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0 CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI HISTÓRIA DA FILOSOFIA MEDIEVAL GUARULHOS – SP 1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3 2 AS CORRENTES FILOSÓFICAS DA ERA HELENÍSTICA, DA IDADE MÉDIA E DO RENASCIMENTO ....................................................................................................... 4 2.1 Características filosóficas da Era Helenística, da Idade Média e do Renascimento .................................................................................................................................5 2.2 Correntes filosóficas desenvolvidas a partir do Helenismo até o Renascimento .. 9 2.3 Avanços no campo filosófico ocorridos entre a Era Helenística e o Renascimento ...............................................................................................................................13 3 CORRENTES FILOSÓFICAS DA IDADE MÉDIA ................................................. 16 3.1 Os avanços da sociedade e do pensamento filosófico a partir da Idade Média .. 17 3.2 Os avanços de Hipácia nos diversos campos da filosofia .................................. 23 4 A MENTALIDADE MEDIEVAL .............................................................................. 27 4.1 A visão hierofânica do mundo medieval ............................................................. 28 4.2 A igreja e o sagrado ............................................................................................ 29 4.3 A relação entre visão hierofânica medieval e o estabelecimento dos sacramentos cristãos ...................................................................................................................... 31 4.4 A arte e o sagrado no mundo medieval .............................................................. 32 4.5 A literatura medieval ........................................................................................... 37 4.6 Entre a fé e a razão: a filosofia medieval ............................................................ 38 5 A FILOSOFIA CRISTÃ .......................................................................................... 42 5.1 O pensamento cristão e as suas concepções filosóficas .................................... 43 5.2 As correntes de pensamento filosófico que haviam no período de desenvolvimento do cristianismo .......................................................................................................... 51 5.3 Filosofia e religião ............................................................................................... 54 2 6 FILOSOFIA DA RELIGIÃO E FILOSOFIAS RELIGIOSAS ................................... 59 6.1 A reflexão filosófica nas matrizes religiosas do Oriente ...................................... 60 6.2 A filosofia greco-romana e o pensamento judaico no monoteísmo ..................... 65 6.3 Reflexão filosófica nas religiosidades dos povos originários............................... 68 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 72 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 AS CORRENTES FILOSÓFICAS DA ERA HELENÍSTICA, DA IDADE MÉDIA E DO RENASCIMENTO A filosofia está inserida na história de modo que não há como pensar a evolução da humanidade sem a historicidade e o acúmulo do conhecimento. Nesse sentido, a filosofia de um período da história acaba contribuindo com o período posterior, seja em um movimento de ruptura ou de aprimoramento. Fonte: https://www.ex-isto.com/2019/11/filosofia-helenistica.html É possível observar esse movimento ao longo de todo o período da racionalidade. Não foi diferente com os helenos, medievos e renascentistas que recombinaram, reformularam, ressignificaram e criaram teorias, possibilitando a compreensão do mundo em cada um desses períodos. Veremos quais foram as principais características dos períodos entre o Helenismo e o Renascimento e de que forma elas se combinaram até o fim da Renascença. Compreenderá quais foram as principais correntes filosóficas e suas distinções com vistas a entender suas inter- relações. Por fim, reconhecerá quais foram os avanços no campo filosófico devidos à evolução do pensamento (DIONÍZIO, 2020). 5 2.1 Características filosóficas da Era Helenística, da Idade Média e do Renascimento O termo Helenismo deriva da obra do historiador J. G. Droysen Hellenismus e caracteriza o período de intercâmbio cultural entre a Grécia, o Mediterrâneo Ocidental e o Oriente próximo à Grécia. É normativo que um dos métodos que a humanidade utilizou para classificar e periodizar momentos da história foi nomeando e atribuindo características que são próprias a esses momentos. Desse modo, entende-se por período helênico aquele entre a morte de Alexandre, o Grande (323 a.C.), e o suicídio de Cleópatra (30 a.C.). Nesse contexto, o Egito foi um dos últimos lugares a herdar a tradição helenística, que teve fim, por sua vez, após a conquista do Império Romano (SILVA, 2010). Contudo, não há como precisar o momento dessa ruptura cultural com o helenismo. Sabe-se que a ascensão cristã pôs fim a qualquer resquício da cultura helênica, principalmente, em Alexandria. Uma grande pensadora que retratou essa ruptura em sua história foi a filósofa Hipátia (c. 351/370-415 d.C.), que viveu no período de ascensão do discurso cristão e, por ser adepta da filosofia helenística, acabou assassinada, apedrejada pelos novos cristãos de seu tempo. A partir da morte de Aristóteles e da ascensão romana, a Grécia deixou de ter sua influência centralizada na cidade de Atenas, que perdeu muito de seu cosmopolitismo e protagonismo na produção cultural e filosófica no mundo antigo. Desse modo, surgiu uma nova forma de conceber a realidade, bem como uma abertura cultural e filosófica à concepção greco-romana cristã. Nesse período, entrou em vigência outras intersecções culturais, incluindo a expansão linguística e de métodos educativos. Nas escolas e nas academias criadas por Platão e Aristóteles em Atenas, começou a surgir um distanciamento das doutrinas platônicas e aristotélicas em detrimento de novos olhares sobre a realidade (SILVA, 2010). Assim, estabeleceram-se as escolas estoicas, epicuristas e céticas, o que foi chamado de ecletismo filosófico. Se a característica fundamental do helenismo era a troca cultural, com a filosofia não foi diferente. Nesse período, a filosofia grega sofreu uma forte decadência, com destaque apenas para os neopitagóricos e os neoplatônicos. 6 As principais características da filosofia desse período consistem em uma grande ruptura com as reflexões platônicas e aristotélicas, bem como em uma ampliação das reflexões filosóficaspor parte de outros pensadores da época (SILVA, 2010). Esses novos pensadores passaram a trazer novas perspectivas, e a corrente que acabou por durar até mesmo em relação à ética e à religião foi o ceticismo. Outra forte característica da filosofia helenística é que, na polis grega, a cultura relacionada ao culto aos deuses se manteve. Mesmo com o surgimento da filosofia, os gregos mantiveram certos aspectos culturais e religiosos relacionados ao politeísmo. Entretanto, com a hegemonia entre os gregos e os persas, passou a predominar a religião de apenas um deus, o Deus Cósmico. Isso simbolizou uma abertura para a unificação religiosa que, mais tarde, seria convertida no cristianismo. Portanto, o helenismo é marcado pela superação do homem grego da polis. Nesse sentido, o heleno volta-se à sua liberdade, à cultura e à espiritualidade, deixando para trás a dimensão política, mas atendo-se ao cosmopolitismo: […] [a] o contrário da metafísica platônico-aristotélica, o homem helenista se volta à religião e ao mistério das coisas. Ele é senhor da sua vida, livre, independente. Para os cínicos, o homem é um cidadão do mundo. Ele deve ter cuidado com sua alma. Sua felicidade consiste na virtude e no prazer das coisas exteriores (SILVA, 2010, documento on-line). Isso demonstra como a alteração cultural afetou a dimensão formativa do homem, uma vez que a polis se preocupava em formar cidadãos, enquanto a cultura helenista se concentrava em formar indivíduos, ou seja, a primeira experiência do homem como indivíduo, aquele que goza de sua individualidade e liberdade frente ao mundo, buscando, assim, sua identidade. Assim, deu-se a transição da Antiguidade Clássica para a Idade Média, que é marcada pelo encontro entre a cultura greco-romana com a cultura judaico-cristã. Em seus primórdios, o cristianismo não consistia em um sistema religioso doutrinário fechado, o que começou a se alterar com a tradição apostólica iniciada por Paulo que, antes de se converter à religião cristã, era um soldado do Império Romano, estoico, portanto, helênico e judeu (SILVA, 2010). Após a sua conversão, Paulo começou a pregar, em cidades greco-romanas, o cristianismo enquanto religião igualitária, feita para todos e universal. Nesse período, o cristianismo ainda não se constituía em uma unidade, em uma doutrina prática. Para se consolidar como uma doutrina, o cristianismo valeu-se da filosofia grega, principalmente, a platônica. Preponderou-se, 7 a partir de então, a filosofia cristã. Nesse contexto, muitos filósofos só valorizavam a filosofia grega em seus aspectos concordantes com a nova religião. Em relação à filosofia de modo geral, consideravam-na desnecessária, pois foi concebida anteriormente à palavra de Cristo, portanto, não era relevante. Entretanto, apesar de alguns pensadores considerarem a filosofia grega em alguns aspectos, defendiam que a razão deveria estar a serviço da fé. Nesse sentido, a reflexão filosófica