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Marilena Chaui 
 
Convite à Filosofia 
 
 Ed. Ática, São Paulo, 2000. 
Marilena Chauí 
_______________________________ 
 
 
 – 137 – 
 
Capítulo 1 
A preocupação com o conhecimento 
 
O conhecimento e os primeiros filósofos 
Quando estudamos o nascimento da Filosofia na Grécia, vimos que os primeiros 
filósofos – os pré-socráticos – dedicavam-se a um conjunto de indagações 
principais: Por que e como as coisas existem? O que é o mundo? Qual a origem 
da Natureza e quais as causas de sua transformação? Essas indagações 
colocavam no centro a pergunta: o que é o Ser? 
A palavra ser em português, traduz a palavra latina esse e a expressão grega ta 
onta. A palavra latina esse é o infinitivo de um verbo, o verbo ser. A expressão 
grega ta onta quer dizer: as coisas existentes, os entes, os seres. No singular, ta 
onta se diz to on, que é traduzida por: o ser. Os primeiros filósofos ocupavam-se 
com a origem e a ordem do mundo, o kosmos, e a filosofia nascente era uma 
cosmologia. Pouco a pouco, passou-se a indagar o que era o próprio kosmos, qual 
era o fundo eterno e imutável que permanecia sob a multiplicidade e 
transformação das coisas. Qual era e o que era o ser subjacente a todos os seres. 
Com isto, a filosofia nascente tornou-se ontologia, isto é, conhecimento ou saber 
sobre o ser. 
Por esse mesmo motivo, considera-se que os primeiros filósofos não tinham uma 
preocupação principal com o conhecimento enquanto conhecimento, isto é, não 
indagavam se podemos ou não conhecer o Ser, mas partiam da pressuposição de 
que o podemos conhecer, pois a verdade, sendo aletheia, isto é, presença e 
manifestação das coisas para os nossos sentidos e para o nosso pensamento, 
significa que o Ser está manifesto e presente para nós e, portanto, nós o podemos 
conhecer. 
Todavia, a opinião de que os primeiros filósofos não se preocupavam com nossa 
capacidade e possibilidade de conhecimento não é exata. Para tanto, basta 
levarmos em conta o fato de afirmarem que a realidade (o Ser, a Natureza) é 
racional e que a podemos conhecer porque também somos racionais; nossa razão 
é parte da racionalidade do mundo, dela participando. 
Heráclito, Parmênides e Demócrito 
Alguns exemplos indicam a existência da preocupação dos primeiros filósofos 
com o conhecimento e, aqui, tomaremos três: Heráclito de Éfeso, Parmênides de 
Eléia e Demócrito de Abdera. 
Convite à Filosofia 
_______________________________ 
 
 
 – 138 – 
Heráclito de Éfeso considerava a Natureza (o mundo, a realidade) como um 
“fluxo perpétuo ”, o escoamento contínuo dos seres em mudança perpétua. Dizia: 
“Não podemos banhar-nos duas vezes no mesmo rio, porque as águas nunca são 
as mesmas e nós nunca somos os mesmos”. Comparava o mundo à chama de 
uma vela que queima sem cessar, transformando a cera em fogo, o fogo em 
fumaça e a fumaça em ar. O dia se torna noite, o verão se torna outono, o novo 
fica velho, o quente esfria, o úmido seca, tudo se transforma no seu contrário. 
A realidade, para Heráclito, é a harmonia dos contrários, que não cessam de se 
transformar uns nos outros. Se tudo não cessa de se transformar perenemente, 
como explicar que nossa percepção nos ofereça as coisas como se fossem 
estáveis, duradouras e permanentes? Com essa pergunta o filósofo indicava a 
diferença entre o conhecimento que nossos sentidos nos oferecem e o 
conhecimento que nosso pensamento alcança, pois nossos sentidos nos oferecem 
a imagem da estabilidade e nosso pensamento alcança a verdade como mudança 
contínua. 
Parmênides de Eléia colocava-se na posição oposta à de Heráclito. Dizia que só 
podemos pensar sobre aquilo que permanece sempre idêntico a si mesmo, isto é, 
que o pensamento não pode pensar sobre as coisas que são e não são, que ora são 
de um modo e ora são de outro, que são contrárias a si mesmas e contraditórias. 
Conhecer é alcançar o idêntico, imutável. Nossos sentidos nos oferecem a 
imagem de um mundo em incessante mudança, num fluxo perpétuo, onde nada 
permanece idêntico a si mesmo: o dia vira noite, o inverno vira primavera, o doce 
se torna amargo, o pequeno vira grande, o grande diminui, o doce amarga, o 
quente esfria, o frio se aquece, o líquido vira vapor ou vira sólido. 
Como pensar o que é e o que não é ao mesmo tempo? Como pensar o instável? 
Como pensar o que se torna oposto e contrário a si mesmo? Não é possível, dizia 
Parmênides. Pensar é dizer o que um ser é em sua identidade profunda e 
permanente. Com isso, afirmava o mesmo que Heráclito – perceber e pensar são 
diferentes -, mas o dizia no sentido oposto ao de Heráclito, isto é, percebemos 
mudanças impensáveis e devemos pensar identidades imutáveis. 
Demócrito de Abdera desenvolveu uma teoria sobre o Ser ou sobre a Natureza 
conhecida com o nome de atomismo: a realidade é constituída por átomos. A 
palavra átomo tem origem grega e significa: o que não pode ser cortado ou 
dividido, isto é, a menor partícula indivisível de todas as coisas. Os seres surgem 
por composição dos átomos, transformam-se por novos arranjos dos átomos e 
morrem por separação dos átomos. 
Os átomos, para Demócrito, possuem formas e consistências diferentes 
(redondos, triangulares, lisos, duros, moles, rugosos, pontiagudos, etc.) e essas 
diferenças e os diferentes modos de combinação entre eles produzem a variedade 
de seres, suas mudanças e desaparições. Através de nossos órgãos dos sentidos, 
percebemos o quente e o frio, o doce e o amargo, o seco e o úmido, o grande e o 
Marilena Chauí 
_______________________________ 
 
