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Manual de Curso de Licenciatura em Ensino de História HO169-HISTÓRIA DAS INSTITUIÇÕES POLITICAS II Instituições Políticas Africanas Universidade Católica de Moçambique Centro de Ensino à Distância - CED Direitos de autor (copyright) Este manual é propriedade da Universidade Católica de Moçambique, Centro de Ensino à Distância (CED) e contém reservados todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução deste manual, no seu todo ou em partes, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico, gravação, fotocópia ou outros), sem permissão expressa de entidade editora (Universidade Católica de Moçambique - Centro de Ensino à Distância). O não cumprimento desta advertência é passível a processos judiciais. Elaborado Pelos drs. Nazir Gani e Romeu Pinheiro Uanicela, Licenciados em ensino de História pela UP- Beira, Colaboradores do Curso de Licenciatura em ensino de História no Centro de Ensino à Distância (CED) da Universidade Católica de Moçambique – UCM. Universidade Católica de Moçambique Centro de Ensino à Distância - CED Rua Correira de Brito No 613-Ponta-Gêa· Moçambique-Beira Telefone: 23 32 64 05 Cel: 82 50 18 44 0 Fax: 23 32 64 06 E-mail: ced@ucm.ac.mz Website: www.ucm.ac.mz Agradecimentos A Universidade Católica de Moçambique - Centro de Ensino à Distância e o autor do presente manual, dr. Idelson Rui Aberto e Lurdes Jama Passura da Silva , gostaria de agradecer a colaboração dos seguintes indivíduos e instituições na elaboração deste manual: Concepção e produção drs. Idelson Rui Alberto e Lurdes Jama Passura da Silva Pela Coordenação e edição dra Georgina Nicolau Pela Revisão dr. James Gabinete Índice Visão geral 13 Bem-vindo a História das Instituições Políticas II Instituições Políticas Africanas ................ 13 Objectivos da cadeira 13 Quem deve estudar este módulo? 14 Como está estruturado este módulo 14 Tarefas de avaliação e/ou Auto-avaliação 15 Comentários e sugestões 15 Ícones de actividade 15 Acerca dos ícones 15 Habilidades de estudo 15 Precisa de apoio? ................................................................................................................. 16 Tarefas (avaliação e auto-avaliação) 16 Avaliação 16 Unidade I 18 Introdução ao Estudo das Instituições Politicas Africanas 18 Introdução 18 1.1. Origem das Instituições Políticas Africanas 18 1.2. Características das Instituições Políticas Africanas 21 Sumário 26 Exercícios 26 Unidade II 27 O Reino dos Zulo na África do Sul Erro! Marcador não definido. Introdução 27 2.1. Períodos da História Zulu 27 2.2. O rei zulu e o Estado 28 2.3. Status e Poder Político 31 2.4. As Tribos dentro da Nação 32 2.5. Sanções sobre a autoridade e a estabilidade do Estado 34 2.6. O Povo e os seus chefes 35 2.7. O Período da Administração Europeia 36 Sumário 37 Exercícios 37 Unidade III Erro! Marcador não definido. A Organização Política dos Ngwato Erro! Marcador não definido. Introdução 39 3.1. A Composição Étnica e Territorial dos Ngwato 39 3.2. O Sistema Administrativo 41 3.3. Poderes e Autoridade do Chefe 44 3.4. Direitos e Responsabilidades da Chefatura 47 Sumário 50 Exercícios 50 Unidade IV Erro! Marcador não definido. O Sistema Político da Tribo Bemba Erro! Marcador não definido. Introdução 51 4.1. Origem da Tribo Bemba 51 4.2. Bases de Autoridade 56 4.3. O Aparelho do Governo 57 4.4. Integração da Tribo 59 4.5. Mudanças Pós - Europeias 59 4.6. Efeitos dos Decretos de 1929 61 Sumário 63 Exercícios 63 Unidade V Erro! Marcador não definido. O Reino dos Ankole Erro! Marcador não definido. Introdução 64 5.1. A Formação e Implantação do Reino Ankole e suas Tribos 64 5.2. Status Político 66 5.3. O Rei e o Kraal Real 68 5.4. Tributo 69 5.5. Sucessão 70 Sumário 71 Exercícios 72 Unidade VI Erro! Marcador não definido. O Estado Kede Erro! Marcador não definido. Introdução 73 6.1. Origem e Fixação do Estado Kede 73 6.2. Organização Política 74 6.3. Estratificação Social 77 Sumário 78 Exercícios 78 Unidade VII Erro! Marcador não definido. Os Bandos do Kavirondo Erro! Marcador não definido. Introdução 79 7.1. Localização dos Bandos Kavirondo 79 7.2. Estrutura Política Interna 81 7.3. Estrutura Política Externa 84 7.4. Natureza da Autoridade Política 85 Sumário 87 Exercícios 87 Unidade 8 Erro! Marcador não definido. Positivismo Erro! Marcador não definido. Introdução 88 8.1.Sociocracia de Augusto Comte 88 8.2. Do tradicionalismo ao positivismo 89 8.3. Espírito positivo 91 8.4. Influência política de Comte 92 Sumário 94 Exercício 94 Unidade 9 Erro! Marcador não definido. O Nacionalismo totalitário: Mussolini Erro! Marcador não definido. Introdução 97 9.1. Estado nacional 97 9.2. Estado totalitário 99 9.3. Estado corporativo 100 Sumário 101 Exercício Erro! Marcador não definido. Unidade X Erro! Marcador não definido. O Nacionalismo totalitário: Hitler Erro! Marcador não definido. Introdução 102 10.1. Estado nacional 102 10.2. Estado totalitário 104 10.3. Racismo hitleriano 105 Sumário Erro! Marcador não definido. Exercício Erro! Marcador não definido. Unidade XI Erro! Marcador não definido. O Nacionalismo personalizado: Charles de Gaule Erro! Marcador não definido. Introdução 107 11.1. Nacionalismo combatidos 107 11.2. Nacionalismos continuados 108 11.3. O poder personalizado 109 11.4. O Parlamento limitado e eliminado 110 Sumário 111 Exercício 111 Unidade XII Erro! Marcador não definido. Socialismo Erro! Marcador não definido. Introdução 112 12.1. Uma palavra nova 112 12.2. Uma ideia política nova 113 12.3. Uma definição difícil 114 Sumário Erro! Marcador não definido. Exercício 114 Unidade XIII 114 Socialismo sem Estado Erro! Marcador não definido. Introdução 116 13.1. Pensamento politico de Saint Simon 116 14.2. Pensamento Político de Charles Fourier 118 Sumário 119 Exercício 119 Unidade XIV Erro! Marcador não definido. Socialismo contra o Estado Erro! Marcador não definido. Introdução 120 14.1. Federalismo anarquista de Proudhon 120 14.2. Anarquismo libertário 121 14.3. Sindicalista anarquista 124 14.4. Marxismo 126 Exercício 127 Unidade XV Erro! Marcador não definido. Socialismo no estado Erro! Marcador não definido. Introdução 128 15.1. O malogro de 1848 128 15.2. O pensamento de Ferdinand Lassale 131 15.3. O desmembramento do marxismo 133 15.4. Lenine e o marxismo 134 15.5. Staline e o marxismo 136 Sumário 136 Exercício 137 Unidade XVI Erro! Marcador não definido. Crise do Socialismo Erro! Marcador não definido. Introdução 138 16.1. O espírito de Revolta 138 16.2. O comunismo utópico 140 16.3. A diversificação do comunismo 141 16.3.1 Socialismo chinês 142 16.3.2 Socialismo cubano 143 Sumário 143 Exercício 144 Unidade XVII Erro! Marcador não definido. Democracia Liberal Erro! Marcador não definido. Introdução 145 17.1. Deficiência do liberalismo político 145 17.2. A democracia constitucional 146 17.3. O princípio maioritário 148 17.4. Relativismo democrático 149 Sumário 150 Exercício 150 Unidade XVIII Erro! Marcador não definido. Democracia Socialista Erro! Marcador não definido. Introdução 152 18.1. Pensamento político de: Jean Jaurés 152 19.2 Léon Blum 153 Sumário 155 Exercício 155 Unidade XIX Erro! Marcador não definido. Democracia Radical Erro! Marcador não definido. Introdução 157 19.1. Pensamento político de: Charles Renouvier 157 19.2. Alfred Fouillé 159 Exercício 160 Unidade XX Erro! Marcador não definido. Democracia cristã Erro! Marcador não definido.Introdução 161 20.1.Programa político da democracia cristã 161 20.2. A despolitização da democracia cristã 163 20.3. Democracia de inspiração cristã 163 Sumário 165 Exercício 165 Referências Bibliográficas 166 Visão geral Bem-vindo a História das Instituições Políticas II Instituições Políticas Africanas Este módulo apresenta aspectos ligados aos modos de organização socio-económico e politico das sociedades africanas, tocando especificamente na origem dos estados africanos (primitivos e estatais) e caracteriza as semelhanças comuns, bem como a actuação dos chefes das tribos face `a penetração europeia, assim como o poder do rei durante a administração europeia nesses estados. Objectivos da cadeira Findo o estudo da História das Instituições Políticas II - As Instituições Políticas Africanas; o estudante será capaz de: Objectivos Definir a origem dos estados Africanos; Caracterizar a estrutura de parentesco destes estados; Caracterizar as mudanças introduzidas com o advento da administração Britânica; Descrever o período da administração europeia; Classificar o sistema económico e organização política das tribos Africanas; Descrever a História da formação dos reinos e suas tribos; Caracterizar o poder do rei e dos que o rodeiam, e avaliar ainda as regras de sucessão. Analisar o positivismo de Comte; Descrever a influência do positivismo de Comte na arena Política. Descrever o totalitarismo no estado fascista; Analisar o corporativismo durante o fascismo Descrever o totalitarismo no estado nazista; Analisar a política racial durante o nazismo. Analisar o nacionalismo combatido de Charles de Gaule; Analisar os ideais do Parlamento limitado e eliminado Charles de Gaule; Descrever a revolução de 1848 na Europa; Analisar os ideais de Fernand Lessale sobre o socialismo no estado; Explicar o desmembramento do socialismo na concepção marxista; Comentar sobre o socialismo de Lenine e Staline na concepção marxista Conhecer os diversos socialismos. Analisar o princípio maioritário como aspecto fundamental da democracia liberal; Explicar o princípio do estado constitucional no seio do relativismo democrático Explicar o pensamento de Charles Renouvier em relação a liberdade do homem; Identificar