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60 Unidade II Unidade II 3 ADMINISTRAÇÃO DO CAPITAL DE GIRO Na presente unidade abordaremos as nuances referentes à administração do capital de giro para compreender sua importância para a gestão financeira. Toda empresa, em qualquer setor da economia, depende de fundos para manter em funcionamento suas operações diárias; sejam instituições financeiras, comerciais ou industriais, privadas ou públicas, com ou sem fins lucrativos, as empresas precisam controlar seu fluxo de recursos. Os planejamentos estratégicos dos diversos tipos de empresa estimam suas finanças no longo prazo com o intuito de evidenciar os melhores caminhos para sua capitalização. Isso é abordado nos planejamentos financeiros respectivamente de curto e longo prazos. No curto prazo a gestão do capital de giro assume grande importância, portanto, para tudo o que é feito em qualquer tipo de empresa, desde os maiores até os pequenos estabelecimentos. Com isso, para que se possa tomar decisões mais conscientes, é fundamental que se tenha uma avaliação do valor de custo e seu potencial de vendas e lucros. O planejamento financeiro é uma ferramenta importante para a operação das empresas, pois fornece um guia de orientação para a coordenação e o controle de cada movimento da empresa com a premissa de atingir seus objetivos. Este processo de elaboração do planejamento financeiro começa pela parte estratégica, que é a de longo prazo, pois ela orienta a elaboração do planejamento de curto prazo. Esses também são chamados de planejamentos operacionais – ou seja, os planejamentos estratégicos, de longo prazo, desdobram-se em outros planejamentos, chamados de operacionais. Observação As empresas sujeitas a alto grau de incerteza operacional ou com ciclos de produção relativamente curtos, ou ambos, tendem a usar períodos de planejamento mais curtos. A elaboração do orçamento anual, de curto prazo, constitui uma parte importante do processo de planejamento da empresa, pois envolve todos os seus administradores e define as metas para o plano operacional da empresa. As principais informações utilizadas para sua confecção são a previsão de vendas e os dados operacionais e financeiros e resultam em diversos orçamentos operacionais, orçamento de caixa e as demonstrações financeiras projetadas. A principal informação para o processo de planejamento financeiro é a previsão de vendas da empresa, que lhe permite estimar o valor provável referente à receita de vendas no período. Em geral, a previsão de vendas para determinado período é elaborada pelo departamento de marketing e, com base 61 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS na receita de vendas projetada, o administrador financeiro estima as entradas e saídas de caixa mensais decorrentes desta previsão para o que serão os desembolsos para a produção, a aquisição de itens para estoques e as despesas operacionais decorrentes da manutenção da estrutura da empresa necessárias a produção e vendas. O orçamento de caixa, ou projeção de caixa, é uma demonstração das entradas e saídas de caixa embasada nas previsões que a empresa tem para o desenvolvimento de suas atividades operacionais. Trata-se de uma demonstração do fluxo de caixa (DFC) projetada, e que servirá para o gerenciamento e o controle do desenvolvimento das atividades no curso do período para a qual foi planejada. Esse processo vai determinar a quantidade de recursos financeiros que cada empresa precisará ao longo do período de atuação, ou seja, o capital de giro. 3.1 Conceito de capital de giro e suas especificidades Como vimos na unidade anterior, em que foi abordado o cálculo do capital de giro líquido (CGL) com o intuito de introduzir os indicadores de liquidez, precisamos lembrar a definição de capital de giro. Lembrete Segundo Gitman (2010), o ativo circulante, comumente chamado de capital de giro, representa a porção do investimento que circula, de uma forma para outra, na condução normal dos negócios. A administração financeira de curto prazo tem como objetivo principal gerenciar os elementos que compõem tanto o ativo circulante como o passivo circulante, e isso demanda boa parte do tempo dos gestores financeiros. Um estudo com empresas listada na Fortune 1000 revelou que mais de um terço do tempo dedicado à administração financeira é gasto com a gestão do ativo circulante e cerca de um quarto com a gestão do passivo circulante (GITMAN, 2010, p. 546). Nesse sentido, é sabido que os pagamentos são mais previsíveis que os recebimentos, e isso tem influência direta no montante que deve estar disponível para que a empresa sustente suas atividades operacionais. Esses recursos são utilizados para comprar matérias-primas, pagar fornecedores, salários e outros custos e despesas. Tais recursos devem ser provenientes das vendas, e a previsibilidade de possíveis déficits de caixa ajudará o gestor financeiro a planejar a busca por recursos para tal fim. A gestão do ativo circulante permite ao gestor financeiro determinar qual a quantidade ideal de dinheiro que deve estar disponível para manter a atividade operacional da empresa. 62 Unidade II Nesse sentido, há algumas ações que alteram de alguma forma o capital de giro das empresas; podemos citar o aumento das vendas (ou seja, o faturamento), que vai gerar lucros, o aumento do capital por meio da entrada de novos sócios ou, ainda, a integralização de capital feita pelos atuais sócios, os empréstimos efetuados junto aos bancos, de preferência com taxas de juros que sejam atrativas, sejam eles privados ou públicos, ou a venda de algum ativo não circulante imobilizado tangível do qual a empresa possa (ou seja interessante) se desfazer, entre outras possibilidades. Administrar o capital de giro significa fazer a gestão das contas do ativo circulante (disponibilidades, contas a receber e estoque) e do passivo circulante (fornecedores, contas a pagar, salários, encargos e impostos). Essas contas mostram a circulação dos valores na empresa e a transformação que ocorre de trabalho para dinheiro e de mercadoria para dinheiro. Portanto, a previsibilidade entre as entradas e as saídas – para que a primeira tenha totais condições de suprir os recursos demandados pela segunda, ou seja, a geração de recursos e a aplicação dos recursos – é uma dificuldade; por esse motivo as empresas também usam a necessidade de capital de giro (NCG), pois é bastante possível que a empresa precise recorrer a empréstimos ou adiantamentos, tais como os direitos a receber pelas vendas a prazo. O CGL, abordado na unidade I, também será utilizado nesta unidade, pois efetuaremos sua comparação com a NCG. Ele é identificado quando subtraímos o passivo circulante do ativo circulante, e espera-se que seja sempre positivo. Quanto mais positivo for seu resultado, melhor estará o capital de giro da empresa. Ou seja, quanto menor for o saldo do CGL, maior a possibilidade de necessitar de um financiamento para a diferença entre a NCG e o CGL. Ainda sobre a política de capital de giro, é importante saber qual deve ser o nível adequado dos ativos circulantes e como eles devem ser financiados. Podemos destacar algumas abordagens referentes às políticas adotadas pelas empresas para efetuar este financiamento. A política liberal de investimentos em ativos circulantes é baseada numa política de concessão de crédito aos clientes com menores restrições e que denota postura mais liberal da empresa em relação aos prazos concedidos às vendas a prazo; essa abordagem pode resultar em índices mais altos de direitos a receber, porém, pode comprometer os objetivos assumidos no que diz respeito ao período médio de recebimento das vendas (PMRV), concorrendo para a manutenção de altos níveis de caixa e estoque. A política restritiva de investimentos em ativos circulantes é contrária à anterior. Parte-se de uma concessão de crédito muito mais criteriosa para as vendas a prazo; essa postura ajuda a empresa a minimizar a inadimplência e favorece o atingimentode bons níveis de PMRV, porém pode causar queda nos níveis de vendas da empresa por causa da sua pouca flexibilidade. A política moderada de investimentos em ativos circulantes fica entre as condições das duas anteriores para manter os níveis de contas a receber sob controle sem prejudicar a concessão de crédito para vendas a prazo. Há a necessidade de financiamento de capital de giro, que pode ser permanente ou sazonal. Ela é permanente quando existe a necessidade de investimento constante em ativos operacionais, resultante de vendas constantes; ou sazonal quando os investimentos em ativos operacionais variam no tempo em razão do comportamento cíclico das vendas. 63 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS A política de financiamento do capital de giro pode ser agressiva, quando prevê maior utilização das dívidas de curto prazo para financiamento de suas necessidades sazonais e das dívidas de longo prazo para as necessidades permanentes; ou pode ser conservadora, quando prevê somente a utilização de dívidas de longo prazo para financiamento de todas as suas necessidades, sejam elas sazonais ou permanentes. A política agressiva representa maior risco, pois o uso do crédito de curto prazo é mais arriscado, devido à possibilidade de que a dívida contraída seja executada com maior rapidez e o resultado operacional do período tenha que gerar lucros suficientes para saldá-los. Há ainda um risco extra: a dívida pode também ser executada imediatamente, requerendo o pagamento do montante; além disso, o custo pode aumentar em virtude de aumento das taxas. Todavia, há algumas vantagens na adoção dessa política, tais como a flexibilidade: o crédito de curto prazo é menos oneroso, em razão do tempo de amortização, tem maior velocidade, por ser adquirido mais rapidamente e com menos burocracia, e as taxas de juros são geralmente mais baixas. Seria melhor que as empresas pudessem financiar seu capital de giro apenas com o resultado de suas atividades operacionais, porém isso dificilmente acontece e muitas vezes as empresas são obrigadas a recorrer a fontes financeiras, como os bancos comerciais, as financeiras e as empresas de factoring, que, nesse caso, são as fontes de financiamento do capital de giro mais utilizadas pelas empresas. Para que uma empresa consiga crédito em uma instituição financeira, efetua-se uma análise de risco de crédito que inclui a análise das informações qualitativas e de informações que possam restringir sua obtenção. A análise das informações financeiras tem peso decisivo na concessão do crédito, pois identifica a capacidade de a empresa gerar caixa e de efetuar seus pagamentos, e denota seu comprometimento com terceiros. Por isso a atuação do gestor financeiro no controle da administração do capital