 
 – 139 – 
pequeno, o duro e o mole, sabores, odores, texturas, o agradável e o 
desagradável, sentimos prazer e dor, porque percebemos os efeitos das 
combinações dos átomos que, em si mesmos, não possuem tais qualidades. 
Somente o pensamento pode conhecer os átomos, que são invisíveis para nossa 
percepção sensorial. Dessa maneira, Demócrito concordava com Heráclito e 
Parmênides em que há uma diferença entre o que conhecemos através de nossa 
percepção e o que conhecemos apenas pelo pensamento; porém, diversamente 
dos outros dois filósofos, não considerava a percepção ilusória, mas apenas um 
efeito da realidade sobre nós. O conhecimento sensorial ou sensível é tão 
verdadeiro quanto aquilo que o pensamento puro alcança, embora de uma 
verdade diferente e menos profunda ou menos relevante do que aquela alcançada 
pelo puro pensamento. 
Esses três exemplos nos mostram que, desde os seus começos, a Filosofia 
preocupou-se com o problema do conhecimento, pois sempre esteve voltada para 
a questão do verdadeiro. Desde o início, os filósofos se deram conta de que nosso 
pensamento parece seguir certas leis ou regras para conhecer as coisas e que há 
uma diferença entre perceber e pensar. Pensamos a partir do que percebemos ou 
pensamos negando o que percebemos? O pensamento continua, nega ou corrige a 
percepção? O modo como os seres nos aparecem é o modo como os seres 
realmente são? 
Sócrates e os sofistas 
Preocupações como essas levaram, na Grécia clássica, a duas atitudes filosóficas: 
a dos sofistas e a de Sócrates – com eles, os problemas do conhecimento 
tornaram-se centrais. 
Os sofistas, diante da pluralidade e do antagonismo das filosofias anteriores, ou 
dos conflitos entre as várias ontologias, concluíram que não podemos conhecer o 
Ser, mas só podemos ter opiniões subjetivas sobre a realidade. 
Por isso, para se relacionarem com o mundo e com os outros humanos, os 
homens devem valer-se de um outro instrumento – a linguagem – para persuadir 
os outros de suas próprias idéias e opiniões. A verdade é uma questão de opinião 
e de persuasão, e a linguagem é mais importante do que a percepção e o 
pensamento. 
Em contrapartida, Sócrates, distanciando-se dos primeiros filósofos e opondo-se 
aos sofistas, afirmava que a verdade pode ser conhecida, mas primeiro devemos 
afastar as ilusões dos sentidos e as das palavras ou das opiniões e alcançar a 
verdade apenas pelo pensamento. Os sentidos nos dão as aparências das coisas eas palavras, meras opiniões sobre elas. Conhecer é passar da aparência à 
essência, da opinião ao conceito, do ponto de vista individual à idéia universal de 
cada um dos seres e de cada um dos valores da vida moral e política. 
Convite à Filosofia 
_______________________________ 
 
