)
Uma unidade dialética: a relação homem-natureza - a alienação. 
A relação homem-natureza: Hegel retomou da filosofia tradicional o tema da alienação, que pressupõe a relação entre o propriamente humano e o não-humano – o “outro” do homem (enquanto humanidade). As concepções tradicionais ou religiosas tratavam esse tema de maneira restrita e estática: por exemplo, afirmavam que o humano seria a razão, a capacidade de ser racional, e não-humano seriam os demais aspectos implicados na existência da humanidade. Hegel retoma o tema em sua filosofia, mas introduz uma novidade que seria fundamental para a obra de Marx: a relação entre o humano e o não-humano seria uma relação dialética, ou seja, dinâmica e contraditória. 
Humanizar o não-humano: Marx desenvolve essa concepção dialética entre o humano e o não-humano (o outro do homem) partindo da constatação de que o homem seria um ser natural e, nessa medida, parte integrante da natureza. Entretanto, ele se diferenciaria dos outros seres por não se submeter passivamente a ela: ao contrário, ele seria um ser ativo, capaz de se opor à natureza – ou seja, ao seu “outro” - e de lutar contra a situação que estalhe imporia. Em outras palavras: o homem é concebido como um ser em conflito ou luta contra seu “outro” – contra a natureza, portanto – a fim de dominá-lo. O homem se desenvolveria historicamente por meio desse conflito; por meio dessa relação dialética com a natureza, já que esta seria modificada por ele, o que também modificaria o próprio homem. A luta com a natureza tenderia a expandir o humano: a humanizar o não-humano, visto que nesse processo a natureza seria humanizada. 
A alienação: a relação dialética estabelecida entre homem e natureza mostra que o homem se desenvolve por meio do controle cada vez mais intenso que ele exerce sobre a natureza, que se torna assim humanizada: uma natureza para o homem. A relação da espécie humana com a natureza, no decorrer da história, conheceria múltiplas conexões, que tenderiam a se expandir enormemente. O conflito entre homem e natureza seria assim sempre renovado, tornando-se a cada vez mais profundo ou intenso. Em resumo, o homem só se desenvolveria em conexão com este “outro”, do qual ele mesmo faz parte - já que ele é parte integrante da natureza - embora ele não cesse de controla-la ou dominá-la. Nesse processo, a natureza desponta como humanizada, povoada de objetos dos mais diferentes tipos resultantes da ação humana. Entretanto, esse processo, por ser contraditório – já que envolve a existência de diferentes classes sociais - resultou para a maioria dos homens no aparecimento de um mundo social hostil e incompreensível: um mundo povoado por objetos ou forças sociais que aparecem como estranhas e incompreensíveis. A este fenômeno Marx (notadamente o “jovem Marx”) denominou de “alienação”. 
Uma existência dominada por abstrações: A alienação seria um fenômeno amplo, que se manifestaria não apenas no plano teórico ou no da representação do mundo (nas ideias), mas também atingiria a percepção, os sentimentos e as atividades práticas do homem. Nesse sentido, ele atingiria também o processo de trabalho: o trabalhador não entenderia a razão de o trabalho industrial ser organizado de tal ou tal maneira; tampouco entenderia o sentido de seu trabalho, já que ele não seria notável no produto final criado pela indústria que o emprega. 
Desse modo, a existência social cotidiana aparecia como hostil e estranha, dominada por forças ou fatos que controlam o homem. Um dos mais notáveis exemplos dessa situação seria dado pela existência do dinheiro. De fato, o que é o dinheiro, se não apenas um símbolo? Símbolo abstrato do valor dos produtos produzidos socialmente pelos homens – valor este medido pelo tempo médio socialmente necessário para a produção de determinado produto: pois este símbolo ou abstração domina inteiramente a vida social, aparecendo como se tivesse existência própria e fosse uma entidade real autônoma. 
O materialismo histórico; a Sociologia marxista. Desdobramentos posteriores. 