era admitida e praticada apenas com a finalidade de comprovar as verdades bíblicas, portanto, acreditava-se que a religião cristã, de certa forma, purificou a filosofia grega. Importante ressaltar que, nesse período de disseminação do cristianismo, as pessoas não se encontravam sem espiritualidade, ou cultura religiosa, mas foram convertidas e, em alguns casos, obrigadas à conversão. A partir de então, a nova religião ocupou-se de mudar até mesmo a linguagem grega, inserindo vocábulos próprios ao cristianismo e alterando o sentido e o significado dos termos gregos. A partir da solidificação do cristianismo e da queda do Império Romano, teve início a Idade Média (século V–XV). Esse período é caracterizado pelo forte poder da Igreja, pelo sistema político-econômico feudal e pelo poder da nobreza. Nesse contexto, o conhecimento ficava detido nos mosteiros, assim, somente quem tinha acesso eram os padres e religiosos (SILVA, 2010). A característica central desse período é a relação entre razão e fé. Assim, são classificadas duas correntes da história da filosofia cristã na Idade Média: a filosofia patrística, que tem duração do século I ao século VI; e a filosofia escolástica, que vai do século XIII ao século XIV. A corrente patrística da filosofia teve início a partir da formalização e consolidação do cristianismo. Seu início foi marcado pelas Epístolas de São Paulo e pelo Evangelho de João, então, esse período filosófico tem como fundamento os escritos desses apóstolos. Após a morte deles, a continuidade foi dada pelos padres. A missão da patrística era converter o povo e o governo romano, e isso só seria possível unindo a filosofia grega ao cristianismo. Ressalta-se que, até aquele momento, restava, culturalmente, ainda a devoção aos deuses. Portanto, ao evangelizar, os padres buscavam demonstrar que a razão servia para revelar as verdades da fé. Nesse contexto, os principais argumentos orbitavam em torno das seguintes problemáticas: 8 a criação do mundo; a santa trindade; a bondade e a origem do mal; o livre arbítrio pensado, sobretudo, em relação ao pecado original. O grande representante desse período foi o filósofo Santo Agostinho (340-430), que buscou associar o argumento cristão à filosofia platônica, substituindo o mundo das ideias pelo mundo divino. Nesse sentido, a alma, assim como para Platão, assume um caráter superior ao corpo e, por isso, deve conduzir o corpo ao caminho do bem e a Deus (SILVA, 2010). Já a filosofia escolástica (século IX ao século XV) marca um período mais sólido em relação à difusão do cristianismo. Esse momento da história é marcado pelas cruzadas e pelo surgimento das primeiras universidades (criadas pela Igreja), portanto, há alguma abertura do conhecimento, desde que submetidos à religião. O maior nome desse período foi São Tomás de Aquino, que buscou associar a fé à filosofia aristotélica (SILVA, 2010). Assim, filosoficamente, esse período ficou conhecido como aquele em que procurou-se unir o cristianismo a investigações filosóficas científicas de Aristóteles. Nesse sentido, a preocupação central passou a ser uma coalisão entre a racionalidade da natureza e seus fenômenos com a doutrina cristã. A filosofia tomista ocupou-se em buscar formas de fazer essa junção sem que a fé fosse de modo algum contrariada. Para tanto, Tomás de Aquino sistematizou o aristotelismo privilegiando o mundo, ou seja, conhecer o mundo racionalmente é como conhecer a Deus. Esse caráter mais racional, seguindo o aristotelismo, contribuiu para o período posterior, que demarcou a ruptura com a Idade Média: o Renascimento. Como o próprio termo já denota, o Renascimento foi um momento para a Europa renascer (BURKE, 2008). Esse período é caracterizado pelo individualismo e pela modernidade, ou seja, após o período obscurantista da Idade Média, o homem despertou para a própria consciência e autonomia, rompendo, até certo ponto, com a preponderância religiosa. Assim, o homem passou a reconhecer-se em qualquer comunidade tradicional familiar, de classe, de raça, política e social, mas apenas como algo mais geral e não determinante. Isso não significa dizer que o homem rompeu com a espiritualidade, mas que passou a reconhecer em si a possibilidade espiritual em uma espécie de espelhamento com o mundo. 9 Na Europa, em especial, na Itália, aumentou o número de pensadores, artistas e escritores: “começou a usar a imagética da renovação para assinalar uma nova era, uma era de regeneração, restauração, reabilitação, rememoração, renascimento ou ressurgimento, em direção à luz, após aquilo a que foram eles os primeiros a chamar a ‘Idade das Trevas’” (BURKE, 2008, p. 11). Seu avanço intelectual e científico originou o período convencionalmente chamado de Modernidade. 2.2 Correntes filosóficas desenvolvidas a partir do Helenismo até o Renascimento O helenismofoi o movimento de expansão não somente territorial da Grécia, mas também do modo de vida grego, e isso inclui, principalmente, a parte cultural. Assim como toda a mudança cultural ocorrida ao longo da história, ao expandir o seu horizonte, os gregos também foram influenciados por culturas diversas. Desse modo, não há como falar em uma cultura eminentemente grega no helenismo, uma vez que tratou-se de uma intersecção profunda. Nesse contexto, para além dos gregos e das quatro escolas filosóficas mais tradicionais, pode-se citar: o estoicismo, o epicurismo, 10 o neoplatonismo e o ceticismo. Algumas correntes filosóficas difundiram-se também em Roma. A filosofia romana teve como principal preocupação a problematização ética da vida prática. Vale ressaltar que a Roma desse período (a partir do século II a.C.) é reconhecida historicamente por sua organização social e por seu êxito político. Dessa forma, pode-se dizer que, se os romanos são reconhecidos pela sua excelência política, isso dá-se pelo caráter prático que trouxeram inclusive à filosofia. Entretanto, a filosofia romana é marcada pelas escolas gregas, vivendo, assim, o ecletismo entre o epicurismo e o estoicismo. Os romanos buscavam viver em busca da felicidade a partir dessas doutrinas helênicas, assim, uma das grandes práticas do viver bem era também a busca hedonista pelo prazer. Alguns pensadores destacaram-se nesse cenário filosófico: Varro (século 116-27 a.C.), considerado eclético por fundir as filosofias aristotélica, pitagórica, cínica e estoica; e Marco Túlio Cícero (século 106-43 a.C.), que ficou conhecido por relacionar o aristotelismo, o estoicismo, o probabilismo e a gnosiologia (SILVA, 2010). Desse modo, ambos os pensadores, desenvolveram seus argumentos em torno: […] [da] felicidade como prática da virtude, embora também admitissem serem necessários elementos externos para alcançar tal estado (assim como afirmavam os peripatéticos). Ora, caberia ao homem cultuar a razão e deixar- se guiar por sua natureza e pela natureza universal. A prova da existência de Deus se dava pelos argumentos de ordem e consenso universal (SILVA, 2010, documento on-line). Assim, em Roma, a filosofia grega assumiu três vertentes: uma orientada ao estoicismo (Mussônio Rufo e Epiteto), o epicurismo desenvolvido por Sêneca (século 4-65 a.C.), em concordância com o ecletismo. O filósofo passou a ser visto como aquele que cuidava das almas, pois preocupava-se em criar modos ético-práticos para o homem atingir a felicidade. Em especial, cita-se Sêneca, que prestou ensinamentos aos seus seguidores que tinham como fundamento o amor e a solidariedade, o que o aproxima – historicamente – do cristianismo. Entretanto, Sêneca acreditava no panteísmo (doutrina que defende a integração entre Deus e Natureza), assim, a felicidade depende de práticas virtuosas de acordo com a natureza. Já Mussônio (século 30-102 a.C.), adepto do estoicismo, argumentava que o corpo deveria ser equilibrado, assim como a natureza e, desse modo, a felicidade seria alcançada. Por fim, Epiteto (século 50-125), também estoicista, defendia que a ética deve ser definida a partir da natureza humana. Desse modo, o estoicismo: “se caracteriza pela 11 variedade de formas adotadas pelos seus pensadores: a pregação moral de Mussônio; o sermão filosófico de Dião Crisóstomo; a carta espiritual de Sêneca; o colóquio espiritual de Epiteto; a reflexão de marco Aurélio” (SILVA, 2010, documento on-line). Assim, com a fusão entre a filosofia e a ascensão do cristianismo, os primeiros momentos da Idade Média foram com a filosofia patrística, e a filosofia de Aristóteles foi ignorada. Surgiu, então, a filosofia pitagórico-platônica (junção da doutrina de Pitágoras e Platão) e, devido à mistura entre as religiões, assumiu-se um caráter misterioso, ou seja, personagens fantasmagóricos e crenças sobre os limites da natureza ganharam força nesse período, assim como a existência de seres surreais e limites da Terra. As doutrinas helênicas, nesse primórdio do cristianismo, cumpriram o papel prático de, por meio da filosofia, conduzir o homem ao bem e à felicidade. Esse momento de transição entre helenismo e filosofia cristã foi marcado não por uma inaugurabilidade do pensamento, mas de reformulação do helenismo, em concordância com o cristianismo e de ressignificação do pensamento platônico. O que foi ignorado em relação ao helenismo foi o caráter cosmológico que deu lugar à filosofia como medicina da alma (SILVA, 2010). A filosofia, então, não era mais enciclopédica, mas uma prática religiosa/ética/moral em que não se faz necessário entender, mas acreditar, ter fé e seguir os ensinamentos em direção ao bem. O filósofo passou a ser pensado como uma figura divina e sábia. Nesse período, o que