 
 – 140 – 
Platão e Aristóteles 
Sócrates fez a Filosofia preocupar-se com nossa possibilidade de conhecer e 
indagar quais as causas das ilusões, dos erros e da mentira. No esforço para 
definir as formas de conhecer e as diferenças entre o conhecimento verdadeiro e 
a ilusão, Platão e Aristóteles introduziram na Filosofia a idéia de que existem 
diferentes maneiras de conhecer ou graus de conhecimento e que esses graus se 
distinguem pela ausência ou presença do verdadeiro, pela ausência ou presença 
do falso. 
Platão distingue quatro formas ou graus de conhecimento, que vão do grau 
inferior ao superior: crença, opinião, raciocínio e intuição intelectual. Para ele, os 
dois primeiros graus devem ser afastados da Filosofia – são conhecimentos 
ilusórios ou das aparências, como os dos prisioneiros da caverna – e somente os 
dois últimos devem ser considerados válidos. O raciocínio treina e exercita nosso 
pensamento, preparando-o para uma purificação intelectual que lhe permitirá 
alcançar uma intuição das idéias ou das essências que formam a realidade ou que 
constituem o Ser. 
Para Platão, o primeiro exemplo do conhecimento puramente intelectual e 
perfeito encontra-se na matemática, cujas idéias nada devem aos órgãos dos 
sentidos e não se reduzem a meras opiniões subjetivas. O conhecimento 
matemático seria a melhor preparação do pensamento para chegar à intuição 
intelectual das idéias verdadeiras, que constituem a verdadeira realidade. 
Platão diferencia e separa radicalmente duas formas de conhecimento: o 
conhecimento sensível (crença e opinião) e o conhecimento intelectual 
(raciocínio e intuição) afirmando que somente o segundo alcança o Ser e a 
verdade. O conhecimento sensível alcança a mera aparência das coisas, o 
conhecimento intelectual alcança a essência das coisas, as idéias. 
Aristóteles distingue sete formas ou graus de conhecimento: sensação, percepção, 
imaginação, memória, raciocínio e intuição. Para ele, ao contrário de Platão, 
nosso conhecimento vai sendo formado e enriquecido por acumulação das 
informações trazidas por todos os graus, de modo que, em lugar de uma ruptura 
entre o conhecimento sensível e o intelectual, Aristóteles estabelece uma 
continuidade entre eles. 
A separação se dá entre os seis primeiros graus e o último, ou a intuição, que é 
puramente intelectual ou um ato do pensamento puro. Essa separação, porém, 
não significa que os outros graus ofereçam conhecimentos ilusórios ou falsos e 
sim que oferecem tipos de conhecimentos diferentes, que vão de um grau menor 
a um grau maior de verdade. 
Em cada um deles temos acesso a um aspecto do Ser ou da realidade e, na 
intuição intelectual, temos o conhecimento pleno e total da realidade ou dos 
Marilena Chauí 
_______________________________ 
 
 
 – 141 – 
princípios da realidade plena e total, aquilo que Aristóteles chamava de “o Ser 
enquanto Ser”. 
A diferença entre os seis primeiros graus e o último decorre da diferença do 
objeto do conhecimento, isto é, os seis primeiros graus conhecem objetos que se 
oferecem a nós na sensação, na imaginação, no raciocínio, enquanto o sétimo lida 
com um objeto que só pode ser alcançado pelo pensamento puro. 
Princípios gerais 
Com os filósofos gregos, estabeleceram-se alguns princípios gerais do 
conhecimento verdadeiro: 
? as fontes e as formas do conhecimento: sensação, percepção, imaginação, 
memória, linguagem, raciocínio e intuição intelectual; 
? a distinção entre o conhecimento sensível e o conhecimento intelectual; 
? o papel da linguagem no conhecimento; 
? a diferença entre opinião e saber; 
? a diferença entre aparência e essência; 
? a definição dos princípios do pensamento verdadeiro (identidade, não-
contradição, terceiro excluído, causalidade), da forma do conhecimento 
verdadeiro (idéias, conceitos e juízos) e dos procedimentos para alcançar o 
conhecimento verdadeiro (indução, dedução, intuição); 
? a distinção dos campos do conhecimento verdadeiro, sistematizados por 
Aristóteles em três ramos: teorético (referente aos seres que apenas podemos 
contemplar ou observar, sem agir sobre eles ou neles interferir), prático 
(referente às ações humanas: ética, política e economia) e técnico (referente à 
fabricação e ao trabalho humano, que pode interferir no curso da Natureza, criar 
instrumentos ou artefatos: medicina, artesanato, arquitetura, poesia, retórica, 
etc.). 
Para os gregos, a realidade é a Natureza e dela fazem parte os humanos e as 
instituições humanas. Por sua participação na Natureza, os humanos podem 
conhecê-la, pois são feitos dos mesmos elementos que ela e participam da mesma 
inteligência que a habita e dirige. 
O poeta alemão Goethe criou estes versos, que exprimem como os antigos 
concebiam o conhecimento: 
Se os olhos não fossem solares 
Jamais o Sol nós veríamos; 
Se em nós não estivesse a própria força divina, 
Como o divino sentiríamos? 
Convite à Filosofia 
_______________________________ 
 
