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PROJETO DE PAISAGISMO I Anna Carolina Manfroi Galinatti Desenvolvimento da função social do paisagismo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer o espaço aberto como propulsor de atividades sociais. Diferenciar praças de parques urbanos. Aplicar o paisagismo para atividades socioculturais, físicas e recreativas. Introdução O crescimento das áreas urbanas e a densificação do uso do solo têm limitado a alocação de áreas verdes dentro das cidades. Aliado a isso, vê-se a gradual redução das áreas privativas dentro dos grandes centros. Assim, torna-se essencial que os espaços abertos exerçam outras funções, além da ambiental e ornamental. Para atender às necessidades sociais dos indivíduos, os parques, as praças e os espaços abertos estimulam — ou deveriam — a convivência comunitária, promovendo lazer, qualidade de vida e cultura entre os usuários. A disponibilidade de espaços funcionais, de recreação e descompressão é um importante medidor da qualidade do espaço urbano. Neste capítulo, você reconhecerá os espaços abertos como propulso- res de atividades sociais dentro de uma comunidade. Além disso, conhe- cerá os conceitos de praça e parque urbano, bem como verá exemplos de espaços abertos que, por meio do paisagismo, proporcionam atividades socioculturais, físicas e recreativas. A função social do espaço aberto Os espaços abertos exercem três importantes funções dentro de uma ci- dade: ambiental, econômica e social. A primeira diz respeito à promoção de ambientes mais agradáveis, com melhores condições do ar e da água. A segunda função, mais recente, ocorre com a implantação dos créditos de carbono e o aumento dos empreendimentos imobiliários. Por último, mas não menos importante, o aspecto social atrela-se aos benefícios de uso comum e funcionais, como a qualidade de vida, a cultura e a educação (ALENCAR; CARDOSO, 2015). A limitação dos espaços reservados a áreas abertas e verdes, cada vez mais ausentes nas cidades, ressalta a importância da criação de espaços que desempenhem, ao mesmo tempo, diversas funções, a fim de atender às ne- cessidades da população (Figura 1). Figura 1. Parque público. Os espaços abertos sofrem influência e, simultaneamente, influenciam os aspectos sociais de uma cidade. A presença de espaços abertos que promovam a convivência comunitária é um grande indicador de qualidade de vida nos centros urbanos, e faz parte das recentes discussões sobre sustentabilidade. Um bairro bem-sucedido promove locais de encontro e socialização, impor- tantes para a visibilidade de interação entre diferentes grupos de indivíduos, de distintas idades, etnias e classes sociais. A vitalidade urbana depende de ambientes que fomentem a ocupação por parte da população, promovendo encontros e trocas entre os membros de uma comunidade, que podem se apropriar dos espaços, destinando a eles propósitos diferentes dos concebidos originalmente (Figura 2). Desenvolvimento da função social do paisagismo2 Cada vez mais importante na temática social, o lazer é uma necessidade básica da popu- lação. Seu incentivo, como forma de promoção social, tão importante para uma cidade, é de responsabilidade do poder público, conforme assegura a Constituição Federal de 1988. Figura 2. Parque linear na Coreia do Sul que exerce papel além do funcional, estimulando o convívio da comunidade. Fonte: Restrepo (2016, documento on-line). As atividades que podem ser exercidas em um espaço aberto podem ser relacionadas à educação, à cultura, ao lazer ou à atividade física. O uso diver- sificado dos espaços pode incentivar, inclusive, a economia local, uma vez que podem ser promovidos eventos musicais, gastronômicos, culturais e feiras, de modo a envolver os moradores das regiões adjacentes, estimulando a visita de moradores de outras regiões e proporcionando qualidade de vida a todos. Praças e parques urbanos A diferença entre uma praça e um parque está, essencialmente, na escala. As praças, além de serem menores fi sicamente, têm seu uso destinado aos mora- dores de um bairro e suas adjacências. Já os parques, maiores em dimensão, destinam-se à cidade, sendo frequentados por uma parcela maior da população. 