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SEGURANÇA ALIMENTAR E LEGISLAÇÃO APLICADA UNIASSELVI-PÓS Autoria: Cony Gauche Indaial - 2020 1ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2020 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: G265s Gauche, Cony Segurança alimentar e legislação aplicada. / Cony Gauche. – In- daial: UNIASSELVI, 2020. 180 p.; il. ISBN 978-65-5646-157-1 ISBN Digital 978-65-5646-154-0 1. Segurança alimentar. - Brasil. 2. Legislação. – Brasil. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 311.6123 Sumário APRESENTAÇÃO ............................................................................5 CAPÍTULO 1 SEGURANÇA ALIMENTAR ..............................................................7 CAPÍTULO 2 BOAS PRÁTICAS PARA OS SERVIÇOS DE ALIMENTAÇÃO ......67 CAPÍTULO 3 LEGISLAÇÃO APLICADA ............................................................121 APRESENTAÇÃO Incontáveis mudanças sociais e culturais se interpõem entre a sociedade que conhecemos hoje e os primeiros grupos humanos existentes. Embora nossa percepção sobre necessidades e direitos básicos de um ser humano tenha sido aperfeiçoada com o tempo, urgências alimentares estiveram sempre presentes no topo de nossa cadeia de prioridades. Muitos aspectos modernos tangentes aos diretos humanos surgiram após as primeiras guerras mundiais, com a fundação da Organização das Nações Unidas – ONU. Entre outros direitos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos declara o direito à alimentação como básico a todo ser humano. Exercer este direito envolve um grande esforço mundial para garantir abastecimento e elevados padrões de qualidade alimentar acessíveis a todos. Embora existam grandes disparidades com relação às necessidades alimentares de diferentes populações, um grande escopo de trabalho permite que a segurança alimentar seja garantida nas mais distintas situações. No contexto deste curso, a segurança alimentar em bares e restaurantes, cada vez mais utilizados como fonte de alimentação diária de grande parte da população, é analisada sob a luz das boas práticas alimentares e da legislação vigente. O grande tema Segurança Alimentar e Legislação Aplicada abordado neste livro é didaticamente dividido em três capítulos. O primeiro capítulo apresenta os conceitos relacionados à segurança alimentar necessários para a compreensão das necessidades atuais com relação à qualidade dos alimentos consumidos. O capítulo discorre ainda sobre a teoria com relação à microbiologia de alimentos, importante para que o aluno tenha um conhecimento básico sobre os microrganismos presentes nos alimentos e as doenças transmitidas por alimentos em caso de contaminação. A ampla abordagem com relação às condições favoráreis para o desenvolvimento de microrganismos em alimentos, além das possíveis doenças decorrentes da ingestão destes, ressalta a importância dos requisitos básicos de higiene estabelecidos pelas legislações vigentes. O segundo capítulo tem seu enfoque nas Boas Práticas de manipulação dos alimentos. Baseado na teoria discutida no capítulo anterior, as ações adotadas dentro da cozinha de um restaurante são apresentadas no decorrer deste capítulo de maneira que o alimento adquirido seja manipulado de tal forma a ser servido ao cliente com segurança microbiológica, livre também de contaminações químicas e físicas. Para tanto, são apresentadas orientações desde o processo de aquisição de matérias-primas e seleção dos fornecedores, passando pelos procedimentos de armazenamento de produtos alimentícios e de limpeza, organização, até o momento do pré-preparo, preparo, acondicionamento e conservação de alimentos prontos. Todo o procedimento descrito, do fornecedor ao cliente servido em sua mesa, é baseado nas diretrizes estabelecidas na legislação federal. Este capítulo apresenta ainda as recomendações com relação à higiene dos alimentos, além da higiene pessoal e ambiental, imprescindíveis para a garantia da segurança alimentar. Por fim, o terceiro capítulo se concentra no detalhamento da principal lei que orienta os serviços de alimentação: a Resolução RDC 216/2004, discutida ao longo de todo o livro. Com base nesta lei, é apresentada a documentação exigida pela Vigilância Sanitária ao estabelecimento, tais como o Manual de Boas Práticas e os Procedimentos Operacionais Padronizados. A elaboração destes documentos é discutida de maneira que o aluno entenda o seu papel dentro da empresa e a importância da sua necessidade. Neste capítulo são apresentadas as Organizações Internacionais responsáveis pela pesquisa e orientação sobre políticas públicas referentes às ações higiênico-sanitárias essenciais para a garantia da qualidade dos alimentos. Com base nas orientações dos organismos internacionais e nas diretrizes nacionais, a legislação nacional atualizada aplicada aos serviços de alimentação é apresentada. O capítulo discorre ainda sobre as legislações referentes aos limites máximos tolerados para contaminantes biológicos, químicos e físicos. A adoção das Boas Práticas de manipulação dos alimentos tem como principal objetivo a segurança do alimento produzido, e esta segurança é medida através destes valores padrões, estabelecidos em lei. Por fim, o capítulo encerra este livro com a apresentação das punições estabelecidas frente ao não cumprimento das normas apresentadas, caracterizando as infrações sanitárias. Espera-se que ao longo deste livro o leitor desenvolva uma noção ampla de todos os componentes envolvidos no sucesso da obtenção de um produto preparado dentro das condições ótimas de segurança alimentar. Não se espera aqui formar especialistas em microbiologia ou advocacia, mas fornecer as ferramentas de compreensão necessárias para que o gestor de um bar ou restaurante possa adequar seu negócio às leis vigentes e compreenda o contexto e a necessidade da existência delas. Compreende-se que o estudo das leis vigentes é difícil, demanda tempo e esforço, não sendo uma unanimidade na lista de atividades prazerosas para se realizar em seu tempo livre. Entretanto, se o propósito deste livro for bem- sucedido, o leitor compreenderá que sua necessidade e benefícios são suficientes para superar esta barreira. CAPÍTULO 1 SEGURANÇA ALIMENTAR A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Defi nir os conceitos na área de microbiologia e segurança alimentar. Apresentar a microbiologia aplicada à área de alimentos e identifi car os principais agentes causadores de contaminação de origem alimentar. Avaliar e identifi car possíveis focos de contaminação microbiana durante qualquer processo de manipulação de produtos alimentícios. Aplicar a teoria como forma de evitar que a contaminação aconteça. 8 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA 9 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 1 CONTEXTUALIZAÇÃO Neste primeiro capítulo, serão apresentados os conceitos básicos de segurança alimentar. Uma visão ampla e sedimentada deste tópico de estudo, no contexto deste curso, é a pedra fundamental a ser utilizada na compreensão dos tópicos posteriores. Enquanto neste capítulo lidaremos com conceitos básicos e científi cos comumente abordados pela segurança alimentar, os capítulos posteriores pretendem oferecersoluções e guias para se exercer as boas práticas requisitadas durante a manipulação de alimentos, de acordo com as leis vigentes no Brasil. Ao longo desta primeira parte de nosso texto, a segurança alimentar é discutida em três tópicos principais: (i) conceitos básicos, (ii) microbiologia de alimentos e (iii) prevenção de contaminação alimentar. A primeira parte lida com conceitos estabelecidos ao longo dos anos por organismos nacionais e internacionais, amplamente aceitos no âmbito da segurança alimentar. Assim, defi nições e normas gerais serão apresentadas juntamente ao histórico dos organismos internacionais que guiam as normas mundiais relacionadas ao tema. As outras duas partes baseiam-se em uma visão científi ca do tema. Na segunda parte, conceitos sobre os principais microrganismos a serem conhecidos, seu crescimento, comportamento e infl uência de fatores químicos serão apresentados. Finalmente, a última parte possui enfoque na prevenção à contaminação causada por estes microrganismos nos alimentos. Baseando-se nos fatores fi siológicos e ambientais apresentados, uma ampla visão sobre como evitar a proliferação de microrganismos indesejados em alimentos é oferecida. Com estas informações em mente, podemos assimilar mais facilmente as boas práticas de manipulação de alimentos (Capítulo 2) e compreender o impacto destas atitudes, que visam ser regulamentadas pelas leis específi cas ao tema (Capítulo 3). 2 SEGURANÇA ALIMENTAR A atual defi nição para o termo segurança alimentar, no Brasil, foi construída durante a elaboração do documento brasileiro apresentado na Cúpula Mundial de Alimentação por representantes do governo e da sociedade civil. A segurança alimentar é considerada um direito social, e defi nida pela Lei de Segurança Alimentar e Nutricional, como segue: 10 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA Segurança alimentar consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade sufi ciente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis (BRASIL, 2006, p. 1). O emprego do termo segurança alimentar, no entanto, surgiu na Europa ao fi nal da Primeira Guerra Mundial. Percebeu-se que a dominação de um país sobre o outro poderia ser exercida através do controle do fornecimento de alimentos. A necessidade do estoque de alimentos e a autossufi ciência na produção destes tornaram-se, portanto, requisitos para a segurança nacional. Mais tarde, ao fi m da Segunda Guerra Mundial, em 1945, foi criada a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura – FAO. A necessidade da fundação de um órgão dedicado exclusivamente a estes temas surgiu, pois questões relativas à segurança alimentar alcançaram níveis críticos, sendo necessário que suas resoluções fossem trabalhadas como uma estratégia global. Em 1948, em Assembleia Geral, a Organização das Nações Unidas – ONU – proclama a Declaração Universal dos Direitos Humanos, reconhecendo a alimentação como um dos direitos básicos humanos. Hoje, a segurança alimentar refere-se, portanto, à implantação de políticas públicas com o objetivo de garantir às pessoas de todo o mundo o direito ao acesso a alimentos de qualidade, em quantidades apropriadas para uma vida saudável. 