 
 – 142 – 
O intelecto humano conhece a inteligibilidade do mundo, alcança a racionalidade 
do real e pode pensar a realidade porque nós e ela somos feitos da mesma 
maneira, com os mesmos elementos e com a mesma inteligência. 
Os filósofos modernos e a teoria do conhecimento 
Quando se diz que a teoria do conhecimento tornou-se uma disciplina específica 
da Filosofia somente com os filósofos modernos (a partir do século XVII) não se 
pretende dizer que antes deles o problema do conhecimento não havia ocupado 
outros filósofos, e sim que, para os modernos, a questão do conhecimento foi 
considerada anterior à da ontologia e pré-condição ou pré-requisito para a 
Filosofia e as ciências. 
Por que essa mudança de perspectiva dos gregos para os modernos? Porque entre 
eles instala-se o cristianismo, trazendo problemas que os antigos filósofos 
desconheciam. 
A perspectiva cristã introduziu algumas distinções que romperam com a idéia 
grega de uma participação direta e harmoniosa entre o nosso intelecto e a 
verdade, nosso ser e o mundo. O cristianismo fez distinção entre fé e razão, 
verdades reveladas e verdades racionais, matéria e espírito, corpo e alma; 
afirmou que o erro e a ilusão são parte da natureza humana em decorrência do 
caráter pervertido de nossa vontade, após o pecado original. 
Em conseqüência, a Filosofia precisou enfrentar três problemas novos: 
1. Como, sendo seres decaídos e pervertidos, podemos conhecer a verdade? 
2. Sendo nossa natureza dupla (matéria e espírito), como nossa inteligência pode 
conhecer o que é diferente dela? Isto é, como seres corporais podem conhecer o 
incorporal (Deus) e como seres dotados de alma incorpórea podem conhecer o 
corpóreo (mundo)? 
3. Os filósofos antigos consideravam que éramos entes participantes de todas as 
formas de realidade: por nosso corpo, participamos da Natureza; por nossa alma, 
participamos da Inteligência divina. O cristianismo, ao introduzir a noção de 
pecado original, introduziu a separação radical entre os humanos (pervertidos e 
finitos) e a divindade (perfeita e infinita). Com isso, fez surgir a pergunta: como 
o finito (humano) pode conhecer a verdade (infinita e divina)? 
Eis porque, durante toda a Idade Média, a fé tornou-se central para a Filosofia, 
pois era através dela que essas perguntas eram respondidas. Auxiliada pela graça 
divina, a fé iluminava nosso intelecto e guiava nossa vontade, permitindo à nossa 
razão o conhecimento do que está ao seu alcance, ao mesmo tempo em que nossa 
alma recebia os mistérios da revelação. A fé nos fazia saber (mesmo que não 
pudéssemos compreender como isso era possível) que, pela vontade soberana de 
Deus, era concedido à nossa alma imaterial conhecer as coisas materiais. 
Marilena Chauí_______________________________ 
 
 
 – 143 – 
Os filósofos modernos, porém, não aceitaram essas respostas e por esse motivo a 
questão do conhecimento tornou-se central para eles. 
Os gregos se surpreendiam que pudesse haver erro, ilusão e mentira. Como a 
verdade – aletheia – era concebida como presença e manifestação do verdadeiro 
aos nossos sentidos ou ao nosso intelecto, isto é, como presença do Ser à nossa 
experiência sensível ou ao puro pensamento, a pergunta filosófica só podia ser: 
Como é possível o erro ou a ilusão? Ou seja, como é possível ver o que não é, 
dizer o que não é, pensar o que não é? 
Para os modernos, a situação é exatamente contrária. Se a verdade depende da 
revelação e da vontade divinas, e se nosso intelecto foi pervertido pela nossa 
vontade pecadora, como podemos conhecer a verdade? Se a verdade depender da 
fé e se depender da fraqueza da nossa vontade, como nossa razão poderá 
conhecê-la? 
O cristianismo, particularmente com santo Agostinho, trouxe a idéia de que cada 
ser humano é uma pessoa. Essa idéia vem do Direito Romano, que define a 
pessoa como um sujeito de direitos e de deveres. Se somos pessoas, somos 
responsáveis por nossos atos e pensamentos. Nossa pessoa é nossa consciência, 
que é nossa alma dotada de vontade, imaginação, memória e inteligência. 
A vontade é livre e, aprisionada num corpo passional e fraco, pode mergulhar 
nossa alma na ilusão e no erro. Estar no erro ou na verdade dependerá, portanto, 
de nós mesmos e por isso precisamos saber se podemos ou não conhecer a 
verdade e em que condições tal conhecimento é possível. Os primeiros filósofos 
cristãos e os medievais afirmavam que podemos conhecer a verdade, desde que a 
razão não contradiga a fé e se submeta a ela no tocante às verdades últimas e 
principais. 
A primeira tarefa que os modernos se deram foi a de separar fé de razão, 
considerando cada uma delas destinada a conhecimentos diferentes e sem 
qualquer relação entre si. A segunda tarefa foi a de explicar como a alma-
consciência, embora diferente dos corpos, pode conhecê-los. Consideraram que a 
alma pode conhecer os corpos porque os representa intelectualmente por meio 
das idéias e estas são imateriais como a própria alma. A terceira tarefa foi a de 
explicar como a razão e o pensamento podem tornar-se mais fortes do que a 
vontade e controlá-la para que evite o erro. 
O problema do conhecimento torna-se, portanto, crucial e a Filosofia precisa 
começar pelo exame da capacidade humana de conhecer, pelo entendimento ou 
sujeito do conhecimento. A teoria do conhecimento volta-se para a relação entre 
o pensamento e as coisas, a consciência (interior) e a realidade (exterior), o 
entendimento e a realidade; em suma, o sujeito e o objeto do conhecimento. 
Os dois filósofos que iniciam o exame da capacidade humana para o erro e a 
verdade são o inglês Francis Bacon e o francês René Descartes. O filósofo que 
Convite à Filosofia 
_______________________________ 
 
