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A Dignidade da Vida e os Direitos Fundamentais para além dos Humanos

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COLEÇÃO FôRUM OE
DIREITOS FUNDAMENTAIS COLEÇÃO FÔRUM OE 
DIREITOS FUNDAMENTAIS 
Coordenador 
ANDRÉ RAMOS TAVARES 
Carlos Alberto Molinaro 
Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros 
Ingo Wolfgang Sarlet 
Tiago Fensterseifer 
(Organizadores) 
A DIGNIDADE DA VIDA 
E OS DIREITOS FUNDAMENfAIS 
PARA ALÉM DOS HUMANOS 
UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 
PUCRS/BCE 
Belo Horizonte 111 11111111111111 I 
� Edlton, F6nnn -
2008 
0.944.054-8 
PRlllllft IIIAfOIIN 
U. CQNIIICl•IIO
'O fôRUM OE COLEC"v
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OIREIT 
coordenador 
ANDRt RAMOS TA
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PLJCRS • BIBLIO
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::::;;ri21oos Editora Fóru
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obra •. por 
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ex ressa do Editor. 
t proibida a reprod
ução t
�s xerogrMicos, sem 
autorização p 
inclusive por process 
Editora Fórum Ltda.. ários _ CEP 30130-00
7 
2770 - 1 Sº/16
º andar - Funct;; 4900 I 2121.4949 Av. Af
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31),;@e<iitoraforum.com.br�o m br- e<1i1ora oru yJWW.editoraforum.co · . 
. 1 Cláudio Rodrigu
es Ferreira 
Editor responsáv el. L� s . . 01 a M. A. Sousa Coordenação ed1tonal. 9 
. 
Reviso�a: Cida. Rib�r�RB 1326 _ 5• Região 
indexação· Maria Clarice uma 
Ba1JSta 
CRB 2900 - 5• Região . 
F da de Paula Moreira 
-
Bibliotecária: er�an áf formatação: Walter 
Santos
capa. proJeto gr "º e 
. além dos humanos: uma 'd 5 direitos fundamenta15 
para . F nda Luiza 
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Med · s lngo Wol gang a • Fontoura de eiro • Fó de Direitos Fundamentais, 
3). 
Fórum. 2008. (Coleção rum 
��!,��nador da coleção: André Ramo
s Tavares. 
ISBN 978-85-7700-120-0 
. . . .5 _ trato. 3. Animais - proteção. 4. 
1. Animais - aspectos JurldJCos. 2d
· Anim
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n·,mal 6 Rodeio. 7. Brasil [Lei dos
. ét' 5 Cruelda e con ra
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AnimaJS - aspectos JCos. · . C I Alberto II Medeiros. Fernanda Lu
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Crimes Ambientais (1998)). I. MW
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Ramos. VI. Coleção Fórum de Direitos Fundame
ntais. VII. T1tu o. 
COO: 344.81049 
CDU: 34:577.4 
Informação bibliográfica deste livro, conforme a NBR 6023:2002 d
a Associação Brasileira 
de Normas Técnicas (ABND: 
MOUNARO, Carlos Alberto; MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de; SARLET, lngo Wolfgang; 
FENSTERSEIFER, Tiago (Org.). A dignidade da vida e os direitos fundamentais para além dos 
humanos: uma discussão necessária. Belo Horizonte: Fórum, 2008. 542 p. ISBN 978-85-
7700-120-0. (Coleção Fórum de Direitos Fundamentais, 3). 
Sumário 
Apresentação 
André Ramos Tavares ....................................... _................. 1 3 
Nota dos organizadores .... -................................................ 17 
Ética e animais - Reflexões desde o imperativo da alteridade 
Ricardo Timm de Souza ............................................................... 21 
I Introdução ............................................................................. 22 
li Da diferença à_objetificação ................................................... 23 
a) No princípio era a diferença ................................................... 24 
b) O primeiro passo do processo de objetificação/superação
da diferença: sobre Ser e Não-ser ........................................... 31 
c) O segundo passo na superação da diferença:
a espacialização da temporalidade ......................................... 33 
d) O terceiro passo na superação da diferença: a objetificação
intelectual-neutralizante do real ............................................. 37 
Ili Da neutralização da diferença à dignidade da alter idade ........ 39 
a) Pó e cinzas ......................................................... - ................... 39 
b) Crises, arqueologias e novas descobertas: finitude e
temporalidade ....................................................................... 42 
c) A reafirmação da dignidade da Alteridade .............................. 44 
IV A Alteridade dos animais ................................... - ................... 47 
Referências ............................................................................ 50 
Liberdade e autonomia prática. Fundamentação ética 
d� �roteçã? constitucional dos animais � 
Son1a T. Fehpe ......................................................... -........ -............ 55 
Considerações preliminares .............................................................. 5_} 
Antropocentrismo especista ..................................... __ , ..................... f>8.; 
Capacidade de sentir dor e de sofrer, ou igualdade racional? ............ 6J 
Direitos constitucionais para os animais. A proporcionalidade 
da liberdade na proposta de Steven M. Wise ................................. 'JO 
.V 
Autonomia prática, consciência, autoconsciência e a liberdade 
proporcional que as deve respeitar ............................................... .
Implicações do respeito à liberdade animal ..................................... .
Da autonomia moral ao direito legal ............................................... .
Conclusões ..................................................................................... .
Para além de "compaixão e humanidade" - Justiça para
animais não-humanos 
Martha C. Nussbaum ................................................................... 85
"Seres titulares do direito a uma existência digna" ......................... .
Contratualismo kantiano: obrigações indiretas, deveres 
de compaixão ............................................................................. . 
Utilitarismo e prosperidade animal .................................................. .
Tipos de dignidade, tipos de prosperidade: estendendo 
a abordagem das competências .................................................... 98
Dignidade e encantamento: o ponto de partida intuitivo .................. 99
Por quem e para quem? Os propósitos da cooperação social .......... 101 
Quão abrangente? ......................................................................... 102
As espécies e o individuo ............................................................... �j
Os níveis de complexidade importam? ............................................ 1 04
A espécie importa? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O 
Avaliando as competências animais: não ao culto à natureza ......... 108
Positivo e negativo, competência e funcionalidade ......................... 111
Em direção a princípios políticos fundamentais: a lista das 
competências ............................................................................. 114 •
As competências humanas centrais ................................................ 114
A impossibilidade de eliminação de conflito ................................... 123
Rumo a uma justiça verdadeiramente global .................................. 12�
�mal n�humano
.. < 
Ana ma ria Gonçalves dos Santos -Fe1Jo ..................................... 1J7
Vivissecção: fé cega, faca amolada? 
Paula Brügger ............................................................................. 145
Resultados pífios e perigos potenciais ............................................ 147
Fé cega: a crença acrítica numa visão mecanicista, reducionista 
de ciência ................................................................................... 1 51
Faca amolada: é possível "arrancar sob tortura os segredos 
da natureza"? ............................................................................ 160
Técnicas e procedimentos substitutivos à "experimentação 
animal": muitas luzes no fim do túnel ...... ·············· ..................... 163 
É hora de urdir uma nova trama com a natureza ........................... 165Conclusões articuladas ................................................................... 171 
Referências .................................................................................... 1 7 3 
Algumas notas sobre a dimensão ecológica da dignidade
essoa humana e sobre a dignidade da vida em geral
lngo Wolfgang Sarlet, Tiago Fensterseifer .............................. 175 
1 A dimensão ecológica da dignidade (da pessoa) humana ..... 176 
2 Dignidade da vida para além da humana?............................ 82 
2.1 Sobre a necessidade de repensar a concepção individualista
e antropocêntrica de dignidade e avançar ·rumo a uma
compreensão ecológica da dignidade da pessoa humana 
e da vida em geral ................................................................ 182
3 A superação do paradigma jurídico antropocêntrico 
clássico e o reconhecimento da dignidade do animal 
não-humano e da vida em geral no âmbito 
jurídico-constitucional brasileiro .......................................... . 
4 Algumas questões em aberto - Um novo contrato 
político-jurídico socioambiental? .......................................... 203
Experimentação em animais e Direito Penal: comentários
dogmáticos sobre o art. 32, § 1 º, da Lei nº 9.605/1998,
e o bem jurídico "dignidade animal"
Paulo Vinicius Sporleder de Souza, João Alves Teixeira Neto, 
Juliana Cigerza ............................................................................ 207 
1 Considerações prévias .......................................................... 208
2 Art. 32, §1 º (Lei nº 9.605/1998) ........................................... 213
2 .1 Tipo objetivo ........................................................................ 213 
2.2 Tipo subjetivo ...................................................................... 214
2 .3 Modalidade culposa ............................................................. 215
2.4 Qualificadoras e causas de aumento de pena ....................... 215
2.5 Pena e questões processuais ................................................. 215
3 Da dignidade animal ......... ........... ........ ........................ ...... .. 15 
3.1 Fundamentos (fatores fundantes ) ......................................... 2 
3. 1 . 1 Vida ..................................................................................... 217
3.1.2 Sensciência ........................................................................ . 218
o 
3 .1 .3 Capacidade para sofrer ........................................................ 21 ii 
3.1.4 Interesse .............................................................................. 9 
3.1.5 Racionalidade ..................................................................... . 
3.2 Conceito .............................................................................. 223 
3.3 Natureza .............................................................................. 225 
4 Considerações finais ............................................................. 225 
Referências .......................................................................... 228 
e��!�: �n�i�:�e�r�s·�-�_i-��'.� .. ��--�'.�.�_i��-�-���i.1�.i-��-··· 231
Introdução .................................................................................... 231 
1 A tolerância da crueldade contra os animais 
não-humanos na legislação brasileira .................................. � 40 
2 A tolerância da crueldade contra os animais / 
não-humanos nos tribunais ................................................. • 43 
3 Inovações da legislação ambiental e a crueldade contra 
���:,;::::� .�.�·���'.�����. '.
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��······ IReferências ........................................................................... 12 
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,0'ireito dos a nimais : proteção ou legit imaçã� 
'&Q_mércio da vid 7 _ _ __ -
Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros ..................................... 259 
1 Introdução ...................................................... '. .................... 259 
2 Um olhar acerca da interação entre os animais 
(hum�no� e/ou não)_ .. _. ............ : ... _. ........................................ �3 Os animais como suJe1tos de direito .................................... �:: 1
4 As duas correntes de proteção: o bem-estar e o direito ,,.. 
d . 