3Desenvolvimento da função social do paisagismo As características de uma praça dependem muito do seu lugar de inserção e dos costumes dos usuários locais. Devido à sua escala, a praça é percebida como um todo pelos usuários que ali exercem atividades, como breves caminhadas, estar e recreação. Em algumas praças, predominam áreas para a realização de atividades esportivas, como futebol, vôlei, corrida, etc. Em outras, predominam atividades recreativas infantis, com mobiliário urbano específico. Além disso, é possível encontrar praças com espaços unicamente de estar e descanso, nas quais o mobiliário se resume a bancos, lixeiras e luminárias. As praças são, provavelmente, o lugar público mais importante (WATER- MAN, 2010) e não podem ser cercadas, devendo ser integradas ao bairro, de modo a permitir o livre acesso dos cidadãos. Nelas, há espaço para socialização e festividades, que promovem o intercâmbio urbano (Figura 3). Costumam estar em posições estratégicas nos bairros, cuja organização pode ter se dado justamente em função da presença da praça. Algumas cidades do interior, inclusive, se desenvolvem ao redor de praças. Conforme o art. 8º, § 1º da Resolução CONAMA, Lei nº. 369/2006, área verde de domínio público é “o espaço de domínio público que desempenhe função ecológica, paisagística e recreativa, propiciando a melhoria da qualidade estética, funcional e ambiental da cidade, sendo dotado de vegetação e espaços livres de impermeabilização”. Figura 3. Praça da Matriz em Porto Alegre. Fonte: Gov.br (2013, documento on-line). Desenvolvimento da função social do paisagismo4 Conforme Kliass (1993), os parques urbanos são espaços públicos com dimensões significativas, com elementos naturais, principalmente cobertura vegetal, destinado à recreação. É ampla a gama de atividades que podem ser ofertadas em um parque, sendo muito comum a existência de equipamentos públicos culturais de médio e grande portes, como ginásios e anfiteatros. O comércio pode ser instalado com restrição, costumando aparecer na forma de quiosques de alimentação e vendedores ambulantes. Exercendo a função de “pulmões verdes” da cidade e desempenhando um importante papel ecológico (WATERMAN, 2010), os parques podem estar inseridos em áreas densamente construídas, nas quais funcionam como uma importante conexão do tecido urbano, ou podem estar mais afastados (Figura 4). Seu acesso pode ser público ou controlado, podendo existir parques cercados. As circulações nos parques costumam ser hierarquizadas, podendo haver caminhos primários, secundários e terciários, que definem diferentes circuitos ao longo do espaço. Figura 4. Com mais de 3 km2 de extensão, o Central Park, em Nova Iorque, abriga inúmeras atividades de lazer voltadas à população. Devido à sua extensão e ao número de usuários frequentadores, um parque necessita de equipamentos de infraestrutura básica, como, por exemplo, área bebedouros, administração e banheiros. Ao caminhar por um parque, é possível encontrar diversas paisagens, compostas por diferentes elementos paisagísticos, tais como vegetação alta e rasteira, pavimentações diferentes, iluminações, fontes e espelhos d’água, áreas planas, áreas acidentadas, entre outros. 5Desenvolvimento da função social do paisagismo Exemplos de praças e parques Principal praça do centro da cidade de Buenos Aires, a Plaza de Mayo (Figura 5) concentra ao seu redor diversos monumentos históricos e edifi cações públicas. Em suas adjacências, encontram-se a sede do Poder Executivo da cidade (a Casa Rosada), a Catedral Metropolitana, a casa central do Banco Nación e o edifício do governo. Aqui, tem-se um exemplo de cidade que se desenvolveu ao redor de uma praça, cujouso, desde o século XVI até os dias de hoje, tem forte caráter político e social. Figura 5. Plaza de Mayo, em Buenos Aires. Fonte: Špindler (2008, documento on-line). A praça Fonte Nova faz parte do programa municipal “Uma Praça em Cada Bairro”, da cidade de Lisboa, em Portugal (Figura 6). O programa teve como finalidade melhorar o espaço público em diversos locais da cidade. O projeto, proposto pelo escritório José Adrião Arquitetos, privilegia a mobilidade de pedes- tres e os espaços de estadia. Há, no interior da praça, zonas de estadia e lazer em pontos específicos que pontuam o espaço, cada qual com seu programa específico: lazer, recreação infantil, parque canino, entre outros. Cada “ilha” de programa é delimitada por bancos contínuos em seu perímetro. Mesmo localizada sob um viaduto, a praça é amplamente iluminada, sendo utilizada ao longo do dia para a realização de diferentes atividades. A praça e o espaço público permitem uma fácil apreensão a todas idades. Além disso, seus materiais são resistentes e de fácil manutenção, características muito desejáveis a espaços públicos de uso intenso. Desenvolvimento da função social do paisagismo6 Figura 6. Praça Fonte Nova, em Portugal. Fonte: Vada (2018, documento on-line). A Praça dos Três Poderes, em Brasília, representa uma praça em outra escala e percepção. Esse amplo espaço aberto é cercado por três edifícios públicos monumentais que representam os três poderes da República: o Palácio do Planalto (Executivo), o Supremo Tribunal Federal (Judiciário) e o Congresso Nacional (Legislativo) (Figura 7). Idealizada por Lúcio Costa, essa praça foge do conceito tradicional, visto que não possui árvores e elementos de sombre- amento, e constitui um importante espaço simbólico da cidade. Nesse caso, a praça funciona como integração entre a cidade e a paisagem. Figura 7. Praça dos Três Poderes, em Brasília. Fonte: Pereira (2019, documento on-line). 