Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MÓDULO 1. Introdução. Da sucessão em geral Princípios Da herança Da cessão de direitos hereditários Conceito e fundamento do direito das sucessões. 1. Conceito. Sucessão é a substituição de outrem, em direitos e obrigações. O termo é usado para a transmissão de bens e deveres – há um adquirente que substitui o antigo titular. A sucessão pode ser: - O título gratuito ou oneroso; - Inter vivos ou causa mortis. · Quando se fala em direito das sucessões estuda-se apenas a transmissão em decorrência da morte, excluindo-se a transmissão de bens por ato entre vivos. Conceito: Direito das sucessões é conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus herdeiros e legatários. E trata-se de transmissão de patrimônio, e não de bens ou valores, porque a secessão hereditária envolve a transmissão do ativo e do passivo (obrigações/dívidas) - do morto ao sucessor. No sentido subjetivo, direito de sucessão (ou de suceder) é o direito de receber o acervo hereditário do de cujus. ________//_________ 2. Evolução histórica e fundamento do direito sucessório. Etimologicamente, succedere (latim) significa “vir depois”. A possibilidade de alguém transmitir seus bens por sua morte é instituição muito antiga – direito egípcio, hindu e babilônico, dezenas de séculos antes da Era Cristã, o consagravam. Mas as razões pelas quais a lei acata o direito hereditário variaram ao longo do tempo – e muitos contestam a legitimidade e a conveniência da sucessão hereditária. No Direito Romano, a regra era a da sucessão testamentária. Havia íntima conexão entre o direito hereditário e a religião. O culto dos antepassados constitui o centro da vida religiosa nas antigas civilizações, sendo grave castigo falecer sem deixar quem lhe cultue o altar doméstico, deixando seu túmulo ao abandono. Cabe ao herdeiro o sacerdócio desse culto. O filho varão, biológico ou adotado, recebia a herança. A filha só era herdeira a título provisório, como usufrutuária, e passava a titularidade da herança ao marido, com o casamento. Carlos Roberto Gonçalves afirma que a filha não recebia herança porque, pelo casamento, passava a integrar a família do marido, perdendo os laços com a família do seu pai[1]. Então: herdar não decorria da vontade do pai, mas do culto religioso – daí se falar em herdeiro necessário. Os filhos herdam porque devem continuar o culto. Por isso a sucessão durante séculos se transmite apenas pela linha masculina – como o filho é o sacerdote da religião doméstica, recebe o patrimônio da família. O direito de primogenitura e varonia, entretanto, se perpetua em muitas civilizações, para preservar o poder da família e impedir a divisão da fortuna entre a prole numerosa. O direito hereditário evoluiu – hoje, em quase todos os países, a sucessão legítima se processa entre os herdeiros que se encontram no mesmo grau e esses recebem quinhões idênticos. Obs.: o direito hereditário encontra opositores. Sistemas socialistas negam a legitimidade da propriedade privada e, portanto, contestam a legitimidade da transmissão de bens causa mortis. Dizem que o direito hereditário é injusto por criar e ampliar a desigualdade entre os homens, estimulando o ócio. Acreditam que há prejuízo aos meios de produção, o que é ruim para a coletividade. Assim, tais autores concluem que o direito sucessório deve ser abolido, devolvendo-se ao Estado os bens da pessoa que falecer[2]. Em sentido contrário: o direito de propriedade é estímulo ao progresso, e tem como corolário o direito sucessório. Ao buscar satisfazer interesse pessoal, cada indivíduo se desenvolve mais, beneficiando a sociedade. Consoante Roberto Senise Lisboa: “Não se buscou um modelo socialista nem qualquer modelo misto de sucessão, segundo o qual parte do patrimônio necessariamente seria destinada ao poder público. Pelo contrário, manteve-se um modelo de transmissão primordial aos familiares, assentado em normas de ordem pública e em disposição de última vontade limitada por tais normas”[3]. O direito de propriedade é direito fundamental, assim como o direito sucessório. Se não fosse admitida a sucessão hereditária, o indivíduo não teria incentivo para amealhar e conservar a riqueza. Tal comportamento prejudicaria a sociedade. Seriam feitas doações ou liberalidades simuladas em negócios onerosos, e o titular do direito tentaria transmitir seu patrimônio a seus herdeiros. · Fundamentos: art. 5º, XXII e XXX da CF/88. · Prescreve o art. 5º, XXX da CF: “XXX – é garantido o direito de herança”. _________________//___________ Da sucessão em geral; Trata da sucessão legítima e testamentária. