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01 Memórias dos sertões maranhenses_compressed

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Francisco de Paula Ribeiro 
Memórias 
dos sertões 
maranhenses 
retinidas aos cuidados de 
Manoel de Jesus Barros Marfins 
São Paulo 
EDITORA JWSICILIANO 
2002
Diagramação: Luciane Szabo 
Capa: Daniel Rampazzo 
Revisão: Beatriz Garcia 
Impressão e acabamento: São Paulo, Brasil 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) 
Ribeiro, Francisco de Paula 
Memórias tios sertões maranhenses / Francisco de Paula Ribeiro ; reunidas aos cuidados 
de Manoel de Jesus Barros Martins. — São Paulo : Siciliano, 2002. 
ISBN 85-267-0876-7 
I. Maranhão - Descrição e viagens 2. Maranhão — História 3. Ribeiro, Francisco de 
Paula I. Martins, Manoel de Jesus Barros. II, Título. 
CDD-981.21 
índices para catálogo sistemático: 
1. Maranhão : História 981.21 
2002 
Proibida a reprodução total ou parcial. 
Os infratores serão processados na forma da lei. 
Direitos exclusivos para a língua portuguesa 
cedidos à Siciliano S.A. 
Editora Siciliano 
Av. Raimundo Pereira de Magalhães, 3305 
CEP 05145-200 — São Paulo — Brasil 
e-mail: esiciiiano@siciliano.com.br 
 
01-6173 
mailto:esiciiiano@siciliano.com.br
Sumário 
Francisco de Paula Ribeiro, Um Pioneiro nos Sertões 7 
dos Pastos Bons -— Manoel de Jesus Barros Martins. 
Roteiro da viagem que fez o Capitão Francisco de 27 
Paula Ribeiro às fronteiras da Capitania do Maranhão e da dc Goiás, no 
ano de 1815, em serviço de S. M. 
Fidelíssima. 
Descrição do Território de Pastos Bons, nos Sertões 105 
do Maranhão, propriedades dos seus terrenos, suas produções, caráter 
dos seus habitantes colonos, e estado atual dos seus estabelecimentos. 
Memória sobre as nações gentias que presentemente 155 
habitam o continente do Maranhão: análise de algumas tribos mais 
conhecidas: processo de suas hostilidades sobre os habitantes: causas 
que lhes têm dificultado a redução, e único método que seriamente 
poderá reduzi-las.
Francisco de Paula Ribeiro 
Um Pioneiro nos Sertões 
dos Pastos Bons 
Manoel cie Jesus Barros Martins 
O conhecimento acurado do Maranhão colonial tardio, particularmente das 
ribeiras de sua grande mesopotâmia e dos sertões do centro-sul, será sempre 
fragmentário e parcial para aquele pesquisador que não eleger como fonte 
importante a produção memo- realística fundada por Francisco de Paula Ribeiro, 
que, a serviço da Metrópole lusitana, talou as entranhas territoriais da então 
Capitania, no desempenho de inúmeras e importantes comissões emanadas das 
autoridades capitais do império português. 
Paula Ribeiro, conforme a historiografia consagrou seu nome, foi um 
militar que galgou quase todos os postos constitutivos da hierarquia vigente em 
seu tempo, em decorrência de penosos e relevantes serviços prestados à causa 
portuguesa no último quartel do período colonial do Maranhão. 
Traçar um esboço biográfico desse pioneiro do sertão maranhense vem 
constituindo problema de difícil solução para todos os estudiosos que se 
utilizaram de suas obras e pretenderam mapear o dinamismo de uma vida 
intensamente devotada ao conhecimento e à 
 
 
Francisco de Paula Ribeiro 
Um Pioneiro nos Sertões 
dos Pastos Bons 
Manoel de Jesus Barros Martins 
O conhecimento acurado do Maranhão colonial tardio, particularmente das 
ribeiras de sua grande mesopotâmia e dos sertões do centro-sul, será sempre 
fragmentário e parcial para aquele pesquisador que não eleger como fonte 
importante a produção memo- realística fundada por Francisco de Paula Ribeiro, 
que, a serviço da Metrópole lusitana, talou as entranhas territoriais da então 
Capitania, no desempenho de inúmeras e importantes comissões emanadas das 
autoridades capitais do império português. 
Paula Ribeiro, conforme a historiografia consagrou seu nome, foi um 
militar que galgou quase todos os postos constitutivos da hierarquia vigente em 
seu tempo, em decorrência de penosos e relevantes serviços prestados à causa 
portuguesa no último quartel do período colonial do Maranhão. 
Traçar um esboço biográfico desse pioneiro do sertão maranhense vem 
constituindo problema de difícil solução para todos os estudiosos que se 
utilizaram de suas obras e pretenderam mapear o dinamismo de uma vida 
intensamente devotada ao conhecimento e à 
8 
 
divulgação das delícias e potencialidades desta terra das palmeiras e de campinas 
e chapadões, prenhes de pastos bons. Resistem, à espera de respostas plausíveis 
várias interrogações fundamentais sobre a vida desse intrépido soldado e 
desbravador contumaz. Não são conhecidas evidências documentais para 
responder a perguntas como as que se seguem: onde e quando nasceu? De que 
família descendia? Onde e de que maneira passou sua infância e sua 
adolescência, enfim, a primeira metade de sua vida? Onde, quando e em que 
circunstâncias realizou a sua escolaridade? Que graus adquiriu? Qual a natureza 
de sua formação escolar? Como e em que circunstâncias ingressou na vida 
militar? Chegou a constituir família antes ou durante a sua permanência no 
Maranhão? Deixou descendentes? 
A maioria dos estudiosos que analisaram sua obra concluiu haver sido 
Paula Ribeiro um português de nascimento que, ainda bem jovem, transferiu-se 
para a parte norte da Colônia portuguesa na América. Para uns, ele já aportou no 
Maranhão como integrante dos efetivos militares regularmente deslocados para 
ampliar a segurança e a defesa da Colônia. Para outros, entretanto, toda a sua 
carreira militar desenvolveu-se na capitania do Maranhão. 
De qualquer modo, sua vida nesta parte da Colônia o qualifica como um 
dos mais ardorosos defensores dos interesses portugueses no território americano. 
Seus sucessos e promoções militares foram conseguidos fundamentalmente no 
Maranhão, mormente quando passou a desempenhar suas funções no sul da 
Capitania, nos chamados Sertões dos Pastos Bons. 
Essa região foi aquela a que mais tempo dedicou em efetivo exercício, e 
dela ele traçou um panorama riquíssimo e multifacetado de informações, 
consolidado em suas obras, resultante objetiva de argutas observações in toco, 
realizadas, palmo a palmo, nos mais variados e distantes rincões da seção 
meridional da Capitania. 
A primeira referência concreta sobre a vida de Paula Ribeiro no Maranhão 
data de 1798, quando, como alferes, foi integrado a uma comissão de oficiais que 
se destinava ao Pará. Sua presença nessa missão deveu-se a seus insistentes 
9 
 
pedidos, combinados com a necessidade do então governador D. Diogo de Sousa 
de manter em São Luís um tenente que havia sido designado para integrá-la.1 
Logo em 1800 foi indicado para comandar o Destacamento de Pastos 
Bons,2 em substituição ao alferes Raimundo José Vieira, permanecendo nesse 
posto durante mais de dois anos até ser substituído, em 1802, pelo também alferes 
Higino Xavier Lopes. 
A partir dessa época, durante dez anos, Paula Ribeiro desempenhou intensa 
atividade no interior da Capitania. Sua ação foi mais prolongada nos sertões de 
Pastos Bons, identificando-se, fora disso, rápidas incursões em outras partes do 
Maranhão. Dessas, a mais significativa parece ter sido aquela realizada, em 1810, 
no distrito de Viana, objetivando fazer frente às contínuas investidas de nativos 
Timbiras e Canelas contra os colonizadores da região, de sorte que “o gentio 
incursor desses lugares [ficasse] arrependido e escarmentado sempre que 
[cometesse] novas incursões”.1 A tropa chefiada por Ribeiro era composta de 45 
militares — além de paisanos e milicianos armados integrados a esse contingente 
por determinações superiores — e contava com bem sortido material bélico. Todo 
esse aparato foi mobilizado para um ataque fulminante ao “gentio inimigo”, no 
propósito de afugentá-lo até “as maiores alturas, sem que se perdoem as vidas que 
o Direito das Gentes permite se tirem no calor da guerra, e só dispensando-as 
quando eles se entregarem, ou depondo as suas armas derem algum sinal de 
amizade,sem contudo isentá-los de serem remetidos presos a esta Capital, 
principalmente alguns de seus companheiros que constam daquelas vizinhanças”2 
Tais palavras (e exemplo) desnudam a crueza da conquista e do devassamento 
dos 
 
 Rodapé 1 MARANHÃO. Secretaria do Governo. Registro de ofícios e ordens do governador e 
capitão- general do Estado do Maranhão a autoridades do interior da capitania, 1809-1811 (Objetos 
diversos). São Luís, 20 de agosto de 1810. Doc. 112. 
2 ld.ibid.Doc.ill. fim de rodapé 
 
sertões, e a limpeza étnica promovida contra o indígena, dissimuladas quase 
sempre em tratados de paz rompidos à força da superioridade bélica do 
colonizador. 
A atuação de Paula Ribeiro na região de Pastos Bons pode ser caracterizada 
como a de um ponta-de-lança da conquista daquela imensa área. Ele comandou 
inúmeras expedições, amistosas e punitivas, aos mais variados grupos indígenas 
estabelecidos secularmente naquelas paragens, os quais constituíam obstáculo de 
monta para o desenvolvimento do pastoreio, numa das áreas mais apropriadas 
para essa atividade em toda a Colônia. 
Dando concretude a objetivos fundamentais da política colonial portuguesa, 
Paula Ribeiro esteve envolvido no processo de fundação de muitas das povoações 
do centro-sul do Maranhão (hoje sedes municipais), de abertura de estradas para 
facilitar o contato entre o litoral e o sertão, além de estudar sistematicamente a 
Capitania, especialmente a região sertaneja, de modo a identificar-lhe as poten-
cialidades e indicar possibilidades de aproveitamento racional de suas riquezas. 
Em 1812, já promovido a tenente do Regimento de Linha, foi nomeado 
comandante do Destacamento de Aldeias Altas. Essa nomeação configurava-se 
como uma medida do governador Paulo José da Silva Gama (1811-1819) para 
neutralizar as recorrentes desordens que perturbavam o sossego público na 
jurisdição daquele distrito, algumas delas tendo como personagens centrais as 
autoridades que deveriam mantê-las sob controle. Uma vez no efetivo exercício 
do cargo, baixou um conjunto de disposições no intuito de restabelecer, a 
harmonia tão necessária entre as autoridades do distrito; entretanto, nem todas 
elas surtiram o efeito desejado, pois o próprio comandante do destacamento logo 
cedo entrou em atrito com o juiz ordinário, em flagrante prejuízo para a 
população das Aldeias Altas, que, incrédula, assistia a um espetáculo degradante 
praticado pelos emissários mais graduados d’el-rei naquele distrito. 
A beligerância ostensiva entre eles concorreu para que Silva Gama os 
repreendesse. Em correspondência endereçada a Paula 
11 
 
