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Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 1 de 12 Filosofia – Caderno 3 AULA 1 – Maquiavel e a secularização da política Nicolau Maquiavel (1469 – 1527): Político, diplomata e intelectual italiano. Pesquisador das práticas políticas, tinha como principais objetivos: entender a crise italiana e promover a unificação do país. Atuou como consultor político na República de Florença. Sua principal obra, “O Príncipe”, é escrita entre os anos de 1513 e 1514, porém somente é publicada no ano de 1532, após a morte de Maquiavel. Obra inaugural do pensamento político moderno, consiste em uma espécie de manual criado para orientar a ação do líder político, uma vez que assume como valor central a eficácia da prática política. Maquiavel a dedica aos monarquistas da família Médicis, que haviam tomado o poder em Florença. DEDICATÓRIA DO LIVRO O PRÍNCIPE Ao Magnífico Lorenzo, filho de Piero de Médicis As mais das vezes, costumam aqueles que desejam granjear as graças de um príncipe, trazer-lhes os objetos que lhes são mais caros, ou com os quais o veem deleitar-se; assim, muitas vezes, eles são presenteados com cavalos, armas, tecidos de ouro, pedras preciosas e outros ornamentos dignos de sua grandeza. Desejando eu oferecer a Vossa Magnificência um testemunho qualquer de minha obrigação, não achei, entre os meus cabedais, coisa que me seja mais cara ou que tanto estime quanto o conhecimento das ações dos grandes homens apreendido por uma longa experiência das coisas modernas e uma contínua lição das antigas; as quais tendo eu, com grande diligência, longamente cogitado, examinando-as, agora a mando a Vossa Magnificência, reduzidas a um pequeno volume. E conquanto julgue indigna esta obra da presença de Vossa Magnificência, não confio menos em que, por sua humanidade, deva ser aceita, considerado que não lhe posso fazer maior presente que lhe dar a faculdade de poder em tempo muito breve aprender tudo aquilo que, em tantos anos e à custa de tantos incômodos e perigos, hei conhecido. Não ornei esta obra e nem a enchi de períodos sonoros ou de palavras empoladas e floreadas (…); porque não quis que coisa alguma seja seu ornato e a faça agradável senão a variedade da matéria e a gravidade do assunto. Nem quero que se repute presunção o fato de um homem de baixo e ínfimo estado discorrer e regular sobre o governo dos príncipes, pois os que desejam os contornos dos países se colocam na planície para considerar a natureza dos montes, e para considerar a das planícies ascendem aos montes, assim também para conhecer bem a natureza dos povos é necessário ser príncipe, e para conhecer a dos príncipes é necessário ser povo. (Nicolau Maquiavel. O Príncipe, p. 9-10) Contexto Histórico: EUROPA RENASCENTISTA – transição do sistema feudal para o capitalismo; início do processo de centralização política em alguns países, sob o comando dos príncipes (Espanha, Portugal, França e Inglaterra). ITÁLIA – vários centros dispersos de poder (reinos, ducados, repúblicas). Não ocorre a unificação política. Novas rotas marítimas acabam com a hegemonia do comércio Mediterrâneo. Características da obra de Maquiavel: - Método Empírico: Maquiavel não toma como base a Bíblia, o direito romano ou a obra dos filósofos gregos para construir suas teorias políticas, mas parte da experiência real de seu tempo. Busca observar a realidade factual, sem juízos de valor e atem-se a feitos históricos realizados pelos líderes políticos. Assim, assume a política em sua dimensão mais prática: a eficácia ou o resultado. - Cálculo Racional: A finalidade da política é a tomada e manutenção do poder. O líder político (príncipe) deve orientar racionalmente suas ações visando determinados fins e avaliando os custos e benefícios de cada atitude. Isso implica em uma responsabilidade para com os RESULTADOS. - Separação entre política e religião: Não é a moral que orienta a análise de Maquiavel, mas a coerência a um princípio. A política tem sua própria moral e esta deve se basear na eficácia de determinadas ações. Ao estadista é permitido fazer coisas que não são permitidas aos súditos, portanto, a ética política não deve ser regulada por preceitos morais ou valores difundidos pela religião. A lógica política nada tem a ver com as virtudes éticas dos indivíduos em sua vida privada. O que poderia ser moral na vida privada pode ser fraqueza na vida pública, assim como o que pode ser imoral na vida privada pode ser virtude política. Dessa maneira, Maquiavel inaugura a ideia de valores políticos medidos pela eficácia prática e pela utilidade social, afastando a política dos padrões que regulam a moralidade privada dos indivíduos. O Príncipe: Maquiavel considera que seja melhor, ao príncipe, ser temido do que amado, mas jamais odiado. Assim, o príncipe garante o respeito do povo, mas evita a instabilidade de sentimentos volúveis, com o amor excessivo. Já o ódio da população pode levar ao fracasso do governo, por isso deve ser evitado ao máximo. O líder deve possuir Virtú, habilidades racionais relacionadas à liderança que sintetizam o que Maquiavel descreve como virtude política: possuir estratégia e saber governar de acordo com o resultado. A virtú é componente essencial para que o príncipe possa lidar com a Fortuna, que representa a imprevisibilidade do destino, adversidades que podem acontecer mesmo com a máxima eficácia do líder político. Texto complementar: O Príncipe - Maquiavel CAPÍTULO XV DAQUELAS COISAS PELAS QUAIS OS HOMENS, E ESPECIALMENTE OS PRÍNCIPES, SÃO LOUVADOS OU VITUPERADOS Resta ver agora quais devam ser os modos e o proceder de um príncipe para com os súditos e os amigos e, por que sei que muitos já escreveram a respeito, duvido não ser considerado presunçoso escrevendo ainda sobre o mesmo assunto, máxime quando irei disputar essa matéria à orientação já por outros dada aos príncipes. Mas, sendo minha intenção escrever algo de útil para quem por tal se interesse, pareceu-me mais conveniente ir em busca da verdade extraída dos fatos e não à imaginação dos mesmos, pois muitos conceberam repúblicas e principados jamais vistos ou conhecidos como tendo realmente existido. Em verdade, há tanta diferença de como se vive e como se deveria viver, que aquele que abandone o que se faz por aquilo que se deveria fazer, aprenderá antes o caminho de sua ruína do que o de sua preservação, eis que um homem que queira em todas as suas palavras fazer profissão de bondade, perder-se-á em meio a tantos que não são bons. Donde é necessário, a um príncipe que queira se manter, aprender a poder não ser bom e usar ou não da bondade, segundo a necessidade. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 2 de 12 Deixando de parte, assim, os assuntos relativos a um príncipe imaginário e falando daqueles que são verdadeiros, digo que todos os homens, máxime os príncipes por situados em posição mais preeminente, quando analisados, se fazem notar por alguns daqueles atributos que lhes acarretam ou reprovação ou louvor. Assim é que alguns são havidos como liberais, alguns miseráveis (usando um termo toscano, porque "avaro" em nossa língua é ainda aquele que deseja possuir por rapina, enquanto "miserável" chamamos aquele que se abstém em excesso de usar o que possui); alguns são tidos como pródigos, alguns rapaces; alguns cruéis, alguns piedosos; um fedífrago, o outro fiel; um efeminado e pusilânime, o outro feroz e animoso; um humano, o outro soberbo; um lascivo, o outro casto; um simples, o outro astuto; um duro, o outro fácil; um grave, o outro leviano; um religioso, o outro incrédulo, e assim por diante. Sei que cada um confessará que seria sumamente louvável encontrarem-se em um príncipe, de todos os atributos acima referidos, apenas aqueles que são considerados bons; mas, desde que não os podem possuir nem inteiramente observá-los em razão das contingências humanasnão o permitirem, é necessário seja o príncipe tão prudente que saiba fugir à infâmia daqueles vícios que o fariam perder o poder, cuidando evitar até mesmo aqueles que não chegariam a pôr em risco o seu posto; mas, não podendo evitar, é possível tolerá-los, se bem que com quebra do respeito devido. Ainda, não evite o príncipe de incorrer na má faina daqueles vícios que, sem eles, difícil se lhe torne salvar o Estado; pois, se bem considerado for tudo, sempre se encontrará alguma coisa que, parecendo virtude, praticada acarretará ruína, e alguma outra que, com aparência de vício, seguida dará origem à segurança e ao bem-estar. Exercícios 1. (Ufu 2011) A Itália do tempo de Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) não era um Estado unificado como hoje, mas fragmentada em reinos e repúblicas. Na obra O Príncipe, declara seu sonho de ver a península unificada. Para tanto, entre outros conceitos, forjou as concepções de virtú e de fortuna. A primeira representa a capacidade de governar, agir para conquistar e manter o poder; a segunda é relativa aos “acasos da sorte” aos quais todos estão submetidos, inclusive os governantes. Afinal, como registrado na famosa ópera de Carl Orff: Fortuna imperatrix mundi (A Fortuna governa o mundo). Por isso, um príncipe prudente não pode nem deve guardar a palavra dada quando isso se lhe torne prejudicial e quando as causas que o determinaram cessem de existir. MAQUIAVEL, N. “O príncipe”. Coleção os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1973, p. 79 - 80. Com base nas informações acima, assinale a alternativa que melhor interpreta o pensamento de Maquiavel. a) Trata-se da fortuna, quando Maquiavel diz que “as causas que o determinaram cessem de existir”; e de virtú, quando Maquiavel diz que o príncipe deve ser “prudente”. b) Trata-se da virtú, quando Maquiavel diz que as “causas mudaram”; e de fortuna quando se refere ao príncipe prudente, pois um príncipe com tal qualidade saberia acumular grande quantidade de riquezas. c) Apesar de ser uma frase de Maquiavel, conforme o texto introdutório, ela não guarda qualquer relação com as noções de virtú e fortuna. d) O fragmento de Maquiavel expressa bem a noção de virtú, ao dizer que o príncipe deve ser prudente, mas não se relaciona com a noção de fortuna, pois em nenhum momento afirma que as “circunstâncias” podem mudar. 