. (,"'os an1ma1s .............................................. ........................... ,t..8/
5 Uma questão de dignidade .................................................. 283 
6 Conclusões articuladas ......................................................... 287 
Referências .......................................................................... 288 
Ação Civil Pública - Processo 2004. 71.00.021481-2 -
Sentença 0397 /2005
Cândido Alfredo Silva Leal Júnior ............................................. 291 
1 RELATÓRIO .......................................................................... 292 
2 FUNDAMENTAÇÃO .............................................................. 296 
3 DISPOSITIVO ........................................................................ 328 
1Entre anjos e macacos, a prática hu�na� �acrifício 
ritual de animais 
Jãyme Wemgartner Neto ........................................................... 331 
1 
2 
3 
Introdução ........................................................................... 331 
Traços doutrinários .............................................................. � 
O açougueiro turco de Essen ............................................... � 
As religiões afro-brasileiras no Rio Grande do Sul ................. 34� 
Diretrizes para resolução do caso no STF .............................. @ 4 
Por uma releitura ética da atuação do Ministério Público 
'em prol dos animais: estudo de casos da Primeira Promotoria 
de Justiça do Meio Ambiente de Salvador (Bahia) 
Luciano Rocha Santana ............................................................. 361 
1 Introdução ........................................................................... 361 
2 Das éticas da natureza ......................................................... 363 
/ 
3 Das éticas animalistas e ecológicas ........... .... ....... ................. 6-U 
Por uma releitura ética do Ministério Público em favor 
dos animais ...................................................................... J g _
4.1 Casos práticos ..................................................................... . 
5 Conclusão ............................................................................ 392 
Referências .......................................................................... 392 
O caso da farra do boi no Estado de Santa Catarina: 
colisão de direitos fundamentais 
e<'� 
CiraH·na Meaeiros Bahia ............................................................ 395 
1 Introdução ........................................................................... 395 
2 Conceito constitucional de cultura. Direito à liberdade 
de ação cultural como direito fundamental ......... ........ ......... 96 
3 Proteção constitucional da fauna. Combate aos maus-tratos 
e à crueldade como manifestação do direito ao meio 
ambiente ecologicamente equilibrado .................................. 4QO , 
4 O caso da farra do boi no Estado de Santa Catarina ............. 404 
4.1 Histórico .............................................................................. 404 
4.2 Descrição da prática ............................................................. 408 
5 Discussão ............................................................................. 411 
5.1 A farra do boi como manifestação cultural ........................... 411 
5.2 A farra do boi como ato cruel contra os animais .................. 414 
6 A colisão no âmbito judiciário: a farra do boi segundo . ' 'b . 416 1os Ju1zes e tn unais ............................................................ _ -
7 Conclusões articuladas ......................................................... 423 
Referências ............................................., .. , ......................... 424 
O direito à escusa de consciência na experimentação animal 
Laerte Fernando Levai ................................................................ 429 
1 Introdução ........................................................................... 429 
2 O altar cientificista ............................................................... 433 
3 Métodos alternativos ........................................................... 436 
4 A objeção de consciência ..................................................... 440 
5 Aspectos jurídicos ................................................................ 442 
6 Conclusões articuladas ......................................................... 448 
Referências .......................................................................... 449 
(cJs animais podem processar? 
Céfss R. Sunstein ............. � ......................... , .............................. . 
Dire itos dos animais em ação ........................................................ . 
Lei estadual: crueldade, uma interpretação ampla ......................... . 
Lei federal: espécies, mamíferos, cavalos, outros ........................... �56 • 
Uma declaração de direitos federal para os animais?..................... 7. 
Legitimidade: seres humanos, direitos humanos e bem-estar animal ... · O 
Leg islação vigente: legitimidade para informações ......................... 21-60 
Legislação vigente: danos da concorrência .................................... 63 
Legislação vigente: dano estético ................................................... 464 
,,. ,/ 
Sem danos e sem planos ............................................................... -
Planos, cientistas, visitantes ......................................................... -� 
Os animais têm legitimidade? ....................................................... l:1-6 
O art. 20a da Lei Fundamental da Alemanha e o novo 
objetivo estatal de proteção aos animais 
Johannes Caspar, Martin Geissen ............................................. 473 
I Introdução ........................................................................... 474 
li Do âmbito de proteção do novo fim estatal .......................... 475 
1 A "pequena solução" ........................................................... 41-51 
2 O termo "anima is" no art. 20a da Le i Fundamental .............. 47,.6 
Ili 
IV 
2 
V 
Sobre a natureza jurídica das normas defin idoras de fins 
do Estado ............................................................................ 47'"'' 
Sobre o futuro significado do objetivo estatal da 
" t - . . " 44788) 
6a
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�:r�:�t��:;:�:;��ídi�·�· d�. ���-��. d�ti�id·�·�
;· ·d·�· ti�� ....... Y)
do Estado para o Legislativo ................................................. 478 
O significado da norma definidora de fins do Estado 
para o Judic iário e o Executivo ............................................. . 
Conclusão ............................................................................ 491 
/\Í 
( Habe:S Co�us ��Chimpanzé�
1 Dos fatos ............................................................................. 496 
2 Da admissibilidade do writ .. ............. ... . ...... .... ....... .. ............. 7 
2.1 
2.2 
2.3 
3 
Extensão dos direitos humanos aos grandes primatas .......... 
,Os ch impanzés como pessoas ............................................. 
· 
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-�-�-�'.. ��-����-�-��.:::::::::::::::::::::: :: :: : : 5-
Habeas Corpus nº 833085-3/2005 - lmpetrantes:
Drs. Heron José de Santana e Luciano Rocha Santana -
Promotores de Justiça do Meio Ambiente e Outros -
Paciente: Chimpanzé "Suíça" ................................................... 525 
Índice ............................................................................................ 533 
Apresentação 
A Coleção Fórum de Direitos Fundamentais faz agregar, 
como sua terceira composição, a presente obra coletiva A 
dignida.de da vida e os direitos fundamentais para a/im dos humanos: 
urna discussão necessária. Estão de parabéns seus organizadores, 
Carlos Alberto Molinaro, Fernanda Luiza Fontoura de 
Medeiros, Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer, não 
só pelo alto padrão de discussões que aqui foram capazes de 
reunir, mas por permitirem ao público brasileiro uma apro­
ximação mais segura de um tema extremamente delicado e 
ainda muito escassamente enfrentado pela literatura jurídica 
pátria. A riqueza bibliográfica e a reavaliação dos direitos 
em relação aos seres vivos não-humanos (problematizando a 
gramática tradicional dos chamados direitos (humanos) 
fundamentais) permeia todos os estudos desta obra, 
conferindo-lhe uma robusta coesão e, concomitantemente, 
uma visão abrangente e compreensiva de todas dimensões 
que se (im)põem pela questão enfrentada, pelas questões 
conexas e por suas conseqüências em geral. 
Os textos vocacionados para o enfrentamento teórico­
jurídico do assunto rendem uma impressionante variedade 
de argumentos e texturas valorativo-normativas, na sua 
bem exposta e sistematizada complexidade. Dentre os 
autores, e sem pretender aqui adiantar a· totalidade dos 
pressupostos e conclusões apresentadas, Ingo Sarlet e Tiago 
Fensterseifer nos falam de uma nova dimensão ecológica 
, •ERIO MOU
NARO,
I QRLOS •� GANG s,IRLET. 
TIA
TOURA OE MEDEIR
OS. 
F�Ri::s�:.w::t/(��GANIZAOORfS) 
 
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14 1NGO\\Olf 
humana: "uma compreensão. . d de da pessoa . . Para a d1gn1 ª . d. sional e não-re
duc1omsta da
. te rnulu imen , . necessanarnen aquilo que se podera designar
. d d pessoa h
urnana, . . 
dign1da e ª 
/' . ( u quem sabe, so
cwambzental) da
d' ão eco ogzca o 
, 
de uma wzens ue or sua vez, também 
não poderá
d. . dade hurnana
, q , p 
b' l ' 
. 1gn1 d'mensão puramente 10 ogica ou.· gida a urna 1 ser resu 1�1 
1 qualidade de vida como um
 todo,
física pois contemp a ª b ' b' m que a vida humana (mas tam
 ém 
inclusive do am iente e 
_ ) desenvolve". A essa concep
çao se faz
a nao-hurnana se . -
'd de que a tutela da vida em geral naoacrescer o senu o . _ 
d e como meramente mstr
umental em relaçao
po e sustentar-s 
h no. há um valor intrínseco em sua defesa, umao ser uma , . 
"valor próprio" da dignidade da vida em geral. E as
sim a
discussão se desemola entre os diversos autores que compõem 
a obra, autores do porte de Cass Sunstein, ao qual se juntam
Paulo Vinicius Sporleder de Souza, João Alves Teixeira
Neto, Juliana Cigerza, Patrícia Azevedo da Silveira,
Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros, Cândido Alfredo
Silva Leal Júnior, J ayme Weingartner Neto, Luciano Rocha
Santana, Carolina Medeiros Bahia e Laerte Fernando Levai.
Mas não é só. Acrescente-se ainda o texto de J ohannes
Caspar e Martin Geissen. 
. Mas a obra se caracteriza também pela sua "combinação"(imprescindível) - e contribuição - filosófica. Assim é que
no 
.
texto de Sônia T Felipe, partindo-se de postura ética de canz constitucional d , · 
i: 'bil' 
- emocrat1Co, estas são realocadas, em suare1en idade aos a . 
fil 'fi 
rumais. A autora, com sua excelente baseoso 1ca segue a " . 
direitos � 
autonomia prática" e defende que "osevem ser conced'd . . , . 1 mente às suas h b'i'd 
1 os aos md1viduos proporciona -
. a 1 1 ades fís · , . , 
. d de mteração soc'al . 
' Ka e psiqmca, e a sua capacida ei e ambiental :1;,..;,1,,,t/P.' resguardando-se a especip1.,;,...,.,,._
�----
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAJS PARA AL(M DOS HUMANOS: UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 1 1 5 
dessa liberdade, e assegurando-se a igualdade na consideração
dos interesses semelhantes, para todos os animais". 
Ainda na linha filosófica, Ricardo Timm de Souza fala
do processo de diferenciação e de sua "domesticação", em
texto que nos obriga a repensar as bases e conexões mais
arraigadas de nosso discurso em geral e do discurso jurídico
em particular. Desde a idéia de que a "diferença entre o
velho e o novo pensamento expressa-se ... na necessidade
do Outro",o autor bem desenvolve as principais linhas de 
uma nova postura que parte da "constatação" daquilo que
os animais não têm podido ser "co-autores da sustenta­
bilidade ético-ecológica do planeta, ou seja, ' outros"'. 