2.1 ALIMENTO SEGURO No contexto apresentado, um alimento seguro é aquele que não oferece risco à saúde e à integridade do consumidor, defi nição dada pelos Princípios Gerais de Higiene Alimentar do Codex Alimentarius – FAO –, em 1998. O alimento seguro ou adequado para o consumo humano refere-se àquele que foi manipulado segundo um conjunto de normas de produção, transporte e armazenamento, ou seja, garantindo a qualidade do alimento desde a produção até o consumo, sem apresentar riscos à saúde do consumidor. Essas normas visam à garantia das características microbiológicas, físico- químicas e sensoriais, consideradas como padrão, especifi cado por lei. Muitas dessas regras são internacionais e amplamente adotadas por diversos países. Desta forma, relações entre diferentes povos baseiam-se em necessidades sanitárias e comerciais básicas amplamente difundidas. Isso signifi ca uma garantia de que estes alimentos são saudáveis, sem a presença de contaminantes 11 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 de qualquer natureza e não causam danos à saúde de quem os consome, independentemente de sua localização geográfi ca. Pode-se classifi car um alimento como sendo seguro desde que os seus constituintes ou possíveis contaminantes causadores de algum perigo à saúde estejam ausentes ou em concentração abaixo do limite de risco estabelecido por lei. Um alimento se torna inseguro, por sua vez, quando os microrganismos presentes nele atingem a dose infectante, podendo causar malefícios à pessoa que o consome. Logicamente, a presença de tais elementos contaminantes (e.g. resíduos químicos, produtos tóxicos ou materiais estranhos) pode contaminar o alimento em questão. Para facilitar o entendimento dos diferentes tipos de contaminantes, o conceito de perigo em alimentos é importante na garantia de um alimento saudável. 2.2 PERIGOS EM ALIMENTOS A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA – classifi ca os riscos em alimentos em quatro categorias: os agentes biológicos, os agentes químicos, os agentes físicos ou alguma propriedade do alimento capaz de provocar um efeito nocivo à saúde. No entanto, não podemos confundir risco com perigo em alimentos. Enquanto o risco, no contexto de segurança de alimentos, signifi ca a probabilidade da ocorrência de um efeito adverso à saúde e a severidade deste efeito frente à exposição a um perigo específi co, o perigo, propriamente dito, é o agente químico, físico ou biológico com o potencial de causar efeito adverso à saúde. Inclui-se nos perigos a presença de alergênicos, estendendo-se para perigos de natureza radioativa. As categorias de perigo em alimentos são defi nidas individualmente na sequência. 2.2.1 Perigos químicos Os perigos químicos são associados ao uso de aditivos químicos durante o processo de controle de produção na agricultura e na indústria de alimentos, como defi nido por Yeung e Morris (2001). Segundo os autores, os principais aditivos empregados são os agrotóxicos, os conservantes e o tratamento à base de antibióticos para aumentar a proteção e o tempo de vida de prateleira dos produtos. Alguns resíduos químicos indesejados podem estar presentes no alimento devido a sua utilização durante o preparo do produto, seu manuseio inadequado ou devido a operações realizadas em ambientes poluídos. 12 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA A prevenção deste tipo de perigo é alcançada através das boas práticas de fabricação e manipulação de alimentos. Essas ações devem ser feitas desde a produção até a embalagem ou entrega do alimento para o consumidor. Além disso, análises periódicas dos alimentos são obrigatórias a fi m de que os níveis de possíveis contaminantes químicos sejam avaliados. É importante ressaltar que o efeito da contaminação química pode ser crônico, como no caso de substâncias carcinogênicas e acumulativas, ou agudo, como no caso de alergênicos que podem levar à manifestação de sintomas imediatos. Alguns exemplos de perigos químicos mais comuns na manipulação de alimentos são: resíduos de produtos de limpeza utilizados em higienização, resíduos de produtos químicos utilizados na manutenção de máquinas, resíduos de pesticidas e agrotóxicos, metais tóxicos, resíduos veterinários, toxinas naturais e microbianas, metabólitos de origem microbiana. Percebe-se que em muitos casos, a rastreabilidade da matéria-prima e insumos é fundamental para a garantia de um alimento seguro. Até o início do mês de fevereiro de 2020, seis mortes foram relatadasrelacionadas ao cosumo de cervejas contaminadas por dietilenoglicol em Belo Horizonte - MG. Esse componente químico tóxico utilizado como anticongelante é empregado na indústria para evitar que os líquidos evaporem, e não deveria entrar em contato com a bebida. • Houve falha nos procedimentos de boas práticas de manipulação? • Como a cerveja foi contaminada? • De que forma a empresa poderia ter prevenido a contaminação? Até o momento da elaboração deste livro, o caso da contaminação das cervejas da empresa Baker não havia sido completamente esclarecido. Uma possível falha que está sendo avaliada por especialistas é o vazamento do produto tóxico nos tanques de produção das cervejas. Se essa for a resposta, a falha foi de manutenção dos equipamentos. A cerveja pode ter sido contaminada pelo vazamento de dietilenoglicol por falhas na estrutura do equipamento. A empresa poderia ter evitado a contaminação da cerveja através de manutenções periódicas. Além disso, a contaminação dos consumidores poderia ser evitada pela análise dos produtos de cada lote fabricado. A liberação de um produto para a venda deve ser realizada após a garantia da segurança alimentar de cada lote produzido. 13 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 2.2.2 Perigos físicos Os perigos físicos podem ser descritos como a presença de corpos estranhos nos alimentos, ou seja, que não são inerentes a sua composição. Esses corpos estranhos são componentes que possuem características que não são próprias do alimento e são capazes de machucar fi sicamente o consumidor. São as causas mais comuns de reclamações de clientes, pois sua presença é percebida antes ou imediatamente após o consumo do produto, devido à quebra de dentes, cortes na língua, perfuração nas mucosas e gengivas, sufocamento, engasgamento, perfuração intestinal, entre outras. Os perigos físicos podem contaminar o alimento em qualquer fase da sua manipulação e incluem uma variedade de materiais provenientes do campo de produção da matéria-prima, das áreas de processamento, distribuição ou mesmo da contaminação intencional. Esse tipo de contaminação provém dos próprios equipamentos, por exemplo, a falta de manutenção preventiva ou manutenção inadequada é uma importante fonte de contaminação, podendo acarretar na soltura de pedaços de metais, plástico, borracha e parafusos. Matérias-primas trazem consigo sujidades aderidas aos produtos no momento da colheita ou do transporte, funcionários que precisam carregar consigo canetas, termômetros, entre outros, precisam estar sempre atentos, carregando esses materiais protegidos, além de evitar o uso de qualquer objeto pessoal, como joias e adornos. Entre os corpos estranhos mais comuns temos: vidros e seus fragmentos, fragmentos de metais, pedras, madeiras e seus fragmentos, materiais plásticos, insetos e seus fragmentos, pelos de roedores, penas de aves, unhas, esmalte, brinco, entre muitos outros. 