2.(Uem 2009) Maquiavel inaugura o pensamento político moderno. Seculariza a política, rejeitando o legado ético- cristão. Maquiavel tem uma visão do homem e da política como elas são e não como deveriam ser. A política deve ater- se ao real, deve preocupar-se com a eficiência da ação e não teorizar, como fazia Platão, sobre a forma ideal de governo. Assinale o que for correto. 01) Para Maquiavel, o príncipe virtuoso é aquele que governa com justiça, estabelecendo, entre seus súditos, a igualdade social e uma participação político-democrática. 02) Maquiavel redefine as relações entre ética e política, não julga mais as ações políticas em função de uma hierarquia de valores dada de antemão, mas em função da necessidade dos resultados que as ações políticas devem alcançar. 04) Maquiavel faz a apologia da tirania, pois considera ser a forma mais eficiente de o príncipe manter-se no poder e garantir a segurança da ordem social e política para seus súditos. 08) Na concepção política de Maquiavel, não há uma exclusão entre ética e política, todavia a primeira deve ser entendida a partir da segunda. Para ele, as exigências da ação política implicam uma ética cujo caráter é diferente da ética praticada pelos indivíduos na vida privada. 16) Para Maquiavel, a sociedade é dividida entre polos distintamente separados, isto é, os que possuem o poder político e econômico, e o povo. A sociedade, cindida por lutas sociais, não pode, portanto, ser vista como uma comunidade ideal e homogênea voltada para o bem comum. 3. (Unesp 2011) “Três maneiras há de preservar a posse de Estados acostumados a serem governados por leis próprias; primeiro, devastá-los; segundo, morar neles; terceiro, permitir que vivam com suas leis, arrancando um tributo e formando um governo de poucas pessoas, que permaneçam amigas. Sucede que, na verdade, a garantia mais segura da posse é a ruína. Os que se tornam senhores de cidades livres por tradição, e não as destroem, serão destruídos por elas. Essas cidades costumam ter por bandeira, em suas rebeliões, tanto a liberdade quanto suas antigas leis, jamais esquecidas, nem com o passar do tempo, nem por influência dos favores que receberam. Por mais que se faça, e sejam quais forem os cuidados, sem promover desavença e desagregação entre os habitantes, continuarão eles a recordar aqueles princípios e a estes irão recorrer em quaisquer oportunidades e situações”. (Nicolau Maquiavel. Publicado originalmente em 1513. Adaptado.) Partindo de uma definição de moralidade como conjunto de regras de conduta humana que se pretendem válidas em termos absolutos, responda se o pensamento de Maquiavel é compatível com a moralidade cristã. Justifique sua resposta, comentando o teor prático ou pragmático do pensamento desse filósofo. 4.(Ifsp 2011) Reconhecido por muitos como fundador do pensamento político moderno, Maquiavel chocou a sociedade de seu tempo ao propor, em O Príncipe, que a) a soberania do Estado é ilimitada e que o monarca, embora submetido às leis divinas, pode interpretá-las de forma autônoma, sem a necessidade de recorrer ao Papa. b) a autoridade do monarca é sagrada, ilimitada e incontestável, pois o príncipe recebe seu poder diretamente de Deus. c) o Estado é personificado pelo monarca, que encarna a soberania e cujo poder não conhece outros limites que não aqueles ditados pela moral. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 3 de 12 d) a autoridade do príncipe deriva do consentimento dos governados, pois a função do Estado é promover e assegurar a felicidade dos seus súditos. e) a política é autonormativa, justificando seus meios em prol de um bem maior, que é a estabilidade do Estado. 5. (Uel 2010) Leia o texto de Maquiavel a seguir: [Todo príncipe prudente deve] não só remediar o presente, mas prever os casos futuros e preveni-los com toda a perícia, de forma que se lhes possa facilmente levar corretivo, e não deixar que se aproximem os acontecimentos, pois deste modo o remédio não chega a tempo, tendo-se tornado incurável a moléstia. [...] Assim se dá com o Estado: conhecendo-se os males com antecedência o que não é dado senão aos homens prudentes, rapidamente são curados [...] (MAQUIAVEL, N. O Príncipe: Escritos políticos. São Paulo: Nova cultural, 1991, p.12.) Nas ações de todos os homens, máxime dos príncipes, onde não há tribunal para recorrer, o que importa é o êxito bom ou mau. Procure, pois, um príncipe, vencer e conservar o Estado. Os meios que empregar serão sempre julgados honrosos e louvados por todos, porque o vulgo é levado pelas aparências e pelos resultados dos fatos consumados. (MAQUIAVEL, N. O Príncipe: Escritos políticos. São Paulo: Nova cultural, 1991, p.75.) Com base nos textos e nos conhecimentos sobre o pensamento de Maquiavel acerca da polaridade entre virtú e fortuna na ação política e suas implicações na moralidade pública, considere as afirmativas a seguir: I. A virtú refere-se à capacidade do príncipe de agir com astúcia e força em meio à fortuna, isto é, à contingência e ao acaso nas quais a política está imersa, com a finalidade de alcançar êxito em seus objetivos. II. A fortuna manifesta o destino inexorável dos homens e o caráter imutável de todas as coisas, de modo que a virtú do príncipe consiste em agir consoante a finalidade do Estado ideal: a felicidade dos súditos. III. A virtú implica a adesão sincera do governante a um conjunto de valores morais elevados, como a piedade cristã e ahumildade, para que tenha êxito na sua ação política diante da fortuna. IV. O exercício da virtú diante da fortuna constitui a lógica da ação política orientada para a conquista e a manutenção do poder e manifesta a autonomia dos fins políticos em relação à moral preestabelecida. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e IV são corretas. b) Somente as afirmativas II e III são corretas. c) Somente as afirmativas II e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas I, III e IV são corretas. 6.(Uel 2009) [...] como é meu intento escrever coisa útil para os que se interessarem, pareceu-me mais conveniente procurar a verdade pelo efeito das coisas, do que pelo que delas se possa imaginar. E muita gente imaginou repúblicas e principados que nunca se viram nem jamais foram reconhecidos como verdadeiros. Vai tanta diferença entre o como se vive e o modo por que se deveria viver, que quem se preocupar com o que se deveria fazer em vez do que se faz aprende antes a ruína própria, do que o modo de se preservar; e um homem que quiser fazer profissão de bondade é natural que se arruíne entre tantos que são maus. Assim, é necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda a poder ser mau e que se valha ou deixe de valer-se disso segundo a necessidade. (MAQUIAVEL, N. O Príncipe cap. XV. “Coleção Os pensadores”. São Paulo: Abril Cultural 1973. p. 69.) Com base no texto e nos conhecimentos sobre o pensamento de Maquiavel acerca da relação entre poder e moral, é correto afirmar. a) Maquiavel se preocupa em analisar a ação política considerando tão somente as qualidades morais do Príncipe que determinam a ordem objetiva do Estado. b) O sentido da ação política, segundo Maquiavel, tem por fundamento originário e, portanto, anterior, a ordem divina, refletida na harmonia da Cidade. c) Para Maquiavel, a busca da ordem e da harmonia, em face do desequilíbrio e do caos, só se realiza com a conquista da justiça e do bem comum. d) Na reflexão política de Maquiavel, o fim que deve orientar as ações de um Príncipe é a ordem e a manutenção do poder. e) A análise de Maquiavel, com base nos valores espirituais superiores aos políticos, repudia como ilegítimo o emprego da força coercitiva do Estado. 