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn1 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn2 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn3 São regras sobre a administração da herança, sua aceitação e renúncia, sobre a vocação hereditária e dos legitimados a suceder, da herança jacente, da petição de herança, e sobre a indignidade: aplicam-se à sucessão decorrente da lei e à sucessão derivada de testamento. Ainda estudaremos os seguintes Títulos: Título II - Da sucessão legítima; Trata da sucessão que opera por força de lei. No Brasil, é mais comum que a sucessão testamentária. A lei determina a transmissão da herança às pessoas constantes da ordem de vocação hereditária, no art. 1829 do CC, mencionando os herdeiros necessários e consagrando o direito de representação. Título III. Da sucessão testamentária; É o maior Título: a lei dá importância à transmissão de bens por ato de última vontade. A lei traz regras interpretativas da vontade do testador. Título IV. Do inventário e partilha. As regras são mais processuais. Tratam das colações e dos sonegados. _______________//_______________ Da sucessão em geral. Cap. I – Disposições Gerais. Da abertura da sucessão. Art. 1.784, CC/02: A sucessão causa mortis se abre com a morte do autor da herança. O instante do falecimento é o exato momento da transmissão da herança. No momento do falecimento, a herança se transmite aos herdeiros legítimos e testamentários do de cujus[4], quer estes tenham ou não ciência daquela circunstância. Porque (vimos) a personalidade civil (capacidade da pessoa de ser titular de direitos e obrigações na órbita do direito) se extingue com sua morte. Como não há direito subjetivo sem titular, e nem obrigação sem responsável, a titularidade dos direitos e das obrigações do de cujus se transmite, desde o preciso instante de sua morte, a seus sucessores. O art. 1.784 (supra) elimina as dúvidas quanto ao domínio e posse da herança, no intervalo entre a morte do de cujus e a partilha, esta decorrente de sentença judicial ou de documento do cartório de notas, se o inventário é extrajudicial. Consequências da regra do art. 1.784, CC: a) A capacidade para suceder é averiguada ao tempo da abertura da sucessão. É preciso que o herdeiro esteja vivo ao tempo da morte do autor da herança. Pode o herdeiro sobreviver ao de cujus apenas por um instante. Por uma fração de segundo o herdeiro se torna efetivamente o sucessor e, quando este morre, transmite aos seus próprios herdeiros o patrimônio adquirido, embora houvesse morrido na ignorância de haver herdado referido patrimônio. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn4 · Por isso é importante saber quem morreu antes e, em caso de comoriência, presumem-se simultaneamente mortos. b) A lei aplicável à sucessão é a que está em vigor no instante do falecimento, pois nesse momento ocorre a transmissão patrimonial (art. 1.787). Assim, serão reguladas pelas normas do CC/1916 todas as sucessões que se abriram no tempo em que este vigorava. E o atual CC regerá as sucessões que forem abertas a partir de sua vigência. Ex.: cf. CC/1916 eram chamados à sucessão, à falta de outros herdeiros, os colaterais até 6º grau. Pelo CC/02 só conservam este direito os colaterais em até 4º grau. c) O valor dos bens inventariados é o do momento da morte do de cujus, pois é nesse momento que se dá a transmissão dos mesmos aos herdeiros(jurispr.). ______________//____________ Transmissão da posse. O princípio da “saisine”. “Na herança, o sistema da saisine é o direito que os herdeiros têm de entrar na posse dos bens que constituem a herança”[5]. Embora seja a posse situação de fato, a lei atribui ao herdeiro a condição de possuidor e determina a sua transferência no instante do falecimento do autor da herança, sem subordinar a aquisição de tal estado (possuidor) à apreensão material da coisa. Ainda que a herança se encontre na detenção de terceiros, o herdeiro adquire a qualidade de possuidor. Ele obtém a posse indireta, a posse de direito. · É