de giro da empresa é tão importante, pois dele também dependerá o custo do crédito que será obtido, e quanto maior o risco apresentado pela empresa tomadora, maior será a taxa de juros e a exigência de garantias. Existem diversas modalidades de créditos bancários para capital de giro, por exemplo, o financiamento de curtíssimo prazo, de um a dez dias, ou o desconto de títulos, que é o adiantamento dos direitos referentes às vendas a prazo, tópico este que será abordado mais profundamente ainda nesta unidade. Os bancos procuram evitar a liberação de dinheiro para quem tem alto volume das vendas concentrado em poucos clientes – a chamada concentração de sacados. Além desse tipo de financiamento ao capital de giro, a empresa pode necessitar de recursos a serem investidos em oportunidades de crescimento e expansão, que precisarão de muito mais capital do que somente o que a empresa tem a receber das vendas para clientes. Os empréstimos obtidos para capital de giro são destinados a atender essas necessidades, e os custos dos juros e das taxas variam de acordo com as garantias apresentadas. A operação desses empréstimos oferece vantagens em relação ao desconto de recebíveis, pois as linhas de crédito para capital de giro 64 Unidade II dos bancos oficiais permitem que você use os recebíveis da empresa (bem como veículos e imóveis) como garantia, fiança ou aval. Há ocasiões em que as empresas precisam de recursos para pagar tributos e obrigações sociais; essa é uma operação de crédito em que o banco proporciona à empresa a possibilidade de recolher tais valores de maneira pontual, como as indústrias que possuem ciclos mais longos de recebimento porque efetuam vendas com prazos superiores a 30 dias e são obrigadas a recolher os impostos, obviamente antes de receber pelas vendas que fizeram. Dessa forma, quando falta caixa, é necessário recorrer a empréstimo para financiar o pagamento dos impostos. Situações como esta não ocorrem em países desenvolvidos, mas aqui são classificadas como Custo Brasil, ou seja, a burocracia das leis que pune de maneira inacreditável quem produz e gera empregos. Médias e pequenas empresas muitas vezes encaram situações parecidas com relação ao pagamento da folha salarial referente ao décimo terceiro salário e também precisam recorrer ao banco para financiar recursos para seu pagamento. É constante a necessidade de conciliar recebimentos e pagamentos, a fim de se evitar que a empresa se torne tecnicamente insolvente; portanto, a conversão do orçamento de caixa em um caixa realizado torna-se muito importante, e é nesse contexto que surge o conceito do ciclo de conversão de caixa. O entendimento deste conceito é essencial para a administração financeira de curto prazo. Para o cálculo do ciclo de conversão de caixa é necessário compreender o conceito do ciclo operacional – período de tempo que vai do começo do processo de produção, com o empenho de recursos presentes no ativo circulante até o recebimento de caixa resultante da venda do produto acabado, que é o seu retorno à conta de origem. 3.1.1 O ciclo operacional (CO) O ciclo operacional (CO) das empresas mede o período de tempo que o processo para o qual o negócio foi constituído leva para se concluir. Como mede todo o processo operacional, ele considera o tempo desde o empenho dos recursos na compra de matéria-prima até o recebimento da venda efetuada do produto acabado. Em suma, o CO mede o tempo que leva para uma empresa concluir as atividades operacionais que representam seu objeto social. O CO envolve as operações mencionadas no quadro a seguir: Quadro 15 – Ciclo operacional (1) Ciclo operacional Compra Armazenagem de matéria-prima Produtos em transformação Produtos intermediários Produtos acabados Transferência ao distribuidor Venda dos produtos Recebimento (caixa) 65 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Este período que chamamos CO engloba o período de tempo da administração de duas categorias de ativos de curto prazo registrados no ativo circulante (estoques e direitos a receber proveniente das vendas). O processo de produção do CO envolve a compra de matéria-prima e insumos para a produção do que será vendido (ou a aquisição de produtos acabados, quando empresa comercial), além dos valores referentes às vendas a prazo – ou seja, os direitos a receber referentes às vendas. Há dois indicadores, abordados na unidade anterior, que medem tanto o período que os recursos financeiros da empresa ficam “parados” no estoque como o período que tais recursos passam investidos em crédito aos clientes. Esses dois indicadores são o período médio de renovação de estoque (PMRE) e o período médio de recebimento das vendas (PMRV). Após identificarmos estes indicadores como formadores do CO, temos uma equação de cálculo, que pode ser deduzida a partir do quadro a seguir (originado do quadro anterior, com a inserção dos indicadores): Quadro 16 – Ciclo operacional (2) Ciclo operacional Compra Armazenagem de matéria-prima Produtos em transformação Produtos intermediários Produtos acabados Transferência ao distribuidor Venda dos produtos Recebimento (caixa) PMRE – Período médio de renovação de estoquesPMRV – Período médio de recebimento de vendas Com base nisso, apresentamos a equação para cálculo do CO: CO = PMRE + PMRV Quadro 17 – Ciclo operacional (3) Ciclo operacional PMRE PMRV Se levarmos em consideração as informações usadas na unidade I para calcularmos os referidos indicadores, podemos saber qual o CO da empresa em questão. No caso do giro de estoque (GE), que utiliza o custo das vendas, a equação para cálculo é a seguinte: GE = custo das vendas / estoque GE = R$ 80.000,00 / R$ 10.000,00 GE = 8 vezes Como vimos anteriormente, o indicador chamado de idade média do estoque (IME) mede a quantidade de dias que o estoque se renova, e, por isso, também pode ser chamado de PMRE ou, ainda, dias de estoque – tais nomenclaturas significam a mesma coisa, mas trazem abordagens diferentes. No estudo do CO usamos a nomenclatura PMRE, que é calculado usando o número encontrado no GE e depende da unidade de tempo do custo das vendas utilizado no cálculo. 66 Unidade II No caso do exemplo da unidade I, são 360 dias. Sendo assim, o cálculo desse indicador é dado pela seguinte equação: PMRE = 360 / GE Usando os números adotados para exemplificar os cálculos até aqui teríamos o seguinte: PMRE = 360 / GE PMRE = 360 / 8 PMRE = 45 dias Além do PMRE, para compormos o número do CO precisamos saber o PMRV. No exemplo anterior havia uma estimativa de que a receita de vendas da empresa teria sido de R$ 150.000,00 (dos quais R$ 120.000,00 representavam as vendas a prazo anuais) e que essa empresa possuiria registro no balanço patrimonial de um montante de direitos a receber referentes às vendas a prazo no valor de R$ 18.000,00; registrado como clientes. Com isso, efetuamos o cálculo do indicador da seguinte maneira: Vendas médias diárias a prazo = receita de vendas a prazo / 360 Vendas médias diárias a prazo = R$ 120.000,00 / 360 Vendas médias diárias a prazo = R$ 333,33 Depois, calculamos o PMRV: PMRV = direitos a receber referentes às vendas a prazo / vendas médias diárias a prazo PMRV = R$ 18.000,00 / R$ 333,33 PMRV = 54 dias Após rememorarmos o cálculo dos dois indicadores, podemos calcular qual seria o CO de uma empresa que apresentasse esses números: CO = PMRE + PMRV CO = 45 dias + 54 dias CO = 99 dias Quadro 18 – Ciclo operacional (4) CO = 99 dias PMRE = 45 dias PMRV = 54 dias Neste caso podemos afirmar que o dinheiro empenhado no ato da compra dos materiais para estoque retorna ao caixa da empresa 99 dias após o desenvolvimento de suas atividades operacionais, culminado com o recebimento das vendas efetuadas a prazo. 67 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Podemos utilizar as demonstrações da empresa Votorantim, de 2020, que ilustraram o cálculo dos indicadores de dívida líquida. Com base nas informações desses documentos, demonstraremos qual seria seu CO. • Custo das vendas = R$ 29.620,00 • Estoques = R$ 4.724,00 • Direitos a receber referentes às vendas a prazo = R$ 3.209,00 • Receita de vendas = R$ 36.667,00 Lembrete Os números das demonstrações da Votorantim estão expressos em milhões de reais. GE = custo das vendas / estoque GE = R$ 29.620,00 / R$ 4.724,00 GE = 6,2701 PMRE = 360 / GE PMRE = 360 / 6,2701 PMRE = 57,41 dias Como entendemos que não exista fração da unidade de tempo dias, neste estudo assumimos para o PMRE o resultado de 57 dias. Precisamos agora apurar o PMRV, começando pelas vendas médias diárias a prazo: Vendas médias diárias a prazo = receita de vendas / 360 Vendas médias diárias a prazo = R$ 36.667,00 / 360 Vendas médias diárias a prazo = R$ 101,85 PMRV = direitos a receber referentes às vendas a prazo / vendas médias diárias a prazo PMRV = R$ 3.209,00 / R$ 101,85 PMRV = 31,50 dias Como no indicador anterior, por entendermos que não existe fração da unidade de tempo dias, neste estudo assumimos para o PMRV o resultado de 32 dias. 68 Unidade II Assim, o CO da Votorantim, com base nos números de suas demonstrações, é de: CO = PMRE + PMRV CO = 57 dias + 32 dias CO = 89 dias Quadro 19 – Ciclo operacional (5) CO = 89 dias PMRE = 57 dias PMRV = 32 dias Como vimos, o CO mede o período de tempo que representa o desenvolvimento das atividades da empresa, mas as atividades que compõem o CO não se relacionam apenas a esses dois indicadores; envolvem também o crédito concedido pelos fornecedores. No próximo item a ser estudado – o ciclo financeiro –, vamos ver de que maneira essa informação é agregada ao estudo do CO. 3.1.2 O ciclo financeiro (CF) ou ciclo de conversão de caixa Os processos de produção e vendas não se limitam apenas aos indicadores que formam o ciclo operacional: também estão envolvidos no ciclo financeiro (CF), igualmente conhecido como ciclo de conversão de caixa. Apesar de ser uma derivação do CO, o CF abarca uma nova e importante informação: as obrigações a pagar referentes às compras (que, como vimos anteriormente, podem receber diferentes nomenclaturas, como contas a pagar aos fornecedores). Para concretizar sua composição, o CF considera também o crédito que o fornecedor oferece à empresa, ou seja, o prazo que a empresa tem para pagar ao fornecedor pelas compras efetuadas. Esse prazo é medido pelo período médio de pagamento das compras (PMPC) e também é mensurado em dias. Se a empresa efetua compras a prazo e, portanto, recebe esse crédito (prazo) de seus fornecedores, os recursos financeiros não saem de seu caixa imediatamente. Com isso, há uma redução no tempo em que esses recursos ficam empatados no ciclo operacional. A essa redução ocasionada pelo prazo oferecido pelos fornecedores damos o nome de CF, pois é a partir do pagamento aos fornecedores que o dinheiro sai