preponderou, especialmente, em Alexandria, foram o sincretismo religioso e o ecletismo no que compete à filosofia. A partir desse cenário alexandrino, surgem duas principais correntes: o neopitagorismo e o chamado platonismo médio (SILVA, 2010). As duas correntes concordam ao pensar em Deus como transcendente, como único e bom, o que permite ao homem pensar a divindade em relação à humanidade. A junção ao criador se daria no mundo divino de Santo Agostinho, interpretado como céu, e a morte do corpo era interpretada pela aproximação entre espírito e Deus. Essa concepção do espírito mais expansivo e desbravador foi retomada no Renascimento. A principal corrente que assinala para isso é a humanista. O Humanismo, como o termo já indica, é um modo de pensar o mundo tendo como fundamento o antropocentrismo, o homem no centro do mundo. Esse ideal rompe com o teocentrismo, ou Deus no centro do mundo, até então vigente na Idade Média. O 12 que aconteceu nesse período renascentista foi a valorização do ser humano, portanto, das humanidades. Assim, ocorreu uma extrema valorização das artes, da literatura, da matemática como modo de compreensão e domínio sobre o mundo e da música como arte e como compreensão matemática da natureza (BURKE, 2008). Nesse contexto, surge uma compreensão distanciada da religião cristã, além do resgate das obras gregas em sua racionalidade e despendimento cristão. A razão volta a ter lugar de destaque e retoma-se o estudo estrito do que compete ao humano, enquanto áreas do saber, e o estudo das ciências naturais. O individualismo leva os estudiosos a refletirem sobre a história, em especial, greco-romana, avaliando o que caracterizou cada período até o Renascimento (BURKE, 2008). Por conseguinte, os gregos passaram a ser estudados por terem mantido a tradição racional e de crença no humano, de modo que tudo dependesse da formação desse humano. Criou-se, então, uma maneira de classificação das pessoas não só pela classe social, apesar disso ser extremamente relevante, mas pela cultura. Assim, quanto mais rico, maior acesso à cultura e desenvolvimento de habilidades. Alguns pensadores e artistas se sobressaíram nesse período, e um dos mais famosos foi o filósofo político Nicolau Maquiavel (1469-1527). Maquiavel nasceu em Florença, foi filósofo político e diplomata. Em sua obra, expressou o resgate, em especial, da política romana, refletindo sobre como ocorria o jogo político sobre o poder. Desse modo, Maquiavel ocupava-se em pensar a eficácia do poder na política e o modo como um político deve agir para alcançar o fim necessário à melhoria social (BURKE, 2008). Assim, ele acreditava que todas as ações devem ser pensadas em 13 relação à sua finalidade, sem considerar o meio necessário para que se mantenha o poder. 2.3 Avanços no campo filosófico ocorridos entre a Era Helenística e o Renascimento Pode-se dizer que os avanços filosóficos do Helenismo ao Renascimento foram importantes, ou seja, da Antiguidade até a Renascença aconteceram mudanças culturais e reflexivastanto apropriadoras quanto expropriadoras. Com isso, busca-se dizer que esses períodos foram marcados por uma relação necessária com o pensamento grego, tanto em sua afirmação como em sua negação. Seja em um ecletismo filosófico, em um sincretismo religioso ou em uma ruptura mística, esses três períodos da história encontram-se extremamente entrelaçados, de modo que suas existências foram marcadas por sua relação. Como falar, nesse sentido, em uma Idade Média sem a influência do pensamento greco-romano na ascensão cristã? Ou ainda, como formular o espírito do humanista, próprio ao Renascimento, sem a influência helenística? Foi a partir dessas correntes que a humanidade evoluiu. Os gregos do período helênico representaram, no contexto cristão, uma doutrina que forneceu as bases para o cristianismo, ou seja, a busca por uma cosmologia em que o ser uno, mais tarde interpretado como Deus, era o princípio ordenador de tudo o que existe (CHAUÍ, 2000). Desse modo, compreender a natureza era entender a ordem do universo. A partir disso, surgiram outros modos de metodizar essa compreensão, por meio da matemática, da astronomia, da ética, entre outras. 14 Cada escola helênica ocupou-se de desenvolver uma doutrina, no caso pitagórico, de uma maneira mais exata, por meio dos números alinhados à cosmologia. Nesse sentido, essa orientação do helenismo abriu espaço para a solidificação de uma nova religião. Os helenos, por se preocuparem muito com a felicidade humana, conseguiram transmitir aos pagãos uma nova doutrina que, apesar de suas diferenças, ainda prometia esse desfecho feliz. Assim, os filósofos helenistas, principalmente, os seguidores das correntes gregas em Roma, transmitiram à população uma forma de sincretismo religioso, ou seja, a religião cristã teve que adequar-se às doutrinas helênicas, que configuravam o modo de vida desse período de transição, a fim de garantir a conversão dos pagãos, já que tratava-se de uma mudança muito grande na cultura da época. Portanto, os pensadores desse período perceberam, assim como os padres, a necessidade de uma união cultural. Por isso, várias simbologias, inclusive datas, foram retiradas da cultura greco-romana e ressignificadas na religião cristã. Por exemplo, tem-se a substituição das festas pagãs em homenagem ao Deus Dionísio pelas festas cristãs natalinas, que simbolizam o nascimento de Jesus. Na data de 25 de dezembro, era comemorado o solstício de inverno em homenagem ao nascimento do Deus Dionísio. Por não se saber ao certo quando Jesus nasceu, os cristãos atribuíram a data ao nascimento de Jesus. Essa apropriação religiosa-cultural é denominada sincretismo (CLÍMACO, 2007). Ressalta- se a contribuição também ética da formação cristã: em seus primórdios, o cristianismo não consistia em uma doutrina. Em verdade, o cristianismo estava começando a ser formulado, inclusive pelos apóstolos, e foi a tradição helênica que respaldou a nova religião durante toda a Idade Média. É difícil determinar os grandes avanços filosóficos ocorridos no período patrístico, pois, em grande parte, tratava-se dessa releitura dos gregos, em especial, de Platão. A filosofia agostiniana, por exemplo, trouxe avanços ao associar a teoria platônica à religião e, só assim, foi possível garantir a disseminação do cristianismo a partir da ética e moral que, mais tarde, no período tomista, viria a se tornar a teologia (CHAUÍ, 2000). Outro avanço que ocorreu em torno do contexto filosófico medieval foi a criação das universidades. No período convencionado como escolástico, a Igreja passou a ser influenciada pela teoria aristotélica e por sua interpretação tomista, associando a ordem natural à divindade, originando, assim, um caráter mais racional. 15 Isso levou a Igreja a criar universidades, e o conhecimento tornou-se um pouco mais acessível, mas ainda subordinado às verdades bíblicas. Assim, é correto dizer que a Idade Média não foi um período de grandes ou muitos avanços, uma vez que foi marcada pelo obscurantismo religioso (CHAUÍ, 2000). Entretanto, esse período foi importante para o desenvolvimento das teorias de Agostinho e Tomás de Aquino e, por conseguinte, para a criação das universidades europeias. Diferentemente desse período obscurantista, foi no Renascimento que a filosofia voltou a ser privilegiada em seu caráter racional e científico. A partir da Renascença e da instituição de valores voltados à intelectualidade e ao desenvolvimento, a filosofia ganhou espaço mais uma vez. Se antes, na Idade Média, a filosofia deveria dobrar-se à fé e ser restrita aos padres, na Renascença, a filosofia torna-se autônoma e própria daqueles indivíduos que buscam compreender o mundo por meio da racionalidade. Nesse período, o exercício filosófico constitui-se em uma importante ferramenta do humanismo para compreender a realidade em três aspectos (CHAUÍ, 2000): 1. a busca por compreensão e teorização do ser humano; 2. a investigação científica da natureza e do universo; 3. a realização ética que busca a felicidade. Esse endosso provocou o desenvolvimento do conhecimento da época, expresso não só nos textos filosóficos, mas na pintura, na literatura, nas esculturas e na produção científica. Nesse movimento, por exemplo, a física apresentou importantes avanços que, ao mesmo tempo em que rompiam com a compreensão grega do universo, partiam dessa compreensão para reelaborar a investigação científica acerca do cosmos. Outro aspecto foi devolver a capacidade individual do homem. Sua importância foi tanta que, sem esse passo, provavelmente, a filosofia iluminista não teria sido possível na modernidade, uma vez que o iluminismo se define a partir da supremacia racional do humano frente ao mundo (CHAUÍ, 2000). Um dos avanços de grande destaque foi o republicanismo presente nesse período – pensadores como Maquiavel contribuíram para pensar o poder e seu exercício. A intersecção – ou o encadeamento – da produção filosófica desses períodos possibilitou o surgimento da modernidade, do mesmo modo que a modernidade, em sua evolução e contribuição, orientou o surgimento da contemporaneidade. A filosofia, 16 portanto, em sua historicidade, é afetada pelo contexto de uma época. Nesse sentido, as características filosóficas de um período – helênico, medievo ou renascentista – são definidas a partir da evolução do pensamento em relação à compreensão dessa realidade. A história, ou a história da filosofia, busca periodizar o conhecimento reunindo-o em correntes que se distinguem e orientam uma época. Desse modo, compreender a relação necessária entre essas correntes e esses períodos da história do pensamento é compreender a evolução da intelectualidade humana. 