2.2.3 Perigos biológicos Entre os três tipos de perigos em alimentos, o perigo biológico é o que representa maior risco à saúde do consumidor e é o principal responsável por surtos alimentares causados por doenças transmitidas por alimentos. Todo alimento está sujeito aos perigos biológicos ao longo de sua cadeia produtiva, provenientes da matéria-prima, dos insumos, do ambiente e dos manipuladores, durante o seu processamento e em todas as etapas, até a mesa do consumidor. Os perigos biológicos de origem alimentar incluem microrganismos, como bactérias, vírus fungos, protozoários e parasitas, frequentemente associados a manipuladores e produtos crus contaminados num estabelecimento. O primeiro 14 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA passo para se ter um controle sobre a contaminação por microrganismos é compreender as interações existentes entre os microrganismos e o alimento, os fatores que condicionam seu desenvolvimento ou inibição de crescimento. Muitos destes organismos ocorrem naturalmente no meio de produção dos alimentos, sendo inativados por cocção ou pela aplicação de práticas adequadas de higiene e armazenamento. As bactérias patogênicas causam a maioria dos surtos e casos de doenças transmitidas por alimentos, tais como Salmonella spp., Listeria Monocytogenes, E. coli O157:H7, Mycobacterium bovis, Brucella abortus, entre outras. Além das bactérias, vírus e outros parasitas contribuem para a contaminação de alimentos, causando quadros de febre, distúrbios gastrointestinais, dor abdominal, entre outros sintomas. É normal encontrar um certo nível desses microrganismos na maioria dos alimentos crus. Entretanto, seu armazenamento e a manipulação adequada contribuem para uma redução signifi cativa do número de microrganismos antes do cozimento. Isso diminui o risco de se obter um alimento com níveis microbiológicos acima do limite tolerado. Deve-se lembrar que alimentos cozidos também fornecem um meio fértil para o crescimento rápido de microrganismos se não são manipulados e armazenados adequadamente. No decorrer deste livro, discutiremos as formas de garantir a segurança dos alimentos por meio de boas práticas de manipulação. O blog Food Safety Brazil é uma iniciativa sem fi ns lucrativos que busca ajudar as empresas de pequeno e médio porte da cadeia produtiva de alimentos a melhorar as suas práticas. Acessando a página https://foodsafetybrazil.org/category/biologicos/ você terá acesso a matérias sobre perigos biológicos, escritas voluntariamente por profi ssionais da área, que têm como objetivo o compartilhamento de suas vivências, incentivando o debate, a harmonização e o consenso. Se você olhar com atenção o site indicado, encontrará muitas outras informações importantes para o seu estudo na disicplina. 15 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 2.3 DEFINIÇÕES TÉCNICAS IMPORTANTES Para inserir o leitor na linguagem comumente utilizada em segurança alimentar e microbiologia de alimentos, que será utilizada durante as discussões apresentadas no decorrer do livro, elaboramos uma lista com defi nições importantes. Os itens e as defi nições desta lista foram extraídos e transcritos a partir da Portaria CVS 5/2013 (SÃO PAULO, 2013). I - alimento: toda substância ou mistura no estado sólido, líquido, pastoso ou qualquer outra forma adequada, destinada a fornecer ao organismo humano os nutrientes necessários para sua formação, manutenção e desenvolvimento, e satisfazer as necessidades sensoriais e socioculturais do indivíduo; II - alimento preparado: aquele manipulado em serviços de alimentação, exposto à venda, embalado ou não; III - antissepsia: operação destinada à redução de microrganismos presentes na pele, em níveis seguros. IV - antisséptico: substâncias aplicadas à pele para reduzir o número de agentes da microbiota transitória e residente; V - autoridade sanitária: funcionário público investido de função fi scalizadora, competente para fazer cumprir as leis e regulamentos sanitários na sua demarcação territorial, com livre acesso a todos os locais sujeitos à legislação sanitária, observados os preceitos constitucionais; VI - boas práticas: procedimentos que devem ser adotados para garantir a qualidade higiênico-sanitária dos alimentos; VII - contaminantes: substâncias de origem biológica, química ou física, estranhas ao alimento, que comprometem sua integridade e que são nocivas à saúde humana; VIII - contaminação cruzada: transferência da contaminação de uma área ou produto para áreas ou produtos anteriormente não contaminados, por meio de superfícies de contato, mãos, utensílios e equipamentos, entre outros; IX - controle: condição obtida pelo correto cumprimento dos procedimentos e do atendimento dos critérios estabelecidos; X - controle integrado de vetores e pragas urbanas: sistema de ações preventivas e corretivas, incluindo medidas físicas, químicas e biológicas destinadas a impedir a atração, o abrigo, o acesso e/ou a proliferação de vetores e pragas urbanas,que comprometam a qualidade higiênico-sanitária e a segurança do alimento; XI - cozinhas industriais: estabelecimentos que preparam e fornecem alimentos prontos em larga escala, para o consumo coletivo no local, ou não, de comunidades fechadas ou fi xas, como indústrias, empresas, bufês, e instituições, como presídios, quartéis, entre outros; 16 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA XII - desinfecção: operação por método físico e/ou químico, de redução parcial do número de microrganismos patogênicos ou não, situados fora do organismo humano e não necessariamente matando os esporos; XIII - desinfetante: produto que elimina ou reduz microrganismos patogênicos ou não de superfícies inanimadas, mas não necessariamente as formas microbianas esporuladas; XIV - doenças transmitidas por alimentos (DTA): doenças causadas pela ingestão de alimentos ou bebidas contaminados com microrganismos patogênicos; XV - embalagem: recipiente, pacote ou invólucro destinado a garantir a conservação e facilitar o transporte e manuseio dos alimentos; XVI - estabelecimento: edifi cação, área ou local onde são desenvolvidas atividades relacionadas à produção, manipulação, acondicionamento, transporte, armazenamento, distribuição, embalagem, reembalagem, fracionamento e/ou comercialização de alimentos; XVII - estabelecimentos comerciais de alimentos: unidades do comércio varejista e atacadista, cuja atividade predominante é a exposição de alimentos industrializados, produtos hortifrutigranjeiros, carnes e pescados, podendo inclusive, expor alimentos preparados, embalados ou não, para venda direta ao consumidor, pessoa física ou jurídica. Exemplos: hipermercados, supermercados, mercearias, padarias, açougues, comércios atacadistas de produtos alimentícios de todos os tipos; XVIII - fracionamento: operação pela qual o alimento é dividido e acondicionado para atender a sua distribuição, comercialização e disponibilização ao consumidor; XIX - higienização: operação que compreende duas etapas, a limpeza e a desinfecção; XX - higienização das mãos: ato de higienizar as mãos com água, sabonete líquido e um agente antisséptico; XXI - ingrediente: é toda substância, incluídos os aditivos alimentares, que se emprega na fabricação ou preparo dos alimentos e que está presente no produto fi nal em sua forma original ou modifi cada; XXII - limpeza: operação de remoção de sujidades, substâncias minerais e/ou orgânicas indesejáveis à qualidade do alimento, tais como terra, poeira, resíduos alimentares, gorduras, entre outras; XXIII - lote: é o conjunto de produtos de um mesmo tipo, processados pelo mesmo fabricante ou fracionador, em um espaço de tempo determinado, sob condições essencialmente iguais; XXIV - manipulação de alimentos: operações efetuadas sobre matérias-primas para obtenção de um alimento e sua entrega ao consumo, envolvendo as etapas de preparação, fracionamento, embalagem, armazenamento, transporte, distribuição e exposição à venda, entre outras; XXV - manipulador de alimentos: toda pessoa que trabalhe num estabelecimento comercial de alimentos ou serviço de alimentação, que manipule ingredientes e matérias-primas, equipamentos e utensílios utilizados na produção, embalagens, 17 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 produtos alimentícios embalados ou não, e que realize fracionamento, distribuição e transporte de alimentos; XXVI - manual de boas práticas: documento que descreve as operações específi cas realizadas num estabelecimento comercial de alimentos ou serviço de alimentação, incluindo, no mínimo, os requisitos higiênico-sanitários dos edifícios, a manutenção e higienização das instalações, dos equipamentos e dos utensílios, o controle da qualidade da água para consumo humano, o controle integrado de vetores e pragas urbanas, a capacitação profi ssional, o controle da higiene e saúde dos manipuladores, o manejo de resíduos e o controle e a garantia da qualidade do produto fi nal; XXVII - matéria-prima: toda substância que para ser utilizada como alimento necessita sofrer tratamento e/ou transformação de natureza física, química ou biológica; XXVIII - perigo: agente biológico, químico ou físico, presente no alimento, ou condição apresentada pelo alimento que pode causar efeitos adversos à saúde; XXIX - pré-preparo: etapa na qual os alimentos sofrem operações preliminares de seleção, escolha, higienização, corte, fracionamento, moagem, tempero e/ou adição de outros ingredientes; XXX - procedimento operacional padronizado (POP): procedimento escrito de forma objetiva que estabelece instruções sequenciais para a realização de operações rotineiras e específi cas na manipulação de alimentos; XXXI - produção: conjunto de setores do processo de elaboração de alimentos, compreendendo desde a recepção e controle de ingredientes e matérias- primas (industrializadas, congeladas, resfriadas, pré-preparadas), inclusive seu armazenamento, e as áreas de pré-preparo e preparo, cocção, resfriamento, até as operações de higienização, fracionamento e oferta dos produtos; XXXII - registro: anotação de um ato, em planilha ou outro documento, apresentando a data e a identifi cação do funcionário responsável pelo seu preenchimento; XXXIII - resíduos: materiais a serem descartados; XXXIV - responsável técnico (RT): profi ssional legalmente habilitado, responsável pela qualidade e segurança do estabelecimento e dos alimentos perante os órgãos de vigilância sanitária; XXXV - risco: estimativa da probabilidade de ocorrer um perigo físico-químico ou biológico que possa afetar a inocuidade do alimento; XXXVI - rotulagem: inscrição, legenda, imagem ou qualquer matéria descritiva ou gráfi ca que seja indelével, sob forma escrita, impressa, estampada, gravada ou colada sobre a embalagem do alimento; XXXVII - rótulo: qualquer identifi cação impressa ou litografada, bem como os dizeres pintados ou gravados a fogo por pressão ou decalcação aplicados sobre o recipiente, vasilhame