 
 – 144 – 
propõe, pela primeira vez, uma teoria do conhecimento propriamente dita é o 
inglês John Locke. A partir do século XVII, portanto, a teoria do conhecimento 
torna-se uma disciplina central da Filosofia. 
Bacon e Descartes 
Os gregos indagavam: como o erro é possível? Os modernos perguntaram: como 
a verdade é possível? Para os gregos, a verdade era aletheia, para os modernos, 
veritas. Em outras palavras, para os modernos trata-se de compreender e explicar 
como os relatos mentais – nossas idéias – correspondem ao que se passa 
verdadeiramente na realidade. Apesar dessas diferenças, os filósofos retomaram 
o modo de trabalhar filosoficamente proposto por Sócrates, Platão e Aristóteles, 
qual seja, começar pelo exame das opiniões contrárias e ilusórias para ultrapassá-
las em direção à verdade. 
Antes de abordar o conhecimento verdadeiro, Bacon e Descartes examinaram 
exaustivamente as causas e as formas do erro, inaugurando um estilo filosófico 
que permanecerá na Filosofia, isto é, a análise dos preconceitos e do senso 
comum. 
Bacon elaborou uma teoria conhecida como a crítica dos ídolos (a palavra ídolo 
vem do grego eidolon e significa imagem). Descartes, como já mencionamos, 
elaborou um método de análise conhecido como dúvida metódica. 
De acordo com Bacon, existem quatro tipos de ídolos ou de imagens que formam 
opiniões cristalizadas e preconceitos, que impedem o conhecimento da verdade: 
1. ídolos da caverna: as opiniões que se formam em nós por erros e defeitos de 
nossos órgãos dos sentidos. São os mais fáceis de corrigir por nosso intelecto; 
2. ídolos do fórum: são as opiniões que se formam em nós como conseqüência 
da linguagem e de nossas relações com os outros. São difíceis de vencer, mas o 
intelecto tem poder sobre eles; 
3. ídolos do teatro: são as opiniões formadas em nós em decorrência dos poderes 
das autoridades que nos impõem seus pontos de vista e os transformam em 
decretos e leis inquestionáveis. Só podem ser refeitos se houver uma mudança 
social e política; 
4. ídolos da tribo: são as opiniões que se formam em nós em decorrência de 
nossa natureza humana; esses ídolos são próprios da espécie humana e só podem 
ser vencidos se houver uma reforma da própria natureza humana. 
Bacon acreditava que o avanço dos conhecimentos e das técnicas, as mudanças 
sociais e políticas e o desenvolvimento das ciências e da Filosofia propiciariam 
uma grande reforma do conhecimento humano, que seria também uma grande 
reforma na vida humana. Tanto assim que, ao lado de suas obras filosóficas, 
escreveu uma obra filosófico-política, a Nova Atlântida, na qual descreve e narra 
Marilena Chauí 
_______________________________ 
 