os elementos fundamentais de Léon Bourgeois no meio social humano Conhecer o programa da democracia cristã; Diferenciar a primeira democracia cristã da segunda democracia cristã; Explicar a despolitização da democracia cristã; Descrever a democracia de inspiração cristã. Quem deve estudar este módulo? Este Módulo foi concebido para todos estudantes que queiram ser professores da disciplina de História, que estão a frequentar o curso de Licenciatura em Ensino de História, do Centro de Ensino a Distancia. Estendese a todos que queiram consolidar os seus conhecimentos sobre as Instituições Políticas Africanas. Como está estruturado este módulo Todos os módulos dos cursos produzidos pela Universidade Católica de Moçambique - Centro de Ensino a Distância encontram-se estruturados da seguinte maneira: Páginas introdutórias Um índice completo. Uma visão geral detalhada do curso / módulo, resumindo os aspectos-chave que você precisa conhecer para completar o estudo. Recomendamos vivamente que leia esta secção com atenção antes de começar o seu estudo. Conteúdo do curso / módulo O curso está estruturado em unidades. Cada unidade incluirá uma introdução, objectivos da unidade, conteúdo da unidade incluindo actividades de aprendizagem, um summary da unidade e uma ou mais actividades para auto- avaliação. Outros recursos Para quem esteja interessado em aprender mais, apresentamos uma lista de recursos adicionais para explorar. Estes recursos podem incluir livros, artigos ou sites na Internet. Tarefas de avaliação e/ou Auto-avaliação Tarefas de avaliação para este módulo encontram-se no final de cada unidade. Sempre que necessário, dão-se folhas individuais para desenvolver as tarefas, assim como instruções para as completar. Estes elementos encontram-se no final do módulo. Comentários e sugestões Esta é a sua oportunidade para nos dar sugestões e fazer comentários sobre a estrutura e o conteúdo do curso / módulo. Os seus comentários serão úteis para nos ajudar a avaliar e melhorar este curso / módulo. Ícones de actividade Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas margens das folhas. Estes ícones servem para identificar diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa, uma mudança de actividade, etc. Acerca dos ícones Pode ver o conjunto completo de ícones deste manual já a seguir, cada um com uma descrição do seu significado e da forma como nós interpretámos esse significado para representar as várias actividades ao longo deste curso / módulo. Habilidades de estudo Caro estudante, procure reservar no mínimo 2 (duas) horas de estudo por dia e use ao máximo o tempo disponível nos finais de semana. Lembre-te que é necessário elaborar um plano de estudo individual, que inclui, a data, o dia, a hora, o que estudar, como estudar e com quem estudar (sozinho, com colegas, outros). Lembre-te que o teu sucesso depende da tua entrega, tu és o responsável pela tua própria aprendizagem e cabe a ti planificar, organizar, gerir, controlar e avaliar o teu próprio progresso. Evite plágio. Precisa de apoio? Caro estudante: Os tutores têm por obrigação monitorar a sua aprendizagem, dai o estudante ter a oportunidade de interagir objectivamente com o tutor, usando para o efeito os mecanismos apresentados acima. Todos os tutores têm por obrigação facilitar a inteiração. Em caso de problemas específicos, ele deve ser o primeiro a ser contactado, numa fase posterior contacte o coordenador do curso e se o problema for da natureza geral, contacte a direcção do CED, pelo número 825018440. Os contactos só se podem efectuar nos dias úteis e nas horas normais de expediente. Tarefas (avaliação e auto-avaliação) O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e auto-avaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é importante que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues antes do período presencial. Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não cumprimento dos prazos de entrega, implica a não classificação do estudante Os trabalhos devem ser entregues ao CED e os mesmos devem ser dirigidos ao tutor/docentes. Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa, contudo os mesmos devem ser devidamente referenciados, respeitando os direitos do autor Avaliação Tu serás avaliado durante o estudo independente (80% do curso) e o período presencial (20%). A avaliação do estudante é regulamentada com base no chamado regulamento de avaliação. Os trabalhos de campo por ti desenvolvidos, durante o estudo individual, concorrem para os 25% do cálculo da média de frequência da cadeira. Os testes são realizados durante as sessões presenciais e concorrem para os 75% do cálculo da média de frequência da cadeira. Os exames são realizados no final da cadeira e durante as sessões presenciais, eles representam 60%, o que adicionado aos 40% da média de frequência, determinam a nota final com a qual o estudante conclui a cadeira. A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da cadeira. Nesta cadeira o estudante deverá realizar: realizar realizar 3 (três) trabalhos, 2 (dois) teste e 1 (um) exame. Algumas actividades praticas, relatórios e reflexões serão utilizadas como ferramentas de avaliação formativa. Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em consideração a apresentação,a coerência textual, o grau de cientificidade, a forma de conclusão dos assuntos, as recomendações, a identificação das referencias utilizadas, o respeito pelos direitos do autor, entre outros. Os objectivos e critérios de avaliação estão indicados no manual. consulteos. Unidade I Introdução ao Estudo das Instituições Politicas Africanas Introdução Dois tipos ou mais, de sociedades podem assemelhar-se num aspecto do sistema social total e diferir noutro. Por isso é importante comparar sociedades com referência a algum aspecto particular ou parte de todo sistema social, com referências ao sistema económico, político ou de parentesco. Isto é, a imensa diversidade de formas da sociedade humana deve ser primeiro reduzida a uma ordem comum de classificação. Ao completar esta unidade / lição, tu serás capaz de: Objectivos Definir a origem dos Estados Africanos (primitivos e Descrever as características comuns dos Estados Africanos; Caracterizar a estrutura de parentesco dos Estados Africanos. 1.1. Origem das Instituições Políticas Africanas Ao se classificar as sociedades humanas, encontramos dificuldades que não se registam em ciências como a Física ou Química. Dois tipos de sociedade podem assemelhar-se num aspecto do sistema social total e diferenciar-se noutro. Dai, torna-se necessário comparar as sociedades com referência a algum aspecto em particular ou parte de todo sistema social, com referência, por exemplo, ao sistema político, económico, de parentesco, etc. E como a disciplina em questão é história política, o presente texto fará uma abordagem da organização política de algumas sociedades africanas, sem perder de vista que em qualquer sistema social total todas instituições estão intimamente ligadas e são interdependentes. Ao estudarmos a organização política, lidaremos com a manutenção ou estabelecimento da ordem social num quadro territorial, pelo exercício organizado de autoridade coerciva através da possibilidade de utilização de força física. A ordem social é mantida pela punição dos que violarem as leis e pela supressão armada da revolta. Externamente o Estado esta preparado para usar a força armada contra outros Estados. Ao se tratar da organização política, está-se assim a tratar do Direito e da guerra. Considerando o Direito e dentro deste campo o aparelho da justiça repressiva, numa determinada comunidade, um indivíduo pode cometer um certo acto ou adoptar certo tipo de comportamento que constitui ataque ou ofensa contra comunidade. Este ofensor pode se sentenciado à morte, banido da comunidade ou sujeito a certa forma de expiação. E acções colectivas do tipo em que a comunidade julga e condena e infringe o castigo, podemos ver nessas acções a forma embrionária do direito criminal. Dentro de pequenas comunidades haverá pouca ou nenhuma necessidade de sanções penais. O bom comportamento pode resultar do hábito e condicionamento do indivíduo à educação que foi submetido. Ao procurar definir a estrutura política duma sociedade simples, temos que procurar uma comunidade territorial que esteja unida pelo primado do direito, por isso entende-se uma comunidade na qual o sentimento público se empenha ou na aplicação de sanções penais directas ou indirectas a qualquer dos seus próprios membros que ofendam por certas formas, ou na resolução das disputas e provisão de satisfação por injúrias dentro da própria comunidade. Outro aspecto é que há muito poucas sociedades humanas conhecidas em que não existe uma forma de guerra, e pelo menos uma boa parte da história do desenvolvimento político são de uma ou outra maneira história de guerras. Entre várias espécies de guerra, podemos identificar aquela que chamamos guerra de conquista e tem sido importante em África. E quando esta guerra é coroada de êxito, transforma o povo conquistador em dominador doutro, ficando ambos incorporados numa sociedade política mais ampla. Mas a instituição da guerra pode tomar uma forma diferente, de forma que a guerra entre comunidades é sempre uma possibilidade e acontece de vez em quando, embora nenhuma procure conquistar ou absorver outra a fim de aumentar sua comunidade política. Alguns politologos afirmam, que há uma tendência para concentrar demasiada atenção sobre o que se designa por “Estado Soberano”. Mas os Estados são meramente grupos territoriais dentro de um sistema