envoltório, cartucho ou qualquer outro tipo de embalagem do alimento ou sobre o que acompanha o continente; XXXVIII - sanitizante: é um agente ou produto que reduz o número de bactérias a 18 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA níveis seguros de acordo com as normas de saúde; XXXIX - saneantes: substâncias ou formulações destinadas à higienização, desinfecção, desinfestação, desodorização e odorização de ambientes domiciliares, coletivos e/ou públicos, para aplicação por qualquer pessoa para fi ns domésticos ou entidades especializadas para fi ns profi ssionais; XL - serviços de alimentação: empresas comerciais (exemplos: restaurantes de todo tipo, inclusive industriais, lanchonetes, bufês, entre outros) ou serviços incluídos em instituições sociais (exemplos: cozinhas de creches, escolas, asilos, hospitais, entre outros), cuja atividade predominante é a preparação e a oferta de refeições prontas para consumo individual ou coletivo, servidas, principalmente, no mesmo local; XLI - sobras de alimentos: o alimento que não foi distribuído e que foi conservado adequadamente, incluindo-se a sobra do balcão térmico ou refrigerado, quando se tratar de alimento pronto para o consumo; XLII - surtos: episódio em que duas ou mais pessoas apresentam doença semelhante após ingerirem alimentos e/ou água da mesma origem; XLIII - transportador de alimento: é a empresa que realiza o transporte de ingredientes, matérias-primas e embalagens alimentícias, e de alimentos industrializados ou manipulados, prontos ou não para o consumo; XLIV - veículo transportador de alimento: é o veículo que realiza o transporte de ingredientes, matérias-primas e embalagens alimentícias, e de alimentos industrializados ou manipulados, prontos ou não para o consumo. 1 “Consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade sufi ciente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentarespromotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”. O texto traz o conceito de: a) Segurança alimentar e nutricional. b) Programa intersetorial de alimentação. c) Política pública para promoção de práticas alimentares saudáveis. d) Plano de acesso ao alimento. e) Alimento seguro. 2 Perigo em alimentação é tudo aquilo que pode causar algum mal à saúde das pessoas no momento da ingestão de algum produto alimentício. Os perigos em alimentos podem ser biológicos, 19 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 físicos e químicos. Numere a coluna II de acordo com a coluna I, relacionando os perigos apresentados aos seus tipos. Coluna I Coluna II 1. Biológico. ( ) Pedras. 2. Físico. ( ) Caco de vidro. 3. Químico. ( ) Antibiótico. ( ) Bactéria patogênica. ( ) Agrotóxico. Assinale a sequência CORRETA: a) 1 – 3 – 1 – 2 – 1. b) 2 – 2 – 3 – 3 – 3. c) 2 – 2 – 3 – 1 – 3. d) 2 – 1 – 2 – 3 – 1. e) 2 – 3 – 1 – 1 – 2. 3 MICROBIOLOGIA DE ALIMENTOS Historicamente, a alimentação do ser humano se baseava inicialmente nos recursos disponíveis na natureza. Com o tempo, o homem passou a plantar, domesticar animais e produzir seu próprio alimento. As doenças transmitidas por alimentos – DTA – surgiram, no entanto, com o surgimento dos alimentos preparados, devido à rápida deterioração em decorrência do armazenamento inadequado destes alimentos. A microbiologia de alimentos é a área da biologia voltada para os estudos relacionados aos microrganismos que habitam, crescem e contaminam os alimentos, principalmente daqueles importantes para a garantia de sua inocuidade, vida útil, desenvolvimento e processamento de novos produtos. Para o estudo de segurança alimentar, os microrganismos de maior importância são os que causam deterioração dos alimentos e os responsáveis pelas DTAs. No entanto, microrganismos podem ser benéfi cos, tais como os probióticos, ou mesmo essenciais para a produção de alimentos, como pão, cerveja, vinho, queijo e derivados, picles, entre outros (HUTKINS, 2006). Dessa maneira, os microrganismos em alimentos podem ser divididos, de forma simplifi cada, em três grandes grupos, de acordo com sua interação com os alimentos: 20 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA i. os que causam alterações químicas nos alimentos. Essas alterações levam à deterioração microbiana, resultando em alteração de cor, odor, sabor e textura do produto. A deterioração provocada no alimento é a simples consequência das atividades metabólicas naturais dos microrganismos presentes no alimento; ii. os que causam alterações benéfi cas nos alimentos. Estes microrganismos modifi cam as características originais do alimento de tal forma a transformá-lo em outro alimento. Neste grupo estão aqueles microrganismos adicionados intencionalmente ao alimento, ou mesmo aqueles já presentes naturalmente, em que reações químicas específi cas acontecem, utilizadas na produção de produtos fermentados, como pães, vegetais, cerveja, queijos, entre outros; iii. os que representam risco à saúde. São os denominados microrganismos patogênicos. A contaminação de um alimento pelos microrganismos patogênicos é um refl exo direto de condições precárias de higiene durante o manuseio do alimento, podendo ocorrer desde a produção até a mesa do consumidor. Por essa razão, os microrganismos patogênicos serão o foco principal deste capítulo. 1 Você não imagina a quantidade de microrganismos benéfi cos que ingerimos no nosso dia a dia! Faremos uma pausa no assunto sobre falta de higiene e presença de microrganismos patogênicos. Agora é hora de dar importância para aqueles que fazem a nossa vida mais saborosa. Faça uma lista com os microrganismos responsáveis pela produção de diferentes alimentos e identifi que a sua classe: bactéria, fungo, levedura. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ________________________. 3.1 MICRORGANISMOS DE INTERESSE EM ALIMENTOS Os microrganismos de interesse que serão abordados compreendem bactérias, fungos (bolores), vírus e parasitas. 21 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 3.1.1 Bactérias As bactérias são organismos simples, unicelulares e procariontes, presentes nos mais diversos ambientes, como solo, água, ar, animais e seres humanos. O Quadro 1 apresentará uma lista de bactérias relacionadas a oito diferentes fontes em que estas podem estar presentes. As bactérias possuem tamanho microscópico, medindo cerca de 0,2 a 1,5 µm de comprimento, podendo ter diferentes formas, normalmente sendo encontradas na forma de bacilos, cocos e espirilos. Demais morfologias e arranjos podem ser observadas na ilustração da Figura 1. Os alimentos destinados ao consumo humano raramente são produzidos em estado estéril ou descontaminado. Os microrganismos estão presentes naturalmente, mesmo nos alimentos, e se multiplicam quando encontram condições favoráveis, ultrapassando os limites de segurança. No contexto de vigilância sanitária de alimentos, as toxinfecções causadas por microrganismos, tais como as bactérias, ocupam lugar de destaque devido ao grande número de microrganismos envolvidos, pela diversidade de períodos de incubação, da variabilidade dos quadros clínicos e da elevada quantidade de produtos alimentícios que podem veicular esses agentes. Os gêneros bacterianos importantes para alimentos podem ser agrupados em sete categorias: (1) bactérias Gram-negativas, aeróbias e microaeróbias; (2) bactérias Gram-negativas aeróbias estritas; (3) bactérias Gram-negativas, anaeróbias facultativas; (4) cocos Gram-positivos; (5) bacilos Gram-positivos produtores de esporos; (6) bacilos Gram-positivos não esporulados; (7) outros (FRANCO; LANDGRAF, 1996). 22 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA Q U AD R O 1 – IM PO R TÂ N C IA R EL AT IV A D E O IT O F O N TE S D E BA C TÉ R IA S PA R A AL IM EN TO S Ba ct ér ia So lo e á gu a Pl an ta s e ou tro s pr od ut os U te ns íli os Tr at o G as tro in te st in al M an ip ul ad or es d e Al i- m en to s Al im en to s pa ra A n- im ai s C ou ro d e An im ai s Ar e P oe ira A ci ne to ba ct er XX X X X X A er om on as XX * X A lc al ig en es X X X X X A lte ro m on as XX * A rc ob ac te r X B ac ill us XX ** X X X X X XX B ro ch ot hr ix XX X C am py lo ba ct er XX X C ar no ba ct er iu m X X X C itr ob ac te r X XX X XX C lo st rid iu m XX ** X X X X X X XX C or yn eb ac te riu m XX ** X X X X X E nt er ob ac te r X XX X X E nt er oc oc cu s X X X XX X X X X E rw in ia X XX X E sc he ric hi a X X XX X Fl av ob ac te riu m X XX X H af ni a X X XX K oc ur ia X X X X X X La ct oc oc cu s XX X X X La ct ob ac ill us XX X X X Le uc on os to c XX X X X Li st er ia X XX X X X X M ic ro co cc us X X X X X X XX M or ax el la X X X P ae ni ba ci llu s XX X X XX P an to ea X X X P ed io co cc us XX X X X P ro te us X X X X X X P se ud om on as XX X X X X P sy ch ro ba ct er XX X X X S al m on el la XX XX S er ra tia X X X X X X S he w an el la X X S hi ge lla XX S ta ph yl oc oc cu s X XX X Va go co cc us XX XX Vi br io XX * X W ei ss el la XX X Ye rs in ia X X X FO N TE : A da pt ad o de J ay (2 00 0) XX in di ca u m a fo nt e m ui to im po rta nt e * p rin ci pa lm en te á gu a ** p rin ci palm en te s ol o 23 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 FIGURA 1 – MORFOLOGIA E ARRANJOS DE ALGUNS TIPOS DE BACTÉRIAS FONTE: O autor 1 Vamos relembrar a época de escola? Defi na o que são bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Em seguida, procure a diferença entre bactérias aeróbias, microaeróbias, anaeróbias estritas e anaeróbias facultativas. Entendendo essas diferenças você perceberá por que certos alimentos são armazenados a vácuo, por exemplo. R.: ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ __________________________________________________. 