3 CORRENTES FILOSÓFICAS DA IDADE MÉDIA Conforme vemos em PINNOW (2020), a filosofia medieval foi produzida num período histórico que vai do século V ao XV. Nesse período, o catolicismo ganhou força a ponto de orientar a produção intelectual e científica de diversas correntes filosóficas, entre elas a escolástica. Fonte: https://conhecimentocientifico.r7.com/filosofia-medieval/ 17 Na idade moderna, observamos a partir do século XVI o surgimento de uma nova forma de pensamento, que coloca o ser humano no centro das reflexões e busca romper com a visão religiosa de mundo e de valores. Pensadores modernos como René Descartes e Francis Bacon procuram atribuir sentido aos novos rumos da filosofia e da ciência de seu período. Já na Idade Contemporânea, a partir do século XVIII, vemos inúmeras reflexões sobre filosofia, ciência, sociedade e ser humano, por meio de correntes filosóficas como a fenomenologia e do existencialismo. Neste capítulo, você vai aprender mais sobre o pensamento filosófico desenvolvido durante a Idade Média e a busca pela articulação entre fé e razão. Você também vai compreender sobre o lugar dasmulheres na filosofia, a partir da figura de Hipácia de Alexandria. Além disso, lançaremos um olhar sobre a produção filosófica contemporânea, com base nas reflexões produzidas por Edmund Husserl, Martin Heidegger e Jean-Paul Sartre. 3.1 Os avanços da sociedade e do pensamento filosófico a partir da Idade Média A filosofia medieval desenvolveu-se num período que vai do final do helenismo (séc. IV–V d.C.) até a formação do pensamento moderno (final do séc. XV e séc. XVI), com o renascimento. A produção intelectual filosófica mais conhecida foi empreendida entre os séculos XII e XIV, com a chamada filosofia escolástica. Convém destacar que a Idade Média ficou marcada na história do pensamento ocidental como uma época de trevas, um período de retrocesso intelectual, econômico, social e cultural. Podemos ainda destacar como marco desse período histórico a ocorrência da peste negra (ou peste bubônica), que matou mais de um terço da população europeia. Além disso, imperavam os regimes de servidão e colonato, bem como monopólios restritivos da igreja no que tange à educação e à cultura (MARCONDES, 2001). Todavia, foi no século XX que diversos historiadores e demais cientistas passaram a ver a Idade Média com um olhar próprio desse período. Conforme aponta o medievalista Hilário Franco Junior (2001), essa postura possibilitou a elaboração de inúmeras técnicas e metodologias de pesquisa, que fizeram a historiografia medievalista dar um grande salto qualitativo. Nas próprias palavras do autor: 18 Sem risco de exagerar, pode-se dizer que o medievalismo se tornou uma espécie de carro-chefe da historiografia contemporânea, ao propor temas, experimentar métodos, rever conceitos, dialogar intimamente com outras ciências humanas. Isso não apenas deu um grande prestígio à produção medievalística nos meios cultos como popularizou a Idade Média diante de um público mais vasto e mais consciente do que o do século XIX. O que não significa que a imagem negativa da Idade Média tenha desaparecido. Não é raro encontrarmos pessoas sem conhecimento histórico ainda qualificando de “medieval” algo que elas reprovam (FRANCO JUNIOR, 2001, p. 14). Embora tenham ocorrido inúmeros avanços nas análises sobre a Idade Média, ainda é possível nos depararmos com visões preconceituosas e esvaziadas de reflexões históricas do período. Nesse sentido, podemos questionar: o que foi produzido em termos de filosofia e ciência nesse período? Qual a verdadeira relação entre igreja e formação do pensamento intelectual? O que foi produzido em termos de filosofia e ciência a partir da Idade Média até a Idade Contemporânea? Essas perguntas serão essenciais para o desenvolvimento de nossas abordagens. No final do período helenístico (antiguidade), pode-se afirmar que a divisão mais profunda da história da filosofia é marcada pelo cristianismo. O cristianismo teve um papel decisivo, porque modificou os pressupostos sobre os quais o homem se move, isto é, a situação experiencial que parte para filosofar. O homem cristão é outro; logo, a sua filosofia é distinta, por exemplo, da filosofia praticada pelos gregos (MARÍAS, 2004). Nesse sentido, desenvolveram-se na Idade Média diversas correntes filosóficas, muitas das quais tinham como figuras essenciais teólogos e padres, como Santo Tomás de Aquino e Santo Agostinho. Conforme aponta Danilo Marcondes (2001), os primeiros representantes da filosofia cristã pertencem à chamada escola neoplatônica cristã de Alexandria, na qual se desenvolveu uma síntese entre o platonismo e os ensinamentos cristãos. Destacam-se aqui Clemente de Alexandria e Orígenes. A ideia é sempre olhar para filósofos como Sócrates, Platão ou Aristóteles e, com olhar seletivo, adotar conceitos filosóficos que podem, de alguma maneira, relacionar-se com os ensinamentos bíblicos. O que se privilegia é o dualismo platônico entre mundo espiritual e mundo material. Santo Agostinho (354–430), bispo de Hipona, no norte da África, foi um dos filósofos mais importantes da sua geração. A pergunta mais crucial por ele formulada é como a mente humana, mutável, falível, pode atingir uma verdade eterna com certeza infalível? A resposta a tal pergunta é tema de sua reflexão e teoria da 19 iluminação divina, elaborada com base na filosofia platônica. Nesse sentido, a função do filósofo é despertar a virtude e o conhecimento adormecido na alma dos seres humanos (MARCONDES, 2001). Santo Agostinho é considerado o último dos pensadores antigos, uma vez que se situa cronológica e tematicamente no contexto da antiguidade. Ao mesmo tempo, no entanto, é um dos primeiros medievais, já que a sua obra — de enorme originalidade — influenciou fortemente os pensadores medievais. Todavia, foi apenas nos séculos XII–XIII que surgiu a chamada escolástica, termo utilizado para designar a filosofia medieval. Ela passou a representar um grupo de filósofos que aceitaram certas doutrinas cristãs e para os quais, por esse motivo, a filosofia não poderia contestar as verdades contidas nas Escrituras Sagradas. Assim, a filosofia tornou-se possível, no contexto medieval, devido à difusão das escolas nos mosteiros e nas catedrais, cujo objetivo primordial era a formação consistente do clero. Estavam incluídas em seus roteiros de estudos análises publicadas por padres, teólogos e filósofos como o próprio Santo Agostinho (MARCONDES, 2001). O primeiro grande pensador da escolástica foi Santo Anselmo de Catenbury, ou Cantuária, cuja preocupação central foi articular fé, entendimento, razão e revelação. Irineu Strenger (1998, p. 118) nos apresenta informações importantes sobre o seu pensamento: O mais célebre desses argumentos em favor da existência de Deus, argumento chamado ontológico, foi tirado da ideia que temos de um Ser perfeito, implicando, pois a perfeição existência, com a existência real desse Ser perfeito. Semelhante análise pressupõe, não obstante, como espécie de fato primordial, uma presença íntima de Deus na alma e um conhecimento vago do infinito, que é refratário à análise dialética. Suas teorias tornaram-se o bem coletivo da escolástica. Assim, conforme nos aponta Strenger (1998), o encontro com Deus na intimidade da mente abre caminho para a especulação de Santo Anselmo. Essa é a via que o pensamento medieval da época seguinte percorre. Marcondes (2001) enfatiza ainda que essas reflexões tiveram diferentes desdobramentos, tocando em conceitos considerados mais centrais na filosofia — e que estavam longe de serem resolvidos. É válido salientar que o contexto europeu dos séculos XII e XIV era bem diferente. Em várias regiões, como Flandres, Itália, Inglaterra, França, desenvolveu- se uma intensa atividade comercial, e novos núcleos urbanos surgiram, em virtude 20 das imigrações para o campo. Pouco a pouco, o mundo fechado do feudalismo, com a vida marcada pelo trabalho camponês e pela pouca mobilidade social, foi deixando de existir, e se instaurou uma nova ordem política e econômica. Os artesãos se organizaram nas chamadas corporações de ofício, e os comerciantes criaram as ligas hanseáticas, a fim de regulamentar e proteger as suas práticas e os seus interesses (MARCONDES, 2001). Na baixa Idade Média, já entre os séculos XIII e XV, o Ocidente europeu assistiu a um processo de ressurgimento das cidades. A criação de eixos comerciais, reforçada pelo crescimento demográfico, pelo desenvolvimento de tecnologias agrícolas e pelo aumento na produção do campo, gerou novas condições de vida. Sugiram então as cidades (burgos), que se tornaram centros de produção artesanal e entrepostos comerciais. Também surgiram novas camadas sociais, como os burgueses, que procuravam estabelecer-se na política e angariar prestígio social. Nesse momento, uma nova forma de pensamento surgiu. O espírito humano deixava cada vez mais de lado as superstições eos medos, e dava lugar à curiosidade e à novidade. Essa foi a nova mentalidade que pautou o pensamento na idade moderna. Em termos de filosofia, houve um grande interesse pela obra de Aristóteles. Por sua preocupação científica e empírica, ele foi alvo de inúmeras leituras e do interesse de diversos intelectuais, que, de certo modo, abriram espaço para o chamado renascimento cultural e científico. Já o período considerado pelos historiadores como idade moderna, que compreende o final do século XIV até o século XVIII, é marcado pelo surgimento de grandes pensadores, que contribuíram muito para o