político mais largo no qual as relações se definem pela guerra ou a possibilidade desta. Um outro aspecto é que a estrutura social de qualquer sociedade inclui uma certa diferenciação do papel social entre pessoas e entre classes de pessoas, isto é, o papel de um indivíduo e a parte que ele representa na vida social total. Nas sociedades mais simples, pouco mais há do que a diferenciação muito importante na base de sexo e idade e do reconhecimento não institucionalizado da chefia no ritual, na caça pesca, guerra, etc. A medida que a organização política se desenvolve verifica- se uma diferenciação crescente reactivamente a certas pessoas (chefes, reis, juízes, comandantes militares, etc) que desempenham papeis especiais na vida social. Cada uma destas pessoas desempenha ou ocupa um cargo (administrativo, judicial, legislativo, etc) e o detentor está revestido de autoridade e ao lugar estão ligados certos deveres, direitos e privilégios. Em África é muitas vezes difícil separar o lugar político da função ritual ou religiosa. Assim, nalgumas sociedades africanas pode dizer-se que o rei é o chefe executivo, legislador, juiz supremo, comandante do exército, sacerdote-chefe, etc. Mas, é erróneo pensar que ele combina um número de cargos distintos e separados. Há um único cargo, o do rei, que com os seus vários deveres e actividades, e os seus direitos, prerrogativas e privilégios fazem um todo unificado. Além do desenvolvimento do cargo político, temos que ter em conta as várias formas de desigualdade política. Um exemplo disso é a diferenciação com base no sexo e na idade: os homens geralmente participam muito mais do que as mulheres, não só na guerra, mas também na manutenção da ordem interna, e os homens mais velhos, em regra, tem mais autoridade do que os mais novos. Na literatura sobre as instituições políticas, existe ainda uma discussão acesa sobre a natureza e origem do Estado, que é geralmente representado como sendo uma entidade acima dos indivíduos que formam uma sociedade, tendo como um dos atributos a soberania, e que algumas vezes se tem por uma vontade ou como poder de emitir ordens. Não existe um Estado no sentido clássico do termo. O que existe é uma organização, isto é, um grupo de seres humanos ligados por um sistema complexo de relações. Dentro desta organização, diferentes indivíduos desempenham diferentes papéis, e alguns detêm um poder especial ou autoridade, como chefes ou anciãos capazes de dar ordens que serão obedecidas, como legisladores ou juízes e assim por diante. O poder do Estado é coisa que não existe. Existe na realidade, poderes de indivíduos (reis, magistrados, generais, chefes de partidos, etc). No entanto, neste texto, serão apresentados um conjunto de organizações políticas que podemos considerar como representativas de tipos comuns de sistemas políticos africanos. A maioria das formas que serão descritas é variante de um padrão de organização política encontrado entre sociedades vizinhas. Dai que uma análise aos sistemas aqui apresentados pode conduzir a generalizações válidas para os sistemas políticos que aqui não foram apresentados. 1.2. Características das Instituições Políticas Africanas Os sistemas políticos aqui descritos podem ser organizados em duas categorias: um grupo que consiste naquelas sociedades que têm autoridade centralizada, aparelho administrativo e instituiçõesjudiciais ─ em suma, que tem um governo ─ nas quais as distinções de riqueza, privilégio e status correspondem a distribuição de poder e autoridade. Este grupo compreende os Zulos, Ngwato, Bemba, Banyankole e Kede; outro grupo que consiste nas sociedades em que esta patente a falta de autoridade centralizada, aparelho administrativo e instituições judiciais construídas, em suma, que não tem um governo ─ e nas quais não existem divisões agudas de categoria, status ou riqueza. Este grupo compreende os Logoli, Tallensi e Nuer. Os que consideram que um Estado deve definir-se pela presença de instituições governamentais, consideram o primeiro grupo como Estados primitivos. Estes ocupam-se com a descrição organizativa governamental relatando por isso o status e classe do rei, papel dos funcionários administrativos, privilégios de determinadas categorias, diferenças da riqueza e poder, regulamentação dos impostos, divisão territorial, direito dos súbditos, etc. Os que consideram que o Estado define-se pela ausência de instituições governamentais consideram os Estados como estatais. Uma das diferenças relevantes entre os dois grupos (Estados primitivos e estatais) é o papel desempenhado pelo sistema de linhagem na estrutura política. Há que distinguir entre a série de relações ligando o indivíduo a outras pessoas e a unidades sociais particulares através da família bilateral e transitória, que se chama sistema de parentesco; e o sistema segmentário de grupos de descendência unilinear e permanente que se chama sistema de linhagem. Em ambos grupos de sociedade, o parentesco e os laços domésticos desempenham um papel importante na vida dos indivíduos mas a sua relação com o sistema político é de ordem secundária. Nos Estados primitivos é a organização administrativa, nos estatais é o sistema de linhagem segmentária que primariamente regula as relações políticas entre os segmentos territoriais. De notar ainda que, a unidade política nas sociedades com organização estatal é numericamente maior do que as que não têm organização estatal. Mas o volume da população não deve confundir-se com a densidade da população, pode até haver uma certa relação entre o grau de desenvolvimento político e o volume de população, mas seria incorrecto supor que as instituições governamentais se encontrem naquelas sociedades com maior densidade. A densidade e a distribuição da população estão claramente relacionadas com condições ecológicas que também afectam todo modo de vida, determinam os valores dominantes dos povos e influenciam fortemente as suas organizações sociais incluindo seus sistemas políticos. Os privilégios económicos, tais como direitos de exigir impostos, tributo e trabalho, são a principal recompensa do poder político e um meio essencial de mantê-lo nos sistemas políticos primitivos. Mas não devemos esquecer que aqueles que tiram maior benefício económico do cargo político têm as maiores responsabilidades administrativas judiciais e religiosas. Nas sociedades acima descritas, o sistema político se apresenta dentro duma moldura territorial, mas com funções diferentes nos dois tipos de organização política. Esta diferença se deve à predominância de um aparelho administrativo e judicial num tipo de sistema e sua ausência noutro. No Estado primitivo a unidade administrativa é uma unidade territorial, os direitos e as obrigações políticas são territorialmente delimitadas. Um chefe é a cabeça administrativa e judicial de uma dada divisão territorial, investido muitas vezes de controle definitivo económico e legal sobre toda a terra dentro dos seus limites e todos que vivem dentro dele são seus súbditos. Já no estatal não existem unidades territoriais definidas por um sistema administrativo, mas as unidades territoriais são comunidades locais cuja extensão corresponde à fronteira de uma particular teia de laços de linhagem e de elos de cooperação directa. O cargo político não acarreta consigo direitos sobre uma faixa de território definida e os seus habitantes. A categoria de membro da comunidade local e os direitos e deveres que acompanham adquire-se em regra por meio de laços genealógicos reais ou fictícios. O princípio de linhagem toma o lugar de subordinação política e as interrelações dos segmentos territoriais estão directamente correlacionados com as interrelações dos segmentos de linhagem. As distinções que estão sendo apontadas entre as duas formas de organização tornam-se muito evidentes quanto ao seu ajustamento às normas dos governos coloniais. A maioria das sociedades africanas foi conquistada ou submeteu-se à lei europeia. Nos Estados primitivos, o chefe principal é proibido, por pressão do governo colonial, de usar de força organizada comandada por ele e debaixo da sua responsabilidade. Isto resultou por toda a parte na diminuição da sua autoridade e aumentou o poder e independência dos seus subordinados. Ele não governa mais por direito próprio mas como agente do governo colonial. A estrutura piramidal do Estado é mantida colocando-se o chefe no seu topo. Perde apoio do seu povo porque o padrão de direitos e deveres recíprocos que o ligavam a ele está destruído. Alternativamente pode ser capaz de salvaguardar o seu status anterior, em certa medida, dirigindo abertamente ou a coberto, a oposição que a sua gente inevitavelmente sente em face do mando estrangeiro. Muitas vezes fica na posição de ter que conciliar os seus papéis contraditórios como representantes do seu povo contra o governo colónia mas também contra seu povo. Já nas estatais a administração europeia tem tido efeito oposto. O governo colonial não pode administrar através de agregados de indivíduos compostos por segmentos políticos, mas tem que recrutar agentes administrativos. Para este fim, faz o uso de quaisquer pessoas que possam ser assimiladas à noção estereotipada de um chefe africano. Estes agentes têm agora pela primeira vez o apoio da força por detrás da sua autoridade. Existe pela primeira vez uma autoridade principal exigindo obediência em virtude da força superior que lhe possibilita estabelecer tribunais de justiça em substituição de auto defesa. Em ambos tipos de organização política os governos coloniais podiam impor sua autoridade mas em nenhuma eram capazes de estabelecer laços