do caixa da empresa e que medimos o tempo efetivo que ele demora a retornar após essa saída. Quadro 20 – Ciclo financeiro (1) Ciclo operacional Compra Armazenagem de matéria-prima Produtos em transformação Produtos intermediários Produtos acabados Transferência ao distribuidor Venda dos produtos Recebimento (caixa) Crédito concedido pelos fornecedores 69 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Nesse caso, CF é o período de tempo medido desde a saída do dinheiro do caixa da empresa para pagamento aos fornecedores até o momento em que ocorre o recebimento no caixa das vendas efetuadas – ou seja, é o período em que realmente o dinheiro demora para retornar ao caixa da empresa após sua saída. Quadro 21 – Ciclo financeiro (2) Ciclo operacional Compra Armazenagem de matéria-prima Produtos em transformação Produtos intermediários Produtos acabados Transferência ao distribuidor Venda dos produtos Recebimento (caixa) Crédito concedido pelos fornecedores Ciclo financeiro ou ciclo de conversão de caixa Este período de tempo medido pelo crédito dado pelos fornecedores é o indicador calculado na unidade I chamado de PMPC. Com a inserção do PMPC, veremos a seguir como podemos medir o CO e o CF: Quadro 22 – Ciclo financeiro (3) Ciclo operacional Compra Armazenagem de matéria-prima Produtos em transformação Produtos intermediários Produtos acabados Transferência ao distribuidor Venda dos produtos Recebimento (caixa) PMRE – Período médio de renovação de estoques PMRV – Período médio de recebimento de vendas PMPC - Período médio de pagamento de compras Ciclo financeiro ou ciclo de conversão de caixa Ao observarmos esse quadro, podemos deduzir que a equação de cálculo do CF é: CF = CO – PMPC Se a equação do CO é a seguinte: CO = PMRE + PMRV Então, a equação do CF ficará: CF = CO – PMPC CF = PMRE + PMRV – PMPC Podemos usar o exemplo de cálculo do PMPC feito na unidade I para mostrar como o CO dá origem ao CF. No exemplo apresentado, utilizamos o valor do custo das vendas de R$ 80.000,00, que foi empregado no cálculo do GE, e o registro no balanço patrimonial de um montante de obrigações a pagar referentes às compras no valor de R$ 14.000,00, registrado como fornecedores; então, calculamos as compras médias e o referido indicador: 70 Unidade II Compras médiasdiárias = custo das vendas / 360 Compras médias diárias = R$ 80.000,00 / 360 Compras médias diárias = R$ 222,22 PMPC = obrigações a pagar referentes às compras / valor das compras médias diárias PMPC = R$ 14.000,00 / R$ 222,22 PMPC = 63 dias A partir desse número temos como calcular o CF referente ao primeiro exemplo dado aqui: CO = PMRE + PMRV CO = 45 dias + 54 dias CO = 99 dias CF = CO – PMPC CF = 99 dias – 63 dias CF = 36 dias Ou, ainda: CF = PMRE + PMRV – PMPC CF = 45 dias + 54 dias – 63 dias CF = 36 dias Esse número significa que, dos 99 dias que a empresa demora para desenvolver todo o ciclo de suas atividades operacionais, 63 dias são desenvolvidos com o crédito dado pelos fornecedores, recursos de terceiros, para somente então saírem recursos financeiros da empresa para pagá-los; a partir daí, levam 36 dias para que os recursos efetivamente retornem ao caixa da empresa. Quadro 23 – Ciclo financeiro (4) CO = 99 dias PMRE = 45 dias PMRV = 54 dias PMPC = 63 dias CF = 36 dias Podemos utilizar as demonstrações da empresa Votorantim (cujas informações estão demonstradas em milhões de reais) também nesse caso, uma vez que já calculamos o seu CO para calcularmos o CF. Na sequência, calcularemos seu PMPC; para isso, vamos precisar apenas do valor das obrigações referentes às compras, pois o custo das vendas já foi mencionado no cálculo do GE: 71 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS • Fornecedores = R$ 5.404,00 Compras médias diárias = custo das vendas / 360 Compras médias diárias = R$ 29.620,00 / 360 Compras médias diárias = R$ 82,28 PMPC = obrigações referentes às compras / valor das compras médias diárias PMPC = R$ 5.404,00 / R$ 82,28 PMPC = 65,68 dias Portanto, como não usamos números decimais para a unidade de tempo em dias, assumimos o resultado como 66 dias; o cálculo do CF fica assim: CO = PMRE + PMRV CO = 57 dias + 32 dias CO = 89 dias CF = CO – PMPC CF = 89 dias – 66 dias CF = 23 dias Ou, ainda: CF = PMRE + PMRV – PMPC CF = 57 dias + 32 dias – 66 dias CF = 23 dias Esse número significa que, dos 89 dias que a Votorantim demorava em 2020 para desenvolver todo o ciclo de suas atividades operacionais (ou seja, o CO), 66 dias eram desenvolvidos com o crédito dado pelos fornecedores, recursos de terceiros, para somente então haver recursos financeiros da empresa para pagá-los; a partir daí, levava 23 dias para que os recursos efetivamente retornassem ao caixa da empresa. O quadro a seguir apresenta o CF da empresa Votorantim. Quadro 24 – Ciclo financeiro (5): Votorantim CO = 89 dias PMRE = 57 dias PMRV = 32 dias PMPC = 66 dias CF = 23 dias Qualquer alteração no número encontrado em qualquer um desses indicadores poderá afetar os saldos de caixa da empresa para melhor ou para pior, a depender do resultado obtido pela empresa referente ao período observado. Vamos utilizar este número do CF para efetuar projeções no estudo do próximo assunto, a NCG. 72 Unidade II 3.1.3 Necessidade de capital de giro (NCG) Após termos estudado o CO e o CF, podemos agora entender o uso destes dois números para o planejamento do valor para o capital de giro, ou seja, a NCG, que representa o montante de recursos necessários para desenvolvimento das atividades operacionais para o qual a empresa foi constituída. Notamos que qualquer alteração que venha a ocorrer em um dos indicadores que compõem o CF fará com que essa necessidade de capital possa ser maior ou menor, e muitas empresas estabelecem objetivos para que o resultado se reflita na NCG. Os conceitos de capital de giro nos dão uma certeza: é extremamente difícil sincronizar as entradas de caixa com as saídas de caixa, ou seja, combinar recebimentos com pagamentos para que não ocorram déficits de caixa; como sabemos, estes déficits vão ocorrer, porém, quanto mais previsíveis forem, mais barata será a captação dos referidos recursos. O financiamento das atividades operacionais da empresa faz com que ela tenha maior necessidade de capital, pois, para aumentar as vendas, pode ser necessário elevar o volume de estoques e, consequentemente, ampliar o crédito para os clientes, aumentando o valor dos direitos a receber referentes às vendas – o que representa mais dinheiro parado por determinado tempo e maior necessidade de recursos financeiros também. O maior problema de uma empresa não é ter NCG, mas tê-la em um volume muito maior que seu CGL, pois isso pode demonstrar uma necessidade muito grande de recursos financeiros e impactar nos custos financeiros da empresa no longo e no curto prazo, o que pode resultar em sua insolvência. Como o cálculo da NCG deriva do CF, atentemo-nos ao quadro a seguir. Quadro 25 – Ciclo financeiro (6) Ciclo operacional PMRE PMRV PMPC Ciclo financeiro Ao observar este quadro, podemos perceber que a empresa necessita de capital de giro para o período de tempo compreendido pelo CF, pois é a quantidade de dias do ciclo operacional não coberto pelo crédito dos fornecedores. Vejamos a equação: CF = PMRE + PMRV – PMPC Essa equação resulta num dado valor que será descrito em uma unidade de tempo (dias), não em um valor monetário (R$), e isso é do que precisamos para determinar a NCG. Ainda, a equação nos permite chegar à seguinte conclusão: a NCG é exatamente o CF escrito em outra unidade, conforme a figura seguinte. 73 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS CF = PMRE + PMRV – PMPC NCG = + – Valor médio mantido em estoque Direitos a receber provenientes das vendas a prazo Obrigações a pagar provenientes das compras a prazo Figura 2 – Relação entre necessidade de capital de giro e ciclo financeiro Essa visão é possível, pois, no cálculo do PMRE, a principal conta contábil envolvida é o valor médio do estoque, uma vez que, inclusive, o custo das vendas tem seu valor originado nos produtos e mercadorias que saíram do estoque quando foram vendidos. Ao tratarmos do PMRV, os direitos aos quais se referem o indicador podem estar registrados em contas contábeis com diferentes nomenclaturas – tais como clientes, contas a receber, duplicatas a receber ou, ainda, títulos a receber –, e estão no subgrupo do balanço patrimonial em seu ativo circulante, chamado direitos. No caso do PMPC, a principal conta contábil envolvida é a de fornecedores, mas é possível que tenhamos valores registrados em outras contas contábeis do passivo circulante, tais como duplicatas a pagar, contas a pagar ou, ainda, títulos a pagar. Essa é uma questão de nomenclatura apenas, pois o que é importante neste estudo é reconhecer o conceito por trás de cada valor. Se usarmos os números dos cálculos dos indicadores da unidade I, podemos calcular a NCG daquela empresa, que apresentou o seguinte CF: CF = PMRE + PMRV – PMPC CF = 45 dias + 54 dias – 63 dias CF = 36 dias Nesse cálculo, o valor do estoque foi de R$ 10.000,00, o valor dos direitos a receber referentes às vendas a prazo foi de R$ 18.000,00 e o valor dos fornecedores foi de R$ 14.000,00. Elaborando o cálculo da NCG conforme a fórmula apresentada na figura anterior, teremos: NCG = estoque + direitos – fornecedores NCG = R$ 10.000,00 + R$ 18.000,00 – R$ 14.000,00 NCG = R$ 14.000,00 Podemos comparar, então, a NCG com o CGL para saber em que situação a empresa está do ponto de vista de seu capital de giro. Vejamos: CGL = R$ 29.000,00 (conforme visto na unidade I) 74 Unidade II Como neste caso o CGL está superior à NCG, podemos afirmar que a empresa está bem, pois não necessita de financiamento para o capital de giro e consegue sustentar de maneira independente o desenvolvimento de suas atividades operacionais. Voltemos ao caso da Votorantim. O resultado do CF foi o seguinte, como já calculamos nesta unidade: CF = PMRE + PMRV – PMPC CF = 57 dias + 32 dias – 66 dias CF = 23 dias Vamos calcular também a NCG referente à Votorantim; para isso, precisamos calcular o CGL: CGL = ativo circulante – passivo circulante CGL = R$ 26.436,00 – R$ 13.336,00 CGL = R$13.100,00 Devemos, agora, calcular sua NCG: NCG = estoque + direitos referentes às vendas – obrigações referentes às compras A NCG da Votorantim envolverá as seguintes contas contábeis, conforme seu balanço patrimonial presente na unidade I (quando efetuamos o cálculo dos indicadores de dívida ativa): NCG = estoque + contas a receber de clientes – fornecedores NCG = R$ 4.724,00 + R$ 3.209,00 – R$ 5.404,00 NCG = R$ 2.529,00 Portanto, a Votorantim também apresenta uma situação de capital de giro favorável, pois seu CGL é maior que sua NCG. Em alguns casos, principalmente para negócios de menor tamanho (por exemplo, microempresas e empresas de pequeno porte), o horizonte de controle é bastante curto, e pode ser necessário que a empresa saiba qual sua necessidade de capital de giro para períodos curtíssimos – poderíamos até mesmo dizer diariamente. Nesse caso, podemos usar essa relação direta do CF com a NCG para sabermos o valor diário que ela necessita. A partir dos dados de ambos os indicadores, é possível deduzir como encontrar esta relação entre tempo do CF e recursos da NCG. A diferença entre a NCG e o CGL demonstra a necessidade que a empresa pode apresentar de financiamento para capital de giro. Vejamos a seguir. 