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LIVRO-ETNOBOTÂNICA-E-ETNOFARMACOLOGIA

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ETNOBOTÂNICA E ETNOFARMACOLOGIA 
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Sumário 
 
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 3 
1. INTRODUÇÃO ................................................................................ 4 
2. AS ORIGENS DO SISTEMA POPULAR BRASILEIRO DE 
PLANTAS MEDICINAIS SÃO AS SEGUINTES: ................................................ 7 
3. PLANTAS MEDICINAIS ............................................................... 10 
4. OBJETIVOS DA ETNOBOTÂNICA .............................................. 12 
5. APLICAÇÕES DOS USOS TRADICIONAIS DOS VEGETAIS PELO 
HOMEM 13 
6. O QUE É ETNOFARMACOLOGIA? ............................................. 14 
7. CRITÉRIOS PARA ACHAR UM REMÉDIO .................................. 17 
7.1. COLETA RANDÔMICA ............................................................. 18 
7.2. QUIMIOTAXONOMIA ................................................................ 18 
7.3. ZOOFARMACOGNOSIA ........................................................... 18 
7.4. ETNOFARMACOLOGIA ............................................................ 18 
7.5. ECOLOGIA QUÍMICA ............................................................... 19 
8. MUNDO DESCONHECIDO .......................................................... 19 
9. ATLAS DA BIODIVERSIDADE ..................................................... 21 
10. BIOMAS BRASILEIROS ............................................................... 22 
11. REMÉDIOS GENUINAMENTE BRASILEIROS ............................ 23 
12. NATUREZA E GENTE .................................................................. 24 
13. MEDICINAS DIFERENTES .......................................................... 25 
14. DESAFIOS DA ETNOFARMACOLOGIA ...................................... 25 
15. TRABALHO DE CAMPO .............................................................. 27 
16. ESTADA DE UM ANO .................................................................. 28 
2 
 
 
17. OS LABORATÓRIOS DA FLORESTA ......................................... 29 
18. CORRIDA PARA PRODUZIR REMÉDIOS ................................... 31 
19. LADO BOM E LADO RUIM .......................................................... 32 
20. COMO OS ÍNDIOS DESCOBREM OS REMÉDIOS? ................... 34 
21. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................... 35 
22. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................. 36 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3 
 
 
 
NOSSA HISTÓRIA 
 
 
A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de 
empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de 
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como 
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. 
A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de 
conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a 
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua 
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, 
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o 
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. 
A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma 
confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base 
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições 
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, 
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
 
1. INTRODUÇÃO 
Figura 1: Etnobotânica e etnofarmacologia. 
 
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Etnobot%C3%A2nica 
O reino vegetal, além de ser o maior reservatório de moléculas orgânicas 
conhecido, é um poderoso laboratório de síntese. Até hoje diversas moléculas 
com estrutura complexa dependem de síntese biológica, pois a síntese em 
laboratório não pode ser feita ou é economicamente inviável, como é o caso dos 
digitálicos, da pilocarpina ou dos esteróides. 
Por isso plantas medicinais são usadas até hoje como matéria-prima para 
a fabricação de medicamentos. 
As plantas medicinais têm sido um importante recurso terapêutico desde 
os primórdios da antigüidade até nossos dias. No passado, representavam a 
principal arma terapêutica conhecida. 
Em todos os registros sobre médicos famosos da antigüidade, tais como 
Hipócrates, Avicena e Paracelcius, as plantas medicinais ocupavam lugar de 
destaque em suas práticas. A partir de plantas descritas e usadas pelo 
conhecimento popular, foram descobertos diversos medicamentos usados até 
hoje pela medicina. 
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Os salicilatos, por exemplo, foram descobertos através de estudos no 
Salgueiro Branco (Salix alba), que era usado pelos índios norte-americanos no 
tratamento de dor e febre. Já os digitálicos foram isolados da Dedaleira (Digitalis 
purpurea), usada por curandeiros europeus no tratamento de edemas. 
O uso terapêutico de plantas medicinais é um dos traços mais 
característicos da espécie humana. É tão antigo quanto o Homo sapiens, e 
encontrado em praticamente todas as civilizações ou grupos culturais 
conhecidos. A etnobotânica brasileira é originária de várias tradições diferentes, 
criando um sistema heterogêneo de plantas medicinais. 
A etnobotânica estuda a interação de comunidades humanas com o 
mundo vegetal, em suas dimensões antropológica, ecológica e botânica. Esses 
estudos são de grande importância na manutenção da cultura, além de combinar 
conhecimentos tradicionais e modernos, permitindo uma melhor investigação 
dessa flora ainda tão desconhecida e sua conservação e manejo sustentável. 
O uso de plantas para fins terapêuticos está inserido em um contexto 
social e ecológico que vai moldá-lo, de modo que muitas das peculiaridades 
deste emprego não podem ser entendidas se não se levar em consideração 
fatores culturais envolvidos, além do ambiente físico onde ele ocorre. 
Em sociedades tradicionais, a transmissão oral é o principal modo pelo 
qual o conhecimento é perpetuado. O conhecimento é transmitido em situações, 
o que faz que a transmissão entre gerações requeira contato intenso e 
prolongado dos membros mais velhos com os mais novos. Isto acontece 
normalmente em sociedades rurais ou indígenas, nas quais o aprendizado é feito 
pela socialização no interior do próprio grupo doméstico e de parentesco, sem 
necessidade de instituições mediadoras: crianças e jovens acompanham seus 
parentes na execução de tarefas cotidianas em ambientes físicos diversificados 
(excursões de coleta, trabalhos na lavoura, etc.), onde podem existir plantas com 
atividade terapêutica, observam os mais velhos ao cuidarem dos doentes, etc. 
Esta ciência vem contribuindo para o conhecimento da biodiversidade das 
florestas tropicais, devido ao registro e resgate dos hábitos e usos de vários 
6 
 
 
povos que possuem estreito vínculo com os recursos de fauna e flora. 
Compartilhar a informação com quem a gerou, e contribuir para a melhoria das 
condições de vida das populações estudadas, são um dos destinos desta nova 
etnociência. 
O conhecimento gerado através do resgate do saber popular deve ser 
valorizado através de ações que viabilizem e garantam o uso desses recursos 
pela população. A produção do material científico deve ter uma utilidade maior 
do que parar nas prateleiras e livrarias, e sim ter um uso aplicado a favor do 
reconhecimento deste saber local, influenciando as políticas ambientais para 
este fim. 
A etnociência tem como características principais, a multidisciplinaridade 
das ações e retorno do conhecimento produzido àqueles que o geram. Neste 
retorno confrontam-se e contemplam-se o conhecimento acadêmico e o 
conhecimento popular. 
A etnobotânica colabora com:– A valorização dos conhecimentos e as medicinas tradicionais das 
comunidades; 
– A preservação da flora utilizando o conhecimento adquirido pela sua 
investigação científica; 
– A ampliação do conhecimento sobre as propriedades úteis de espécies 
vegetais; 
– Subsídios para estudos étnicos, antropológicos, botânicos e ecológicos sobre 
os povos envolvidos na pesquisa; 
– Subsídios ao Poder Público no desenvolvimento de projetos sócio-
econômicos, bem como ambientais. 
A Etnofarmacologia não trata de superstições, e sim do conhecimento 
popular relacionado a sistemas tradicionais de medicina. Para apreciar o 
conhecimento popular é preciso admiti-lo como tal – um corpo de conhecimento, 
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um produto do intelecto humano – e não se pode ser preconceituoso. A 
Etnofarmacologia é uma divisão da Etnobiologia, uma disciplina devotada ao 
estudo do complexo conjunto de relações de plantas e animais com sociedades 
humanas, presentes ou passadas (1). Defini-se Etnofarmacologia como “a 
exploração científica interdisciplinar dos agentes biologicamente ativos, 
tradicionalmente empregados ou observados pelo homem” (2). 
Como estratégia na investigação de plantas medicinais, a abordagem 
etnofarmacológica consiste em combinar informações adquiridas junto a 
usuários da flora medicinal (comunidades e especialistas tradicionais), com 
estudos químicos e farmacológicos. O método etnofarmacológico permite a 
formulação de hipóteses quanto à(s) atividade(s) farmacológica(s) e à(s) 
substância(s) ativa(s) responsáveis pelas ações terapêuticas relatadas. 
 