Martha C. Nussbaum realiza uma abordagem a partir
das teorias da Justiça. Contrapõe-se às concepções u·adi­
cionais de teoria da Justiça, que considera insuficientes para
a inclusão de outras formas de vida não-humanas, propondo
elementos e critérios para uma teoria da justiça efetiva­
mente e inteiramente global. Nesse sentido observa: "parece
que a melhor razão para se ser contra a escravidão, a tortura
e a subordinação vitalícia é uma razão de justiça, não um
cálculo empírico de bem-estar médio ou total".
Por fim, completam a discussão filosófica os exce­
lentes textos de Anamaria Gonçalves dos Santos Feijó e de
Paula Brügger.
A obra está a merecer, por toda sua contribuição crítica
ao pensamento mais "tradicional" e menos "global" dos
direitos constitucionais, uma leitura atenta de todos aqueles
dedicados ao estudo dos direitos e dos pressupostos filo­
sóficos, éticos e lógicos dessa categoria jurídica tão cara à
Teoria do Direito e particularmente à Teoria do Direito
Constitucional. Justifica-se, assim, plenamente, a in erção
ZA FONTOURA OE MEDEIROS
, 
1 
(AJILOI ALBERTO MOLINA��A6��E:�:R��:FER (ORGANIZADORES) 
16 INúO WOLfúANG SAR
LET. 
1 - que pretende contribuir com Od obra nesta Co eçao
, . ª 
. 1 voltado para o desenvolvimento dospensamento naoon� 
direitos fundamentais.
André Ramos Tavares
d d C leça-0 Professor dos programas de doutorado eCoordena or a o 
d D
. e'to da PUC/SP. Visiting Research Scholar na Cardozomestra o em ir 1 . d · · School of Law _ New York. Visiting Foreig11 �fess�r na for; ham u:1iversity
_ New York. Professor Visitante da Universidade de Sa?tta.go �e
Compostela. Diretor do Instituto Brasileiro de Estudos Const1tuc1ona1s.
Nota dos organizadores 
A dignidade da vida e os direitos fundamentais para 
além do animal humano é, sem dúvida, um tema que, a 
despeito de não ser propriamente novo, segue exigindo 
um enfrentamento adequado e desafia constante debate e 
reflexão. Embora siga, na essência, alinhada à matriz filo­
sófica moderna a respeito da dignidade da pessoa humana, 
designadamente no que diz com a tradição kantiana de que 
o ser humano não pode ser empregado como simples meio
( ou seja, objeto) para a satisfação de qualquer vontade alheia,
mas sempre deve ser tomado como fim em si mesmo (ou seja,
há de ser sempre sujeito) em qualquer relação, seja em face
do Estado seja em face de outros indivíduos, 1 com a presente
coletânea se pretende investir na discussão a respeito do
status moral e jurídico-constitucional dos animais não­
humanos. O objetivo não é apenas o de reforçar a neces­
sidade de ampliação das premissas e mesmo das fronteiras
propostas por KANT, no sentido de afirmar a necessidade
do reconhecimento da dignidade de qualquer forma de
vida, mas também se pretende enfatizar a correlata supe­
ração do excessivo antropocentrismo que ainda preside a
concepção vigente de dignidade da pessoa humana e dos
direitos humanos e fundamentais que lhe são inerentes.
Com isso, pretende-se também render homenagem às novas
concepções que alimentam as relações sociais contempo­
râneas e que desafiam uma nova postura ética, notadamente
no que diz com o necessário reconhecimento de um valor
, KANT, lmmanuel. Crítica da raz�o pura e outros textos filosóficos. São Paulo: Abril Cultural. 
1974, p. 229. 
I CAALOS AJ.8ERTO MOLINARO. FERNANDA LUIZA FONIOURA DE MEDEIROS, 18 INGO WOLFGANG SARLET, TIAGO FENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
intrínseco (e não meramente instrumental) inerente às 
existências animais não-humanas. 
Como decorrência do reconhecimento da dignidade 
de tais vidas não humanas, sob o marco-jurídico constitu­
cional da proteção dos animais, projeta-se um conjunto de 
deveres fundamentais que vinculam o Estado e a sociedade, 
questionando-se, inclusive, a respeito da existência de autên­
ticos direitos atribuídos aos animais, ou pelo menos de 
interesses fundamentais juridicamente tuteláveis. Essas são, 
todavia, apenas algumas das indagações subjacentes às 
diversas contribuições que compõem a presente coletânea, 
cujo propósito maior é o de, inclusive mediante a tradução 
de alguns textos estrangeiros, lançar algumas questões para 
o debate e de algum modo contribuir para o seu desen­
volvimento, mesmo porque não é a certeza que nos move,
mas a inquietude! A única certeza é a de que é preciso refletir
e avançar e que está mais do que na hora de investir na
construção de uma concepção multidimensional e inclusiva
da dignidade.
A seleção de trabalhos que ora se apresenta ao público 
integra textos de diversos autores já consagrados, inclu­
sive no que diz com o tratamento do tema específico, 
destacando-se desde logo a perspectiva interdisciplinar e a 
inserção de peças forenses que dizem respeito à discussão 
travada no âmbito da litigância em prol da proteção da 
dignidade da vida não-humana. 
Desenvolvendo uma abordagem de c unho ético­
filosófico, destacam-se os ensaios de Ricardo Timm de Souza 
("Ética e animais - Reflexões desde o imperativo da alteri­
dade"), de Sônia I Felipe ("Liberdade e autonomia prática -
Fundamentação ética da proteção constitucional dos animais"),
de Martha Nussbaum ("(Para) Além de 'compaixão e humani­
dade': justiça para os animais não-humanos"), d e Anamaria 
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIRWOS FUNDAMENTAIS PARA AÚM DOS HUMANOS UMA OlSCUSSÃO NECESSÁRIA 1 19 
Gonçalves dos Santos Feijó ("A dignidade e o animal não 
humano") e de Paula Brügger ("Vivissecção: fé cega, faca 
amolada?"). 
Já com o olhar voltado para o mundo jurídico, foram 
incorporadas as contribuições de Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago 
Fensterseifer ("Algumas notas sobre a dimensão ecológica da 
dignidade da pessoa humana e sobre a dignidade da vida 
em geral"), de Paulo Vinicius Sporleder de Souza, João Alves 
Teixeira Neto e Juliana Cigerza ("Experimentação em animais 
e direito penal: comentários dogmáticos sobre o art. 32, 
§ 1 º, da Lei nº 9.605/1998 e o bem jurídico 'dignidade
animal"'), de Patrícia Azevedo Da Silveira ("AniMENOS: a
condição dos animais no direito brasileiro"), de Fernanda
Luiza Fontoura de Medeiros ("Direito dos animais: proteção
ou legitimação do comércio da vida?"), de Cândido Alfredo
Silva Leal Júnior ("Íntegra da decisão judicial que proibiu a
caça amadora no Estado do Rio Grande do Sul"), deJayme
Weingartner Neto ("Entre anjos e macacos, a prática humana·
de sacrifício ritual de animais"), de Luciano Rocha Santana
("Por uma releitura ética da atuação do Ministério Público
em prol dos animais: estudo de casos da 1 ª Promotoria de
Justiça do Meio Ambiente de Salvador - Bahia"), de Carolina
Medeiros Bahia ("O caso da Farra do Boi no Estado de Santa
Catarina: colisão de direitos fundamentais"), de Laerte
Fernando Levai ("O direito à escusa de consciência na expe­
rimentação animal"), de Cass Sunstein ("Os animais podem
processar?"), assim como deJohannes Gaspar e Martin Geissen
("O art. 20 da Lei Fundamental da Alemanha e o novo
objetivo estatal de proteção aos animais").
Além do nosso profundo agradecimento aos diversos 
autores pelo fato de terem prontamente aceito o convite e 
disponibilizado suas respectivas contribuições, cumpre agra­
decer aos tradutores dos artigos originalmente publicados 
I CARLOS ALBERTO MOUNARO. FERNANDA LUIZA FONTOURA DE MEDEIROS. 20 INGO WOlfGANG SARLET. TIAGO FENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
em língua estrangeira. Assim, a tradução do artigo de Martha 
Nussbaum deve ser creditada a Marcelo Fensterseifer, com 
revisão de Ivar Alberto Martins Hartmann, ao passo que a 
tradução do artigo de Cass Sunstein é de autoria de Sérgio 
Osborne Moreira Alves. Com relação à tradução do artigo em 
alemão de J ohannes Caspar e Martin Geissen, a mesma foi 
realizada por Beatriz Bastide Horbach, tendo sido revista por 
Ingo Wolf gang Sarlet. 
Tanto no que diz com as traduçõesquanto no concer­
nente aos textos nacionais, não houve padronização das 
referências bibliográficas, que, portanto, mantêm o modelo 
adotado por cada autor. Da mesma forma, sempre convém 
destacar que cada autor é responsável pelo conteúdo do seu 
respectivo trabalho, de tal sorte que a inserção da contri­
buição na coletânea não corresponde necessariamente ao 
pensamento dos organizadores. 
Há que ser consignado, ainda, que muitas das discussões 
que levaram à concepção da presente obra (inclusive o debate 
sobre os textos estrangeiros) ocorreram no âmbito do NEDF 
- Núcleo de Estudos de Direitos Fundamentais (CNPq),
coordenado por Ingo Wolfgang Sarlet e vinculado ao mes­
trado e doutorado em Direito da PUC/RS, integrado também
pelos demais organizadores.
Por derradeiro, resta agradecer à Editora Fórum, na 
pessoa de seu Presidente e Editor, Luís Cláudio Rodrigues 
Ferreira, bem como ao coordenador da coleção, Prof. Dr. André 
Ramos Tavares, por terem acolhido a presente publicação 
na coleção que tem como tema os direitos fundamentais. 
Porto Alegre, fevereiro de 2008 
Ética e animais - Reflexões 
desde o imperativo da alteridade 
Ricardo Timm de Souza 
Filósofo e ensaísta. Doutor em filosofia pela Universidade de Frtiburg, Alemanha. 
Autor de 16 livros e cerca de 90 mtigos, capítulos de livros e outras publicações 
organizadas. Atual111tnte Professor da PUCRS, nos Programas de Pós-Graduação tm 
Filosofia, Ciências Criminais e Medicina e Ciências da Saúde. 