75 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Necessidade de capital de giro Capital de giro líquido Necessidade de financiamento Tempo Dinheiro ($) 0 Figura 3 – Necessidade de financiamento do capital de giro Se o CF representa o período de tempo em que os recursos retornam ao caixa após o pagamento das compras, e para este tempo a empresa precisa de recursos próprios, então pode-se deduzir que a NCG de uma empresa é o valor do qual ela precisa para sustentar as atividades durante o período de tempo em que transcorre o CF. Sendo assim, a NCGdiária pode ser calculada como: NCGdiária = NCG / CF No caso do exemplo em que a NCG foi igual a R$ 14.000,00 e o CF foi de 36 dias, o valor seria o seguinte: NCGdiária = R$ 14.000,00 / 36 NCGdiária = R$ 389,00 (aproximadamente) No caso da empresa Votorantim, em que temos a NCG de R$ 2.529,00 e o CF de 23 dias, teríamos: NCGdiária = NCG / CF NCGdiária = R$ 2.529,00 / 23 NCGdiária = R$ 110,00 (aproximadamente) Podemos ainda evidenciar que, para efeito de planejamento financeiro, é possível estabelecer objetivos e metas para os números dos ciclos operacional e financeiro, pois podemos utilizar os números que foram abordados como aceitáveis na unidade I. Assim, por exemplo, podemos definir que existe um objetivo de CF para o setor industrial: CF = PMRE + PMRV – PMPC CFideal = 60 dias + 29 dias – 30 dias CFideal = 59 dias (no máximo) 76 Unidade II E, para as empresas comerciais, com exceção daquelas que trabalhem com produtos perecíveis ou que sejam prestadoras de serviço, seria: CF = PMRE + PMRV – PMPC CFideal = 45 dias + 29 dias – 30 dias CFideal = 44 dias (no máximo) Com base nestes parâmetros para o ciclo financeiro (CFideal), poderíamos calcular a NCGideal para cada empresa usando seus números de CF e NCG; a equação seria a seguinte: NCGideal = NCG / CF × CFideal Com base nesses cálculos e no que foi estudado referente a NCG, é possível dizer que as empresas com altos padrões de gestão financeira e que venham a apresentar bons números em outros indicadores apresentarão NCGideal maior do que a NCG que possuem. 3.1.4 Administração das disponibilidades As disponibilidades são um subgrupo do ativo circulante no balanço patrimonial, conforme o quadro a seguir, e estão representadas pelas contas contábeis caixa, bancos e aplicações financeiras – estas últimas são consideradas disponibilidades por estarem no rol das aplicações de curtíssimo prazo e que podem ser convertidas em saldo no banco imediatamente. Quadro 26 – Balanço patrimonial de curto e longo prazo Balanço patrimonial contendo contas de curto e longo Ativo circulante = curto prazo Caixa Bancos Aplicações Direitos a receber Estoques Passivo circulante = curto prazo Fornecedores Empréstimos e financiamentos Passivo não circulante = longo prazo Empréstimos e financiamentos Ativo não circulante = longo prazo Realizável a longo prazo Patrimônio líquido Capital social Reservas de lucros Lucros ou prejuízos acumulados Elas são os recursos financeiros que as empresas utilizam e precisam ter para poderem pagar suas obrigações de maneira imediata. O controle das disponibilidades da empresa na condução de sua gestão financeira também é chamado de administração das disponibilidades ou administração de caixa. Entre as motivações específicas para realização desta atividade está a necessidade de efetuar transações, ou seja, efetuar 77 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS pagamentos de obrigações que estão programadas, como aquelas que se referem às contas do passivo circulante, ou seja, duplicatas de fornecedores, salários, aluguéis, impostos, empréstimos, financiamentos etc. Além disso, existe a necessidade de manter recursos financeiros em reserva – valores que são mantidos acima do que representam as necessidades imediatas, como precaução contra possíveis imprevistos em decorrência de eventuais erros de planejamento, ou atraso de clientes ao quitar suas compras a prazo, além de eventos não programados, como reparações imprevistas. Estes recursos em reserva ficam investidos em aplicações financeiras de curtíssimo prazo; portanto, são títulos de alta liquidez, que podem ser resgatados imediatamente se assim for necessário, e uma parte deles pode ser mantida em aplicações com o intuito de efetuar especulação financeira, realizando a compra de materiais para estoque com preços vantajosos, de títulos por preços abaixo do mercado ou de outros bens dos quais a empresa prevê utilização futura. Há também as contas correntes remuneradas, em que a empresa pode manter recursos para desenvolver um bom relacionamento com as instituições financeiras que guardam seus recursos; o intuito, neste caso, é obter linhas de crédito com taxas mais acessíveis, por exemplo, em descontos de duplicatas. Para efetuar uma administração de caixa eficiente, as empresas elaboram o que é chamado de orçamento de caixa, ou seja, uma DFC projetada para discriminar todas as suas previsões de entradas e saídas de recursos. Na unidade I já apresentamos um quadro com um modelo de DFC para a elaboração do orçamento de caixa. Este orçamento vai proporcionar ao gestor financeiro uma possibilidade de antecipar as necessidades de recursos para cobrir os possíveis déficits que, por terem sido antecipados, proporcionam ao gestor a garantia de melhores condições para financiamento desses valores. Um problema que precisa ser abordado é que, se, por um lado, manter recursos em disponibilidade para a empresa representa liquidez, por outro, também representa custos decorrentes de sua manutenção; tais custos representam ganhos não realizados, que poderiam ser auferidos ao investir esses valores em outra opção com prazo mais longo e que remunerasse os recursos com taxas superiores às de curtíssimo prazo. Sobre essa questão, também é preciso ponderar que, em alguma eventualidade, se a empresa precisasse financiar déficits de caixa com recursos aplicados em aplicações de prazos mais longos, isso acarretaria em perdas maiores, pois empréstimos tendem a ter taxas muito mais altas que as pagas por recursos das empresas aplicados em seus produtos. A empresa também precisa controlar e saber qual o saldo ideal de caixa, pois, a princípio, esses recursos financeiros não recebem nenhuma remuneração e representam apenas uma reserva para liquidez. 78 Unidade II Algumas empresas determinam que seu saldo de caixa deve ser um percentual da receita de vendas; além disso, é necessário saber que sobre os empréstimos para este fim incide o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o qual veremos mais adiante, ao abordarmos operações de desconto de duplicata. Além disso, as operações de aplicações financeiras sofrem a incidência do impostode renda; portanto, todos esses aspectos devem ser levados em consideração. Geralmente, uma estratégia que é usada pelos gestores financeiros das empresas é a de acelerar recebimentos, por meio de um departamento de cobrança que seja eficiente e que consiga, sem aplicar técnicas rígidas que impactem as vendas, manter os recebimentos em dia e sem atrasos, dialogando com clientes que procuram retardar os pagamentos. Isso não significa que esses clientes atrasem os pagamentos de maneira deliberada, mas que deixam para pagar estritamente nas datas de vencimento. Com isso, evitam o pagamento antecipado, mantendo bom relacionamento com os fornecedores para que estes lhe propiciem melhores prazos, e alocam os recursos financeiros momentaneamente excedentes em aplicações de curtíssimo prazo. 3.1.5 Desconto de duplicatas Neste tópico vamos abordar uma importante ferramenta para os gestores financeiros, mas que precisa ser bem compreendida e usada de maneira inteligente, por causa de alguns aspectos que vamos destacar mais adiante. As duplicatas a receber se originam nas vendas de mercadorias e produtos realizadas a prazo, o que significa crédito concedido pela empresa vendedora, em que ela financia as operações dos seus clientes pelo prazo estipulado para que os clientes efetuem o pagamento dos valores comprados. Com essa medida, as empresas conseguem aumentar suas vendas e provavelmente seus lucros, pois o lucro depende da boa gestão financeira efetuada pela empresa. Sabemos que as vendas a crédito impactam a necessidade de capital de giro, pois os recursos financeiros vão demorar o período concedido aos clientes para retornar ao caixa da empresa. Isso pode resultar em custos financeiros, como os que serão resultantes do não recebimento; por isso é necessário que a empresa tenha critério na concessão de crédito para escolher os clientes que mereçam ser beneficiados. Para contar com recebimentos mais rápidos, em alguns casos as empresas incluem uma cláusula de desconto financeiro para incentivar os clientes a anteciparem os pagamentos, o que permite às empresas reduzir os investimentos em direitos a receber proveniente das vendas. No entanto, isso repercute também no lucro das empresas, diminuindo sua margem, por isso mesmo é preciso analisar minuciosamente o custo-benefício para adotar esta medida. Como já vimos, as empresas precisam de recursos para financiar suas atividades, principalmente ao longo do CF, e um dos meios de financiar o montante necessário para investimento em suas atividades operacionais é chamado de desconto de duplicatas ou desconto de contas a receber, usado de maneira 79 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS frequente como garantia de empréstimos de curto prazo, pois as duplicatas representam um título com bastante liquidez. Quando uma empresa busca uma instituição financeira para solicitar um empréstimo de curto prazo, oferecendo suas duplicatas a receber como garantia, a instituição vai avaliar a carteira de títulos e escolher aquelas que lhe parecem mais confiáveis, e vai elaborar uma lista com suas datas de vencimento, valores, clientes da empresa, entre outras informações. Depois que a instituição escolhe os títulos que vai aceitar como garantia, ela ajusta o valor de face dos títulos para se enquadrarem nas condições que lhe interessam ao conceder este tipo de crédito. Depois, é determinada uma porcentagem do valor total de títulos aceitos