 
2. AS ORIGENS DO SISTEMA POPULAR BRASILEIRO 
DE PLANTAS MEDICINAIS SÃO AS SEGUINTES: 
Figura 2: Plantas medicinais. 
 
Fonte: https://medium.com/@leonavrj/plantas-medicinais-pdf-a24d285982b8 
Sistema etnofarmacológico europeu: Foi trazido com a colonização 
portuguesa e de outros povos europeus, e é mais forte no Sul do país. Este 
sistema possui muita influência das plantas de uso mundial, e plantas européias, 
pois o Sul possui um clima mais frio, semelhante ao europeu, onde essas plantas 
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já estavam adaptadas. É o caso da Erva Cidreira (Melissa officinalis), da Erva 
Doce (Pimpinella anisum), entre outras. 
Sistema etnofarmacológico africano: Foi trazido com o tráfico de escravos 
para o Brasil, nos séculos XVI e XVII. Este sistema associa rituais religiosos ao 
uso de plantas medicinais, como é visto em diversas culturas primitivas. É mais 
encontrado no estado da Bahia. Através dos negros africanos incorporamos 
plantas como a Arruda (Ruta graveolens), e o Jambolão (Syzigium jambolanum). 
Sistema etnofarmacológico indígena: Corresponde à herança do 
conhecimento de plantas medicinais dos indígenas brasileiros. Este sistema 
pode ser encontrado em praticamente todo o território nacional. Entre as plantas 
cujo uso aprendemos com os nossos índios, temos a Caapeba (Piper 
umbellatum), o Abajerú (Chrisobalanus icaco) e o Urucum (Bixa orellana). 
Sistema etnofarmacológico oriental: Foi trazido junto com os imigrantes 
chineses e japoneses para o Brasil, no final do século passado e no início deste. 
É encontrado principalmente no estado de São Paulo. Os orientais trouxeram 
para o Brasil espécies como o Gengibre (Zingiber officinale), a Lichia (Litchi 
chinensis) e a Raiz Forte (Wassabia japonica). Outras plantas medicinais de 
origem oriental foram trazidas pelos portugueses durante suas navegações até 
a Ásia, como a Canela (Cinnamomum cassia) e o Cravo (Syzygium aromaticum). 
Estas espécies se tornaram mundialmente conhecidas por seu uso culinário. 
Sistema etnofarmacológico amazônico: Este sistema deriva das 
características peculiares da flora da região, associada à absorção de 
conhecimentos indígenas pelo caboclo. Ele também decorre do isolamento 
cultural da Amazônia. Com isto, usa ervas específicas da região e possui uma 
linguagem própria. É o caso de plantas como o Guaraná (Paulinia cupana), a 
Copaíba (Copaifera officinalis) e a Fava de Tonca (Dipteryx odorata). 
Sistema etnofarmacológico nordestino: A região Nordeste apresenta um 
clima e vegetação peculiares, e forte influência indígena e africana. Estes 
aspectos combinados às más condições socioeconômicas da região 
estimularam o surgimento de um sistema de plantas medicinais próprias. Como 
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contribuição do sistema nordestino, temos plantas como a Aroeira (Schinus 
molle), a Catinga de Mulata (Tanacetum vulgare) e o Bamburral (Hyptis 
suaveolens). 
Sistema científico internacional: Como resultado das pesquisas realizadas 
com plantas medicinais feitas em países europeus, foram introduzidas diversas 
plantas medicinais no mercado internacional, baseadas em seus efeitos 
farmacológicos. Entre estas temos o Ginkgo Biloba (Ginkgo biloba), o Hipérico 
(Hipericum perforatum) e a Echinácea (Echinacea purpurea). 
O uso terapêutico de plantas medicinais ficou restrito à abordagem leiga 
desde o salto tecnológico da indústria farmacêutica ocorrido nas décadas de 50 
e 60. Recentemente, as plantas medicinais consideradas medicamentos de 
segunda categoria, voltaram à voga com a comprovação de ações 
farmacológicas relevantes e de uma excelente relação de custo-benefício. Mas 
é sempre bom lembrar a importância de se utilizar a espécie correta para 
determinada enfermidade. 
A Alemanha foi o país que investiu primeiro e saiu na frente nesse campo. 
Pesquisadores dessa área concluíram ser importante sistematizar e estudar as 
tradições populares do uso de plantas medicinais, como forma de ter uma 
estratégia para investigação e comprovação farmacológica. 
Por isso um ramo da antropologia chamado etnofarmacologia (estudo da 
farmacologia popular de um determinado grupo cultural) tem ganhado 
importância cada vez maior para o desenvolvimento de novos medicamentos à 
base de plantas medicinais. 
O Brasil tem um enorme potencial nesse campo. É fundamental que a 
comunidade médica assim como outros profissionais da área da saúde ligados 
às universidades atentem para esse potencial, para que possamos lançar mão 
dele. 
É o momento de voltarmos nossos esforços para construir um 
conhecimento médico baseado em nossos valores e adequado às nossas 
necessidades, em vez de ficarmos atrelados a um modelo científico 
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exclusivamente internacional. Para tanto devemos valorizar, estudar, validar e 
utilizar terapeuticamente nossas espécies, antes que outros o façam. 
3. PLANTAS MEDICINAIS 
Figura 3: Plantas como remédio. 
 
