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Prova N2 da disciplina teoria literária 1-Leia o excerto apresentado a seguir e, depois, responda ao que se pede. O movimento deliberou, a partir de sua visão inovadora, que os críticos fizessem uma leitura minuciosa do poema (close reading), ou seja, para entender o poema deve-se apreciá-lo emocionalmente, buscando resolver as tensões entre as diversas unidades semânticas do texto que independem das emoções do autor, ainda que essas emoções possam ter ocorrido durante a produção. Houve também outras deliberações essenciais para a formação da estrutura teórica da crítica analisada nesse ensaio. A maioria dos críticos adeptos a essa corrente dirigiam seu olhar ao desprezo da intenção do autor e da história social em que o poema estaria inserido. REVISTA ANAGRAMAS: Revista Científica Interdisciplinar da Graduação. São Paulo: Edusp, v. 5, n. 3, maio 2012. Grifo nosso. Assinale a alternativa que corresponde à corrente crítica que mais se aproxima dos postulados no excerto. 2-O trecho a seguir foi retirado da Revista Cult, a respeito do Formalismo Russo. Leia- o e, em seguida, leia os poemas de Sá de Miranda e Maria Teresa Horta: Texto I Antes do ensaio de Chklovski, dominava na Rússia a idéia de que fazer arte é pensar por imagens, princípio defendido pelo teórico Potebnia e incorporado pelos poetas simbolistas. Conforme esse princípio, a função da imagem é procurar semelhança entre coisas diferentes para facilitar o conhecimento. Por isso, a imagem devia ser mais simples do que aquilo que explica. Por essa perspectiva, a história dos estilos e das escolas basearse-ia no estudo das imagens características de cada autor nos diversos períodos. Contrariando essas noções, Chklovski negou a idéia da imagem como instrumento conhecido para se atingir o desconhecido, assim como demonstrou que os autores e as escolas não criam as próprias imagens. Ao contrário, as imagens são essencialmente as mesmas ao longo da história, cabendo aos períodos e aos respectivos autores apenas a seleção de velhas imagens em novas combinações.TEIXEIRA, Ivan. O formalismo russo. Cult: Fortuna Crítica 2, São Paulo, p.36-39, ago. 1998. Disponível em: <http://www.usp.br/cje/depaula/wp- content/uploads/2017/03/Ivan_Cult_Formalismo-Russo-ilovepdf-compressed.pdf>. Acesso em: 16 ago. 2019. Texto II COMIGO ME DESAVIM Comigo me desavim, Sou posto em todo perigo; Não posso viver comigo Nem posso fugir de mim. Com dor da gente fugia, Antes que esta assi crecesse: Agora já fugiria De mim, se de mim pudesse. Que meo espero ou que fim Do vão trabalho que sigo, Pois que trago a mim comigo Tamanho imigo de mim?SÁ DE MIRANDA: Comigo me desavim. Lisboa, 1595. Disponível em: <http://www.citador.pt/poemas/comigo-me-desavim-sa-de-miranda>. Acesso em 16. ago 2019. Texto III MINHA SENHORA DE MIM Comigo me desavim minha senhora de mim sem ser dor ou ser cansaço nem o corpo que disfarço Comigo me desavim minha senhora de mim nunca dizendo comigo o amigo nos meus braços Comigo me desavim minha senhora de mim recusando o que é desfeito no interior do meu peitoHORTA, Maria Teresa. Minha senhora de mim. Lisboa: Futura, 1974. Tomando por base suas leituras dos poemas e do trecho em destaque, bem como seus conhecimentos a respeito da crítica formalista russa, assinale a alternativa correta em relação à formação de imagens em Sá de Miranda e Maria Teresa Horta. 3- Leia o trecho a seguir, retirado da Revista Cult a respeito do Formalismo Russo: Como se sabe, Roman Jakobson, outro integrante fundamental do Formalismo, é responsável por uma das teorias mais difundidas no Ocidente: a idéia de que a função poética da linguagem consiste na ambigüidade da mensagem mediante o adensamento do significante, princípio desenvolvido a partir de pressupostos de Chklovski. (...) Chklovski define a arte como a singularização de momentos importantes. Em rigor, os momentos tornam-se importantes somente depois de submetidos ao processo de singularização artística, porque, na vida prática, as coisas se tornam imperceptíveis em sua totalidade. Movido pela pressa e pelo empenho em imediatizar o cotidiano, o homem acaba por perder a consciência individual das ações, dos objetos e das situações. Por isso, abreviam-se palavras, criam-se siglas, desenvolvem-se esquemas para tornar mais rápida a superação dos compromissos e dos contatos com as pessoas. (...) Esse processo pensa Chklovski resulta