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DESCRIÇÃO As lições introdutórias e noções gerais do mandado de segurança. PROPÓSITO Compreender as noções básicas a respeito do mandado de segurança, remédio constitucional de grande importância para a obtenção de uma proteção em face de lesão ou ameaça provocada por atos de autoridade. PREPARAÇÃO Antes de iniciar este conteúdo, tenha em mãos a Constituição Federal, o Código de Processo Civil e a Lei do Mandado de Segurança (Lei n. 12.016 de 2009). OBJETIVOS MÓDULO 1 Identificar os principais elementos conceituais do mandado de segurança MÓDULO 2 Reconhecer os pressupostos e o procedimento do mandado de segurança MÓDULO 3 Identificar o conteúdo da sentença e o regime da coisa julgada INTRODUÇÃO Abordaremos os principais elementos referentes ao mandado de segurança. No primeiro módulo, veremos o conceito, a natureza e a legitimidade para propositura do mandado de segurança; no segundo módulo, estudaremos seus pressupostos e procedimentos e, finalmente, no terceiro módulo, a análise será feita a respeito da sentença e da coisa julgada no mandado de segurança. MÓDULO 1 Identificar os principais elementos conceituais do mandado de segurança CONCEITO E NOÇÕES GERAIS O mandado de segurança, também conhecido em inglês como writ e, em nomenclatura mais antiga e cada vez em maior desuso, remédio heroico, possui previsão no artigo 5º, incisos LXIX (mandado de segurança individual) e LXX (mandado de segurança coletivo), ambos da Constituição Federal, sendo disciplinado pela Lei n. 12.016 de 2009 e, nas suas omissões, pelo artigo 1º do Código de Processo Civil. Conceitualmente, o mandado de segurança é o remédio constitucional destinado à proteção de direito líquido e certo, lesado ou sob ameaça de ilegalidade ou abuso de poder oriundo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Nas palavras de Hely Lopes Meirelles, o mandado de segurança pode ser conceituado como: O MEIO CONSTITUCIONAL POSTO À DISPOSIÇÃO DE TODA PESSOA FÍSICA E JURÍDICA, ÓRGÃO COM CAPACIDADE PROCESSUAL, OU UNIVERSALIDADE RECONHECIDA POR LEI, PARA PROTEÇÃO DE DIREITO INDIVIDUAL, PRÓPRIO, LÍQUIDO E CERTO, NÃO AMPARADO POR HABEAS CORPUS , LESADO OU AMEAÇADO DE LESÃO POR ATO DE QUALQUER AUTORIDADE, SEJA DE QUE CATEGORIA FOR E SEJAM QUAIS FOREM AS FUNÇÕES QUE EXERÇAM. (MEIRELLES, 2020, p. 722) COMENTÁRIO A noção de direito líquido e certo será aprofundada no módulo seguinte, ao tratarmos dos pressupostos e do procedimento do mandado de segurança. Foto: Shutterstock.com Quanto às espécies, o mandado de segurança pode ser individual, quando impetrado por apenas uma pessoa natural ou jurídica na defesa de direito ou interesse individual, ou coletivo, quando proposto por algum dos legitimados pelo artigo 5º, inciso LXX, da Constituição Federal, na defesa de direitos coletivos (difusos, coletivos em sentido estrito ou individuais homogêneos, a depender da hipótese): (A) Partido político com representação no Congresso Nacional (B) Organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associado Quanto ao marco temporal em relação ao ato de autoridade, o mandado de segurança pode ser repressivo (quando impetrado com vistas a fazer cessar ato cujos efeitos já estão sendo produzidos) ou preventivo (quando impetrado para impedir a produção de efeitos de ato de autoridade já existente, porém ainda ineficaz, ou em vias de existir). NATUREZA JURÍDICA O mandado de segurança, do ponto de vista do direito material, possui natureza jurídica de direito fundamental, tendo em vista sua localização topográfica no rol exemplificativo do artigo 5º da Constituição Federal, que elenca os direitos e garantias fundamentais. Do ponto de vista do direito processual, o mandado de segurança possui natureza jurídica de procedimento especial, simplificado em relação ao procedimento comum do Código de Processo Civil, previsto nos artigos 318 e seguintes do Código, diante da celeridade que deve possuir. Foto: Shutterstock.com LEGITIMIDADE A legitimidade ativa para a propositura do mandado de segurança é conferida a qualquer pessoa natural ou jurídica, seja esta de personalidade jurídica de direito público ou de direito privado. O Ministério Público e a Defensoria Pública, no exercício de suas funções institucionais, também são legitimados a propor mandado de segurança. O autor do mandado de segurança é denominado impetrante. Além disso, doutrina (como RODRIGUES, 2016) e jurisprudência (STJ, RMS 8.967/SP e súmula 525) reconhecem a legitimidade ativa de alguns entes despersonalizados para a impetração de mandado de segurança, tais como condomínios, massa falida, espólio, dentre outros. javascript:void(0) Dentre os entes despersonalizados, assume destaque a legitimidade ativa dos órgãos públicos para propositura de mandado de segurança. Para que se reconheça sua capacidade processual e legitimidade ativa para ingressar com o mandado de segurança, exige-se o preenchimento de dois requisitos cumulativos, a saber: STJ, RMS 8.967/SP E SÚMULA 525 “A Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária, somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais.” O órgão deve possuir status constitucional e atuar na defesa de suas prerrogativas institucionais. É o caso da Câmara de Vereadores, que pode impetrar mandado de segurança em virtude do não repasse de verbas que lhe sejam constitucionalmente asseguradas, o que ofende prerrogativa sua. EXEMPLO No entender da jurisprudência, o falecimento do impetrante antes da prolação da sentença de mérito acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, considerando que o direito líquido e certo amparável por meio de mandado de segurança é intransmissível, na forma do artigo 485, inciso IX, do CPC. Na hipótese em que o óbito venha a ocorrer após a sentença de mérito, em fase de cumprimento de sentença, como regra, a solução conferida é diferente, permitindo a continuidade do processo até a extinção da fase executiva. Isso porque, em havendo concessão da ordem, a fase de cumprimento se destina a efetivar o direito reconhecido ao impetrante, direito esse que possui natureza patrimonial e é transmissível aos seus herdeiros. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO No que tange ao mandado de segurança coletivo, o artigo 5º, inciso LXX da Constituição Federal prevê que ele pode ser impetrado por a) partido político com representação no Congresso Nacional e b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associado. Regulamentando o dispositivo constitucional, o artigo 21 da Lei n. 12.016 de 2009 prevê que, em relação ao mandado de segurança coletivo impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, sua impetração é cabível para a defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária. A título de exemplo, mandado de segurança impetrado com vistas a compelir o Presidente da Câmara dos Deputados ao preenchimento de vaga decorrente de renúncia de parlamentar. Em relação ao mandado de segurança coletivo impetrado por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída, exige-se, de início, seu funcionamento há, pelo menos, um ano. O STF entende que o referido requisito é taxativo, de sorte que, na hipótese em que a associação seja constituída a menos de um ano, há carência de pressuposto processual positivo, acarretando a extinção do processo sem resolução do mérito. Em relação ao mandado de segurança coletivo impetrado por associação na defesa de seus associados, deve-se ter em conta que o artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal, que exige autorização expressa dos associados para que a associaçãoatue em juízo em favor de seus interesses, constituindo hipótese de representação (nessa linha, STF, RE 572232, julgado sob regime de repercussão geral), não se aplica no caso do mandado de segurança coletivo. Isso