Ribeiro, o governador exortava-o: “Portanto, assim como admoesto aquele juiz 
para entrar no cumprimento dos seus deveres, recomendo a Vossa Mercê outro 
tanto para que não me obrigue a providenciar contra a sua conduta”.3 Uma leitura 
mais atenta da citação parece revelar a existência de grande simpatia do 
governador em relação a Paula Ribeiro, pela maneira como as palavras são 
empregadas. 
Em 1815, o governador Paulo José da Silva Gama, atendendo a 
determinação superior, nomeou Paula Ribeiro para dar cumprimento à missão 
mais relevante entre todas que empreendeu. Já promovido capitão do Regimento 
de Linha, recebeu a incumbência de atuar junto a emissários da Capitania de 
Goiás para promoverem a fixação definitiva dos limites entre as duas capitanias 
na região tocantina. Em verdade, o primeiro escolhido para realizar a referida 
comissão foi Vicente Jorge Dias Cabral (outro exímio conhecedor do Maranhão 
daquele tempo, ainda desconhecido), “bacharel em Filosofias e formado em 
Leis”, que no governo de D. Diogo de Sousa (1798-1802), “tinha viajado àqueles 
sertões no exame de produtos da natureza, e por isso o único capaz para o 
presente objeto”.4 Entretanto, como Cabral padecia de moléstia, vindo a falecer 
nos momentos iniciais da preparação da viagem, Silva Gama recorreu aos 
serviços de Paula Ribeiro, considerando ter ele “estado também no Real Serviço 
por vários anos naquele contorno”5 
Pelas instruções do governador maranhense, devia Ribeiro envidar todos os 
esforços para que não entrasse em conflitos desnecessários com os emissários 
goianos. Para tanto, cumpria que se antecipasse em chegar à região da raia 
divisória e mantivesse sólidos contatos com os mais antigos habitantes daquele 
sertão, buscando identificar a noção de pertencimento por eles desenvolvida em 
relação a uma ou outra capitania. Por outro lado, deveria investigar- lhes o tempo 
de residência, como produziam a sua subsistência e a que jurisdição recorriam 
aqueles moradores para resolver seus interesses, além de efetuar o 
 
 Rodapé 3 MARANHÃO. Secretaria do Governo. Registro de ofícios, portarias e bandas do 
governador e capitão-gcncral da Capitania do Maranhão, 1811-1814 (Objetos diversos). São Luís, 26 de 
outubro de 1812. Doe. 215. 
4 MARANHÃO. Secretaria do Governo. Registro da correspondência do governador e capitão- general da 
Capitania do Maranhão com o Ministro Secretário de Estado dos Negócios da Guerra e dos Estrangeiros, 
1812-1819. São Luís, 16 de fevereiro de 1815. Doe. 4. 
5 Idetn, ibidem. Doc. 4. Fim de rodapé 
12 
 
reconhecimento dos acidentes geográficos passíveis de serem indicados como 
marcos perenes ao cabo da faina demarcatória. 
Por outro lado, durante a viagem para os Pastos Bons, competia a Paula 
Ribeiro, nos intervalos da jornada, e quando do trabalho demarcatório ,“explorar 
ou mandar explorar todo o terreno dos limites desta Capitania próximo ao 
Tocantins, a fim de se conhecer a direção e a capacidade do rio, a sua diversidade 
de braços que se intrometem por aquele Sertão, os rios com que se comunica e 
aonde estes vêm desembocar. A qualidade dos terrenos, as povoações que se 
descobrirem e todos os vestígios notáveis de antigas povoações e caminhos. 
Talvez pois que nesta exploração se descubram navegações ou caminhos por terra 
mais apropinquados desta Capital ou a rios navegáveis por ela”? 
Era sua responsabilidade, também, realizar todas as explorações possíveis 
para, através de memórias, descrever a mais ampla variedade de produtos dos três 
reinos da natureza que pudesse recolher deles, coletando amostras para serem 
submetidas aos exames necessários em São Luís ou na Academia de Ciências de 
Lisboa. 
Na viagem ao vale tocantino, ao passar por Caxias observou e relatou 
através de ofício ao governador o clima de insegurança vivenciado pela 
população local, particularmente os lavradores, em virtude das frequentes 
incursões indígenas que assolavam seus estabelecimentos agrícolas e, quase 
sempre, deixavam um rastro de morte no seio das “famílias coloniais”. Ciente de 
tal situação, o governador expediu correspondência ao juiz de fora daquela 
circunscrição, orientando-o sobre o modo mais apropriado para o trato 
producente com 6 o nativo. Segundo as orientações, devia o juiz, a continuarem as 
reduções de “diversas nações gentias”, conservar “os índios nas suas primitivas 
aldeias, ou fazê-los situar em territórios análogos ao seu modo de vida, não muito 
contíguos às roças dos lavradores desse distrito, onde não haja suficiente força 
armada para os coibir do hábito de suas continuadas rapinas” 7 
Afinal, conforme entendia Paula Ribeiro, providências deveriam ser 
tomadas, de modo a “suspender a desolação e desamparo destas fazendas e 
 
Rodapé MARANHÃO. Secretaria do Governo. Registro de ofícios, bandas, nomeações e portarias do governador e 
capitão-general da Capitania do Maranhão, 18)4-1816 (Objetos diversos). São Luís, 15 de fevereiro de 1815. Doc. 
755. 
7 Idem, ibidem. São Luís, 2 de julho de 1815; doc. 834. 
13 
 
promover o regresso, segurança e subsistência desses seus colonos”8 Para ele, a 
política mais adequada seria continuar a domesticação dos gentios a fim de torná-
los mais sociáveis e colonos úteis,sem, contudo, abdicar de coibir suas habituais 
correrias, pilhagens e insultos. 
Durante os anos de 1815 e 1816, Paula Ribeiro despendeu suas energias no 
cumprimento da missão demarcatória dos limites entre as capitanias do Maranhão 
e de Goiás. Sua atuação foi decisiva para que os limites meridionais do Maranhão 
fossem definidos pelos marcos por ele apontados (aliás, reconhecidos até hoje) 
quase sem contestação mais veemente dos emissários goianos. Contava, nessa 
hora, o fato de ser ele um exímio conhecedor das peculiaridades dessa região, 
talvez o maior naquele tempo, haja vista que tinha uma visão de conjunto tanto 
dos “Pastos Bons” quanto do resto do Maranhão, posto que, por longos anos, no 
desempenho de suas funções, vinha ampliando suas observações sobre tudo o que 
no Maranhão pudesse ir ao encontro dos interesses lusíadas na região. 
Nesse sentido, nada mais cristalino que a correspondência dirigida pelo 
governador Paulo José da Silva Gama ao ministro da Guerra e Estrangeiros, 
Marquês de Aguiar, dando entusiástica relevância à atuação de Paula Ribeiro. 
Para Silva Gama, o êxito retumbante da comissão, pendendo para o lado do 
Maranhão, dependeu do “bom arranjamento, discernimento e trabalhos”11 
desenvolvidos pelo primeiro comissário por ele nomeado. Ademais, “o seu zelo e 
aptidão com que trabalhou e se esmerou, excedeu aos outros comissários e o 
fizeram digno de que eu e o capitão-general [de Goiás] nos regulássemos e 
assentíssemos no método e linha de sua divisão”,9 10 
Afinal, reconheceu o governador, um desempenho qualitativo como o 
apresentado por Ribeiro, além de deixá-lo plenamente satisfeito pela escolha 
desse incansável súdito português para desenvolver semelhante missão, o 
intimava a recomendá-lo para figurar entre aqueles que, por mérito, tornaram-se 
merecedores da “Real Augusta atenção de Sua Majestade”.11 
Ao cabo de suas atividades demarcatórias, Paula Ribeiro regressou a São 
 
8 Idem, ibidem fim de rodapé 
Rodapé 9 MARANHÃO. Secretaria do Governo, Registro da correspondência do governador e 
capitão- general da Capitania do Maranhão com o Ministro Secretário de Estado dos Negócios da Guerra c 
dos Estrangeiros, 1812-1819. São Luís, 15 de outubro de 1816. Doc. 16. 
10 Idem.lbidem. 
11 Idem.lbidem. fim de rodapé 
14 
 
Luís fortalecido por uma variada gama de informações substantivas acerca das 
potencialidades de uma região por ele considerada pedra angular para o 
desenvolvimento da capitania do Maranhão como um todo. Dessa maneira, para 
que sua aspiração ganhasse concretude, indicava, entre outros, que fossem 
promovidas ações tendentes a enraizar relações entre as duas correntes coloniza- 
doras do território maranhense: a litorânea, baseada na agroexportação, e a 
sertaneja, baseada na pecuária. 
Uma vez em São Luís, após prestar contas da comissão demarcatória sob 
sua chefia, Paula Ribeiro foi indicado, em dezembro de 1816, para comandar 
interinamente a Companhia de Artilharia recentemente criada na Capital. Durante 
a gestão dessa unidade providenciou a incorporação em sua tropa de mais de 
quarenta recrutas, cinco soldados, dois tambores e um anspeçada, além de 
solucionar uma série de problemas relativos à recorrência de deserções do seio do 
efetivo por ele comandado. Enfim, deu um toque de moralidade nessa fração 
militar que iniciava suas importantes atividades até ser substituído, em março de 
1818, por um tenente engenheiro nomeado por real patente. 
Ainda no primeiro semestre desse ano, Paula Ribeiro requereu real patente 
de sargento-mor, considerando uma larga folha de serviços executados em prol 
dos interesses lusos na América. Seu processo tramitou ordinariamente, tendo 
sido enfatizada a maneira proba e ativa com que produzira sua carreira até então. 
Entretanto, obteve apenas a promoção para o posto de major graduado adido ao 
Estado Maior, com a incumbência de comandar novamente o Destacamento de 
Pastos Bons. 
A promoção, assim definida, desagradou até mesmo ao governador 
Bernardo da Silveira Pinto da Fonseca (1819-1822), que esperava ser Paula 
Ribeiro passado, no mínimo, ao posto de major efetivo, posto a que 
recomendavam o merecimento e exação com que se pautou no desempenho das 
inúmeras comissões emanadas de ordem superior no benefício do real serviço. 
Finalmente, pelo decreto de 18 de julho de 1818, teve suas aspirações 
atendidas, ao ser graduado no posto de sargento-mor, adido ao Estado Maior do 
Exército, permanecendo, todavia, com o encargo de comandar os destinos do 
destacamento de Pastos Bons. Em verdade, esse encargo, para Ribeiro, 
funcionava como um prêmio, já que lhe permitia nova oportunidade para ampliar 
o seu conhecimento da região e consolidar observações e sínteses parciais sobre 
15 
 