na automatização da vida psíquica, pois, em nome da rapidez, anula-se a intensidade do ato de conhecer. Nele, as coisas possuem importância apenas quando reconhecidas, esvaindo-se o entusiasmo da descoberta. O próprio conceito de aprendizado pressupõe o uso automático das noções e dos movimentos. O simples fato de uma ação se tornar habitual basta para desencadear a inconsciência em quem a executa. Assim, a principal função da arte seria restaurar a intensidade do conhecimento, promovendo a virgindade dos contatos e o encanto da descoberta. Nesse sentido, o artista deve criar situações inéditas e imprevistas, em busca da restauração do ato de conhecer. Numa palavra, a finalidade da arte é gerar a desautomatização, mediante o estranhamento ou a singularização da estrutura que o artista oferece à contemplação. Se algo aspira à condição de enunciado artístico, precisa ser dito de forma impressionante.TEIXEIRA, Ivan. O formalismo russo. Cult: Fortuna Crítica 2, São Paulo, p.36-39, ago. 1998. Disponível em: <http://www.usp.br/cje/depaula/wp- content/uploads/2017/03/Ivan_Cult_Formalismo-Russo-ilovepdf-compressed.pdf>. Acesso em: 16 ago. 2019. Leia as afirmações a seguir a respeito da compreensão do objeto artístico literário. 1. Apresenta um motivo antigo com nova roupagem; 2. Não se limita na reprodução das coisas como elas são, mas sim, que se deixa inovar, contando algo de uma maneira totalmente nova. 3. Reconhece as importâncias do mundo e as imprime na forma escrita, buscando total fidelidade em sua reprodução e o mínimo de choque possível. 4. Diz exatamente o que gostaria de dizer, sem abrir brechas para ambiguidades interpretativas que podem causar desconforto em diferentes leitores; 5. Deixa transparecer diversas possibilidades de reconhecimento, sempre oferecendo uma possibilidade nova a ser compreendida e explorada. Tendo por base os seus conhecimentos sobre o Formalismo Russo, assinale a alternativa em que todas as afirmações contempladas são corretas. 4-Leia o trecho a seguir, do romance A Hora da Estrela, de Clarice Lispector. “Proponho-me a que não seja complexo o que escreverei, embora obrigado a usar palavras que vos sustentam. A história - determino com falso livre-arbítrio - vai ter uns sete personagens e eu sou um dos mais importantes deles, é claro. Eu, Rodrigo S. M. Relato antigo, este, pois não quero ser mordenoso e inventar modismos à guisa de originalidade. Assim é que experimentarei contra os meus hábitos uma história com começo, meio e “gran finale” seguido de silêncio e de chuva caindo. (...) Quem antes afiançar que essa moça não se conhece senão através de ir vivendo à toa. Se tivesse a tolice de se perguntar “quem sou eu?” Cairia estatelada em cheio no chão. É que “quem sou eu?” Provoca necessidade. E como satisfazer a necessidade? Quem se indaga é incompleto. A pessoa de quem vou falar é tão tola que às vezes sorri para os outros na rua. Ninguém lhe responde ao sorriso porque nem ao menos a olham. (...) De uma coisa tenho certeza: essa narrativa mexerá com uma coisa delicada: a criação de uma pessoa inteira que na certa está tão viva quanto eu. Cuidai dela porque meu poder é só mostrá-la para que vós a reconheçais na rua, andando de leve por causa da esvoaçada magreza. E se for triste a minha narrativa? Depois na certa escreverei algo alegre, embora alegre por quê? Porque também sou um homem de hosanase um dia, quem sabe, cantarei loas que não as dificuldades da nordestina.” (LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. São Paulo: Rocco, 1998.) Indique que tipo de narrador está sendo desenvolvido no trecho. 5-O romance Os Noivos, de Alessandro Manzoni é considerado um marco na literatura italiana. A obra foi tão influente que ditou por séculos a forma que o romance, na Itália, deveria seguir. O trecho a seguir foi retirado da Introdução do romance. Leia-o e responda ao que se pede a seguir. “Mas quando findar este meu trabalho heroico de transcrever esta história de um manuscrito desbotado e meio rasgado, e a trouxer, como se costuma dizer, à luz do dia, achar-se-á depois quem se dê ao trabalho de a ler?” Esta reflexão dubitativa, nascida do esforço de decifrar um rabisco que vinha logo a seguir à palavra acidentes, fez-me suspender a cópia e pensar com maior seriedade no que conviria mais fazer. “É bem verdade - disse para comigo, folheando o manuscrito -, é bem verdade que tal saraivada de floreados e de figuras de