porque o artigo 5º, inciso LXX, alínea “b” da Constituição Federal é norma especial para o mandado de segurança coletivo, dispensando a exigência de autorização expressa. Com efeito, em se tratando de mandado de segurança coletivo, o STF entende desnecessária a autorização expressa ou a relação nominal dos associados para legitimar a atuação em juízo da associação, posto se tratar, aqui, de hipótese de substituição processual. Por tal razão é que a Lei n. 12.016 de 2009 dispensa autorização especial na parte final do artigo 21 para que a associação possa atuar em juízo em sede de mandado de segurança coletivo, dispensa essa que transformou em lei o entendimento constante da súmula 629 do STF. Fizemos, então, um resumo da Lei n. 12.016: PARÁGRAFO ÚNICO O parágrafo único do artigo 21 da Lei n. 12.016 de 2009 traz o rol de direitos passíveis de proteção pela via do mandado de segurança coletivo. Destaque-se que a pretensão pode dizer respeito à totalidade ou à parte da categoria da entidade de classe, entendimento constante da súmula 630 do STF. INCISO I Prevê os direitos coletivos em sentido estrito, quais sejam, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica. É o caso, por exemplo, do direito ao saneamento básico. INCISO II Prevê os direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante. Com efeito, os direitos individuais homogêneos são direitos individuais que admitem proteção pela via da tutela coletiva. Por exemplo, são direitos decorrentes de acidentes, de eventos comuns. Por fim, o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, porém os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva, como prevê o artigo 22, § 1º, da Lei n. 12.016 de 2009. Trata-se, com efeito, do sistema right to opt in , também previsto no artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor como regra na tutela coletiva no Direito Brasileiro, segundo o qual o autor de ação individual pode escolher entre seguir com sua própria ação ou aderir à decisão coletiva. RIGHT TO OPT IN Direito de optar por participar da tutela coletiva. LITISCONSÓRCIO ATIVO NO MANDADO DE SEGURANÇA O mandado de segurança admite expressamente o litisconsórcio no polo ativo. Porém, de modo a respeitar o direito fundamental ao juiz natural e a duração razoável do processo, ambos direitos fundamentais, previstos no artigo 5º, incisos LII e LXXVIII, da Constituição Federal, o ingresso de litisconsorte ativo será admitido somente até o despacho (ou melhor, decisão de admissibilidade) da petição inicial, na forma do artigo 10, § 2º, da Lei n. 12.016 de 2009. javascript:void(0) LEGITIMIDADE ATIVA DO MANDADO DE SEGURANÇA Vamos agora tratar dos principais aspectos da legitimidade ativa no mandado de segurança: SAIBA MAIS A legitimidade passiva no mandado de segurança é conferida à pessoa jurídica de direito público ou privado que a autoridade coatora integra. A título de exemplo, se o writ for impetrado em face de ato praticado por Governador de Estado, a legitimidade passiva será do Estado. AUTORIDADE COATORA A autoridade coatora é o agente público ou privado no exercício de função pública responsável pelo ato atacado no mandado de segurança. Pelo artigo 6º, § 3º, da Lei n 12.016 de 2009, considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. A autoridade coatora não é parte no mandado de segurança; com efeito, não há litisconsórcio passivo entre a pessoa jurídica e a autoridade coatora (minoritariamente, entendendo existir litisconsórcio na hipótese, VIDIGAL, 1953). A autoridade coatora, embora não seja parte, é notificada para prestar informações, na forma do artigo 7, inciso I, da Lei n. 12.016 de 2009. As informações se destinam a subsidiar o convencimento do órgão julgador, não possuindo natureza jurídica de contestação; tanto que sua apresentação fora do prazo de 10 dias previsto no mesmo dispositivo legal não ocasiona a revelia da pessoa jurídica ré. Contudo, diante da possibilidade de que sua esfera jurídica seja atingida e das repercussões materiais e extrapatrimoniais que poderá sofrer em razão da concessão da ordem, a autoridade coatora tem o direito de recorrer em face da sentença, conforme dispõe o artigo 14, § 3º, da Lei n. 12.016 de 2009. RESUMINDO O artigo 1º, § 1º, da Lei n. 12.016 de 2009 prevê que se equiparam às autoridades os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. O termo “autoridades”, com efeito, faz referência às autoridades públicas. AUTORIDADE COATORA FEDERAL Pelo artigo 2º da Lei n. 12.016 de 2009, considerar-se-á federal a autoridade coatora se as consequências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada. A previsão tem repercussões na definição da competência para julgamento do mandado de segurança, tendo em vista que, pelo artigo 109, inciso VIII, da Constituição Federal, o julgamento de mandado de segurança impetrado em face de ato de autoridade federal compete à Justiça Federal. Foto: Marcelo Moryan/Shutterstock.com ERRO NA INDICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA Em princípio, verificando erro na qualificação do agente responsável pelo ato atacado, cabe ao magistrado intimar o impetrante para emendar a petição inicial, na forma do artigo 321 do Código de Processo Civil, apontando a autoridade correta. Os tribunais, contudo, têm conferido interpretação restritiva ao dispositivo, somente admitindo a emenda da inicial quando o juízo for competente para processar e julgar o mandado de segurança impetrado em face da autoridade coatora correta. A título de exemplo, a competência para o julgamento de mandados de segurança impetrados em face de atos do Presidente da República é conferida ao STF, na forma do artigo 102, inciso I, alínea “d”, da Constituição Federal. Caso o impetrante, ao distribuir seu mandamus , aponte um Ministro de Estado como autoridade coatora em se tratando de ato praticado pelo Presidente da República e o proponha perante o STJ, na forma do artigo 105, inciso I, alínea “d”, da mesma Constituição. Nesse caso, o Tribunal não admite o declínio de competência para o STF, com a intimação do impetrante para efetuar a emenda da inicial. TEORIA DA ENCAMPAÇÃO A teoria da encampação diz respeito à hipótese em que, indicada erroneamente a autoridade coatora pelo impetrante, que aponta agente público de hierarquia superior como responsável pelo ato coator, este realiza a defesa do ato impugnado, “encampando” o ato administrativo. Pela redação da súmula 628 do STJ, a aplicação da teoria da encampação exige o preenchimento dos seguintes requisitos, cumulativamente: Existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado Manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas Ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal Imagine, por exemplo, um mandado de segurança impetrado em face de ato praticado por Auditor Fiscal integrante dos quadros da Secretaria de Fazenda do Estadodo Rio de Janeiro, no qual o impetrante aponte o Governador do Estado como autoridade coatora. O Chefe do Poder Executivo, ao ser notificado para apresentar informações, defende o ato impugnado em seu mérito. Em tal hipótese, é cabível a aplicação da teoria da encampação no mandado de segurança. ATOS SUJEITOS À IMPUGNAÇÃO VIA MANDADO DE SEGURANÇA O mandado de segurança serve para combater atos eivados de ilegalidade ou abuso de poder, praticados por autoridade pública ou no exercício de função pública. Dessa definição, é possível extrair dois elementos necessários para que um ato possa ser impugnado pela via do mandado de segurança: ELEMENTO SUBJETIVO O ato coator deve ter sido praticado por agente público integrante da estrutura de pessoa jurídica de direito público ou por pessoa jurídica de direito privado ou pessoa natural no exercício de função pública. É o que dispõe o artigo 1º, caput e seu § 1º da Lei n. 12.016 