importante a atribuição da qualidade de possuidor ao herdeiro, porque gera efeitos: o principal é permitir que os herdeiros defendam a posse dos bens herdados, diretamente[6] e através dos interditos possessórios. · A transmissão da posse da herança, por força de lei, era desconhecida dos romanos. Entre eles, a posse só era adquirida pelo herdeiro através da apreensão da coisa[7]. Enquanto é facilmente entendida a transmissão automática do domínio, pois o herdeiro toma a posição do autor da herança, substituindo-o em todas as relações jurídicas patrimoniais, a posse, fato, envolve, na concepção tradicional, um ato externo de apreensão da coisa. O princípio da transmissão ex lege dos bens hereditários aos sucessores universais do de cujus só foi introduzido no direito português pelo alvará de 9.11.1754, fonte do art. 1.572 do CC/1916 e do art. 1.784 do CC/02. Para Silvio Rodrigues[8], a regra deve ser interpretada em consonância com o art. 1.207 do CC, que determina continuar o sucessor universal a posse de seu antecessor, de modo que o herdeiro se sub-roga, no que diz respeito à posse da herança, na própria situação que o finado desfrutava. Se ele era titular de uma posse justa e de boa-fé, o herdeiro adquirirá uma posse justa e de boa-fé. Se, ao contrário, for injusta a posse do de cujus, a posse de seu sucessor terá igual defeito, pois ninguém pode transmitir mais do que tem. Mas (vimos) se a posse for violenta ou clandestina, pode convalescer desses vícios após ano e dia a contar da cessação da violência ou da clandestinidade. · Outra questão importante: conciliação do art. 1.784 do CC (em comentário) combinado com o parágrafo único do art. 1.791, que defere a posse da herança aos herdeiros, com as regras dos art. 1.797 e 1991 do CC, que conferem às pessoas que mencionam a administração da herança até o compromisso de inventariante, e ao inventariante, desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn5 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn6 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn7 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn8 Como conciliar os preceitos, aparentemente contraditórios: um transfere a posse a todos os herdeiros; e os outros apontam pessoas que, cf. o caso, administrarão a herança?[9] A conciliação é simples[10]: a contradição se dilui desde que feita a distinção entre posse direta e indireta. Enquanto o inventariante conserva a posse direta dos bens do espólio, os herdeiros adquirem a sua posse indireta. Ambos ostentam, simultaneamente, a condição de possuidores. ______________//___________ Espécies de sucessão: legítima e testamentária. A sucessão se dá por lei (sucessão legítima) ou por disposição de última vontade, expressa em testamento (sucessão testamentária - art. 1.786). No Direito Romano, a sucessão ou era legítima, ou testamentária – uma excluía a outra. No Brasil isto não ocorre – as duas formas podem ocorrer em um só caso. Falecendo uma pessoa com testamento que não abranja todos os seus bens, a parte de seu patrimônio não referida no ato de última vontade passa a seus herdeiros legítimos. Sucessão legítima: decorre da lei. Se o morto não fez testamento, por exemplo, seu patrimônio por força de lei irá a seus descendentes e, dependendo do regime de bens, aos descendentes em concorrência com o cônjuge. Inexistindo descendentes, aos seus ascendentes e cônjuge; não havendo nem descendentes e nem ascendentes, ao seu cônjuge. Não havendo nem aqueles parentes e nem cônjuge, aos colaterais até o 4º grau. A transmissão da herança aos sucessores ocorre sem manifestação de última vontade do falecido; decorre da lei, por isso se fala em sucessão legítima. A sucessão legítima é o testamento (tácito) presumido do de cujus que não dispôs expressamente sobre seus bens. · Ocorre a sucessão legítima quando não existe testamento, ou quando o testamento caducar ou for anulado ou declarado nulo, pois nesses casos deixa de haver disposição de última vontade e a lei disciplina a sucessão (art. 1.788, CC). · Ocorre sucessão simultaneamente legítima e testamentária quando o testamento não abrange todos os seus bens. Nesse caso, os bens referidos no testamento se transmitem aos herdeiros testamentários e aos legatários, enquanto os bens não alcançados pelas disposições testamentárias seguem aos