estilo não continua assim a fio ao longo de toda a obra. (...) Na verdade, não é coisa que se apresente aos leitores de hoje: estes já estão demasiado fartos, demasiado enfadados com tal género de extravagâncias. Ainda bem que tive esta boa ideia logo ao princípio de tão infeliz trabalho: e daí lavo as minhas mãos”. Contudo, no momento de fechar o cartapácio para o arrumar, custava-me que uma história tão bela tivesse, no entanto, de ficar desconhecida; porque, enquanto história, pode acontecer que ao leitor não o pareça, mas na minha opinião era bela, ou melhor dizendo: muito bela. “Por que razão - pensei - é que não se poderia pegar na série dos factos deste manuscrito e refazer-lhe a linguagem?’ Não se tendo apresentado nenhuma objeção razoável, tal partido foi logo abraçado. E eis aqui a origem do presente livro, exposta com uma ingenuidade que corresponde à importância do próprio livro.” MANZONI, Alessandro (1827). Os Noivos. São Paulo: Paulinas Editora, 2015. Tradução de José Colaço Barreiros. Com base no que se pode depreender da Introdução ao romance, assinale a alternativa que demonstra adequadamente qual é a principal motivação deste trecho. 6-Eu havia finalmente chegado, no correr dessa perambulação, às prateleiras que contêm livros de autores vivos — de homens e mulheres, pois há agora quase tantos livros escritos por mulheres quanto por homens. Ou, se isso ainda não é exatamente verdade, se o masculino é ainda o sexo volúvel, é certamente verdade que as mulheres já não escrevem apenas romances. Há os livros de Jane Harrison sobre arqueologia grega; os livros de Vernon Lee sobre estética; os livros de Gertrude Bell sobre a Pérsia. Há livros sobre todo tipo de assuntos, que, há uma geração, nenhuma mulher teria tocado. Há poemas e peças e crítica; há histórias e biografias, livros de viagens e livros de erudição e pesquisa; há até algumas filosofias e livros sobre ciência e economia. E, embora os romances predominem, é bem possível que os próprios romances tenham mudado a partir da associação com livros de outra natureza. A simplicidade natural, a era épica da produção literária das mulheres, talvez tenha passado. A leitura e a crítica talvez lhe tenham ampliado o alcance, aumentado a sutileza. O impulso para a autobiografia terá se esgotado. Talvez a mulher esteja começando a usar a literatura como uma arte, não como um método de expressão pessoal. Entre esses novos romances se poderia encontrar a resposta para diversas dessas indagações. Tomei um deles ao acaso. Estava bem no canto da prateleira; chamava-se ‘A aventura da vida’, ou um título semelhante, de Mary Carmichael, e foi publicado neste exato mês de outubro. Parece ser seu primeiro livro, disse a mim mesma, mas é preciso lê-lo como se fosse o último volume de uma série bastante longa, em prosseguimento a todos os outros que andei olhando: os poemas de Lady Winchilsea e as peças de Aphra Behn e os romances das quatro grandes romancistas. Pois os livros vêm sempre numa seqüência, apesar de nosso hábito de julgá-los separadamente. E devo também considerá-la — essa mulher desconhecida — como a descendente de todas aquelas outras mulheres cujas condições de vida estive examinando e ver o que ela herdou de suas características e restrições. Assim, com um suspiro — pois os romances freqüentemente proporcionam um paliativo, e não um antídoto, fazendo-nos deslizar para cochilos letárgicos, em vez de despertar-nos com um ferro em brasa —, acomodei-me com um caderno de anotações e um lápis para extrair o melhor que pudesse do primeiro romance de Mary Carmichael, ‘A aventura da vida’.” WOOLF, Virginia. Um teto todo seu. São Paulo: Círculo do Livro S.a, 1928. 141 p. Disponível em: <https://iedamagri.files.wordpress.com/2014/07/uma-hipotc3a9tica- irmc3a3-de-shakespeare-um-teto-todo-seu.pdf>. Acesso em: 21 ago. 2019. Grifo nosso. No trecho em destaque, Virginia Woolf disserta sobre o processo de criação literária das mulheres de seu tempo. A partir dele, analise as afirmações a seguir. 1. Virginia Woolf insere o conceito de “bagagem literária” em “E devo também considerá-la — essa mulher desconhecida — como a descendente de todas aquelas outras mulheres cujas condições de vida estive examinando e ver o que ela herdou de suas características e restrições”, trecho em que a autora disserta a respeito da influência das autoras predecessoras da literatura produzida em seu tempo sobre o estilo desta mesma literatura. 