morais com o povo sujeito. No sistema original indígena a força é utilizada por um chefe com o consenso dos seus súbditos para prosseguir o bem comum. Um governante africano não é para o seu povo apenas uma pessoa que pode exercer a sua vontade sobre eles. Ele é o eixo das suas relações políticas, o símbolo da sua unidade e exclusividade e a encarnação dos seus valores essenciais. Em suma, é mais do que um simples governante. Os membros de uma sociedade africana sentem a sua unidade e apercebem-se dos seus interesses comuns através de símbolos, e é a sua adesão a estes símbolos que mais do que qualquer outra coisa dá à sua sociedade coesão e continuidade. Na forma de mitos, ficções, dogmas, rituais, estes símbolos representam a unidade e exclusividade dos grupos que os respeitam. São considerados não como meros símbolos mas como valores finais em si. Além disso, estes símbolos sagrados que reflectem o sistema social, rodeiam-no de valores místicos que evocam a aceitação da ordem social que vai para além da obediência exarada pela sanção da força. Os sistemas políticos da maioria destes povos apresentam semelhanças impressionantes, particularmente na África Meridional e Central. A primeira vista, em cada caso, deparamo-nos com uma organização tribal que é uma derivação de um grupo de linhagem mais pequeno, através duma separação da sua raiz em busca de independência e de um novo território, ou porque se viu disperso devido ao combate de um inimigo. A maioria dos grupos étnicos (tribos) tem uma históriacurta de ocupação do seu habitat actual. Por isso a estrutura de parentesco do povo emigrante pode reconhecer-se como a moldura do seu sistema político. A autoridade baseia-se quase invariavelmente na descendência, seja dentro da família, da aldeia, do distrito ou da nação e o chefe da tribo concentra as funções executivas, rituais e judiciais de acordo com o modelo de chefia de cada unidade de parentesco. A hierarquia da sociedade bantu permite apenas um tipo de autoridade, uma base de poder, e uma série de atributos nos seus chefes na maioria das tribos que já foram descritas. Além desta relação pessoal estabelecida pela tradição entre o súbdito bantu e o seu chefe, existe outro aspecto da organização política dependente de factos de parentesco, emocionais, jurídicos ou rituais. O poder político e suas prerrogativas tendem a concentrar-se nas mãos dos descendentes da linhagem do grupo original de que o chefe é um representante vivo, e é muitas áreas a coesão tribal parece depender muito amplamente da predominância desta linha governante, quer seja referente ao primeiro povo bantu a ocupar um território em particular, quer tivesse conquistado os primeiros habitantes e subsequentemente construído um novo Estado. Encontramos ainda tribos designadas segundo o nome do chefe original da comunidade dominante, e outros chamados segundo o seu clã. Os descendentes do clã do primeiro chefe, podem formar uma casta dominante, e o número total de clãs na tribo pode ordenar-se por ordem de precedência baseada na tradição da emigração original para a área ou qualquer outro grau de relação com o grupo descendente do chefe. O parente próximo do chefe pode desempenhar um papel definitivo na organização política, pode reivindicar direitos a chefiados territoriais ou aldeias de membro de conselhos tribais ou corpos conselheiros menores. Estes são os aspectos comuns da organização política bantu. A posição do chefe como cabeça de uma comunidade coesa por laços reais ou fictícios, de parentesco e como sacerdote de um culto ancestral, de uma estrutura política baseada no domínio de uma linha de família dirigente ou clã. A examinar um caso particular, há um número de factores condicionantes diferentes que parece responder pelas variações que possam existir na estrutura política: a) O período de tempo que a tribo habitou no presente território; b) O tipo de emigração, se por penetração pacífica, expulsão de outras unidades ou a sua amalgamação; c) A importância colocada nos princípios diferentes de agrupamento social como descendência, idade, sexo ou laços locais pelos quais a tribo pode ser integrada e a incidência de determinada autoridade; d) As bases económicas das actividades do povo que afectam o seu grau de dispersão, a forma de chefia requerida e os valores económicos associados com as prerrogativas políticas; e) O tipo de administração estrangeira a que a tribo está sujeita e os elementos europeus que afectam o seu desenvolvimento político, isto é, variações na política so sistema administrativo, e as tentativas feitas para criar novas instituições políticas para os nativos. Sumário Ao procurar definir a estrutura política duma sociedade simples, temos que procurar uma comunidade territorial que esteja unida pelo primado do direito, por isso entende-se uma comunidade na qual o sentimento público se empenha ou na aplicação de sanções penais directas ou indirectas a qualquer dos seus próprios membros que ofendam por certas formas. Estados são meramente grupos territoriais dentro de um sistema político mais largo no qual as reacções se definem pela guerra ou a possibilidade desta. Exercícios Tendo em conta o módulo responda: 1. No respeitante a estrutura social, que diferenças podemos identificar entre sociedade simples e organização política complexa? 2. Os sistemas políticos podem ser organizados em duas categorias. Descreva- as. 3. Diferentemente dos aspectos de semelhanças nas instituições políticas africanas, existem variáveis de diferenciação. Identifique e explique dois. 4. Caracterize as instituições políticas africanas. Auto-avaliação Resolva os exercícios indicados. Faça uma breve síntese da unidade em estudo. Unidade II O Reino dos Zulus na África do Sul Introdução A nação zulo pode ser definida como um grupo de pessoas (membros de algumas centenas de clã) devendo obediência e lealdade a um chefe comum (rei) e ocupando um território definido. Devido ao seu carácter e estratégia militar, Shaka saiu vitorioso das várias lutas tribais, tornando-se em 10 anos senhor da terra zulo e organizando uma nação com organização política específica. Ao completar esta unidade / lição, você será capaz de: Objectivos Descrever o status e o poder político do rei zulo perante o Estado; Estabelecer o ponto de situação do povo, seus chefes e das tribos face a nação; Descrever o período da administração europeia na terra zulo; 2.1. Períodos da História Zulu A organização política dos zulus divide-se em dois períodos da história zulu: sob o domínio do rei Mpande e sob a administração europeia. A família Nguni, do povo de expressão bantu que mais tarde formou a nação zulu, emigrou para o sudoeste de África por volta de meados do séc. XV. Eram pastores e praticavam culturas rotativas. Viviam em casais dispersos ocupados por agnates masculinos e suas famílias. Eles estavam unidos sob o domínio de um chefe, o herdeiro da sua linha sénior, de uma tribo. Uma tribo estava dividida em secções, sob a direcção dos irmãos do chefe e em consequência de uma disputa, uma secção podia emigrar e estabelecer-se como um clã e tribo independente. As incursões por causa do gado eram frequentes, mas não havia guerras de conquista. Por volta de 1775, mudaram os móbeis da guerra e certas tribos passaram a conquistar seus vizinhos surgindo pequenos reinos em conflito. Chaka, cabeça da tribo zulu, saiu vitorioso dessa guerra devido ao seu carácter e estratégia militar, tornando-se em 10 anos senhor do que é hoje a terra dos Zulu e Natal, andando as suas tropas em campanha muito para além das suas fronteiras. De todas tribos que sujeitou, organizou uma nação. O seu principal interesse estava no exército e em todo tempo fazia dos seus homens guerreiros. Desenvolveu a ideia de regimentos formados por homens da mesma idade e aquartelava-os, a maior parte do tempo, em grandes quartéis construídos em diferentes partes do país onde se treinavam para a guerra, pastoreavam o gado do rei e trabalhavam nos campos. Os homens estavam proibidos de se casarem até obterem autorização do rei para os mancebos de um regimento se unirem com raparigas de um certo regimento de idade. O governo de Chaka era tirano e todos os anos fazia uma campanha; por isso quando em 1828 foi assassinado pelo seu irmão Dingane, o povo aceitou este com júbilo. No tempo de Shaka, os comerciantes ingleses fixaram-se em Porto Natal em termos de amizade com os Zulu. Quando os Boers entram em Natal, derrotam os Zulu em 1838 e confinam seu território para o norte do rio Tugela. O governo de Dingane também foi tirano e o povo volta-se para seu irmão Mpande. Dingane conspirou para matar Mpande, que fugiu com os seus bens para junto dos Boers no Natal. Daí lançou o ataque, destronou Dingane e tornou-se rei. Os Zulus entraram num período de relativa paz, pois Mpande apenas esporadicamente fazia incursões contra os Swazi e Thonga. Entretanto, durante seu reinado dois dos seus filhos lutaram pela sucessão saindo vencedor Cetshwayo que se tornou rei em 1872 quando Mpande morreu. Em 1880, os ingleses derrotaram os Zulo, depuseram Cetshwayo e dividiram a nação em treze regulados. Três anos mais tarde tentaram repor Cetshwayo, mas por razões várias rebentaram a guerra civilentre os Usuthu (a secção real da nação e das tribos governadas sob o rei, pela casa zulu Mandlakazi que estava unida à casa real do avô de Mpande). O rei morreu mas o seu filho, Dinuzulu, com ajuda boer derrotou os rebeldes que fugiram para os ingleses. Em 1887 os britânicos estabeleceram uma magistratura na terra zulu e repuseram os Mandlakazi nas suas terras. Dinuzulu resistiu mas foi derrotado