 
 – 145 – 
uma sociedade ideal e perfeita, nascida do conhecimento verdadeiro e do 
desenvolvimento das técnicas. 
Descartes localizava a origem do erro em duas atitudes que chamou de atitudes 
infantis: 
1. a prevenção, que é a facilidade com que nosso espírito se deixa levar pelas 
opiniões e idéias alheias, sem se preocupar em verificar se são ou não 
verdadeiras. São as opiniões que se cristalizam em nós sob a forma de 
preconceitos (colocados em nós por pais, professores, livros, autoridades) e que 
escravizam nosso pensamento, impedindo-nos de pensar e de investigar; 
2. a precipitação, que é a facilidade e a velocidade com que nossa vontade nos 
faz emitir juízos sobre as coisas antes de verificarmos se nossas idéias são ou não 
são verdadeiras. São opiniões que emitimos em conseqüência de nossa vontade 
ser mais forte e poderosa do que nosso intelecto. Originam-se no conhecimento 
sensível, na imaginação, na linguagem e na memória. 
Como Bacon, Descartes também está convencido de que é possível vencer esses 
efeitos, graças a uma reforma do entendimento e das ciências. (Descartes não 
pensa na necessidade de mudanças sociais e políticas, diferindo de Bacon nesse 
aspecto.) Essa reforma pode ser feita pelo sujeito do conhecimento, se este 
decidir e deliberar pela necessidade de encontrar fundamentos seguros para o 
saber. Para isso Descartes criou um procedimento, a dúvida metódica, pela qual 
o sujeito do conhecimento, analisando cada um de seus conhecimentos, conhece 
e avalia as fontes e as causas de cada um, a forma e o conteúdo de cada um, a 
falsidade e a verdade de cada um e encontra meios para livrar-se de tudo quanto 
seja duvidoso perante o pensamento. Ao mesmo tempo, o pensamento oferece ao 
espírito um conjunto de regras que deverão ser obedecidas para que um 
conhecimento seja considerado verdadeiro. 
Para Descartes, o conhecimento sensível (isto é, sensação, percepção, 
imaginação, memória e linguagem) é a causa do erro e deve ser afastado. O 
conhecimento verdadeiro é puramente intelectual, parte das idéias inatas e 
controla (por meio de regras) as investigações filosóficas, científicas e técnicas. 
Locke 
Locke é o iniciador da teoria do conhecimento propriamente dita porque se 
propõe a analisar cada uma das formas de conhecimento que possuímos, a 
origem de nossasidéias e nossos discursos, a finalidade das teorias e as 
capacidades do sujeito cognoscente relacionadas com os objetos que ele pode 
conhecer. Seguindo a trilha que fora aberta por Aristóteles, Locke também 
distingue graus de conhecimento, começando pelas sensações até chegar ao 
pensamento. 
Comparemos o que escreveu Aristóteles, no início da Metafísica, e o que afirmou 
Locke, no início do Ensaio sobre o entendimento humano. 
Convite à Filosofia 
_______________________________ 
 
 
 – 146 – 
Aristóteles escreveu: 
Todos os homens têm, por natureza, o desejo de conhecer. O prazer 
causado pelas sensações é a prova disso, pois, mesmo fora de qualquer 
utilidade, as sensações nos agradam por si mesmas e, mais do que todas as 
outras, as sensações visuais. 
Locke afirmou: 
Visto que o entendimento situa o homem acima dos outros seres sensíveis 
e dá-lhe toda vantagem e todo domínio que tem sobre eles, seu estudo 
consiste certamente num tópico que, por sua nobreza, é merecedor de 
nosso trabalho de investigá-lo. O entendimento, como o olho, que nos faz 
ver e perceber todas as outras coisas, não se observa a si mesmo; requer 
arte e esforço situá-lo à distância e fazê-lo seu próprio objeto. 
Assim como Aristóteles diferia de Platão, Locke difere de Descartes. 
Platão e Descartes afastam a experiência sensível ou o conhecimento sensível do 
conhecimento verdadeiro, que é puramente intelectual. Aristóteles e Locke 
consideram que o conhecimento se realiza por graus contínuos, partindo da 
sensação até chegar às idéias. 
Essa diferença de perspectiva estabelece as duas grandes orientações da teoria do 
conhecimento, conhecidas como racionalismo e empirismo. 
Para o racionalismo, a fonte do conhecimento verdadeiro é a razão operando por 
si mesma, sem o auxílio da experiência sensível e controlando a própria 
experiência sensível. 
Para o empirismo, a fonte de todo e qualquer conhecimento é a experiência 
sensível, responsável pelas idéias da razão e controlando o trabalho da própria 
razão. 
Essas diferenças, porém, não impedem que haja um elemento comum a todos os 
filósofos a partir da modernidade, qual seja, tomar o entendimento humano como 
objeto da investigação filosófica. 
Tornar o entendimento objeto para si próprio, tornar o sujeito do conhecimento 
objeto de conhecimento para si mesmo é a grande tarefa que a modernidade 
filosófica inaugura, ao desenvolver a teoria do conhecimento. Como se trata da 
volta do conhecimento sobre si mesmo para conhecer-se, ou do sujeito do 
conhecimento colocando-se como objeto para si mesmo, a teoria do 
conhecimento é a reflexão filosófica. 
A consciência: o eu, a pessoa, o cidadão e o sujeito 
A teoria do conhecimento no seu todo realiza-se como reflexão do entendimento 
e baseia-se num pressuposto fundamental: o de que somos seres racionais 
conscientes. 
Marilena Chauí 
_______________________________ 
 