de 2009, ao equiparar à autoridade coatora os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. A título de exemplo, ato praticado por comissão de licitação da sociedade de economia mista é impugnável por meio de mandado de segurança (súmula 333 do STJ), posto se tratar de ato exercido com função pública, considerando a obrigatoriedade, como regra, de procedimento licitatório prévio pelas empresas estatais (artigo 28 da Lei n. 13.303 de 2016 c/c artigo 173, § 1º, inciso III, da Constituição Federal). ELEMENTO OBJETIVO O ato coator deve ter sido praticado com o exercício de poder de império, ou seja, com o uso das prerrogativas típicas do regime jurídico administrativo. Por esta razão é que atos praticados por pessoas jurídicas de direito privado e pessoas naturais por meio do regime jurídico de direito privado não podem ser impugnados por meio de mandado de segurança. Da mesma forma, atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público não estão sujeitos à impugnação pela via do mandado de segurança, como prevê o artigo 1º, § 2º, da Lei n. 12.016 de 2009, por não serem praticados com o exercício de poder de império do Estado. REQUISITO DA SUBSIDIARIEDADE O mandado de segurança é cabível quando o direito líquido e certo que se pretende defender não seja amparado por habeas corpus ou habeas data , na forma do artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal. A título de exemplo, se o impetrante deseja combater ato de autoridade pública que indeferiu seu acesso a informações constantes de bancos de dados de caráter público, o habeas data será a medida processual adequada para obter tal providência, na forma do artigo 5º, inciso LXXII, alínea “a”, da Constituição Federal. Veremos, brevemente, atos em espécie que podem ser impugnados por meio de mandado de segurança. ATOS ADMINISTRATIVOS Os atos administrativos podem ser impugnados por meio de mandado de segurança, sendo certo que, quantitativamente, a maior parte dos mandados de segurança são impetrados em face de atos administrativos. Ao se falar em ato administrativo, está se fazendo menção aos atos praticados no exercício de função administrativa do Estado, englobando não apenas atos do Poder Executivo, como também atos praticados pelos demais Poderes de natureza administrativa (a título de exemplo, concurso público realizado pelo Poder Judiciário – aqui o Judiciário está praticando atos administrativos para a realização do concurso, ou seja, está exercendo atividade típica administrativa). ATENÇÃO Pelo artigo 5º, inciso I, da Lei n. 12.016 de 2009, não cabe mandado de segurança em face de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução. Anote-se, de início, que a parte final do dispositivo restou prejudicada em razão da súmula vinculante 21, que entendeu ser inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo. A ideia do dispositivo é a de que, em havendo mecanismo processual na esfera administrativa para fazer cessar a ilegalidade ou o abuso de poder, inexistiria interesse processual do impetrante em ingressar na esfera judicial para combater o ato lesivo. Há, porém, de se levar em conta a inafastabilidade de jurisdição, direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, assegurando a intervenção do Poder Judiciário para fazer cessar ou impedir a lesão a direito. Ainda que haja a possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo na esfera administrativa, o administrado pode validamente buscar o Poder Judiciário com vistas a obter a cessação dos efeitos do ato administrativo lesivo, inclusive, através do manejo de mandado de segurança. Contudo, diante da autonomia das instâncias, deve-se ter em conta que a impetração de mandado de segurança implica renúncia ao direito de recorrer na esfera administrativa ou desistência do recurso interposto, aplicando-se, analogicamente, o artigo 38, Parágrafo Único, da Lei de Execuções Fiscais à hipótese (Lei n. 6.830 de 1980). Foto: Shutterstock.com ATOS LEGISLATIVOS A impetração de mandado de segurança em face de atos legislativos típicos é possível. Há de se ter em conta, contudo, o teor da súmula 266 do STF, segundo a qual não é cabível mandado de segurança em face de lei em tese. Isso porque, caso fosse admissível o mandado de segurança em tal hipótese, o writ estaria sendo utilizado com finalidade idêntica à das ações de controle concentrado de constitucionalidade, as quais possuem legitimados específicos e são de competência do STF, na forma do artigo 102, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal. Não há óbice, contudo, que o impetrante adote como causa de pedir próxima do mandado de segurança a inconstitucionalidade de uma lei ou um ato normativo, sendo o pedido a declaração de inconstitucionalidade, em concreto, da lei ou do ato normativo. Afinal: No modelo brasileiro de controle de constitucionalidade, qualquer juiz pode exercer controle difuso de constitucionalidade. Em relação às leis em sentido formal – atos administrativos que assumem a feição de lei, tal como uma lei que conceda isenção tributária a determinado contribuinte – o mandado de segurança pode ser utilizado para impugná-la, considerando sua ausência de natureza normativa, não incidindo, pois, o óbice da súmula 266 do STF (RODRIGUES, 2020, p. 256). Foto: Shutterstock.com ATOS JUDICIAIS O mandado de segurança também é cabível em face de atos judiciais. A Lei n. 12.016 de 2009, com efeito, atribuiu nítida feição subsidiária ao mandado de segurança em face de ato judicial, excluindo seu cabimento nas hipóteses em que impetrado contra decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo e de decisão judicial transitada em julgado (artigo 5º, incisos II e III, da Lei n. 12.016 de 2009). A seguir, leremos um pouco mais sobre essas duas hipóteses: DECISÃO JUDICIAL EM FACE DA QUAL É CABÍVEL RECURSO COM EFEITO SUSPENSIVO No primeiro caso, a ideia é a de evitar que o mandado de segurança seja utilizado como substitutivo de recurso próprio. A Lei n. 12.016 de 2009, com efeito, trouxe para a esfera legal o entendimento já constante da súmula 267 do STF, editada sob a vigência da revogada Lei n. 1.533 de 1951 (a antiga Lei do Mandado de Segurança). A vedação, contudo, é interpretada com certo temperamento pela jurisprudência, admitindo-se a impetração de mandado de segurança em face de ato judicial eivado de flagrante ilegalidade ou abuso de poder (STJ, AgInt no RMS 60.885/SC). DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO No segundo caso, busca-se evitar que o mandado de segurança seja manejado como substituto de ação rescisória ou de ação declaratóriade nulidade (querela nulitatis ), as quais são os meios processuais próprios para impugnação de decisões judiciais transitadas em julgado. Nesse ponto, a Lei n. 12.016 de 2009 legificou o entendimento já constante da súmula 268 do STF. SAIBA MAIS À luz da teoria da asserção, a vedação do artigo 5º, inciso III, da Lei n. 12.016 de 2009 incide na hipótese em que, quando do ajuizamento do mandado de segurança, a decisão judicial que se busca afastar já está transitada em julgado. Caso o trânsito em julgado da decisão judicial impugnada ocorra após a propositura do mandado de segurança, o processo deverá ser extinto sem resolução do mérito, em razão da perda superveniente do objeto, com lastro no artigo 485, inciso IV, do CPC, tendo em vista a perda do interesse processual do impetrante para buscar a impugnação da referida decisão por meio de mandado de segurança. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A RESPEITO DA LEGITIMIDADE ATIVA EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA: A) Pessoa jurídica é parte ilegítima para ajuizar mandado de segurança. B) No mandado de segurança coletivo, as associações somente podem atuar se autorizadas específica e expressamente por seus associados. C) Qualquer pessoa física ou jurídica, desde que constituída há menos de um ano, é parte legítima para ajuizar mandado de segurança coletivo. D) Os órgãos públicos, desde que possuam estatura constitucional e atuem na defesa de prerrogativas institucionais próprias, podem propor mandado de segurança. E) Os órgãos públicos não podem, em hipótese alguma, ajuizar mandado de segurança. 2. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A RESPEITO DO MANDADO DE SEGURANÇA EM FACE DE ATOS JUDICIAIS: A) O mandado de segurança pode ser utilizado de maneira ampla para impugnar decisões judiciais, inclusive, se estas já estiverem transitadas em julgado. B) O mandado de segurança é substituto de recurso próprio. C) O mandado de segurança não é cabível em face de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo. D) Não há hipótese alguma na qual o mandado de segurança seja cabível em face de atos judiciais. E) O impetrante, para ajuizar mandado de segurança em face de ato judicial, deve prestar caução. GABARITO 1. Assinale a alternativa correta a respeito da legitimidade ativa em sede de mandado de segurança: A alternativa "D " está correta. O mandado de segurança pode ser utilizado pelos órgãos para a defesa de suas prerrogativas, sendo exemplo disso o entendimento constante da súmula 525 do STJ. 2. Assinale a alternativa correta a respeito do mandado de segurança em face de atos judiciais: A alternativa "C " está correta. O mandado de segurança não pode ser utilizado como meio processual substitutivo de recurso, razão pela qual o artigo 5º, inciso II, da Lei n. 12.016 de 2009 contém a referida vedação. MÓDULO 2 Reconhecer os pressupostos e o procedimento do mandado de segurança PRESSUPOSTOS O mandado de segurança possui dois pressupostos processuais específicos: EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO IMPETRAÇÃO NO PRAZO DECADENCIAL DE 120 DIAS O direito líquido e certo é aquele passível de comprovação documental pelo impetrante, em sua existência e extensão, quando da propositura do mandado de segurança. Nas palavras de Hely Lopes Meirelles: DIREITO LÍQUIDO E CERTO É O QUE SE APRESENTA MANIFESTO NA SUA EXISTÊNCIA, DELIMITADO NA SUA EXTENSÃO E APTO A SER EXERCITADO NO MOMENTO DA IMPETRAÇÃO. POR OUTRAS PALAVRAS, O DIREITO INVOCADO, PARA SER AMPARÁVEL POR MANDADO DE SEGURANÇA, HÁ DE VIR EXPRESSO EM NORMA LEGAL E TRAZER EM SI TODOS OS REQUISITOS E CONDIÇÕES DE SUA APLICAÇÃO AO IMPETRANTE: SE SUA EXISTÊNCIA FOR DUVIDOSA; SE SUA EXTENSÃO AINDA NÃO TIVER DELIMITADA; SE SEU EXERCÍCIO DEPENDER DE SITUAÇÕES E FATOS AINDA INDETERMINADOS, NÃO RENDE ENSEJO À SEGURANÇA, EMBORA POSSA SER DEFENDIDO POR OUTROS MEIOS JUDICIAIS. (MEIRELLES, 2019, p. 34-35) RESUMINDO Em outras palavras: o mandado de segurança não admite dilação probatória, cabendo ao impetrante instruir sua petição inicial com os documentos necessários para demonstrar a existência e a extensão do direito que alega possuir. Caso constatada a necessidade de dilação probatória para que se possa perquirir a respeito da existência do direito alegado pelo impetrante, o mandado de segurança deverá ser extinto sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, inciso IV, do CPC, cabendo ao autor buscar satisfazer sua pretensão pelas vias ordinárias. Foto: Shutterstock.com A impossibilidade de dilação probatória no mandado de segurança faz com que tal procedimento especial somente admita prova documental, sendo afastada, a título de exemplo, a possibilidade de produção de prova oral e prova pericial. Há possibilidade, porém, de uso de prova documentada, ou seja, a prova produzida por outros meios de produção e que é transcrita para prova documental, desde que apresentada em conjunto com a petição inicial (exemplo: ata de depoimento de testemunha). O mandado de segurança, diante de sua feição de tutela célere para o combate de atos lesivos de autoridade pública, deve ser ajuizado no prazo de 120 dias contados da ciência do interessado a respeito do teor do ato impugnado, na forma do artigo 23 da Lei n. 12.016 de 2009. Trata-se de prazo de natureza decadencial, fazendo com que, uma vez transcorrido, esteja extinto o direito do pretenso titular do direito em ingressar com mandado de segurança. Ressalvadas posições isoladas, é dominante o entendimento no sentido da constitucionalidade da previsão de prazo decadencial, cristalizado na súmula 632 do STF, editada ainda no ano de 1977, sob a égide da Lei n. 1.533 de 1951. Isso porque o mandamus , como já exposto, é destinado a conferir tutela processual pronta e célere a quem reputa ser titular de direito líquido e certo, razão pela qual o transcurso do tempo faz com que a existência dessa tutela no caso concreto perca razão de existir. A proteção ao direito poderá ser buscada por outros mecanismos processuais (a título de exemplo, ação ordinária), não havendo extinção do eventual direito subjetivo titularizado pela parte em razão da decadência do direito de ingressar com mandado de segurança. Logo, o STF e a doutrina em geral não vislumbram inconstitucionalidade no artigo 23 da Lei n. 12.016 de 2009. Pedido de reconsideração formulado pelo impetrante na via administrativa não interrompe o prazo para impetração de mandado de segurança, como prevê a súmula 430 do STF. Afinal, além do pedido de reconsideração ser direcionado à mesma autoridade prolatora da decisão, já existe ciência do interessado a respeito do ato que pode vir a impugnar, o que permite o manejo do mandamus . No caso das relações jurídicas de trato sucessivo, o prazo para impetração se renova mês a mês, tendo em vista a renovação da lesão ao direito do impetrante. Por fim, aponta-se que o prazo decadencial previsto no artigo 23 da Lei n. 12.016 de 2009 somente se aplica ao mandado de segurança repressivo. Em se tratando de mandado de segurança preventivo, considerando que a lesão ao direito ainda não se consumou, não incide o referido prazo. PROCEDIMENTO: MANDADO DE SEGURANÇA EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO O mandado de segurança é um procedimento especial, destinado à tutela célere em face de atos de autoridade supostamente lesivos ao impetrante, não adotando o procedimento comum, previsto nos artigos 318 e seguintes do Código de Processo Civil. De início, a petição inicial do mandado de segurança deve ser acompanhada dos documentos que comprovam o alegado direito líquido e certo que o impetrante afirma ser titular. Trata-se de providência fundamental, considerando a impossibilidade de dilação probatória no mandado de segurança. De início, o artigo 4º da Lei n. 12.016 de 2009 dispõe que, em caso de urgência, é permitido, observados os requisitos legais, impetrar mandado de segurança por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidadecomprovada. Com o avanço tecnológico, o mandado de segurança é impetrado, como regra, por via eletrônica, através dos sistemas de processo eletrônico. O artigo 7º da Lei n. 12.016 de 2009 elenca as providências cabíveis ao magistrado quando da decisão de admissibilidade positiva da petição inicial do mandado de segurança. Há a possibilidade, ainda, de a petição inicial ser indeferida ou de ocorrer a improcedência liminar do pedido, como se falará mais adiante. NOTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE COATORA A primeira providência é a notificação da autoridade coatora para prestar informações (inciso I). Como mencionado, tais informações se destinam a subsidiar o conhecimento do juízo a respeito do ato impugnado, não possuindo natureza jurídica de contestação; tanto que sua apresentação fora do prazo de 10 dias previsto no mesmo dispositivo legal não ocasiona a revelia da pessoa jurídica ré (a título de exemplo, STJ, RMS 26.170/RO). CIÊNCIA AO ÓRGÃO DE REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA PESSOA JURÍDICA