Sumário: ! Introdução - li Da diferença à objetificação - a) No princípio era 
a diferença - b) O primeiro passo do processo de objetificação/superação 
da diferença: sobre Ser e Não-ser - c) O segundo passo na superação da 
diferença: a espacialização da temporalidade - d) O terceiro passo na 
superação da diferença: a objetificação intelectual-neutralizante do real 
Ili Da neutralização da diferença à dignidade da alteridade - a) Pó e cinzas 
- b) Crises, arqueologias e novas descobertas: finitude e temporalidade - e) 
A reafirmação da dignidade da Alteridade - IV A Alteridade dos animais -
Referências
Die Philosophie ist eigenJlich daz.u da, das ei111.uliisen, 
was im Bliclr. eines Tieres liegt 
(ADORNO, Theodo1: ApudJÃGER, Lorenz.Adomo 
- Eine poütische biographie, p. 11) 1 
' Optamos pela seguinte tradução: "A filosofia existe propriamente par• f� ,ustiçi iO 
que se dá no olhar de um animal". 
Wk mum“ u ._'.\ uwvoi R-\ m Minimos
_, . A} >\ ital-pm mi ,JfiuALQi‘MRLS'
I Introduga'o
Afiusc de Adorno cm cpigi‘ale‘ miduz S.‘llllllllilllt‘alllCllte
uma dimensiio dc clurilimga‘o dos ierinos em que a leinntica
da irlaga’o emit? a éllCil c 05 llllllllillS sc‘ coloca a purlir (1e
para‘nietms da élica da alteridade e uma oulra dimensa’o,
poderiznnos Chaim-la abixsul. demincizukmi (la complexi-
dade d1. questa‘o que pit‘tendemos abm‘dar apenus intro-
duloriamente no pnesente texto.~"
A primeira questa‘o que se coloca parece ser [ambém
uma das principals: alinalnquem é o auuLal‘? Esta questa’o
parece impro’pria em muitosw sentidos, pois nos acostu-
111amos.aolongo dos séculos, a rois'lfi'hzr o que estabelecemos
como comlato de nosso intelecto todo—poderoso; a pergunta
poderia soar. no ma’xiino, como “o que é um animal". E,
na'o obstante, pretendemos argumentar neste texto em favor
de uma radical reordenaga'o axiolo’gica, que estabelega os
animais como Iambe'm deposita’rios de uma estrutura correla-
cional de all/eridade irredutivel a‘ simples simetrizaga’o d0
logos classificador.
Para tamo, recorremos aqui a uma leitura de estilo
aiqueolo'gico, focando. exatamenle, a estruturaga'o do pensa-
memo classificante lo’gico/ordenador pela anulaga‘o da
1 As bases argumentanvas geiais do presente texto, que na'o sera‘o aqui referidas em detalhe
para NW 0 excesso de Citagoes‘, encontram-se especialmente em nossos Iivr05 Total/Glade
& desagregagao" Sable as fronteuas do pensamento e suas alternativas; O tempo 6 a
méquma do tempo: estudos de filosofia e po‘s-modernidade; Existéncia em decisa'o: uma
Introdugao' ao pensamemo de Franz Rosenzweig; Sujeito, ét/ca e histo'ria: Levmas, O
traumatlsmo Inflnlto e 3 (mice da filosofia ocidental; Sent/do e alten‘dade: dez ensaios
50be o lpensamento de Emmanuel Levinas; Razo'es plurals: itinera’rios da racionalidade
“109 "0 SECUIO XX: Em tame a dlferenga: aventuras da alteridade na complexudade da[culture contemAporanea e, espeaalmente, em Erica coma fundamento: uma introduga'o 3‘
Veflca contemporanea, bem corno nos amgos e capitulos ‘J‘ustlga, liberdade e alteridadeEnveumca sobreba quiesta'o da radicahdade da justiga desde o pensamento de E. Levinas",
Dletas, d, Referéncnas, ao fim do texto,
A DIGNIDADE DA WM! 05 DIREHOS mNDAMEmAis PAM MM 005 «um um DISCussAo Mittsm l 23
diferenga real. Embora tenhamos ja’ abordado este tema
em muilas oportunidades e publicado textos que representam
esta’gios de aperle'igoamento paulatino de nosso algumento,
cabc aqui i‘etonla—lo, e por uma raza’o muito simples: a espe-
cilicidade (la temzitica que aqui nos ocupa, 05 animals. Pois,
sc- 6 vei‘dade que um tal argumento pode assumir aguda
pertinéncia no que sc rcle're a" especilicidade do ser humano
— e muitas obras tém sido escritas, ncste recéni-findo século
XX, a abalizar uma tal constataga'o“ -—, bem como se é
verdade que, mutalis mutandix, a articulaga‘o geral das idéias
encontl‘a eco claro no que diz respeito a‘ realidade estética’
e as realidades ambientais" em sentido mais amplo, na‘o
menos verdade é que 0 exposto se aplica de forma cabal
aos animais, por motivos que esperamos esclarecer a0 longo
do texto e, especialmente, nas concluso'es.
II Da diferenga a‘ objetificaga‘o
Como ja’ enunciamos, a presente sega’o se inscreve em
uma linha de trabalhos ja’ antiga. Seus temas essenciais ja”
esta'o presentes em nosso artigo “Da neutralizaga‘o da dife-
renga a‘ dignidade da Alteridade: estago’es de uma histo’ria
3 Apenas como refere”ncia inicial e com o intulto de permanecermos em nosso a‘mbno
especifico de abordagem "anlropolo’glca" da questa‘o, velam-se entre oulros nossos
Fontes do humanismo Iatino: a condiga‘o humana no pensamento flloso'fico moderno e
contempora’neo, "Trés teses sobre a violéncla", "Das neue Denken und die Ermogluchung
des Friedens - Franz Rosenzweig und Emmanuel Levmas 1m Zentrum der Evalgnisse des
20‘ Jahrhunderts", "Humanismo e altendade: a filosofia frente a radicalldade do desafio
humano", "A dignidade da pessoa humana; uma visa'o contempora"nea". “No‘s e as
outros: sobre a questa‘o do humanismo, hoje", bem come 0 cla’ssmo de Levmas.
Humanismo do outro homem.
‘ No semido da nota acnma, cf. nosso Metamorfose e extmga‘o: sabre Kafka e a patologla
do tempo.
5 Cf. nossos Em torno a diferenga: aventuras da allendade na complexidade da cultma
contempora‘nea; "E’tica e amblente: por uma nova étlca ambienlal", bem come as
coleténeas Cie'ncra 9 Erica: os glandes desahos e Fenomenalogia hole m. bnoética.
bimecnologia, blopolitlca. 
24 1 
CMLOS ALBERTO MOLINARO, fERNANOA lUIZA FONTOURA OE MEOEIROS, 
INGO WOlfGANG SARlET, TIAGO fENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
multicentenária", apresentado originalmente no Colóquio 
sobre o Pensamento Judaico Contemporâneo, USP/U niver­
sidade Hebraica de Jerusalém, São Paulo, agosto de 1999, 
e publicado originalmente em Sentido e alteridade: dez ensaios 
sobre o pensamento de Emmanuel Levinas, sendo posterior­
mente revisto, desenvolvido e reapresentado sob diversos 
formatos em eventos igualmente muito diversos nas áreas 
da filosofia, da literatura e do direito; sua última retomada, 
sob enfoque bastante diverso do original, se encontra em 
nosso artigo recentemente publicado "'Pensiero debole", 
diferença e alteridade: uma releitura". 6 Tal obstinação de 
recorrência se justifica pelo simples fato de que tais temas 
essenciais se constituem, a rigor, na medula do que preten­
demos seja a nossa produção propriamente dita na área da 
filosofia, e por isso a esses temas sempre retornamos. 
a) No princípio era a diferença
Não nos parece difícilconstatar um fato histórico­
filosófico de grande significação: o índice de incisividade e 
perenidade crítica de uma escola filosófica pode ser aqui­
latado, em boa medida, pela seriedade com que tal escola 
trata do tema da "diferença", aqui entendida inicialmente 
em sentido lato. Autores e escolas que trataram deste a ssunto 
como se fosse um conceito operativo entre outros, redutível 
a uma lógica privada ou a um conjunto de procedimentos 
intelectuais, tendem a ser esquecidos rapidamente quando 
do advento de modelos mais vigorosos de reflexão filosófica; 
autores e escolas que abordaram tal temática com extrema 
• 1n: Alceu - Revista de Comunicação, Cultura e Polftica. Rio de Janeiro, v. 7, p. 254-273. 
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS fUNDAMENlAJS PARA AÚM DOS HUMANOS UMA DISCUSSÃO NECES5ÁIUA 1 2 5 
seriedade e cuidado (ou melhor, que fizeram de tal temática, 
de certo modo, o motor de suas construções intelectuais)­
como é o caso paradigmático do pensamento kantiano ou 
da filosofia sistemática hegeliana - perduram muito além 
de sua mera circunscrição histórica, renascendo sempre pela 
força do real a que se vertem. 
Por outro lado, haverá, na filosofia mais recente, uma 
palavra tão maltratada como "diferença"? Sua redescoberta 
como ponto de torção racional explícito levou, em muitos 
momentos, a uma verdadeira folclorização deste conceito. 
Seu poder filosoficamente crítico, levado a patamares inusi­
tados justamente por Hegel, 7 viu-se em muitos momentos 
do século XX - e não por culpa de seus detratores, mas 
primariamente de seus admiradores - reduzido a níveis 
de inofensividade inéditos, dolorosamente contrastantes 
com o que acontecia em outros campos da cultura. 8 Todavia, 
a marca heideggeriana insuflou-se indelevelmente nos 
autores de estilo mais fenomenológico de escrita. A percepção 
posterior de que a différance derridiana inaugura uma nova 
chave interpretativa para o tema que corre pari passu com 
os temas da exterioridade e da alteridade em Levinas, esta 
percepção não é absolutamente de domínio comum. O 
resultado é conhecido: "diferença", termo mal-compreen­
dido e maltratado, estandarte proclamado de um ou de 
muitos estilos filosóficos, não diz mais aos contemporâneos 
aquilo que parecia sugerir originalmente, antes de sua procla­
mação. A maldição do banal o atingiu. 
7 Cf. nosso Sentidos do infinito: a categoria "infinito" nas origens da rac10nalidade ocidental. 
dos pré-socráticos a Hegel, p. 87 -114. 