24 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA Conforme observado anteriormente no Quadro 1, existem dezenas de bactérias de interesse em alimentos. Aqui, abordaremos algumas das bactérias mais comuns encontradas no nosso dia a dia para que você possa entender a origem da presença dessas bactérias no alimento manipulado. Isso deve evidenciar a importância do controle higiênico-sanitário durante a manipulação dos produtos alimentícios. As informações sobre as bactérias de interesse em alimentos descritas neste livro foram retiradas do livro Microbiologia dos alimentos, escrito pelos autores Franco e Landgraf (1996), uma referência na área de microbiologia de alimentos. As Pseudomonas são bactérias do tipo bacilo Gram-negativo aeróbia estrita. A P. aeruginosa produz substâncias tóxicas e são patógenos humanos oportunistas (um patógeno oportunista é aquele que pode causar infecções em pessoas que apresentam o sistema imunológico deprimido). Encontra-se amplamente distribuída no solo e na água, e pode fazer parte da microbiota normal do trato intestinal e pele de cerca de 3 a 5% da população. Devido a sua baixa resistência térmica, são encontradas apenas em alimentos processados que sofreram contaminação pós-processamento. P. aeruginosa é um microorganismo que gosta de ambientes úmidos e já foi motivo de proibição de venda e distribuição de água mineral pela ANVISA, devido à contaminação do lote 1702 (data de fabricação 13 de setembro de 2017) da marca Santa Rita do Sapucaí, que pertence à empresa Fonte Azul indústria, Comércio e Empreendimentos Imobiliários Ltda. Brucella são bactérias do tipo cocobacilo, ou bacilo curto, Gram-negativo aeróbia estrita, com algumas espécies patogênicas: B. abortus, patogênica para gado bovino e B. suis, patogênica para suínos. Essas espécies podem causar brucelose em humanos através da contaminação por leite cru, laticínios, carnes não cozidas e derivados. Devido a sua baixa resistência térmica, são facilmente eliminadas dos alimentos pela pasteurização. Escherichia são bactérias Gram-negativas anaeróbias facultativas, cuja principal espécie é a E. coli. Pertencente ao grupo de coliformes fecais, é extremamente comum em animais e no homem. Pode causar reações indesejáveis aos alimentos, além de possuir várias linhagens patogênicas. Durante muito tempo, considerou-se a contaminação por E. coli um problema apenas relacionado 25 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 a práticas insatisfatórias de higiene. No entanto, nas últimas décadas, comprovou- se que muitos tipos da bactéria poderiam causar infecções graves. Atualmente, a E. coli recebe atenção especial das autoridades de saúde e, por consequência, da indústria e da própria sociedade, devido às graves consequências causadas pela sua presença em alimentos. Salmonella são bacilos não esporulados, Gram-negativos anaeróbios facultativos e seu principal reservatório é o trato gastrointestinal do homem e de animais, principalmente aves e suínos. Este gênero é responsável por diferentes enfermidades, como febre tifoide (S. typhi), febres entéricas (S. paratyphi A, B e C) e enterocolites ou salmoneloses. As infecções provocadas por esse gênero de bactérias são consideradas universalmente como as causas de maior importância de DTAs. Salmonella não são organismos exigentes, podem se multiplicar em condições ambientais externas aos seres vivos. Por isso, desenvolvem-se facilmente em alimentos e água contaminados com restos de alimentos e fezes. Os alimentos envolvidos na contaminação por Salmonella são aqueles com alto teor de umidade e alta porcentagem de proteína, como produtos lácteos, ovos, carnes e derivados. Em produtos cárneos, a presença do organismo é resultado da contaminação cruzada nas plantas industriais. Produtos de origem vegetal também podem sofrer contaminação pelo patógeno durante as etapas de cultivo, devido a práticas agrícolas incorretas, principalmente relacionadas ao adubo com excrementos não tratados. Staphylococcus são bactérias do tipo cocos Gram-positivos anaeróbios facultativos, tolerantes a concentrações de sal (NaCl) na concentração de 7,5 a 15%. S. aureus são encontrados no homem de forma localizada, como em lesões de pele e nas vias aéreas superiores. São facilmente transferidos para os alimentos e podem causar intoxicação quando consumidos, devido à produção de enterotoxinas (proteínas termoestáveis, resistentes à temperatura). De maneira geral, todos os alimentos que requerem manipulação considerável são passíveis de contaminação por cepas de Staphylococcus. Destacam-se aqueles em que uma alta porcentagem de proteínas e teor de umidade estão presentes, como carnes, leite e derivados, sobremesas e cremes. Bacillus é um gênero de bactérias com morfologia de bacilo Gram- positivo, formador de esporos. Dependendo da espécie, podem ser aeróbias ou anaeróbias facultativas, conseguem tolerar temperaturas variando de -5 a 75 °C, e valores de pH do meio entre 2,0 - 8,0. Este grupo abriga espécies patogênicas como B. cereus, responsáveis por gastroenterites de origem alimentar, além de outras espécies deterioradoras de alimentos (B. subtilis, B. stearothermophilus, B. coagulans), podendo ser encontradas no solo, água, material fecal e diversos alimentos. Ervas secas e especiarias são apontadas como uma das origens 26 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA da contaminação dos alimentos por esporos de B.cereus, produtor de uma exoenterotoxina responsável pela sua patogenicidade. A síndrome emética está relacionada com produtos amiláceos e cereais, em especial o arroz que, quando preparado em grandes quantidades (em restaurantes, por exemplo) pode conter esporos termorresistentes do agente, que sobrevivem à cocção e germinam. Nesse momento, o agente encontra uma condição favorável para multiplicação, produzindo a toxina emética durante o tempo de reserva e armazenamento do alimento entre 10 e 50 °C. Clostridium é outro gênero de bactérias do tipo bacilo Gram-positivo. Com exceção de algumas espécies aerotolerantes, estas bactérias são anaeróbias estritas. A principal fonte deste gênero de bactérias é o solo, podendo ser encontradas também no trato intestinal do homem e animais. Duas espécies patogênicas podem ser veiculadas pelos alimentos, C. botulinum e C. perfringens. Enquanto C. perfringens está associado a quadros diarreicos em decorrência de intoxicações alimentares, C. botulinum provoca o botulismo, uma intoxicação alimentar de extrema gravidade e evolução aguda. Um quadro de botulismo é caracterizado por distúrbios digestivos e neurológicos e surge pela ingestão de produtos de origem animal ou vegetal,embutidos ou enlatados, conservados de maneira insatisfatória ou submetidos à esterilização inefi ciente. Em casos extremos, a falta de um ambiente estéril cria as condições adequadas para a produção de uma neurotoxina capaz de levar os intoxicados ao óbito. Listeria é um gênero de bactérias a ser destacado, pois estas se multiplicam em alimentos mantidos em temperatura de refrigeração. O fato destas bactérias se reproduzirem sob tais condições vai de encontro a vários mitos comumente disseminados sobre a conservação de alimentos em baixas temperaturas. Listeria são bactérias do tipo bacilos Gram-positivos não esporulados, microaerófi los, sendo a espécie mais importante a L. monocytogenes, responsável por causar a listeriose. Esta doença pode se manifestar de diferentes formas clínicas, como conjuntivite, endocardite, meningite e até septicemia, podendo resultar em aborto. A L. monocytogenes é isolada a partir de uma grande variedade de alimentos, em que se destacam os produtos lácteos, produtos cárneos crus ou termoprocessados de diversas origens. Peixes crus ou defumados e embutidos preparados a partir de carne crua fermentada são bons exemplos de produtos com tendência à contaminação por estas bactérias. 3.1.2 Bolores Bolores são fungos fi lamentosos que crescem na forma de uma massa emaranhada que se propaga rapidamente, podendo cobrir vários centímetros de 27 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 uma área em um período curto de 2 a 3 dias. A massa total formada e entrelaçada é chamada de micélio, composto por ramifi cações ou fi lamentos chamados hifas. Esta estrutura está ilustrada na Figura 2a. O micélio pode ter duas funções: promover a fi xação do bolor ao substrato e promover a reprodução através dos esporos. É responsável pelo aspecto característico das colônias que formam, podendo ter aspecto cotonoso, ser secas, úmidas, compactas, aveludadas, gelatinosas com variadas colorações. Os bolores são menos exigentes do que as bactérias e leveduras com relação à umidade, pH, temperatura e nutrientes. Em sua absoluta maioria, são aeróbios, e por essa razão o seu crescimento nos alimentos limita-se à superfície em contato com o ar. No entanto, não se engane! O fungo visível a olho nu não é a única parte do bolor. Quando ele começa a ser observado na superfície sua colônia já está desenvolvida e substâncias nocivas já estão sendo produzidas no interior do alimento. Veja a ilustração da fatia de pão apresentada na Figura 2b para ter uma ideia melhor de como o desenvolvimento do bolor acontece. FIGURA 2 – ESTRUTURA TÍPICA DO BOLOR (A) E SUA PRESENÇA EM UM ALIMENTO CONTAMINADO (B) FONTE: O autor Poucos bolores são patogênicos, no entanto, as toxinas produzidas por bolores nos alimentos são de alta periculosidade e podem causar doenças no homem. Uma das principais toxinas abordadas na literatura é a afl atoxina, uma