herdeiros legítimos, na ordem de vocação hereditária. ______________//_______________ Sucessão a título universal e a título singular. · A título universal: quando o herdeiro é chamado a suceder na totalidade dos bens do de cujus, ou em uma parte alíquota deles (abstrata e ideal), ou seja: o sucessor se sub-roga na posição do finado, como titular da totalidade ou de parte da universitas iuris, que é o seu patrimônio, de modo que, da mesma maneira que se investe na titularidade de seu ativo, assume a responsabilidade por seu passivo. Exemplo de sucessão a título universal: cláusula testamentária que defere ao herdeiro todos os bens do de cujus, ou 1% de seu patrimônio. Se houver passivo, o herdeiro assume as dívidas na proporção de seus benefícios – se recebeu 1% da herança, assumirá 1% das dívidas. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn9 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn10 · Sucessão a título singular: quando o testador se dispõe a transferir ao beneficiário bens individuados, determinados. Ex.: deixa a alguém dois imóveis, ou um carro. O sucessor a título singular é chamado de legatário, e não de herdeiro. E o legatário não assume obrigações do de cujus, salvo as obrigações propter rem, que acompanham o dono. A distinção é importante porque o legatário não assume as obrigações do de cujus. As únicas obrigações que recebe o legatário são as obrigações propter rem. _______________//__________ Liberdade de testar. No Direito Romano, originalmente, a liberdade de testar não encontrava limites[11]. As restrições vêm a partir da República, para proteger os descendentes e ascendentes injustamente afastados da sucessão, ou preteridos. Art. 1789 do CC: havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade dos seus bens, pois a outra metade constitui a legítima ou reserva daqueles herdeiros. Herdeiros necessários: art. 1.845, CC – descendentes, ascendentes e cônjuge. A lei concede a esses sucessores direito à metade do ativo patrimonial do de cujus. Assim, se o testador não tiver descendentes, ascendente ou cônjuge, é irrestrita a sua liberdade de testar. Pode dispor de todos os seus bens por testamento, afastando, então, de sua sucessão, os colaterais (art. 1.850, CC). · Mas se tiver herdeiros necessários, sua liberdade de testar encontra restrição, pois a lei só lhe permite dispor da metade de seus bens. A outra metade constitui a reserva, ou legítima, dos herdeiros necessários (art. 1.846, CC). · O Direito das Ordenações, anterior ao CC/1916, já consagrava o princípio da relativa liberdade de testar, ao determinar não poder o testador dispor de mais do que a terça parte dos seus bens, se tivesse descendentes ou ascendentes. A Lei Feliciano Penna – Decr. n. 1.839, de 31.12.1907 (art. 2º) – reduziu a legítima de 2/3 para a metade dos bens do testador, aumentando, então, a quota disponível, de 1/3 para a metade de seu patrimônio. Esta regra foi adotada pelo CC/1916 (art. 1.576) e pelo CC/2002 – art. 1.789. ___________//___________ Lugar em que se abre a sucessão: Art. 1.785,CC: a sucessão se abre no lugar do último domicílio do falecido. A competência para a ação de inventário é do juiz do último domicílio do de cujus. · No juízo do inventário serão decididas todas as questões relativas à sucessão (art. 48, CPC/2015; art. 96 do CPC/1973). O art. 48 do CPC/2015 diz ser competente, para o inventário e partilha, o foro do domicílio do de cujus, bem como para todas as ações relativas à herança. Se o de cujus tinha vários domicílios, requerido o processamento de seu inventário em um deles, fixa-se a competência do juiz requerido, para processá-lo[12]. · Se o cônjuge do de cujus falece no curso do processo, o inventário deste último se processará conjuntamente com o do anteriormente falecido, em obediência ao princípio da http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn11 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftn12 conexão. A conexão ainda prevenirá a competência, em caso de falecimento de herdeiro sem outro bem além da quota hereditária no primitivo inventário. - Haverá um só inventariante para os dois inventários. - O segundo inventário será distribuído por dependência, processando-se em apenso ao primeiro. * Na falta de domicílio certo, será competente o foro da situação do imóvel deixado pelo de