7. (Unesp 2014) Texto 1 A verdade é esta: a cidade onde os que devem mandar são os menos apressados pela busca do poder é a mais bem governada e menos sujeita a revoltas, e aquela onde os chefes revelam disposições contrárias está ela mesma numa situação contrária. Certamente, no Estado bem governado só mandarão os que são verdadeiramente ricos, não de ouro, mas dessa riqueza de que o homem tem necessidade para ser feliz: uma vida virtuosa e sábia. (Platão. A República, 2000. Adaptado.) Texto 2 Um príncipe prudente não pode e nem deve manter a palavra dada quando isso lhe é nocivo e quando aquilo que a determinou não mais exista. Fossem os homens todos bons, esse preceito seria mau. Mas, uma vez que são pérfidos e que não a manteriam a teu respeito, também não te vejas obrigado a cumpri-la para com eles. Nunca, aos príncipes, faltaram motivos para dissimular quebra da fé jurada. (Maquiavel. O Príncipe, 2000. Adaptado.) Comente as diferenças entre os dois textos no que se refere à necessidade de virtudes pessoais para o governante de um Estado. 8. (Uem 2013) “Porque há tanta diferença entre como se vive e como se deveria viver, que quem deixa aquele e segue o que se deveria fazer apreende mais rapidamente a sua ruína que a sua preservação: porque um homem que deseja ser bom em todas as situações é inevitável que se destrua entre tantos que não são bons. Assim, é necessário a um príncipe que deseja conservar-se no poder aprender a não ser bom e sê-lo e não sê-lo conforme a necessidade.” (MAQUIAVEL, N. O Príncipe. São Paulo: Hedra, 2009, cap. XV, p. 159). Conforme o trecho citado, assinale o que for correto. 01) No mundo da política, o agente político não deve pautar suas ações apenas pelos princípios morais fundados na ideia de bondade e de santidade. 02) O mundo da política não comporta ações virtuosas, mas sim traições e vilanias. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 4 de 12 04) O mundo da política obriga o governante a tomar decisões que contrariam os seus ideais de moralidade e de virtude em nome da conservação do regime político. 08) Os ideais políticos não se fundam sobre a realidade do mundo da política, donde suas inadequações e fracassos para aqueles que os seguem. 16) O mundo da política exige ações más, porém disfarçadas de bondade, isto é, a total hipocrisia do político. 9. (Enem 2013) Nasce daqui uma questão: se vale mais ser amado que temido ou temido que amado. Responde-se que ambas as coisas seriam de desejar; mas porque é difícil juntá-las, é muito mais seguro ser temido que amado, quando haja de faltar uma das duas. Porque dos homens se pode dizer, duma maneira geral, que são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ávidos de lucro, e enquanto lhes fazes bem são inteiramente teus, oferecem- te o sangue, os bens, a vida e os filhos, quando, como acima disse, o perigo está longe; mas quando ele chega, revoltam-se. MAQUIAVEL, N. O príncipe. Rio de Janeiro: Bertrand, 1991. A partir da análise histórica do comportamento humano em suas relações sociais e políticas, Maquiavel define o homem como um ser a) munido de virtude, com disposição nata a praticar o bem a si e aos outros. b) possuidor de fortuna, valendo-se de riquezas para alcançar êxito na política. c) guiado por interesses, de modo que suas ações são imprevisíveis e inconstantes. d) naturalmente racional, vivendo em um estado pré-social e portando seus direitos naturais. e) sociável por natureza, mantendo relações pacíficas com seus pares. Gabarito: 1.A 2. (2+8+16=26) 3. Diss. 4.E 5.A 6.D 7.Diss. 8. (1+4+8=13) 9.C AULA 2 – O Racionalismo de René Descartes René Descartes (1596 – 1650) Filósofo e matemático francês, considerado por muitos o pai da filosofia moderna. Em seus escritos, reflete sobre o mundo renascentista e sobre as consequências da revolução científica que marca o século XVI. Procura estabelecer os fundamentos para um conhecimento seguro, fundado em parâmetros racionais e em bases matemáticas, rompendo com os preceitos escolásticos e criticando, por outro lado, os posicionamentos de pensadores céticos que emergem em sua época. Descartes é um dos expoentes mais importantes do Racionalismo, vertente filosófica que aponta ser o princípio de racionalidade o que faz com que o homem seja capaz de obter conhecimento sobre si mesmo e sobre o mundo. A razão seria mais confiável do que os sentidos em matéria de produzir um conhecimento seguro. Contudo, é preciso um método para guiar a razão. De outro modo, ela estaria sujeita a erros. Descartes procura, assim, firmar uma base segura para o desenvolvimento das ciências. Busca também legitimar a matemática. Dúvida metódica – Descartes assume a dúvida como método e busca aquilo de que não se pode duvidar (indubitável ou ideia clara e distinta) Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto; de modo que me era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente desde os fundamentos, se quisesse estabelecer algo de firme e de constante nas ciências. Mas, parecendo-me ser muito grande essa empresa, aguardei atingir uma idade que fosse tão madura que não pudesse esperar outra após ela, naqual eu estivesse mais apto para executá-la; o que me fez diferi-Ia por tão longo tempo que doravante acreditaria cometer uma falta se empregasse ainda em deliberar o tempo que me resta para agir. (René Descartes – Meditações Metafísicas) “Meditações Metafísicas” (obra publicada em 1641) − Busca uma base inicial segura para o conhecimento. Crítica ao ceticismo vigente, que duvidava de qualquer possibilidade de se definir verdades. Ao mesmo tempo, vale-se das próprias indagações céticas, submetendo suas crenças e antigas opiniões a uma análise rigorosa em busca pelo conhecimento seguro e indubitável. − Afirma que aceitará como verdade apenas aquilo que conseguir sobreviver a qualquer dúvida. − Duvida sistematicamente da tradição, dos sentidos, da realidade exterior, da matemática até chegar à primeira verdade segura: Cogito ergo sum. − Em um momento significativo de sua primeira meditação, apresenta o que se costuma chamar de dúvida hiperbólica: argumento do gênio maligno, uma ferramenta de radicalização de seu método, com o intuito de fortalecer os critérios que demonstrem evidência. Qualquer indício de dúvida, mesmo algo que pareça absurdo à primeira vista, deve servir para que uma ideia seja descartada. Cogito – Penso, logo existo: garante a existência de um ser que pensa, mas não necessariamente um mundo exterior ao pensamento. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 5 de 12 Descartes dividiu a realidade em res conngitans (consciência e mente) e res extensa (corpo e matéria). Para ele, o pensamento é mais evidente do que a matéria, uma vez que é mais fácil comprovar o mundo imaterial do que o mundo material, algo constatado nas meditações filosóficas que o conduzem à sua primeira certeza, o COGITO. Assim como Platão, Descartes acredita na existência de certas ideias inatas. Uma desses seria a noção da existência de Deus. Ele afirma: “eu não teria a ideia de uma substância infinita e perfeita se ela não tivesse sido colocada em mim por uma substância verdadeiramente infinita e perfeita”. Deus, assim, é parte importante do sistema filosófico de Descartes, uma vez que é a existência de Deus que rompe com a hipótese do gênio maligno e garante a existência do mundo material. Argumento Mecanicista Descartes acreditava que o mundo físico operava como uma máquina, assim como as diferentes engrenagens produzidas pelo homem, tal como um relógio, por exemplo. No relógio, uma coisa funciona em função da outra e os mecanismo interagem entre si, o que pode originar dinâmicas complexas. Assim ele acreditava ser o funcionamento do mundo, que era visto por Descartes como um mecanismo bastante complexo. Um dos caminhos para se compreender um mecanismo complexo seria desmembrá-lo em partes mais simples, que é o que ele apresenta em sua obra Discurso do Método. “Discurso do Método” (publicado em 1637) Questiona o conhecimento até então adquirido e assume a racionalidade como o atributo fundamental do homem, que pode garantir o conhecimento seguro, desde que guiada por um método. As 4 regras do método: 1. jamais aceitar como verdadeira uma coisa que não se soubesse ser evidentemente como tal; 2. dividir as dificuldades em níveis, de acordo com a complexidade; 3. ir do pensamento mais simples ao mais complexo; 4. enumerar e revisar para nada omitir. “ (...) porque nossos sentidos nos enganam às vezes, quis supor que não havia coisa alguma que fosse tal como eles nos fazem imaginar. E, porque há homens que se equivocam ao raciocinar, mesmo no tocante às mais simples matérias da Geometria, e cometem aí paralogismos, rejeitei como falsas, julgando que estava sujeito a falhar como qualquer outro, todas as razões que eu tomara até então por demonstrações. E enfim, considerando que todos os mesmos pensamentos que temos quando despertos nos podem também ocorrer quando dormimos, sem que haja nenhum, nesse caso, que seja verdadeiro, resolvi fazer de conta que todas coisas que até então haviam entrado no meu espírito não eram mais verdadeiras que as ilusões de meus sonhos.” DESCARTES, Discurso do método. São Paulo: Nova Cultural, 1987 – p.25. Exercícios 1. (Ufsc 2019) No que se refere à obra Meditações Metafísicas de Descartes, é correto afirmar que: 01) os sentidos corpóreos são enganadores e, portanto, não são confiáveis para a obtenção de conhecimento. 