Fonte: https://www.selecoes.com.br/saude/23-plantas-e-ervas-medicinais-que-
podem-melhorar-a-sua-vida/ 
Planta medicinal “é a espécie vegetal, cultivada ou não, utilizada com 
propósitos terapêuticos” (BRASIL, 2011). Atualmente, as plantas medicinais 
denotam grande importância para a humanidade. Não apenas em função da 
ação terapêutica, mas também por expor a história que, evolutivamente, as 
comunidades tradicionais têm com elas. Ademais, possibilita que a população 
realize tratamento com medicamentos que não são caros e obtidos facilmente. 
Essas plantas proporcionam um exercício de saúde coletiva, promovendo maior 
autonomia para os agricultores (ARAÚJO et al., 2007). 
Nessa perspectiva, o estudo das plantas para finalidade terapêutica se 
insere em um contexto ecológico e social, sendo de grande relevância para a 
população que padece em razão de pressões sociais e econômicas, retratando 
uma alternativa aos tratamentos com medicamentos sintéticos. As pesquisas 
podem colaborar para a implantação de drogas eficazes e seguras na 
comunidade no combate de diferentes doenças (MARTINS; GARLET, 2016). 
As espécies com fins terapêuticos podem pertencer a dois grupos: o das 
plantas nativas e o das plantas exóticas ou introduzidas. Estas, em sua maioria, 
foram trazidas por imigrantes que colonizaram diferentes localidades. As nativas 
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ocorrem de forma natural em determinada região e apresentam grande 
relevância parao ecossistema local (BENINI et al., 2010). 
Em 2006, foi aprovada a Política Nacional de Plantas Medicinais e 
Fitoterápicos pelo governo federal, mediante o Decreto nº 5.813, de 22 de junho, 
constituindo-se como ferramenta fundamental das políticas públicas de saúde, 
meio ambiente, desenvolvimento social e econômico, além de ser um elemento 
essencial de transversalidade na implantação de ações aptas para gerar 
melhorias na qualidade de vida da população brasileira (BRASIL, 2009). 
No país, o uso intenso de plantas medicinais se deve, principalmente, à 
riqueza e variedade de espécies da flora nativa (COAN; MATIAS, 2014). A 
manutenção do ecossistema local é auxiliada pelo cultivo de plantas medicinais 
nativas, o qual também promove a valorização da flora regional de modo a 
provocar a sua preservação. Investimentos na área de plantas medicinais, em 
particular as nativas, apresentam a possibilidade de produzir informações 
fundamentais para o aperfeiçoamento da qualidade dos fitoterápicos e progresso 
no campo da saúde coletiva, especialmente em relação à minimização de 
despesas com medicamentos alopáticos (BENINI et al., 2010). 
A população pode não ter conhecimento acerca da existência de possível 
toxicidade ratificada no que diz respeito às plantas medicinais, assim como há a 
possibilidade de desconhecimento quanto ao modo correto de cultivo, preparo, 
indicações e contraindicações, em razão do fato de pressuporem que, em virtude 
de serem plantas medicinais, a quantidade e formas empregadas não geram 
danos e problemas à saúde (SANTOS et al., 2011). 
 A fitoterapia é denominada como a ciência que estuda o uso de plantas 
medicinais (ABÍLIO, 2011). Sua utilização apresenta diversas motivações, além 
de resgatar saberes populares e preservar a biodiversidade, contribui para o 
aumento de recursos terapêuticos, fomento da agroecologia e promoção do 
desenvolvimento social e educação ambiental (ANTÔNIO et al., 2014). Desde 
2006 está regulamentada no Brasil, através de duas políticas públicas, a Política 
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF) e a Política Nacional 
de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), efetivandose como uma 
alternativa no Sistema Único de Saúde (BUENO et al., 2016). 
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Ao apresentar diversidade cultural e vasto patrimônio genético, o país 
pode determinar um modelo próprio e absoluto de desenvolvimento na área da 
saúde e utilização de fitoterápicos e plantas medicinais, que ressalta o uso 
sustentável dos elementos integrantes da biodiversidade. Tal política tem como 
asserções o respeito aos princípios de eficácia e segurança na saúde pública e 
a concordância entre conservação ambiental e desenvolvimento 
socioeconômico, tanto em escala local quanto em âmbito nacional (BRASIL, 
2006). 
O modo de preparo das plantas medicinais é diverso, sendo geralmente 
determinado pela indicação terapêutica e parte da planta utilizada. Abílio (2011) 
descreveu os processos de preparação, sendo esses: infusão, decocção, 
maceração, garrafada, xarope, dentre outros. 
 Em determinados estudos, ocorre a predominância do chá como modo 
de preparo, dentre eles, os desenvolvidos por Amorozo (2002), Pasa et al. 
(2005), Cunha e Bortolloto (2011), Freitas et al. (2012), Ribeiro et al. (2014), Lima 
et al. (2015), Costa e Marinho (2016), Ferreira et al. (2016), Gois et al. (2016), 
Santos-Silva e Oliveira (2016), Brito et al. (2017) e Leandro et al. (2017). 
Predomina a decocção em trabalhos realizados, por exemplo, por Pinto et 
al. (2006), Aguiar & Barros (2012), Cavalcante & Silva (2014), Almeida Neto et 
al. (2015), Vásquez et al. (2014) e Vieira et al. (2015). Destaca-se a infusão em 
estudos, como os de Santos e Rosito (2012), Battisti et al. (2013), David et al. 
(2014) e Santos et al. (2016). 
4. OBJETIVOS DA ETNOBOTÂNICA 
Figura 4: Etnobotânica. 
 
Fonte: https://biologo.com.br/bio/etnobotanica/ 
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É uma ciência multidisciplinar que envolve botânicos, antropólogos, 
farmacólogos, médicos e outros profissionais. 
É também uma interdisciplina capaz de proporcionar explicações sobre a 
interação de comunidades humanas com o mundo vegetal, em suas dimensões 
antropológica, ecológica e botânica. 
Desde a época de Schultes, o campo da etnobotânica passou de 
simplesmente adquirir o conhecimento etnobotânico para aplicá-lo a uma 
sociedade moderna, principalmente na forma de produtos farmacêuticos. 
Com o conhecimento botânico e a identificação das espécies de plantas 
usadas pelas várias etnias, temos a base para o trabalho do etnobotânico. 
 
 
 
 
 
 
5. APLICAÇÕES DOS USOS TRADICIONAIS DOS 
VEGETAIS PELO HOMEM 
Figura 5: Aplicação das plantas medicinais. 
 
Fonte: https://biologo.com.br/bio/etnobotanica/ 
As contribuições da antropologia destinam-se ao estudo da origem, 
estrutura social e étnica das comunidades humanas em foco, estabelecendo 
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relações entre as diversas etnias e extensão do universo linguístico e papéis 
sociais associados ao conhecimento em questão além de elaborar questionários 
que serão aplicados aos informantes no inventário das espécies utilizadas. 
É na interação com as populações que se constrói o conhecimento, não 
só da utilidade tradicional das plantas em foco, como da cosmologia que embasa 
a estrutura social à qual está associada. 
Da farmacologia pode-se pesquisar se há alguma propriedade medicinal, 
algum princípio ativo presente nas plantas. Da clínica médica pode-se 
determinar se as plantas usadas provocam algum efeito fisiológico positivo ou 
negativo. 
A utilização de madeiras usadas na construção, fabricação de armas, 
instrumentos musicais, embarcações, por sua vez também podem requerer de 
especialistas de áreas afins em nosso saber ocidental científico. 
Os direitos de propriedade intelectual e os acordos de partilha de 
benefícios são questões importantes na etnobotânica. 
 