variados objetos que lhe aguçaram a curiosidade em outros momentos. 
Assim entrou no efetivo exercício do seu posto e voltou a cumprir uma 
jornada de trabalho toda cia devotada ao conhecimento, ao mapeamento, enfim, à 
observação sistemática dos “Sertões dos Pastos Bons”, objetivando integrar esse 
rincão ao concerto geral da capitania do Maranhão e do Império Português. 
Fixado definitivamente naqueles confins, Paula Ribeiro, além dos afazeres 
decorrentes do cargo de comandante do destacamento de Pastos Bons, foi 
convocado para contribuir no desenvolvimento do projeto de estabelecimento de 
fazendas reais para a criação de gado vacum na região, à semelhança daquelas 
existentes na capitania do Piauí, as quais deveriam fornecer as matrizes bovinas e 
demais animais necessários ao pleno funcionamento dos novos empreendimentos 
pecuários em terras maranhenses. 
Pelo projeto, inicialmente seriam estabelecidas três fazendas, seguindo um 
plano elaborado pelo desembargador Antônio Rodrigues Veloso, pelo qual tais 
fazendas teriam a seguinte disposição: uma organizada na região dos Perizes; 
outra, em alguma paragem apropriadas às margens do rio Mearim; e mais uma 
nas cabeceiras do rio Grajaú, na região dos Pastos Bons. 
Essa disposição das fazendas em linha reta, ligando a zona litorânea à zona 
sertaneja da Capitania, secundada pela construção de uma grande estrada que 
permitisse o contato frequente e mais cômodo entre as mesmas e entre a Capital e 
o sertão dos Pastos Bons e, além do mais, contribuísse sobremodo para a 
exploração de uma atividade econômica importantíssima como a pecuária, 
granjeou a imediata reprovação do governador Bernardo da Silveira, devidamente 
atualizado pelas informações abalizadas oferecidas por Paula Ribeiro, que, em 
trânsito por São Luís, foi convidado a manifestar sua opinião sobre a viabilidade 
do projeto baseado no plano formulado por Veloso. 
Segundo Paula Ribeiro, concretizadas dessa forma tais fazendas, situar-se-
iam tão distantes umas das outras que impossibilitariam a competente vigilância 
dos inspetores. Ademais, a região coberta pela orientação sugerida constituía-se, 
em grande parte, de imensas matas (geralmente impróprias para a criação de 
gado) densamente “infestadas por grande número de selvagens que procuram as 
mesmas matas como mais seguras para suas moradas”.’4 Isso sem mencionar o 
fato de que a construção de uma estrada nos moldes da que foi projetada 
redundava em obra gigantesca, muito além das possibilidades de recursos do 
16 
 
momento, mas principalmente porque drenaria para ela uma boa parcela da 
escassa mão-de-obra existente, que deveria estar 
Rodapé 14 Idem. Ibidem. São Luís, 6 de outubro de 1819; doe. 4. Fim de rodapé 
 
ocupada na produção dos gêneros através dos quais a Capitania fundava a sua 
prosperidade e riqueza. 
O plano defendido pelo governador Silveira indicava a instalação das 
fazendas em lugares previamente escolhidos, constituídos por “terrenos devolutos 
contíguos a aqueles que já tenham alguma população, porque desta forma facilita-
se a estes povoados irem formando iguais estabelecimentos com aproteção das 
fazendas reais vai-se dando contiguidade à população da Capitania e à proporção 
que se vão descobrindo novos terrenos se vão também formando mais fazendas 
em sítios acomodados dividindo-as em diferentes inspeções, como mais convier 
segundo a sua situação e circunstâncias!”12 13 
Por semelhante orientação, a abertura das estradas, ligando as fazendas 
reais e as de particulares que fossem sendo estabelecidas, resultaria de atividade 
ordinária, gradual, consequente e em consonância com as exigências que o 
incremento de estabelecimentos ganadeiros e de população insinuassem. 
Assim, a área que reunia as melhores condições para a instalação do 
empreendimento pastoril, segundo o governador, sob a orientação de Paula 
Ribeiro, era aquela compreendida da “Ribeira do Alpercatas, desde a sua 
confluência com o Itapecuru até a Ribeira das Neves, porção de terreno 
desocupado entre a Ribeira chamada de Gr a jaú e o Itapecuru, onde talvez se 
possam formar dez ou doze fazendas reais e com as mais que os particulares 
muito provavelmente estabelecerão entre estas, em muito pouco tempo se 
povoará aquela porção de excelente terreno, facilitando as comunicações na 
sobredita Ribeira do Grajaú já bastante povoada com a do Itapecuru, ainda mais 
povoada”/1 Caso o empreendimento alcançasse o sucesso almejado, progres-
sivamente os vales dos rios Mearim, Grajaú e Tocantins (lá pelas cercanias da 
atual Carolina) ganhariam um novo desenho espacial e humano com a introdução 
de vários outros estabelecimentos criatórios. 
 
 
. 
17 
 
Conforme já registrado, a maioria das ideias constantes do plano 
apresentado por Bernardo da Silveira para assentar as fazendas reais no 
Maranhão originava-se de informações relatadas por Paula Ribeiro no 
cumprimento de suas atividades funcionais. Por isso, não foi por acaso que o 
referido governador o encarregou de “escolher os lugares mais apropriados para 
as mencionadas fazendas na sobredita Ribeira de Alpercatas e de proceder logo a 
medição do terreno, marcando-o competente mente”.14 
Em verdade, Paula Ribeiro gozava de elevado conceito junto às autoridades 
principais da Capitania, principalmente do governador Bernardo da Silveira, pelo 
fato de que “pela sua inteligência, zelo e atividade tem sido sumamente útil nesta 
Capitania, sendo encarregado de muitas diligências importantes no interior e nos 
sertões dos quais tem maior conhecimento do que qualquer outro e é talvez o 
único que me tem dado informações exatas e inteligentes do interior da 
Capitania”.15 
Em 1820, Paula Ribeiro palmilhou os “Sertões dos Pastos Bons” em busca 
dos lugares mais acomodados para abrigar as fazendas reais, cumprindo assim 
determinações superiores da agonizante política colonial portuguesa na América. 
Por essa ocasião, após prestar mais esse relevante serviço à Coroa, passou à 
efetividade do posto de sargento-mor, o qual ocupava como graduado. Esse 
reconhecimento do seu mérito chegou em boa hora, pois para atender a todas as 
requisições decorrentes do exercício do cargo de comandante do destacamento da 
área precisava não só dos recursos oriundos do erário público, mas de uma 
remuneração mais de acordo com a atividade que cotidianamente desempenhava 
para além daquelas funções. Assim estaria mais bem amparado para fazer face a 
despesas pessoais supervenientes. Por outro lado, poderia desfrutar das regalias 
que a efetividade do posto lhe conferia, mas, sobretudo, firmar-se como uma das 
autoridades militares mais importantes dos arranjos estratégicos do exercito 
português na parte norte da colonização. Finalmente, comandou o destacamento 
de Pastos Bons até à sua morte, em maio de 1823, dedicando-se àquilo que mais 
o satisfazia: observar, conhecer e estudar as entranhas dos “Sertões dos Pastos 
Bons”. Foi nesse mister que chegou-lhe a notícia da independência do Brasil. 
Todavia, como disciplinado e valoroso súdito português e como comandante de 
uma das mais importantes unidades do esquema bélico lusitano, pôs-se 
 
 
 
18 
 
imediatamente de prontidão para a luta que deveria empreender, de modo a 
conservar intacta a Capitania do Maranhão dos arroubos dos independentistas 
vindos principalmente do Piauí e do Ceará. 
Sua atitude, pois, foi a de um homem de sistema, de um intelectual 
orgânico, num contexto social preciso, ao traçar todas as diretrizes possíveis para 
a defesa da área sob seu comando, em benefício da Coroa de quem era um 
vassalo exemplar. 
Contudo, superiores às suas possibilidades e habilidades estratégicas foram 
as forças implosivas dos independentes a sacudir e fazer ruir o colosso luso na 
América. A luta pela independência do Brasil, no Maranhão, apesar da resistência 
pró-Portugal prolongá-la por um ano, foi produzida num quadro de contínuo 
encolhimento da defesa lusíada e de ampliação progressiva dos sucessos dos 
independentes. Paula Ribeiro, entretanto, atirou-se à luta com os efetivos 
militares de que dispunha, emulando-os a oferecer a mais arrojada defesa 
daqueles territórios importantes, ainda mais após receber ordens expressas da 
Junta Governativa do Maranhão. 
Destarte, ao longo de quase um ano de sucessos e reveses, Paula Ribeiro 
foi, afinal, preso na ilha da Botica, no vale tocantino, pelo fazendeiro José Dias 
de Matos, de Pastos Bons, quando se deslocava para o arraial de São Pedro de 
Alcântara (Carolina), após renhida batalha em que ficou em flagrante 
desvantagem e capitulou. 
Levado para Carolina Velha, do lado goiano (hoje tocantino), foi, 
inicialmente, tratado como indicavam as convenções de guerra. Após ser curado 
de ferimentos (juntamente com os remanescentes de sua tropa), decidiram seus 
algozes que ele, como importante trunfo de guerra, deveria ser conduzido para 
Pastos Bons — onde construiu grande parte de sua vida — como um exemplo 
incontestável da vitória dos independentes. Entretanto, durante a penosa viagem 
(em que ele e o capelão de sua tropa foram montados em cavalos aprestados com 
cangalhas, tendo os pés presos sob a barriga dos animais), Paula Ribeiro e seu 
companheiro religioso foram barbaramente assassinados, em maio de 1823, às 
margens do rio Balsas, segundo alardeado à época, para que José Dias e seus 
asseclas se apossassem de cabedais da ordem de 18 mil cruzados constituintes do 
patrimônio das vítimas. 
Assim chegou a termo a vida de um dos mais profundos conhecedores e 
19 
 