micotoxina hepatotóxica, resistente à temperatura, produzida pelo fungo Aspergillus fl avus. A ocorrência de fungos do gênero Aspergillus, bem como das afl atoxinas nos alimentos e rações animais, apresenta distribuição mundial, com predominânica em regiões de clima tropical e subtropical. Produtos agrícolas, como milho, feijão, arroz, trigo, entre outros, e principalmente o amendoim, podem ser contaminados por meio do contato com os esporos do fungo. Essa contaminação ocorre durante 28 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA a colheita, através do contato com o solo e durante a secagem. O armazenamento em locais inadequados, úmidos e sem ventilação, favorece o desenvolvimento fúngico nos produtos já contaminados. No caso do amendoim, por exemplo, o grão após a colheita contém cerca de 40% de umidade. A partir desse momento, ele perde umidade em uma velocidade dependente das condições climáticas (sol, chuvas etc.) e de como a planta foi condicionada para secagem. No entanto, mesmo que o amendoim esteja seco, se ele for armazenado de forma inadequada, como em épocas chuvosas, o grão pode reumedecer devido ao aumento da umidade relativa do ar. Isto provém as condições ao fungo para seu crescimento e, por consequência, possibilita a contaminação por afl atoxina. Após a ingestão, a toxina é absorvida pelo intestino e metabolizada no fígado, em que sua toxicidade pode assumir a forma aguda (febre, vômitos e icterícia) ou crônica (consumo a longo prazo aumenta o risco de carcinoma hepatocelular). 3.1.3 Vírus Vírus são parasitas intracelulares obrigatórios. Para sobreviver e multiplicar é necessário que estejam parasitando uma célula hospedeira viva, ou seja, não conseguem se replicar nos alimentos. No entanto, qualquer tipo de alimento pode servir de veículo para a transmissão de vírus para o homem. De modo geral, esses microrganismos são resistentes a condições consideradas adversas às bactérias com relação a tempo e à temperatura. Vírus são estáveis na faixa de pH de 2 a 9 e capazes de tolerar uma temperatura de 65 °C por 30 minutos. Em saúde pública, a água é considerada uma das principais vias de transmissão dos enterovírus para o homem. Esses vírus são os responsáveis por viroses intestinais com alto potencial de transmissão via alimentos. Dentro desse grupo viral, destaca-se o vírus da hepatite A (HAV). O vírus da hepatite infecciosa pode ser encontrado em águas poluídas e contaminadas por esgotos e é transmitido preferencialmente por via oral-fecal. Gastroenterites virais, por sua vez, são transmitidas por meio de água contaminada, alimentos manipulados por pessoas infectadas ou contato direto com o material fecal de uma pessoa doente. Existem diversos vírus responsáveis pela etiologia das gastroenterites, com destaque para rotavírus A, norovírus, adenovírus entéricos e astrovírus. Vale ressaltar que as fontes mais comuns de gastroenterites virais são os produtos marinhos, principalmente os moluscos, por se tratarem de organismos fi ltrantes de água. Os norovírus e o HAV são altamente infecciosos e apresentam boa resistência ao calor e aos desinfetantes, entretanto, são inativados a temperatura de 100 °C. 29 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 3.1.4 Parasitas Os parasitas são seres que vivem em associação a outros organismos, ou seja, dependem deste outro ser vivo e retiram deste os nutrientes necessários para a sua sobrevivência. Esta convivência acaba prejudicando o organismo do hospedeiro. Diferente das bactérias e dos fungos, não existem parasitas benéfi cos ou com importância no desenvolvimento de alimentos. Segundo a FAO, alguns parasitas podem viver no corpo humano por décadas. Dentre os mais comuns, a Taenia solium lidera o ranking de contaminação pelo consumo de carne de porco mal cozida, seguida pelo protozoário causador da toxoplasmose (Toxoplasma gondii), encontrado em carnes vermelhas e porco. Segue uma lista contendo os principais parasitas encontrados em alimentos, assim como a fonte de contaminação: • Taenia solium (verme de porco): carne de porco. • Echinococcus granulosus (parasita do cão): produtos frescos. • Echinococcus multilocularis (tipo de solitária): produtos frescos. • Toxoplasma gondii (protozoário): carne de pequenos ruminantes, carne vermelha e de porco. • Cryptosporidium spp. (protozoário): produtos frescos, suco de fruta e leite. • Entamoeba histolytica (protozoário): produtos frescos. • Trichinella spiralis (verme do porco): carne de porco. • Opisthorchiidae (platelmintos ou vermes achatados): peixe de água doce. • Ascaris spp. (lombrigas): produtos frescos. • Trypanosoma cruzi (protozoário causador da Doença de Chagas): sucos de frutas. A contaminação humana por parasitas normalmente é infl uenciada por princípios de higiene, tendo como origem más condições de manejo e, sobretudo, contaminação ambiental provocada pelo próprio homem, hospedeiro do parasita. Menos comum, temos ainda a contaminação por larvas ingeridas diretamente de peixes crus, como acontece com Anisakis simplex. Em todosos casos, a contaminação pode ser evitada através da aplicação das boas práticas de manipulação e/ou pelo cozimento adequado dos alimentos. 30 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA Em 2005, seis mortes foram notifi cadas em Santa Catarina devido à doença de Chagas em fase aguda. A doença foi relacionada à contaminação por consumo de caldo de cana. De fato, o caldo de cana é preparado cru, não sofre processo de aquecimento. Além disso, a cana de açúcar não é um hospedeiro para o protozoário Trypanosoma cruzi. Como a contaminação ocorreu? De que forma ela poderia ter sido evitada? A contaminação do caldo de cana neste caso ocorreu através do processamento da cana contendo o parasita. O preparo do caldo de cana foi feito na presença de fezes contaminadas pelo Trypanosoma cruzi ou mesmo pela moagem do inseto contaminado com a cana no momento do preparo do suco. A contaminação poderia ter sido evitada por meio de inspeção da matéria-prima, limpeza da cana por procedimentos de remoção de sujidades, cuidados com o armazenamento em locais livres de entrada de insetos, limpeza do local de armazenamento. 1 As doenças transmitidas por alimentos ocorrem quando microrganismos prejudiciais à saúde, parasitas ou substâncias tóxicas estão presentes nos alimentos. Com relação ao tema estudado, julgue o seguinte item: Existem microrganismos nos alimentos que não causam doenças e são úteis, como os utilizados para se fazer queijos e iogurtes. ( ) Certo. ( ) Errado. 2 Os microrganismos presentes nos alimentos e capazes de causar doenças são conhecidos como: a) Salutogênicos. b) Úteis. c) Patogênicos. d) Deteriorantes. e) Neutros. 31 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 3.2 FATORES QUE CONTROLAM O CRESCIMENTO MICROBIANO EM ALIMENTOS A capacidade de multiplicação ou sobrevivência dos microrganismos presentes nos alimentos depende de diversos fatores relacionados tanto com as características próprias do alimento (fatores intrínsecos) como com o ambiente em que esse alimento se encontra (fatores extrínsecos). Dentre estes fatores, podemos considerar como fatores intrínsecos a atividade de água, acidez, composição química, potencial de oxirredução, a presença de antimicrobianos naturais, e as interações entre os microrganismos presentes no alimento. Os fatores extrínsecos, por sua vez, são principalmente a umidade e a temperatura do ambiente, como também a composição química da atmosfera que envolve o alimento. Estes fatores serão abordados em detalhes a seguir. 3.2.1 Fatores intrínsecos • Atividade de água Quando falamos em segurança e qualidade de alimentos, existem duas medidas relacionadas à água, a saber: o teor de umidade e a atividade de água. Apesar de parecerem a mesma coisa, essas medidas servem para propósitos completamente diferentes com relação à qualidade, ao rendimento e à segurança dos alimentos. O teor de umidade é a medida da quantidade total de água em um alimento. É uma das medidas analíticas mais importantes utilizadas no processamento de produtos alimentícios, sendo essencial para a determinação da qualidade e estabilidade do alimento, valor nutritivo, garantia de uniformidade de resultados dentro de especifi cações de padrões de identidade e qualidade do produto. O valor é obtido após um procedimento simples de secagem do alimento através do cálculo: , em que Pi é o peso inicial da amostra e Pf é o peso fi nal da amostra após a remoção da água por secagem. Enquanto o teor de umidade defi ne a quantidade total de água em um alimento, a atividade de água é defi nida como a água presente no alimento disponível para a proliferação microbiana e para outras reações, tais como as enzimáticas. Quanto maior a atividade de água, mais propenso será o crescimento 32 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA de microrganismos, como bactérias, leveduras e bolores. Portanto, a atividade de água está diretamente relacionada à conservação dos alimentos (FRANCO; LANDGRAF, 1996; DAMODARAN; PARKIN; FENNEMA, 2010). Os microrganismos exigem a presença de água na forma disponível para seu metabolismo, multiplicação e sobrevivência. A água ligada por forças físicas às macromoléculas (cadeias moleculares constituintes do alimento) não está livre para agir como solvente, ou para participar de reações químicas, e, por consequência, não pode ser utilizada pelos microrganismos. Assim, podemos dizer que existem três formas de apresentação da água nos alimentos: água livre (disponível ou não ligada), água adsorvida (hidratada) e água ligada. Embora o tema aqui tenda