02) só é possível distinguir o sono da vigília com o auxílio do gênio maligno. 04) não é possível adquirir conhecimento, portanto só nos resta aceitar o ceticismo. 08) Deus não existe, de modo que a melhor posição em filosofia é o ateísmo. 16) a dúvida metódica não se deve aplicar às verdades matemáticas. 32) a expressão “eu sou, eu existo” é a primeira certeza da filosofia cartesiana. 64) Deus existe, e tal verdade pode ser provada pela ideia que temos de Deus como um ser perfeito e pela constatação de que sua inexistência implicaria uma imperfeição. 2. (Uel 2019) Leia o texto a seguir. E se escrevo em francês, que é a língua de meu país, e não em latim, que é a de meus preceptores, é porque espero que aqueles que se servem apenas de sua razão natural inteiramente pura julgarão melhor minhas opiniões do que aqueles que não acreditam senão nos livros dos antigos. E quanto aos que unem o bom senso ao estudo, os únicos que desejo para meus juízes, não serão de modo algum, tenho certeza, tão parciais a favor do latim que recusem ouvir minhas razões, porque as explico em língua vulgar. DESCARTES, R. Discurso do Método. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Jr. São Paulo: Abril Cultural, 1973. Coleção “Os pensadores”. p. 79. Com base nos conhecimentos sobre Descartes e o surgimento da filosofia moderna, assinale a alternativa correta. a) A língua vulgar, o francês, expressa de modo mais adequado o espírito da modernidade por estar livre dos preconceitos da língua dos doutos, o latim. b) Redigir o Discurso do Método em francês teve propósito similar à tradução da bíblia para o alemão feita por Lutero: facilitar o acesso à sacralidade do texto em língua vulgar. c) O desencantamento do mundo, resultante da radical crítica cartesiana à tradição, teve como consequência o abandono da referência à divindade. d) As ideias expressas por Descartes em seu Discurso do Método refletem a postura tipicamente moderna de ruptura total com o passado. e) A razão natural inteiramente pura é um atributo inerente à natureza humana, independentemente da tradição ou da cultura à qual o humano se vincula. 3. (Enem 2018) O século XVIII é, por diversas razões, um século diferenciado. Razão e experimentação se aliavam no que se acreditava ser o verdadeiro caminho para o estabelecimento do conhecimento científico, por tanto tempo almejado. O fato, a análise e a indução passavam a ser parceiros fundamentais da razão. É ainda no século XVIII que o homem começa a tomar consciência de sua situação na história. ODALIA, N. In: PINSKY, J.; PINSKY. C. B. História da cidadania. São Paulo: Contexto. 2003. No ambiente cultural do Antigo Regime, a discussão filosófica mencionada no texto tinha como uma de suas características a a) aproximação entre inovação e saberes antigos. b) conciliação entre revelação e metafísica platônica. c) vinculação entre escolástica e práticas de pesquisa. d) separação entre teologia e fundamentalismo religioso. e) contraposição entre clericalismo e liberdade de pensamento. 4. (Unesp 2018) De um lado, dizem os materialistas, a mente é um processo material ou físico, um produto do funcionamento cerebral. De outro lado, de acordo com as visões não materialistas, a mente é algo diferente do cérebro, podendo existir além dele. Ambas as posições estão enraizadas em uma longa tradição filosófica, que remonta pelo menos à Grécia Antiga. Assim, enquanto Demócrito Prof. Maria Helena Filosofia &Sociologia Página 6 de 12 defendia a ideia de que tudo é composto de átomos e todo pensamento é causado por seus movimentos físicos, Platão insistia que o intelecto humano é imaterial e que a alma sobrevive à morte do corpo. (Alexander Moreira-Almeida e Saulo de F. Araujo. “O cérebro produz a mente?: um levantamento da opinião de psiquiatras”. www.archivespsy.com, 2015.) A partir das informações e das relações presentes no texto, conclui-se que a) a hipótese da independência da mente em relação ao cérebro teve origem no método científico. b) a dualidade entre mente e cérebro foi conceituada por Descartes como separação entre pensamento e extensão. c) o pensamento de Santo Agostinho se baseou em hipóteses empiristas análogas às do materialismo. d) os argumentos materialistas resgatam a metafísica platônica, favorecendo hipóteses de natureza espiritualista. e) o progresso da neurociência estabeleceu provas objetivas para resolver um debate originalmente filosófico. 5. (Enem 2016) Nunca nos tornaremos matemáticos, por exemplo, embora nossa memória possua todas as demonstrações feitas por outros, se nosso espírito não for capaz de resolver toda espécie de problemas; não nos tornaríamos filósofos, por ter lido todos os raciocínios de Platão e Aristóteles, sem poder formular um juízo sólido sobre o que nos é proposto. Assim, de fato, pareceríamos ter aprendido, não ciências, mas histórias. DESCARTES. R. Regras para a orientação do espírito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Em sua busca pelo saber verdadeiro, o autor considera o conhecimento, de modo crítico, como resultado da a) investigação de natureza empírica. b) retomada da tradição intelectual. c) imposição de valores ortodoxos. d) autonomia do sujeito pensante. e) liberdade do agente moral. 6. (Ufu 2010) Em O Discurso sobre o método, Descartes afirma: Não se deve acatar nunca como verdadeiro aquilo que não se reconhece ser tal pela evidência, ou seja, evitar acuradamente a precipitação e a prevenção, assim como nunca se deve abranger entre nossos juízos aquilo que não se apresente tão clara e distintamente à nossa inteligência a ponto de excluir qualquer possibilidade de dúvida. (REALE, G.; ANTISERI, D. História da filosofia: Do humanismo a Descartes. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2004. p. 289.) Após a leitura do texto acima, assinale a alternativa correta. a) A evidência, apesar de apreciada por Descartes, permanece uma noção indefinível. b) A evidência é a primeira regra do método cartesiano, mas não é o princípio metódico fundamental. c) Ideias claras e distintas são o mesmo que ideias evidentes. d) A evidência não é um princípio do método cartesiano. 7.(Uel 2010) Observe a tira e leia o texto a seguir: Mas há um enganador, não sei quem, sumamente poderoso, sumamente astucioso que, por indústria, sempre me engana. Não há dúvida, portanto, de que eu, eu sou, também, se me engana: que me engane o quanto possa, nunca poderá fazer, porém, que eu nada seja, enquanto eu pensar que sou algo. De sorte que, depois de ponderar e examinar cuidadosamente todas as coisas é preciso estabelecer, finalmente, que este enunciado eu, eu sou, eu, eu existo é necessariamente verdadeiro, todas as vezes que é por mim proferido ou concebido na mente. (DESCARTES, R. Meditações sobre Filosofia Primeira. Tradução, nota prévia e revisão de Fausto Castilho. Campinas: Unicamp, 2008, p. 25.) Com base na tira e no texto, sobre o cogito cartesiano, é correto afirmar: a) A existência decorre do ato de aparecer e se apresenta independente da essência constitutiva do ser. b) A existência é manifesta pelo ato de pensar que, ao trazer à mente a imagem da coisa pensada, assegura a sua realidade. c) A existência é concebida pelo ato originário e imaginativo do pensamento, o qual impede que a realidade seja mera ficção. d) a existência é a plenitude do ato de exteriorização dos objetos, cuja integridade é dada pela manifestação da sua aparência. e) A existência é a evidência revelada ao ser humano pelo ato próprio de pensar. 8. (ENEM) Após ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito. DESCARTES, R. Meditações. Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979. A proposição “eu sou, eu existo” corresponde a um dos momentos mais importantes na ruptura da filosofia do século XVII com os padrões da reflexão medieval, por A) estabelecer o ceticismo como opção legítima. B) utilizar silogismos linguísticos como prova ontológica. C) inaugurar a posição teórica conhecida como empirismo. D) estabelecer um princípio indubitável para o conhecimento. E) questionar a relação entre a Filosofia e o tema da existência de Deus. 9. (Unioeste 2011) Considerando-se as primeiras linhas das Meditações sobre a filosofia primeira de René Descartes: “Há já algum tempo dei-me conta de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões por verdadeiras e de que aquilo que depois eu fundei sobre princípios tão mal assegurados devia ser apenas muito duvidoso e incerto; de modo que era preciso tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões que recebera até então em minha crença e começar tudo novamente desde os fundamentos, se eu quisesse estabelecer alguma coisa de firme e de constante nas ciências. (...) Agora, pois, que meu espírito está livre de todas Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 7 de 12 as preocupações e que obtive um repouso seguro numa solidão tranquila, aplicar-me-ei seriamente e com liberdade a destruir em geral todas as minhas antigas opiniões” É correto afirmar sobre a teoria do conhecimento cartesiana que a) Descartes não utiliza um método ou uma estratégia para estabelecer algo de firme e certo no conhecimento, já que suas opiniões antigas eram incertas. b) Descartes considera que não é possível encontrar algo de firme e certo nas ciências, pois até então esse objetivo não foi atingido. c) Descartes, ao rejeitar o que a tradição filosófica considerou como conhecimento, busca fundamentar nos sentidos uma base segura para as ciências. d) ao investigar uma base firme e indestrutível para o conhecimento, Descartes inicia rejeitando suas antigas opiniões e utiliza o método da dúvida até encontrar algo de firme e certo. e) Descartes necessitou de solidão para investigar as suas antigas opiniões e encontrar entre elas aquela que seria o verdadeiro fundamento do conhecimento. 10. (Uel 2012) Leia o texto a seguir. Mas há algum, não sei qual, enganador mui poderoso e mui ardiloso que emprega toda sua indústria em enganar-me sempre. Não há, pois, dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e, por mais que me engane, não poderá jamais fazer com que eu nada seja, enquanto eu pensar ser alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito. (DESCARTES, René. Meditações. Trad. J. Guinsburg e Bento Prado Júnior. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p.100 - Coleção Os Pensadores.) A partir do texto e dos conhecimentos acerca de Descartes: a) Apresente o propósito e os graus da dúvida metódica. b) Demonstre como Descartes descobre que o pensamento é a verdade primeira. Gabarito: 1. 97 2.E 3.E 4.B 5.D 6.C 7.E 8.D 9.D 10.Diss AULA 3 – O Empirismo Inglês Empirismo Inglês Corrente filosófica que parte do pressuposto de que o conhecimento humano tem origem nas experiênciassensoriais. Os principais pensadores da tradição empirista são: Francis Bacon, Thomas Hobbes, John Locke e David Hume. Em 1660 é fundada, em Londres, a Royal Society of London for the Improvement of Natural Knowledge, instituição que representa a tradição empirista inglesa e que tem como principal objetivo firmar um método seguro que possa contribuir com o avanço científico. Francis Bacon (1561 - 1626) Contemporâneo a Descartes, é considerado um dos primeiros pensadores modernos. Seu pensamento atrela o progresso social ao desenvolvimento técnico-científico, por meio do lema “saber é poder”. Por isso, para muitos Bacon é considerado já um precursor das ideias iluministas. As duas principais contribuições de Bacon para a história do pensamento filosófico são seu método indutivo e a Teoria dos Ídolos. Ídolos Em sua obra Novum Organum, Bacon preocupou-se inicialmente com a análise de falsas noções (ídolos) que se revelam responsáveis pelos erros cometidos pela ciência ou pelos homens que produzem conhecimento. Esses ídolos foram classificados em quatro grupos: 1) Idola Tribus (ídolos da tribo). Ocorrem por conta das deficiências do próprio espírito humano e se revelam pela facilidade com que generalizamos com base nos casos favoráveis ou em observações imediatas. O homem, que se entende como o padrão das coisas, faz com que todas as percepções dos sentidos e da mente sejam tomadas como verdade, limitando as possibilidades de conhecimento do mundo. Tais ídolos são, portanto, inerentes à natureza humana, à própria tribo ou condição humana. 2) Idola Specus (ídolos da caverna). Resultam da educação e da pressão dos costumes, que conformam a humanidade a visões de mundo preestabelecidas. Há uma alusão à alegoria da caverna platônica, pois Bacon faz referência às correntes que nos fixam ao mundo sensível: nossas crenças, nossos valores e nossas opiniões. 3) Idola Fori (ídolos do foro - vida pública). Estes estão vinculados à linguagem e decorrem das dificuldade de comunicação e do próprio mau uso da língua; 4) Idola Theatri (ídolos do teatro - autoridade). Decorrem da irrestrita subordinação à autoridade de pensamentos e doutrinas, tal como a física aristotélica, que do ponto de vista empírico carecia de demonstração, mas que era considerada verdadeira por pressuposto de autoridade. Assim, é preciso propor uma nova forma, um novo modelo de ciência que não caia na mesma armadilha dos ídolos. O modelo para Bacon é o Método Indutivo, caracterizado pela observação dos fenômenos, por meio de experiências, para que se possa chegar a uma regularidade desses mesmos fenômenos. Com a percepção dessa regularidade, o cientista pode fazer relação entre elas até chegar a uma generalização ou a uma lei. Usando o método indutivo, a ciência estabelecerá conhecimento seguro e conquistará avanços na parte técnica. Tal conhecimento deve exercer controle sobre a natureza e é essa justamente a ideia expressa em sua famosa frase: “saber é poder”. http://pt.wikipedia.org/wiki/Platão Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 8 de 12 John Locke (1632 – 1704) Publica a obra Ensaio sobre o Entendimento Humano, em 1690. Acredita que as representações do real são sempre derivadas das percepções sensíveis. O conhecimento, portanto, não é inato, mas resulta do modo como elaboramos as informações provenientes da experiência. Defende a ideia de que a mente humana é uma página em branco (tábula rasa) que se constitui a partir das experiências. David Hume (1711 – 1776) O escocês David Hume levou o empirismo a níveis radicais. Nas suas principais obras Tratado sobre a natureza humana (1739) e Investigação sobre o entendimento humano (1748), encontramos sua tese principal, semelhante à dos outros empiristas, de que todas as ideias se originam da experiência sensível. Contudo, o que é importante na obra de Hume é notar como ele leva esse princípio a consequências que estão além dos seus contemporâneos, chegando a beirar o ceticismo. Além disso, cunha um novo conceito, o hábito, que vai exercer forte influência sobre filósofos posteriores, como Immanuel Kant. Hume parte das premissas empiristas, estabelecendo uma distinção entre impressões (dados fornecidos pelos sentidos) e ideias (representações da memória ou da imaginação). Acredita que percepção forma todas as ideias. Quanto mais próximas cronologicamente da experiência, maior força e nitidez possuem tais ideias. Por isso, para ele, os fenômenos da percepção são sempre particulares. Os conceitos são formados a partir de generalizações de casos particulares que captamos por meio de nossas experiências. Não existe, por exemplo, a ideia geral de árvore, mas sim cada árvore que vemos. A nossa mente opera, assim, de modo a extrair os aspectos gerais dos fenômenos e criar relações entre eles, tais como as noções de causalidade. Tendemos a, ao observar algo imediato, supor que isso seja o efeito de algo ou causa de um próximo efeito, porém, para Hume, estamos restritos às experiências momentâneas e não temos o poder de alcançar tamanhas suposições. A causalidade, ou seja, a relação entre diferentes fenômenos, é, para Huem, um hábito criado pelo pensamento. O que para muitos outros filósofos seria razão, para Hume é apenas o hábito ou costume de associar ideias que têm origem na experiência. Desse modo, Hume entende que somos dotados de um mecanismo psicológico que nos leva a encontrar semelhanças ou algum padrão de repetição nos fenômenos e é por meio desse processo, o hábito, que tiramos as nossas conclusões acerca da realidade. Porém, tais conclusões não geram um conhecimento seguro, uma vez que dependem de fatores subjetivos. “Todo o poder criador da mente reduz- se à simples faculdade de combinar, transpor, aumentar ou diminuir os materiais fornecidos pelos sentidos e pela experiência”, afirma Hume. Por que associamos ideias? Por repetição ou semelhança. Se vivemos em uma região em que todos coelhos são brancos, tendemos a associar a espécie animal a esta cor. Se comemos um alimento todos os dias e, em uma viagem, observamos algo semelhante, tendemos a classificar aquilo como um alimento mesmo sem termos experimentado. Essas associações, contudo, atingem somente probabilidades, jamais certezas. Podemos incidir em erros seguindo semelhantes especulações. Afinal, estamos circunscritos em nosso próprio campo de experimentação, que é limitado, mas tendemos a tirar conclusões gerais, que buscam explicar a realidade como um todo. Hume, como vimos, duvida da possibilidade de alcançarmos um conhecimento verdadeiro (essencial e completo) acerca da realidade. Por isso, podemos dizer que ele radicaliza as bases do Empirismo e alcança o que muitos definem como CETICISMO RELATIVO, uma vez que não duvida da nossa capacidade de percepção imediata da realidade, mas põe em xeque as conclusões que tiramos por meio do hábito. Para o filósofo, as verdades só podem ser