7Desenvolvimento da função social do paisagismo O Parque Villa-Lobos é um parque público localizado em São Paulo, concebido, originalmente, para ser uma espécie de “oásis musical”, uma ho- menagem ao compositor Heitor Villa-Lobos (Figura 8). O parque contempla, além de grandes áreas verdes e de passeio, equipamentos destinados ao conhe- cimento da música, de modo a estimular diversos sentidos dos usuários. Em sua extensão, é possível encontrar playgrounds, ciclovias, pistas de corrida, quadras esportivas, ilhas para shows, além de equipamentos maiores, como orquidário e anfiteatro. Trata-se de um exemplo de parque cercado. Após o encerramento de seu horário de funcionamento, o parque é fechado para o acesso do público externo. Figura 8. Parque Villa-Lobos, em São Paulo. Fonte: Time Out São Paulo (2019, documento on-line). Também em São Paulo, destaca-se o Parque Iburapuera, com uma enorme área de 158 hectares. Patrimônio histórico tombado da cidade, o parque abriga construções de grande relevância, como museus e auditórios, projetados pelo arquiteto Oscar Niemeyer (Figura 9). O parque contempla diversos atrativos para a população, como passeios culturais e educativos, quadras esportivas, aparelhos de ginástica, ciclovia e planetário. Desenvolvimento da função social do paisagismo8 Figura 9. Parque Ibirapuera, em São Paulo. Fonte: windwalk/Shutterstock.com. Com um conceito um pouco diferente dos demais, o Vigeland Park é uma das principais atrações da cidade de Oslo, na Noruega (Figura 10). O parque é conhecido por suas exuberantes esculturas em bronze e granito, feitas por um único artista, Gustav Vigeland, que dá nome ao parque. São, ao todo, 212 obras em tamanho real, espalhadas ao longo dos 850 metros de extensão, representando a inerência da existência humana, como fraternidade, trabalho e maternidade. Figura 10. Vigeland Park, na Noruega. Fonte: Bestourism (2019, documento on-line). 9Desenvolvimento da função social do paisagismo ALENCAR, L. D.; CARDOSO, J. C. Paisagismo funcional: o uso de projetos que integram mais que ornamentação. Revista Ciência, Tecnologia & Ambiente, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 1–7, 2015. Disponível em: http://www.revistacta.ufscar.br/index.php/revistacta/article/ view/4/3. Acesso em: 24 ago. 2019. BESTOURISM. Vigeland Park. 2019. Disponível em: http://www.bestourism.com/medias/ dfp/11352. Acesso em: 24 ago. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 24 ago. 2019. BRASIL. Ministério de Meio Ambiente. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 369, de 28 de março de 2006. Dispõe sobre os casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente-APP. Disponível em: http:// www2.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=489. Acesso em: 24 ago. 2019. GOV.BR. Praça da Matriz e 3 poderes. 2013. Disponível em: http://legado.brasil.gov.br/ noticias/esporte/2010/07/porto-alegre/COPA2014_PortoAlegre_SETUR_Praa-da-Matriz- -e-3-poderes_Alfonso-Abraham.jpg/view. Acesso em: 24 ago. 2019. KLIASS, R. G. Os parques urbanos de São Paulo. São Paulo: Pini, 1993. PEREIRA, C. Brasília, três poderes. 2019. Disponível em: https://blogdochicopereira.com/ web/brasilia-tres-poderes/. Acesso em: 24 ago. 2019. RESTREPO, J. M. Walking the Cheonggyecheon Stream Restoration Project in Seoul. 2016. Disponível em: https://favelissues.com/2016/06/06/walking-the-cheonggyecheon- -stream-restoration-project-in-seoul/. Acesso em: 24 ago. 2019. ŠPINDLER, P. Plaza de Mayo a prezidentský palác Casa Rosada: Buenos Aires: panoramio. 2008. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Plaza_de_Mayo_a_ prezidentsk%C3%BD_pal%C3%A1c_Casa_Rosada_-_Buenos_Aires_-_panoramio_(1). jpg. Acesso em: 24 ago. 2019. TIME OUT SÃO PAULO. Parque Villa-Lobos. 2019. Disponível em: http://www.timeout. com.br/sao-paulo/na-cidade/venues/382/parque-villa-lobos. Acesso em: 24 ago. 2019. VADA, P. Praça Fonte Nova / José Adrião Arquitetos. 2018. Disponível em: https://www.archdaily. com.br/br/891211/praca-fonte-nova-jose-adriao-arquitetos. Acesso em: 24 ago. 2019. WATERMAN, T. Fundamentos de paisagismo. Porto Alegre: Bookman, 2010. Leituras recomendadas GOMBRICH, E. H. J. A história da arte. Rio de Janeiro: LTC, 2000. WATERMAN, T.; WALL, E. Desenho urbano: fundamentos de paisagismo. Porto Alegre: Bookman, 2012. Desenvolvimento da função social do paisagismo10
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