desenvolvimento da filosofia e da ciência. A filosofia de René Descartes inaugurou de maneira mais sofisticada o pensamento moderno, juntamente com os empiristas ingleses. Desse modo, conforme Marcondes (2001), compreender as linhas mestras do pensamento de Descartes é fundamental para entender o sentido dessa mesma modernidade, da qual somos herdeiros até os dias de hoje. Assim, o projeto filosófico de Descartes é uma defesa do novo modelo de ciência inaugurado por Galilei, Copérnico e Kepler, contra a concepção escolástica que vigorou no final da Idade Média. Segundo Marcondes (2001, p. 162): 21 Se, como diz Descartes no início do Discurso do Método, o bom senso, isto é, a racionalidade, é natural ao homem, sendo compartilhada por todos, o que explica a possibilidade da ocorrência do erro, do engano, da falsidade? O erro resulta, na realidade de um mau uso da razão, de sua aplicação incorreta em nosso conhecimento do mundo. A finalidade do método é precisamente pôr a razão no bom caminho, evitando assim, o erro. As regras do método propostas por Descartes são inspiradas na geometria, mas devem ser levadas à risca. A primeira regra é a evidência (dúvida): jamais aceitar algo como verdadeiro sem antes analisar a sua procedência. A segunda regra é da análise: dividir todas as dificuldades em partes para melhor resolvê-las. A terceira parte é a síntese: ordenar o pensamento, começando pelos objetos mais simples e depois seguir para os mais complexos. A quarta regra é enumerar: fazer revisões e enumerações para se ter certeza e para não omitir nenhuma informação (MARCONDES, 2001). Ademais, é relevante tecer algumas considerações sobre a filosofia inglesa, conhecida como filosofia empirista. Os pensadores ingleses dos séculos XVI ao XVIII desenvolveram ideias relevantes, que influenciaram grandes transformações da sociedade europeia: o sensualismo, a crítica à faculdade de conhecer (que, em alguns casos, chega até o ceticismo), as ideias de tolerância, os princípios liberais, o espírito da ilustração, a religião natural, a filosofia do bom senso (common sense), a moral utilitária e o pragmatismo (STRENGER, 1998). Francis Bacon (1561–1626), nascido em Londres, estudou em Cambridge e foi um dos filósofos representantes dessa filosofia inglesa. Para ele, a grande renovação da ciência começa a partir do momento em que se consolida a liberação dos preconceitos que impedem as pessoas de chegarem à verdade. Desse modo, Bacon elaborou a seguinte categorização dos preconceitos que devem ser eliminados. Ídolo da tribo: as falsas noções derivadas da natureza humana fazem, por exemplo, que as pessoas busquem evidências que deem suporte às suas próprias conclusões. Ídolo da caverna: são interpretações surgidas de reflexões individuais, mas bloqueadas para visões mais amplas de mundo. Algumas pessoas, por exemplo, estão a favor de ideias que apoiam as suas conclusões e não observam as coisas em sua diversidade. Isso é uma “perturbação” do espírito humano. 22 Ídolo do foro/mercado: são as falsas noções surgidas a partir do uso da linguagem e das palavras como meio de se comunicar com o outro. As pessoas têm a capacidade de imaginar e nomear coisas que realmente não são. Ídolo do teatro: as correntes filosóficas não eram muito melhores do que as peças teatrais. A filosofia supersticiosa era o pior tipo de falsa noção (KLEINMAN, 2014). O pensamento de Bacon assenta-se no argumento de que não há outra base senão a experiência, sendo a indução o único procedimento fecundo da ciência. É interessante destacar que, para Bacon, existe um grande desejo do ser humano de conhecer a natureza e o seu funcionamento; para tanto, ele deve estar em contato com ela. Porém, o ser humano só pode conhecer a natureza pela via empírica e experimental, e nunca por meio da especulação. As observações devem ser registradas e, por meio dessas análises, Bacon afirma ser possível chegar a verdades universais (GRUBBA, 2012). Assim, com base nesse método indutivo, deve-se sempre partir dos fatos concretos (a experiência), para ascender às formas gerais (a abstração), no intuito de descobrir as suas causas e leis (GRUBBA, 2012). É nesse sentido que a filosofia baconiana é considerada empirista, pois todo conhecimento, além de ter a sua origem na experiência concreta, só é relevante se for considerado útil para a vida prática. Por fim, é importante mencionar o pensamento do filósofo empirista inglês John Locke (1632–1704). A sua principal obra é intitulada Ensaios sobre o entendimento humano (1690), elaborada ao longo de 20 anos de sua carreira. Locke afirma que não é possível conhecer as coisas em sua essência. Em outras palavras, temos apenas crenças e opiniões sobre o mundo natural, e não conhecimento verdadeiro. Nesse sentido, esse filosofo é um cético moderado. O conhecimento demonstrativo é aquele derivado das nossas percepções da realidade, restringindo-as a campos do saber como a geometria. Além disso, para o filósofo, não há ideias inatas no ser humano; tudo é derivado das experiências concretas e reais (MARCONDES, 2001). Desse modo, o que deve estar claro a partir dessa análise é que cada época gestou a sua própria forma de pensar e abordar o mundo. Nenhuma forma é inferior às outras, mas todas elas são diferentes e muitas vezes fundamentais para o desenvolvimento de novos meios de compreensão da sociedade e do mundo. 23 3.2 Os avanços de Hipácia nos diversos campos da filosofia Na história da filosofia ocidental, poucas vezes ouvimos falar de mulheres filósofas. É comum dar-se ênfase a filósofos clássicos como Sócrates, Platão, Aristóteles, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, Descartes, Bacon ou Locke. No entanto, sabe-se muito pouco sobre a produção intelectual feminina na história. Você vai conhecer agora o pensamento de uma das grandes filósofas do período helenístico: Hipácia de Alexandria. 24 Fonte: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/mulheres-que-mudaram-a-historia-a-filosofa-hipacia- de-alexandria/ Não é possível datar com exatidão o ano de seu nascimento, mas o mais aceito na história da filosofia é que ela nasceu em 350 e morreu em 415. Hipácia era filha de Téon, um importante matemático e cientista do século IV, e sempre demonstrou interesse pela matemática, assim como pela geometria, astronomia e filosofia. Nesse sentido: Depois de lecionar na cidade por longo período, no ano de 400 ela foi reconhecida como responsável pelos estudos neoplatônicos. Alunos de todos os cantos do mundo queriam assistir às suas aulas. Além de sua inteligência fulgurante, sua eloquência e rara beleza eram notáveis. Uma lenda em seu tempo (VRETTOS, 2005, p. 253). Antes de abordar as suas contribuições para a filosofia e a sua contribuição intelectual para a humanidade, vamos tecer algumas considerações sobre o contexto histórico vivenciado por Hipácia. Martinelli (2016), ao fazer a leitura da História Eclesiástica, de Sócrates Escolástico, mostra que a população de Alexandria era muito violenta, e havia muitos tumultos e conflitos. Tais conflitos podem ser atribuídos ao pluralismo de ideologias, uma vez que conviviam cristãos, judeus e pagãos. Vivia- se um período de grande intolerânciareligiosa, que foi acentuada quando o Imperador 25 Teodósio decretou o cristianismo como religião oficial do Império Romano, a fim de unificar todos os povos. Todavia, nem sempre Alexandria foi um centro de caos e violência. Nos séculos II e III d.C., a cidade irradiava cultura e ciência. Esse fato é comprovado pela construção da biblioteca de Alexandria, que abrigava o maior acervo de conhecimento sobre a antiguidade (MARCONDES, 2001). Nessa direção, Carl Sagan (apud MATER, 2010, documento online) aponta: Há cerca de 2000 anos, emergiu uma civilização científica esplêndida na nossa história, e sua base era em Alexandria. Apesar das grandes chances de florescer, ela decaiu. Sua última cientista foi uma mulher, considerada pagã. Seu nome era Hipátia. Com uma sociedade conservadora a respeito do trabalho da mulher e do seu papel, com o aumento progressivo do poder da Igreja, formadora de opiniões e conservadora quanto às ciências, e devido a Alexandria estar sob o domínio romano, após o assassinato de Hipátia, em 415, essa biblioteca (de Alexandria) foi destruída. Milhares dos documentos dessa biblioteca foram em grande parte queimados e perdidos para sempre, e com ela todo o progresso científico e filosófico da época. Era comum nesse período que as mulheres ocupassem um lugar mais restrito na sociedade. Poucas delas tinham a oportunidade de se dedicarem aos estudos, e muitas vezes ocupavam-se com afazeres domésticos e com o cuidado dos filhos. Hipácia representou um diferencial desse período: além da filosofia, desenvolveu conhecimentos em outras áreas, sobretudo a matemática. Todavia, não há nenhum registro dos escritos de dessa filósofa. O que sabemos sobre os seus ensinamentos é decorrente dos testemunhos de seus alunos, com quem ela mantinha relações próximas, como Sinésio ou Damáscio. Na carta 15 de Sinésio, ele relata sobre o astrolábio, utilizado como instrumento náutico, e o hidroscópio, utilizado para medir a densidade dos líquidos. Esses dois aparelhos não foram invenções de Hipácia; porém, pelos registros dos seus discípulos, é possível inferir que ela tinha profundo conhecimento sobre eles — e inclusive sabia construí- los (MARTINELLI, 2016). No entanto, não sabemos mais sobre a atuação de Hipácia na matemática. Martinelli (2016) afirma que, por meio da Suda (enciclopédia da antiguidade), é possível saber que Hipácia escreveu um trabalho sobre os Cones de Apolônio