A segunda providência é a ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada para que, querendo, ingresse no feito (inciso II). A referida ciência ocorre por meio de intimação. A Lei n. 12.016 de 2009 não prevê forma específica para este ingresso da pessoa jurídica interessada no feito. Consagrou-se na praxe forense o uso de impugnação para apresentação dos elementos de defesa do ato impugnado. MEDIDA LIMINAR A terceira providência, em presentes os requisitos para tanto, é a concessão de liminar, para que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica (inciso III). TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA OU CAUTELAR A concessão de liminar em mandado de segurança pode se dar a título de tutela provisória de urgência antecipada ou cautelar, na forma dos artigos 294 a 310 do Código de Processo Civil, ou da evidência, conforme o artigo 311 do CPC, desde que preenchidos os requisitos para tanto: TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA Probabilidade de existência do direito (fumus boni iuris ) e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora ), conforme disposto no artigo 300 do Código de Processo Civil. TUTELA PROVISÓRIA DA EVIDÊNCIA Hipóteses elencadas nos incisos do artigo 311 do CPC, quais sejam: a) Ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte. b) As alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante. c) Tratar-se de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa. d) A petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Pelo artigo 7º, §§ 3º e 4º, da Lei n. 12.016 de 2009, os efeitos da medida liminar em mandado de segurança, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença e, deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento. Destaque-se que a estabilização da tutela de urgência antecipada, prevista no artigo 304 do Código de Processo Civil, não é cabível em sede de mandado de segurança, tendo em vista a especialidade do rito procedimental em relação ao procedimento comum do Código de Processo Civil. Anote-se que a Lei n. 12.016 de 2009 traz algumas vedações à concessão de medida liminar em mandado de segurança no artigo 7º, § 2º, destinadas à Fazenda Pública: com efeito, não será concedida medida liminar que tenha por objeto: (A) A compensação de créditos tributários (B) A entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior (C) A reclassificação ou equiparação de servidores públicos (D) A concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza Sobre as vedações: PRIMEIRA VEDAÇÃO A primeira vedação, semelhante àquela prevista no artigo 1º, § 5º, da Lei n. 8.437 de 1992, decorre do artigo 156, inciso II, do artigo 170-A do CTN: a compensação é forma de extinção do crédito tributário, fazendo desaparecer o direito de crédito da Fazenda Pública. Assim, sua extinção por meio de medida liminar poderia ocasionar a extinção prematura do crédito tributário em havendo posterior cassação da medida liminar, em prejuízo do Fisco. A compensação tributária depende do trânsito em julgado da sentença no mandado de segurança. SEGUNDA VEDAÇÃO A segunda vedação resulta de opção legislativa, pois a não liberação dessas mercadorias e desses bens provenientes do exterior, extrajudicialmente pela Administração, pode decorrer de motivos de saúde pública ou tributários, que justificam uma opção legislativa pela não concessão de medida de urgência (RODRIGUES, 2016). TERCEIRA VEDAÇÃO A terceira vedação resulta de medida de economia processual e eficiência administrativa. Isto porque, caso não houvesse este óbice à concessão de medida liminar em desfavor da Fazenda Pública e a tutela provisória desse teor fosse posteriormente cassada ou revogada, haveria necessidade de liquidação de eventual prejuízo pecuniário sofrido, na forma do artigo 302 do Código de Processo Civil, ou cobrança administrativa dos valores devidos ao servidor. ATENÇÃO A vedação incide tão somente em relação à concessão de medida liminar para a compensação tributária. Não há óbice que o mandado de segurança seja utilizado ou para declaração do direito à compensação tributária, como deixa evidente a súmula 213 do STJ, a ser buscado administrativamente junto ao Fisco pelo impetrante, ou para compelir a autoridade fazendária coatora a efetuar a compensação tributária. Foto: Shutterstock.com A parte final do artigo 7º, inciso III, prevê a possibilidade de o juízo exigir caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica, conteúdo bastante semelhante ao previsto no artigo 300, § 2º, do Código de Processo Civil. Trata-se de medida de contracautela, destinada à proteção ao erário na hipótese de revogação ou cassação da liminar, e que poderá ser exigida do impetrante. Pelo artigo 7º, § 5º, da Lei n. 12.016 de 2009, as vedações à concessão de liminar em mandado de segurança são extensíveis à tutela provisória de urgência em sede de procedimento comum. Trata-se de disposição em consonância com o artigo 1º da Lei n. 8.437 de 1992, que possui conteúdo semelhante, ao vedar a concessão de medida liminar quando não for cabível sua concessão em mandado de segurança. Em relação ao mandado de segurança coletivo, a Lei n. 12.016 de 2009 prevê que a concessão de liminar depende de oitiva prévia do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 horas (artigo 22, § 2º), previsão semelhante a existente no artigo 2º da Lei n. 8.437 de 1992. Trata-se de medida de promoção do princípio do contraditório, norma fundamental do processo civil, prevista no artigo 9º do Código de Processo Civil, que tem em conta a relevância dos direitos discutidos em sede de mandado de segurança coletivo. Em casos de urgência extrema, poderá haver a concessão da medida antes da oitiva do representante da Fazenda Pública. Trata-se, contudo, de exceção, devendo a oitiva do representante judicial da pessoa jurídica de direito público ser a regra em tal hipótese. A decisão interlocutória a respeito do pedido de medida liminar é recorrível por meio de agravo de instrumento (artigo 7º, § 1º, da Lei n. 12.016 de 2009), de maneira semelhante ao regime previsto no Código de Processo Civil a respeito das decisões interlocutórias sobre tutela provisória, previsto no artigo 1015, inciso II,do Código, entendimento este adotado pelo Enunciado 351 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC). LIMINAR DO MANDADO DE SEGURANÇA Vamos agora descrever os principais elementos a respeito da liminar: SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DE LIMINAR O artigo 15 da Lei n. 12.016 de 2009 traz o incidente de suspensão de eficácia de liminar em mandado de segurança, que, na nomenclatura forense, adquiriu a denominação de suspensão de segurança. Anteriormente, o incidente já encontrava previsão no artigo 4º da Lei n. 8.437 de 1992. Em apertadíssima síntese, a suspensão de segurança é prerrogativa processual da Fazenda Pública, a qual permite a suspensão do cumprimento da medida liminar ou da sentença com vistas a evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, conceitos mais amplos do que aqueles passíveis de serem alegados em sede de agravo de instrumentos, os quais são relacionados ao preenchimento ou não dos requisitos para concessão da tutela provisória. A natureza jurídica do incidente de suspensão de eficácia de liminar em mandado de segurança, como seu nome sugere, é de incidente processual. A legitimidade para requerer a suspensão da eficácia de liminar é atribuída à pessoa jurídica de direito público interessada e ao Ministério Público, na forma do artigo 15, in fine , da Lei n. 12.016 de 2009. A jurisprudência, de longa data e em interpretação extensiva, também confere legitimidade às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos para requerer a instauração do incidente, como é o caso das empresas públicas e das sociedades de