constatadas em termos particulares, jamais de modo generalizado. Em uma das partes de sua obra Ensaio acerca do entendimento humano, Hume procura desconstruir o argumento cartesiano da prova da existência de Deus, mostrando que Deus, como ideia, é fruto de conclusões que obtemos projetando elementos de nossas experiências diretas para preencher as lacunas da realidade que não compreendemos. AULA 4 – O Criticismo de Kant Immanuel Kant (1724 – 1804) Filósofo alemão, um dos principais expoentes do século XVIII e de toda a filosofia moderna. Nasceu, cresceu e trabalhou por toda a vida na cosmopolita cidade portuária de Konigsberg (atual Kaliningrado), então parte da Prússia. Embora nunca tenha deixado a província natal, tornou-se um filósofo internacionalmente conhecido ainda em vida. Estudou na Universidade de Konigsberg e lecionou na mesma universidade ao longo de toda sua vida. Após uma fase em que defende preceitos semelhantes aosdemais pensadores iluministas, como a valorização da racionalidade humana e seu poder de romper com a ignorância e com a alienação, Kant adentra em sua fase célebre, conhecida como criticismo ou fase crítica. Tal fase corresponde à maturidade do pensamento do autor, após seus cinquenta anos de vida. Influenciado por David Hume, desperta de seu “sono dogmático” e questiona a capacidade da racionalidade humana compreender a realidade tal como é em si mesma. Em todo a sua obra, Kant dialoga com o pressuposto iluminista de que a razão autônoma é capaz de produzir conhecimento. Ele parte da tese de que “a razão tende a libertar a humanidade de seu estado de menoridade”, porém, acredita que posicionar a filosofia no “projeto iluminista” implica em se analisar criticamente a razão humana, estabelecendo os limites do que esta pode conhecer. Essa busca pelos limites da racionalidade humana é o que decide aprofundar por meio de suas obras críticas: Critica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e Crítica das Faculdades do Juízo. Tais obras solidificam o Criticismo, vertente filosófica desenvolvida por Kant. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 9 de 12 Crítica à Razão Pura Promove uma análise crítica da razão humana e dos limites do conhecimento, O que a razão pode conhecer do real? Como o conhecimento se processa? Os juízos Dialogando com as vertentes do Racionalismo e do Empirismo, Kant busca analisar o que a razão consegue conhecer de modo puro, ou seja, a razão por ela mesma. Ao fazer esta análise, constata que a razão não traz, de modo inato, nenhuma informação acerca da realidade física ou metafísica, mas possui a capacidade de produzir um conhecimento lógico e universal, que Kant classifica como juízo analítico. Juízo analítico: é fruto de uma operação racional, de deduções lógicas que a racionalidade alcança por ela mesma. Por isso, trata-se de um conhecimento independente da experiência (a priori). É um instrumento de análise do próprio pensamento, mas não conclui nada acerca da realidade externa. Para Kant, o juízo analítico é aquele em que o predicado está contido no conceito do sujeito. Como exemplo, temos a seguinte afirmação: “o quadrado tem quatro lados”. Juízo sintético: representa o conhecimento obtido por meio da experiência (a posteriori). Nesta forma de conhecimento o predicado não está contido no sujeito, por isso Kant acredita que a experiência acrescenta conteúdo à forma lógica da racionalidade. Quando digo que “aquela caneta é azul”, é necessária uma informação sensível posterior para que o conhecimento possa ser validado. Porém, o juízo sintético se limita ao tempo e espaço em que a experiência está circunscrita, portanto, não constitui um juízo necessário e universal. Juízo sintético a priori: para Kant, a ciência deve se basear numa terceira forma de juízo, capaz de sintetizar os outros dois. Para isso, a mente do cientista deve ser capaz de produzir juízos que dependam da experiência, mas que possam ser universais e necessários, ou seja, que transcendam os limites daquele fenômeno em particular. Síntese entre racionalismo e empirismo O conhecimento, para Kant, está relacionado, portanto, à nossa capacidade de produzir juízos sintéticos a priori. Isso acontece porque os dados fornecidos pela experiência são organizados dentro dos nossos moldes racionais. A razão é uma estrutura vazia, anterior à experiência e independente desta (a priori), porém os conteúdos que a razão conhece e nos quais ela pensa dependem da experiência (a posteriori). A experiência não é a causa das ideias, mas é a ocasião para que a razão, recebendo a matéria ou o conteúdo, formule as ideias. Experiência: fornece os conteúdos, a matéria do conhecimento. RAZÃO Forma universal e necessária do conhecimento. Recebe as informações do meio e as organiza de acordo com suas formas estruturais: sensibilidade: noções temporais e espaciais; entendimento: organiza os conteúdos enviados pela sensibilidade em categorias (qualidade; quantidade; causalidade; finalidade; verdade; falsidade; universalidade e particularidade). “O entendimento nada pode intuir e os sentidos nada podem pensar. Só pela sua reunião se obtém conhecimento” Revolução Copernicana de Kant O “eu” é condicionante no processo de conhecimento. O objeto apenas se encaixa nos moldes da percepção humana. Não é o objeto que determina o sujeito, mas o sujeito que determina o objeto. O objeto só se torna cognoscível à medida que há um sujeito que pode conhecê-lo e isso depende da estrutura de nossa razão (formas a priori). Por isso, o mundo não é senão aquilo que pode ser conhecido pelo sujeito, é sua representação. “A razão só entende aquilo que produz segundo seus próprios planos” Impossibilidade da Metafísica A razão possui essas estruturas como meio de conhecimento. Por serem universais e necessárias, o conhecimento é racional e verdadeiro para os seres humanos. Isso implica que podemos conhecer a realidade dentro dos limites do cognoscível. O que não se pode supor é que com essas estruturas possa-se conhecer a realidade tal como esta é em si mesma. O erro dos inatistas e empiristas foi supor que a nossa razão alcança a realidade em si , o númeno, quando na verdade só podemos captar a realidade como fenômeno, ou seja, a realidade organizada pela razão, que submete os conteúdos da experiência às formas da sensibilidade e do entendimento. 3. Texto complementar KANT: Resposta à Pergunta: Que é esclarecimento? Esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento. A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha, continuem, no entanto de bom grado menores durante toda a vida. São também as causas que explicam por que é tão fácil que os outros se constituam em tutores deles. É tão cômodo ser menor. Se tenho um livro que faz as vezes de meu entendimento, um diretor espiritual que por mim tem consciência, um médico que por mim decide a respeito de minha dieta, etc., então não preciso esforçar-me eu mesmo. Não tenho necessidade de pensar, quando posso simplesmente pagar; outros se encarregarão em meu lugar dos negócios desagradáveis. A imensa maioria da humanidade (inclusive todo o belo sexo) considera a passagem à maioridade difícil e além do mais perigosa, porque aqueles tutores de bom grado tomaram a seu cargo a supervisão dela. Depois de terem primeiramente embrutecido seu gado doméstico e preservado cuidadosamente estas tranquilas criaturas a fim de não ousarem dar um passo fora do carrinho para aprender a andar, no qual as encerraram, mostram-lhes, em seguida, o perigo que as ameaça se tentarem andar sozinhas. Ora, este perigo na verdade não é tão grande, pois aprenderiam muito bem a andar finalmente, depois de algumas quedas. Basta um exemplo deste tipo para tornar tímido o indivíduo e atemorizá- lo em geral para não fazer outras tentativas no futuro. É difícil, portanto, para um homem em particular desvencilhar-se da menoridade que para ele se tornou quase uma natureza. Chegou mesmo a criar amor a ela, sendo por ora realmente incapaz de utilizar seu próprio entendimento, porque nunca o deixaram fazer a tentativa de assim proceder. Preceitos e fórmulas, estes instrumentos mecânicos do uso racional, ou, antes, do abuso de seus dons naturais, são os grilhões de uma perpétua menoridade. Quem deles se livrasse só seria capaz de dar um salto inseguro mesmosobre o mais estreito fosso, porque não está habituado a este movimento livre. Por isso são muito poucos aqueles que conseguiram, pela transformação do próprio espírito, emergir da menoridade e Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 10 de 12 empreender então uma marcha segura. Que, porém, um público se esclareça a si mesmo é perfeitamente possível; mais que isso, se lhe for dada a liberdade, é quase inevitável. Pois, encontrar-se-ão sempre alguns indivíduos capazes de pensamento próprio, até entre os tutores estabelecidos da grande massa, que, depois de terem sacudido de si mesmos o jugo da menoridade, espalharão em redor de si o espírito de uma avaliação racional do próprio