2. No trecho, estão elaboradas questões centrais a respeito do contexto sociocultural e o processo de criação literária, uma vez que a autora localiza historicamente e socialmente o caráter das publicações que vieram antes da literatura de sua contemporaneidade. 3. Apesar de dissertar a respeito da produção escrita de mulheres de seu tempo, Virginia Woolf não se detém sobre os aspectos psicológicos que circundam esta produção, focando apenas no argumento sociocultural para embasar sua teoria de opressão sistemática. É correto o que se afirma em: 7- Leia o trecho a seguir. Para a estética da recepção, a teoria da literatura deve ser fundada no reconhecimento da historicidade da arte. Segundo Jauss, as outras linhas teóricas não consideram a história nas análises do texto literário. (...) O processo da leitura, a experiência estética e o leitor, principal elo desse sistema, são elementos centrais para conhecimento e interpretação da obra. Jauss propõe o estudo da literatura sob a perspectiva de sua relação com a época de produção e com a posição histórica do intérprete. Assim, a estética da recepção é fruto do encontro entre poética e hermenêutica (estética e interpretação). O teórico defende uma história da arte fundada nas perspectivas do sujeito produtor e do consumidor e na sua interação mútua, vendo a obra de arte no horizonte histórico de sua origem, função social e ação no tempo. SILVA, A. C. S.; PAZ, Ravel Giordano. OBSERVAÇÕES SOBRE A APLICAÇÃO DA METODOLOGIA DA ESTÉTICA DA RECEPÇÃO A HELENA, DE MACHADO DE ASSIS. REEL. Revista Eletrônica de Estudos Literários, v. 1, p. 1-17, 2014. No trecho em destaque, a autora faz um apanhado das principais características da chamada Estética da Recepção, uma teoria que propõe a reformulação da interpretação textual baseando-se na relação entre leitor e obra sob um ponto de vista diacrônico. Com base em seus conhecimentos, assinale a alternativa em que cita-se uma corrente literária que está em consonância com a Estética da Recepção. 8- A canção a seguir foi gravada em 1976 pelo sambista Cartola e é considerada um clássico da MPB, tendo sido regravada por grandes nomes da música brasileira como Cazuza, Beth Carvalho e Ney Matogrosso. Ainda é cedo, amor Mal começaste a conhecer a vida Já anuncias a hora de partida Sem saber mesmo o rumo que irás tomarPreste atenção, querida Embora eu saiba que estás resolvida Em cada esquina cai um pouco a tua vida Em pouco tempo não serás mais o que és Ouça-me bem, amor Preste atenção, o mundo é um moinho Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho Vai reduzir as ilusões a pó Muita atenção, querida De cada amor tu herdarás só o cinismo Quando notares estás à beira do abismo Abismo que cavaste com os teus pés O MUNDO É UM MOINHO: Cartola. Cartola. Disponível em: <https://www.letras.mus.br/cartola/44901/>. Acesso em: 16 ago. 2019. Tendo como base seus conhecimentos a respeito das contribuições do formalismo russo para a crítica literária, bem como a contribuição de um de seus precursores, Roman Jakobson, assinale a alternativa em que as características de literariedade, na canção, estão descritas adequadamente. 9- O trecho a seguir foi retirado do conto Kholstomér, do autor russo Liev Tolstói. Leia- o e, depois, responda ao que se pede. Compreendi muito bem o que dizia a respeito dos açoites e do cristianismo. Mas ficou completamente obscura para mim a palavra “seu”, pela qual pude deduzir que estabeleciam um vínculo a ligar-me ao chefe das cavalariças. Então, não pude compreender de modo algum em que consistiria tal vínculo. Só muito depois, quando me separaram dos demais cavalos, é que expliquei a mim mesmo o que aquilo representava. Naquela época, eu não era capaz de entender a significação do fato de ser “eu” propriedade de um homem. As palavras “meu cavalo”, referindo-se a mim, um cavalo vivo, pareciam-me tão estranhas como as palavras “minha terra”, “meu ar”, “minha água”. No entanto, elas exerceram sobre mim enorme influência. Sem cessar pensava nelas e só depois de longo contato com.os seres humanos pude explicar-me a significação que, afinal, lhes é atribuída. Querem dizer o seguinte: os homens não dirigem a vida com fatos, mas com palavras. Não os preocupa tanto a possibilidade de fazer ou deixar de fazer alguma coisa, como a de falar de objetos diferentes mediante palavras convencionais. Essas palavras que consideram muito importantes, são, sobretudo, “meu” ou “minha”, “teu” ou “tua”. Aplicam-nas a todas as espécies de coisas e de seres, inclusive à terra, aos seus semelhantes e aos cavalos. Além disto, convencionaram que uma pessoa só pode dizer “meu” a respeito de uma coisa determinada. E aquele que puder aplicar a palavra “meu” a um número maior de coisas, segundo a convenção feita, considera-se a pessoa mais feliz. Não sei por que as coisas são desse modo; mas sei que são assim. Durante muito tempo procurei compreender isso, supondo que daí viria algum proveito direto; mas verifiquei que isso não era exato. Muitas pessoas das que me chamavam “seu cavalo” nem mesmo me montavam; mas outras o faziam. Não eram elas as que me davam de comer, mas outros estranhos. Também não eram as pessoas que me faziam bem, mas os cocheiros, os veterinários e, em geral, pessoas desconhecidas. Posteriormente, quando ampliei o círculo de minhas observações, convenci-me de que o conceito de meu - e não só com relação a nós, cavalos - não tem qualquer outro fundamento além de um baixo instinto animal, que os homens chamam sentimento ou direito de propriedade. O homem diz “minha casa” mas nunca vive nela; preocupa-se só em construí-Ia e mantê-Ia. O comerciante diz “minha loja”, ou “meus tecidos”, por exemplo, mas não faz suas roupas com os melhores tecidos que vende na loja. Há pessoas que chamam “minha” uma extensão de terra e nunca a viram nem passaram por ela. Há outras que dizem serem suas certas pessoas que nunca viram nesta vida e a única relação que têm com elas consiste em causar-Ihes dano.TOLSTÓI, Liev. Kholstomér. Belo Horizonte: Suryara, 2017. Leia os itens a seguir e, tomando por base seus conhecimentos a respeito da crítica formalista russa, assinale a alternativa em que todos os itens estão corretos. 1. O primeiro motivo de estranhamento a que se pode chear na leitura do excerto diz respeito ao narrador, “eu” como testemunha, que narra a fábula a partir do ponto de vista de um cavalo. 2. Observa-se um processo de singularização (segundo a terminologia de Chklovski) das experiências e objetos, uma vez que estes não são chamados por seus nomes, mas sim, por descritos de uma maneira nova. 3. Tomando por argumento a escolha de narrar o conto do ponto de vista de um cavalo, tem-se que a principal motivação observada nesta trama é estética. 10-Leia o trecho a seguir: “Uma voz chega a alguém no escuro. Imaginar. A alguém deitado de costas no escuro. Isso ele pode dizer pela pressão nas partes traseiras e pela mudança do escuro quando ele fecha os olhos e de novo quando os abre de novo. Só uma pequena parte do que é dito pode ser verificada. Como por exemplo quando ele ouve, Você está deitado de costas no escuro. Então ele deve reconhecer a verdade do que é dito. Mas de longe a maior parte do que é dito não pode ser verificada. Como por exemplo quando ouve, Você viu a luz primeiro em tal e tal dia. Às vezes os dois se combinam como por exemplo, Você viu a luz primeiro em tal e tal dia e agora está deitado de costas no escuro. Um expediente talvez da incontrovertibilidade de um para ganhar crédito para o outro. Aquela então é a proposição. A alguém deitado de costas no escuro uma voz conta de um passado. Com alusões ocasionais a um presente e mais raramente a um futuro como por exemplo, Você acabará como está agora. E num outro escuro ou no mesmo um outro imaginando tudo por companhia. Depressa deixa-lo. (...) Inventor da voz e do seu ouvinte e dei si mesmo. Inventor de si mesmo por companhia. Deixar assim. Ele fala de si mesmo como de um outro. Ele diz falando de si mesmo, Ele fala de si mesmo como de um outro. A si mesmo ele inventa também por companhia. Deixar assim. Confusão também é companhia até certo ponto Melhor esperança adiada que nenhuma. Até certo ponto Até o coração começar a desgostar- se. Companhia também até certo ponto. Melhor um coração desgostoso que nenhum. Até começar a partir-se. Então falando de si mesmo ele conclui por enquanto, Por enquanto deixar assim.” (BECKETT, Samuel. Companhia. In: BECKETT, Samuel. Companhia e outros textos. São Paulo: Globo, 2012. p. 27-64.) No conto Companhia, obra de Samuel Beckett, a interpretação do tipo de narrador é crucial para a apreensão de sentido. Pensando nisso, leia o trecho a seguir e assinale a alternativa correta em relação aos recursos formais utilizados pelo autor quanto ao modo de enunciação.
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