como garantia – costumeiramente, em torno de 50% a 90% –, e esta será entregue à empresa como adiantamento; ainda, para que o credor não tenha risco de perder os direitos sobre as garantias que lhe foram dadas, é feito um registro público do direito sobre a garantia, chamado de gravame. Esse tipo de operação tem custo alto para as empresas, cerca de 2% a 5% maior que a taxa básica de juros; além disso, pode-se cobrar uma taxa de serviço de até 3% para custos administrativos. Essa ferramenta geralmente é utilizada sem que se notifiquem os clientes da empresa que tiveram seus títulos concedidos como garantia, mas, em alguns casos, a instituição financeira pode exigir que se permita a notificação. Nesse caso, o cliente da empresa é avisado de que o título que registra a dívida que ele tem para com a empresa foi negociado, e que ele deverá, então, efetuar o pagamento diretamente à instituição financeira. Além do alto custo para as empresas, existe ainda outra desvantagem: a possibilidade de o cliente não efetuar o pagamento. O título concedido em garantia, mas não quitado, é deduzido da garantia, e a empresa deve efetuar a reposição, concedendo, então, outro título em garantia; nesse caso, ela fica com o déficit do não recebimento do pagamento pelo crédito que concedeu ao seu cliente, o que significa custo em dobro. Estas operações podem ser calculadas das seguintes maneiras: DB = S × i × n DR = S × [(i × n) / (1+ i × n)] Onde: DB = desconto bancário ou comercial (por fora); DR = desconto racional (por dentro); S = valor nominal do título; i = taxa de juros do desconto; n = prazo (até o vencimento do título). 80 Unidade II O valor que a empresa vai receber usando esta forma de cálculo para antecipação é dado pela seguinte equação: P = S – D – IOF Onde: P = valor recebido pela venda do título; D = desconto a ser aplicado; IOF = Imposto sobre Operações Financeiras. O IOF, que incide nessas operações, é um imposto federal recolhido pelas instituições bancárias e financeiras, calculado a partir do valor nominal do título, que deverá ser abatido do valor a ser pago pelo título. A equação para cálculo do IOF é a seguinte: IOF = S × % IOF × n Onde: S = valor nominal do título; % IOF = valor percentual do Imposto sobre Operações Financeiras; n = prazo (até o vencimento do título). Para calcular o valor do IOF, devemos usar a alíquota convertida para a mesma unidade de tempo do prazo “n”. Em 2015, a alíquota passou de 1,5% para 3% ao ano. Além deste valor, é cobrada uma taxa de 0,38%, que incide na abertura das operações de crédito. Ao realizar a conversão para duas possíveis variações de prazo da taxa ao ano, que é de 3%, teríamos os seguintes percentuais de IOF: 0,246626977% para períodos em mês – porém vamos utilizar 0,24663% para facilitar a operação dos cálculos – e um percentual diário de 0,008211115%, incidindo sobre o valor nominal do título. Caso uma empresa queira adiantar o valor de suas contas a receber no valor de R$ 200.000,00, com vencimentos em média de 60 dias, quanto ela receberia em uma operação de desconto de duplicatas em que a instituição financeira cobrasse uma taxa de desconto de 5% ao mês? 81 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Observação Em equações, a taxa deve ser usada na forma centesimal, ou seja, o seu número dividido por cem, por exemplo: 3% = 3 / 100 = 0,03. Precisamos identificar as informações existentes na proposição: S = R$ 200.000,00 (valor nominal dos títulos); i = 5% ao mês; n = 60 dias = 2 meses (como a taxa de desconto “i” está na unidade mês, podemos converter o prazo para meses). Considerando que o valor a ser entregue à empresa terá o desconto do IOF, que temos duas formas de calcular o valor a ser descontado e que o IOF tem uma única forma de cálculo, podemos começar o cálculo pelo IOF. O IOF que incide na operação em questão é dividido em duas partes, sendo a primeira com a alíquota única de 0,38%: IOF = S × % IOF × n IOF = R$ 200.000,00 × 0,0038 IOF = R$ 760,00 Podemos calcular a segunda parte do IOF usando o prazo em meses; nesse caso, consideramos a alíquota de 0,24663%: IOF = S × % IOF × n IOF = R$ 200.000,00 × 0,0024663 × 2 IOF = R$ 986,52 Ou podemos calcular a segunda parte do IOF usando o prazo em dias, conforme o vencimento original dos títulos; nesse caso, usamos a alíquota de 0,008211115%: IOF = S × % IOF × n IOF = R$ 200.000,00 × 0,00008211115 × 60 IOF = R$ 985,33 A diferença que é observada entre o valor de R$ 986,52 e R$ 985,33 se dá pelo fato de que ainda háoutras casas decimais além das que foram utilizadas no cálculo com a taxa diária; mesmo assim, podemos perceber que os valores são bastante próximos. 82 Unidade II Com isso, para finalizar o cálculo do exemplo, vamos assumir que o valor total de IOF na operação será a soma dos R$ 760,00 + R$ 986,52, perfazendo, então, R$ 1.746,52. Agora podemos calcular o valor do desconto propriamente dito, seja ele bancário ou racional. Vamos começar pelo bancário: DB = S × i × n DB = R$ 200.000,00 × 0,05 × 2 DB = R$ 20.000,00 Calculado o valor do desconto bancário e já sabendo o valor do IOF na operação, podemos calcular o valor a ser recebido: P = S – D – IOF P = R$ 200.000,00 – R$ 20.000,00 – R$ 1.746,52 P = R$ 178.253,48 Agora vamos calcular pelo sistema do desconto racional: DR = S × [(i × n) / (1 + i × n)] DR = R$ 200.000,00 × [(0,05 × 2) / (1+ 0,05 × 2)] DR = R$ 200.000,00 × [0,10 / (1 + 0,10)] DR = R$ 200.000,00 × [0,10 / 1,10] DR = R$ 200.000,00 × 0,0909 DR = R$ 18.180,00 Percebam que o valor do desconto ficou menor neste sistema: o desconto bancário foi igual a R$ 20.000,00, já o desconto racional foi de R$ 18.180,00. No final das contas, isso vai permitir à empresa que está efetuando a operação receber uma quantidade maior de recursos pelos títulos descontados. Vejamos: P = R$ 200.000,00 – R$ 18.180,00 – R$ 1.746,52 P = R$ 180.073,48 Pelo desconto bancário a empresa receberia R$ 178.253,48, e pelo desconto racional, R$ 180.073,48 – ou seja, a diferença seria de R$ 1.820,00, o que representa 0,91% sobre o valor nominal dos títulos R$ 200.000,00. Isso acontece porque no desconto bancário a taxa incide sempre sobre o valor inicial de R$ 200.000,00; nesse caso, ainda incidiu duas vezes, por eventualidade do prazo de 60 dias (ou 2 meses, como foi utilizado por causa da unidade de tempo da taxa de desconto). Já no caso do desconto racional é feita uma normalização da taxa [(i × n) / (1 + i × n)] para que isso não ocorra. 83 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Será sempre melhor para a empresa recorrer a uma instituição que calcule o desconto por meio do desconto racional; no caso de não ser possível, é bom que o gestor financeiro conheça o mecanismo para negociar com a instituição, mostrando o cálculo e buscando negociar um valor melhor para a empresa. Há ainda outro modelo praticado pelas empresas como tomada de crédito lastreado em contas a receber. É o factoring, que significa, de maneira geral, a venda das contas a receber a uma instituição financeira; para isso é cobrado um deságio, valor sobre o montante dos títulos. Esse mecanismo de crédito tem funcionamento muito semelhante ao desconto de duplicatas; quando ele ocorre de forma contínua, a empresa acaba determinando sua concessão de crédito com base nos critérios que o factor (agente com quem a empresa contrata a operação de factoring) utiliza para aceitar os títulos da empresa como garantia nas operações de crédito entre eles. Uma vantagem do factoring é que a maior parte dos contratos é estabelecida com notificação e sem recurso, o que significa que o cliente que deve o título à empresa é notificado e fica ciente que sua dívida foi adquirida pelo fator e que deverá efetuar o pagamento diretamente a ele. Para a empresa, o fato de o contrato ter essa característica “sem recurso” significa que no caso de inadimplência do cliente a empresa não sofrerá débitos por causa disso, ficando o factor responsável pela cobrança. Além disso, em muitos casos o contrato de factoring funciona como uma conta corrente, em que adiantamentos efetuados à empresa terão a cobrança de juros estabelecida em contrato. Saiba mais O artigo a seguir oferece mais algumas informações a respeito do assunto desconto de duplicatas. SILVA, A. M. L. Aferição do custo efetivo final das operações de desconto de duplicatas em bancos comerciais no Brasil – para empresas Lucro Real, Lucro Presumido e Simples Nacional. Anais do XVI Congresso Brasileiro de Custos, Fortaleza, Ceará, 3-5 nov. 2009. Disponível em: https://cutt.ly/ZPTJHuz. Acesso em: 7 jan. 2022. 4 ESTOQUE E LOGÍSTICA Na unidade I, em que estudamos o indicador que se refere ao GE e ao PMRE, vimos a importância de uma boa administração desse ativo tão essencial para a empresa. É relevante considerarmos que, diante da evolução dos processos administrativos e do aumento das atividades industriais e comerciais, muita coisa precisou evoluir. Devido à modernização das atividades 84 Unidade II referentes à administração de estoques, vamos perceber que a evolução da logística permitiu uma melhora na gestão financeira do montante de capital investido em estoque. Durante muito tempo a logística foi encarada como uma atividade apenas operacional, mas sua evolução mostrou que ela tomou importância estratégica para as empresas, tanto que passamos a ouvir o termo logística integrada quando falamos de assuntos relacionados à administração das empresas em geral. No que diz respeito ao gerenciamento de sua cadeia de suprimentos, isso permitiu à logística tornar-se uma ferramenta que proporciona às empresas um gerenciamento mais eficiente de seus custos. Como a logística evoluiu de uma atividade que tinha caráter mais operacional para uma questão muito mais estratégica, ela passou a ser uma ferramenta muito importante e que necessita de planejamento, seja qual for o tópico abordado: produção, armazenagem, vendas, entregas, entre outras ações das empresas. 4.1 Administração de estoque As atividades operacionais das empresas comerciais ou industriais dependem muito dos níveis de seus estoques, e este ativo precisa ser muito bem gerido para que não seja um motivo de problemas na liquidez das empresas. Portanto, a administração dos estoques deve otimizar os investimentos neste tipo de ativo, e a gestão financeira nesse sentido tem a função de monitorar o montante de recursos financeiros aplicados em estoques, que devem ser adequados às exigências da área de produção e dos clientes para que não haja excesso, ou mesmo falta, de itens. Eles correspondem às quantidades necessárias de matérias-primas, produtos em transformação, produtos intermediários e produtos acabados em relação à indústria, e mercadorias para as empresas comerciais. Mercadorias nada mais são que os produtos acabados da indústria que as empresas comerciais adquirem para revender. O gestor financeiro não é o responsável pela gestão física do estoque, porém, seu auxílio consiste em estabelecer um volume de recursos financeiros ideal que seja equilibrado em relação às necessidades e ao tamanho da empresa do ponto de vista de suas finanças. Conforme já mencionado anteriormente, os termos utilizados para nomenclatura dos estoques variam de acordo com o objeto social da empresa. As empresas comerciais possuem mercadorias (produtos acabados comprados de seus fornecedores) em seus estoques; já as industriais podem ter três tipos de estoques diferentes: • Estoque de matérias-primas – materiais que serão aplicados nos processos de produção da empresa e passarão por transformação até tornarem-se o produto acabado. 