amantes dos sertões maranhenses. Aliás, como que por ironia do destino, foi 
assassinado bem no coração da região que mais conheceu, estudou e descreveu 
com rara sensibilidade e inteligência, bem como fez dela uma extensão do seu 
torrão nativo, de onde cedo emigrara. Por isso, combatia tenazmente em 
obediência à Coroa portuguesa contra aqueles que visavam dela subtrair o 
Maranhão e seus sertões para integrá-los ao território da Coroa recém-constituída 
no Brasil. 
A observação criteriosa foi, pois, uma marca iniludível que permitiu a esse 
militar ilustrado, infatigável, laborioso, brioso e, sobretudo, amante contumaz da 
vida sertaneja, fundar uma obra de incontestável mérito, imprescindível para o 
conhecimento do Maranhão colonial, às vésperas da Independência. 
Ao todo foram cinco as obras que produziu, sem contar os inumeráveis 
exemplares de sua profícua correspondência com as autoridades capitais e 
subalternas de seu relacionamento, em que, via de regra, extrapolava os limites 
ritualísticos ou oficiais e emitia opiniões recheadas de exemplos extraídos da 
faina cotidiana que desenvolvia. 
Cronologicamente, a primeira obra de sua lavra foi o Roteiro da viagem 
que fez o capitão Francisco de Paula Ribeiro às fronteiras da capitania do 
Maranhão e da de Goiás no ano de 1815 em serviço de Sua Majestade 
Fidelíssima. Trata-se de relatório circunstanciado de seu 
 desempenho como comissário demarcador oficial do Maranhão das fronteiras 
da entãocapitania com a de Goiás, bem como das minuciosas observações 
realizadas sobre os mais díspares aspectos dos sertões da Capitania pelos 
quais orientou a sua jornada até chegar à região limítrofe objeto da 
demarcação, 
A obra foi concebida em duas partes, Na primeira, Paula Ribeiro 
reportou-se fundamentalmente às peripécias da extenuante viagem, em que 
foram percorridas cerca de 290 léguas em 91 dias (de 23 de fevereiro a 24 
de maio) de São Luís a São Pedro de Alcântara (atual Carolina), ora 
utilizando-se de transporte fluvial (até Caxias), ora de montarias adquiridas 
em Caxias para levar a comitiva até o termo da jornada. 
Do trecho situado entre São Luís e Caxias, a descrição da viagem 
não apresenta um conjunto de informações substantivas. Ao que parece, 
20 
 
por referir-se à região mais importante da Capitania, econômica e 
demograficamente, cingiu-se Paula Ribeiro a narrar os detalhes da viagem 
empreendida, inclusive de algumas poucas incursões de estudo efetuadas 
em áreas contíguas às margens do rio Itapecuru. 
Já do intervalo compreendido entre Caxias e a ribeira do Tocantins, a 
descrição, densa, fez aflorar uma infinidade de acidentes geográficos e de 
sinais concretos da presença humana naqueles confins, traduzidos em 
povoações, estabelecimentos ganadeiros, propriedades em geral, caminhos, 
veredas, entre outros aspectos dos Pastos Bons. 
Na segunda parte do Roteiro, o autor primou pela apresentação de 
um quadro detalhado dos elementos constitutivos da região. Em sua 
narrativa, teceu considerações valiosas sobre os aspectos físicos; descreveu 
as bacias hidrográficas, apontando a importância de cada rio; discorreu 
sobre as qualidades e defeitos dos terrenos; destacou a excelência do clima 
e analisou as singularidades da cobertura vegetal daqueles sertões. Por 
outro lado, traçou um perfil dos caminhos, das estradas e das povoações 
existentes, analisando assim o avanço colonizador na região, caracterizou 
os grupos indígenas radicados naqueles contornos e, por fim, examinou 
vários aspectos da produção econômica regional. 
A nosso juízo, pela quantidade e pela qualidade dos aspectos sobre a 
capitania do Maranhão, referenciados por Paula Ribeiro, o Roteiro foi a 
matriz fundante de todas as demais obras por ele produzidas. Pelo exame 
atento dessa obra, verifica-se que as demais resultaram do aprofundamento 
e do amadurecimento de questões já levantadas nos limites de um 
documento restritivo ao desenvolvimento delas como o relatório de viagem 
ora enfocado. 
A segunda obra de Paula Ribeiro foi a Descrição do território de 
Pastos Bons, nos sertões do Maranhão, propriedades de seus terrenos, 
suas produções, caráter dos seus habitantes colonos, e estado atual dos 
seus estabelecimentos,16 redigido em março de 1819. Trata-se, pois, de 
produção intelectual amadurecida, cuja finalidade era descrever intensa e 
abrangentemente a região dos Pastos Bons em seus aspectos físicos, 
econômicos e sociais. 
 
Rodapé 16 Revista do instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (12): 41-87, 1849. Fim de rodapé 
21 
 
Inicialmente, o autor traçou um quadro comparativo entre as seções 
norte e sul da Capitania, isto é, entre a zona agroexportadora e a zona 
pecuarista. A primeira, de colonização antiga, estreitamente ligada à 
Metrópole em todos os aspectos; a segunda, fundada pela ação de pioneiros 
e marginalmente incorporada às preocupações coloniais portuguesas. Por 
isso, a comparação efetuada ressaltou as diferenças básicas entre as duas 
porções do Maranhão em termos físicos, econômicos e sociais, o que 
possibilitou a seu autor indicar a criação de duas comarcas, tendo a vila de 
Caxias como elo entre ambas, de modo que elas pudessem “dar-se as mãos 
e sustentar combinadas a sua florescência comercial e agronômica”.17 
Por fim, Paula Ribeiro orientou sua descrição para o exame das 
entranhas da região de Pastos Bons, discorrendo sobre todos os aspectos 
constituintes da área, especialmente no tocante à atividade criatória e à 
singularidade da vida sertaneja. Apontou ele ainda uma série de problemas 
que constituíam obstáculos à expansão da atividade pastoril, indicando, 
sempre que possível, as medidas necessárias para erradicá-los. 
A terceira obra elaborada por Paula Ribeiro foi a Memória sobre as 
nações gentias que presentemente habitam o continente do Maranhão: 
análise de algumas tribos mais conhecidas, processo de suas hostilidades 
sobre os habitantes, causas que lhes têm dificultado a redução, e o único 
método do que seriamente poderá reduzi-las.18 Escrito em 1819, o objetivo 
do trabalho foi consolidar em texto um manancial de informações 
coletadas acerca do gentio maranhense, como resultado patente de largos 
anos em que, como agente do governo português, atuou diligentemente 
para manter contatos amistosos com várias tribos do sertão maranhense, ou 
quando chefiou expedições com claros objetivos punitivos a tribos hostis à 
penetração e fixação do colonizador na região, ou ainda quando esteve à 
frente de expedições visando ao reconhecimento de tribos arredias ao 
contato com a frente de expansão portuguesa. 
Assim esboçada a obra, Paula Ribeiro descreveu com acuidade a 
maioria das tribos existentes na Capitania, especialmente aquelas 
localizadas na região de sua predileção e de convívio frequente. Nesse 
 
Rodapé 17 klem,ibidem,p.4J. 
18 Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (3): 184-1%; 297-323; 39-409. 1841-42. Fim de rodapé 
22 
 
sentido, apontou o nível das relações que cada uma delas travara com a 
vanguarda da colonização e com os colonos já estabelecidos em áreas sob 
a influência gentílica. Também registrou aspectos significativos dos 
hábitos e costumes prevalecentes no cotidiano das tribos descritas. 
Finalmente, analisou a ação de expedições organizadas para reconhecer, 
reduzir ou afugentar o indígena, apresentando sugestões para transformá-lo 
em súdito da Coroa e, evidentemente, em mão- de-obra abundante para a 
consecução dos objetivos primordiais da política colonial lusitana. 
Além dessas obras, Paula Ribeiro deixou cm manuscritos inéditos 
duas outras importantes contribuições: um Mapa geográfico da capitania 
do Maranhão que pode servir de memória sobre a população, cultura e 
cousas mais notáveis da mesma capitania, e a Viagem ao rio Tocantins 
pelos sertões do Maranhão no ano de 1815, por Francisco de Paula 
Ribeiro, 1818. 
O Mapa foi elaborado provavelmente entre os anos de 1815 e 1816, para 
ser anexado aos documentos comprobatórios essenciais da demarcação dos 
limites entre as capitanias do Maranhão e de Goiás, realizada durante parte 
desses anos sob a direção de Paula Ribeiro. Esse mapa, a que, aliás, o autor faz 
menção nas páginas a seguir, não acompanha a presente publicação, por não 
vir nos textos originais publicados pela Revista do Instituto e Geográfico 
Brasileiro. Ignoramos, ademais, se o Instituto ainda conserva tal preciosidade 
em seu acervo. 
Já a Viagem ao rio Tocantins..., admitimos tratar-se de versão mais bem 
refletida do Roteiro redigido para dar conta dos trabalhos demarcatórios, a 
julgar pelo trecho inserto cm publicação feita por Cândido Mendes de 
Almejda.2'’ 
Como ficou demonstrado, a obra de Paula Ribeiro constitui, pois, artigo 
primordial para o exame analítico do Maranhão de seu tempo. Através dela 
fica evidente tratar-se o autor de um intelectual impregnado da “ideia 
colonialista de feição ilustrada, que propunha formas racionais e práticas de 
exploração da riqueza natural e humana da Colônia”.19 20 21 
 
 Rodapé 19 ALMEIDA, Cândido Mendes de. A Carolina, ou a definitiva fixação dos limites entre as 
províncias do Maranhão c de Goiás. Rio de Janeiro: Typ. Episcopal de Agostinho de Freitas Guimarães & 
Cia., 1852, p. 173-186. 
23 
 
A obra de Paula Ribeiro ganhou notoriedade principalmente a partirda 
década de 1840, quando as três basilares foram publicadas na Revista do 
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Tal publicação tornou-se possível 
porque foram os manuscritos doados ao referido instituto pelo conselheiro 
Antônio de Menezes Vasconcelos e Drummond, inclusive o da Viagem ao rio 
Tocantins, ainda inédito. Já o Mapa geográfico também pertence ao acervo do 
IHGB por doação feita pelo coronel Inácio Acioly.2’ 
Desde então Paula Ribeiro passou a ter seu nome incluído nas listas de 
autores importantes da História do Maranhão, sendo, portanto, classificado 
pelas agências regionais de legitimação e reconhecimento como uma 
personalidade tutelar, como um patrono das tradições intelectuais 
maranhenses.22 Foi entronizado como o patrono da cadeira número 12 do 
Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, posição que indica a 
perpetuidade de seu nome através da menção obrigatória de sua obra por 
todos aqueles que ocuparem, naquele sodalício, o assento sob seu 
patrocínio. 
Se a descrição de Paula Ribeiro, quando de sua elaboração, atendeu 
essencialmente a imperativos ligados à atividade prática por ele exercitada, 
a partir do momento em que ganhou publicidade, como fonte primária de 
elevada densidade informacional, passou a cumprir um papel cada vez mais 
saliente para os pesquisadores interessados em compreender melhor a 
evolução histórica da realidade maranhense, em especial o período 
imediatamente anterior à independência do Brasil.
 