valor e da vocação de cada homem em pensar por si mesmo. O interessante nesse caso é que o público, que anteriormente foi conduzido por eles a este jugo, obriga-os daí em diante a permanecer sob ele, quando é levado a se rebelar por alguns de seus tutores que, eles mesmos, são incapazes de qualquer esclarecimento. Vê- se assim como é prejudicial plantar preconceitos, porque terminam por se vingar daqueles que foram seus autores ou predecessores destes. Por isso, um público só muito lentamente pode chegar ao esclarecimento. Uma revolução poderá talvez realizar a queda do despotismo pessoal ou da opressão ávida de lucros ou de domínios, porém nunca produzirá a verdadeira reforma do modo de pensar. Apenas novos preconceitos, assim como os velhos, servirão como cintas para conduzir a grande massa destituída de pensamento. Para este esclarecimento, porém, nada mais se exige senão LIBERDADE. E a mais inofensiva entre tudo aquilo que se possa chamar liberdade, a saber: a de fazer um uso público de sua razão em todas as questões. Ouço, agora, porém, exclamar de todos os lados: não raciocineis! O oficial diz: não raciocineis, mas exercitai-vos! O financista exclama: não raciocineis, mas pagai! O sacerdote proclama: não raciocineis, mas crede! (Um único senhor no mundo diz: raciocinai, tanto quanto quiserdes, e sobre o que quiserdes, mas obedecei!). Eis aqui por toda a parte a limitação da liberdade. Que limitação, porém, impede o esclarecimento? Qual não o impede, e até mesmo favorece? Respondo: o uso público de sua razão deve ser sempre livre e só ele pode realizar o esclarecimento entre os homens. Exercícios das aulas 3 e 4 1. (ENEM) Texto I Experimentei algumas vezes que os sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez. DESCARTES, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1979. Texto II Sempre que alimentarmos alguma suspeita deque uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva esta suposta ideia? E se for impossível atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá para confirmar nossa suspeita. HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento. São Paulo: Unesp, 2004. Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a natureza do conhecimento humano. A comparação dos excertos permite assumir que Descartes e Hume A) defendem os sentidos como critério originário para considerar um conhecimento legítimo. B) entendem que é desnecessário suspeitar do significado de uma ideia na reflexão filosófica e crítica. C) são legítimos representantes do criticismo quanto à gênese do conhecimento. D) concordam que conhecimento humano é impossível em relação às ideias e aos sentidos. E) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento. 2. (Uel 2007) Leia o texto a seguir: “Todos os raciocínios referentes a questões de fato parecem fundar-se na relação de causa e efeito. É somente por meio dessa relação que podemos ir além da evidência de nossa memória e nossos sentidos. [...] Arrisco-me a afirmar, a título de uma proposta geral que não admite exceções, que o conhecimento dessa relação não é, em nenhum caso, alcançado por meio de raciocínios a priori, mas provém inteiramente da experiência, ao descobrirmos que certos objetos particulares acham-se constantemente conjugados uns aos outros.” Fonte: HUME, D. Investigação sobre o entendimento humano. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Editora UNESP, 1999. p. 44-45. Com base no texto e em seus conhecimentos sobre Hume, é correto afirmar que: a) Ao observarmos dois objetos conjugados entre si, podemos observar também a relação de causa e efeito que os une. b) É a razão que nos faz descobrir as causas e efeitos dos acontecimentos. c) Quando raciocinamos a priori e consideramos um objeto ou causa apenas, tal como aparece à mente, independente de toda observação, ele facilmente poderá sugerir-nos a ideia de algum objeto distinto, como seu efeito, e também exibir- nos a conexão inseparável e inviolável entre eles. d) Nenhum objeto jamais revela, pelas qualidades que aparecem aos sentidos, nem as causas que o produziram, nem os efeitos que dele provirão; tampouco nossa razão é capaz de extrair, sem o auxílio da experiência, qualquer conclusão referente à existência efetiva de coisas ou questões de fato. e) Todas as leis da natureza e todas as operações dos corpos são conhecidas pela razão, com o auxílio da experiência. 3. (UNESP) Suponhamos, pois, que a mente é um papel em branco, desprovida de todos os caracteres, sem nenhuma ideia; como ela será suprida? De onde lhe provém este vasto estoque, que a ativa e ilimitada fantasia do homem pintou nela com uma variedade quase infinita? De onde apreende todos os materiais da razão e do conhecimento? A isso respondo, numa palavra: da experiência. Todo o nosso conhecimento está nela fundado, e dela deriva fundamentalmente o próprio conhecimento. (John Locke. Ensaio acerca do entendimento humano [publicado originalmente em 1690], 1999. Adaptado.) Qual é a interpretação de Locke sobre as ideias inatas? Explique quais foram as implicações do pensamento desse filósofo no que se refere à metafísica. 4. (UNESP) “O Iluminismo é a saída do homem de um estado de menoridade que deve ser imputado a ele próprio. Menoridade é a incapacidade de servir-se do próprio intelecto sem a guia de outro. Imputável a si próprios é esta menoridade se a causa dela não depende de um defeito da inteligência, mas da falta de decisão e da coragem de servir-se do próprio intelecto sem ser guiado por outro. Sapere aude! Tem a coragem de servires de tua própria inteligência!” (Immanuel Kant, 1784.) Esse texto do filósofo Kant é considerado uma das mais sintéticas e adequadas definições acerca do Iluminismo. Justifique essa importância comentando o significado do termo “menoridade”, bem como os fatores sociais que produzem essa condição, no campo da religião e da política. Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 11 de 12 5. (Uem 2009) “(...) a própria experiência é um modo de conhecimento que requer entendimento, cuja regra tenho que pressupor a priori em mim ainda antes de me serem dados objetos e que é expressa em conceitos a priori, pelos quais, portanto todos os objetos da experiência têm necessariamente que se regular e com eles concordar.” (KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. São Paulo: Abril Cultural, 1983, p.13). Com base na filosofia de Kant, assinale o que for correto. 01) O método de Kant é chamado criticismo, pois consiste na crítica ou na análise reflexiva da razão, a qual, antes de partir ao conhecimento das coisas, deve conhecer a si mesma, fixando as condições de possibilidade do conhecimento, aquilo que pode legitimamente ser conhecido e o que não. 02) Para Kant, uma vez que os limites do conhecimento científico são os limites da experiência, as coisas que não são dadas à intuição sensível (a coisa em si, as entidades metafísicas como Deus, alma e liberdade) não podem ser conhecidas. 04) Kant mantém-se na posição dogmáticaherdada de Hume. Para os dois filósofos, o conhecimento é um fato que não põe problema. O resultado da crítica da razão é a constatação do poder ilimitado da razão para conhecer. 08) O sentido da revolução copernicana operada por Kant na filosofia é que são os objetos que se regulam pelo nosso conhecimento, não o inverso. Ou seja, o conhecimento não reflete o objeto exterior, mas o sujeito cognoscente constrói o objeto do seu saber. 16) Com a sua explicação da natureza do conhecimento, Kant supera a dicotomia racionalismo-empirismo. O conhecimento, que tem por objeto o fenômeno, é o resultado da síntese entre os dados da experiência e as intuições e os conceitos a priori da razão. 6.(Ufu 2004) Até agora se supõe que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos: todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os mesmos, através do que nosso conhecimento seria ampliado, fracassaram sob esta pressuposição. Por isso, tente-se ver uma vez se não progredimos melhor nas tarefas da Metafísica admitindo que os objetos têm que se regular pelo nosso conhecimento, o que assim já concorda melhor com a requerida possibilidade de um conhecimento a priori dos mesmos que deve estabelecer algo sobre os objetos antes de nos serem dados. O mesmo aconteceu com os pensamentos de Copérnico que, depois das coisas não quererem andar muito bem com a explicação dos movimentos celestes admitindo—se que todo exército de astros girava em tomo do espectador, tentou ver se não seria mais bem-sucedido se deixasse o espectador mover-se e, em contrapartida, os astros em repouso.” KANT, I. Crítica da razão pura São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 14. (Os Pensadores) Considerando a leitura do trecho acima, podemos dizer que a revolução copernicana de Kant é a) uma revolução filosófica e científica segundo a qual o espectador não pode permanecer fixo em sua posição, aprendendo apenas os fenômenos, mas deve considerar que ele mesmo encontra-se em movimento para poder perceber as coisas em si mesmas. b) uma revolução astronômica que pretendeu mudar o curso da Filosofia Moderna, propondo uma reavaliação da física newtoniana. c) uma revolução filosófica que estabeleceu que o conhecimento da coisa em si só pode ser atingido caso haja um cuidadoso estudo dos fenômenos. d) uma revolução filosófica que afirmou a distinção entre fenômeno e coisa em si, qualificando esta última como incognoscível. 