85 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS • Estoque de produtos em elaboração – aqueles que ainda não completaram o processo de transformação, mas já não podem ser considerados matérias-primas. • Estoque de produtos acabados – aqueles que completaram todo o processo de produção e estão prontos para serem comercializados, porém ainda não foram vendidos. Estoques bem administrados são responsáveis pelos bons resultados das atividades das empresas, pois vão suprir e apoiar os processos de produção e vendas. Um estoque mal dimensionado faz com que ocorram interrupções no processo de produção de uma indústria; além disso, faz com que empresas comerciais percam oportunidade de vendas quando, eventualmente, pedidos não podem ser atendidos por um ou outro item que, em circunstâncias normais, estariam em estoque no momento em que surgiu a demanda. A administração deestoque significa a gestão de alguns custos que são inerentes a tal função em busca de alguns benefícios possíveis. Tais custos podem ser divididos em dois tipos: custos de reposição e custos de manutenção. Entre os custos de reposição temos: • Custos de preparação e emissão de pedidos. • Custos de acompanhamento dos pedidos. • Custos de recebimento e inspeção dos pedidos. • Custos de processamento de contas a pagar. Já entre os custos de manutenção temos: • Custos de armazenagem. • Custos de movimentação do estoque. • Custos de seguro do estoque. • Custos referentes às perdas. • Custo do capital investido no estoque. Os custos referentes às perdas envolvem possível obsolescência, deterioração, furtos, quebras, vencimento da validade etc. 86 Unidade II Outro custo muito importante, cujo valor em muitos casos é difícil mensurar, é o que se refere às perdas de vendas por falta de itens em estoque. Nem sempre é possível ter todos os itens de um catálogo em estoque, mas atualmente as empresas possuem sistemas informatizados e parametrizados que, com base em um histórico de vendas, oferecem uma sugestão de compras que seja capaz de minimizar esse tipo de custo. Em alguns casos, contudo, para que que o parâmetro se constitua de maneira eficiente, é necessário um profissional de compras com bom conhecimento do processo e do sistema. Seria muito bom que as empresas não necessitassem da manutenção de estoques para suas atividades. Como isso não é possível, elas adotam práticas que as permitem manter níveis sensivelmente reduzidos de estoques para liberar recursos financeiros a serem aplicados em alternativas mais rentáveis. Na intenção de manter os estoques em níveis satisfatórios do ponto de vista econômico, as empresas utilizam técnicas de administração de estoque, como classificação ABC e o lote econômico de compra. A classificação ABC, ou curva ABC, tem seu princípio atribuído a Vilfredo Pareto – um estudioso italiano que, no final do século XIX, observou, em um estudo de riqueza e renda, que 20% da população concentrava em seu poder 80% da riqueza do país. Da observação apresentada surgiu o princípio 80–20, justamente por causa dos resultados encontrados no estudo de Pareto – tais como em vendas, 20% dos vendedores recebem mais de 80% das comissões pagas, pois representam 80% das vendas. No caso de descobertas científicas, 80% delas são realizadas por apenas 20% dos cientistas. Em relação à administração de estoques, o princípio 80–20 também é pertinente, pois geralmente 20% dos itens representam 80% do faturamento das vendas. Como mencionamos, essa observação levou à criação da técnica de administração de estoque chamada de curva ABC, em que as letras representam classes de classificação dos itens estocados conforme a demanda por recursos que representam: • Classe A: os itens de maior valor do estoque, que correspondem a 20% dos itens do estoque e representam 80% do valor do estoque. • Classe B: os itens de valor intermediário, que correspondem a 30% dos itens do estoque e representam 10% do valor do estoque. • Classe C: os itens de valor mais baixo e que demandam menor atenção no gerenciamento. Correspondem a 50% dos itens do estoque e representam, também, 10% do valor do estoque, assim como os itens da classe B. Esses percentuais não são absolutos e podem variar de uma empresa para outra, porém estarão sempre muito próximos disto: um número pequeno de itens representando a maior movimentação em dinheiro do estoque. 87 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS 0% A B C 0% 20% 40% 60% 80% 100% Va lo r d os it en s e m e st oq ue (% ) Itens em relação ao total do estoque (%) 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Figura 4 – Curva ABC Há ainda alguns sistemas de parametrização de estoques que adotam uma subdivisão em cada uma das classes A, B e C em níveis de valores referentes a cada item, estabelecendo uma escala de valor para os itens, classificando-os em 1, 2 e 3. O número 1 é destinado aos itens cujas compras representam valores maiores, o número 2, para itens com valores intermediários, e o número 3, por fim, para itens com valores pequenos. Isso faz com que a curva ABC assuma nove classes de itens no estoque: A1, A2, A3, B1, B2, B3, C1, C2 e C3. Este conceito é mais importante para o gestor de compras que para o gestor financeiro, mas é sempre importante saber que há essa possibilidade para concentrar os recursos nos itens mais interessantes de se manter em estoque. A técnica conhecida como lote econômico de compra (LEC) é aquela que procura determinar uma quantidade ótima para aquisição de determinado item para estoque que possa, pelo estabelecimento do valor a ser pago, minimizar os custos envolvidos na operação de compra e estocagem. Uma condição natural de negociação em aquisição de itens para estoque é que quanto maior a quantidade adquirida, melhor serão o preço a ser pago e os custos envolvidos nos processos de compra e transporte diluídos na quantidade adquirida. Contudo, temos que levar em consideração que os custos de armazenagem podem aumentar devido à quantidade que será estocada. Para encontrarmos a quantidade de determinado item por meio da técnica do LEC, usamos a seguinte equação: LEC = ( ) 2 C P M × × 88 Unidade II Onde: C = quantidade movimentada por determinado item do estoque em determinado período; P = custo de pedido; M = custo de manutenção da unidade de cada item no estoque, por período. Podemos, por exemplo, calcular o LEC de um item que movimenta 4.500 unidades por ano, apresentando o custo de pedido de R$ 28,00 e o custo de manutenção da unidade em estoque de R$ 20,00 por ano. Ao utilizarmos a equação apresentada, teremos: LEC = ( ) 2 C P M × × LEC = ( ) 2 4.500 28 20 × × LEC = 252.000 20 LEC = 12.600 LEC = 112,2497, ou seja, 112 unidades Em nosso exemplo, a quantidade econômica de 112 unidades estabelece um estoque médio de 56 unidades. Uma vez que estima-se que o recebimento de um novo pedido ocorra no momento em que o estoque chegar a zero, teremos uma quantidade de 40 pedidos anuais: Demanda anual de 4.500 unidades / LEC de 112 unidades = 40,1786 pedidos, cerca de 40 pedidos anuais Tempo Estoque médio Estoque em unidades 56 0 112 Figura 5 – Consumo do exemplo do LEC 89 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Nesse caso, para que não haja custos adicionais, a parametrização do estoque para estabelecer o ponto de pedido correto é muito importante, pois qualquer outra quantidade que seja encomendada acarretará em custos adicionais desnecessários. É importante destacar que a técnica do LEC se trata de uma boa forma de calcular a aquisição de um item ou alguns itens específicos de estoque, numa situação em que o gestor de compras deverá analisar item por item no momento de programar os pedidos. Em empresas comerciais com uma quantidade bastante grande de itens cadastrados em estoque, há a necessidade de combinar as duas técnicas para ter uma gestão de estoque eficiente. 4.2 Custeio direto e indireto Ao falarmos em custeio, fazemos referência à classificação dos custos em relação às diversas finalidades que eles possuem. Em nosso estudo vamos abordar os custos diretos e indiretos, bem como os custos fixos (CF) e variáveis (CV). Observação No contexto de nossos estudos, as siglas são um importante recurso para conferir agilidade aos conteúdos, mas é importante atentar ao contexto em que elas são aplicadas, pois podem carregar significados distintos. Perceba que, anteriormente, o emprego do CF fazia menção ao ciclo financeiro, mas neste tópico esta sigla é utilizada para identificar o custo fixo. Quando abordamos os custos em relação ao produto falamos em diretos e indiretos; o custo é direto quando podemos identificar a quantidade de determinado item aplicado no produto; se isso não for possível, dizemos que o custo é indireto. Uma indústria de doces teria como custos diretos na produção de doce de leite,por exemplo, o leite, o açúcar, o salário dos operários da produção, os materiais de embalagem e tudo o que estiver diretamente ligado à produção do doce de leite. Os custos indiretos, nesse caso, serão os salários administrativos da equipe de produção, supervisores e afins, a depreciação do maquinário utilizado na produção, o aluguel do espaço onde fica a unidade fabril etc. A definição de custos indiretos tem relação com o fato de que os valores e quantidades aplicados na produção do doce de leite não podem ser identificados de maneira exata, pois eles também estão envolvidos na atividade de produção dos outros tipos de doces da referida indústria. 