cujus; havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes; e não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do espólio (art. 48, parágrafo único do CPC/2015). ______________________//______________ Da herança e de sua administração: A morte ocasiona a abertura da sucessão e a transmissão da herança. Entre coerdeiros, a situação é de condomínio: a propriedade e a posse da herança serão indivisíveis (art. 1.791, CC). Até que haja a partilha, nenhum herdeiro tem a propriedade ou a posse exclusiva sobre um bem certo e determinado do acervo. A partilha é que individualiza o que cabe a cada herdeiro. Com a partilha, cessa a indivisão e o direito do herdeiro fica restrito ao seu quinhão. A situação dos coerdeiros da abertura da sucessão até a partilha é de condôminos, titulares de uma parte ideal do todo, e jamais de bens individuados que compõem o acervo. Aplicam- se aqui as regras do condomínio. E o condômino, respeitando o direito de preferência, pode alienar a terceiro sua parte indivisa - a fração ideal de que é titular (pode até alienar uma alíquota de sua parte), mas não pode alienar um bem do acervo (isto só pode ocorrer com o consentimento dos demais herdeiros). Se for para alienar um bem do acervo, todos fazem a venda conjuntamente, e o preço entra no lugar da coisa (sub-rogação real). Até a partilha, então, cada herdeiro tem a prerrogativa de reclamar a herança inteira, de quem quer que injustamente a possua, sem que essa pessoa possa defender-se alegando o caráter parcial do direito do reivindicante. O herdeiro tem tal legitimidade porque é indivisível o direito de domínio e à posse da herança – art. 1.825, CC. Isto é bom porque é difícil defender apenas um quinhão não individuado. Das dívidas do de cujus. No direito romano a responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do de cujus era ilimitada. Os patrimônios do herdeiro e do de cujus se confundiam: os credores do de cujus passavam a ser credores do herdeiro. O pior era para os herdeiros necessários, que não podiam repudiar tal sucessão, enquanto os voluntários podiam repudiar a sucessão. Com o tempo, a renúncia passa a ser sempre permitida, para não haver que se responsabilizar pelo passivo do de cujus. Com Justiniano, em 531, resolve-se que é possível renunciar a herança quando se percebe que o passivo supera o ativo (aceitação sob benefício de inventário). No Brasil este foi o regime até o CC/1916. Se não se fizesse a ressalva de aceitar sob benefício de inventário, o herdeiro assumia integral responsabilidade pelas dívidas do morto, qualquer que fosse o seu montante. Art. 1.587 do CC/1916 e 1.792 do CC/2.002: a aceitação é sempre a benefício de inventário. A responsabilidade do herdeiro não excede as forças da herança. O inventário é para fazer o levantamento do patrimônio do falecido – das suas vantagens e débitos. Antes de dividirem os bens, as dívidas devem ser pagas. Essas dívidas são da herança – é a herança que por elas responde (1.997, CC/2.002). Separam-se o patrimônio da herança e o patrimônio do herdeiro. Quando os encargos excederem o valor dos bens que integram o espólio, ocorre a insolvência da herança, incumbindo ao inventariante requerer a declaração de insolvência. Cessão de direitos hereditários. Os direitos de herdeiro à sucessão aberta podem ser transmitidos gratuita ou onerosamente. A cessão é negócio jurídico inter vivos. Com a morte do autor da herança e abertura da sucessão pode haver a cessão. Antes, a cessão é pacto sucessório, contrato que tem por objeto a herança de pessoa viva, que nossa lei proíbe (art. 426, CC) – e é negócio nulo de pleno direito (art. 166, II e VII, CC). Aberta a sucessão, é lícita a cessão, mesmo feita antes da abertura do inventário. Com a partilha e finda a indivisão, não há cessão de direitos hereditários, pois cada herdeiro já é dono dos seus bens e o que ocorre então é permuta, doação, venda etc. Ainda que só haja coisas móveis no espólio, a herança é considerada bem imóvel para efeitos legais – art. 80, II, CC. Exige-se forma solene para a cessão: escritura pública (art. 1.793, caput do CC). Não se cumprindo a forma, há nulidade (art. 166, IV, CC). E se o herdeiro é casado, é necessária a anuência do outro cônjuge, salvo se o regime de bens for o da separação absoluta (art. 1.647, caput e I). Sem autorização