O materialismo histórico: criado por Marx é inseparável do materialismo dialético. Por essa razão, seria apropriado falar-se em “materialismo histórico dialético”; no entanto, por razões didáticas, os separamos a fim de realçar como o histórico tem por objeto a análise concreta das sociedades ou, para dizer como Marx, dos diferentes modos de produção, notadamente o modo de produção capitalista. O materialismo dialético, por sua vez, fornece o método para a concretização das análises marxistas: organiza seus procedimentos teórico-metodológicos a fim de viabilizar a condução correta da análise oferecendo ao mesmo tempo a visão dinâmica da totalidade social, - ou seja, da dialética contraditória que rege a vida social. 
Conceitos fundamentais: modo de produção. Marx observou em certa ocasião ser mais importante saber como uma determinada sociedade se organiza a fim de reproduzir materialmente sua existência do que saber exatamente que produtos ela produziria. Desta maneira, chamou a atenção para aquela atividade fundamental sem a qual a própria vida dessa sociedade – ou de qualquer outra - não seria possível: a atividade econômica, entendida precisamente como “reprodução material da existência social”. À maneira de organizar a vida econômica – que nessa perspectiva constituiria a base da sociedade, também chamada de “infraestrutura” – Marx denominou de “modo de produção”. 
Os modos de produção na história: Historicamente, pode-se constatar a existência de diferentes modos de produção – ou sociedades com diferentes organizações econômicas – nas diversas épocas da história social. Os modos de produção existentes seriam: o modo de produção primitivo; o modo de produção escravista; o modo de produção asiático; o modo de produção feudal e o modo de produção capitalista. 
A análise da totalidade do modo de produção capitalista permite a identificação de seu desenvolvimento e de suas transformações: dessa forma, o capitalismo da atualidade seria diverso do capitalismo do século XIX, embora o modo de produção continuasse a ser exatamente o mesmo. O modo de produção capitalista comportaria em seu desenvolvimento diferentes momentos, a saber: Pré-capitalismo, Capitalismo comercial, Capitalismo industrial, Capitalismo financeiro, no qual os bancos e instituições financeiras controlam as demais atividades econômicas. 
O modo de produção e as forças produtivas: Cada modo de produção resulta da maneira própria de organizar as atividades econômicas; esta forma de organização, contudo, está sempre relacionada a dois outros aspectos constitutivos do modo de produção, qualquer que seja ele: às forças produtivas e às relações de produção. As forças produtivas são constituídas, por um lado, pelo conjunto dos meios de produção disponíveis historicamente em cada maneira de organizar a produção e, por outro, pelo grau de desenvolvimento técnico dos trabalhadores, que também se diferencia historicamente. Os meios de produção são compostos por tudo o que é comumente indispensável na atividade produtiva, como o capital (em suas diferentes formas), a terra, as matérias primas, os equipamentos, as ferramentas, os utensílios e máquinas destinadas à agricultura ou à produção industrial, as técnicas produtivas, etc. As forças produtivas são, portanto, o fator dinâmico do modo de produção, já que elas se modificam constantemente, em maior ou menor velocidade – já que as máquinas, os equipamentos, as técnicas produtivas, etc. sempre conhecem inovações. 
O modo de produção e as relações de produção: as relações de produção – ou relações sociais de produção - constituem o outro aspecto decisivo do modo de produção, qualquer que seja ele. Elas constituem o regime de propriedade dos bens e dos meios de produção; dessa maneira elas se relacionam com a apropriação dos bens ou objetos produzidos, isto é, com a distribuição do produto social. As relações sociais de produção também se relacionam com outras estruturas, delas derivadas: caso do aparato jurídico e político de uma sociedade, como o sistema jurídico e suas leis, a forma do Estado, a ideologia dominante – que segundo Marx, é sempre a ideologia da classe dominante, etc. Semelhantes estruturas seriam destinadas a legitimar a organização da vida econômica e, dessa forma, garantir sua continuidade. Nesse sentido, as relações sociais de produção tendem a ser estáticas, opondo-se ao dinamismo das forças produtivas. 