8 Para um estudo mais detalhado deste tema, d. nosso já citado ·o século XX e ;i desag� 
da totalidade". bem como nossa "Introdução" a SOUZA. Fontes do humanismo latino: a 
condição humana no pensamento filosófico moderno e contempor1neo. 
26 1 CARLOI 
ALBERTO MOUNARO. FERNANDA LUIZA fONTOURA OE MEDEIROS, 
INGO WOLfGANG IARLET. TIAGO fENSTERSElfER (ORGANIZADORES) 
Mas, não obstante, o pensamento ocidental se esuutura, 
desde os seus primórdios, exatamente em torno à questão 
da diferença. É em torno a este núcleo referencial que os 
grandes problemas clássicos da filosofia, ou seja, o que 
conhecemos normalmente como raiz do pensamento oci­
dental logocentrado (o termo não tem aqui, absolutamente, 
conotação depreciativa, apenas constatativa) se articulam e 
amadurecem enquanto, exatamente, problemas fundamentais: 
particular versus universal, necessário versus contingente, 
finito versus infinito, sensível versus racional, alma versus 
corpo, chaos versus koS?nos -as dualidades opostas são infindas 
e remetem, em última análise, sempre ao mesmo problema 
anterior que as gera: à questão da não-unidade - da diferença 
- da realidade com relação a si mesma. Houvesse tudo em
tudo, e o resultado seria a onisciência e a dispensabilidade
do pensar; mas é porque há desvãos, desencontros e
desencaixes na estrutura do real (seja esta qual for, porque a
concepção de realidade se articula justamente em tomo a estes
desencontros, desvãos e desencaixes), que o pensamento se
gera, e se gera como urgência, mgência de índole cognoscente­
classificatória, e isso já desde sua mais remota origem, referida
ao "desencontro" pré-original entre ser e pensar. Contraria­
mente ao senso comum filosófico, cumpre-nos ressaltar
aqui com todas as letras: no início, não é o verbo Ser -
muito menos a unidade-, mas os desencontros que o verbo
Ser tenta de algum modo identificar, retraindo ao presente
de (seu indicativo verbal: o verdadeiro Leitmotiv do logos. Se
"isso" fosse desde sempre apenas "isso" - {X = X}, uma
afirmatividade absoluta, auto-identificante e finalmente
tautológica-, não teríamos provavelmente filosofia alguma,
pois a tautologia perfeita desaparece em si mesma e para si
mesma inclusive enquanto problema, entendendo-se como
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALÉM DOS HUMANOS: UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 1 2] 
identidade original e originante;9 mas é porque "isso" é 
também "aquilo", ou não é somente "isso", ou deve ser 
"aquilo", ou pode ser compreendido de outra forma, ou se 
constitui em instância de uma síntese maior - {X não é Y} 
- que o pensamento cognoscente se põe em marcha em
seu processo essencialmente identificante - de forma que,
ao fim e ao cabo, "isso" "se encontra", ainda que na órbita
fechada de uma racionalidade particular, consigo mesmo.
Uma série de funções do processo de identificação, do
processo cognoscitivo, se une nesta tarefa: a localização, a
comparação, a nominalização, a determinação, enfim.
Quando, ao final de minhas análises, promulgo que "o
pinheiro é um vegetal", isso significa a culminância de um
longo e árduo itinerário. Tive de "perceber" a realidade;
destacar dali algo especial a ser "classificado"; destacar deste
"algo" o seu "conceito" (ou mesmo "construí-lo"); tive de
comparar esse "conceito" com semelhantes e dessemelhantes;
"atribuir" a esse conceito um "nome"; e, finalmente, propor
a identificação entre esse nome e o alvo de minhas atenções.
Mas, a rigor, o processo é o desdobramento de uma fórmula
mais simples. Inicia com um "o que é isso?" {X=?}; desdobra­
se em "isso pertence à classe lógica dos vegetais" {X=Y} e
desemboca na nominalização onde se pretende que a essência
ou o essencial do pinheiro seja dado, coincida com seu nome:
9 Não entraremos aqui na discussão de um outro complicador desta questão: uma vez 
afirmada a unidade absoluta na origem e que se desdobra logicamente em uma equação, 
toda diversidade lhe é posterior e subalterna e, portanto, rigorosamente dispensável, a 
não ser como combustível mental e real da tautologia. Estamos aqui não às voltas com 
uma lógica mais ou menos sofisticada de identificações e desidentificações, mas em 
face de uma sutil expressão de violência, bem traduzida por Derrida, a partir da 
identificação (x=y), como um processo de equalização e subordinação violenta de x a y. 
Neste sentido, não existe lógica, por mais formal que apareça, que não seja essencialmente 
onto-lógica, ou seja, expressão de afirmação do ser sobre o não-ser. Esta é a falácia de 
muitos modelos lógicos aparentemente vazios de conteúdo. 
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I CARLOS ALBERTO MOUNARO, FERNANDA LUIZA FONTOURA DE MEDEIROS, 28 INGO WOLIGANG SARLET. TIAGO FENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
"isso é um pinheiro", ou seja, "isso, que é identificado como 
sendo um pinheiro, é um pinheiro" {X= X}. O que aqui 
realmente nos interessa - o que esteve por trás e realmente 
sustenta todo esse procedimento - é um processo ulentificante. 
E esse processo identificante consiste justamente na tentativa 
de retirar da diferença seu caráter, exatamente, de" diferente" 
enquanto tal, transmutando-a em diferença lógica, ou seja, 
em uma espécie de combustível da máquina identificante 
do pensamento. E é interessante notar que tal dado é comum 
a todas as grandes lógicas ocidentais clássicas, sejam de índole 
formal, sejam de teor dialético. No primeiro campo, temos 
a articulação da variedade do mundo em torno a uma ref e­
rência significante que lhe dá sentido: o verbo Ser,a presença 
do real em tomo às definições da possibilidade de o real ser, 
exatamente, real. No segundo caso, a diferença - a negação 
- assume uma posição mais consistente, é levada pretensa­
mente "mais a sério"; mas, pela sua própria dinâmica, a
dialética não cessa, seguindo adiante na direção de uma
AufhelJung ou sín-tese que, contendo embora a diferença, não
a trata como tal, mas como momento dialético a ser ultrapas­
sado no momento seguinte que é, de uma ou outra forma,
re-identificante. Não podemos deixar aqui de apontar que a
Dialética Negativa é uma tentativa extrema e refinadíssima
de deter esta compulsão à identidade, este delírio totalizante,
que afeta o cerne do movimento que leva a diferença ontolo­
gicamente a sério; 10 sua grandeza consiste em permanecer
ela mesma exatamente pela negação factual de sua estrutura
lógica, se quisermos levar a sério o esforço adorniano. 11 
'º CI. SOUz_A. Estética e restos da história. ln: SOUZA. Totalidade & desagregaçtJo: sobre 
as fronteiras do pensamento e suas alternativas. op. cit., p. 40-46. 
II Cf. SOUZA. Razões plurais; itinerários da racionalidade ética no século XX - Adorno, 
Bergson, Derrida, Levinas, Rosenzvveig, p. 93-126. 
A OIGNIDAOE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PAAA AÚM DOS HUMANOS UMA DISCUSSÃO NECESSÁJ!IA 1 29 
Assim, podemos propor tranqüilamente que a diferença 
é a questão propriamente dita do pensar; é sua condição, como 
é o impedimento de sua completação, pelo fato de ser, desde 
sempre, o seu Outro. A questão da diferença é a provocação 
a um processo de compreensão do "todo", ao mesmo tempo 
em que bloqueia, por sua recorrência incômoda e indecli­
nável, qualquer invectiva de universalização totalizante. É 
por isso que o pensamento - e a filosofia, enquanto deter­
minada forma de organização do pensamento - tem de se 
ver continuamente confrontado com o problema das origens, 
dos fundamentos, dos pressupostos, antes de se preocupar 
com as conseqüências e com os sistemas, mesmo satendo 
que nunca chegará totalmente às origens, aos fundamentos 
e aos pressupostos. É por isso, também, que o pensar é uma 
tarefa infinita, uma arqueologia interminável, e tem de 
necessariamente reiniciar a cada momento: tal é explícito 
no filosofar ocidental, quando se percebe, por exemplo, 
que para além de suas diferenças de encaminhamento da 
questão, Parmênides e Heráclito, Platão e Aristóteles e 
tantos outros exemplos de aparentes opostos intelectuais 
pensavam, no fundo, o mesmo problema, que não era, a rigo1� 
senão o problema do mesmo, ou seja, o problema do Ser: a 
solução da questão da diferença, como veremos adiante de 
forma mais detalhada. Para além de qualquer fabulação ou 
imaginação, antes de toda síntese e organização mental, 
dá-se a diferença: este fato é tão real aqui e agora, nesse 
exato momento, como o foi para o primeiro pensador que 
percebeu sua não-coincidência com o que não era ele, e 
entendeu, segundo sua cosmovisão particular, a necessi­
dade de superar tal não-coincidência corno condição ou 
realização do processo compreensivo do real enquanto tal. 
Superar a diferença é o ato fundante que se concebe, muito 
RNANDA LUIZA FONT
OURA OE MEDEIROS, 
I 
c;AAlOS ALBERTO MOU
NARiÂ6� FENSTERSEIFER (ORGANIZAD
ORES) 
30 1Nc;O \\'OLIGANG \
ARLET. 
no movente do grande projeto dot ramente, co1 prema u ente como a base da possibilidade de seensamento cognosc 
, . . . . P , . ndição de intehgibihdade
 do real.
ensar a propna co p 
· · portanto
 historicamente, o processo deI01oa-se, ' . 
- api·opriativa" da diferença, ou seJa, de sua"compreensao . _ 
· 
- ma ordem maior de sentidos que compoe asmtegraçao a u 
diversas formas de avançar do pensame
nto que pretende
conhecer. Tal não se dá por uma escolha con
sciente de
algum gênio isolado, mas por um an�anjo pré-origi
nal d?
que se considera implicitamente condição de todo conheci­
mento: identificar o conhecido consigo mesmo, chegar ao
real desde dentro dele mesmo . 
Constituir-se-á originalmente o corpo hegemônico da
filosofia ocidental, em suas grandes linhas, por este viés? 