 
 – 147 – 
O que se entende por consciência? 
A capacidade humana para conhecer, para saber que conhece e para saber o que 
sabe que conhece. A consciência é um conhecimento (das coisas e de si) e um 
conhecimento desse conhecimento (reflexão). 
Do ponto de vista psicológico, a consciência é o sentimento de nossa própria 
identidade: é o eu, um fluxo temporal de estados corporais e mentais, que retém 
o passado na memória, percebe o presente pela atenção e espera o futuro pela 
imaginação e pelo pensamento. O eu é o centro ou a unidade de todos esses 
estados psíquicos. 
A consciência psicológica ou o eu é formada por nossas vivências, isto é, pela 
maneira como sentimos e compreendemos o que se passa em nosso corpo e no 
mundo que nos rodeia, assim como o que se passa em nosso interior. É a maneira 
individual e própria com que cada um de nós percebe, imagina, lembra, opina, 
deseja, age, ama e odeia, sente prazer e dor, toma posição diante das coisas e dos 
outros, decide, sente-se feliz ou infeliz. 
Do ponto de vista ético e moral, a consciência é a espontaneidade livre e racional, 
para escolher, deliberar e agir conforme à liberdade, aos direitos alheios e ao 
dever. É a pessoa, dotada de vontade livre e de responsabilidade. É a capacidade 
para compreender e interpretar sua situação e sua condição (física, mental, social, 
cultural, histórica), viver na companhia dos outros segundo as normas e os 
valores morais definidos por sua sociedade, agir tendo em vista fins escolhidos 
por deliberação e decisão, realizar as virtudes e, quando necessário, contrapor-se 
e opor-se aos valores estabelecidos em nome de outros, considerados mais 
adequados à liberdade e à responsabilidade. 
Do ponto de vista político, a consciência é o cidadão, isto é, tanto o indivíduo 
situado no tecido das relações sociais, como portador de direitos e deveres, 
relacionando-se com a esfera pública do poder e das leis, quanto o membro de 
uma classe social, definido por sua situação e posição nessa classe, portador e 
defensor de interesses específicos de seu grupo ou de sua classe, relacionando-se 
com a esfera pública do poder e das leis. 
A consciência moral (a pessoa) e a consciência política (o cidadão) formam-se 
pelas relações entre as vivências do eu e os valores e as instituições de sua 
sociedade ou de sua cultura. São as maneiras pelas quais nos relacionamos com 
os outros por meio de comportamentos e de práticas determinados pelos códigos 
morais (que definem deveres, obrigações, virtudes) e políticos (que definem 
direitos, deveres e instituições coletivas públicas), a partir do modo como uma 
cultura e uma sociedade determinadas definem o bem e o mal, o justo e o injusto, 
o legítimo e o ilegítimo, o legal e o ilegal, o privado e o público. O eu é uma 
vivência e uma experiência que se realiza por comportamentos; a pessoa e o 
cidadão são a consciência como agente (moral e político), como práxis. 
Convite à Filosofia 
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 – 148 – 
Do ponto de vista da teoria do conhecimento, a consciência é uma atividade 
sensível e intelectual dotada do poder de análise, síntese e representação. É o 
sujeito. Reconhece-se como diferente dos objetos, cria e descobre significações, 
institui sentidos, elabora conceitos, idéias, juízos e teorias. É dotado de 
capacidade para conhecer-se a si mesmo no ato do conhecimento, ou seja, é 
capaz de reflexão. É saber de si e saber sobre o mundo, manifestando-se como 
sujeito percebedor, imaginante, memorioso, falante e pensante. É o entendimento 
propriamente dito. 
A consciência reflexiva ou o sujeito do conhecimento forma-se como atividade 
de análise e síntese, de representação e de significação voltadas para a 
explicação, descrição e interpretação da realidade e das outras três esferas da vida 
consciente (vida psíquica, moral e política), isto é, da posição do mundo natural e 
cultural e de si mesma como objetos de conhecimento. Apóia-se em métodos de 
conhecer e busca a verdade ou o verdadeiro. É o aspecto intelectual e teórico da 
consciência. 
Ao contrário do eu, o sujeito do conhecimento não é uma vivência individual, 
mas aspira à universalidade, ou seja, à capacidade de conhecimento que seja 
idêntica em todos os seres humanos e com validade para todos os seres humanos, 
em todos os tempos e lugares. Assim, por exemplo, João pode gostar de 
geometria e Paula pode detestar essa matéria, mas o que ambos sentem não 
afetam os conceitos geométricos, nem os procedimentos matemáticos, cujo 
sentido e valor independem das vivências de ambos e são o objeto construído ou 
descoberto pelo sujeito do conhecimento. 