e Aritmética Diophantus. A autora aponta que ambos os trabalhos tratam sobre álgebra 26 e geometria, e Hipácia estava familiarizada com as equações. Martinelli afirma ainda que, segundo o Suda, Hipácia escreveu um trabalho intitulado O cânone astronômico, além de postular que ela teria superado o seu pai na matemática. É conveniente acompanhar um fragmento textual sobre a sua vida e os seus ensinamentos: Havia em Alexandria uma mulher chamada Hipácia cujo pai era o filósofo Téon. Ele a instruíra tão bem e ela se distinguia em tantas disciplinas que sobrepujava de longe todos os filósofos; não somente os de seu tempo, como também aqueles que desde muito a haviam precedido. Foi admitida na escola de Platão para ser sucessora de Plotino. Tinha competência para dar a conhecer as ciências a todos os que o desejassem. Do mesmo modo, qualquer um que tivesse paixão pela filosofia achegava-se a ela, atraído não somente pela sua honestidade e pela seriedade que mostrava em seus discursos, como também porque abordava os homens com pudor e decência e a ninguém parecia indecente vê-la entre eles. Todos a respeitavam e veneravam em razão de sua notável conduta. Todos a admiravam, até que a Inveja armou contra ela seu braço vingador. O fato de estar frequentemente na companhia de Orestes, prefeito de Alexandria, inspirou contra ela uma intriga junto ao clero de Cirilo, bispo de Alexandria, que impediu a reconciliação de Cirilo com o prefeito. Foi por isto que alguns adeptos ardorosos de Cirilo [...] se puseram a matá-la e, no momento em que ela retornava de algum lugar, retiraram-na da liteira e arrastaram-na para dentro da igreja que traz o nome de César, onde a despiram antes de matá-la com cacos de telhas. Depois, após arrancar seus membros, levaram-na a um lugar chamado Cinaron e lá a queimaram (MÉNAGE, 2003, p. 42). Uma análise desses fragmentos nos remete à noção de que havia uma supremacia de ideias, numa relação de poder caracterizada pela violência física. Além disso, a morte tentava eliminar não apenas o aspecto físico, mas também o ideológico — a morte das ideias. Todavia, Hipácia se manteve como uma das primeiras mulheres além do seu tempo. Outro ponto que vale destacar é a sua bela oratória, descrita como doce e equilibrada. Muitos homens vinham de diversas regiões tirar dúvidas, ouvir a sua prática filosófica e compreender um pouco mais sobre a ciência (MÉNAGE, 2003). Podemos compreender, assim, que Hipácia foi uma das grandes mulheres da história, que desafiaram paradigmas de sua época e promoveram revoluções em suas áreas de estudo. Ela mostrou capacidade intelectual e domínio sobre áreas da ciência dominadas ideologicamente por homens. Aos poucos, porém, o universo feminino foi se constituindo, e novas pensadoras contribuíram de maneira decisiva para o conhecimento. Podemos citar como exemplos da antiguidade Aspásia de Mileto e Diotima de Matinéia (séc. IV a.C.), e as mais contemporâneas, como Maria Gaetana Agnesi (1718–1799), Sophie Germain (1776–1831), Mary Fairfax Somerville (1780– 1872), Sonya Kavaleskvy (1850–1891), Amalie Noether (1882–1935). 27 4 A MENTALIDADE MEDIEVAL Compreender a Idade Média a partir da produção historiográfica brasileira é bastante desafiador, quiçá a tentativa de elucidar a mentalidade medieval por meio de um breve capítulo. Contudo, faz-se necessário reconhecer que a Idade Média é um dos temas mais fascinantes e estimulantes para os pesquisadores. Os aspectos mais intrigantes que compõem os campos de investigação sobre o período estão diretamente conectados aos estudos sobre imaginário social, mentalidades, memória social, religiosidade e poder. Nossa posição geográfica, a barreira idiomática e a miríade de fontes sobre o período espalhadas pelos inúmeros centros de pesquisa do mundo dificultam a prática de investigações mais aprofundadas, porém a tecnologia nos instiga a navegar em busca de novas problematizações. Neste capítulo, você compreenderá como o conceito de hierofania, criado por Mircea Eliade, pesquisador da religião, se aplica ao período. Além disso, você examinará a influência da religiosidade do período na expressão das artes e na literatura, construindo um melhor entendimento sobre a riqueza cultural da época e reconhecendo a importância da filosofia medieval. 28 Fonte: https://ensinarhistoriajoelza.com.br/a-idade-media-contada-nas-salas-de-aula/ 4.1 A visão hierofânica do mundo medieval Muitas tradições culturais deram origem à mentalidade medieval, pois, no processo de sua constituição, existem elementos greco-romanos, germânicos e judaico-cristãos (FRANCO JR., 2001). Nesse sentido, o segmento historiográfico conhecido como história das mentalidades, composto por renomados historiadores, como Aries, Mandrou, Duby, Le Goff, entre outros, nos dão subsídios para buscar compreender os fenômenos relacionados ao imaginário ou, mais especificamente, às visões de mundo. Entretanto, no que diz respeito à Idade Média, escassa de registros escritos, principalmente pela quantidade de indivíduos que não sabiam ler nem escrever, compreender a mentalidade da época se torna um pouco mais complexo. É preciso investigar, nesse caso, a instituição detentora de conhecimento na época, bem como estabelecer parâmetros de comparação entre as ações da instituição e a produção historiográfica desde então. Segundo Le Goff (2007), no caso da sociedade medieval,a referência lógica normativa estava calcada no sagrado, ou seja, em Deus. Tal fenômeno é considerado 29 no arcabouço teórico-metodológico da sociologia e da história das mentalidades como psicossocial, independentemente do período social. 4.2 A igreja e o sagrado A morte estava presente desde a infância no mundo medieval — as expectativas de vida eram bem pessimistas, uma vez que não havia recursos humanos capacitados para a manutenção da saúde, bem como para o planejamento familiar da época. A porta-voz da esperança naturalmente se tornou a fé em Cristo, a fé no sagrado e, principalmente, a pós-vida no paraíso cristão, tão difundido pela Igreja Católica. De acordo com Franco Jr. (2001, p. 190): Esbarramos aqui em dificuldades terminológicas importantes. Falar em sagrado desperta hoje a ideia de oposição com o profano, quando na verdade esta palavra quer dizer mais “diante do templo” (pro fanum) do que “fora do templo”. Ou seja, não se trata de conceitos opostos (como pensava a sociologia das religiões do século XIX), e sim complementares. Falar em sobrenatural implica pensar na natureza de forma restrita, enquanto para os medievais e sua cosmologia, pela qual todas as partes do universo estão estreita e indissoluvelmente ligadas entre si, a natureza tinha um sentido muito amplo. Não havia propriamente aquilo que chamamos sobrenatural: a própria palavra surgiu apenas no século XIII, no contexto do desenvolvimento de uma nova concepção de natureza. 30 A população medieval era extremamente voltada para crenças supersticiosas criadas pela Igreja Católica, considerando todos os eventos naturais como uma expressão da vontade divina, como, por exemplo, o sucesso nas plantações, a saúde, os nascimentos, as mortes e até mesmo as vitórias ou derrotas. As escrituras sagradas eram o único meio para estabelecer uma relação com o sagrado, com o divino, para que fosse possível vencer o pecado através de uma vida condizente aos mandamentos da Igreja. Segundo Eliade (1992, p. 13): O homem toma conhecimento do sagrado porque este se manifesta, se mostra como algo absolutamente diferente do profano. A fim de indicarmos o ato da manifestação do sagrado, propusemos o termo hierofania. Este termo é cômodo, pois não implica nenhuma precisão suplementar: exprime apenas o que está implicado no seu conteúdo etimológico, a saber, que algo de sagrado se nos revela. Poder-se-ia dizer que a história das religiões – desde as mais primitivas às mais elaboradas – é constituída por um número considerável de hierofanias, pelas manifestações das realidades sagradas. A partir da mais elementar hierofania – por exemplo, a manifestação do sagrado num objeto qualquer, urna pedra ou uma árvore – e até a hierofania suprema, que é, para um cristão, a encarnação de Deus em Jesus Cristo, não existe solução de continuidade. Encontramo-nos diante do mesmo ato misterioso: a manifestação de algo “de ordem diferente” – de uma realidade que não pertence ao nosso mundo – em objetos que fazem parte integrante do nosso mundo “natural”, “profano”. O sagrado, para o mundo medieval, era revelado pela Igreja Católica por meio da palavra e de sua aplicabilidade. O imaginário social da época se encarregava de construir as conexões com a realidade, pois, como lembra Le Goff (2018), a fusão de culturas que deram origem à sociedade medieval construiu pontes entre o sagrado e o profano, juntamente com o maravilhoso, o misterioso e o mágico. O sobrenatural se manifestava para além dos dogmas cristãos, pois estavam enraizadas lendas de seres, como dragões, bruxas, unicórnios, fadas, faunos, entre outras entidades oriundas da diversidade cultural, que compunham o tecido social do medievo. É preciso considerar que a transição do mundo politeísta para o mundo monoteísta se deu por meio de um sincretismo construído pela Igreja Católica. Com isso, presume-se que boa parte das crenças das culturas politeístas tenham sido a base para a construção das alegorias de fantasia do mundo medieval, porém, consequentemente, a essência do sagrado e da verdade estava devidamente resguardada sob a égide do Cristianismo. 