mais para a química do que para a microbiologia, é importante perceber como as ciências estão interligadas. A compreensão do papel da água no alimento é essencial para entender o desenvolvimento dos microrganismos nele. A água livre atua como um meio de dispersão de nutrientes para o crescimento de organismos, está presente entre os poros do alimento, nos espaços intragranulares. A água adsorvida é a água presente como se fosse uma camada muito fi na na superfície de amidos, pectinas, celuloses e proteínas. Enquanto isso, a água ligada é aquela combinada quimicamente com outras substâncias, que não permite o desenvolvimento de microrganismos e é difi cilmente eliminada do alimento. Como dá-se a entender pela sua denominação, a água livre está presente livremente na estrutura do alimento. A Figura 3 ilustra os tipos de água nos alimentos. FIGURA 3 – DESENHO ESQUEMÁTICO DOS TIPOS DE ÁGUA NOS ALIMENTOS FONTE: O autor 33 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 A adição de sais, açúcares e de outras substâncias provoca a redução do valor de atividade de água de um alimento, pois a água livre é usada para dissolver tais aditivos presentes na formulação. Essa redução varia em função da natureza da substância adicionada, da quantidade e da temperatura. A estabilidade dos alimentos pode ser melhorada, portanto, através da redução da água livre por congelamento, concentração, desidratação parcial ou por adição de açúcar ou sal a alimentos. Engana-se quem pensa que um produto com elevada atividade de água terá necessariamente elevado teor de umidade. Essa relação é comum, no entanto, é possível um produto apresentar baixo teor de umidade e alto ou médio valor de atividade de água, ou seja, praticamente toda água presente no alimento estará em sua forma livre, e não interagindo com as moléculas que formam a parte sólida do alimento. Observe no Quadro 2 os valores de teor de umidade e atividade de água no pão, por exemplo. Nota-se que, apesar do teor de água no pão ser de apenas 40%, sua atividade de água é de 0,96, ideal para o desenvolvimento de diversos microrganismos, como os descritos no Quadro 3. QUADRO 2 – TEOR DE UMIDADE E ATIVIDADE DE ÁGUA NOS ALIMENTOS Alimento Teor de umidade Atividade de água Gelo (0 °C) 100,0 1,00 Carne fresca 70,0 0,98 Pão 40,0 0,96 Gelo (10 °C) 100,0 0,91 Geleia 35,0 0,86 Gelo (-20 °C) 100,0 0,82 Farinha de trigo 14,5 0,72 Gelo (-50 °C) 100,0 0,62 Passas 27,0 0,60 Massas 10,0 0,45 Doces fervidos 3,0 0,30 Biscoitos 5,0 0,20 Leite desidratado 3,5 0,11 Chips de batata 1,5 0,08 FONTE: <https://foodsafetybrazil.org/diferenca-entre-atividade-de-agua- aw-e-o-teor-de-umidade-nos-alimentos/>. Acesso em: 16 maio 2020. O comportamento microbiano frente à atividade de água é extremamente variável, sendo as bactérias mais exigentes em relação aos fungos e às leveduras. Os alimentos de baixa atividade de água (< 0,60) são microbiologicamente estáveis. Além disso, a atividade de água limitante para o crescimento de microrganismos é dependente ainda de outros fatores intrínsecos que podem agir de maneira simultânea, tais como o pH do meio e a presença de substâncias antimicrobianas. Quando estes fatores provocam um afastamento das condições ideais para o crescimento microbiano, um valor mais alto de atividade de água será necessário para que o desenvolvimento delas aconteça. 34SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA QUADRO 3 – VALORES MÍNIMOS DE ATIVIDADE DE ÁGUA (AA) PARA O CRESCIMENTO E PRODUÇÃO DE TOXINAS DE PATÓGENOS DE IMPORTÂNCIA ALIMENTAR Microrganismo Aa para crescimento Aa para produção de toxinas C. botulinum (tipo E) 0,95 – 0,97 0,97 C. botulinum (tipo A) 0,93 – 0,95 0,94 – 0,95 C. perfringens 0,93 – 0,95 - Salmonella sp. 0,92 – 0,95 - S. aureus 0,86 0,87 – 0,90 (enterotoxina A) P. viridicatum 0,83 0,83 – 0,86 (ocratoxina A) A. parasiticus 0,82 0,87 P. cyclopium 0,81 – 0,85 0,87 – 0,90 (ocratoxina) A. Flavus 0,78 – 0,80 0,83 – 0,87 (afl atoxina) A. ochraceus 0,77 – 0,83 0,83 – 0,87 (ocratoxina A) Bactérias halofílicas 0,75 - Bolores xerofílicos 0,65 - Fungos osmofílicos 0,60 - FONTE: <https://foodsafetybrazil.org/diferenca-entre-atividade-de-agua- aw-e-o-teor-de-umidade-nos-alimentos/>. Acesso em: 16 maio 2020. • Acidez (pH) Os alimentos podem ser subdivididos em três grupos, de acordo com o seu valor de pH: a) baixa acidez (pH superior a 4,5 – leite, carnes, pescados, alguns vegetais); b) ácidos (pH entre 4,0 e 4,5 – frutas e hortaliças); c) muito ácidos (pH inferior a 4,0 – suco de frutas, refrigerantes). Essa classifi cação foi baseada no pH mínimo para a multiplicação e produção da toxina do Clostridium botulinum (4,5) e no pH mínimo para a multiplicação da maioria das bactérias patogênicas e deteriorantes de interesse em alimentos (4,0). Uma lista resumida com os valores de pH aproximados para as classes de alimentos é apresentada na Quadro 4. QUADRO 4 – PH APROXIMADO DOS GRUPOS DE ALIMENTOS Alimento pH Vegetais 3,6 a 7,3 Frutas 1,8 a 6,7 Carnes 5,1 a 6,4 Pescados 4,8 a 7,0 Laticínios 4,8 a 7,0 FONTE: Adaptado de Franco e Landgraf (1996) O valor de pH do meio em torno da neutralidade (i.e. entre 6,5 e 7,5) é o mais favorável para a proliferação da maioria dos microrganismos. As bactérias patogênicas são as mais exigentes quanto ao controle do pH, enquanto bolores e leveduras são os que apresentam a maior tolerância ao pH, tolerando meios 35 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 extremamente ácidos, como frutas, refrigerantes, vinhos e vinagres. Assim como ocorre com a atividade de água, os microrganismos toleram valores de pH mínimos e máximos para a sua multiplicação (Quadro 5). Observa-se que o pH ligeiramente ácido das hortaliças favorece a ação de bactérias de putrefação branda, enquanto nas frutas, o pH mais ácido impede o desenvolvimento bacteriano, sendo as leveduras e os bolores os agentes de deterioração mais importantes. Sob refrigeração, o pescado se altera com maior facilidade do que a carne de mamíferos, pois o valor médio do pH do pescado situa-se em 6,2 e 6,5, enquanto o dos músculos dos mamíferos é de 5,6. Dessa maneira, a vida comercial da carne é mais duradoura que a do pescado. QUADRO 5 – VALORES DE PH PARA MULTIPLICAÇÃO DE MICRORGANISMOS pH Organismo mínimo ótimo máximo Bactérias (maioria) 4,5 6,5 a 7,5 9,0 Leveduras 1,5 a 3,5 4,0 a 6,5 8,0 a 8,5 Bolores 1,5 a 3,5 4,5 a 6,8 8,0 a 11,0 FONTE: Adaptado de Franco e Landgraf (1996) O pH afeta dois aspectos da célula microbiana: o funcionamento de suas enzimas e o transporte de nutrientes no interior da célula, infl uindo tanto no crescimento como no metabolismo dos microrganismos. Se você bem lembra do Ensino Médio, o pH é igual ao logaritmo negativo da atividade dos íons de hidrogênio presentes no meio (ou seja, pH = -log[H+]). Como se trata de uma escala logarítmica, as diferenças no pH de 1, 2 e 3 unidades correspondem a diferenças de 10, 100 e 1.000 vezes na concentração de íons de hidrogênio! Por isso, pequenas variações na faixa de pH indicam que há uma grande diferença na concentração de ácido [H+] do meio. 1 Atividade de água e pH são importantes fatores intrínsecos dos alimentos que interferem no metabolismo dos microrganismos. Assinale a alternativa que apresenta valores de atividade de água e pH, respectivamente, que favorecem o desenvolvimento da maior parte das bactérias patogênicas. a) 0,98 e 6. b) 0,90 e 3. c) 0,84 e 5. d) 0,72 e 7. e) 0,53 e 4. 36 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA • Composição química Para que a proliferação microbiana aconteça, alguns nutrientes devem estar disponíveis, tais como água, fonte de energia, fonte de nitrogênio, vitaminas e sais minerais. Com relação às necessidades nutricionais, as bactérias Gram-positivas são as mais exigentes, seguidas pelas bactérias Gram-negativas, leveduras e bolores. Açúcares, álcoois e aminoácidos são as principais fontes de energia utilizadas pelos microrganismos. Lipídios também podem servir como fonte de energia, mas são metabolizados por um número reduzido de microrganismos de interesse em alimentos. As fontes primárias de nitrogênio são os aminoácidos, mas uma variedade de outros compostos, como nucleotídios, peptídios e proteínas complexas também podem ser utilizados. Entre as vitaminas, as mais importantes são as do complexo B. Exemplos, como a biotina e o ácido pantotênico, são importantes fatores de crescimento de microrganismos, por fazerem parte de diversas coenzimas envolvidas nas reações metabólicas. Como mencionado anteriormente, entre os microrganismos, as bactérias Gram-positivas são as mais exigentes quanto à necessidade de vitaminas. As bactérias Gram-negativas e os bolores são capazes de sintetizar seus fatores de crescimento, podendo, portanto, desenvolver-se nos alimentos com baixos teores de vitamina B. Por fi m, os minerais são indispensáveis para a multiplicação microbiana. Mesmo que presentes em quantidades muito reduzidas, estes estão envolvidos em reações enzimáticas essenciais aos microrganismos. Alguns minerais que merecem destaque são: sódio, potássio, cálcio e magnésio. Outros minerais que também apresentam importância são: ferro, cobre, manganês, molibdênio, zinco, cobalto, fósforo e enxofre (FRANCO; LANDGRAF, 1996; GERMANO; GERMANO, 2015). • Agentes antimicrobianos A estabilidade dos alimentos diante do ataque por microrganismos deve- se à presença de substâncias capazes de retardar ou até mesmo impedir o desenvolvimento microbiano. Muitos alimentos apresentam mecanismos próprios de combate ao crescimento de microrganismos. Um dos principais exemplos destas substâncias são os óleos