Provavelmente. As questões originais que a tradição nos 
lega, ainda que fragmentariamente, bem o sugerem; as 
partículas de poemas cosmológicos, as obscuridades e clarezas 
dos antigos assumem essa tonalidade inquieta. Logo se 
propõem um antes e um além do visível; à sua procura se
�edi�am as mentes mais agudas. Caminha-se por sobre a
mqmetude do dado da diferença; mas esta inquietude é a
base que segundo A • • • , . ' a convergencia das energias umficantes, e preC1so superar- , , . • . • e necessano chegar à sabedoria, superaras aparenc1as ab d . ' or ar solidamente o existente afrontar evencer a mseguran 
-
. . 
, . 
da mulu· 1 .. d 
ça das nao-comcidências, do umversop ICI ade.
Alguns passos sã , . 
, 
. 
Para os fin d 
o, porem, previamente necessanos.s esta refl -dualidade or· . 1 
exao, basta-nos destacar três: a
1. igma ser/não- " . . -
ra idade e a ob· ifi 
ser, a espaciahzaçao" da tempo-, �et icação .que e alvo da. . mtelectual-neutralizante do dad
o
s energia fil apresenta corn 
s 1 osóficas ou se1a do que seo real ao · ' J ' intelecto cognoscente.
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PAM AL' 
1 
,M DOS HUMANOS. UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 31 
b) O primeiro passo do processo de objetificação/
superação da diferença: sobre Ser e Não-ser
Aconseqüência da percepção de uma "situação original", 
na qu�l se ancora a possibilidade de o ser humano perceber
a realidade com sentido, é que nada se pode perceber de 
"humano" que não esteja afetado por este "estar situado". 
Tal é válido também para as comunidades humanas grandes 
e pequenas, articuladas em coletividade de sentido, e que 
são, em realidade, pluralidade de mundos em íntima inter­
penetração. Compartilhamos assim a tese de que, antes que 
um povo ou conjunto de povos pense em expressar suas 
vivências originais em termos poéticos, literários ou filo­
sóficos, estas não somente já existem desde há muito, como 
assentam sobre bases de difícil -ou, praticamente, impos­
sível- intelecção por parte deles mesmos e para os pósteros. 
Ninguém - e aqui se inclui a totalidade das culturas -
atinge a plenitude de seus pressupostos, ninguém capta o 
estertor original que dá origem à vida ou a inspiração prévia 
a toda expiração. Estes pressupostos são mais antigos que 
sua expressão, mais fundamentais que qualquer materiali­
zação ulterior, realidade prévia a toda realidade posterior, 
base possível de todo pensamento. 
Qual seria, então, a cosmovisão geral ou pos1çao 
originária que se expressa e se desdobra pela árdua via do 
logos ocidental? Trata-se de uma determinada instalação
original no mundo, de uma determinada concepçã-0 de realitkule
prévia a todas as outras, e que as outras, suas herdeiras,
hão de tentar compreender e criticar. Esta realidade toma
forma, por vez primeira, na articulação de uma determinada
linguagem como expressão de racionalidade. . 
Esta posição originária se trad�z pela m�ençao de
penetração unívoca, racional, na realidade. A ling
uagem 
32 1 
CARLOS AlBERTO MOllNARO. FERNANDA LUIZA FONIOURA OE MEDEIROS, 
1NGO WOLIGANG IARUT, TIAGO FENITERIEIFER (ORGANIZADORES) 
grega, bela tradução desta origem no passado e inspiradora 
de inúmeras linguagens futuras, tem no verbo Ser sua 
essência mais profunda, o essencial de sua autocompreensão. 
No verbo Ser cruzam-se todos os sentidos e suas possibili­
dades, estabelece-se de forma definitiva a forma equacional 
já examinada {X = Y}, isto é aquilo, o cavalo é um animal, 
o homem é um animal racional e político. Antes de ser
racional ou político, o homem é alguma coisa, e antes de
ser alguma coisa "específica", tem de já "ser" alguma coisa
prévia à própria especificação, por habitar desde sempre o
verb o "ser" - nisto coincidem os mais antigos metafísicos
com os mais recentes filósofos da Fundamentalontologie. É
na igualdade, na equalização do diferente, no processo
dinâmico desta equalização de uma vez para sempre, que
repousaa segurança do logos. É ali que o logos encontra sua
origem, como Ulisses, metáfora logocêntrica por excelência,
reencontrou sua pátria. Este é o parentesco original de todo
realismo com todo o idealismo: um não pode conceber-se,
em última análise, sem o outro. A intimidade mais pro­
funda da lógica grega, determinativa, tem seu peso, seu
sentido mais próprio, na conexão dos particulares: tudo é
importante na equação, mas ainda mais importante é a
marca, o sinal de equalização traduzidos pelo verbo Ser, pois
ali repousa, em última análise, o peso da realidade para o
logos. A lógica grega é enunciativa, vive de seus enunciados,
pais de toda concepção de ciência até algumas reviravoltas
contemporâneas ainda não bem compreendidas nem
assimiladas pela ortodoxia bem-pensante. Sua preocupação
pela precisão é a preocupação por sua vocação maior.
A 
,
linguagem grega enunciativa pressupõe assim, a
be�_ate mesmo de sua autocompreensão, uma espécie de
solulão ou solip · · · z sismo origina , a pretensão intelectual a uma
A DIGNIDADE DA VIDA E 01 DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALtM DOS HUMANOS UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 1 3 3 
unívocidade perfeita de sentido, atualizada ou em potência. 
A razão, como expressará a mentalidade moderna, tem de 
ser urna só; pois o contrário seria compatível com a multipli­
cidade de sentidos, e o sentido está dado, de uma vez para 
sempre, na expressão da igualdade "equacional", no verbo 
Ser. Algo é, ou não é: tertium non datur- eis a regra original, 
da qual dependem todas as outras da lógica de origem 
grega, inclusive, como já sugerimos, a lógica dialética. O 
enunciado da razão como razão é a equação do verbo ser: a 
igualdade redentora afasta da razão o perigo do diferente 
dela, ou seja, do tempo e da multiplicidade real. 
Eis, portanto, um primeiro passo fundamental e 
grandioso no processo de domesticação da diferença: sua 
subordinação a uma determinada lógica e linguagem que, 
ao se propor como única possibilidade (ou como "verda­
deira" possibilidade, o que, na órbita de sentido de uma 
verdade solitária, vêm a ser categorias mutuamente conver­
síveis) de abordagem do real, transborda ontologicamente 
de si mesma e determina também o não-ser, ou seja, o irreal.
É nisto que, como já sugerimos, Parmên·ides e Heráclito, 
quase sempre apresentados como "adversários", concordam 
definitivamente, e concordam ainda antes que esta inspi­
ração original possa se conformar em qualquer tipo de 
organização lógica. E é nisto também que concordarão a 
imensa maioria dos múltiplos pares digladiantes da história 
da filosofia greco-ocidental, tais como resgatados pelo senso 
comum histórico-filosófico. 
e) O segundo passo na superação da diferença: a
espacialização da temporalidade
Porém, de nada adiantariam tais esforços lógicos 
se, no âmbito de um universo mental, a temporalidade 
fERNANDA LUIZA fONTOURA DE M
EDEIROS, 
I 
CAALOI ALB(RTO MOU
NAAO,GO fENITERSElfER (ORGANIZADORES) 
3 4 INGO WOU-GANG 
SARLH TIA 
. tinuasse a ocorrer pelas bordas dos sistemassimplesmente con . 
· . · sofisticados que estes seJam. E a tempora-lógicos, po1 mais . . 
d Sa-0 da diferença dá-se ongmalmente comolida e, expres ' . 
fundamento de toda inquietação filosófica, amda que sob
nomes os mais diversos: finitude, contingência, acidente,
mundo empírico, etc. - e, até mesmo, exatamente, diferença,
como em Rosenzweig. Há, portanto, com relação à tempo­
ralidade, de neutralizá-la; caso contrário, cada categoria 
lógica teria de ser reinventada a cada passo, para repor na 
ordem plenamente inteligível da realidade do ser aquilo 
que o tempo acaba de corroer. A unívocidade do conceito 
estaria perdida, e cada generalização, indução ou dedução 
estaria condenada a priori ao fracasso. 
Esta neutralização, porém, não pode padecer de 
ingenuidade, pois o poder desagregador da temporalidade 
real é imenso . .P-ara tratar desta questão são, portanto, mobi­
lizadas grandiosas potências racionais; e uma das primeiras
s�l���es, e das mais clássicas, procura equiparar a não­V1S1b1l'.dade do tempo à visibilidade do espaço, "logicizando"espacialmente a primeira: quando se pensa em termos dese c · · onstituir o tempo na medida do movimento, pensa-seexatamente em subordinar o que não se dá no espaçoenquanto cate · , · gona aquilo que se dá neste espaço; e,portanto avança d 'd 'd 
d , 
' -se en 1 amente no controle do impon·eravel desagrega t . n e, ma111etando-o à controlabilidade deuma rede de conce· 
de mais d d . .
1�0s_. E pode-se perceber que, ao longo e o1s m1Ien d uma das qu t - . 
ios e pensamento filosófico, esta ees oes mais re d metade do , 1 
correntes, pelo menos até a segun a. secu o XIX· intemporalid d 
. como transformar o tempo em. a e, para neut 1· , s1vos das cert ra 1za-lo em seus efeitos corro-. ezas conceptu . ;i , . , . do estilo cont , ais . Esta e a demarcação do mIClOemporaneo d fil e I osofar: quando a percepçao
A DIGNIDADE DA VIDA E 01 DIREITOS fUNDAMENTAJI PARA ALÉM 001 HUMANOS. UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 1 3 5 
de que a temporalidade "existe" é inelutável na raiz do 
próprio pensar, e a questão acima se dilui no imponderável 
e na inquietude da contemporaneidade, esta crise na qual
ainda vivemos.12 
Assim, em termos práticos, o tempo que penetra até 
mesmo a equação do verbo Ser é congelado no verbo Ser. 
A rigor, não existem propriamente o passado e o futuro, 
exceto como antevisão e celebração da conquista do Ser. 
No presente do "é", o passado e o futuro deixam de assustar: 
encontraram-se a si mesmos, neutralizando-se mutuamente. 