Maria pode não saber que existe a física quântica e pode, ao ser informada sobre 
ela, não acreditar nela e não gostar da idéia de que seu corpo seja apenas 
movimento infinito de partículas invisíveis. Isso, porém, não afeta a validade e o 
sentido da ciência quântica, descoberta e conhecida pelo sujeito. Luíza tem 
lembranças agradáveis quando vê rosas amarelas; Antônio, porém, tem péssimas 
lembranças quando as vê. Porém, ver flores e cores, perceberqualidades, senti-
las afetivamente não depende de que queiramos ou não vê -las, como não depende 
do nosso eu percebê-las espacialmente ou temporalmente. A percepção de cores, 
de seres espaciais e temporais se realiza em mim não apenas segundo minhas 
vivências psicológicas individuais, mas também segundo leis, normas, princípios 
de estruturação e organização das coisas, que são as mesmas para todos os 
sujeitos percebedores. É com essa estruturação e organização que lida o sujeito. 
A vivência é singular (minha). O conhecimento é universal (nosso, de todos os 
humanos). 
Eu, pessoa, cidadão e sujeito constituem a consciência como subjetividade 
ativa, sede da razão e do pensamento, capaz de identidade consigo mesma, 
virtude, direitos e verdade. 
Marilena Chauí 
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 – 149 – 
Subjetividade e graus de consciência 
Embora a subjetividade se manifeste plenamente como uma atividade que sabe 
de si mesma, isso não significa que a consciência esteja sempre alerta e atenta. 
Quando, por exemplo, recebemos uma anestesia geral, vamos perdendo 
gradualmente a consciência, deixamos de ter consciência de ver, sentir, lembrar. 
Dependendo da intensidade da dose aplicada, podemos perder todas as formas de 
consciência menos, por exemplo, a auditiva. No entanto, mesmo a consciência 
auditiva, nessa situação, é fluida, não parece estar referida a um eu. Quando 
despertamos à noite, de um sono profundo e num local que não é nosso quarto, 
levamos um certo tempo até sabermos quem somos e onde estamos. 
Quando devaneamos ou divagamos, ou sonhamos de olhos abertos, perdemos a 
consciência de tudo quanto está à nossa volta e, muitas vezes, quando “voltamos 
a nós”, temos um braço ou uma perna adormecidos, uma queimadura na mão, o 
rosto queimado de sol ou o corpo molhado de chuva sem que tivéssemos 
consciência do que se passava conosco. Situações como essas indicam que há 
graus de consciência. 
De um modo geral, distinguem-se os seguintes graus de consciência: 
? consciência passiva: aquela na qual temos uma vaga e uma confusa percepção 
de nós mesmos e do que se passa à nossa volta, como no devaneio, no momento 
que precede o sono ou o despertar, na anestesia e, sobretudo, quando somos 
muito crianças ou muito idosos; 
? consciência vivida, mas não reflexiva: é nossa consciência efetiva, que tem a 
peculiaridade de ser egocêntrica, isto é, de perceber os outros e as coisas apenas 
a partir de nossos sentimentos com relação a eles, como, por exemplo, a criança 
que bate numa mesa ao tropeçar nela, julgando que a mesa “fez de propósito” 
para machucá-la. Nesse grau de consciência, não conseguimos separar o eu e o 
outro, o eu e as coisas. É típico, por exemplo, das pessoas apaixonadas, para as 
quais o mundo só existe a partir dos seus sentimentos de amor, ódio, cólera, 
alegria, tristeza, etc.; 
? consciência ativa e reflexiva: aquela que reconhece a diferença entre o interior 
e o exterior, entre si e os outros, entre si e as coisas. Esse grau de consciência é o 
que permite a existência da consciência em suas quatro modalidades, isto é, eu, 
pessoa, cidadão e sujeito. 
Esse último grau de consciência, nas suas quatro modalidades, é definido pela 
fenomenologia como consciência intencional ou intencionalidade, isto é, como 
“consciência de”. Toda a consciência, diz a fenomenologia, é sempre consciência 
de alguma coisa, visa sempre a alguma coisa, de tal maneira que perceber é 
sempre perceber alguma coisa, imaginar é sempre imaginar alguma coisa, 
lembrar é sempre lembrar alguma coisa, dizer é sempre dizer alguma coisa, 
pensar é sempre pensar alguma coisa. A consciência realiza atos (perceber, 
Convite à Filosofia 
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lembrar, imaginar, falar, refletir, pensar) e visa a conteúdos ou significações (o 
percebido, o lembrado, o imaginado, o falado, o refletido, o pensado). O sujeito 
do conhecimento é aquele que reflete sobre as relações entre atos e significações 
e conhece a estrutura formada por eles (a percepção, a imaginação, a memória, a 
linguagem, o pensamento).

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