20 CABRAL, Maria do Socorro Coelho. A colonização do sul do Maranhão. São Paulo; FAFILECH, 1992, 
p. 22 (Tese de doutoramento, miineo). 
21 MARQUES, César Augusto. Dicionário histórico e geográfico da província do Maranhão. 2" ed. Rio de 
Janeiro; Fon-Fon & Seleta, 1970, p. 605. Fim de rodapé 
Rodapé 22 ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. A ideologia da decadência: leitura antropológica a 
uma história da agricultura do Maranhão. São Luís: ÍPES, 1983, p. 26-46. Fim de rodape 
 
ROTEIRO DA VIAGEM 
que fez o Capitão Francisco cie Paula Ribeiro às fronteiras 
da Capitania do Maranhão e da de Goiás, no ano de 
1815, em serviço de S. M. 
Fidelíssima. 
Aos vinte e três dias do mês de fevereiro de mil e oitocentos e quinze 
embarquei no porto da cidade do Maranhão, metrópole desta capitania (1), 
encarregado de ir fazer, como primeiro comissário por parte do seu 
governador e capitão-general, a sua divisão limítrofe central com a capitania 
de Goiás, a que el-rei nosso senhor mandou proceder pelo seu régio aviso de 
11 de agosto de 1813. A 25 entrei na foz do rio Itapucuru, 16 ou 18 léguas ao 
 
sudoeste do dito porto; e a 26 fiquei no pequeno lugar denominado Pai 
Simão, que consta de poucas e pobres palhoças, tão encobertas dos matos da 
beira-rio, que deste se lhe não vê alguma. Seus habitantes, índios ou mulatos 
libertos, servem assalariados de varejar ou remar algumas embarcações, que 
para os diferentes portos ou fazendas deste rio se dirigem. Nele me demorei 
cinco dias 
Rodapé 1. Os números entre parênteses remetem às Observações (p. 44) que se seguem a esta descrição 
inicial da viagem de Paula Ribeiro. Repare-se, todavia,que lá as notas, encabeçadas pelas letras do 
alfabeto, com subdivisões numéricas, começam pela letra A, enquanto desta cronologia constam 
diversas chamadas antes que apareça a primeira remissão alfabética, a qual se inicia, aliás, pela letra H. 
É assim que está o origina] publicado pela Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 
[(10):5-80, 1848], que não corrigimos, a despeito de algum eventual embaraço aos leitores. (N. do E.) 
fim de rodapé 
30 
 
completos enquanto não chegou a canoa denominada Graça Divina, 
pertencente a Antônio José da Silva e Companhia, que devia conduzir- me 
ao último porto público por ora navegável do mesmo rio, pois que aquela 
em que até ali viera embarcado não fazia nesta ocasião semelhante viagem. 
No entanto, porque já dali tencionava dar princípio às observações que 
premeditava fazer para organizar o mapa do interior da capitania, o qual me 
era indispensável, segundo a natureza desta minha comissão, me dirigi com 
Antônio de Couto, piloto aprovado pela Academia Real das Ciências, ao 
primeiro lugar situado à borda do mesmo rio Itapucuru, pouco mais de 
meia légua distante da grande cachoeira da freguesia, e duas léguas pouco 
mais ou menos distante da embocadura do rio, cujo lugar, que é muito 
antigo e denominado pelos seus habitantes freguesia de Nossa Senhora do 
Rosário (2), e meia légua abaixo de Pai Simão, era o mais suficiente para as 
referidas observações. Viajei depois para outro lugar, que sobre a margem 
leste fica a dez léguas distante, c aonde aportei no dia 4 de março, cujo 
lugar e do Itapucuru-Mirim (3); e dirigindo-me daí com a brevidade a que 
as enchentes do rio, próprias daquele tempo, dão lugar, me achei no dia 21 
do dito mês em o porto da vila de Caxias (4), ficando abarracado no riacho 
de São José, quinhentas braças para o norte do principal corpo da vila, onde 
esperei oito dias que se aprontassem as bestas e cavalga- duras que para 
viajar por terra me eram indispensáveis. Não me demoro a analisar as 
viagens diárias que fiz pelo Itapucuru, porque sendo aquela sua navegação 
já muito conhecida, seria supérfluo o tratar de circunstâncias que 
geralmente se sabem. Devo porém notar que não a continuei mais acima 70 
ou 80 léguas até onde algum tempo principiava a estabelecer-se o 
interessante local que se denominou arraial do Príncipe Regente (5), porque 
não me seria possível encontrar a aquele ponto inteiramente hoje deserto os 
meios de transportar as bagagens da comissão aos povoados centrais, por 
entre os quais é a estrada que infalivelmente eu tinha de seguir. A Junta de 
Real Fazenda do Maranhão me havia expedido, por portaria de 20 de 
fevereiro do mesmo ano de 1815, uma ordem para comprar seis bestas para 
conduzirem o trem da mesma expedição; porém Francisco de Moura de 
Queirós, honrado morador estabelecido com sua feitoria no lugar 
denominado Sucuruju e Bonito, a dez léguas distante de Caxias, me prestou 
31 
 
este importante auxílio, não consentindo que se fizesse ao soberano 
semelhante despesa. Rasgo generoso, que sinceramente publico como único 
recurso que em mim posso descobrir para Iho agradecer; uma vez que a 
dignidade a quem isso competia, depois que lhe fiz oficialmente saber, não 
deu ao menos para o animar esse tão pouco custoso passo. Contam-se do 
Maranhão à vila de Caxias léguas pelo rio 118. Aos 23 dias do mês de 
março dei princípio à viagem por terra, que irei circunstanciando para dar 
uma ideia do país onde viajei. 
Dia 30 de março. Andei três léguas entre os rumos leste c sueste, até 
o pequeno sítio do Rosário, estrada parte plana e parte montanhosa, e duas 
por estrada bem seguida até ao lugar da Pindova, deixando neste caminho, 
em direção ao rumo de leste, a que vai à barra do Poti, cuja estrada (6) 
passa do rio Parnaíba ao Piauí. Todo este caminho acima dito é agradável 
pelo meio de campos cobertos de dispersos arvoredos, areia, pedras miúdas 
e variáveis na cor. 
Dia 31 de março. Andei seis léguas entre os rumos sul, lés-sueste e 
leste, campos agradáveis e parte de um cordão de buritizal minado de 
águas excelentes, encontrando neste caminho o sítio do Riachão, e fiquei 
na feitoria Sucuruju, pertencente àquele Francisco de Moura de Queirós. 
Nela me demorei um dia, mandando arrear as cargas e fazer provisões de 
boca. 
Dia 2 de abril. Viajei cinco léguas e meia entre os rumos su -sueste, 
su-sudoeste, e sul 4° de sudoeste, com o agulhão à vista, por estrada limpa 
e plana, com poucos moradores, e falta de águas. Passei a estrada da 
Passagem de Santo Antônio, o lugar do Bonito, e fiquei por noite no lugar 
chamado Espora. 
Dia 3 de abril. Viajei quatro léguas nos rumos sudoeste, oeste e oés-
sudoeste, por entre matos limpos, epoucos campos até ao lugar de São 
José, chamado do Vicente; estrada boa, porém também falta de água até 
sair fora da mata da Espora. 
Dia 4 e 5 de abril. Nestes dias não excedeu de quatro léguas a 
viagem até a fazenda e riacho Serra, limites antigos entre os termos de 
Pastos Bons e Caxias (quando felizmente eram separados), o caminho foi 
no quadrante do sudoeste. Estrada excelente de areia pouco solta, campos 
32 
 
cobertos, algumas porções de matos e faltas de água. 
Dia 6 de abril. Andei oito léguas no rumo do oeste até a fazenda 
Tiquaras, que pertence a Francisco Germano, tendo deixado à esquerda as 
estradas da Beirada e Terra Vermelha. Esta última, é no rumo do sueste, se 
encontra outra vez em São Domingos com a que vou descrevendo. Neste 
dia atravessei pequenas serras, espaços de matos, campos, tabocais, e um 
grande alagado a que chamam o Tremedal: passagem esta impraticável pelo 
inverno, por isso que nesse tempo deve seguir-se aquela da Terra Vermelha. 
Uma e outra são abundantes de água. Nesta travessa há despovoadas 
algumas fazendas pelos índios Timbiras das matas. 
Dia 7 de abril. Viajei quatro léguas no rumo sudoeste. Estradas sobre 
serras; poucas planícies, e nestas, areia, pedras, pequenas inatas, palmeirais, 
e campos cobertos até à fazenda de São Domingos, hoje despovoada. Na 
tarde deste dia encontrei obra de quinhentos índios, que iam ver a vila de 
Caxias, e eram da nação a que os habitantes chamam Canelas Finas. 
Dia 8 de abril. Andei cinco léguas nos rumos su-sudoeste e oés- 
sudoeste por entre pequenas matas guarnecidas de palmeiras. Estrada 
algumas vezes por cima de serras pedregosas, fazendo grandes subidas e 
descidas, terrenos de barro preto e vermelho. Neste caminho passei o riacho 
do Corrente (7), cuja barra faz também pelo lado do Itapucuru a externa do 
distrito com Caxias, quando naquele se mete. 
Dia 9 de abril. Viajei cinco léguas e meia, passei pelo lugar Piaçaba. 
Estrada entre os rumos sudoeste 4° de sul e oés-sudoeste, em que parte por 
campos é plana, e em parte por serras, pedra solta, terras pretas ou 
vermelhas, mas com abundância de águas, e buritizais continuados por 
distância longa. Fiquei no lugar denominado Passagem, em que há vários 
atoleiros ou terrenos alagados, e poucos moradores. 
Dia 10 de abril. Andei quatro léguas nos diferentes rumos sul, 
sudoeste c norte; tal é a tortuosidade da estrada na fazenda Inhuma, 
pertencente a Francisco Pereira Franco. Nela me demorei o dia 11, 
provendo-me de mantimentos. A estrada foi como a do dia antecedente. 
Dia 12 de abril. Viajei seis léguas e meia nos rumos sudoeste, 4o de 
sul, su-sudoeste, sul e oeste 4° de sudoeste; estrada trabalhosa, parte 
alagada e parte por matos c campos. Fiquei na fazenda chamada Brejo, que 
33 
 