31 4.3 A relação entre visão hierofânica medieval e o estabelecimento dos sacramentos cristãos Parafraseando a pergunta original de Eliade (1992) — “como uma sociedade se esforça para se manter ao máximo do tempo possível num universo sagrado?” — na obra O Sagrado e Profano, o autor problematiza, do ponto de vista fenomenológico, a questão relacionada ao sagrado e às suas dimensões. Até o momento, compreendemos que a mentalidade medieval foi forjada pelos dogmas do Cristianismo, e, a partir disso, a instituição consolidou formas de controle social e espiritual. Contudo, a partir das reflexões de Eliade (1992), pode-se considerar que uma das estratégias da Igreja Católica para manter a sociedade medieval constantemente em um universo sagrado foi o estabelecimento dos sacramentos. De acordo com Franco Jr. (2001, p. 202): Colocado no centro da luta entre o Bem e o Mal, com sua alma disputada por anjos e demônios, o homem podia contar com preciosos apoios, hierofânicos. Em primeiro lugar, indispensáveis para a salvação, os sacramentos* ministrados pela Igreja: a comunhão, por exemplo, era vista como contato mais mágico que espiritual com Deus, daí, ainda no século XI, camponeses enterrarem pedaços de hóstias consagradas para aumentar a fertilidade da terra. De forma geral, toda a liturgia era “aos olhos dos fiéis uma coleção de ritos dos quais eles esperavam tirar proveito”. Depois, os santos e as relíquias* também fortaleciam o homem, dando-lhe melhores condições de enfrentar as forças demoníacas. Os sacramentos da Igreja Católica foram baseados na interpretação das escrituras sagradas. Segundo as fontes oficiais do Vaticano, os sacramentos concebidos pela Igreja Católica são elos entre os cristãos com o sagrado, ou seja, por meio deles, na perspectiva teológica cristã, o indivíduo que professa a fé em Jesus Cristo se renova e se fortalece. Segundo Franco Jr. (2001), os sacramentos foram parte importante da estratégia da Igreja Católica para manifestar o sagrado efetivamente na vida secular da população medieval. O autor ressalta que o cotidiano medieval foi gradativamente sendo atingido pelos sacramentos cristãos. Por outro lado, Eliade (1992) propõe que a representação do sagrado possui expressão simbólica através de uma malha de significados. Segundo o autor, num primeiro momento, esse conjunto de significados não é compreendido como parte de um todo. Entretanto, quando analisamos os sacramentos como apoios hierofânicos e complementares ao imaginário dos cristãos, 32 percebemos o quanto a Igreja criou meios para a expansão da percepção dos fenômenos considerados sagrados, disseminando, assim, uma sensação de pertencimento mais sólida ao Cristianismo e, consequentemente, estabelecendo seus alicerces na sociedade medieval (DIONIZIO, 2020). 4.4 A arte e o sagrado no mundo medieval A manifestação do sagrado esteve presente como expressão da arte, sobretudo na arquitetura medieval, uma vez que a Igreja entendia que, em um mundo sem referências físicas de centralização de poder, como, por exemplo, prédios públicos, era preciso consolidar espaços de vivência da fé pautados pelas escrituras sagradas. A partir disso, a arquitetura medieval teve destaque na construção de castelos, catedrais, igrejas e monastérios. Como vimos até aqui, a Igreja recorria às sagradas escrituras para justificar suas demandas estratégicas. Sendo assim, como porta voz de Deus, estabelece a simbologia dos templos como a materialização da doutrina cristã. Vocês esperavam muito, mas, eis que veio pouco. E o que vocês trouxeram para casa eu dissipei com um sopro. “E por que o fiz?”, pergunta o SENHOR dos Exércitos. “Por causa do meu templo, que ainda está destruídoenquanto cada um de vocês se ocupa com a sua própria casa” (AGEU, 1980, 1:9). 33 Fonte: https://www.meisterdrucke.pt A escritura acima é uma das muitas que ajudaram a caracterizar na arte medieval a essência da religiosidade cristã. A Igreja recorreu à arte como forma de educar a população iletrada, por meio de pinturas e vitrais, com a representação de passagens bíblicas que expressavam os dogmas cristãos. Segundo Strickland e Boswell (2014), a arte religiosa teve objetivos didáticos construídos em parceria com o corpo eclesiástico, não havendo, em muitos casos, obras assinadas, pois tudo pertencia ao sagrado, logo, não haveria necessidade de interferência do mundo secular. Nesse contexto, durante os primeiros séculos da Idade Média, os artistas não tiveram o devido destaque pela grandiosidade de suas obras, pois eram parte integrante do imaginário social “[...] fé sem obras é morta [...]” (SÃO TIAGO, 1980, 2: 26). Como a meta cristã era a salvação e o paraíso, ou seja, a vida eterna, aos poucos, o realismo das representações de mundo desapareceu. Comuns na Antiguidade Clássica, período que antecedeu a Idade Média, a representação do corpo nu não era mais recomendada, passando a ser condenada. As novas composições de corpos femininos tinham um novo olhar em termos de anatomia, fugindo, e muito, das representações greco-romanas. Observe, na Figura abaixo, uma pintura da Virgem Maria. 34 No contexto artístico medieval, o corpo foi substituído pelo espírito, pois o corpo do mundo greco-romano era considerado profano, e o espírito, a partir dos dogmas católicos, seria a conexão com o sagrado. Esse ensinamento foi incentivado pelos teólogos da época com o intuito de que os cristãos vislumbrassem a beleza por meio do divino representado nas esculturas, pinturas e vitrais das Igrejas, catedrais e monastérios. De acordo com Franco Jr. (2001, p. 144): A arte ocidental dos séculos IV-VIII realizou uma síntese de elementos de origens diversas. Da arte romana clássica conservou-se algo das técnicas e das características arquitetônicas. Da arte oriental, com a qual se manteve contato mesmo após as invasões germânicas, através de mercadores e missionários, veio certa estilização e hieratismo das formas. Da arte germânica, típica de povos nômades, aproveitou-se o caráter não figurativo e o geometrismo estilizado. Da arte céltica, através das iluminuras dos monges irlandeses, absorveu-se o uso de linhas abstratas, apenas ornamentais. Da arte cristã primitiva veio o essencial, isto é, a temática e o simbolismo. No todo, elementos que se completavam mais do que se negavam, tendo cada um deles peso variável conforme o gênero artístico (arquitetura, escultura, pintura, miniatura, mosaico etc.) e as condições locais (composição étnica, meio físico, época). 35 Segundo Soares (2017), a arquitetura medieval teve como foco projetos com estruturas mais leves, suaves e arejadas. O padrão cristão de edificação tinha um exterior simples, a massa e o volume da arquitetura romana cederam lugar para edificações que refletiam o ideal cristão: discretos no exterior, mas resplandecentes, com uma simbologia representada pelo uso de afrescos, mosaicos e vitrais. Com isso, a autora evidencia três estilos de arte medieval distintos: bizantino, romano e gótico. A arte bizantina geograficamente se manifesta no Mediterrâneo Oriental a partir de 330 d.C., momento marcado pela transferência do trono do Império Romano, por Constantino, para Bizâncio, que teve seu nome posteriormente alterado para Constantinopla. O estilo bizantino mesclou elementos da arte cristã, combinados com uma variedade de cores e um estilo decorativo único, com influências da cultura grega oriental. Conforme Soares (2017), a Igreja de Santa Sofia é a representação da arquitetura da época, tendo sido construída por aproximadamente 10 mil homens por quase 6 anos (Figura abaixo). A arte românica se apropria de elementos da cultura romana e foi desenvolvida entre os séculos V e IX, período historiograficamente chamado de Alta Idade Média. Fazem parte do estilo uma arquitetura focada em castelos, catedrais, igrejas e monastérios, com características específicas: poucas entradas de luz, sem muitas 36 janelas, robustas, com edificações horizontais, mais grossas, com abóbadas e arcos, como fortalezas seguras e prontas para defesa. Entre os séculos X e XV, a arte gótica ganha força no mundo medieval e apresenta características distintas de sua antecessora, a arte românica, por possuir mais aberturas, leveza, paredes mais finas. Há consenso entre os historiadores da arte de que as catedrais góticas reúnem elementos únicos de beleza e esplendor do mundo greco-romano combinados com o sagrado cristão. Alguns autores, como Strickland e Boswell (2014), chamam as catedrais góticas de “bíblias de pedra”, pois avançam para além dos elementos da cultura clássica, com uma arquitetura mais ousada e com novos elementos de engenharia para a época: a utilização da abóbada entre traves, sendo sustentada por estruturas externas, chamadas de arcobotantes (Figura abaixo). Segundo Soares (2017), essa nova engenharia possibilitou que as construções góticas tivessem paredes estreitas, com janelas maiores, cobertas por vitrais, aumentando, assim, a luminosidade no interior da edificação. 