do outro cônjuge, o ato é anulável (art. 1.649, CC). A cessão pode ser de toda a herança, se o cedente é herdeiro único, ou de parte da herança; pode ter por objeto todo o quinhão hereditário ou parte deste. O cessionário se sub-roga em todos os direitos e obrigações do herdeiro cedente, podendo defender posse e propriedade da herança. Há situações jurídicas que salvo deliberação expressa das partes não estão compreendidas na cessão (não beneficiam o cessionário). Se o herdeiro adquiriu direitos em consequência de substituição (art. 1.947, CC) ou de direito de acrescer (art. 1.941, CC), esses direitos presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente (art. 1.793, §1º). O herdeiro pode efetuar a cessão gratuita ou onerosamente, equiparando-se à compra e venda, no 1º caso, e à doação, no 2º - aplicam-se por analogia as normas que regem estes contratos, no que couber – e se o assunto não estiver diretamente regulado nos art. 1.793 a 1.795, CC. O cedente não transfere bem individuado, coisa certa integrante do espólio, mas sim direito sobre a sua quota ideal na unidade abstrata, indivisível que é a herança. Conforme art. 1.793, §2º, CC – é ineficaz a cessão de direito hereditário sobre bem da herança considerado singularmente. A venda de bem individuado da herança, por um dos herdeiros, depende de acordo dos interessados e autorização do juiz da sucessão (art. 1.793, §3º). E há também outro tipo de venda, a realizada pelo espólio, por hastas públicas ou mediante alvará judicial – o preço vai para o acervo e será dividido, no lugar da coisa, entre todos os herdeiros, na proporção de suas quotas. A venda ocorre para pagar dívidas da herança, custas, impostos etc., para atender necessidade urgente dos herdeiros, por estar algum imóvel se deteriorando etc. Incumbe ao inventariante, ouvidos os interessados e com autorização do juiz, alienar bens de qualquer espécie. Conforme regra do condomínio – o herdeiro não pode ceder a sua quota hereditária a estranho, se outro herdeiro a quiser, pelo mesmo preço (“tanto por tanto”) – preferência do art. 1.794, CC. A razão da lei é evitar que estranho ingresse na comunhão hereditária, que mesmo sem terceiro já é fonte de briga. O CC/2.002, no 1.794, firmou o direito de preferência. *** A preferência só existe na cessão onerosa. Não há preferência do coerdeiro se a cessão se faz gratuitamente. E não há preferência se o coerdeiro cede o seu quinhão a outrocoerdeiro, que não é pessoa estranha à sucessão. Se não for dada a preferência, o coerdeiro, a quem não se deu conhecimento da cessão, pode depositar o preço e haver para si a quota cedida a estranho – até 180 dias após a transmissão. Art. 1.795, CC (repete art. 504, CC). Se mais de um coerdeiro quiser a preferência, dividir-se-á entre eles o quinhão cedido, na proporção de suas respectivas quotas hereditárias (art. 1.795, parágr. único, CC). Abertura do inventário. Art. 1.796, CC – é matéria de processo: diz que em 30 dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á inventário do patrimônio hereditário, perante o juízo competente no lugar da sucessão, para fins de liquidação e, quando for o caso, partilha da herança. Ocorre que a reforma do art. 983, CPC/1973, conferida pela Lei nº 11.441/2007, estabelece que o processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro de 60 dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar tais prazos, de ofício ou a requerimento das partes. O CPC/2015, em seu art. 611, determina que o processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro de 2 (dois) meses a contar da abertura da sucessão. Desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a administração da herança será exercida pelo inventariante, que representa o espólio, ativa e passivamente, em juízo e fora dele, tendo por lei outras importantes atribuições (art. 618, CPC/2015; art. 991, CPC/1973). Art. 617, CPC/2015 (art. 990, CPC/1973): O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem – o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste; o herdeiro que se ache na posse e administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou que possa ser nomeado; qualquer herdeiro, se nenhum estiver na posse e administração do espólio; o herdeiro menor, por seu representante legal; o testamenteiro (pessoa encarregada pelo