pertence a Narciso Gomes de Gouveia; e aqui neste caminho atravessei a 
mata do Taboleirão (H). 
Dia 13 de abril. Viajei cinco léguas e meia no rumo de sudoeste 4o de 
oeste por estrada má, terra de massapé preto e vermelho, escorregadio, 
serras e campos cobertos, com alguns alagadiços encostados ao riacho 
Balseiro. Neste caminho atravessei o pequeno lugar dos índios Amanajós 
(I), e fui ficar no lugar matriz ou capital de Pastos Bons (L), meia légua 
distante, até ao dia lº de Maio, para dar o descanso e penso suficiente aos 
cavalos, comodidades que só naquele lugar se encontram de uma forma que 
aproveitem, e também para dar à capitania de Goiás, segundo as ordens que 
tinha, os avisos deste fim para que me dirigia, esperando no entanto que 
declinassem as águas do inverno, que muito até ali me tinham mortificado. 
Dia 2 de maio. Andei seis léguas até a fazenda do Alegre, que 
pertence à viúva Paula Fernandes Lima. Estrada sem água, mas bem 
assentada e por campos cobertos até descer junto à dita fazenda a serra de 
Itapucuru, sobre que vinha desde Pastos Bons. Os rumos foram su-sudoeste 
e oés-sudoeste, A descida da serra não é íngreme, porém sim dilatada, e por 
entre penedos. A confluência dos dois rios Itapucuru e Alpercatas já fica 
para baixo algumas léguas: a distância de um a outro será de 12 a 14, e 
entre o Itapucuru com Parnaíba será de quatro a cinco: uma e outra 
distância sempre por campos. 
Dia 3 de maio. Fui ficar à fazenda de João Martins Jorge, 
denominado o Bonito, depois de andar três léguas nos rumos sudoeste e sul 
por estrada pouco assentada, pedra solta, e por entre pequenas serras. Águas 
poucas e salobras. 
Dia 4 de maio. Viajei seis léguas a diversos rumos no quadrante do 
sudoeste, caminho plano em partes, e em partes montanhoso: serras 
continuadas, e poucas águas. Subi e desci a serra Itapucuru, chamada ali 
chapada dos Três Morros, e fiquei na fazenda deste nome, que pertence a 
José Carvalho, a qual assim se denomina por se situar entre três elevados 
montes. Aqui finaliza a ribeira do alto Itapucuru, depois de se ter dilatado 
desde o riacho Serra, sempre a oeste desta estrada. 
Dia 5 de maio. Andei sete léguas; subi outra vez a serra do Itapucuru, 
e a fui descer na fazenda Vereda Grande. Os rumos deste dia foram oés-
34 
 
sudoeste, oeste e sudoeste, estrada por campos cobertos, e, na maior parte, 
sem água. Nesta fazenda há um excelente riacho, e tem não só bons matos 
para lavoura, porém também famosos campos para criar os gados. 
Dia 6 de maio. Passei pela fazenda Serra Vermelha, que pertence a d. 
Luísa Maria dos Reis, e fui ficar no riacho Saco, depois de andar neste dia 
cinco léguas, e de ter subido novamente e descido a mais alta ponta da serra 
de Itapucuru. O rumo a que viajei foi oeste Va sudoeste: caminho péssimo 
sobre serras talhadas a prumo, e correndo a todos os rumos. Este foi o 
espaço mais montuoso que encontrei, muito falto de águas no verão, ou sem 
alguma; devo porém, quanto a esta falta de águas, advertir que só se 
encontra na estrada porque esta se dilata quase sempre sobre os montes, 
áridos em suas planícies, e não porque os terrenos entre os mesmos matos 
sejam carecidos desse artigo. 
Dia 7 de maio. Passei o riacho Batateira e a fazenda deste nome, já 
despovoada, e fiquei na do Bacuri, que pertence a Manuel de Cerqueira. 
Estrada boa no rumo sudoeste por campos cobertos; porções de mato sempre 
por entre serras, e bastantes águas: andei seis léguas. 
Dia 8 de maio. Andei cinco léguas entre vários rumos no quadrante do 
sudoeste à fazenda da Gameleira, pertencente ao velho José de Oliveira 
Cabral, e fui ficar no riacho Água Branca. Caminhos por excelentes campos 
e buritizais abundantes de boas águas. 
Dia 9 de maio. Depois de andar três léguas e meia no rumo oeste, 
fiquei na fazenda de São José, pertencente a José Alves Lisboa. Encontrei 
boas águas correntes e boa estrada; pouco distante ao sueste desta fazenda 
entra no rio de Balsas o rio de Neves, e principia a um lado e outro deste 
último a ribeira de seu nome, que se estende para oeste e para o noroeste. 
Toda esta travessa contém, assim como todo o terreno da fazenda Alegre 
para cima, os mais excelentes e desembaraçados campos para criar os gados, 
que, apesar de nascerem e de se criarem nos capins chamados agrestes, 
únicos pastos gerais de que são próprios estes sertões do sul da capitania do 
Maranhão, têm contudo pela sua grandeza de corpo, gordura e aptidão para 
grandes marchas, muito mais valor nas feiras do Itapucuru do que todos os 
outros gados da capitania do Piauí, menos vistosos, sem diferença do que os 
de Balsas e Pastos Bons. 
35 
 
Dia 10 de maio. Andei légua e meia por terreno cortado de 
abundantes e deliciosas águas, com agradável arvoredo e pequenos montes 
em pouca distância a um e outro lado da estrada. Passei o rio Neves na sua 
principal passagem denominada o Bom Jardim, e deste rio, em distância de 
duas léguas, fui ficar na fazenda chamada Cabeceiras, que pertence a 
Antônio José Tavares. Foi o rumo deste dia inteiro oés-noroeste, c todo o 
caminho por excelentes campos. Esta passagemdo rio terá talvez na sua 
largura 12 ou 14 braças, e o seu fundo, no maior auge do verão, não excede 
nem diminui de quatro palmos. Também é navegado pelo inverno em balsas 
ou jangadas de buriti e talos de coco de palmeira, levando nelas os 
habitantes desta ribeira ao rio Balsas, e por este ao Parnaíba e seus portos de 
exportação comerciável, todos aqueles gêneros em que podem fazer o 
comércio. Logo a 60 ou 70 braças distante da margem sudoeste deste rio 
Neves se divide em duas esta estrada que descrevo, e a da esquerda vai 
entranhar-se por todo o lado de leste da ribeira de Balsas até se tornar a 
encontrar com esta da direita na fazenda do Saco, 17 léguas adiante daquela 
separação dentre ambas. 
Dia lide maio. Andei seis léguas nos rumos norte 4o do noroeste, norte 
e nordeste. A estrada foi, como a do dia antecedente, agradável e com 
abundância de muitas águas em partes. Fiquei na fazenda denominada 
Peixe, cujo proprietário é Antônio Lopes Torrão, aonde me demorei uma 
tarde esperando se aprontasse um guia para entrar no pequeno deserto que 
dali se encontra de 11 léguas até a fazenda denominada o Saco. 
Dia 12 de maio. Viajei duas léguas até o riacho apelidado Faca, caminho 
plano sobre largos campos agradáveis cobertos espaçosa- mente de muitos 
viçosos arvoredos, e com notável abundância de boas águas; porém espaço todo 
este muito falto de comunicação. 
Dia 13 de maio. Andei seis léguas e meia ao rumo oeste, sudoeste e sul. 
Subi a serra que se apelida Chapada do Saco, e fiquei toda a noite sobre ela, 
padecendo grandes sedes eu e os da minha comitiva. O caminho foi bom e por 
campos desafogados, porém muito solitários e faltos de água no verão. 
Dia 14 de maio. Andei três léguas, e desci a serra chamada o Saco (M), 
cuja ponta rodeei, e depois de andar mais légua e meia fiquei na fazenda deste 
nome, que pertence ao capitão José Fernandes dos Reis. Nesta me demorei até o 
36 
 
dia 17 do mesmo mês de maio, assim para me prover de guias e mantimentos, 
como de alguns cavalos de que já vinha falto; recursos estes que me foram 
gratuitamente prestados pelo dito capitão em serviço de S. Majestade, tratando 
toda a tropa da expedição com o maior agasalho possível, e facilitando tudo o 
que naquela sua fazenda houvesse para os auxílios da mesma. Louvável 
conduta, que não participei à capital, porque certamente teria a minha 
participação igual sucesso ao daquela que fiz dos serviços de Francisco de 
Moura de Queirós. O rumo deste dia foi ao noroeste 4o do oeste por estrada boa 
e farta de águas excelentes. Deste lugar em diante se não vê mais a serra 
Itapucuru, que ali em mais ou menos distância se avistava pela parte do oeste. 
Dia 18 de maio. Andei quatro léguas e meia no rumo principal desse dia, 
noroeste; caminho um pouco áspero por campos e serras: passei o riacho 
Cachoeira (N), a fazenda do Campo largo, que pertence a José Sebastião, e 
pernoitei na das Porteiras (O), que pertence aos herdeiros de Vicente Ferreira de 
Brito. 
Dia 19 de maio. Viajei sete léguas no rumo do noroeste 4o de oeste; 
passei a fazenda do Macapá sobre a margem sudoeste do rio do mesmo nome, 
que também atravessei de vau, tendo nesta passagem a largura de oito braças: 
pertence aquela fazenda aos mesmos herdeiros 
acima nomeados. Passei a fazenda dos Capotes (P), cujo proprietário é o 
alferes Antônio Francisco dos Reis, e fiquei no riacho denominado o Cocai. 
A estrada foi terrível, por terrenos alagados, massapé ou barro preto 
gomoso, atoleiros continuados, e muito más passagens nos riachos correntes 
(Q). Ao nordeste das cabeceiras do rio Macapá, e ao noroeste da já passada 
ribeira de Neves, se estende a do Grajaú. 
Dia 20 de maio. Andei sete léguas ao norte, a oeste e a oés- noroeste, 
ficando no riacho Primavera, depois de ter passado pela fazenda das 
Contendas, que pertence ao velho Sousa Carneiro. O caminho continua a ser 
mau como o do dia antecedente. 
Dia 21 de maio. Viajei seis léguas e meia entre diversos rumos para o 
quadrante de oeste, e fiquei adiante da fazenda do Boqueirão (R), 
pertencente a Anacleto Ferreira de Sousa, havendo já de manhã passado a 
fazenda Santo Antônio, que pertence a Manuel Germano da Silva, e por 
entre estas fazendas atravessei o rio Farinha, poucas léguas ao noroeste da 
37 
 