37 4.5 A literatura medieval Ao contrário de nossa realidade, no mundo medieval, a literatura também esteve a serviço da Igreja Católica como ferramenta pedagógica para o reforço do Cristianismo. Os autores da época eram membros do corpo eclesiástico bispos, padres e até mesmo papas se aventuravam nas práticas literárias. Contudo, os consumidores da literatura da época eram os próprios membros do clero e alguns da nobreza (DIONIZIO, 2020). Além das inspirações religiosas que faziam parte da substância essencial das obras, as influências da filosofia também se faziam presentes, com reflexões de Aristóteles e Platão, mas poucas na Alta Idade Média. O corpo eclesiástico, apreciadores do conhecimento das muitas dimensões da arte dos greco-romanos, foram os guardiões e responsáveis pela conservação de inúmeras bibliotecas e verdadeiras preciosidades artísticas do mundo clássico. Nesse período, a Igreja, por intermédio do sagrado, explícito na doutrina cristã, estimulou que os literatos medievais escrevessem sobre o imaginário cultural, social e sagrado do complexo tecido medieval. Os autores escolheram relatar em suas obras passagens bíblicas, produziram verdadeiras biografias romanceadas sobre a jornada de santos católicos e, sempre, reforçaram o sagrado por intermédio da existência de Deus e da vida eterna. Na literatura, por outro lado, à primeira vista a fronteira entre os dois polos culturais estava colocada no idioma utilizado, o latino na cultura clerical e o vernáculo na vulgar. De fato, segundo Bruce Rosenberg, a literatura medieval em língua vulgar está mais impregnada de elementos folclóricos do que a de qualquer outra época. No entanto, a questão é mais complexa. Na literatura latina, ao lado de uma produção nitidamente clerical (crônicas, poesias de cunho clássico), havia uma de espírito popular (hagiografia) e outra erudita mas anti eclesiástica (goliárdica). Na literatura vernácula, havia gêneros com forte coloração clerical (canção de gesta, ciclo do Graal) e outros acentuadamente laicos (lais, fabliaux). Em termos culturais, portanto, e não apenas linguísticos, boa parte da literatura da Idade Média Central estava na zona da cultura intermediária (FRANCO JR., 2001, p. 144). Há um consenso entre os historiadores Le Goff (2018) e Gombrich (1999) sobre dois aspectos importantes relacionados á Idade Média: primeiro, a falácia do termo renascentista “idade das trevas”, uma vez que, em quase mil anos de medievo, houve muitos “renascimentos”;segundo, para os autores, as camadas sociais que viveram entre os séculos V e X não compreendiam e tampouco identificavam-se com estilos 38 artísticos, seja nas artes ou na literatura, pois haviam muitas influências artístico- culturais. Somente a partir do século XI, com um processo civilizatório mais consolidado, os estilos artísticos seriam mais bem compreendidos e apreciados. A partir do século XII, conforme o consenso de alguns autores do medievo, o trovadorismo provocou algumas mudanças na literatura. O amor, a aventura, contos épicos e sátiras começaram a ter mais espaço, mas sempre sob os auspícios da Igreja e muitos considerados profanos. Segundo Barros (2015, p. 216): O Amor Cortês encontra seus principais veículos de expressão nas cantigas dos trovadores, nos romances corteses, nas “cortes de amor” e, em muitos casos, nas próprias “vidas” dos poetas-cantores que percorriam as cortes feudais da Europa Medieval e que por vezes acabavam transformando a sua própria existência errante em uma autêntica obra de arte. O século XII também nos legou o famoso Tratado do Amor Cortês, de André Capelão, que procura refletir sobre o Amor à maneira dos tratadistas medievais, sendo esta também uma importante fonte para a compreensão dos novos padrões de sensibilidade. Entretanto, desse momento em diante, a literatura passa a ter outro papel no imaginário da época. 4.6 Entre a fé e a razão: a filosofia medieval A igreja Católica, para além de tudo o que já foi dito neste capítulo, teve a incumbência de agir como uma entidade supranacional, dialogando e costurando alianças com as camadas dominantes, estabelecendo seu papel no campo cultural, social e político. Com isso, expandiu sua estrutura física, agregando riqueza material e, por conseguinte, tornando-se a proprietária de quase um terço das terras férteis do continente europeu, em um período em que o latifúndio significava glória, poder e riqueza. Com isso, seu plano universalista abarcou diferentes territórios, mediando muitas celeumas entre a fé e a razão. A partir disso, a Igreja estabeleceu, do ponto de vista da cultura, uma estratégia intelectual, na qual a fé cristã seria a base primordial de todo o conhecimento humano. Portanto, a fé fundamentava-se em um processo de doutrinação contínua e plena às revelações feitas por Deus aos homens, registradas na Bíblia, com os devidos esclarecimentos feitos pela autoridade da Igreja Católica. Num primeiro momento, é preciso ter em mente que a questão central do debate para a constituição da filosofia na Idade Média gira em torno do conflito entre 39 fé e razão. Trata-se de um período profundamente teocêntrico, em que os filósofos também eram religiosos, com uma forte bagagem teológica, e a grande preocupação desses homens era equilibrar a fé e a razão. Se a razão não fosse ignorada, ao contrário, fosse incorporada à fé cristã, a Igreja católica certamente teria mais seguidores. Então, era preciso que houvesse uma diferenciação e, ao mesmo tempo, uma conciliação no debate entre os dogmas construídos pela fé e as descobertas elaboradas pela razão. No entanto, segundo Franco Jr. (2001, p. 146): [...] o campo cultural em que melhor se expressou a tentativa de harmonização do passado clássico com o cristianismo foi o da Filosofia. Na verdade, tal pretensão não foi apenas a dos primeiros tempos medievais, mas de toda a Idade Média, como veremos mais adiante. Na fase que ora examinamos, isso transparece na corrente conhecida por Patrística. Na essência, ela procurava provar que a doutrina cristã não conflitava com a razão, demonstrando assim a falsidade do paganismo, para tanto, ela recorreu à filosofia grega, sobretudo ao platonismo, que se adequava melhor à mensagem cristã. Agostinho de Hipona, posteriormente, Santo Agostinho, como ficou conhecido, foi o primeiro filósofo e teólogo responsável pela aproximação entre a fé e a razão. Em sua obra, Cidade de Deus, produzida em 426 d.C., o pensador cristão refutou as heresias da época, tais como o Maniqueísmo (crença no dualismo bem e mal, de origem persa), o Donatismo (corrente contrária aos eclesiásticos com atribuições no Estado), o Arianismo (compreensão de Jesus humano, não divino) e o Pelagianismo (compreensão do homem como responsável por sua salvação). Agostinho foi o principal expoente da Patrística, corrente filosófica que buscou compreender a relação entre o corpo e a alma, entre a fé e a razão. O diferencial de Agostinho foi o resgate do mundo dos sentidos da Antiguidade Clássica, concebido pela filosofia de Platão. A partir desse mundo dos sentidos, Agostinho propôs uma reflexão que equilibrava o conhecimento, a razão, o pensamento e os sentidos humanos dentro do debate teológico da doutrina cristã. Segundo Gomes (2002, p. 222): A bifurcação da escatologia cristã consumou-se com a teologia agostiniana, mantendo o cristianismo numa permanente tensão entre instituição e inspiração, entre poder e carisma. Agostinho refutou o milenarismo e a escatologia iminente, rejeitando a possibilidade da identificação de um reino visível de Cristo na terra antes do Juízo Final e falando antes de uma presença invisível do Reino de Deus na Igreja. Nesta escatologia que se tornou oficial na Cristandade medieval, o futuro prometido era reconhecido como já presente no culto, na proclamação da Palavra de Deus, nos sacramentos, na Igreja. Dava-se deste modo uma quase identificação do 40 Reino de Deus com a Igreja numa espécie de “êxtase” da realização no presente do futuro prometido. Era como que um “mito” do presente. Seguidor das ideias de Agostinho de Hipona, o teólogo e filósofo Anselmo de Cantuária, nascido como Anselmo de Aosta (cidade de Aosta, Itália), hoje conhecido como Santo Anselmo, tinha como lema principal a expressão: fides quaerens intellectum (a fé que procura entender), ou seja, ele utilizava um argumento ontológico, também da escola platônica, sobre “o que é isso?”. O filósofo defendia a ideia de que Deus era um ser perfeito, portanto, ele deveria existir por essa perfeição. E se Deus era perfeito, era inconcebível para a mente humana o significado de Deus. A Igreja traduziria quem seria e o que seria Deus. Em suas obras, o filósofo expressa suas preocupações sobre os debates relacionados à conciliação entre fé e razão. No livro Monológio, Anselmo tenta demonstrar a existência de Deus por intermédio da razão, sem o uso das escrituras sagradas. Em Proslógio, Anselmo também desenvolve uma fundamentação da fé com argumentação pautada pela razão. O pensador cristão, além de ser um intelectual adepto do aprimoramento filosófico por meio do equilíbrio entre a razão filosófica e teológica, também teve atuação política na sustentação e na defesa da doutrina cristã e da Igreja. Mas uma vez que é melhor ser sensível, omnipotente, misericordioso, impassível, do que não o ser, de que modo és sensível se não és um corpo?, ou omnipotente se não podes todas as coisas?, ou misericordioso e simultaneamente impassível? De facto, se só as coisas corporais são sensíveis, reportando-se os sentidos ao corpo e estando no corpo, de que modo és tu senciente, quando não és corpo, mas sumo espírito, o qual é melhor que o corpo? Mas, se sentir não é senão conhecer ou ao conhecimento – quem sente, com efeito, conhece segundo a propriedade dos sentidos, como por exemplo, a cor pela vista, os sabores pelo gosto – diz-se sem inconveniente que, sente de algum modo tudo o que conhece de algum modo. Assim, Senhor, se bem que não sejas corpo, és, contudo, vera e sumamente senciente, do modo mesmo como conheces sumamente todas as coisas, e não da maneira como também o animal conhece pelo sentido corpóreo (ANSELMO, 2008, p. 15). Segundo Chesterton (2015), Tomás de Aquino foi professor da Universidade de Paris e membro da Ordem dos Dominicanos, responsável por ampliar o projeto
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