90 Unidade II Como há essa dificuldade de identificação da quantidade e dos valores, geralmente eles são determinados por meio de um rateio em relação ao volume de produção de cada item. A energia elétrica para a indústria é uma questão especial, pois depende da estrutura física. É indicado que empresas que a utilizam como insumo da produção tenham instalações separadas, em que há um relógio medidor do consumo específico para cada maquinário. Desse modo, as empresas conseguem medir a quantidade e o valor correto gasto com energia elétrica com o maquinário responsável por cada produto. Vejamos agora sobre os custos fixos e variáveis. Podemos dizer que os custos fixos são aqueles que não se alteram mesmo que o volume de produção aumente ou diminua. No exemplo da indústria de doces, se ela produzir 10.000 ou 12.000 unidades de doce de leite, os custos fixos são aqueles que permanecerão os mesmos, que incorrem independentemente de a empresa produzir ou não nem uma unidade sequer do que ela foi concebida para produzir; podemos citar como exemplo o aluguel do espaço no qual se localiza a fábrica. Mesmo que o valor modifique, o custo fixo continua incorrendo, mesmo que a empresa diminua sua produção a zero, a depreciação do maquinário incorrerá no mesmo valor, assim como os salários administrativos ligados à produção, como os supervisores da área de produção. Para exemplificar o que foi dito referente aos custos fixos, vamos estimar que essa indústria apresente os seguintes valores por mês: • Aluguel: R$ 40.000,00 • Depreciação: R$ 1.000,00 • Salários administrativos da produção: R$ 5.000,00 Esses valores somados totalizam R$ 46.000,00 mensais referentes aos custos fixos da produção, e são os mesmos para uma produção de 10.000 ou 13.000 unidades; sendo assim, o valor por unidade pode se modificar conforme aumente a produção. Vejamos o exemplo para 10.000 unidades: CF unitário = CF total / unidades produzidas CF unitário = R$ 46.000,00 / 10.000 CF unitário = R$ 4,60 Caso a empresa aumente a quantidade produzida para 13.000 unidades: CF unitário = CF total / unidades produzidas CF unitário = R$ 46.000,00 / 13.000 CF unitário = R$ 3,54 91 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Podemos perceber que o custo fixo continuaria o mesmo, no total, R$ 46.000,00, mas diminui em relação a cada unidade produzida. Quanto ao rateio por produto, podemos estimar que quando a produção fosse de 10.000 unidades, seriam 7.000 unidades de doce de leite e 3.000 de goiabada, e ficaria assim: Percentual para o rateio por produto: Percentual = quantidade do produto / total produzido pela fábrica × 100 Percentual (doce de leite) = 7.000 / 10.000 × 100 Percentual (doce de leite) = 0,7 × 100 Percentual (doce de leite) = 70% Rateio do CF (doce de leite) = R$ 46.000,00 × 70% Rateio do CF (doce de leite) = R$ 32.200,00 Percentual (goiabada) = 3.000 / 10.000 × 100 Percentual (goiabada) = 0,3 × 100 Percentual (goiabada) = 30% Rateio do CF (goiabada) = R$ 46.000,00 × 30% Rateio do CF (goiabada) = R$ 13.800,00 Como ficaria, então, na segunda estimativa para 13.000 unidades produzidas, em que 8.500 seriam doces de leite e 4.500 seriam goiabadas: Percentual (doce de leite) = 8.500 / 13.000 × 100 Percentual (doce de leite) = 0,6538 × 100 Percentual (doce de leite) = 65,38% Rateio do CF (doce de leite) = R$ 46.000,00 × 65,38% Rateio do CF (doce de leite) = R$ 30.075,00 Percentual (goiabada) = 4.500 / 13.000 × 100 Percentual (goiabada) = 0,3462 × 100 Percentual (goiabada) = 34,62% Rateio do CF (goiabada) = R$ 46.000,00 × 34,62% Rateio do CF (goiabada) = R$ 15.925,00 Percebemos que o rateio varia justamente conforme a variação do percentual de participação de cada produto em relação ao total produzido pela empresa. Esses valores depois vão integrar o cálculo do custo de produção de cada unidade de cada produto. Porém, pudemos observar um fato interessante quanto aos custos fixos: mesmo não dependendo da quantidade produzida, caso esta aumente, como foi o caso do nosso exemplo, o custo fixo por unidade obviamente ficará menor, pois, uma vez calculados os custos fixos de produção, se a quantidade produzida for maior, isso representa um custo fixo menor por unidade e uma melhor utilização da capacidade instalada. 92 Unidade II Quanto aos custos variáveis, podemos dizer que estes vão aumentar conforme aumente a quantidade de produtos produzidos, pois para produzir uma unidade precisamos de um valor de matéria-prima, e para produzir 100 unidades precisaremos de 100 vezes esse valor, o que evidentemente refletirá num custo maior de matéria-prima. A mesma coisa acontece com o salário dos operários da produção e com os materiais utilizados para embalagem. Vamos estimar que para produzir 7.000 doces de leite precisemos de 4.200 litros de leite, 1.100 kg de açúcar, além do salário do operário da produção de R$ 4.000,00 com encargos, e que para produzir 3.000 goiabadas precisemos de 1.800 kg de goiaba, 500 kg de açúcar e 300 kg de limão in natura, além do salário do operário da produção também de R$ 4.000,00. Vamos usar essas informações para demonstrar como o custo variável aumenta conforme aumenta a produção, devido à necessidade de uma quantidade maior de insumos. Apenas para ilustrar o cálculo, utilizaremos aqui preços de mercado no varejo. Portanto, a produção de 7.000 unidades do doce de leite demandaria: • 4.200 litros de leite a R$ 3,50 cada litro, totalizando R$ 14.700,00; • 1.100 kg de açúcar a R$ 2,83 cada quilograma, totalizando R$ 3.113,00; • Salário do operário R$ 4.000,00. Somando todos os insumos, teríamos R$ 21.813,00. Com essas informações, o custo variável unitário de cada doce de leite seria: CV unitário = R$ 21.813,00 / 7.000 unidades CV unitário = R$ 3,12 cada doce de leite No caso da goiabada teríamos: • 1.800 kg de goiaba a R$ 7,99 cada quilograma, totalizando R$ 14.382,00; • 500 kg de açúcar a R$ 2,83 cada quilograma, totalizando R$ 1.415,00; • Salário do operário R$ 4.000,00. Somando todos os insumos, teríamos R$ 19.797,00. Com essas informações o custo variável unitário de cada doce de leite seria: CV unitário = R$ 19.797,00 / 3.000 unidades CV unitário = R$ 6,60 cada goiabada Esses cálculos foram apenas para exemplificar o cálculo do custo variável unitário de um produto, o que vai mostrar que o custo variável total aumenta quando a quantidade a ser produzida também aumenta. 93 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Se estimarmos que o salário não se altere e levarmos em consideração o aumento de 10.000 para 13.000 unidades, com 8.500 unidades de doce de leite e 4.500 de goiabada, teríamos o seguinte: • 5.100 litros de leite a R$ 3,50 por litro, totalizando R$ 17.850,00; • 1.336 kg de açúcar a R$ 2,83 cada quilograma, totalizando R$ 3.781,00; • Salário do operário R$ 4.858,00. O custo variável para as 8.500 unidades de doce de leite totaliza R$ 26.489,00. Já para 4.500 goiabadas teríamos: • 2.700 kg de goiaba a R$ 7,99 cada quilograma, totalizando R$ 21.573,00; • 750 kg de açúcar a R$ 2,83 cada quilograma, totalizando R$ 2.123,00; • Salário do operário R$ 6.000,00. Nesse caso, o custo variável para as 4.500 unidades de goiabada totaliza R$ 29.696,00. A partir dessas informações, observamos que para 7.000 unidades de doce de leite o custo variável total é de R$ 21.813,00,e para 8.500 unidades é de R$ 26.489,00; ou seja, houve um aumento. Já para 3.000 unidades de goiabada o total é de R$ 19.797,00, enquanto o resultado foi R$ 29.696,00 para 4.500 unidades, também demonstrando um aumento. Se efetuarmos o cálculo, vamos perceber que o custo variável unitário não se altera quando modificamos o total de insumos apresentado para a produção dos doces, como podemos observar a seguir: • Comparação do cálculo para os doces de leite: CV unitário = R$ 21.813,00 / 7.000 unidades = R$ 3,12 CV unitário = R$ 26.489,00 / 8.500 unidades = R$ 3,12 • Comparação do cálculo para a goiabada: CV unitário = R$ 19.797,00 / 3.000 unidades = R$ 6,60 CV unitário = R$ 29.696,00 / 4.500 unidades = R$ 6,60 Utilizamos o processo de produção de uma empresa industrial para exemplificar os custos diretos e indiretos e os custos fixos e variáveis, porém, para empresas comerciais a lógica não se altera, pois os custos fixos seguem o mesmo padrão de apuração e os custos variáveis dependerão da maneira como são conduzidos os processos de aquisição e venda dos produtos comercializados. 94 Unidade II 4.3 Logística, estocagem e o método just-in-time A logística tem sua origem principal na movimentação de materiais, principalmente insumos de guerra, desde a Grécia Antiga. Porém, com a evolução das práticas comerciais, o pensamento logístico ganhou importância como ferramenta estratégica na busca por melhores práticas em todos os departamentos das empresas. Ademais, ganhou maior repercussão como atividade essencialmente cerebral, apesar de ainda haver pessoas que pensam a logística apenas como uma atividade operacional. A logística se desenvolveu com base nas atividades de comércio, que no seu início tinha como prática o escambo, troca de mercadorias que aconteciam em postos específicos para tal atividade, pois não havia confiança suficiente na moeda para fazer com que a economia se movimentasse. No período do escambo, todo o processo logístico era muito simples: o produtor seguia até o posto de troca e adquiria matéria-prima e insumos, utilizava-os em sua produção e depois, para “vender” seu produto, retornava até o posto de troca para entregá-lo como parte do pagamento por novas aquisições. Nessa época, o processo era rudimentar, com poucos concorrentes, poucos fornecedores e poucos produtos ofertados. Em relação às questões financeiras dessa época, vale ressaltar que o pagamento aceito nos armazéns gerais era somente em dinheiro, e, como este era escasso, surgiram também as chamadas cadernetas, em que se registravam as compras e os valores devidos para que posteriormente o devedor efetuasse o pagamento. Nesse contexto, cabe o registro de que, pela extensão continental do Brasil, ainda temos alguns lugares que mantêm essa prática até a atualidade. Os avanços dos estudos de administração e a ampliação da importância da gestão financeira em todos os negócios fizeram repercutir a visão de que a logística é uma ferramenta com capacidade de aumentar as vendas e melhorar os resultados. Além disso, a expansão da informática permitiu que a logística fosse utilizada para segmentar mercados e gerenciar cadeias de suprimentos cada vez maiores, o que a transformou em uma atividade atualmente essencial a qualquer organização que almeje o sucesso no mercado em que atua. O desenvolvimento da logística – que permitiu que as empresas gerenciem desde os fornecedores dos seus fornecedores até o descarte dos produtos comprados pelos seus clientes, passando pelo gerenciamento dos estoques – fez com que ela não só se preocupasse com a administração da distribuição dos materiais tangíveis como também o fluxo de bens e serviços e, principalmente, o gerenciamento das informações geradas pelos seus diversos tipos de processos. Para entendermos a dimensão da importância da logística, precisamos compreender as duas coisas que mais custam dinheiro atualmente em termos de administração de qualquer tipo em uma organização: tempo e espaço. Para o cliente, é imprescindível que o