sua nascente, na serra das Covoadas; ele é nesta passagem tão pouco 
importante, que apenas se distingue de pequeno córrego. A estrada foi por 
campos de uma largura imensa, em partes abundantes de água, e em partes 
faltos. 
Dia 22 de maio. Entrei na pequena travessa que por esta estrada ainda 
se acha deserta, a leste do rio dos Tocantins, nos distritos da capitania do 
Maranhão. Andei seis léguas no rumo oeste por dilatados campos despidos 
de árvores sombrias, sertão de fastidiosa jornada até as margens daquele rio, 
exposto sem abrigo aos intensos ardores do sol, atravessando repetidos 
bancos de areia solta, que atola a meia perna das cavalgaduras, e às vezes 
com poucas águas para saciar ao menos as sedes que promovem em 
semelhantes jornadas os calores do sol do meio-dia. 
Dia 23 de maio. Viajei seis léguas no rumo sudoeste, e fui perto do rio 
Manuel Alves Grande. Passei o riacho Itapucuruzinho (S) e fiquei adiante 
nas cabeceiras de um brejo de buritizal. O caminho foi pouco melhor do que 
o do dia 22, porém mais abundante de excelentes águas. 
Dia 24 de maio e último desta jornada para o sul. Andei sete léguas 
até a povoação de São Pedro de Alcântara (T), aonde cheguei 
 
às oito horas da noite. O rumo foi ao noroeste 4o de norte; o caminho meio 
alagado, e campos de má qualidade, depois da passagem do riacho das 
Lages, tais quais os antecedentes despidos de verdura, com areias e vargens 
lodosas, algumas travessas de matos fixados, passagens estreitas, sujas, 
atravancadas de árvores caídas, e finalmente próprias só dos habitantes que 
por ali fazem as suas moradas. Três meses nos demoramos pela primeira 
vez neste lugar, aonde toda a nossa sociedade foi com os selvagens Caraús 
(U): diariamente éramos visitados em tanto número, que chegavam por 
vezes a mais de quatrocentos, com o que nós, por sermos bem poucos, não 
nos satisfazíamos muito, e pior porque não tínhamos tabaco de fumo para os 
presentear, nem sal, de que eles recebem por grande mimo qualquer 
punhado. Goiás tinha tido aqui um pequeno destacamento, que havia dias 
mandara levantar, mas ainda à nossa chegada pago ali pela fazenda d’el-rei 
nosso senhor o capitão Torquato Urge] de tal, destinado à instrução e 
catequização dos Caraús (X), ainda que enquanto ali estive nunca vi a 
menor disposição deste negócio, nem de outros que não fossem no geral 
preparativos de guerra sobre diversas nações selvagens comarcãos (Z), com 
o que não éramos contentes; principalmente nas ocasiões em que, 
realizando-se estas expedições, ficávamos solitários no lugar, porque 
temíamos que no entretanto viessem a ele algumas numerosas porções dos 
escandalizados índios, e nos metessem também 11a conta da desforra que 
quisessem tomar pelas violências (K) que só sofriam. Em uma palavra, foi 
um dia de prazer que tivemos aquele em que nos achamos fora dali para 
voltar, como voltamos um ano depois, à nossa capital, a dar conta daquela 
comissão, que só se ultimou em 9 de julho de 1816. 
OBSERVAÇÕES 
A 
A capitania do Maranhão, que está dividida da capitania do Piauí pela 
margem oeste do rio Parnaíba, da do Pará pela margem leste do rio Turi, e da de 
Goiás ao sudoeste pelo rio Manuel Alves Grande, até este desembocar no rio 
Tocantins, que correndo de sul ao norte lhe fecha com a do Pará aquela sua 
divisão de oeste, se estende no seu cumprimento, linha nordeste-sudoeste desde 
 
o mar até ao dito rio Manuel Alves Grande, a distância pouco mais ou menos de 
180 léguas, com a maior largura ou longitude de 90 a 100, desde o Parnaíba ao 
Turi e ao Tocantins. 
2. Entre as bocas dos referidos Parnaíba e Turi,pontos limítrofes 
entre Piauí, Maranhão e Pará, saem ao mar pelo longo da costa do 
Maranhão, discorrendo leste para oeste, os principais rios que acompanham 
quase toda a latitude da capitania, e que vêm a ser o Munim, o célebre 
Itapucuru, o Miarim e o Pinaré, todos eles com suficiente largura, e mais ou 
menos navegáveis. A estes se ajuntam os de Balsas, Balsinhas, Alpercatas, 
Neves, Macapá, Canela, Grajaú e Farinha, regando a parte superior dos 
sertões da mesma capitania no distrito de Pastos Bons, o mais extenso e o 
mais precioso espaço dela, e em o qual todos estes rios nascem. 
3.0 terreno vizinho à foz daqueles primeiros quatro é povoado de 
fazendas de gado vacum, onde são campos descobertos, a que seus 
habitantes chamam Perizes ou de Lavradores, onde há matos próprios de 
cultura, e se divide também de leste para oeste, não falando na- beira-mar, 
de que não trato por ser assaz conhecida, em distritos ou freguesias centrais: 
Icatu, nas vertentes do Munim, Rosário, nas do Itapucuru, Nossa Senhora da 
Vitória, nas do Miarim, e Viana ou Monção, nas do Pinaré. Todo o mais 
espaço ao sudoeste entre as três últimas e o Tocantins é possuído por muitas 
nações gentias indomés- ticas. As freguesias do Rosário e Icatu extremam 
ambas para o centro com a do Itapucuru-Mirim, depositada entre elas com 
as de Caxias e São Bernardo: Caxias com a de Pastos Bons, a maior delas e 
última que sueste, sul e sudoeste, divide da de Goiás toda a capitania do 
Maranhão, que também por ele se divide da do Piauí em muita parte da sua 
extrema leste. 
4. Povoada assim em toda a largura somente nos distritos vizinhos ao 
mar, vai levando pela banda de leste encostada aos rios Parnaíba e Balsas, 
quase em todo o seu cumprimento sudoeste, uma única tira de terra 
habitada, que principia a estreitar-se desde o meio baixo Itapucuru até a 
passagem do rio Neves, porque daí suas povoações tornam a estender-se 
para oeste rodeando as cabeceiras do mesmo Itapucuru e as do Alpercatas 
até se encostar ao Tocantins pelas fazendas Boqueirão, fazenda grande de 
Elias Ferreira Barros, e outras. A parte em que menos se alarga é das alturas 
 
do lugar capital de Pastos Bons para o sul até ao riacho Batateira, onde entre 
o arraial do Príncipe Regente e o Tocantins lhe fica para oeste um 
desconhecido de mais de 80 léguas, possuído somente por aquelas já ditas 
nações gentias. 
5. Além deste deserto, também o é muita parte do terreno que se 
encaminha ao sul por entre os rios Manuel Alves Grande, Altos, Parnaíba, e 
Balsas, o qual se corta por uma grande parte deste último, se não tão dilatado 
como aquele, nem tão importante, pois que apenas consta de infrutíferas e largas 
campinas arenosas, quando o outro todo contém os mais fecundos matos da 
capitania. 
6.0 país mais central da mesma capitania do Maranhão principia a ser 
montanhoso no distrito de Pastos Bons, e se estende acima até perto do rio 
Macapá. Seus montes, posto que não consideráveis, à exceção da serra do 
Itapucuru, são contudo imensos, confusamente dispostos, e correndo a diversos 
rumos. Sobre eles, ou sobre aquela serra, é que se contém a maior parte das 
planícies desta porção de terreno, c o outro espaço entre o mesmo rio e o 
Tocantins consta de campos dilatados quanto avista pode alcançar, pelo meio dos 
quais se levantam pequenos montes de pedras ou escalvados, tão insignificantes 
alguns deles que não chegam a cem braças no diâmetro da sua base. 
7. A serra do Itapucuru, chamada assim dos seus habitantes por lhe correr 
vizinha uma grande parte daquele rio ao seu noroeste, dividindo-lhe ela suas altas 
vertentes das do Parnaíba, principia seis léguas ao noroeste da matriz de Pastos 
Bons, na fazenda chamada Brocotó e Pedras, pertencente a Zacarias Gomes de 
Gouveia. Corre para sul até as cabeceiras do Itapucuru, e destas vai declinando 
para o noroeste por entre as do rio Neves e do Alpercatas até finalizar perto das do 
Miarim, muito para oeste da fazenda chamada o Engano, que 
41 
 
pertence hoje aos filhos de Vitorino Pais de Araújo. É assim dilatada 
comprimento, porém estreita em partes, tanto que para qualquer dos seus lados se 
lhes acham prontas descidas, e nestas águas muito excelentes, contanto que não 
vertam para o Itapucuru. A estrada para o Tocantins vai algumas vezes por muito 
tempo sobre ela, e a sua subida maior que encontrei não excede quarenta braças 
perpendiculares. O distrito tem outras serras menos importantes. 
8.0 rio Itapucuru vem de um buritizal junto às fraldas da mesma 
serra; tem mais de 250 léguas de corrente, segundo a multidão confusa de 
suas voltas, e dele tenho eu viajado toda aquela parte que tem navegável 
desde a sua foz no mar até a fazenda do Alegre, em Pastos Bons, a qual 
pertence à viúva Paula Fernandes Lima: deste estabelecimento para o 
sudoeste pouco mais terá de 50 a 60 léguas, e c inavegável. 
9. Corre do sudoeste ao nordeste pouco importante até se ajuntar 
com o rio Alpercatas, que em si o recebe naquele lugar, em que já esteve 
estabelecida a povoação do arraial do Príncipe Regente, com águas deste 
rio, com as do riacho do Corrente, que encontra ao entrar no território da 
vila de Caxias; e para baixo desta vila com as dos riachos Ouro, Limpeza, 
Gameleira, Riachão, Codó, Prata, Pirapemas, Peritoró e outros, se faz de 
considerável navegação. 
10. Desce desde a sua origem por entre campos gerais até ao dito 
Alpercatas: deste rio para baixo à parte de leste lhes ficam matos ou lados 
de campos por fora, em mais ou menos distância; e pela parte de oeste, até 
desaguar no mar 18 léguas ao sudoeste do porto do Maranhão, corta várias 
pontas de mata grande ou geral, que vêm da capitania do Pará. 
11. São turvas e lodosas as suas águas, tão quentes no verão durante 
a noite que amanhecem fumegando: utilizam então muito os seus banhos, 
porque são medicinais; porém, logo que lhe sucedem as chuvas, ou que no 
fim destas principiam suas barreiras a descobrir- se, tornam-se elas 
perniciosas e até perigosos os seus ares para respirar. Assim o mostrou, 
além de outras vezes, a experiência, em o ano de 1805, a cuja invernada, 
que inundou léguas de centro, se seguiu a epidemia maior que ainda teve o 
Itapucuru, e que foi a mais fatal para os seus habitantes; advertindo contudo 
que esta somente apareceu, como sempre, da Cachoeira Grande para o 
norte, sem que daí para o sul até às suas cabeceiras se sentisse a mais 
42 
 