e exilado. Os Zulu estavam divididos em muitas tribos e a administração branca foi solidamente instituida. Dinuzulu foi mais tarde nomeado chefe de uma pequena tribo, os usuthu, e depois da rebelião dos Bambada em 1906 enviado para o exílio. Lá morreu e sucedeu-lhe seu irmão Germano, como regente. O governo passou de Inglaterra para Natal em 1910 para a União da África do Sul. 2.2. O rei zulu e o Estado Certos grupos de parentesco persistiram apesar de guerras devastadoras e da grande mudança na organização política nos reinos de Shaka e Dingane. Os clãs desapareceram como unidades e os membros de um único clã podiam estar largamente dispersos pela terra Zulu. Os grupos de parentesco importantes, que eram a base da organização social, ainda eram constituídos pelos habitantes de lugares separados. A cabeça de um casal era um homem sénior de um grupo de descendência. Próximo podiam encontrar-se casais de homens do mesmo clã, todos eles reconhecendo no herdeiro da sua linha sénior como seu chefe. Os estrangeiros podiam juntar- se a um homem importante, como seus servidores ou dependentes e eram absorvidos com os seus parentes no seu grupo de parentesco como “quase-parentes”. Conservavam seu nome clânico, mas não podiam casar dentro da linhagem do seu chefe, embora pudessem casar no seu clã. Como referimos acima, os homens serviam nos quartéis militares do rei que os mantinha fora de casa quase o ano todo. Nos casais, os homens mais velhos e os rapazes pastoreavam o gado e as mulheres trabalhavam nos campos. Estes campos estavam ao longo das cordilheiras e das margens dos rios. Os vales baixos, desabitados por causa das febres constituíam as pastagens de Inverno e os lugares de caça. A comunicação entre as diferentes partes da terra dos Zulu era bastante fácil. Os homens vinham de todas partes para os quartéis do rei e o casamento entre os membros de casais bastante afastados era vulgar. A nação Zulu era constituída por membros de algumas centenas de clãs, unidos pela sua lealdade ao rei. As pessoas pertenciam ao rei e ele por isso pagava a multa em caso de assalto ou assassino. A nação Zulu pode, portanto, ser definida como um grupo de pessoas devendo obediência a um chefe comum (o rei) e ocupando um território definido. Eles uniram-se ao rei para atacarem ou se defenderem de grupos estrangeiros. O rei exercia ainda autoridade judicial, administrativa e legislativa sobre seu povo, com poder para fazer cumprir as suas decisões. Realizava ainda cerimónias religiosas e actos mágicos em nome da nação. O rei era saudado com cumprimentos cerimoniosos e título de respeito que aumentavam seu prestígio. Ele simbolizava a nação e como tal era tratado. Mas cerimónias dos primeiros frutos e nos ritos de guerra o rei era fortalecido e limpo em nome da nação. Possuía certos objectos herdados dos seus antepassados, e o bem-estar do país considerava-se estar dependente destes. Esta posição cerimonial do rei era apoiada pelos seus espíritos ancestrais. Eram tidos como protectores de toda terra Zulu, e no interesse da nação eram a eles que o rei fazia apelo, aquando da seca, guerras, plantações ou colheitas. Em suma, o rei tinha a seu cargo a responsabilidade de toda magia nacional. Shaka expulsou todos manda-chuvas do reino, dizendo que só ele podia controlar os céus. O rei possuía importantes medicamentos terapêuticos com os quais tratava todas suas pessoas que estivessem doentes. Todos curandeiros habilidosos tinham que ensinar ao rei a sua cura. Quando a pessoa morria e um indivíduo era acusado de a ter morto por feitiçaria, nenhuma sentença podia ser executada sem que os médicos feiticeiros do rei confirmassem o veredicto. Estes deveres religiosos e mágicos do rei, ao celebrar aquilo que era assistido por mágicos hereditários especiais, estava investido na realeza. Embora um rei pudesse ser assassinado, o seu sucessor reassumia estes deveres, e os espíritos de tiranos tornavam-se numa fonte de bem-estar para o povo que os tinha morto. As cerimónias eram principalmente celebradas com o fim de fortalecer os zulus reactivamente a outros povos, que era simbolicamente atacado por eles. Foi esta orientação militar da cultura zulu sob a hegemonia do rei que largamente unificou seu povo. Os valores dominantes da vida zulo eram os do guerreiro, e eram satisfeitos pelo serviço prestado nos quartéis do rei e nas suas guerras. Os regimentos pertenciam só ao rei. Viviam em aquartelamentos que se concentravam em torno da capital e os chefes não tinham autoridade sobre os regimentos e juntavam as suas próprias gente em divisões territoriais e não de idade. A nação também estava dividida para fins militares da mesma maneira que estava uma tribo, porque o rei ligava certos grupos de tribos a certos casais reais. A maioria dos casais que eram “cabeças” ficava na área do rei. Algumas eram também quartéis onde estavam instalados regimentos particulares. A divisão em “cabeças” não era puramente territorial, pois, assim que um homem se agregava a uma “cabeça” não podia mudar esta ligação mesmo que mudasse para uma área tribal ligada a outra “cabeça” diferente. Os seus filhos herdavam a sua ligação e quando chegava a altura de se alistarem como soldados, dirigiam-se a “cabeça” a que seu pai pertencia. Esta centralização dos regimentos na área do rei, dava-lhe uma posição na vida zulo inteiramente diferente de qualquer dos seus chefes. Mas embora isto trouxesse os regimentos sob o seu controle, tirava-lhes os seus adeptos pessoais, visto que todos homens estavam ligados a um chefe. O rei era também o tribunal supremo da nação sendo chamado para resolver os casos difíceis. Havia sempre na sua residência alguns indunas que ouviam os casos e davam o veredicto em nome do rei. A maioria destes indunas eram chefes governantes de áreas próprias, outros eram filhos, irmãos ou tios do rei, e havia ainda plebeus elevados pelo rei pelo seu saber e conhecimento da lei. Dois destes indunas eram mais importantes do que os outros: um era o comandante do exército e era um chefe ou príncipe; outro era o “primeiro ministro” (grande induna) e tinha a voz mais decisiva na discussão dos negócios do Estado. Ao rei competia fazer respeitar o direito costumeiro. Os Zulu acreditavam que a prosperidade do país dependia do facto do reiter conselheiros fortes e sabedores prontos a criticar o seu próprio rei. O rei devia apresentar os problemas para serem discutidos no conselho devia falar apenas no fim para que ninguém tivesse receio de expressar seu ponto de vista. Encerrava o debate, e se era prudente adoptava a opinião da maioria. Do ponto de vista dos súbditos, pode dizer-se que a principal obrigação que eles tinham para com o rei era o serviço militar, incluindo a prestação de trabalho. Era ainda costume o rei dar-lhes presentes de cereal, cerveja, gado e algumas raparigas. Como também recebia a maior parte do gado e das mulheres capturadas na guerra e indemnização por certas ofensas, tornando-se facilmente o homem mais rico da nação. Em troca alimentava e ajudava sua gente. Tinha a seu cargo os regimentos e devia dar-lhes escudos. Em tempo de fome tinha obrigação de ajudar seu povo e em qualquer altura à todos que se encontrassem em dificuldade. Proporcionava-lhes um clima de justiça, protegia os seus interesses e era através dele que os súbditos confiavam satisfazer as suas ambições no campo de batalha e no fórum. 2.3. Status ePoder Político Todos os membros da família de Shaka gozavam de um status mais elevado em consequência das suas vitórias. Nem Shaka nem Dingane tinham quaisquer filhos e foram os descendentes de Mpande que vieram a formar a família real. Qualquer filho dessas linhas e os filhos das suas filhas e mulheres adoptadas eram referidos por abantwana (filhos, mas equivalente a príncipes e princesas). Formavam uma casta superior ficando em status mesmo acima dos chefes. Alguns governavam como chefes de tribos. Qualquer membro da família real Zulu tinha que ser saudado cerimoniosamente pelos plebeus, incluindo os chefes. Qualquer príncipe podia também adquirir alguns títulos honoríficos do rei na ausência deste. Este status, trouxe a alguns príncipes poder político. Os irmãos de Shaka tornaram-se reis nas áreas onde se fixaram. Mas o rei era sempre a cabeça por descendência da poderosa linhagem aristocrática Zulu, que era respeitada por todos Zulu, e a sua posição na organização nacional fortalecida pelos seus parentes próximos que governavam nas tribos dispersas pelas terras zulu. O casamento entre a família real e as famílias dos chefes estabeleciam laços idênticos. O rei costumava casar uma irmã, uma filha, ou qualquer rapariga que lhe pertencesse, com um chefe e o filho desta devia ser o herdeiro. Os príncipes deviam chamar a si sequazes para além dos que lhes eram dados pelo rei. Os príncipes dentro da nação eram uma ameaça para o rei, especialmente se esta não era bom governante. Eles estavam prontos para tecer intrigas contra ele e tirar vantagens da insatisfação do povo. Assim, se por um lado o rei governa com o apoio dos seus irmãos e tios, por outro odeias os mesmos irmãos e tios com aspirações ao trono. 