produto esteja no lugar que ele deseja, no momento exato em que ele espera utilizá-lo. Dessa forma, o planejamento da empresa para atender a essa necessidade vai determinar quais recursos serão necessários para que a empresa tenha o produto que o cliente espera e 95 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS consiga entregá-lo no momento desejado – isso vai nortear, por exemplo, o dimensionamento da área de estocagem, ou seja, o espaço necessário para a operação da empresa. É primordial para a administração moderna das empresas, em termos de conceito logístico, que ela passe a pensar seus processos a partir da demanda, ou seja, da ponta do processo em que está o cliente e suas necessidades. Antes do desenvolvimento da logística, o que norteava seus processos era a produção. Por exemplo, na produção em massa, que se preocupava em inserir no processo de produção a maior quantidade de matéria-prima possível, esperava-se que se produzisse uma maior quantidade de produtos, sem se importar com os custos dos desperdícios que essa prática ocasionava. A logística permite, então, com esses princípios, que os custos sejam reduzidos, pois parte-se do princípio de que somente o que será consumido deverá ser produzido. Isso levará a um desenvolvimento de fornecedores melhores, de estoques mais enxutos e, consequentemente, de custos menores. Conforme apresentado na unidade anterior, para uma boa saúde financeira da empresa é essencial que os recursos financeiros estejam alocados onde realmente são importantes naquele momento. Nesse sentido e pensando na gestão financeira de uma organização, é necessário que, ao tratarmos de estocagem, entendamos o conceito de just-in-time, um dos dois pilares de sustentação do Sistema Toyota de Produção que é embasado na eliminação total e absoluta do desperdício. O just-in-time usado na produção determina que cada processo receba o item que precisa, quando necessário e na quantidade necessária. Para esse processo ser implantado de maneira eficaz, é preciso um sistema de previsão de demanda extremamente eficaz, pois o sentido da produção é diferente daquele adotado pela produção em massa, que é empurrado. O just-in-time é um sistema puxado, por isso é importante que a previsão de demanda seja realizada da maneira correta, de modo que o produto esteja disponível concomitantemente com a necessidade dos potenciais clientes. Na indústria automobilística esse sistema proporciona a montagem de um veículo em um período de pelo menos três dias, o que é muito curto, levando em consideração a quantidade de itens que um veículo necessita para ser montado. Saiba mais O artigo a seguir oferece mais algumas informações a respeito do assunto just-in-time. HECKERT, C. R.; FRANCISCHINI, P. G. Variações do just-in-time na indústria automobilística brasileira. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO (Enegep), 18., Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro, 1998. Disponível em: https://cutt.ly/MPmdZvd. Acesso em: 12 fev. 2021. 96 Unidade II Para este sistema funcionar a contento, ele usa uma ferramenta chamada de Kanban, que, grosso modo, é uma ficha informativa sobre as necessidades que cada célula de produção tem referente aos componentes que deverão ser disponibilizados. Para a gestão comercial, o sistema just-in-time deixa como contribuição a preocupação que as empresas passaram a ter com a disponibilização do item no momento exato da necessidade do cliente. Se para a indústria isso é algo importante – ao ponto de algumas delas passarem a treinar os fornecedores dos fornecedores de seus fornecedores (os fornecedores de terceiro nível), para que estes tenham a mesma agilidade da indústria em questão –, para o comércio em geral isso proporcionou, por exemplo, em grandes redes de supermercados, que os fornecedores fossem informados sobre os itens vendidos e que necessitam reposição diretamente pelos terminais de caixa, quando os clientes efetuamos pagamentos. Cabe ressaltar, inclusive, que o início do desenvolvimento do método just-in-time se deu exatamente em supermercados norte-americanos. Em relação ao sistema de previsão de demanda, as lojas McDonald’s podem ser encaradas como um grande exemplo do método just-in-time: nos momentos em que a loja apresenta pouco movimento, os lanches somente entram na linha de produção quando os pedidos são registrados e enviados para a cozinha; já nos momentos de pico de movimento, o sistema de previsão de demanda informa – por meio de métodos estatísticos de histórico de consumo em relação aos dias dos meses e das semanas, horários e suas variações – quais são os lanches mais pedidos e já dispara o início da produção, para que o tempo de atendimento dos pedidos seja mantido, independentemente da quantidade de clientes que efetuem seus pedidos de maneira simultânea. Esta é a forma mais interessante de uma produção puxada: baseada na previsão de demanda, o produto alimentício é preparado antes mesmo que o cliente chegue à loja para efetuar seu pedido, e, mesmo assim, mantém-se o princípio de absoluta e total eliminação de desperdício. O exemplo anterior sugere que as empresas comerciais que queiram manter uma boa gestão financeira e recursos de capital de giro disponíveis devem primar por um bom sistema de previsão de demanda para reposição de seus estoques ou fornecimento de seus serviços; assim, poderão manter-se sempre competitivas no mercado em que atuarem. 97 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Resumo Nesta unidade vimos a importância do planejamento financeiro para as organizações, como parte integrante do planejamento estratégico. Ele dá origem ao orçamento anual, de curto prazo, que servirá de referência para que o gestor financeiro faça o gerenciamento dos recursos financeiros da organização, usando-o como ferramenta de gestão para balizar a tomada de decisões no curto prazo. Essa demonstração das entradas e saídas de recursos projetados permite ao gestor identificar o que pode ser melhorado e, principalmente, o porquê dos acontecimentos. Vimos também os conceitos das políticas de capital de giro que podem ser utilizadas pelas empresas. Foi possível compreender também dois importantes conceitos: um chamado de ciclo operacional (CO) e outro de ciclo financeiro (CF) ou de ciclo de conversão de caixa, que traduz em quantidade de dias o período de tempo do ciclo de atuação de uma empresa na área em que ela se desenvolve. Ademais, acompanhamos o cálculo da necessidade de capital de giro (NCG), fazendo a comparação com o capital de giro líquido (CGL), que serve para sabermos em números absolutos a necessidade de financiamento da empresa, que pode ser permanente ou sazonal. Os números encontrados nestes cálculos também são importantes para o planejamento financeiro. Investigamos mais a fundo o conceito de disponibilidades e a importância de sua correta administração e como isso pode ser relevante para a gestão financeira de uma empresa. Abordamos a ferramenta chamada desconto de duplicatas, que permite transformar recebíveis em capital de giro, ou seja, dinheiro à disposição da empresa para financiar suas atividades operacionais. Analisamos ainda outra ferramenta importante, chamada factoring. Abordamos também a administração de estoques, um ativo das empresas que pode ser uma armadilha para sugar boa parte de seu capital de giro. Estudamos sobre como tratar os estoques com atenção, por meio da classificação ABC e do lote econômico de compras (LEC). Por fim, vimos um pouco da importância da logística como atividade estratégica, aliada do gestor financeiro, e o método just-in-time, que permite às empresas trabalharem com baixos níveis de estoque a depender da necessidade de cada atividade. 98 Unidade II Exercícios Questão 1. Avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas. I – A gestão do capital de giro (ou ativo circulante) permite ao gestor financeiro determinar qual volume de recursos financeiros deve estar disponível para preservar a atividade operacional da empresa. porque II – É notório que os pagamentos têm mais previsibilidade que os recebimentos, e isso afeta diretamente o montante que deve estar à disposição da empresa para saldar compromissos financeiros como pagar salários, fornecedores e outros custos e despesas. É correto afirmar que: A) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda asserção justifica a primeira. B) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda asserção não justifica a primeira. C) A primeira asserção é verdadeira, e a segunda asserção é falsa. D) A primeira asserção é falsa, e a segunda asserção é verdadeira. E) As duas asserções são falsas. Resposta correta: alternativa A. Análise da questão A primeira asserção é verdadeira, pois a efetiva gestão do capital de giro, por meio da análise do fluxo de caixa, oferece ao administrador financeiro uma visão antecipada das necessidades de recursos ou de seus excedentes. A segunda asserção é verdadeira e justifica a primeira, pois os pagamentos são compromissos assumidos pela empresa e têm datas de vencimento determinadas, sendo que os recebimentos podem ser afetados por atrasos e eventuais inadimplências. 99 GESTÃO FINANCEIRA E CONTROLE DE RESULTADOS Questão 2. As empresas industriais podem ter três tipos diferentes de composição de estoques: • Matérias-primas; • Produtos em elaboração; • Produtos acabados. Em relação a esses tipos de composição, avalie as descrições a seguir. Descrição I – São os produtos que não requerem modificações nem preparações. Descrição II – São produtos naturais ou transformados (semimanufaturados) utilizados nos processos de produção que se tornarão parte do produto. Descrição III – São produtos resultantes de uma fase de produção intermediária do processo produtivo e que serão consumidos em uma fase posterior. As descrições I, II e III referem-se, respectivamente, aos tipos de composição: A) Matérias-primas, produtos em elaboração e produtos acabados. B) Produtos em elaboração, matérias-primas e produtos acabados. C) Matérias-primas, produtos acabados e produtos em elaboração. D) Produtos acabados, matérias-primas e produtos em elaboração. E) Produtos acabados, produtos em elaboração e matérias-primas. Resposta correta: alternativa D. Análise da questão Os produtos acabados são aqueles que se originam do processo produtivo, que estão prontos para serem comercializados e que ainda não foram vendidos ou distribuídos. As matérias-primas são produtos naturais ou substâncias que são utilizados no processo de produção, e que são base dos produtos que serão produzidos. Os produtos em elaboração são aqueles que se encontram em processo de produção, ou seja, não são mais matérias-primas e ainda não são produtos acabados, pois não completaram todo o processo de produção.