 
6. O QUE É ETNOFARMACOLOGIA? 
Figura 6: Etnofarmacologia. 
 
Fonte: http://cimunisantos.blogspot.com/2017/09/etnofarmacologia-no-
desenvolvimento-de.html 
A etnofarmacologia pode ser definida como “a exploração científica 
interdisciplinar de agentes biologicamente ativos (encontrados em partes ou 
produtos de vegetais, animais, fungos, minerais com fins medicinais e tóxicos) 
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tradicionalmente empregados ou observados pelo homem” (Bruhn & Helmstedt, 
1981). Note que quando falamos de agentes biologicamente ativos não nos 
limitamos a plantas, mas incluímos também animais (secreções de sapos como 
o canuanu, por exemplo) e minerais. Um exemplo de remédio mineral é a areia. 
Frequentemente ouvimos de populações litorâneas: se você levar uma picada 
de arraia, coloque areia no local para desinflamar. Nesse caso estamos falando 
de um remédio, a areia, que não é obtido de planta, mas diretamente do solo. 
Em populações tradicionais encontramos remédios feitos de partes de animais, 
como os pelos do quati, usados como afrodisíaco e secreções de perereca 
empregadas como analgésico. É bom notar que no caso das secreções estamos 
diante não de parte do animal, mas de algo que ele produz, de um produto 
animal. 
Também podemos dar o exemplo do ninho de determinado passarinho 
usado como remédio: nesse caso não é parte nem produto, é outra coisa. Todo 
esse conhecimento se entranha na história de cada uma das medicinas 
tradicionais que encontramos e precisa ser resgatado. 
A grande contribuição da etnofarmacologia com as outras ciências é 
justamente resgatar as medicinas e medicamentos das diferentes culturas indo 
até elas, pesquisando-as, estudando-as. Para isso a etnofarmacologia se vale 
da antropologia cultural (mais especificamente da etnografia), da botânica, da 
zoologia – e aviso que também é importante ter um pezinho na farmacologia. 
Conhecer farmácia enriqueceu meu trabalho, ainda na fase de doutorado e pós-
doutorado. Se você conhece farmacologia você já vaipensando quando se 
depara com uma planta: “Como é que eu vou experimentar isso em ratos?” 
Vemos, por exemplo, que índias de determinadas tribos amarram na 
barriga um tipo de planta, uma embira, quando querem conceber filhos do sexo 
masculino. Quando querem conceber meninas, amarram outra embira na 
barriga... “Como vou testar isso em ratos?”, a pergunta me veio quando me 
deparei com a situação. 
O trabalho é mesmo árduo. Primeiro eu tenho de identificar a planta que 
está sendo usada, e para isso vou ter de utilizar os métodos da botânica. Não 
adianta eu chegar à universidade ou no laboratório e dizer que determinada 
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planta faz crescer 10 centímetros de cabelo por minuto, seu eu não souber dizer 
o nome científico dessa planta. 
Não podemos afirmar simplesmente que é uma planta que o povo local 
chama de crô. Precisa-se coletar amostras dessa planta, recolher flores e frutos. 
E tem de levar esse material a um taxonomista, para que ele possa definir com 
precisão: essa planta chamada popularmente de crô é um Chenopodium 
ambrosioides L. (erva-de-santa-maria), por exemplo. 
Identificar a planta é só o começo. Além de coletar amostras das plantas, 
com folhas, flores, frutos, raízes, o etnofarmacólogo tem de pesquisar de que 
forma ela é usada por determinada população local. Entrevistando a população, 
lendo estudos, precisa anotar quais são as indicações e quais as 
contraindicações desse medicamento local. 
Muitas pessoas pensam que etnofarmacologia e etnobotânica são as 
mesmas coisas. A etnobotânica estuda o uso das plantas pelas populações – 
mas abrange todo tipo de uso, incluindo as plantas que servem para fazer 
colares e adornos, madeiras para construir barcos, plantas usadas para fazer 
roupas e também as utilizadas como remédio. 
Depois de coletados o material e os dados nos locais da pesquisa, o 
próximo passo do etnofarmacólogo é levar esse material para especialistas de 
outras disciplinas, como o taxonomista, que identifica a planta, e o 
farmacologista, que analisa seus princípios ativos. O pesquisador também deve 
consultar a literatura que trata da planta e da população que a utiliza. 
A pesquisa é necessariamente multidisciplinar e culmina com testes em 
animais, nos quais doenças são induzidas e a eficácia da planta no tratamento 
verificada. São a hora em que são investigados e testados os agentes 
biologicamente ativos usados ou observados pelo homem. A meta é que a 
pesquisa resulte em patentes e royalties para o laboratório - que com isso paga 
seus investimentos nos levantamentos etnofarmacológicos, nos estudos 
farmacologia e fitoquímica, nos testes e na elaboração do novo medicamento. 
É importante ressaltar que a etnofarmacologia é abrangente e não se 
limita às plantas: estuda tanto vegetais como animais, algas, fungos e minerais. 
Entre os métodos que aqui especificamos, fica evidente que a etnofarmacologia 
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é o que mais funciona quando a proposta é encontrar um novo medicamento. A 
chance de fazer gol é muito maior. 
Como vamos ver a seguir, se usarmos o critério aleatório, ou randômico, 
de coletar indistintamente plantas de determinada região, a chance de encontrar 
um princípio ativo antineoplásico (isto é, que pode funcionar no tratamento do 
câncer) é de 6%. Se a pesquisa for orientada pela etnofarmacologia, entretanto, 
probabilidade sobe para 25%. A chance de encontrar um novo anti-hipertensivo 
aumenta de 31% na coleta ao acaso para 44% na coleta segundo os critérios da 
etnofarmacologia. Seguindo a mesma comparação de métodos, a probabilidade 
de desenvolver um novo anti-helmíntico (medicamento que combate vermes) 
sobe de 9,8% na coleta randômica para 29,3%. E a diferença pode ser muito 
maior no caso de doenças específicas, como AIDS (de 8,5% para 71,4%). 
A razão para o sucesso da etnofarmacologia no desenvolvimento de 
novos remédios está no fato de ela fornecer pesquisas de cada região 
praticamente prontas, e que foram desenvolvidas pelos povos tradicionais ao 
longo de séculos e milênios. 
7. CRITÉRIOS PARA ACHAR UM REMÉDIO 
Figura 7: Remédio fitoterápico. 
 
Fonte: http://cimunisantos.blogspot.com/2017/09/conceito-de-
etnofarmacologia.html 
Que critérios a Academia e a indústria farmacêutica usam para estudar 
potenciais bioativos que podem resultar em novos medicamentos? Os cinco 
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critérios principais são: coleta randômica, quimiotaxonomia, zoofarmacognosia, 
etnofarmacologia e ecologia química. 
7.1. COLETA RANDÔMICA 
Por esse critério os pesquisadores vão a determinado país ou região e 
coletam plantas aleatoriamente. A chance de essa coleta resultar num remédio 
foi calculada em 1 para 10 mil. É um jogo em que fazer gol é muito difícil. 
 
7.2. QUIMIOTAXONOMIA 
Esse critério dá um salto em relação ao método da coleta aleatória. Ele parte do 
conhecimento que nós já temos sobre a química das plantas. Sabemos que 
determinadas famílias de plantas têm propriedades farmacológicas bem 
definidas. É o caso das Solanáceas, produtoras de anticolinérgicos, como 
atropina e escopolamina, e de outras famílias como as Euforbiaceae, as 
Rutaceae e as Apocynaceae. Se eu for uma indústria farmacêutica ou uma 
universidade e quiser patentear novos remédios, uma boa estratégia será 
mandar pesquisadores em campo e estudar famílias de plantas cujo potencial já 
é conhecido, em busca de novos princípios ativos. 
7.3. ZOOFARMACOGNOSIA 
A zoofarmacognosia parte da observação de como os animais usam 
naturalmente as plantas. É o caso de observar bichos, como macacos e 
cachorros, e observar as plantas que procuram quando sentem algum 
desconforto. Podemos nos valer dessas indicações para descobrir novos 
potenciais bioativos. 
7.4. ETNOFARMACOLOGIA 
O critério da etnofarmacologia ou etnofarmacognosia resgata o uso que 
as populações tradicionais de cada região fazem das plantas medicinais. Para 
obter essas informações, o pesquisador vai conviver com pajés, babalorixás, 
parteiras e outros agentes médicos locais e ver como eles trabalham. A 
etnofarmacologia identifica que plantas as populações tradicionais usam como 
remédio. Ela parte de indicações do tipo: “Esta planta serve para eliminar 
19 
 
 
vermes, esta é para dor de estômago”. Foi assim que ficamos sabendo, por 
exemplo, que a Protim sp. é uma planta vermífuga, a Simaruba sp. é 
antidiarreica, a Bursera sp. combate diabetes e a Strychnos sp. trata gastrite. A 
chance de fazer gol é muito maior porque essa medicina já passou pelo 
laboratório das populações locais: nesse caso a probabilidade de sucesso é de 
300 para mil. 
7.5. ECOLOGIA QUÍMICA 
Existe também um quinto critério que pode orientar a pesquisa de um novo 
remédio: é o da ecologia química. Ela se volta para a relação que existe entre os 
animais e as plantas ao longo da coevolução. Como as plantas não têm pernas 
para fugir nem dentes param se defenderem, sua saída é desenvolver 
estratégias químicas de defesa. Elas produzem diferentes metabólitos, um 
número imenso de moléculas químicas, para se defender da herbivoria dos 
animais, por exemplo. E é preciso ter em mente que mesmo uma substância que 
é tóxica para os animais pode também ter potencial medicinal. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8. MUNDO DESCONHECIDO 
Figura 8: Conhecendo as plantas. 
20 
 