A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os instrumentos de produção, portanto as relações de produção, e por conseguinte todas as relações sociais. A conservação inalterada dos antigos modos de produção era a primeira condição de existência de todas as classes industriais anteriores. A transformação contínua da produção, o abalo incessante de todo o sistema social, a insegurança e o movimento permanentes distinguem a época burguesa de todas as demais. As relações rígidas e enferrujadas, com suas representações e concepções tradicionais, são dissolvidas, e as mais recentes tornam-se antiquadas antes que se consolidem. Tudo o que era sólido desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado, e as pessoassão finalmente forçadas a encarar com serenidade sua posição social e suas relações recíprocas. Manifesto do partido Comunista, São Paulo, Ed expressão popular, 2007, p.15-16. 
Transformações do modo de produção: a contradição entre forças produtivas e relações sociais de produção: todos os modos de produção nascem se desenvolvem e entram em crise, que ocasionam seu desmantelamento e superação, quando então são substituídos por outro. A teoria marxista concede grande importância ao esclarecimento dos momentos em que os modos de produção declinam e desaparecem, dando origem a outras formas de organização da vida econômica: ela valoriza a investigação das transições de um modo de produção a outro. Por exemplo, muitos estudos procuraram esclarecer como ocorreu a transição do feudalismo para o capitalismo. Nessa perspectiva, a teoria marxista concedeu muita atenção ao conflito gerado pelo dinamismo de um dos aspectos constitutivos do modo de produção – as forças produtivas – e a imobilidade de outro de seus aspectos constitutivos: - as relações sociais de produção. Esse conflito tenderia a se intensificar e a gerar crises no interior do modo de produção, já que o constante desenvolvimento das forças produtivas forçaria mudanças nas relações sociais de produção, que, por sua vez, impede o livre desenvolvimento delas a fim de manter o regime de propriedade vigente. Nessa direção, a teoria marxista concebe ser possível a intensificação da contradição entre estes dois termos a tal ponto que ela seria capaz de explodir o modo de produção, ocasionando seu declínio e transformação, resultando dessa maneira no aparecimento de novo modo de produção. No entanto, essa concepção sobre a transição gerou uma tensão interna à teoria marxista, pois ao conceber a transição como resultante de um conflito estrutural do próprio modo de produção vigente, ela não concede importância para a ação consciente e organizada do homem - ou das classes sociais - na transição de um modo de produção a outro. 
Infraestrutura e superestrutura: A análise do modo de produção (acima detalhada) destaca a importância concedida pela teoria marxista à atividade econômica, ou antes, à forma de organização dessa atividade, que seria a “base” da vida social. Por essa razão, a atividade econômica, concebida como a atividade que torna possível a reprodução material da existência, é chamada de “infraestrutura”. Esta envolveria todas as dimensões implicadas na atividade econômica, como a produção, o comércio e determinada divisão social do trabalho, que é a maneira pela qual um modo de produção atribui tarefas ou ocupações aos membros da sociedade. Grosso modo, essa divisão comporta dois grandes tipos de trabalho: o trabalho intelectual e o trabalho manual, sendo este em geral o destinado aos trabalhadores da indústria, os operários. Como foi visto acima, o modo de produção implica as relações sociais de produção, que regulam e legitimam determinada forma de propriedade dos meios de produção; nesse sentido, elas abarcam o direito, a forma do estado, a ideologia, as leis – compondo o que a teoria marxista denomina de “superestrutura”. 
A sociologia marxista: identificada com o materialismo histórico, ela inclui os conceitos acima explicados. Resumidamente, ela procederia da seguinte maneira ao examinar um modo de produção: começaria considerando a totalidade de seu objeto – por exemplo, o capitalismo. Seu objetivo seria o de entender ou apontar as leis que regem o objeto e determinam seu nascimento, seu desenvolvimento e seu consequente declínio e desaparecimento. Em um segundo passo, ela seleciona e investiga diferentes aspectos dessa totalidade, mas sempre considerando como decisiva e fundamental a forma como a produção é organizada – ou seja, a estrutura econômica do modo de produção estudado – do capitalismo, no caso do exemplo dado. 