Não necessitam colocar-se como alternativas p rospectivas 
ou retrospectivas de realidade, pois a realidade está já 
resolvida na fixação de alguma espécie de presente eterno 
ao qual o logos, a iluminação, tem acesso completo. Na 
construção pré-socrática, na platônica com suas "idealidades 
realistas" ou na aristotélica com seu "empirismo" que deriva 
em metafísica, e em todas as suas derivações, inclusive nos 
processos modernos de subjetivação propedêutica ou.ra
dical
(inclusive em sua inversão em "objetivação" radICal �o 
idealismo absoluto) - em cada instância, a preocupaçao 
"determinativa" é, em análise derradeira, a mesma.13 
Mas O que "determina" praticamente e�ta linguage�
ao mundo que a utiliza? Desde a perspectlva dafixaç�o
do correr do tempo no espaço próprio do presente, sao
t, ·s ao menos duas grandes características, que sepercep 1ve1 . _ . . _ . 
t 1 também como dnnensoes de mterp1etaçao. apresen an 
- . sobre as fronteiras do pensamento e suas 12 Cf. SOUZA. Totalidade & desagregaçao. 
alternativas, p. 15-29. 
. . . . ria "infinito" nas origens da racionalid
ade 
" Cf SOUZA. Sentidos do ,nf,n1to. a cat
ego 
ocidental, dos pré-socráticos a Hegel. 
I CARLOS AlBERTO MOUNARO. fERNANDA lUIZA FONTOURA DE MEDEIROS, 36 iNGOWOOGANG SARlET. TIAGO fENSTERSElfER (ORGANIZADORES) 
a) Em primeiro luga1� uma espécie de explícita dualida.de
definidora estabelecida na antropologia, já antes
sugerida em termos categoriais, que não se opõe,
mas antes remete, no fundo, a um monismo radical
implícito: o monismo do Ser. A realidade está cindida
em dois níveis de difícil aproximação: o empírico,
a doxa, o corrnptível, o impuro, o plural, o temporal,
e a dimensão da felicidade ideal, a episteme, racional,
metaempírica, incorruptível, transcendental, "para
além das aparências", pura, singula1� atemporal.
Mas esta cisão também pertence ao mundo das
aparências,já que, em verdade, somente a realidade
atemporal é, conforme vimos, legitimamente real para
esta concepção de realidade. A vita activa, com seus
percalços e inconstâncias, não participa da realidade
plena da contemplação atemporal das essências. O
Bem residiria na atemporalidade da Totalidade de
sentido do verbo Ser, "presente eterno", totalidade
esta que se encontrou consigo mesma: eis o mote
de fundo, "inconsciente", a anterioridade da deter­
minação de realidade do mundo. 
b) Em segundo lugai� e como conseqüência da concepção 
de atemporalidade atribuída à realidade plena,
percebe-sea radical anti-historicidade que habita esta
concepção de verdadeira realidade. A história do
desdobramento do logos, apesar das aparências ern
contrário, é uma anti-história - uma espécie de
história "endógena"-, porque é afinal de contas
um encontro consigo mesmo. Mais uma vez, Ulisses
nos esclarece isso. Sua aventura tem como ultima
ratio a finalidade do retomo à sua pátria, a si mesrn°·
A mutabilidade que caracteriza a história aberta -
O tempo como condição de efetivação da realidade,
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALÉM 001 HUMANOS UMA DISCUISÁO NEaSIÁAJA 1 3 7 
a possibilidade do novo - é, na verdade, um 
desembocadouro do incontrolável, e, portanto, um 
escândalo para qualquer constelação bem-arranjada 
de conceitos. É neste sentido que a temporalidade 
é a expressão última e mais aguda da negatividade 
enquanto tal, e dela não se pode prescindir em 
qualquer crítica à Totalidade ontológica. 
A anti-historicidade se expressa especialmente na 
redução do imprevisível à inofensibilidade. A cosmovisão 
original anti-histórica tenderá mais tarde, em seus desdo­
bramentos modernos, a subsumir o particular, o propriamente 
concreto da história, no universal e abstrato do Espírito e 
da Totalidade - tarefa empreendida por Hegel com tanto 
brilhantismo, e que dará a Benjamin, na intuição do movi­
mento contrário, oportunidade para tanto trabalho. 14 
d) O terceiro passo na superação da diferença: a
objetificação intelectual-neutralizante do real
Ainda um terceiro elemento é fundamental no processo 
de inofensibilização da diferença: trata-se da neutralização 
do real através do crivo neutralizante do objetivismo inte­
lectual, ao qual chamamos, neste contexto, de "objetificação". 
E não falamos, aqui, de um "objetivismo" que meramente 
se oponha a um "subjetivismo", ou de algum tipo de positi­
vismo ingênuo, mas de algo mais profundo, que remete às 
origens do fluxo identificante que tem como resultado a 
articulação lógica intemporal da realidade à qual já fizemos 
referência. E esta é a dimensão que, em nossa discussão 
relacionando o tema da ética com o dos animais, assume 
uma importância singular. 
,. Cf. BENJAMIN. Teses sobre o conceito de história. ln: BENJAMIN. Obras escolhidas. 
FERNANDA LUIZA fONTOURA OE MEDEIROS, 
38 1 (ARIOS ALBERTO MOU���GD f!NSITRSEIFER (ORGANIZADORES) ING
O 
WOtJGANG SARL , 
Em p oucas palavras, o que aqui chamamos de"objetificação" se constitui, exatamente,
. 
�o co_ajunto dosprocessos maiores, chanceladores da leg1t1maçao dos pro­cessos parciais aos quais denominamos anteriormente"autopostulação da identidade" e "espacialização da tempo­ralidade". Ou seja: a objetificação é a forma de emprestarlegitimidade às lógicas da postulação absoluta do serenquanto realidade e da temporalidade enquanto não maisque "pré-realidade", lógicas estas que, como vimos, têmcomo impulso inicial e objetivo final despojar a diferençade seu� elementos desagregantes originais: inofensibilizara altendade. As variadas formas de como tal processo setem dado ao longo da história do pensamento desembocamtodas neste mesmo d d d . esagua ouro a pretensa naturalidade,que faz com que em d , . • ca a epoca, se tenha categonas-chavespara entender e 1 · t' d d "d d'c . 
eg, 1mar ca a passo deste grande processoe es- 1terennaç · " ao , categonas estas tratadas geralmentecomo sagradas ou i t , . quadro 1 1 
n ocave,s. E apenas quando u m grandecu tura entra em . em dúvida· . . cnse que esta sacralidade é posta, e, tmed1atament . 1 · • . . 
-
d 
wande irnpul e, a mte 1genc1a guard ia oso neutraJi 1 . no campo d . 
• 
. zante ocahza uma substituta à altura,. as c1enc1as d intelectuais O ou os grandes sistemas políticos eve , . grande horror d . • . . 1 , 
r as voltas co a consc1enc1a oCidenta e sem ª realidad que a própria cu] e sem as chaves compreensivastura re · , exemplo, com a cat . 
ena constantemente. E assim, porment · egona de "'nfi · ,, O trazia em b . 1 mtto ; enquanto tal pensa-troláv I seu ºJo um d . . . 
e , se lhe tinh po er de mqu1etação mcon-geraJ a repug • . " , Pensavain d d 
nanCia - os gregos de modocosino" es e O 
' 
u"' . 'enquanto O i)' . Ponto de vista da ordem, do"'ª tnstâ · imitado , · 
ncia de esc' d . 
' 0 apezron, permanecia como� an alo, t I . (f nos"'-;---.....___ 
n e ectual. 15 Foi apenas bemnosso Sent,d OC1den1ai d os do inr; , os Pré- lnflo: a SOcráticos categoria "i fi . .. . ª Hegel. n mito nas origens da racionalidade 
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALÉM DOS HUMANOS UMA Dt5CUSSÃO NECESSÁRIA 1 3 9 
mais tarde, nos inícios da modernidade, que se pôde afi rmara infinitude do universo sem temor do descontrole "caótico"(dos antigos) ou da alteridade absoluta divina (dos medjevajs);e é exatamente este o momento em que inicia propriamentea modernidade. 
Assim, a "objetificação-neutraljzação" é o próprio exer­
cício da inteligência, enquanto este exercício visa a preservação
de sua segurança original: sua referencialidade em torno
ao núcleo auto e heteroidentificante. É por isso que se tem 
considerado tradicionalmente a inteligência como avessa a 
condicionalidades que atenuam sua agudeza identificante.
Ili Da neutralização da diferença à dignidade da
alteridade 
a) Pó e cinzas
Ap6s ela (a filosofia) haver recolhido 
tudo em si ... 0 ser humano descobre 
subitamente que ele ... ainda está aqui ... 
Eu, p6 e cinzas, eu ainda estou aqui. 
(ROSENZWEIG, Franz. Zweistromland - Kleine-re
Schriften ztt Glauben und Denken, p. 359) 
Três "passos", na verdade dimensões interpe�etrantes d mo grande "movimento", foram anteriormente e um mes ... 'd "definição definitiva" da imposs1b 1hdade do sugen os: a _ diferente do sei� ou melhor, do diferente que ser; a ob�essao 
I d -0 da temporalidade incontrolável e sua mcor-pe a etença 
. .. l" 
- uma espacialidade cósmica ou lógica controláve ; poraçao em . . _ . . . fi las quais tais obJellvos sao aung1dos, ou SeJa, e as ormas pe _ · d d "chancela neutralizante" que se apoem a tat os mo os e 
- - d cor . ta e que pretendem, com isso, a ev1taçao a re -conqms s . . .. ,, do arência da situação mais ongmaJ de caos , quan 
40 1 
CARLOS ALBERTO MOUNARO, FERNANDA LUIZA fONTOURA DE MEDEIROS, INGO WOLFGANG SARLET. TIAGO fENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
diferença era real e não apenas lógica e metodológ· C 
. 
. 
. 1ca. ornisso, toda realidade nada mais é do que uma quest-" h 
. 
" 
h . ao de con ec1mento , e con ec1mento organizado. em torno àprocura daqmlo que temos chamado de "verdad 1 · , · - . e so Jtana",a correlaçao entre um mtelecto cognoscente e um "ob'eto"de sua atenção cognitiva. � 
Sintetizemos, portanto, o até aqui exposto: 
1.? �ode�o ocidental de pensamento, sua dinâmica,eJaex origine um g d d . ran e arco e poderosa afirmati-vidade, provocado 1 e: . . pe O rato ongmante de que antesde tudo, dá-se d · fi fil ª 1 erença: todo pensamento toda1 osofia, toda ciê · � , . 