 
 
Fonte: https://coletivocurare.wordpress.com/2013/08/15/mais-pesquisadores-se-
dedicam-ao-estudo-de-plantas-medicinais-e-fitoterapicos-no-brasil/ 
O que nós sabemos sobre as plantas medicinais existentes no mundo e 
no Brasil? Não sabemos nada. Embora eu reconheça que na verdade hoje em 
dia sabemos muito, tenho plena consciência de que isso é muito pouco, diante 
do que ainda existe para descobrir. 
Estima-se que no mundo existam de 250 mil a 300 mil espécies de plantas 
superiores, considerando tanto as angiospermas, que produzem fruto 
verdadeiro, como laranja e morango, como as gimnospermas, sem frutos, como 
samambaiase pinheiros. 
Um levantamento feito em 1997 mostra que só 1% desse potencial tinha 
sido ou estava sendo explorado. Ou seja, isso é praticamente nada. Como já se 
passaram alguns anos, é possível que o conhecimento tenha aumentado para 
2% ou 3%, o que continua sendo muito pouco. Continuamos a não saber nada. 
As angiospermas são 99% das plantas que a gente vê por aí no dia a dia. 
Quer dizer, não precisamos nos estressar quando vemos uma planta: a maior 
probabilidade é de ela ser uma angiosperma. 
As gimnospermas, mais raras, mas bastante distribuídas pelo mundo, são 
as samambaias, avencas, pinheirinhos de Natal aqueles tristes ciprestes que 
ornamentam os cemitérios. A mais famosa das gimnospermas em termos de 
farmácia é a Ginkgo biloba - a vedete da fitoterapia, usada para melhorar a 
circulação e a memória. Ela não produz fruto, a semente nasce nua direto dos 
galhos. 
21 
 
 
Das cerca de 55 mil angiospermas que existem no Brasil, 99,6% são 
desconhecidas para a ciência. Elas são um universo sobre o qual nada sabemos, 
desconhecemos sua farmacologia e sua fitoquímica. E isso que não estamos 
nem falando das plantas inferiores, que são as briófitas, pteridófitas e dos fungos 
e das algas, que são de outros reinos, mas também são utilizadas para obter 
medicamentos. E cada uma dessas plantas possui propriedades químicas, úteis 
ou não. Ou seja, se hoje todo mundo quiser estudar as plantas, se todas as 
universidades quiserem estudar as plantas, a natureza é um prato cheio, com 
muitíssima coisa ainda por descobrir. 
Cada planta é uma indústria de moléculas químicas. E cada uma delas 
não produz só uma molécula, produz centenas. Uma simples folha pode conter 
500 substâncias diferentes. Não dá para dizer que estamos diante de um campo 
já esgotado, que não há mais nada para dizer,... Faltam pesquisas, que exigem 
dedicação e trabalho. O pesquisador tem de virar a planta de cabeça para baixo, 
analisar quimicamente tanto as folhas como as raízes, as flores, os caules... 
9. ATLAS DA BIODIVERSIDADE 
O Brasil é o país que detém a maior biodiversidade em todo o planeta. 
Existem em território brasileiro 55 mil plantas angiospermas, das pouco mais de 
300 mil plantas superiores existentes na Terra. A Colômbia fica em segundo 
lugar, com 45mil. A China tem 27 mil angiospermas e África do Sul, 21 mil. 
Partindo do primeiro critério de busca de medicamentos que acabamos de 
abordar, o da coleta randômica, já é possível perceber que as chances de 
sucesso se concentram no Brasil e nos países da faixa tropical do planeta. 
Os países tropicais se destacam no mundo todo pela grande variedade 
de plantas existente em suas paisagens naturais. Os campeões de 
biodiversidade no mundo são: Brasil, Colômbia, Peru, Equador, Venezuela, 
México e Estados Unidos, na América; República Democrática do Congo, África 
do Sul e Madagascar, na África; além de Malásia, Indonésia e Austrália, no 
Pacífico. 
Os cinco primeiros países dessa lista já detêm 50% da biodiversidade do 
planeta, com metade das plantas superiores da Terra (Joffe & Thomas, 1989). 
Os onze países top de biodiversidade concentram cerca de 60% das plantas do 
22 
 
 
mundo. Se for considerada toda a área tropical do planeta, essa proporção sobe 
para 70%. É a região em que ocorre maior concentração de biodiversidade. 
10. BIOMAS BRASILEIROS 
Figura 9: Biomas brasileiros. 
 
Fonte: https://www.todamateria.com.br/biomas-brasileiros/ 
O Brasil tem grandes biomas, como a Amazônia, a Caatinga, o Cerrado, 
os Campos Sulinos, a Mata Atlântica, o Pantanal, a Zona Costeira, e regiões de 
transição como Amazônia-Caatinga, Amazônia-Cerrado e Cerrado-Caatinga. 
Nos Pantanais mato-grossenses, por exemplo, existem populações formadas 
por índios e descendentes de africanos – quer dizer, não são nem índios nem 
africanos, são uma mistura. 
O uso das plantas difere conforme as populações tradicionais de um 
mesmo bioma. Se pesquisando os índios de diferentes regiões da Amazônia, 
constamos que eles não usam as plantas da mesma forma. Cada etnia tem sua 
identidade, sua forma de ver o mundo, sua cosmologia. Mesmo que dividam as 
mesmas plantas, eles as enxergam e lidam com elas de forma diferente. Essa é 
a riqueza que o etnofarmacólogo resgata. 
Afinal, é para isso que a gente existe. Parece que nós, os 
etnofarmacólogos, só existimos para nosso trabalho de viajar e passar muito 
tempo em lugares remotos. Estou até conformada, parece que é para isso que 
servimos nesta vida. E até no casamento enfrentamos problemas... Eu brinco 
23 
 
 
dizendo que ficamos tanto tempo isolados no mato que quando voltamos outra 
pessoa já pode ter ocupado nosso lugar... 
11. REMÉDIOS GENUINAMENTE BRASILEIROS 
Figura 10: Remédios naturais. 
 