Classes sociais: Em seguida, a sociologia investigaria como a divisão social do trabalho nesse modo de produção determina o aparecimento de diferentes classes sociais, buscando identificá-las por meio da verificação de como elas se relacionam com a organização da vida econômica ou que tarefas nela cumprem: por identificar seu “lugar” na atividade econômica, por assim dizer. A classe social pode ser definida como composta por cidadãos que cumprem tarefas análogas ou semelhantes no processo econômico: em todo caso, por cidadãos que ocupariam o mesmo “lugar” no processo produtivo. 
Burguesia e proletariado: No caso do modo de produção capitalista, a análise sociológica constataria a existência de duas classes sociais fundamentais: a burguesia, que seria a proprietária dos meios de produção, e o proletariado, que nada possuiria a não ser sua capacidade de trabalhar – que, como já foi visto, Marx denomina de “força de trabalho”. Por nada possuir, essa classe se veria obrigada a vender a única mercadoria que possui: sua força de trabalho. Por meio desse ato, o trabalhador receberia o salário, que teoricamente corresponderia ao pagamento referente ao valor de venda de sua mercadoria, a força de trabalho. Ao mesmo tempo, a sociologia também investigaria como o capitalista ou burguês consegue obter o lucro, visto este constituir seu objetivo fundamental.
Salário e “mais-valia”: A análise desses fatos - lucro por um lado, salário por outro – conduz ao desvendamento daquilo que Marx denomina de “mais-valia”. Tecnicamente, o lucro seria resultante de uma discrepância entre o valor resultante do trabalho do operário e o salário nominal por este recebido como recompensa por vender sua força de trabalho. Ou seja, semelhante discrepância significaria que o trabalho cria um excedente, que não seria jamais repassado ao trabalhador: esse excedente seria a fonte do lucro do capitalista. A fonte do lucro seria assim a parte do trabalho não paga no salário: encarada dessa forma, a mais-valia corresponderia a uma diferença entre o que o trabalhador efetivamente produziu e o que recebeu de fato na forma de salário. A realidade da “mais-valia” mostraria que o trabalhador seria explorado pelo capitalista e que esse modo de produção se assentaria na exploração do trabalhador. 
Luta de classes: Em decorrência da “ análise da mais-valia”, que torna visível a exploração do trabalhador no interior do modo de produção capitalista, a sociologia marxista conclui que as duas classes fundamentais da sociedade capitalista possuem interesses materiais antagônicos: aliás, as classes sempre agem em função de seus interesses materiais. Dessa maneira, enquanto a burguesia quer manter essa forma de organização da produção e continuar explorando os trabalhadores, o proletariado tem interesse material bem diverso: ele percebe que não pode ser eliminado pela burguesia, já que isso inviabilizaria a própria dinâmica do capitalismo, mas que pode eliminá-la, assim como ela mesma eliminou a nobreza no processo de transição entre o feudalismo e o capitalismo. O Manifesto do Partido Comunista coloca em prática essa visão ao terminar com uma proposta: “Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos”
Desdobramentos: 
A teoria elaborada por Karl Marx – também por F. Engels – teve enorme influência durante o século XX em várias partes do mundo dando origem ao que se convencionou chamar de “marxismo’ – que, desse modo, não se reduz apenas às obras de Marx. Considerado neste sentido amplo, o marxismo tem vasta história, sendo possível distinguir duas correntes principais em seu interior: o marxismo “ortodoxo” – que segue as diretrizes teóricas e práticas adotadas pelos partidos comunistas - e o marxismo “ocidental”, que se distinguiria por conferir maior preocupação com a cultura, fato que abriu a ele novas vias de investigação. Dentre os autores pertencentes a essa tendência, contam-se Georg Lukacs, Karl Korsch, Antonio Gramsci, Theodor Adorno, Walter Benjamin, Herbert Marcuse, entre outros. O marxismo não deixou de se renovar e de se expandir mesmo em nosso século. Na atualidade, muitos pensadores ou cientistas sociais o desenvolvem a fim de conferir aele atualidade, ou seja, de torná-lo ainda hoje capaz de fornecer respostas às grandes questões econômicas e sociais que afligem boa parte da humanidade. Dentre os vários autores marxistas contemporâneos, pode-se citar o historiador Eric Hobsbawm, o geógrafo David Harvey e o sociólogo Emanuel Wallerstein. 