economia mista. A competência para apreciar o pedido é conferida ao presidente do tribunal competente para apreciar o respectivo recurso em face da medida liminar. A título de exemplo, o Presidente do Tribunal de Justiça é competente para apreciar pedido de suspensão de eficácia de liminar concedida por Juízo de Direito. Indeferido o pedido de suspensão pela Presidência do Tribunal, poderá ser formulado novo pedido de suspensão, desta vez, direcionado ao presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário, como dispõe o artigo 15, § 1º, da Lei n. 12.016 de 2009. RESUMINDO Por não possuir natureza recursal e ter pressupostos diversos, como antes mencionado, a instauração de incidente de suspensão de eficácia de medida liminar não prejudica nem condiciona o julgamento de eventual agravo de instrumento interposto em face da decisão concessiva da medida liminar e vice-versa, como deixa claro o artigo 15, § 3º da Lei n. 12.016 de 2009. Foto: Shutterstock.com INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL Há a possibilidade de que a petição inicial do mandado de segurança seja indeferida, como prevê o artigo 10 da Lei n. 12.016 de 2009, quando não for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração, por meio de sentença, no caso de mandado de segurança em primeiro grau de jurisdição, ou decisão monocrática ou acórdão, em se tratando de mandado de segurança em julgamento originário de Tribunal. No caso de vício sanável na petição inicial, o juízo singular ou o relator do mandado de segurança deve oportunizar prazo para o impetrante corrigi-lo, na forma dos artigos 321 e 932 do Código de Processo Civil. A emenda da inicial, no entender de alguns autores, é direito subjetivo do autor, entendimento este aplicável ao mandado de segurança (NERY JUNIOR; NERY, 2018, p. 859). IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO NO MANDADO DE SEGURANÇA Além do indeferimento da petição inicial, também é cabível a improcedência liminar do pedido formulado no mandado de segurança, nas hipóteses previstas no artigo 332 do Código de Processo Civil. Esse é o entendimento adotado, por exemplo, no Enunciado 291 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC). A improcedência liminar do pedido é cabível nas causas que dispensem fase instrutória, como é o caso do mandado de segurança, quando a pretensão do impetrante for contrária a: Enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos Entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência Enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local Pelo artigo 332, § 1º, do CPC, o juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO Após a decisão positiva de admissibilidade da petição inicial, com a notificação da autoridade coatora para prestar informações e a intimação do órgão de representação da pessoa jurídica interessada, findo o prazo de apresentação das informações, o processo será encaminhado ao Ministério Público para que o órgão, querendo, apresente parecer no prazo de dez dias, na forma do artigo 12 da Lei n. 12.016 de 2009. O prazo para manifestação do Ministério Público é impróprio, inexistindo preclusão temporal em havendo manifestação do Parquet após exaurido este prazo. E, com ou sem parecer do órgão ministerial, os autos serão encaminhados ao órgão julgador para decisão final, na forma do artigo 12, parágrafo único, da Lei n. 12.016 de 2009. Pela extensão de seu conteúdo, o ponto será tratado no módulo seguinte. PROCEDIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DE TRIBUNAL Não há diferenças significativas no procedimento do mandado de segurança de competência originária de Tribunal. Há, com efeito, dois traços característicos em comparação com o mandado de segurança em primeiro grau de jurisdição: Defesa oral Compete ao relator a instrução do processo, assegurada a defesa oral na sessão do julgamento do mérito ou do pedido liminar (artigo 16 da Lei n. 12.016 de 2009, na redação da Lei n. 13.676 de 2018). Recurso cabível O recurso cabível em face da decisão de concessão ou de indeferimento da medida liminar é o agravo, a ser julgado pelo órgão do tribunal que integra (a título de exemplo, Câmara Cível). VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. SOBRE O MANDADO DE SEGURANÇA, ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA: A) O Código de Processo Civil traz vedação expressa quanto ao cabimento de medida liminar em mandado de segurança, em toda e qualquer hipótese. B) É cabível a estabilização da medida liminar em mandado de segurança. C) O mandado de segurança não é cabível em face de atos legislativos. D) O mandado de segurança não admite dilação probatória, cabendo ao impetrante instruir sua petição inicial com os documentos necessários para demonstrar a existência e a extensão do direito que alega possuir. E) As vedações à concessão de liminar em mandado de segurança não são extensíveis à tutela provisória de urgência em sede de procedimento comum. 2. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A RESPEITO DA MEDIDA LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA: A) A decisão interlocutória que concede ou indefere o pedido de medida liminar é recorrível por meio de apelação. B) A concessão de liminar em mandado de segurança para a liberação de mercadorias provenientes do exterior não é vedada pela Lei n. 12.016 de 2009. C) A concessão de medida liminar em mandado de segurança permite a instauração de incidente de suspensão de eficácia de liminar em mandado de segurança. D) Sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos não são partes legítimas a requerer a suspensão de medida liminar em mandado de segurança concedida em relação ao serviço público por ela prestado. E) A única vedação à concessão de medida liminar em mandado de segurança diz respeito à impossibilidade de que a tutela provisória seja deferida para a compensação de créditos tributários. GABARITO 1. Sobre o mandado de segurança, assinale a alternativa correta: A alternativa "D " está correta. O direito líquido e certo exigecomprovação documental quando da impetração, não sendo admitida dilação probatória em sede de mandado de segurança. 2. Assinale a alternativa correta a respeito da medida liminar em mandado de segurança: A alternativa "C " está correta. O incidente de suspensão de liminar está previsto no artigo 15 da Lei n. 12.016 de 2009 e no artigo 4º da Lei n. 8.437 de 1992. MÓDULO 3 Identificar o conteúdo da sentença e o regime da coisa julgada SENTENÇA NO MANDADO DE SEGURANÇA Terminada a instrução, com ou sem manifestação do Ministério Público, o processo será concluso ao juízo para proferir sentença, na forma do artigo 12, parágrafo único, da Lei n. 12.016 de 2009, no prazo de trinta dias. Trata-se de prazo impróprio. A sentença no mandado de segurança, a partir da classificação quinária das ações, cunhada por Pontes de Miranda (1998, p. 122), possui natureza mandamental: a pretensão do impetrante, com efeito, é de que seja imposta uma ordem à autoridade coatora para fazer ou deixar de fazer algo. A partir da classificação trinária das ações, majoritária em doutrina, a sentença no mandado de segurança possui natureza condenatória. Em termos de conteúdo, a sentença poderá: CONCEDER A ORDEM Julgar procedente o pedido formulado pelo impetrante, no todo ou em parte DENEGAR A ORDEM Pode ocorrer na hipótese de extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do artigo 485 do Código de Processo Civil, ou resolver o mérito na forma do artigo 487 do Código de Processo Civil, sem julgar procedente o pedido. A distinção será analisada com mais detalhes ao se tratar da coisa julgada no mandado de segurança Pelo artigo 25 da Lei n. 12.016 de 2009, parte final, não é cabível a condenação do sucumbente ao pagamento de honorários advocatícios, sistemática