Fonte: https://www.ecycle.com.br/component/content/article/67-dia-a-dia/2185-
seis-dicas-de-remedios-naturais-para-doencas-comuns.html 
Vimos que o Brasil ocupa o primeiro lugar no mundo em termos de 
angiospermas, as plantas com fruto, vedetes da criação de remédios: são 55 mil 
plantas superiores que produzem fruto. Os dados sobre fauna também são 
impressionantes, com cerca de 100 mil espécies animais. 
Outra característica importante do Brasil é a grande ocorrência de 
endemismo. E o que é isso? Endemismo é quando a distribuição genética de 
uma espécie animal ou vegetal está restrita a determinada região do planeta e 
não ocorre em nenhuma outra. Na Suíça, por exemplo, até recentemente só 
tinha sido comprovada a existência de uma única planta endêmica. 
Recentemente cientistas suíços anunciaram eufóricos que esse índice aumentou 
em 100%, porque descobriram outra planta... Agora eles têm duas... 
Na Alemanha, foram identificadas 16 espécies endêmicas, no Reino 
Unido, 73. Mas no México, que fica na região tropical do planeta, a quantidade 
de espécies endêmicas sobe para 3.376. E o endemismo é ainda muito maior na 
região amazônica, com 25 mil a 30 mil espécies que só ocorrem aqui 
(Cunningham, 1994). 
24 
 
 
É preciso considerar que a região amazônica não se restringe ao Brasil e 
inclui países vizinhos como Colômbia, Peru, Venezuela, Guianas. Mas também 
é bom levar em conta que o Brasil não tem só a Floresta Amazônica. Só no 
Cerrado foram identificadas mais de 6 mil espécies endêmicas. E na Mata 
Atlântica foram registradas mais de 8 mil espécies endêmicas. Não temos dados 
consistentes sobre os outros biomas brasileiros, que ainda não foram 
convenientemente estudados, como a Caatinga, que sabemos ser também muito 
rica em endemismo. 
O fato de ser o país que concentra mais endemismo em princípio deveria 
trazer vantagens enormes para o Brasil no desenvolvimento de novos 
medicamentos. Somos um país abastado em termos de biodiversidade e em 
termos culturais, o que faz muita diferença nas pesquisas da etnofarmacologia. 
12. NATUREZA E GENTE 
No caso do Brasil, a liderança em termos de biodiversidade se soma à 
grande diversidade humana, expressa por diferentes culturas locais. O país tem 
232 etnias indígenas e 1.340 comunidades quilombolas oficialmente 
identificadas e reconhecidas (Cunningham, 1996). De nada adiantaria se eu 
tivesse só as plantas e não tivesse os índios que as descobriram. Da mesma 
forma, seria inútil eu ter os índios se eles não tivessem as plantas. No Brasil 
natureza e cultura se somam – o que falta é gente investigando essa imensa 
riqueza. 
É cruzando o elemento natureza e do elemento cultura local que se obtêm 
as melhores informações. De pouco adianta se só os bichos estiverem usando 
as plantas medicinais... E também de nada valerá se você tiver índios, mas não 
tiver plantas. 
Por isso digo que o Brasil deveria ser o país mais importante do mundo 
em termos de descoberta de novas drogas, pois é comprovadamente a região 
com mais biodiversidade do planeta. Isso é ponto pacífico entre os especialistas, 
inclusive da área de farmacologia. Somos campeões em biodiversidadebiológica e também no elemento humano, com muita diversidade de culturas. 
25 
 
 
13. MEDICINAS DIFERENTES 
O Brasil é ponto de encontro de tradições médicas de índios, europeus e 
africanos e suas combinações em uso por diferentes comunidades locais. 
Temos, por exemplo, os ribeirinhos amazônicos, os caiçaras, os jangadeiros – 
populações que não são nem índio nem afro, mas que foram constituídas pela 
convivência de gente de diferentes origens. São populações que tem muito 
conhecimento dos recursos naturais das regiões em que vivem. 
O professor Diegues da Universidade de São Paulo (USP) trabalhou com 
o mapeamento da distribuição geográfica das mais importantes culturas 
regionais do país, exceto índios. Ele localiza, por exemplo, os ribeirinhos 
amazônicos e os caiçaras do litoral de São Paulo e de Santa Catarina. O mapa 
foi feito no ano 2000 por Edes Etiel e registra as principais populações 
tradicionais não indígenas do Brasil. Estão incluídos praieiros, caboclos 
ribeirinhos da Amazônia, extrativistas de babaçu, sertanejos/vaqueiros, 
jangadeiros, caiçaras, pescadores artesanais, açorianos, ribeirinhos não-
amazônicos, caipiras, sitiantes, pantaneiros, campineiros, quilombolas... 
 
14. DESAFIOS DA ETNOFARMACOLOGIA 
Figura 11: Remédios naturais. 
 
Fonte: https://segredosdomundo.r7.com/remedios-naturais-para-ansiedade/ 
Na etnofarmacologia nós procuramos os médicos de cada cultura e 
entrevistamos esses encarregados da medicina e da cura, segundo cada 
sociedade. No candomblé são os babalorixás, no espiritismo os médiuns, na 
umbanda é o pai-de-santo. 
26 
 
 
Na Amazônia, por exemplo, é indispensável consultar um rezador, uma 
parteira, um curador. Cada lugar vai ter um medico diferente, um sistema de 
medicina diferente, que vai usar tanto planta como produtos vegetais com óleo, 
resina, látex, tanto animais como produtos animais, como a pequena 
pererequinha. 
Tudo isso tem de ser percebido e anotado. É preciso identificar a planta 
ou animal. Eu, por exemplo, tive problemas para achar o sapo 
canuanu (Phyllomedusa bicolor, na verdade uma pequena rã) usado como 
remédio na Amazônia. Nunca consegui ver esse bicho no mato porque ele vive 
no alto das árvores e se aloja em tocas a 30 metros de altura. Eu só escutava a 
sua vocalização, os caboclos me alertaram para o som produzido pelo animal. E 
foi assim que eu acabei por só conhecer o sapo pelo som que ele emite. Durante 
dias a fio procurei coletar esse animalzinho. Mas o máximo que consegui foi 
gravar sua vocalização no meio da floresta. 
Esse é um exemplo de que em etnofarmacologia precisamos usar 
métodos de outras disciplinas, como os da antropologia cultural e da etnografia. 
A gravação do som foi fundamental para identificar o animal nos arquivos do 
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). 
Além dessa atenção redobrada e difusa para as informações que 
chegam,, o pesquisador de outras culturas também deve tomar cuidado, saber 
como se comportar nesses ambientes onde ele é uma visita. A situação não 
deixa de ser irônica: eu chego à casa de uma pessoa e digo: “Vou passar um 
ano aí na sua casa, mas fique à vontade. Vou ficar na sua sala, ver como você 
faz o feijão, ver como você trata sua mulher, como você trata ou não trata seu 
filho, mas fique à vontade...” 
 
 
 
 
 
 
 
27 
 
 
15. TRABALHO DE CAMPO 
Figura 12: Trabalho de campo. 
 
Fonte: https://biologo.com.br/bio/etnobotanica/ 
Quando o pesquisador passa um tempo estudando uma comunidade, ele 
acaba por se incluir nela, por fazer parte dela. Os colaboradores também vão 
adquirindo interesse pelo trabalho do pesquisador. Mas é preciso ter 
distanciamento para fazer as perguntas e interpretar os dados. O 
etnofarmacólogo tem de ter cabeça de antropólogo e não interferir nos valores 
locais ou interferir o mínimo possível, se é que isso é possível. Tem de aprender 
como lidar com as pessoas e saber o que falar - e principalmente o que não falar 
-, como se vestir e tudo o mais, de acordo com os valores daquela população. 
Esses cuidados são necessários porque o pesquisador pode sem querer 
dar uma direção errada para a pesquisa e incluir dados que não têm nada a ver. 
O caboclo diz berinjela e o pesquisador anota abobrinha, por exemplo. Gosto de 
citar o caso que aconteceu com uma pessoa que conheci. Esse pesquisador foi 
fazer um levantamento numa comunidade de uma região de represa e chegou 
todo feliz no laboratório: “Vamos testar o aguapé como analgésico! É assim que 
ele é usado pela comunidade X... Eu estive lá e vi.” O pesquisador explicou que 
um caboclo lhe contara que usava aquela planta aquática flutuante que dá belas 
flores roxas para curar dor de cabeça. 
Todos se ficaram animados. Mas fizeram testes em ratos e nada 
obtiveram. Pesquisaram em camundongos e também não deu resultado. 
Testaram extrato, infusão, tintura... e nada! O pesquisador então voltou para a 
comunidade que havia estudado e foi conferir como é que os locais usavam o 
aguapé. Um rapaz da comunidade lhe mostrou como era empregada a planta: 
ele pegou uma touceira na margem do rio e colocou-a sobre a cabeça. “Quando 
28 
 