A obra de David Harvey: visão geral. Embora Harvey não seja sociólogo, mas geógrafo, sua vasta obra abarca diversos temas. No entanto, apesar da diversidade de assuntos, ela apresenta um fio condutor: investigar as transformações ocorridas na lógica da reprodução do capital. Com esta perspectiva, Harvey aborda a ecologia, a passagem da modernidade para a pós-modernidade – que implica a transformação do modo de acumulação do capital, verificada na substituição da acumulação rígida pela acumulação flexível -, o novo imperialismo, as novas experiências da compressão espaço-temporal na era da tecnologia digital, questões de geopolítica e da história urbana relacionada com o desenvolvimento do capitalismo, dinâmicas da urbanização associadas ás crises financeiras, as crises de superacumulação, entre outros. Seu objetivo é o de esclarecer a lógica do mundo atual, dominado pelas pressões de toda sorte oriundas dos movimentos do capital. 
A passagem da modernidade para a pós-modernidade:
a) A acumulação flexível. Este tema é examinado em “A condição pós-moderna” (1989) (Edição brasileira: Ed Loyola, 1989), embora tenha sido originalmente abordada na obra “Os limites do capital” (1982), que examina a teoria marxista das crises econômicas. O chamado “pós-modernismo” representaria uma transformação do modelo de desenvolvimento do capitalismo iniciado após o fim da Segunda Guerra Mundial, que prevaleceu até o inicio da década de 1970, constituindo seu período de maior esplendor e desenvolvimento. No início dessa década, o modelo de acumulação rígida até então imperante - o fordismo – conheceu forte crise, provocando enormes quedas nas taxas de lucro e uma série de consequencias nefastas para a expansão do capital, que acabou por ocasionar a eclosão de uma crise de superacumulação. A fim de controlar e superar semelhante crise, o capitalismo dos países desenvolvidos passou a adotar o que se chamou de “acumulação flexível”. Este modo de organizar a produção implicou enormes mudanças no processo de trabalho, já que a força de trabalho foi “flexibilizada” ou “precarizada” - ou seja, os direitos dos trabalhadores foram restringidos, os contratos de trabalhos passaram a ser temporários, etc. -; também as indústrias localizadas nesses países foram transferidas para países em que a força de trabalho era politicamente menos organizada e menos qualificada a fim de baratear ao máximo o custo da mão de obra, o que também foi viável graças ao aparecimento da tecnologia digital e da expansão da automatização da produção, que passou a ser regida pelo processo conhecido como “just in time”, por meio do qual as empresas não necessitariam mais acumular estoques, pois a produção seria doravante produzida sob encomenda. O processo de “flexibilização” atingiu ainda os mercados financeiros e as relações comerciais entre os países, que conheceram forte desregulamentação.
 b) A vida e a cultura na era da acumulação flexível: As mudanças no modo de acumulação provocariam também mudanças na vida cultural e na experiência do espaço e do tempo, que conheceria o que Harvey chama de “compressão espaço-temporal”, a qual origina uma nova forma de sensibilidade. Esta seria adequada à experiência da velocidade proporcionada pelos aparelhos digitais, bem como à simultaneidade de ações e acontecimentos que ela também, proporciona. a nova sensibilidade seria pois requerida para se lidar com as exigências da chamada “nova economia”. 
b) A vida e a cultura na era da acumulação flexível: As mudanças no modo de acumulação provocariam também mudanças na vida cultural e na experiência do espaço e do tempo, que conheceria o que Harvey chama de “compressão espaço-temporal”, a qual origina uma nova forma de sensibilidade. Esta seria adequada à experiência da velocidade proporcionada pelos aparelhos digitais, bem como à simultaneidade de ações e acontecimentos que ela também, proporciona. a nova sensibilidade seria pois requerida para se lidar com as exigências da chamada “nova economia”. 