7. (Uem 2009) A Filosofia Moderna compreende os séculos XVII e XVIII, caracterizando-se por um acentuado racionalismo que se opõe ao pessimismo teórico do ceticismo, o qual duvida da capacidade da razão humana poder alcançar um conhecimento certo fundamentado em uma verdade universal. Assinale o que for correto. 01) René Descartes, no Discurso do Método, instaura a dúvida metódica; deve ser, portanto, considerado um adepto do ceticismo. 02) O dogmatismo opõe-se ao ceticismo, pois é uma doutrina segundo a qual é possível atingir a certeza de verdades inquestionáveis. 04) Para o racionalismo, o ponto de partida do conhecimento é o sujeito como consciência de si reflexiva, isto é, como consciência que conhece sua capacidade de conhecer. 08) Francis Bacon é um dos mais importantes céticos do século XVII, pois, para ele, o homem nunca poderia libertar- se dos ídolos que impedem sua razão de alcançar qualquer saber efetivo. 16) O racionalismo acredita que a vida ética pode ser totalmente racional, visto que a razão humana é capaz de conhecer a origem, as causas e os efeitos das paixões e das emoções, podendo dominá-las e governá-las. 8. (Ufsj 2012) Os termos “impressões” e “ideias”, para David Hume, são, respectivamente, por ele definidos como a) “nossas percepções mais fortes, tais como nossas sensações, afetos e sentimentos; percepções mais fracas ou cópias daquelas na memória e imaginação”. b) “aquilo que se imprime à memória e nos permite ativar a imaginação; lampejos inéditos sobre o objeto e sua natureza”. c) “o que fica impresso na memória independentemente da força: ação de criar a partir do dado sensorial”. d) “vaga noção do sensível; raciocínio com força de lei que legitima a natureza no âmbito da razão”. 9. (Enem PPL 2018) Quando analisamos nossos pensamentos ou ideias, por mais complexos e sublimes que sejam, sempre descobrimos que se resolvem em ideias simples que são cópias de uma sensação ou sentimento anterior. Mesmo as ideias que, à primeira vista, parecem mais afastadas dessa origem mostram, a um exame mais atento, ser derivadas dela. HUME, D. Investigação sobre o entendimento humano. São Paulo: Abril Cultural, 1973. Depreende-se deste excerto da obra de Hume que o conhecimento tem a sua gênese na a) convicção inata. b) dimensão apriorística. c) elaboração do intelecto. d) percepção dos sentidos. e) realidade transcendental. 10. (Uem 2018) “Devemos recorrer a dois princípios bastante manifestos na natureza humana. O primeiro é a simpatia, ou seja, a comunicação de sentimentos e paixões [...]. Tão estreita e íntima é a correspondência entre as almas dos seres humanos que, assim que uma pessoa se aproxima de mim, ela me transmite todas as suas opiniões, influenciando meu julgamento em maior ou menor grau. Embora, muitas vezes, minha simpatia por ela não chegue ao ponto de me fazer mudar inteiramente meus sentimentos e modos de pensar, raramente [a simpatia] é tão fraca que não perturbe o tranquilo Prof. Maria Helena Filosofia & Sociologia Página 12 de 12 curso do meu pensamento, dando autoridade à opinião que me é recomendada por seu assentimento. O segundo princípio para o qual chamarei a atenção é o da comparação, ou seja, a variação de nossos juízos acerca dos objetos segundo a proporção entre estes e aqueles com os quais comparamos. [...]. Nenhuma comparação é mais óbvia que a comparação conosco; por isso, ela tem lugar em todas as ocasiões e influencia a maioria de nossas paixões. Esse tipo de comparação é diretamente contrário à simpatia em seu modo de operar.” (HUME, D. Tratado da natureza humana. In: SAVIAN FILHO. J. Filosofia e filosofias: existência e sentidos. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016, p. 272). A partir do texto, assinale o que for correto. 01) Entende-se que a simpatia consiste na experiência na qual uma pessoa é influenciada por outra. 02) Para Hume, não é a razão que leva os seres humanos a agir, e sim as emoções. 04) Hume desenvolveu um sistema filosófico moral fundamentado na razão e nos limites dela. 08) É próprio da comparação o fechamento em si, pois aquele que compara não está sujeito à influência. 16) Simpatia e comparação não interferem diretamente em nosso comportamento moral. 11. (Unesp 2018) Se um estranho chegasse de súbito a este mundo, eu poderia exemplificar seus males mostrando-lhe um hospital cheio de doentes, uma prisão apinhada de malfeitores e endividados, um campo de batalha salpicado de carcaças, uma frota naufragando no oceano, uma nação desfalecendo sob a tirania, fome ou pestilência. Se eu lhe mostrasse uma casa ou um palácio onde não houvesse um único aposento confortável ou aprazível, onde a organização do edifício fosse causa de ruído, confusão, fadiga, obscuridade, e calor e frio extremados, ele com certeza culparia o projeto do edifício. Ao constatar quaisquer inconveniências ou defeitos na construção, ele invariavelmente culparia o arquiteto, sem entrar em maiores considerações. (David Hume. Diálogos sobre a religião natural, 1992. Adaptado.) a) Explicite o tema filosófico abordado no texto e sua relação com a criação do mundo. b) Explique como os argumentos do filósofo evidenciam um ponto de vista empirista (fundamentado na experiência) e cético (baseado na dúvida), em contraste com uma concepção metafísica sobre o tema. 12. (Unioeste2018) O filósofo alemão Immanuel Kant formulou, na Crítica da Razão Pura, uma divisão do conhecimento e acesso da razão aos fenômenos. Fenômenos não são coisas; eles nomeiam aquilo que podemos conhecer das coisas, através das formas da sensibilidade (Espaço e Tempo) e das categorias do entendimento (tais como Substância, Relação, Necessidade etc.). Assim, Kant afirma que o conhecimento humano é finito (limitado por suas formas e categorias). Como poderia haver, então, algum conhecimento universalmente válido? Ele afirma que tal conhecimento se formula num “juízo sintético a priori”. Juízos são afirmações; o adjetivo “sintéticos” significa que essas afirmações reúnem conceitos diferentes; “a priori”, por sua vez, indica aquilo que é obtido sem acesso à experiência dos fenômenos, antes deles e para que os fenômenos possam ser reunidos em um conhecimento que tenha unidade e sentido. Com base nisso, indique a alternativa CORRETA. a) Para Kant, o conhecimento humano é diretamente dado pela experiência das coisas, acessíveis pelos sentidos (visão, audição, etc.). b) Juízos sintéticos a priori são afirmações de conhecimento cuja natureza é particular e que se altera caso a caso. c) Se a Metafísica é o conhecimento da essência das coisas elas mesmas, Kant é, na Crítica da Razão Pura, um defensor da Metafísica, e não um defensor da finitude do conhecimento. d) Para Kant, Espaço e Tempo são categorias do entendimento mediante as quais conhecemos os fenômenos. e) Juízos sintéticos a priori permitem organizar o conhecimento, dando a ele validade universal e unicidade. 13. (Uem 2018) “De que todo o nosso conhecimento comece com a experiência, não há a mínima dúvida; pois de que outro modo a faculdade de conhecer deveria ser despertada para o exercício, se não ocorresse mediante objetos que impressionam os nossos sentidos e em parte produzem espontaneamente representações, em parte põem em movimento a nossa atividade intelectual de comparar essas representações, conectá-las ou separá-las, e deste modo transformar a matéria bruta das impressões sensíveis em conhecimento de objetos, que se chama experiência? [...] Mas, ainda que todo o nosso conhecimento comece com a experiência, nem por isso todo ele origina-se da experiência.” (KANT, I. Crítica da razão pura. In: MARCONDES, D. Textos básicos de Filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 2007, p. 117). A partir do texto citado, assinale o que for correto. 01) O conhecimento tem seu início na experiência sensível; isso não significa, todavia, que ele esteja preso à experiência e limitado por ela. 02) A faculdade de conhecer está em repouso e é despertada pela experiência sensível, sendo essa a fonte primeira do conhecimento. 04) As representações sensíveis das coisas são espontâneas e não precisam de qualquer interferência dos sentidos. 08) A faculdade de conhecer pode produzir conhecimentos por si mesma, visto que as impressões sensíveis não são a origem de todo o conhecimento. 16) A faculdade de conhecer opera sobre as representações das coisas advindas por meio dos sentidos e produz, assim, novos conhecimentos. Gabarito: 1.E 2.D 3.Diss 4.Diss 5.(27) 6.D 7.(22) 8.A 9.D 10.(11) 11. Diss 12.E 13.(27)
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