2.4. As Tribos dentro da Nação A terra dos zulus estava dividida num grande número de tribos de tamanhos variados. Segundo a teoria zulu, os chefes de todas tribos eram elevados por um ou por outro dos reis. Isto é, o poder estava sujeito ao rei e que no tempo em que a nação zulu foi criada e consolidada, Shaka ou os irmãos que lhes sucederam transformaram os seus antepassados em chefes, ou autorizaram-nos a continuar seu mandato numa área particular. Os reis por vezes também recompensavam os seus guarda-costas, os soldados valentes e conselheiros eminentes, colocando-os a frente de distritos. Desde os primeiros tempos que os funcionários políticos passavam os postos aos filhos, e com os reis manteve-se essa regra. Um induna ou chefe tinha a sua posição por lhe ter sido confiada pelo rei; mas com a morte do induna, era o seu herdeiro, a não ser que fosse irremediavelmente incompetente, que devia suceder-lhe. E na falta de herdeiro, o rei devia nomear um parente próximo. Os chefes tinham certos poderes delegados neles pelo rei. Os seus deveres mais importantes eram judiciais e administrativos. Embora em teoria todas as multas por injúrias corporais fossem para o rei, eram efectivamente os chefes a guardá-las. Porém, periodicamente enviavam largos rebanhos de gado de presente ao rei. Eles levavam ao rei os casos difíceis ou que envolvessem importantes patrimónios. Nas suas decisões eram coagidos a seguir as leis feitas pelo rei e por meio delas faziam apelos junto do seu tribunal. Tinham poder para fazer executar as sentenças, mas nenhum poder sobre a vida ou morte. O rei comunicava com seus chefes por meio de mensageiros. Fingir ser mensageiro de um rei era punível com a morte. Em caso de necessidade, os chefes passavam suas ordens para os seus indunas à frente de bairros e estes informavam as cabeças dos grupos de parentesco e depois dos funcionários políticos imediatos. Os chefes, como o rei, recebiam presentes de cereais e gado, mas não recebiam um tributo regular. Podiam chamar seus súbditos para trabalhar no campo, construírem seus casais, prender malfeitores, caçar, etc. Por sua vez, esperava-se que estes trabalhadores fossem recompensados com alimentos e os seus que estivessem em más condições fossem ajudados. O rei devia ainda escutar um conselho dado pelos seus homens importantes. A autoridade do rei exercia-se através dos chefes, seus representantes em vários distritos. Governavam através dos seus irmãos e indunas de distritos mais pequenos. A organização política zulu pode ser vista como uma autoridade delegada em grupos cada vez mais pequenos e com poder executivo decrescente. Em teoria a vontade do rei era quase absoluta. No fim estavam as cabeças de grupos de parentesco que podiam emitir ordens e arbitrar nas disputas dentro dos seus grupos, mas que não podiam obrigar a execução das suas decisões, excepto no tocante a mulheres e menores. A medida que os grupos se tornavam menores, os laços da comunidade e do parentesco eram fortalecidos, e como a força diminuía com uma sanção, outras sanções sociais aumentavam de importância. A dependência dos homens nos seus parentes seniores em matéria religiosa e económica, bem como em casos de necessidade ou aflição, era forte. Mesmo nos quartéis eles compartilhavam as tendas dos seus parentes e esperavam deles alimentos e apoio nas disputas. Além dos traços de sentimento, casal e linhagem, as cabeças exerciam autoridade por causa do seu status de parentesco e da sua importância na vida económica e social dos seus inferiores. A nação era uma federação de tribos cujas identidades separadas eram simbolizadas pelos seus chefes. As tribos eram autónomas dentro da organização nacional, pois em certas ocasiões, os homens da tribo apoiavam os seus chefes nas disputas com o rei. As tribos eram divididas em secções ligadas aos casais do chefe, seus irmãos e seus tios. Os aderentes de cada um destes casais eram muito ciosos do prestígio do seu príncipe e estavam imbuídos de uma lealdade local para com ele e sentiam-se de igual forma contra os aderentes de outro príncipe. Antes e depois da morte de um chefe, estes grupos lutavam entre si afim de o seu príncipe ser nomeado herdeiro. Os grupos opostos dentro da nação estavam unidos pelo serviço comum dos seus chefes prestado no conselho do grupo maior de que eles são parte. A administração corria em linhas separadas do rei para um chefe particular, um induna. Todas estas linhagens se entrelaçavam com o sistema do conselho. Embora as cabeças do grupo fossem a parte principal do que havia de burocracia na simples organização social zulu, as suas funções como burocratas e como cabeças de grupo não eram inteiramente idênticas. Como administradores, eles velavam pelos interesses do seu povo e governavam-no segundo as ordens dos seus superiores, usando também do apoio da gente nas suas lutas pelo poder administrativo. Tanto eles como os funcionários de um tribunal eram o elo entre um governante e os seus súbditos, mas frequentemente tendiam a tornar-se uma barreira, entre estes pois tinham inveja dos seus direitos, ressentiam-se da acumulação dos seus privilégios e algumas vezes agiam com independência do governante. 2.5. Sanções sobre a autoridade e a estabilidade do Estado O rei era obrigados a seguir os costumes e obedecer ao seu conselho. O monarca zulu raras vezes convocava reuniões plenárias da nação para discutir. Consultava os seus desejos através dos chefes. O povo não podia criticar o rei porque partia-se do princípio que o rei era justo e generoso, os príncipes e os chefes eram educados e tinham a consciência disso na tradição da boa administração. Era necessário um longo período de sofrimento antes que o povo se voltasse contra os seus governantes. Dizia-se que o rei e chefes tinham muitos espiões e era difícil organizar uma resistência armada contra o rei. O povo dependia dos oficiais políticos mais próximos para dirigir um movimento de oposição contra um governante opressor. Os Zulu não tinham outra ideia de organização política que não fosse a chefatura hereditária e oseu estádio de desenvolvimento social não conduzia ao estabelecimento de novos tipos de regime. A sua única reacção a um mau governo era a deposição do tirano e colocação de outrem no seu lugar com poderes idênticos, embora os indivíduos pudessem fugir da terra zulu para a protecção de outras nações. Por conseguinte, a política do rei era seguir qualquer um que ameaçasse ser capaz de lhe tirar o lugar. Ele defrontava-se com rivais e não com revolucionários. Os reis matavam todos irmãos cuja rivalidade temesse. O rei tinha assim que tratar todos irmãos com cuidado de modo a não criarem sentimentos de desafecto em relação a ele. Dentro das tribos os chefes detinham o poder em condições similares. Podiam usar a força armada contra súbditos desobedientes ou rebeldes embora tivessem de informar ao rei do seu procedimento. Mas os súbditos também podiam queixar-se ao rei se estivessem sendo mal governados e o chefe podia ser trazido ao tribunal do rei. A má administração por parte de um chefe fortalecia os poderes dos seus irmãos dentro da tribo e ao menos que o rei interviesse, podiam tomar o poder. Os Zulu consideram que um chefe deve ser liberal e generoso como seu povo e escutar as suas atribulações, pois é ele que o suporta na guerra. Os zulus tinham lealdade para com os seus políticos. Enquanto essa lealdade não entrasse em conflito, se o rei, chefe ou induna abusassem do seu poder, o seu povo daria suporte a uma das suas outras cabeças políticas contra ele, e nas suas intrigas pelo poder as cabeças políticas estavam prontas a tirar partido da situação. Assim, o conflito potencial desta lealdade era um teste poderoso para a má administração e dava ao povo um certo poder de controlar os seus dirigentes. 2.6. O Povo e os seus chefes A acção destas forças dependia do facto da liderança política ser pessoal. Em teoria, qualquer um podia contactar com seus superiores através dos seus cortesãos embora pudesse levar dias. Um chefe, e mesmo o rei, devia tratar com seu povo directamente e não delegar tal dever a alguém. Os chefes e os indunas conheciam a maioria dos seus súbditos. Se chegasse a capital um estrangeiro, fazia-se sobre ele todas perguntas. O chefe assistia aos casamentos do seu povo e enviava suas condolências ou visitava-os se morresse um parente. Esta intimidade entre o chefe e o seu povo tornava-se possível porque o chefe era tratado como o pai do seu povo. Embora os cortesãos tivessem um conhecimento maior dos negócios do que os provinciais, todos zulus tinham a mesma educação e viviam da mesma maneira. Qualquer deles podiam participar no conselho do chefe ou assistir ao julgamento de um caso. A riqueza aproximava mais um chefe do seu povo e nunca devia servir para o afastar porque sob o condicionalismo da vida zulu, a riqueza não dava a um homem oportunidade de viver num nível superior ao dos seus súbditos. O chefe podia ter mais mulheres e casais maiores, mas não podia rodear-se de luxo. A riqueza sob a forma de celeiros e grandes rebanhos de gado, dava a um homem poder apenas para aumentar o número dos seus dependentes e para dominar muitos inferiores. O chefe tinha assim que ser rico de forma a poder sustentar seus dependentes. Por outro lado, a riqueza de um plebeu atraía dependentes e dava ao homem rico um status político. Contudo, as maneiras de um plebeu adquirir fortuna não eram muitas: podia enriquecer praticando artes mágicas, ou ser recompensado pelo rei ou pelo chefe por algum feito, ou ainda pelo saque na guerra. Um aspecto notável a organização política zulo através da história zulo, é a criação de novos grupos à medida que as pessoas se moviam, fixavam e aumentavam, e as cabeças de todos estes grupos eram funcionários políticos menores que podiam com o tempo ganhar predominância. Uma vez que a liderança era pessoal, estes grupos não eram meramente absorvidos pelos grupos locais existentes. Os seus chefes tornavam-se chefes dentro da organização. Havia assim, uma criação constante de novos funcionários, que com o levantamento da categoria dos guerreiros valorosos