Crises econômicas e modificações urbanas: O capitalismo, como Marx analisou, conhece em várias situações crises de superacumulação. Harvey analisou um dos modos de se tentar solucionar semelhantes crises: a adoção de intervenções urbanas em escala gigantesca. Isso teria ocorrido em três momentos distintos da história do capitalismo: durante a crise de 1848 em Paris, em que o Barão Hausmann modificou profundamente a cidade eliminando nela seus traços feudais e adequando-a às exigências do capital: essa intervenção também desalojou da cidade milhares de trabalhadores e, ao mesmo tempo, criou frentes de trabalho a fim de solucionar o desemprego provocado pela crise. Solução semelhante foi usada em New York após 1945 e também na China atual, em que cidades são construídas “do zero”. Entretanto, Harvey também considera como politicamente decisivas as manifestações urbanas de resistência ao capitalismo. 
A obra de Immanuel Wallerstein: visão geral. 
Sociólogo estadunidense (1930-1989), Em sua principal obra intitulada “O sistema-mundo moderno” - publicada em quatro partes entre 1974 e 2011 - Wallerstein cunhou a noção de “Sistema-mundo”; esse sistema teria se iniciado no século XVI e adquirido o caráter mundial atual a partir do final do século XIX. Resumindo muito esquematicamente: em alguma medida relacionada com o desenvolvimento da Teoria da dependência e herdeira das concepções de Karl Marx e Ferdinand Braudel – de quem teria herdado a noção de “longa duração” - semelhante concepção postula que, em virtude da enorme rede de dependência e interdependência estabelecida entre os países, não seria mais possível deixar de considerar como objeto de análise a unidade mundial assim formada. Essa unidade implicaria uma relação fundamental – a relação entre os países centrais e os países periféricos – que determinaria a posição ocupada nela pelos diferentes Estados nacionais. As relações entre centro e periferia conheceriam ainda diversos instrumentos econômicos e políticos capazes de viabilizar uma constante redistribuição da “mais-valia” da periferia para o centro: em outros termos, na relação centro-periferia o mercado desempenharia um papel de dominação dos países industrializados do centro sobre os periféricos não-industrializados ou de industrialização incompleta, como seria o caso do Brasil. Nesse sentido, a teoria do sistema-mundo é uma teoria que contempla a exploração econômica entre países e suas populações. Consequentemente, Wallerstein se interessou pela sorte dos países coloniais, além de ter apoiado politicamente diversas lutas de libertação nacional. 
A teoria do sistema-mundo acarreta ainda outra inovação nas ciências sociais: ela questionaria a distinção entre a dimensão politica, a dimensão econômica e a sociocultural; para Wallerstein, essa distinção seria artificial e inventada pelo liberalismo clássico. Além disso, ela também sustenta estar o capitalismo experimentando uma crise decisiva, capaz de leva-lo a sua superação, visto ser o sistema-mundo um sistema histórico. Nessa perspectiva, destaca o fenômeno da “financeirização da economia”, que caracterizaria profundamente os EUA após a década de 1970. Semelhante fenômeno é considerado por Wallerstein como simultaneamente expressão tanto do apogeu quanto do início da ruína da hegemonia desse país, que, desde a década de 1970, conheceria um agravamento de sua situação. Wallerstein aborda essa questão no livro “O declínio do império americano”. 
A obra de Eric Hobsbawm: visão geral. 
