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N1 - Direito e Internet - Direito à comunicação e o papel do Estado

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Parecer Jurídico
Local, data.
Interessado: Colégio UMF
Referente à: Criação de perfis falsos em redes sociais e bullying pela internet.
Trata-se de consulta formulada pelo Colégio UMF acerca das consequências jurídicas sobre manifestação através de perfis falsos em redes sociais, com o intuito de disseminar ofensas e praticar bullying contra uma aluna do Colégio e até que ponto o Colégio pode ser responsabilizado pela conduta de seus alunos.
É o relatório, passo a opinar.
Fundamentação
A interessada é pessoa jurídica, atua como instituição de ensino, tendo como atividade precípua a formação de jovens alunos. 
As “redes sociais virtuais” são serviços online, plataformas ou sites disponibilizados na internet, que têm como objetivo construir redes ou relações sociais entre pessoas, que compartilham interesses e atividades em comum.
Atualmente, as redes deixaram de ser apenas um espaço para procurar outras pessoas. Tornaram-se um poderoso meio de comunicação e difusão de informação em tempo real.
Os falsos perfis, também chamados de "fakes", vêm ganhando notoriedade pela imensa quantidade deles e que têm como objetivo se passar por outra pessoa real ou então, criar características fictícias para ser uma espécie de máscara para a pessoa atrás da tela gerar ofensas e desinformação. 
No que diz respeito à responsabilização civil pela criação de falsos perfis nas redes sociais, sustenta-se que, num primeiro plano, deva recair sobre o “falsificador” ou aquele que usurpa identidade alheia para transitar nos ambientes virtuais. Nada mais natural, na medida em que é ele o autor direto do ato lesivo.
Ocorre, porém, que esse usuário mal intencionado, na maioria das vezes não pode ser identificado fora das redes, no mundo real, pois não forneceu qualquer dado verdadeiro, tampouco há tecnologia capaz de localizá-lo. 
Nessa hipótese, há o entendimento que os proprietários das redes sociais respondam pelos eventuais prejuízos suscitados pelas vítimas, na medida em que esse ambiente de insegurança foi criado pelas próprias redes sociais, cujos donos se negaram a investir em mecanismos de controle efetivo de ingresso, muitas vezes, aproveitando-se de uma legislação omissa. 
Enquanto tais medidas não são adotadas pelas redes sociais, incidirá nos casos da “teoria do risco do negócio”, pela qual haverá obrigação de reparar o dano, independentemente da demonstração de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida por determinada pessoa implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Nesse sentido, a posição de Bruno Miragem: 
“Não parece haver dúvida que as atividades habitualmente realizadas na internet - em caráter profissional, no mais das vezes, pelo provedor de conteúdo - dão causa a risco de danos a terceiros. Neste sentido, correta é a aplicação da cláusula geral de responsabilidade por risco, assinalando o caráter objetivo desta responsabilidade para o efeito de afastar a necessidade de demonstração da culpa do provedor de Internet. Destaque-se, naturalmente, que com isso não se afasta a necessidade de demonstração dos demais pressupostos da obrigação de indenizar (em especial, o dano e o nexo causal), mas aproxima sensivelmente o regime de responsabilidade do regime imposto aos fornecedores de serviço do Código de Defesa do Consumidor(RDC 70, 2009, p.41).”
O STJ já se manifestou pela qualificação da questão como acidente de consumo, fazendo incidir a regra do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, admitindo na hipótese que a atividade do fornecedor, mesmo que aparentemente gratuita ao consumidor direto, teria presente o critério de remuneração indireta. Diga-se, com destaque, que é notório que os proprietários das redes sociais lucram altíssimos valores ano após ano de atividade.
Mas o STJ foi além e reconheceu também que, independentemente da participação da vítima nas redes sociais virtuais, o caso reclamará a incidência da norma do artigo 17 do CDC, a qual equipara a consumidores todas as vítimas do evento danoso, atraindo por conseguinte, a incidência do regime de responsabilidade da legislação consumerista aos casos contratos. Neste sentido: 
“Direito do consumidor e responsabilidade civil. Recurso especial. Indenização. Provedor da Internet. Divulgação de matéria não autorizada. Responsabilidade da empresa prestadora de serviço. Relação de consumo. Remuneração indireta. Danos morais. Quantum razoável. Valor Mantido.
Inexiste violação ao art. 3º, §2º, do CDC, porquanto, para a caracterização da relação de consumo, o serviço pode ser prestado pelo fornecedor mediante remuneração obtida de forma indireta.
Quanto ao dissídio jurisprudencial, consideradas as peculiaridades do caso em questão, quais sejam, psicóloga, funcionária de empresa comercial de porte, inserida, equivocadamente e sem sua autorização, em site de encontros na Internet, pertencente à empresa-recorrente, como ‘pessoa que se propõe a participar de programas de caráter afetivo e sexual’, inclusive com indicação de seu nome completo e número de telefone do trabalho, o valor fixado pelo Tribunal a quo a título de danos morais mostra-se razoável, limitando-se à compensação do sofrimento advindo do evento danoso. Valor indenizatório mantido em 200 (duzentos) salários mínimos, passível de correção monetária a contar desta data. (STJ, REsp 566.468/RJ, j. 23.11.2004, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 17.12.2004)”
Já em relação ao Código Civil e o Código de Defesa de Consumidor, é possível verificar que a escola é responsável objetivamente pela reparação civil de seus educandos conforme previsão explícita nos artigos 932, inciso IV e 933, ambos do Código Civil. O texto dessa lei fala sobre instituições que recebem remuneração, afinal escolas públicas quem assume a responsabilidade é o Estado.
Agora, pelas definições do Código de Defesa do Consumidor, entende-se que as escolas são fornecedoras de serviços, ao passo que os alunos e seus responsáveis figuram como consumidores nessa relação. Sendo os alunos consumidores em tal relação, de modo que a situação apresentada decorre da relação de consumo. 
As excludentes da responsabilidade civil da escola são aqueles em que a culpa é exclusiva da vítima ou em situações de fato exclusivo de terceiro, caso fortuito e força maior.
Conclusão
Para evitar qualquer tipo de responsabilização, o colégio deve apurar internamente quem são os responsáveis pelas postagens para fazer com que tal prática seja abolida dentro do ambiente escolar. Deve também notificar o provedor para que tais postagens sejam removidas, sob o fundamento de que se tratam de perfis falsos criados para a prática de bullying.
Caso o conteúdo não seja removido, deve atuar conjuntamente com o Poder Judiciário e a vítima responsabilização dos envolvidos. 
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078compilado.htm#:~:text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20prote%C3%A7%C3%A3o%20do%20consumidor%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.&text=Art.,48%20de%20suas%20Disposi%C3%A7%C3%B5es%20Transit%C3%B3rias.>. Acesso em 02 set.2022.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em 06 set.2022.
BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). REsp nº 566.468- RJ. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/RevSTJ/article/viewFile/8506/8621> Acesso em 02 set. 2022.
MIRAGEM, Bruno. Responsabilidade por danos na sociedade de informação e proteção do consumidor: desafios atuais da regulação jurídica da internet. Revista de Direito do Consumidor, v. 70. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

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