bastante semelhante àquela prevista para os demais remédios constitucionais e que trouxe ao plano legislativo o entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, constante de sua súmula 512. DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO A sentença concessiva de mandado de segurança está sujeita ao duplo grau obrigatório de jurisdição, previsto no artigo 14, § 1º, da Lei n. 12.016 de 2009. Trata-se de prerrogativa processual da Fazenda Pública, instituída em favor do erário, e que possui natureza jurídica de condição de eficácia da sentença, indispensável para que a decisão possa produzir seus efeitos. Por se tratar de regra especial, no entender da jurisprudência dominante, não se aplicam ao mandado de segurança as dispensas à remessa necessária previstas no artigo 496, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil. Assim, em todo e qualquer caso no qual a sentença seja concessiva da segurança, deverá haver seu reexame pelo tribunal ao qual o juízo prolator está vinculado, sob pena de ineficácia da sentença. O efeito devolutivo na remessa necessária é amplo, permitindo ao tribunal reexaminar todas as questões de fato e de direito submetidas ao processo, como deixa claro a leitura da súmula 325 do STJ. Contudo, no reexame necessário, é vedado ao tribunal agravar a condenação imposta à Fazenda Pública, por força da súmula 45 do STJ. COMENTÁRIO Os recursos em face da sentença em mandado de segurança serão analisados mais adiante. ACÓRDÃO DE JULGAMENTO EM MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DE TRIBUNAL Em termos de conteúdo, o acórdão de julgamento do mandado de segurança não possui diferenças significativas em relação à sentença, no que tange aos mandados de segurança de competência de juízo singular. Assim, o acórdão poderá: CONCEDER A ORDEM Julgar procedente o pedido, no todo ou em parte DENEGAR A ORDEM Pode ocorrer na hipótese de extinção do processo sem resolução do mérito ou julgar improcedente o pedido. A distinção será analisada com mais detalhes ao se tratar da coisa julgada no mandado de segurança A distinção de maior realce que o acórdão de julgamento em mandado de segurança de competência originária de tribunal em relação à sentença diz respeito ao regime de recorribilidade. O ponto será tratado mais adiante. EXECUÇÃO PROVISÓRIA Pelo artigo 14, § 3º, da Lei n. 12.016 de 2009, a sentença concessiva da segurança pode ser executada provisoriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão de medida liminar com aquele conteúdo (ex.: sentença que concede a ordem para que a autoridade coatora efetue a compensação tributária buscada pelo contribuinte, a qual somente poderá ser objeto de cumprimento definitivo). O cumprimento provisório de sentença é disciplinado pelos artigos 520 a 522 do Código de Processo Civil, os quais se aplicam, no que couber, ao cumprimento provisório de sentença concessiva de segurança. RESUMINDO O cumprimento provisório de sentença em face da Fazenda Pública, na hipótese em que for ré pessoa jurídica de direito público, possui importante limitação, qual seja, seu prosseguimento pode ocorrer até a expedição do respectivo precatório ou requisição de pequeno valor, sendo vedado o pagamento de quantia antes do trânsito em julgado da decisão exequenda, como deixa claro o artigo 2º-B da Lei n. 9.494 de 1997, e obedecendo-se ao procedimento para pagamento pela via do precatório ou requisição de pequeno valor, na forma do artigo 100 da Constituição Federal. Foto: Shutterstock.com VENCIMENTOS E VANTAGENS PECUNIÁRIAS O artigo 14, § 4º, da Lei n. 12.016 de 2009 traz a previsão de que o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial. A referida limitação busca impedir o uso do mandado de segurança como substitutivo de ação de cobrança, o que, no entender do Supremo Tribunal Federal, não é cabível, na forma de sua súmula 269, editada ainda sob a vigência da Lei n. 1.533 de 1951. A impossibilidade de utilização do mandado de segurança como sucedâneo de ação de cobrança resulta, essencialmente, de dois fatores: Natureza da ação No mandado de segurança, o impetrante pretende seja imposta uma ordem à autoridade coatora; seu conteúdo é mandamental. Na ação de cobrança, o autor pretende a condenação do réu a efetuar o pagamento de determinada quantia; seu conteúdo é condenatório. Necessidade de dilação probatória A definição da quantia a ser eventualmente paga ao autor, como regra, demanda dilação probatória, o que, por si só, já afastaria o cabimento de mandado de segurança na hipótese. ATENÇÃO A vedação à utilização do mandado de segurança como sucedâneo de ação de cobrança não impede o impetrante de satisfazer a pretensão de receber eventuais reflexos patrimoniais da concessão da ordem (exemplo: a concessão da ordem para que o servidor público impetrante obtenha a implementação de determinada gratificação em sua remuneração permite o eventual recebimento de verbas devidas a partir da data da impetração nos próprios autos do mandado de segurança, sem necessidade de propositura de ação autônoma ou de cobrança administrativa dos referidos valores). A SENTENÇA NO MANDADO DE SEGURANÇA E SUA EFICÁCIA Agora, veremos um pouco mais sobre sentença e os efeitos que ela poderá produzir: COISA JULGADA NO MANDADO DE SEGURANÇA O regime de formação da coisa julgada no mandado de segurança dependerá do conteúdo da decisão final no mandamus . Vamos às hipóteses: CONCESSÃO DA ORDEM Em havendo concessão da ordem, a decisão final do processo formará coisa julgada material, na forma do artigo 502 do Código de Processo Civil, impedindo a rediscussão do mérito em processo posterior. Não há maiores distinções, no ponto, em relação ao regime de formação da coisa julgada no procedimento comum, previsto no Código de Processo Civil. DENEGAÇÃO DA ORDEM Em havendo denegação da ordem, por sua vez, há necessidade de se perquirir a respeito do conteúdo da decisão denegatória. Caso o decisum não tenha apreciadoo mérito do mandado de segurança, extinguindo-o na forma do artigo 485 do Código de Processo Civil, haverá formação de coisa julgada formal, não havendo óbice a que o impetrante, por ação própria, busque o direito que alega possuir, como prevê o artigo 19 da Lei n. 12.016 de 2009. Em sentido semelhante é o conteúdo da súmula 304 do STF. Da mesma forma, na hipótese em que a sentença denegar a ordem por ausência de provas da existência do direito líquido e certo alegado pelo impetrante, haverá formação de coisa julgada formal. Afinal, se houve denegação da segurança por falta de prova do direito líquido e certo, falta requisito para a apreciação do mérito, sendo, pois, decisão terminativa, que não forma coisa julgada material e não impede ação posterior, munida de novas provas, para a defesa do direito (RODRIGUES, 2016, p. 221; MEIRELLES, 2019, p. 127). Por essa razão é que alguns autores, como Fredie Didier Junior, apontam que a coisa julgada nessa hipótese é secundum eventum probationis (DIDIER JUNIOR; BRAGA; OLIVEIRA, 2010, p. 422). Se a denegação da ordem for fundada na inexistência do direito líquido e certo alegado pelo impetrante em sua peça inaugural, a decisão final do processo formará coisa julgada material, na forma do artigo 502 do Código de Processo Civil, nos mesmos moldes da decisão concessiva da segurança pleiteada, impedindo a rediscussão do mérito em processo posterior. No mandado de segurança coletivo, pelo artigo 22 da Lei n. 12.016 de 2009, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante. Trata-se de decorrência das espécies de direito coletivo passíveis de proteção pela via do mandado de segurança, os quais possuem beneficiários passíveis de individualização. Foto: rafapress/Shutterstock.com RECURSOS Os recursos cabíveis em face da sentença e do acórdão de julgamento do mandado de segurança variarão