Hobsbawm (1917- 2012) não foi sociólogo, mas importante historiador marxista, cujas obras influenciaram pesquisadores de diferentes ramos do conhecimento nas ciências humanas. Sua trajetória intelectual começoucom a publicação de Rebeldes Primitivos (editora Paz e Terra, 1962) – que conta com um estudo do cangaço no nordeste brasileiro – e se encerra com a publicação de Como mudar o mundo – Marx e o Marxismo: 1840-2011 (editora Cia. das Letras, 2011), uma coletânea de textos sobre Marx e o marxismo, em que desenvolve panoramicamente uma visão do legado intelectual e político de Marx para as gerações seguintes. Ainda no campo do marxismo, efetuou com Paul Sweezy importante estudo sobre a questão da transição de um modo de produção a outro, no livro “A Transição do feudalismo para o capitalismo”. Hobsbawm, adepto de uma visão da totalidade da história, não se restringiu ao campo estrito desta, preferindo abarcar também os campos da política, da economia e da cultura e, mais recentemente, até da ecologia. Foi também um estudioso do valor e das origens das tradições, chegando a conclusão de que muitas tradições foram inventadas, notadamente no século XIX, pelas várias elites (ou classes dominantes) nacionais a fim de legitimar e glorificar tanto a nação quanto sua própria ação. Ainda nessa direção, foi também um intérprete radical do século XIX a fim de elucidar historicamente a dinâmica do processo de industrialização e a realização de revoluções burguesas - além de estudar a formação da classe operária e suas lutas. Muitos de seus livros resultam dessa investigação ampla: seria o caso de A Era das Revoluções (1789-1848); A Era do Capital (1848-1875) e A Era dos Impérios (1875-1914), seguida depois pelo livro A Era dos Extremos (1914-1991) como uma história do “breve século 20”. Em a “Era das revoluções” investiga a disseminação de ideais de liberdade por grupos organizados na Europa, que, Influenciados pela Revolução Francesa, acirravam a revolução permanente; “Era dos extremos” lançado em 1994, analisa o período que vai de 1917 – ano da revolução russa – até 1991, ano do colapso da União Soviética e do fim dos regimes socialistas
Idealismo: Concepção filosófica que sustenta ser o verdadeiramente existente algo não-material, como seria o caso das Ideias na teoria platônica ou o Espírito na filosofia de Hegel. Este filósofo faz parte do chamado “Idealismo Alemão”, ao qual também pertenceriam filósofos como Kant, Fichte e Schelling, entre outros. É termo que se opõe a materialismo. 
Materialismo: Contrariamente ao idealismo, o materialismo considera a matéria como o verdadeiramente existente. Para essa concepção filosófica, as ideias ou o espírito seriam sempre secundários e derivações da existência primária da matéria.
Mecanicismo: Concepção predominante na filosofia e na cultura europeia após à disseminação da filosofia de Rene Descartes. O mecanicismo sustenta serem os corpos ou as coisas explicáveis por meio da existência da matéria homogênea e do movimento que nela se instala. Esse movimento teria como modelo o funcionamento repetitivo e sempre igual do relógio mecânico. Dessa concepção decorre o chamado “materialismo mecanicista” que antecedeu a obra de Marx, por oposição a seu “materialismo dialético”. 
Processo: A noção de processo pressupõe um encadeamento de fatos concatenados logicamente, uma sequência de causalidades consecutivas e inter-relacionadas: o termo tem valor metodológico no âmbito das concepções dialéticas, opondo-se ao fato isolado, atomizado, que marca a epistemologia positivista. 
Socialismo. Concepção política e econômica que afirma a precedência da sociedade sobre o indivíduo a fim de almejar a construção de uma coletividade na qual impere a justiça e a fraternidade. Nesse sentido, o interesse coletivo deve predominar em relação ao interesse individual. É concepção oposta tanto ao individualismo quanto ao liberalismo econômico (capitalismo) já que, em nome do bem comum, recusa a existência da propriedade privada dos meios de produção e da livre concorrência, propondo a propriedade coletiva dos meios de produção e também acesso igualitário aos produtos sociais. Os socialistas dividem-se em geral em “socialistas utópicos” e “socialistas científicos”: a diferença entre eles residiria no fato de estes demonstrarem “cientificamente” a viabilidade histórica do socialismo e mesmo sua inevitabilidade

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