' 
O l 
ncia tem a1 sua ongem mais remota.ogos tem aí se , . bi u unico e real problema, o pro-ema em relação uma a· _ 
ao qual todos os outros assumemimensao sec d , . que part . . 
un ana, e a inteligência comoe1med1atam (ainda) in 
, 
. ente para a conquista desta terracognua 2 · Tal se dá ao 1 · , ongo d t ticação da 1 
° empo, pela paulatina domes-que es ele . no grand mentos que podem introduzn�, e corpo d h . duvida· 0 ° con ec1mento a sombra da· extra 1 ' extrapolar d 
po ar de categorias - "não-ser"; oacontrol b·1· e desagreg ª 1 idade - o tempo que passal' a o tod . . . 1dade" norm 
o, e o extrapolar da "intelig1b1-do ai - alg · conhecim O que, atraindo as energiasPo ·b. . ento, dá-ssi Ihdade se por fora ou para além dass Puras d ;;;-_--.____ 0 conhecimento. 16 - t. importa� de a, nte que s 
em e 9urne ntaçào n: P
erceba que hnh 
Ontraponto ª0 Subsurn 
n.os é Perfeita . · a ª determina ª esta Qrand 
e as infinitas . rnente claro que esta linha simplificadas Variações nad
nte da civili,aç: 
dinàrnica· rn
vªa"ªntes que, a cada passo se estabelecem a rn · • ao · · s o • 
deª
1ssão do 
ocidental é a a _qu
e se quer destacar é que a gran que desvios 
cirna exposta para a qual i·ustamente, neces · 
' 
sitados de correção. 
A DIGNIDADE DA VIDA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALÉM DOS 
I
HUMANOS UMA DISCUSSÃO NECESSÁRIA 41 
As últimas energias positivadas deste espírito identificantese dão, na forma exposta, à época dos grandes sistemastotalizantes do pensamento - até pelo menos meados doséculo XIX. É a partir daí que um grande processo decorrosão interna tem origem.17 E se o logos se traduz emhabilidade extrema na dimensão que identifica as diferenças"externas", tal não se dá no que se refere aos grandes pro­blemas internos da cultura na qual se move; e o problemaque então se propõe é de tal ordem que a totalidade demecanismos legitimadores da positividade da procura écolocada em questão. A partir da segunda metade do século
XIX, pelo menos, o grande problema já se conforma inequi­
vocamente: dá-se a percepção de que, a um Eu claro e
distinto, contrapõem-se os "eus" sombrios e indistintos, 
atuantes do psiquismo "subterrâneo"; a uma compreensão 
essencialista e formal da realidade, contrapõe-se uma visão 
"evolutiva", onde o tempo, por tantos séculos recalcado, 
faz sua reentrada triunfal; a uma matemática "natural", a 
uma geometria intuitiva, contrapõem-se geometrias "arti­
ficiais", que nem por isso têm menos validade matemática 
do que a euclidiana; a uma música tonal, e, portanto, 
formalmente controlável a priori, contrapõe-se o princípio 
de desagregação da tonalidade, que conduzirá fatalmente 
a sendas desconhecidas; a uma arte figurativa "realista", 
contrapõem-se uma multiplicidade de estilos, que_ c�iamrealidades diferentes daquelas retratadas pela trad1çao; a 
uma literatura formalmente bem-comportada, propõe-se 
uma constmção literária infinitamente variável; a uma ciência 
b · da contrapõe-se uma "ciência" essencialmenteem-orgamza , 
l.d d, & desagregaçáo· sobre as fronteiras do pensamento e suas " Cf. SOUZA. Tota r a e 
alternativas, p. 15-29. 
42 1 
ANDA LUIZA FONTOURA DE 
MEDEIROS. 
CARLOS ALBERT
O MOUNAAO. ��
R
�ENSTERSEIFER (ORGANIZADO
RES) 
INGO WOtlGANG SARLH. TI
A 
. · d Tudo parece fugir ao controle: espaço paramdetermma a. 
· to do grande Medo. 
18 Penetra-se, de corpo eO surgimen . 
alma, na imensa crise civilizatóna na qual
 estam os mergu-
lhados. Na esteira de Rosenzweig, somos obrig ados a
constatar: filosofias surgiram, filosofias desapareceram e 
nós, "pó e cinzas", (ainda) estamos aqui. Após séculos de 
otimismo e de pretensa obviedade do sentido, a questão 
do sentido dos sentidos pressupostos pela inteligência do 
real se re-propõe com inusitada violência, uma violência 
que é uma contrapartida à altura da violência identificante 
que habita a raiz da racionalidade solitária, o coração do 
logos em sua dimensão ancestral. 
b) Crises, arqueologias e novas descobertas: finitude
e temporalidade19 
As formas de resistir a tal embate são variadas; desde
O consetvadorismo filosoficamente inócuo porém cultural-mente impiedoso t' 1 · · ' · d . , a e arqueo ogias radicais em busca amelhor cncunscriç- d - . . ao a questao do sentido conforme acima sugenda e desde · '. uma vigorosa retrovisão arcaizante ate prospectivas inusit d 
nenh 
ª as no encalço do Novo. O fato é que um pensador d · d pensar· 
igno este nome, no século XX, pode ignorando esta . Totalidade d . 
situaçao de crise, de colapso de uma . e sentido A t 1. d tnunfal no · empora idade faz sua reentra acampo do , 1 possível igno , _1 . 
possive , e no século XX já não e
dº 
ra a. esta - . iscursos filosóficos 
nao-ignorância é o proprium doscontemporâneos. 
;;;:;-:::--__(! · nosso M 
" 
etamortose . Cf .. a respeito d 
e extinção: sobr no .Pensament�i�tema geral, nossos Fo
e Kafka e a patologia do tempo. 
raoonalidade éti 
sófico moderno 
ntes do humanismo latino: a condição humana ca no séc I e contemp â · da u o XX. or neo e Razões plurais: itinerários 
A DIGNIDADE DA VIDA E os DIREITOS FUNDAMENTAIS PARA ALÉM DOS HUMANOS: UMA OISCUSSÃO NEass.lJuA 1 43 
Com o Tempo, ressurge a Diferença: com o colapso 
do Conceito identificante, que retira da alteridade apenas 
e tão somente aquilo que é intelectualmente compreensível, 
reassume seu lugar a questão da Alteridade real enquanto 
dimensão que não pode ser, simplesmente, representada 
ou mesmo "intelectualizada", mas remete às profundezas 
de uma "indeterminação" original, onde nada é suficien­
temente "claro", porque a clareza não é a questão original, 
mas, exatamente, é a diferença que é a questão original. 
A percepção da radicalidade deste problema não 
escapa a alguns contados pensadores extremamente agudos: 
todos sabem que precisam se ver seriamente com este 
problema. Investem na dilatação da estrutura original de 
compreensão do real. Filósofos os mais diversos concentram 
o melhor de suas energias em torno a este problema. Suas 
soluções variadas contemplam paradoxalmente inquie­
tações de origem bastante semelhantes, que são propriamente 
as inquietações filosóficas da contemporaneidade.
20 
Conhecemos a história da filosofia contemporânea: a 
reproposição da questão original da temporalidade é com­
preendida inicialmente como finitude o� mesm� �om�
náusea, assim como a emergência da altendade ongmal e 
compreendida como negatividade;
21 n:�ª impede que s_e
consubstancie um novo terreno prop1c10 a novas cami-
nhadas e novas descobertas. . 
Na particularidade da fenomenologia e d� suas_ den-
- H l "resolve" a questão da intenc10nahdadevaçoes, usser 
intelectual, reabrindo o campo da imponderabilida
de do real;
-------. _ mpreensiva especialmente em nossos livros To
talidade &
'º Defendemos esta pos1çao 'º. . . 
desagregação ... e Sujeito, ét,ca e h1sr.
ó�1ad
.
� da percepção". ln: SOUZA. Totalidade &21 cf. nosso ensaio "Sartre e ª 
ambigu, ª 
desagregação ... , op. cit., P· 81 • 1 OO. 
I 
RLOS ALBERTO MOUNARO, FERNANOA LUIZA FONTOURA DE MEDEIROS, 
44 �GO WOlfGANG SARLET, TIAGO FENSTERSEIFER (ORGANIZADORES) 
e, como vimos, Heidegger supera a tradicional proposiçãológica da diferença " invertendo-a" e "positivando-a"enquanto diferença ontológica.22 Está refeito um terrenofilosófico que se presta a uma re-aproximação filosófica daquestão da diferença. 
e) A reafirmação da dignidade da Alteridade 
. s_uperamos, porém, a etapas das ingenuidades bem­mtenC1on�d�s_: se há uma lição que dois mil e quinhentosanos �e h1st?na e de filosofia bem nos ensinam, é a de ue pela via do mtelecto ilumi . q 'do ·1 · d 
nante, podemos ir até os limites 1 umma o pelo int I e ecto, e não mais além. 23 Se isto é oque concebemos como d . de pensar e d 
sen ° ª totalidade das possibilidadeso conceber então h limites da filosofi 
' e egamos realmente aos1a e ao fim da h · t , da primeira fras d Ã.r • 
is ona; se, porém, ao estilob e a ivegatzve D. l k .k d emos aí . 
ia e ti e Adorno perce-uma un1lateralid d . ' 
uma estranha . a e que envia por sua vez a. , e provocativa b ·d consc1encia" 24 ° scun ade, a uma "ma' a uma outra h · , · tempo da sincroni _ 
istona, a um outro tempo que oou a, entao estam I sar enfrentar . os ta vez preparados parad - o receio do d esvao, do fulcro qu ... . esencontro, do paradoxo, docone · e 10c1de" enos. Desde a . na construção do corpo dosem out Cinza da era d , ros termos fi as catastrofes, 25 estaremos,, inalment e preparados para retornar à
� máquina 
ci Husserl e Heide " Cf so 
o tempo: estud 
99er: motivações u�d E UZA. Das neue D 
os de filosofia e Pó
e arqueo-logias. ln: SOUZA. o tempo e a 16 . rnrnanuel Le . en�en Und d' s-modernidade g1ca do se . v1nas irn Ze ie Ermoglich . '' Cf. LEViNA 
ntida ao sentido �
trurn der Ereigni 
u
�g des Friedens - Franz Rosenzweig alteridade 
S. A tonsciênc· _ª lógica; Levinat
se es 20. Jahrhunderts, p. 590 ss. "Da "Cf. SELiGM 
ia "ªº·intencional 1 �
ncontra Platão, entre outros. (Org.), Catã
ANN-SILVA. Ah. 
· n. LEVINAs. Entre nós: ensaios sobre a strofe e R IStória e epresen ta 
- orna trauma I Çao, P. 73.ga. 
' n:

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