conforme o conteúdo da decisão. A discussão a respeito do recurso cabível em face da decisão que concede ou indefere o pedido de liminar foi tratada no módulo 2. RECURSOS EM FACE DA SENTENÇA EM MANDADO DE SEGURANÇA A sentença concessiva ou denegatória da segurança é recorrível por meio de apelação, na forma do artigo 14 da Lei n. 12.016 de 2009. A sentença concessiva pode ser objeto de cumprimento provisório, como dispõe o artigo 14, § 3º, da mesma Lei. Disso se extrai que eventual recurso de apelação interposto em face de sentença que concede a segurança possui efeito devolutivo, constituindo exceção à regra do artigo 1012 do Código de Processo Civil, que prevê efeito suspensivo ope legis para a apelação. O artigo 995, parágrafo único, do Código de Processo Civil permite a concessão de efeito suspensivo por decisão do relator do recurso (efeito suspensivo ope iudicis), se houver risco de dano grave da imediata produção dos efeitos da decisão recorrida, de difícil ou impossível reparação (perigo de dano), e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso (probabilidade de existência do direito). Trata-se, com efeito, de modalidade de tutela provisória de urgência, aplicável ao mandado de segurança. RECURSOS EM FACE DE ACÓRDÃO DE JULGAMENTO EM MANDADO DE SEGURANÇA Os recursos cabíveis em face de acórdão de julgamento de mandado de segurança variarão conforme o conteúdo da decisão proferida pelo tribunal. A técnica de ampliação de colegiado, prevista no artigo 942 para alguns julgamentos não unânimes, não se aplica à remessa necessária, conforme prevê o artigo 942, § 4º, inciso II, do Código de Processo Civil. A previsão tem origem no artigo 25 da Lei n. 12.016 de 2009, que afasta o cabimento de embargos infringentes em sede de mandado de segurança, recurso que fora extinto com o advento do Código de Processo Civil atual. Por sua vez, em sendo o caso de julgamento de recurso de apelação interposto por qualquer das partes, o acórdão poderá ser impugnado mediante recurso especial ou extraordinário, conforme o caso. Tanto a remessa necessária quanto eventual recurso de apelação interposto em face da sentença serão julgados pelo mesmo acórdão. O mandado de segurança de competência originária de tribunal possui sistemática recursal diversa: CONCESSÃO DA ORDEM A pessoa jurídica de direito público e a autoridade coatora poderão interpor recurso especial ou extraordinário, conforme a matéria deduzida em sede de recurso. O impetrante, em havendo concessão parcial da ordem, poderá interpor recurso ordinário, na forma elencada no item anterior. DENEGAÇÃO DA ORDEM O impetrante poderá interpor recurso ordinário a ser julgado pelo STJ, nas hipóteses previstas no artigo 105, inciso II, alínea “b”, da Constituição Federal (mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos estados, do Distrito Federal e territórios), ou de competência recursal do STF, em se tratando de mandado de segurança decidido em única instância pelos Tribunais Superiores, como prevê o artigo 102, inciso II, alínea “a”, da Constituição Federal. Como se vê, o recurso ordinário em mandado de segurança é exemplo de recurso secundum eventum litis , sendo cabível a depender do resultado da demanda (RODRIGUES, 2016). A interposição de recurso ordinário quando cabível recurso especial ou extraordinário e vice- versa é considerada pela jurisprudência como hipótese de erro grosseiro e de inexistência de dúvida objetiva quanto ao recurso cabível, afastando a aplicação da teoria da fungibilidade recursal para permitir o conhecimento do recurso equivocado como se correto fosse. Por fim, em se tratando de acórdão de julgamento de agravo de instrumento interposto em face de decisão concessiva ou de indeferimento de medida liminar, o entendimento jurisprudencial é no sentido de não ser cabível a interposição de recurso extraordinário ou especial com vistas a obter a sua reforma, como estabelecido na súmula 735 do STF. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A RESPEITO DA COISA JULGADA NO MANDADO DE SEGURANÇA: A) Decisão denegatória de mandado de segurança impede o impetrante de buscar em ação própria seus direitos e respectivos efeitos patrimoniais, em toda e qualquer hipótese. B) A coisa julgada no mandado de segurança coletivo será limitada aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante. C) Decisão concessiva de mandado de segurança não formará coisa julgada material, podendo a pessoa jurídica interessada buscar a revisão do conteúdo do julgado em ação ordinária. D) O mandado de segurança coletivo induz litispendência para as ações individuais, ocasionando a extinção desses processos sem resolução do mérito. E) A coisa julgada no mandado de segurança coletivo é erga omnes . 2. ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA A RESPEITO DA SENTENÇA NO MANDADO DE SEGURANÇA: A) A sentença condenará o vencido a pagar honorários advocatícios ao vencedor. B) No mandado de segurança, em nenhuma hipótese é cabível a aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. C) A sentença no mandado de segurança admite cumprimento provisório, nas hipóteses em que não for vedada a concessão de medida liminar. D) A sentença poderá condenar a Fazenda Pública ao pagamento de vantagens pecuniárias ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional que digam respeito a período anterior ao da impetração. E) A Lei n. 12.016 de 2009 afasta de maneira expressa a submissão da sentença no mandado de segurança ao duplo grau obrigatório. GABARITO 1. Assinale a alternativa correta a respeito da coisa julgada no mandado de segurança: A alternativa "B " está correta. A letra b está correta, pois essa é a previsão constante do artigo 22 da Lei n. 12.016 de 2009. 2. Assinale a alternativa correta a respeito da sentença no mandado de segurança: A alternativa "C " está correta. A letra C é a afirmativa certa, já que o artigo 14, § 3º, da Lei n. 12.016 de 2009, admite o cumprimento provisórioem tais hipóteses. CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Como vimos, o mandado de segurança é um remédio constitucional destinado à tutela célere em face de atos de autoridade, com vistas a combater ilegalidade ou abuso de poder, lesiva ou potencialmente lesiva a direito líquido e certo. Trata-se de importante instrumento de proteção de direitos dos administrados. Vimos os pontos mais relevantes de estudo da matéria, tais como os pressupostos para o cabimento de writ , legitimados, quais são os atos passíveis de impugnação pela via de mandado de segurança, dentre outros. Com essas noções, poderemos obter conhecimento amplo sobre a matéria e fixar as bases para que possa haver estudo mais aprofundado no futuro. AVALIAÇÃO DO TEMA: REFERÊNCIAS DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil. v. II, 7. ed. Salvador: JusPODIVM, 2010. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 44. ed. Salvador: JusPODIVM, 2020. MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança e ações constitucionais. 38. ed. São Paulo: Malheiros, 2019. MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado das ações. v. VII, 2. ed. (atualizado por Vilson Rodrigues Alves). Campinas: Bookseller, 1998. RODRIGUES, Marco Antonio. A Fazenda Pública no Processo Civil. Rio de Janeiro: GEN, 2017. RODRIGUES, Marco Antonio. Curso de Processo Administrativo e Judicial Tributário. Salvador: JusPODIVM, 2020. EXPLORE+ Para saber mais sobre os assuntos tratos neste tema, leia: Capítulo XIV da obra Fazenda Pública em juízo (2020), de Leonardo José Carneiro da Cunha. Leia o texto Por um novo mandado de segurança: retorno à origem? , de Leonardo Greco, disponível na internet na Revista Eletrônica de Direito Processual. CONTEUDISTA Rodrigo Vieira Farias CURRÍCULO LATTES javascript:void(0);
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