e homens sabedores, permitiam um grau elevado de mobilidade social. Qualquer homem, independentemente da sua categoria pelo nascimento, podia tornar-se politicamente importante se tivesse habilidade para isso. 2.7. O Período da Administração Europeia Entre 1887 e 1888, o governo britânico tomou finalmente conta do governo da terra Zulu, pese embora a oposição armada de Dinuzulu. E consolidou-se dentro de um curto espaço de tempo fazendo mudar radicalmente a vida zulu com o desenvolvimento de novas actividades e necessidades como missões, escolas, armazéns, administração governamental britânica, etc. A organização militar foi quebrada e a paz estabelecida. A adopção da charrua colocou o trabalho agrícola nas mãos dos homens, e eles deixaram suas terras para ir trabalhar com os europeus em Durban, Johanesburgo ou qualquer outra parte. O dinheiro passa a ser um padrão comum de valores. O culto ancestral e muitas das antigas cerimónias caem em desuso. A terra zulu foi dividida num número magistral de distritos que por sua vez se dividem em tribos sob a direcção de chefes aos quais se garante uma autoridade judicial limitada e que são chamados a colaborar com o governo nos assuntos administrativos. Dentro do distrito, o magistrado torna-se o funcionário político e judicial superior e é o representante do governo. O seu tribunal aplica a lei europeia e é um tribunal de primeira instância e de apelo dos chefes em casos decididos entre os nativos segundo o direito zulu. Ele coopera com outros departamentos do governo e com os chefes e os seus indunas. As pessoas passam recorrer ao magistrado para as suas questões e problemas. A magistratura acaba assim por representar muitos dos novos valores e crenças que passam a actuar sobre o comportamento zulo. Porém, os zulos têm uma atitude para com o governo de desconfiança e hostilidade, atribuindo- lhes a origem dos novos conflitos da comunidade; apontam leis que consideram opressivas; encaram as medidas que o governo toma em função dos seus interesses como tendo a intenção de desapossar da terra e do gado, e incitam como argumento a presença dos brancos nas terras zulu no passado e o que eles consideram como uma série de promessas que lhes foram feitas por aqueles e jamais cumpridas. Além disso, muitas dessas medidas colidem com seus prazeres, crenças e modos de vida. Assim, enquanto o governo exige que os chefes apoiem suas medidas, o povo espera que seus chefes se oponham a elas, e normalmente fazem. A imposição da administração britânica e o desenvolvimento de novas actividades diminuiu radicalmente o poder dos chefes e ele passa a estar subordinado ao governo. Já não pode compelir, embora lance impostos e recrute tropas. Perdeu a sua enorme riqueza e muitas vezes usa o que tem em seu proveito e não no interesse dos seus súbditos. Acabou sendo suplantado pelos novos conhecimentos por muito dos seus súbditos. Os homens agora têm menos tempo para se dedicar aos interesses do seu chefe e se este tentar explorar ou oprimir um homem, este último pode recorrer a magistrado que lhe protegerá. Contudo, o chefe ainda ocupa uma posição vital na vida do povo. Não só os conduz na sua oposição ao governo, como também tem para eles um valor que o magistrado não pode ter. Os chefes e especialmente o rei simbolizam os valores zulus. O chefe está ligado a muitos por laços de parentesco e qualquer homem pode tornar-se seu parente por casamento. Enfim, a barreira social entre brancos e negros não pode ser ultrapassada. Sumário A organização política zulu teve vários momentos, mas a velha organização conservou sempre seus valores apesar das mudanças. A circulação da riqueza dos governantes era necessária de molde a permitir-lhes manter seu relacionamento como povo. Com a penetração britânica, a organização política passou a ser composta por funcionários brancos e negros com posições diferentes na vida do povo. A oposição entre os dois grupos não está equilibrada, uma vez que há um domínio do governo europeu, contra o qual a única reacção dos zulus é aceitação ou desobediência passiva. Exercícios 1. Em que consistia o papel do rei como tribunal supremo? 2. Descreva de forma resumida a organização administrativa das tribos dentro da nação. 3. Com a implantação da administração britânica na terra zulu, a actividade do chefe foi redefinida. Identifique algumas das novas actividades do chefe zulu. Auto-avaliação Resolva os exercícios indicados. Faça uma breve síntese da unidade em estudo. Unidade III A Organização Politica dos Ngwato Introdução Os habitantes do protectorado da Bechuanalândia encontram-se politicamente divididos em várias tribos, sendo os Ngwato a maioria e dominantes sobre outras tribos do protectorado. Para fins administrativos encontravam-se distribuídos em aldeias com base na conveniência geográfica e por razões étnicas. Ao completar esta unidade / lição, você será capaz de: Objectivos Analisar as instituições politica dos Ngwato; Comparar o sistema administrativo antes e após a ocupação europeia; Identificar os direitos, responsabilidades e autoridade das chefatura. 3.1. A Composição Étnica e Territorial dos Ngwato A maioria dos habitantes de Bechuanalândia pertence ao grupo dos Tswana (povo de expressão banto) e estavam politicamente divididos em oito tribos separadas, cada uma com nome próprio ocupando um espaço e sujeitos a administração britânica. Destas tribos, os Ngwato são a mais conhecida. O seu chefe, Kgama III (1837-1923), alcançou proeminência mundial como converso ao cristianismo. Foi um fanático defensor de ingerência de bebidas alcoólicas e um forte suporte do imperialismo britânico no centro da África do Sul. Promoveu de várias formas o progresso económico do seu povo e encorajou a difusão do ensino. As inovações não se confinaram a esta aceitação parcial da civilização ocidental, mas incluíram várias modificações no sistema jurídico e administrativo da tribo. Como resultado disto, os Ngwato afastara-se do seu sistema tradicional de governo. Os habitantes de uma aldeia pequena pertencem geralmente à mesma comunidade tribal. Para fins administrativos considera-se como constituindo um único bairro, sob a chefia e autoridade de um chefe hereditário. O bairro é um corpo patrilinear, pertencendo a maioria dos seus membros ao grupo familiar do chefe mas incluindo normalmente várias outras famílias ou grupos familiares que lhe estão agregados como dependentes. Os aldeamentos maiores contêm todo um número de bairros, não necessariamente da mesma comunidade. A aldeia nestes casos deve ser encarada não como uma unidade local dividida segundo a conveniência em segmentos menores, mas como aglomerado de grupos sociais contidos em si habitando um centro. Nos tempos em que se praticava a poligamia, o chefe agrupava os filhos da mesma mulher num único corpo, sob a autoridade do mais velho, e ligava a estes alguns povos que tivesse origem comum como criados. Cada chefe, confiava seu gado a vários plebeus fiéis para tomarem conta dele. Dentro dum bairro cada grupo de família trata dos seus assuntos, sob a chefia do mais velho, e resolve por arbitragem as disputas que envolvam a qualquer da sua gente. Todos membros do bairro estão sob controle do seu chefe. Este cede-lhes terra para habitação, cultivo e pastagem, pode livremente requerer seus serviços para fins públicos. Quando um bairro se subdivide, o cabeça do grupo dos pais constitui o primeiro tribunal de recurso dos veredictos dos demais. Nos centros maiores, o ancião do bairro é também o chefe de toda aldeia. Nesta qualidade ele pode recorrer dos veredictos dos seus colegas, tem uma autoridade suprema em todos outros assuntos como a distribuição da terra e organização de empreendimentos colectivos. É também o meio através de quem o chefe comunica com os habitantes da aldeia. Para as comunidades que viviam fora das sedes tribais, ficavam sob protecção do motihanka (chefe comum), residente na cidade do chefe. Este homem, cuja responsabilidade era hereditária, devia permanecer em contacto com o povo e seus problemas, visitá-los periodicamente para recolher o tributo para o chefe, e julga os casos que lhe fossem apresentados. Também os informava sobre os acontecimentos das sedes. Com a expansão das tribos ao longo do tempo, muitas comunidades passaram a viver afastadas da sede e este método de supervisão tornou-se pouco eficaz. Assim, foi desenvolvido um sistema de administração mais directo, agrupando as comunidades mais remotas nos distritos já conhecidos e colocando em cada distrito um administrador residente, geralmente um membro da sua própria família e outras vezes um vulgar regedor proeminente e de confiança. O administrador é acompanhado pelos familiares imediatos que o assistem e aconselham. Seus deveres principais consistem em comunicar as ordens e mensagens do chefe à gente debaixo do seu governo, resolver disputas entre comunidades diferentes, organizar e dirigir empreendimentos públicos locais, supervisionar a recolha do imposto habitacional e as colectas tribais, aconselhar o chefe sobre condições económicas e políticas locais. Em caso de abuso do poder, ou prova de incompetência, pode ser chamado ao chefe e ser substituído. Todos os bairros na tribo, tanto Ngwato como estrangeiros se encontravam agrupados em quatro secções paralelas, designados respectivamente segundo o bairro chefiado de cada, Ditimamodimo, Basimane, Maalosô e Maalosô-a-Ngwana. A origem deste agrupamento não se conhece devidamente, mas parece derivar da prática de dar ao herdeiro do chefe um grande posto de gado e da criação de um novo bairro de plebeus a fim de olharem por ele. O herdeiro ao vir para a chefatura, contava consideravelmente com a colaboração e apoio dos partidários assim ligados a ele e como regra colocava sob a sua supervisão todos bairros formados dentro do seu reino. Cada secção tem o seu bairro na cidade, dentro do qual se localizam os bairros que o compõem. Como cabeças das secções, usufruem igualmente de uma influência maior na tribo do que os outros chefes de bairro. O chefe consulta-os frequentemente sobre questões de política tribal, pode delegar neles assuntos seus de grande importância administrativa. Eles falam pelo povo em encontros tribais onde as opiniões de cada secção se entrecruzam com a independência e podem também organizar os seus próprios encontros para discussão de assuntos de interesses para a secção ou para a tribo. A secção a que o próprio chefe pertence, é geralmente encarada durante o seu reinado como a secção governante da tribo. Ele confia muito nos chefes mais velhos para elaboração da política tribal, utiliza-os particularmente para apoio de todos seus planos e empreendimentos. 