 
está muito sol, eu me cubro com aguapé molhado e assim não tenho dor de 
cabeça”, explicou. O caboclo estava certo: usava o aguapé como chapéu para 
se proteger do sol e do calor mais forte do dia, e com isso se defendia de 
insolação. Esse detalhe de como a planta é usada parece bobagem. Mas, como 
estamos vendo, faz toda a diferença... 
Quando o pesquisador está numa comunidade local, como ele escuta o 
que estão lhe dizendo, como ele entende o que está coletando de informação? 
É bom ter isso em mente porque visitar uma comunidade e fazer pilhas de 
anotações pode não servir de nada se você não estiver atento aos detalhes. 
Você tem de estar presente o tempo todo, tem de observar. Aí vai perceber que 
muita coisa que as pessoas de uma comunidade falam não é exatamente o que 
elas fazem nem o que elas pensam – exatamente como acontece em nossa 
sociedade, em que é comum as pessoas pensarem de um jeito, falarem de outro 
jeito e agirem de uma terceira forma diferente... 
Tenho de assumir esse risco como cientista porque sei que sou humana 
e que um ser humano erra. As pessoas são assim mesmo, tendem a se guiar 
por idéias preconcebidas. Pode acontecer de o pesquisador perguntar a uma 
mulher: “Você bate no seu marido?” e ela responder: “Não, não bato” e 
momentos depois o pesquisador presenciar essa mulher espancando o marido 
no meio da aldeia. Só observando é que você consegue ajustar a fala das 
pessoas à realidade. É preciso estar atento, não acreditar de saída no que está 
sendo dito e sempre observar o que está sendo feito. 
16. ESTADA DE UM ANO 
O indicado é o pesquisador de etnofarmacologia ficar pelo menos um ano 
na comunidade que está estudando. O período de um ano, de janeiro a janeiro, 
é perfeito porque é necessário que o pesquisador acompanhe os ciclos da 
natureza, precisa colher as plantas com flor ou com fruto, para facilitar o trabalho 
do taxonomista que vai confirmar o nome científico da planta. Sem esses 
detalhes como flores e frutos o taxonomista não consegue identificar a planta 
com a precisão necessária. 
Como a floração e a frutificação se seguem e se alternam ao longo do 
ano, esse é o período perfeito para colher material permite identificar a planta 
29 
 
 
sem deixar nenhuma dúvida. Se você estiver numa aldeia indígena, o prazo de 
um ano facilita inclusive a comunicação, pois no começo você dispenderá muito 
tempo para estabelecer uma espécie de relação de namoro com os índios que 
vão te passar as informações sobre as plantas. 
Seria absurdo você chegar numa comunidade indígena isolada e ir logo 
propondo: “Vamos lá para o mato? Quero que vocês me mostrem as plantas que 
vocês usam...” É impossível. Primeiro você tem de “chegar nas pessoas”, é 
preciso passar por uma fasede namoro. Para que as pessoas passem 
informações sinceras e confiáveis, você precisa de uma fase anterior de bom 
relacionamento, precisa criar laços de confiança com ela. É importante 
relacionar-se bem com as crianças, por exemplo. Depois dessa fase de namoro 
é que vem o casamento. “Vamos para o mato, agora que eu confio em você e 
você confia em mim?” A pergunta fica muito mais sensata nessas condições. 
Mas essa fase de namoro com uma população local em geral se estende por 
seis meses, é preciso ter paciência. 
Digamos que eu esteja numa comunidade de quilombolas 
afrodescendentes: eu faço a pesquisa, reúno os dados e os levo para um 
laboratório com a dica de que deve ser procurada atividade analgésica naquela 
planta ou produto, por exemplo, baseado no fato de eu ter visto que as 
populações locais usam essa planta ou produto para aliviar dores. 
Assim eu vou arquivando as informações do meu levantamento – alias, para ser 
honesta, não do meu levantamento, mas do levantamento deles, que eu estou 
extraindo. O conhecimento é deles, não é meu. 
17. OS LABORATÓRIOS DA FLORESTA 
Figura 13: Plantas a serem estudadas. 
30 
 
 
 
Fonte: https://maestrovirtuale.com/etnobotanica-objeto-de-estudo-historia-
metodologia/ 
Nós sabemos que os remédios da indústria farmacêutica nos moldes 
ocidentais dominantes são testados em animais. Sabemos que cada planta é 
testada em ratos, camundongos, beagles para chegar a uma constatação 
científica de seus efeitos. E aí nos perguntamos: “Mas no mato como é que os 
índios testaram essa planta?”, “Como eles chegaram ao conhecimento que têm 
sobre essa planta?” A resposta é: “Eles não testaram em roedores, eles testaram 
na sogra!” 
E a piada de certa forma é verdadeira: durante inúmeras gerações muita 
gente foi vendo que a velhinha doente que consumiu determinada planta morreu 
– e que outra que se tratou com outra melhorou... Trata-se de um conhecimento 
que já vem se acumulando na memória da comunidade ao longo de séculos e 
muitas gerações. E eu quero frisar que esse conhecimento que as comunidades 
locais produzem tem um valor, tem um preço. E não estamos falando de valor 
monetário, de valor econômico, é um valor de outra ordem, muito mais precioso: 
o do conhecimento humano. 
Pelo trabalho de etnofarmacobotânica, o conhecimento dos indígenas e 
populações locais que pesquisa se soma ao da humanidade, contribui para 
ampliar o conhecimento universal. Mas não se trata de um conhecimento que eu 
produzi, eu simplesmente fui lá e resgatei esse conhecimento que determinada 
população local produziu – sabe-se lá ao longo de quantos milênios... O 
conhecimento é dessa comunidade, não é meu. Eu apenas fiz um resgate, 
31 
 
 
empacotando o conhecimento deles em assuntos como “dor de cabeça”, “dor de 
dente”, “dor de ouvido”, “matar piolhos”. É só prestar atenção para não achar que 
aguapé é uma planta analgésica quando na verdade o índio a usa simplesmente 
como chapéu úmido para prevenir insolação... Numa situação ideal uma 
pesquisa dessas desenvolve um medicamento e ganha royalties. 
18. CORRIDA PARA PRODUZIR REMÉDIOS 
Figura 14: Produção de remédios naturais. 
 
Fonte: https://science.talknmb.com.br/tendencia-insumos-naturais-
medicamentos/ 
Um levantamento mostrou que 80% dos laboratórios orientam as 
pesquisas que orientam a criação de seus produtos pelas informações 
etnofarmacológicas que obtém da literatura e dos bancos de dados. Ainda são 
poucos os que mandam pesquisadores em campo. No meu caso quem testa os 
remédios das minhas pesquisas não é minha sogra... Eu identifico a substância, 
faço testes em ratos, analiso a estrutura química da substância. Depois eu texto 
em animais e depois em pessoas. É assim que surgem os medicamentos que 
são patenteados e recebem royalties. Mas é bom sempre ressaltar que a fonte 
das informações da etnofarmacologia é sempre tripla: além do laboratório 
(porque você não consegue a patente se não tiver um laboratório) estão 
presentes a universidade que aposta e banca a pesquisa, e os índios, fonte 
primária dos dados. 
Essa visão laboratório/universidade/comunidade seria a maneira ideal de 
encarar esse tipo de atividade econômica. 
Geralmente o contato com uma nova medicina envolve lidar com povos 
isolados, que vivem em regiões distantes e de difícil acesso. Se o acesso for 
fácil, os habitantes dessas comunidades não iriam usar o serviço das parteiras 
32 
 