testador de lhe cumprir as disposições de última vontade), se lhe foi confiada a administração do espólio ou toda a herança estiver distribuída em legados (é preciso que não haja cônjuge ou herdeiros necessários. Se houver, ainda que haja testamenteiro universal, é nomeado ou o cônjuge, ou descendente, ou ascendente); o cessionário do herdeiro ou legatário; o inventariante judicial, se houver; pessoa estranha e idônea, se não houver inventariante judicial. O juiz deve seguir a ordem legal (supra). Só pode deixar de segui-la por razões relevantes. Ex.: nomeia-se estranho idôneo se os herdeiros estão em litígio. E não pode ser nomeado inventariante o herdeiro que esteja obrigado a prestar contas à herança. - Para ser inventariante era preciso que o cônjuge estivesse convivendo com o falecido na época da morte – mas muitos julgados deferiam a inventariança mesmo em caso de separação se o cônjuge supérstite não era o culpado pela separação. Cabe a quem quer impedir a nomeação (ou destituir a mulher do cargo de inventariante) provar que a mulher sobrevivente foi quem deu causa à separação e por isso não pode ser inventariante. - O art. 226, §3º da CF: reconhece a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, de modo que o companheiro sobrevivente pode requerer a abertura do inventário do de cujus e pode ser nomeado inventariante. _________________//___________________ Administração provisória da herança. Até a nomeação do inventariante, que presta compromisso assinando-o, até a homologação da partilha, o espólio fica na posse do administrador provisório, que representa ativa e passivamente o espólio (art. 613 e 614 do CPC/2015; art. 985 e 986, CPC). A administração provisória é conferida pelo juiz às pessoas do art. 1.797, do CC: cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão; ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho; ao testamenteiro; a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz. · O administrador provisório pode ser mantido na administração do espólio se, em seguida, conforme o caso, for nomeado inventariante. ___________________//____________ [1] Direito Civil Brasileiro, vol. 7, pg. 21. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref1 [2] Silvio Rodrigues, Direito Civil – Direito das Sucessões, vol. 7, 26ª ed. Editora Saraiva, p. 5. [3] In Manual de Direito Civil 5 – Direito de Família e Sucessões, 5ª ed. reformulada, 2009. Editora Saraiva, p. 295. [4] A expressão de cujus é tirada da sentença latina de cujus sucessione agitur - (pessoa) de cuja sucessão se trata. [5] Silvio de Salvo Venosa. Código Civil Interpretado, 2ª ed. Editora Atlas, p. 1876. [6] A lei permite a defesa direta da posse, no art. 1.210, parágrafo 1º, CC/2002. [7] Silvio de Salvo Venosa. Código Civil Interpretado, 2ª ed. Editora Atlas, p. 1876. Este autor afirma que o princípio da saisine é de origem germânica, medieval, presente no direito costumeiro francês (idem, ibidem). Silvio Rodrigues afirma que a ideia surge no direito francês (Direito Civil – Direito das Sucessões, vol. 7, 26ª ed., Editora Saraiva, p. 14). [8] Direito Civil, vol. 7, 26ª ed. Editora Saraiva, p. 15. [9] O CC/02, art. 1.797, I, prescreve que até o compromisso do inventariante a administração da herança caberá ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão. [10] Silvio Rodrigues, Direito Civil, vol. 7, 26ª ed. Editora Saraiva, p. 15. [11] Silvio de Salvo Venosa, Código Civil Interpretado, 2ª ed. Editora Atlas, p. 1881. [12] Há jurispr. no sentido de que se só há um imóvel e em outro lugar, este local de situação do imóvel, e não o lugar onde o morto esteve por último domicílio, fixa o foro competente para o inventário. http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref2 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref3 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref4 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref5 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref6 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref7 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref8 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref9 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref10 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref11 http://adm.online.unip.br/blank.htm#_ftnref12
Compartilhar