3.2. O Sistema Administrativo O sistema administrativo acima descrito e a organização social em que directamente se baseia, divide os membros da tribo em grupos distintos uns dos outros pelos poderes locais e lealdades. Sob certos aspectos, cada secção, distrito, comunidade, aldeia, bairro e grupo familiar, é independente do resto, tratando dos seus próprios problemas sob direcção de uma entidade reconhecida, cuja autoridade se estende a quase toda esfera da vida pública. As muitas comunidades de que a tribo se compõe diferem também frequentemente umas das outras pela língua, costumes e tradições e, assim nunca chegam a ter um fundo cultural comum. Como então estes grupos se mantêm unidos, solidários e coesos, permitindoque a tribo no seu todo se apresente como uma frente unida em relação ao mundo exterior na defesa, agressão e prosseguindo nas suas vastas realizações colectivas? Um dos mecanismos por meio dos quais isto se obtém é a hierarquia administrativa por que se distribuem as várias formas de autoridade local. Normalmente, o mais velho do grupo de família fica directamente subordinado ao seu chefe de bairro. O chefe de bairro por sua vez é subordinado, directamente ou através do chefe de bairro donde o seu próprio proveio, o chefe do bairro da mesma secção. O chefe da secção finalmente é subordinado do chefe. Nos distritos periféricos, o chefe de bairro é subordinado directamente ou através do chefe de sua aldeia, do chefiado hereditário da sua comunidade tribal. Este último por sua vez, é subordinado do governador do distrito que finalmente fica subordinado ao chefe. O sistema judicial é fundamentalmente o mesmo para todos os tribunais. A vítima de um mal civil, tal como quebra de contrato, sedução, adultério, dano de propriedade, roubo ou difamação, pode desculpá-lo ou, através do membro mais velho do grupo de família tentar chegar a um acordo com o ofensor. Se estas negociações falharem e leva o caso para o tribunal do chefe de bairro do ofendido. Crimes como ofensas às autoridades políticas em exercício das suas funções, quebra das leis decretadas pelo chefe, violação, assalto, homicídio e bruxaria nunca podem ser resolvidos por meio de acordos particulares, devendo sempre haver um julgamento. Todos julgamentos são ouvidos em público, qualquer membro da tribo tem o direito de assistir a eles e de participar nas cerimónias. O pronunciamento e veredicto são feitos com base nos depoimentos das partes directamente envolvidas e das testemunhas. Se uma parte ficar descontente com o veredicto, pode recorrer. O caso é então ouvido desde o princípio no tribunal superior. A organização social e territorial é usada para delegar os assuntos de preocupação puramente local às autoridades subordinadas. O chefe é a figura central, a volta da qual se ordenam e organizam todas actividades da tribo. Ele é simultaneamente o governador, juiz, legislador, guardião das leis, orientador da vida económica, comandante de guerra, sacerdote. E é por meio de vassalagem para com ele que os membros da tribo demonstram sua unidade. Como as autoridades que lhe estão subordinadas, ele é ajudado no seu trabalho pelos parentes paternos próximos e outros conselheiros pessoais. As vezes consulta apenas os chefes da aldeia, mas frequentemente convoca toda tribo para uma reunião onde se discutem os assuntos públicos, podendo ainda através da organização regimental trazer todos para um trabalho conjunto. Este sistema de administração central prevaleceu até ao estabelecimento do protectorado pela administração europeia, limitando assim os poderes do chefe e das outras autoridades tribais, alterando a estrutura dos tribunais e introduzindo instituições governamentais novas. A administração retirou aos chefes o direito de decretar a guerra ou entrar em acordos políticos independentes. Canalizou os casos de homicídio assim como todos que envolvessem europeus, para a jurisdição de tribunais europeus. Definiu os limites dos territórios tribais. Impôs uma taxa anual regular a todos nativos adultos do sexo masculino. Para manter a lei e ordem e cumprir todos outros deveres a nova administração é assistida por um pequeno corpo de polícias e alguns subordinados, funcionários europeus e nativos. Em 1934, os poderes dos chefes foram claramente definidos e o estatuto e poderes dos tribunais regulados. São especificados os direitos, poderes e deveres do chefe e de outras autoridades tribais. É estabelecida a sucessão e pertença do chefado sujeito à aprovação da administração, que fica com o poder de a passar para outro herdeiro em caso de incompetência do anterior ou de suspender a chefatura, quer por razões de incompetência ou de o chefe não satisfazer fornece uma estrutura pela qual a tribo pode depor um chefe, torna a conspiração contra o chefe uma ofensa estatal e estabelece um conselho formal tribal para ajudar o cumprimento dos deveres. Os tribunais nativos afastam da jurisdição dos tribunais tribais todos casos em que o acusado é culpado de traição, sedução, assassínio ou tentativa de assassínio, culpado de homicídio, violação ou tentativa de violação, assalto ou tentativa de infligir ofensas corporais, conspiração contra o chefe, e uma variedade de ofensas estatutárias. Todos os outros casos, tanto civis como criminais, em que apenas os nativos estejam envolvidos, eram julgados pelos tribunais tribais segundo a lei e costume Tswana. Mas em lugar de muitas categorias de tribunal no sistema tribal, a proclamação da administração britânica reconhece apenas três, cujas decisões são legalmente equivalentes. Estas são representadas pelos tribunais nativos de novos e de velhos e o tribunal do chefe, respectivamente. Do último há ainda apelo para o tribunal do comissário de distrito e daí, só certas condições, para o tribunal especial do protectorado. A proclamação define ainda a constituição de cada tribunal, precisando que deve ter um número limitado de membros nomeados por autoridades tribais específicas. Estas proclamações, delineadas primeiro em 1930, tinham sido frequentemente e amplamente discutidas pela administração com os chefes e suas tribos. A necessidade destas foi-se tornando cada vez mais evidente. A medida que os antigos chefes morriam, eram substituídos por homens novos que na maior parte dos casos eram educados em escolas fora do protectorado e por isso separados da experiência em primeira mão adequada ao governo e jurisdição tribal. Múltiplos casos de embriaguez e irresponsabilidade, negligência de deveres, apropriação indevida de imposto habitacional e de outros dinheiros da tribo, de sérias contendas internas, exigia um controle administrativo mais forte, enquanto o desenvolvimento nos sectores de educação veterinária e agrícola tornava mais desejável numa definição clara das relações entre a administração e as tribos. 3.3. Poderes e Autoridade do Chefe A consequência prática destas medidas é que embora o chefe e seus conselheiros ainda administrem os assuntos da tribo, a autoridade jurídica e política suprema é a administração europeia que actua através do comissário distrital. Mas o chefe como cabeça da tribo continua sendo tratado pelos seus súbditos com grande respeito. A sua posse e casamento são ocasião para grande festividade pública, e a sua morte sugere luto universal. Ainda recebe várias formas de tributo do seu povo. Tem direito a primeira escolha de terra para sua casa, campos e reservas de gado. Só o chefe tinha o direito de convocar assembleias tribais plenas, criar novos regimentos, organizar cerimónias tribais e (nos velhos tempos), impor penalidades extremas de morte e expulsão. O não cumprimento de suas ordens constitui ofensa penal. Todas outras ofensas contra ele são mais severamente punidas do que as cometidas contra qualquer membro ordinário da tribo. Apesar das restrições dos seus poderes e direitos tradicionais, o chefe ainda continua desempenhando um papel importante no governo da tribo. Ele determina e organiza a realização de trabalhos públicos; vigia a conduta das autoridades que lhe estão subordinadas e em caso de extrema incompetência ou abuso de função pode substituir o seu governador de distrito ou depor a cabeça hereditária do bairro ou comunidade cujos deveres recaem no homem seguinte na linha de sucessão. A maior parte do seu tempo diário é passado na sua Kgota (lugar de conselho), onde ouve os novos, as petições e queixas de todos da tribo e dá ordens para que se tome a acção necessária. Ele deve proteger os direitos dos seus súbditos, prover de justiça
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