essenciais presentes em condimentos, como eugenol no cravo e canela, alicina no alho, timol e isotimol no orégano, entre outros. Outros alimentos possuem atividade antimicrobiana inata por motivos diversos. A clara do ovo, por exemplo, tem diversos agentes antimicrobianos naturais, sendo rica em lisozima, uma enzima capaz de destruir a parede celular 37 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 bacteriana. Adicionalmente, a clara possui avidina e conalbumina, ambos inibidores enzimáticos, e um pH desfavorável para a multiplicação microbiana (com valores entre 9 e 10). O leite de vaca também contém substâncias antimicrobianas, como lactoferrina, conglutinina e lactoperoxidase. A própria caseína do leite e alguns ácidos graxos livres desempenham ação antimicrobiana sob determinadas condições. Frutas contêm ácidos orgânicos e óleos essenciais, inibidores da multiplicação microbiana. Os derivados do ácido hidroxicinâmico, por exemplo, encontrados tanto em frutas como vegetais, possuem ação principalmente sobre bactérias e alguns fungos. O mesmo é observado para os taninos, presentes em frutas e sementes. As estruturas biológicas também são incluídas entre os fatores antimicrobianos, e funcionam como barreiras mecânicas para a penetração de microrganismos. A casca das nozes, frutas e ovos, pelos dos animais e a película que envolve as sementes são exemplos clássicos. Além dos agentes antimicrobianos presentes naturalmente nos alimentos, os conservadores químicos adicionados intenciolnalmente a eles têm um importante papel para estender sua vida útil. A legislação brasileira permite a utilização de uma lista restrita de conservadores. Em comum, estesdevem apresentar as seguintes características: não ser tóxico, não ser carcinógeno, ter baixo custo, ser solúvel em água e não produzir características organolépticas indesejáveis ao alimento. Os conservadores permitidos por lei são: ácidos lipofílicos e derivados, nitratos e nitritos, dióxido de enxofre e derivados, nisina e natamicina. A nisina é uma bacteriocina aprovada pelo FDA – Food and Drug Administration – para uso em alimentos. Ela é um exemplo de interação entre microrganismos, um fator intrínseco importante para o desenvolvimento de microrganismos. De que forma a interação entre microrganismos pode ser benéfi ca para a conservação dos alimentos? Como ela é produzida e de que forma essa interação ocorre? Um determinado microrganismo, ao se multiplicar em um alimento, produz metabólitos que podem afetar a capacidade de sobrevivência e de multiplicação de outros microrganismos presentes nesse alimentos. Assim, por exemplo, as bactérias produtoras de ácido lático (bactérias láticas) podem alterar o pH dos alimentos de tal forma que o tornam ácido demais para o crescimento de muitos outros microrganismos. Por outro lado, a formação de compostos alcalinos, como aminas, formadas por ação de descarboxilases 38 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA produzidas por muitos microrganismos, resulta no aumento do pH do alimento, tornando-o propício para a proliferação daquelas bactérias anteriormente inibidas pelo pH ácido. É o que ocorre com as leveduras que degradam o ácido lático de alimentos fermentados, tornando-os favoráveis ao crescimento e à produção de toxinas por Clostridium botulinum. Os produtos do metabolismo de certas bactérias podem ser essenciais para a proliferação de outras. Podemos citar o exemplo da tiamina e do triptofano, que são essenciais para o Staphylococcus aureus, e podem ser produzidas em determinados alimentos como consequência da contaminação com Pseudomonas aeruginosa. Os estreptococos e os bacilos produzem água oxigenada, que é inibidor para muitas bactérias, entre elas Pseudomonas spp., Bacillus spp. e Proteus spp. Muitos microrganismos são capazes de produzir determinadas substâncias com atividade bactericida, denominadas genericamente de bacteriocinas. As primeiras bacteriocinas descritas foram as colicinas, ativas contra E. coli, produzidas por determinadas cepas de E. coli e algumas enterobactérias. Atualmente, são conhecidas muitas outras bacteriocinas produzidas principalmente por Gram- positivos, patogênicos ou não. O maior interesse na área de alimentos é pelas bactérias láticas, capazes de produzir uma ou mais bacteriocinas. A nisina é uma bacteriocina produzida por Lactobacillus lactis spp. lactis, sendo a única cujo uso em alimentos é autorizado pela United States Food and Drug Administration – FDA –. A nisina é efetiva para impedir o desenvolvimento de Gram-positivos e a germinação de seus esporos, mas não é efetiva contra Gram- negativos. A nisina é naturalmente produzida em vários alimentos fermentados, especialmente em produtos lácteos, e vem sendo consumida por humanos há séculos. O efeito da nisina se dá pela interação com os fosfolipídios da membrana plasmática do microrganismo, promovendo a formação de poros que ocasionam o efl uxo do material intracelular. Vários estudos têm avaliado a efi cácia da nisina sobre patógenos, e seu uso em diferentes produtos alimentícios tem sido relatado, como na inibição do crescimento microbiano em queijos, sucos de fruta, carne moída, salsichas, produtos enlatados, derivados do leite e cerveja. FONTE: FRANCO, B. D. G. M.; LANDGRAF, M. Microbiologia dos alimentos. São Paulo: Atheneu, 1996. 186p. 39 SEGURANÇA ALIMENTAR Capítulo 1 3.2.2 Fatores extrínsecos • Temperatura O fator extrínseco mais importante que afeta a multiplicação de microrganismos é, sem dúvida, a temperatura do ambiente. Microrganismos podem se multiplicar em uma ampla faixa de temperatura, havendo registros desde um mínimo de -35 °C até um máximo de 90 °C. Dependendo da temperatura de multiplicação, os microrganismos podem ser classifi cados de acordo com os seguintes grupos: mesófi los, psicrófi los, psicrotófi cos e termófi los. O Quadro 6 apresentará as temperaturas médias mínimas, ótimas e máximas de desenvolvimento microbiano para cada grupo citado. QUADRO 6 – DIVISÃO DOS MICRORGANISMOS SEGUNDO A FAIXA DE TEMPERATURA DE DESENVOLVIMENTO Temperatura (°C) Grupos Mínima Ótima Máxima Mesófi los 5 a 15 30 a 45 35 a 47 Psicrófi los -5 a 15 12 a 15 15 a 20 Psicrotrófi cos -5 a 15 25 a 30 30 a 35 Termófi los 40 a 45 55 a 75 60 a 90 FONTE: Adaptado de Germano e Germano (2015) O conhecimento da temperatura de multiplicação microbiana é imprescindível para a avaliação dos riscos que os alimentos podem oferecer para a saúde. Grupos como psicrófi los e psicrotrófi cos se multiplicam bem em alimentos refrigerados. Nesse grupo estão incluídos os gêneros Pseudomonas, Alcaligenes, Flavobacterium, Micrococcus, entre outros, que são os principais responsáveis pela deterioração de carnes, pescados, ovos e frangos. Os microrganismos mesófi los constituem a maioria dos patógenos com relevância na contaminação de alimentos. Devemos destacar aqui que a maioria dos microrganismos que constituem risco para a segurança dos alimentos multiplica-se idealmente na faixa de temperatura próxima à dos mesófi los, em um intervalo médio de 30 a 45 °C. Já a maioria das bactérias termófi las pertence aos gêneros Bacillus e Clostridium, incluindo tanto as espécies deterioradoras como as patogênicas, sendo estas resistentes a altas temperaturas. Em algumas situações, tal grupo pode resistir a ambientes com temperaturas de até 90 °C (GERMANO; GERMANO, 2015). • Umidade relativa De maneira simplifi cada, a umidade relativa do ambiente é a relação entre a quantidade de água existente no ar e a quantidade máxima que poderia haver, na mesma temperatura, considerando-se a pressão de vapor da água pura. Existe 40 SEGurANÇA ALimENTAr E LEGiSLAÇÃo APLiCADA uma correlação entre a atividade de água de um alimento e a umidade relativa do ambiente em que este alimento está inserido, ou seja, um alimento conservado em um ambiente cuja umidade relativa sofra uma variação, vai adaptar-se a esta variação e apresentar uma modifi cação em seus valores de teor de água e, consequentemente, atividade de água. Por exemplo, alimentos retirados de suas embalagens originais e inseridos em ambientes cuja umidade relativa é superior a sua atividade de água terão a tendência de absorver umidade do ambiente, elevando sua atividade de água (ou seja, o alimento ganhará água livre). Em caso contrário, se o alimento for armazenado em um ambiente com umidade relativa inferior a sua atividade de água, ele perderá água, causando desidratação e diminuição do valor de atividade de água (ou seja, o alimento perderá água livre). As alterações observadas infl uenciarão diretamente na capacidade de desenvolvimento microbiano em função da água presente no alimento, conforme já discutido na seção de fatores intrínsecos e atividade de água. • Composição gasosa do ambiente Os tipos de microrganismos predominantes em um alimento dependem da composição gasosa do ambiente em que este alimento está inserido. A presença de oxigênio favorecerá a multiplicação de microrganismos aeróbios, enquanto a ausência dele favorece a predominância dos anaeróbios. A maior parte dos microrganismos eucarióticos é aeróbia, mas as bactérias variam amplamente em suas exigências em oxigênio, desde facultativas a anaeróbias (Quadro 7). QUADRO 7 – DIVISÃO DOS MICRORGANISMOS SEGUNDO A SUA CAPACIDADE DE CAPTAR OXIGÊNIO LIVRE Microrganismos Necessidades Aeróbios Necessidade de oxigênio livre. Bolores e a maioria das leveduras. Estritos: Pseudomonas, Acetobacter, Micrococcus, entre outras. Anaeróbios Não necessitam de oxigênio livre. Leveduras fermentáveis: Saccharomyces. Estritos:
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