mínima influencia deste contágio, o que assevero como observador que em 
tal ocasião residia naqueles lugares, e o motivo desta diferença assaz se 
coligirá do que vai adiante dizer-se a n. 21. 
12. Do lugar Itapucum-Mirim para baixo chega a sua maior largura 
a trezentos passos, embora lhes não permitam nestes lugares algumas 
notícias que dele tenho ouvido mais do que a de quarenta a cinquenta: 
daqui para cima até ao rio Alpercatas terá a de setenta a cem; porém, já 
deste apartado, e até à fazenda do Alegre, não excede a de vinte e cinco. 
13. Esta última distância c, por ser assim estreita, muito custosa de 
navegar, pois que as imensas árvores que das ribanceiras lhes fazem 
continuamente debruçar, as invernadas formam outros tantos embaraços 
dificultosos de superar por sua multidão e grossura. Espaço houve de dez 
braças em que para o navegar foi preciso desembaraçá-lo de outras tantas 
grandes palmeiras, quando em o ano de 1802 me fiz transportar daquela 
fazenda Alegre, na sua borda, para a do Bom Sucesso, que pertence a Félix 
Martins Jorge, pequena distância de dez léguas, em que por aquele mesmo 
motivo me demorei cinco dias descendo para baixo. Todo o outro resto 
deste rio é limpo, largo e de bom fundo, exceto nos lugares das suas já bem 
conhecidas cachoeiras. 
14. Antes de se unir ao Alpercatas tem a pequena cachoeira de Santa 
Ana, que não é mais do que um vazio de poucas e miúdas pedras: depois de 
se juntarem tem as das Três Irmãs, formada por outrostantos penedos que, 
sobressaindo à superfície das águas, se perfilam na largura de todo o rio, 
deixando porém entre si canais suficientes. Segue-a do Sanharó, poucas 
braças abaixo de São Zacarias (abandonados estabelecimentos que 
pertenceram à família dos Fernandes, de Caxias) e desta em diante no 
espaço de 17 léguas até a dita vila de Caxias se encontram 22 cachoeiras, 
das quais a mais perigosa de todas é a do Canal Torto. Estes pequenos 
obstáculos são o motivo, segundo me dizem, de não o viajarem canoas 
grandes para o sudoeste daquela vila; porém em quanto ao que me parece, a 
falta de inteira precisão é a sua única causa, porque se a população e cultura 
desta grande e mais vantajosa parte do rio se facilitar algum dia (o que não 
tem ainda sucedido por falta de sérias providências, escassas naqueles que 
deveram ter animado a dita população e cultura, o que é muito para 
43 
 
lastimar, pela razão de haver sido em grande prejuízo dos interesses d’el-rei 
nosso senhor e do bem público) o interesse desses que então existirem fará 
remover os pretendidos obstáculos, com a mesma facilidade com que se 
removeram aqueles que antigamente o receio também nos fantasiava na 
idéia que se fazia da sua navegação, hoje mais frequentada, sem que já 
lembrem a Cachoeira Grande, a do Angical, a dos Gatos, Barriguda, e 
outras, para que delas ao menos se trate, sendo por isso mesmo que também 
eu delas nesta ocasião me esqueço. Uma légua acima da foz do rio está a 
grande cachoeira chamada da Freguesia: esta se passa para cima com meia 
maré de cheio, e para baixo na ocasião da preamar. É, com efeito, a mais 
considerável de todo ele, e muitas embarcações não dispensam os práticos 
cm semelhante passagem, que ali sempre acham prontos por sua ganância. 
Na margem oeste do rio sobre a mesma cachoeira se divisam ainda os 
fragmentos de um pequeno fortim, que ali construíram os holandeses 
quando possuíram a capitania, e que há poucos anos acabou de se arruinar. 
Ter ia sido grande prudência o haver-se conservado, cousa que custava bem 
pouco, como chave dos sertões da capitania por aquele lado, pois que, no 
caso de futuras precisões, o auxílio da referida capitania não permitiría 
passar por ali contra a vontade de qualquer pequena guarnição que ali 
tivesse o mais ligeiro barco de pescadores. O que também se faz digno de 
reparo a seu respeito é a criação de um atual governador seu, muito tempo 
depois que ele se havia evaporado. Deve advertir-se que todas as 
cachoeiras, à exceção desta, são apenas trabalhosas no verão, quando, por 
se diminuírem as águas, também o rio em partes se diminui de fundo; e por 
isso fica bem entendido que é fácil de navegar todo ele, logo que as do 
inverno Iho tornam a restituir.
 
15. Bastantemente tortuoso, muito mais de Caxias para cima, é por 
essa causa que as suas repetidas voltas, ao mesmo tempo que lhe fazem 
longa a navegação, também lha tornam suave quebrando em remansos nas 
enseadas ou seios das referidas voltas o ímpeto da corrente furiosa, que a 
não ser por isso se faria insuperável na subida. 
16. A porção de terra mais importante que ele rega é, como já disse, 
aquela ainda hoje inculta que se contém para baixo do Alpercatas até perto 
da vila de Caxias, não tanto por maior, como por ser de mais vantajosa 
cultura; e seriam incalculáveis os interesses resultados, se todas se 
aproveitassem, porque a capitania do Maranhão não tem outra mais própria 
para a agricultura. 
17. Da freguesia do Rosário até aquela vila é por um e outro lado 
povoado de ricos lavradores, que se estendem ao centro mais ou menos, 
conforme lhes permite a situação das suas sesmarias; e de São Zacarias 
para cima ainda deserto, pela razão já dita; está sem embargo disso 
repartido aereamente em datas tão numerosas, que há três e quatro títulos 
de uma só porção de terras conferidos a diferentes sesmeiros: quando para 
o futuro aconteça demarcá-las (o que não sucederá enquanto, para que se 
reduzam os índios que as habitam, se não mudar do sistema já notado a n. 
14), não dará pouco que fazer aos tribunais o progresso das suas demandas; 
no entretanto que era melhor ter concedido menos, para aproveitar mais, 
promovendo, quando outra utilidade não fosse, aquela que resulta à 
sociedade, se esta se poupa aos resultados da intriga, que de ordinário 
sempre provem na maior parte daquelas relações de interesses que os 
homens entre si formam, de terem uns mais do que outros, ainda que não 
seja para lhe dar outro uso além do pasto da mesma intriga. 
18. Já em outro tempo foram povoados seus campos em Pastos 
Bons, os melhores para a criação dos gados, com mais de sessenta 
estabelecimentos, formando parte da alta ribeira do Itapucuru, uma das 
mais populosas do distrito: porém, aqueles gentios, e outros que com eles 
se confinam para o sul, os tornaram a verter em solidões, distraindo-lhes a 
maior parte dos ditos estabelecimentos, tanto que apenas hoje lhe resta o do 
Riachão, pertencente a Henrique Raposo 
45 
 
do Amaral, e este mesmo quase exaurido. A falta de providências e de 
socorros pelas competentes administrações desse e de outros tempos tem 
sido causa de tamanhos males, que por consequência não trouxeram nem 
trazem ainda hoje menos do que insanáveis prejuízos nos rendimentos da 
Real Fazenda, na falta e na carestia dos mesmos gados, que o público de 
então utilizava muito mais abundantes e baratos do que agora, vindo 
presentemente daqui, e de outras iguais ou maiores devastações, que 
naqueles lugares ainda se consentem, sem remediar-se o principal motivo 
do grito público, que consternado hoje, como se vê pela sensível falta deste 
gênero, tanto da primeira necessidade, quase que já não acha recursos de 
que lançar mão para viver ou para enxugar as lágrimas dos seus inocentes 
filhos. 
19. Os únicos lugares públicos da sua borda são o da freguesia do 
Rosário, o de Itapucuru-Mirim e a nova vila de Caxias: fronteiro a esta está 
também o pequeno lugar dos índios de Trezidelas, e pouco acima do de Pai 
Simão o dos índios de São Miguel. Destes dois últimos os habitantes não 
são a centésima parte dos que já foram: porque, tiranizados pelos diretores, 
que em outro tempo tiveram tirados à força para o serviço dos dizimeiros, 
canoas e arsenais (violências que em parte ainda hoje se praticam), sem se 
lhes pagar por ajuste, conforme lhes conviesse, se extraviaram fugindo das 
suas povoações, estes e os de todas as outras em iguais circunstâncias, e que 
tanto algum tempo nos custaram a domesticar ou fazer descer das suas 
montanhas para a nossa sociedade. 
20. Não consta por ora haver nas margens deste rio ou nos seus 
terrenos centrais sinal algum fisicamente conhecido de que se lhe devam 
encontrar minerais quaisquer que forem; nem que elas ou eles sejam 
próprios de pedras preciosas, o que também atribuo à falta de uma 
verdadeira investigação em forma e por pessoas que fossem susceptíveis 
desses conhecimentos, porque, a havê-la, talvez descobririam de propósito 
o que o acaso fez muito indiferentemente descobrir a João Benedito Gaspar 
Guifinigg, um tenente do regimento de linha desta capitania, que na ocasião 
em que eu agora o naveguei também ele o navegou com certo número de 
tropa a destacar em Caxias às ordens do juiz de fora e desembargador Luís 
de Oliveira e Almeida. Este oficial me mostrou uma pedra, que disse haver 
46 
 
encontrado junto d’água no porto da fazenda de Tomás Tavares da Silva: 
tinha ela mais de uma polegada no seu comprimento, com largura e 
grossura de menos de meia, e me pareceu um topázio, como tal o asseverou 
esse mesmo oficial, que não deixa de ser curioso para semelhantes 
observações. 
21. Da vila de Caxias para cima são raras as suas ribanceiras, c em muita 
parte fáceis de alagar o terreno; o que, dando motivos às inundações centrais no 
tempo das invernadas, faz com que estas águas, varrendo para o rio toda a

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