 
nativas, eles iam levar para dar à luz no hospital da cidade. O fato é que o 
pesquisador de etnofarmacologia frequentemente tem de ir para lugares de difícil 
acesso, levado por jipe de tração nas quatro rodas ou por barco. Eu preciso viajar 
cerca de 12 horas de barco para chegar a uma das comunidades que estudei, 
por exemplo. 
A pesquisa etnofarmacológica é uma atividade fascinante, mas tem esse 
alto preço: é preciso abrir mão de tudo. Garanto que não deve existir muita gente 
no mundo que se disponha a abrir mão de sua vida particular, de seu cotidiano 
por causa de algum estudo ou trabalho... Mas os resultados são sempre muito 
bons e frequentemente surpreendentes. 
E o que acontece se você for uma universidade ou laboratório e quiser 
fazer um remédio, mas não tem uma hiena para mandar a campo? A resposta: 
você nesse caso usa os relatos das hienas que foram antes... A alternativa é 
estudar o que já está nos livros, publicações e bancos de dados. Em vez de 
mandar gente para o mato, o laboratório se guia pela literatura. 
19. LADO BOM E LADO RUIM 
Para demonstrar que as plantas são como nós e também têm seu lado 
bom e seu lado ruim, vou listar a seguir algumas plantas contraindicadas para 
gestantes, porque os princípios ativos que eles contêm provocam contrações 
uterinas, podendo causar aborto: 
Sene 
pessegueiro (Prunus pudica), 
erva-de-santa-maria (Chenopodium ambrosinoides L.), 
arnica (Arnica montana L.), 
babosa ou aloé (Aloe vera L.), romã (Punica gratíssima). 
Informações extraídas de Gestação, amamentação e plantas medicinais 
combinam? Riopharma XII (57), 2003. Uso racional das plantas medicinais – um 
compromisso farmacêutico. 
Como nós, as plantas têm seu lado bom e seu lado ruim – elas nem sabem 
disso, elas simplesmente estão ali no mato... Dependendo da dose, um remédio 
pode se transformar em veneno. E isso não depende só da dose como também 
33 
 
 
da via de administração, de que parte é usada... vários fatores vão definir se a 
planta faz bem ou faz mal. 
Outro exemplo, além das plantas que acabamos de ver, como sene e 
arnica, é o hortelã. A mulher grávida ou recém-parida pode se sentir nervosa, 
ansiosa. Nesses casos é comum algum vizinho indicar um chá calmante caseiro: 
“Ah, tome chá de hortelã, você vai ficar mais calma”. Pois a verdade é que as 
grávidas e parturientes não podem tomar chá de hortelã, que é abortiva. Por 
isso advertência e conselho para as gestantes e mulheres que amamentam é: 
“Gestante não deve usar planta nunca, de forma nenhuma”. 
Todas as substâncias que a mãe ingere passam para a criança, pelo 
cordão umbilical ou pelo leite. Os estudos com ratos, camundongos, beagles me 
dão uma boa noção do que acontece com o ser humano. Mas eu só vou ter 
certeza do que acontece quando passar pelas fases I, II e III até chegar na fase 
clínica, dentro dos protocolos internacionais que regulamentam as fases de 
produção de um medicamento. 
O fato é que é contraindicado que as gestantes usem plantas, pois 
sabemos muito pouco sobre as contraindicações e efeitos colaterais. Um 
remédio eficaz para tratar uma doença pode, por exemplo, ter efeito 
teratogênico, isto é, deformante do feto. Isso precisa ser pesquisado. E podemos 
saber se isso ocorre em ratos, mas o medicamento pode agir de forma diferente 
no organismo humano. Já está cientificamente comprovado que o hortelã, por 
exemplo, contrai o útero e reduz a produção de leite, o que o torna contraindicado 
para gestantese lactentes. 
Até as tradições populares mais inocentes podem ser perigosas, como os 
conselhos de caipiras e sertanejos para os casos de nervosismo e ansiedade: 
“Tome um chá de erva-cidreira...” Hoje sabemos que uma gestante nunca deve 
tomar chá de erva cidreira, e até constatamos que tribos indígenas usam as 
raízes dessa planta para contrair o útero e acelerar o trabalho de parto. 
 
 
 
 
34 
 
 
 
 
 
 
 
20. COMO OS ÍNDIOS DESCOBREM OS 
REMÉDIOS? 
Figura 15: Índios descobrem remédios. 
 
Fonte: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2020/05/19/indigenas-da-
amazonia-brasileira-usam-ervas-medicinais-contra-o-coronavirus.htm 
Já vimos a distribuição da biodiversidade no mundo e agora vamos tratar 
das maneiras que os laboratórios se utilizam para ter os indicadores de bioativo 
potenciais. Como os índios fazem? Quais são as abordagens e os métodos mais 
adequados para o pesquisador que está no meio do mato? Como os laboratórios 
fazem para descobrir seus novos remédios? 
O primeiro elemento a considerar é o que eu chamo de memória sensorial. 
Aquele indiozinho que está no meio do mato cresce ouvindo as coisas que o avô 
fala sobre determinada planta e para identificá-la ele pega, cheira, lambe, 
rasga... Como o nosso, o universo dos índios é lúdico. A criança pega uma 
borboleta, arranca as patas, a asa, brinca com ela. E é brincando que eles 
aprendem sobre a vida e sobre a natureza. O indiozinho vai guardando todas 
35 
 
 
essas descobertas, o cheiro, o sabor, a textura de cada folha ele vai gravando 
em sua Winchester. Sem nem mesmo se dar conta, desde a mais tenra infância 
ele vai montando seu banco de informações sensoriais. Se ele se tornar pajé, é 
a esse banco de memória sensorial que ele vai recorrer para resolver os 
problemas de seus pacientes. 
21. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
Podemos concluir que a abordagem etnofarmacológica tem-se mostrado 
uma estratégia eficiente na investigação de plantas medicinais para a descoberta 
de novas entidades terapêuticas. Inserida em um contexto mais abrangente, a 
etnofarmacologia fortalece a etnobiologia na conceituação da vida, da cultura e 
das práticas curativas de povos tradicionais. (Albuquerque, 2005). Combinando 
as informações populares sobre a flora medicinal, adquiridas junto aos sujeitos 
(comunidades e especialistas tradicionais), com estudos 
químico/farmacológicos, essa abordagem permite a formulação de hipóteses 
quanto à atividade farmacológica e à substância ativa responsável pelas ações 
terapêuticas relatadas, bem como uma triagem no intuito de validação de seu 
uso. 
Estudos relatam que o uso da infusão em botões, flores e folhas 
preservam os constituintes voláteis, que se degradam pela ação do calor e da 
água (CASTELLANI, 1999) 
Apesar da ampla inserção dos medicamentos alopáticos como forma de 
cura de grande parte das enfermidades que acometem a população urbana, 
ainda há uma parcela desta que conserva vivo o conhecimento tradicional 
referente a utilização das plantas medicinais e que transmitem e fazem uso 
destas como fonte de bem-estar. 
Vale ressaltar que, mesmo sabendo que a ampla utilização das plantas 
medicinais como fonte terapêutica tem sido útil na medicina popular, ainda há 
muitas plantas além das já conhecidas que necessitam de estudos mais 
aprofundados sobre seus atributos farmacológicos, de forma que as indicações 
populares são impulsionadoras de tais estudos e podem ser de suma 
importância para a descoberta de novos fármacos. 
36 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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78:o-que-e-etnofarmacologia&catid=3:newsflash

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