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2019-Prática-Lei do Mandado de Segurança - Comentada artigo por artigo - Humberto Theodoro Jr - 2Ed - Forense

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contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior (art. 104 da Lei n. 9.610/98).
Capa: Danilo Oliveira
Produção digital: Ozone
Fechamento desta edição: 04.09.2018
CIP – BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE.
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.
T289L
Theodoro Júnior, Humberto
Lei do Mandado de Segurança comentada: artigo por artigo / Humberto Theodoro Júnior. – [2. ed.]. – Rio de Janeiro :
Forense, 2019.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-309-8264-5
1. Brasil. [Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009]. 2. Mandado de segurança – Brasil. I. Título.
18-51112 CDU: 347.951(81)
Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária CRB-7/6439
mailto:faleconosco@grupogen.com.br
http://www.grupogen.com.br
APRESENTAÇÃO
Quando adveio a Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, publicamos um estudo sobre o
mandado de segurança renovado, cujo objetivo não foi o de produzir um ensaio amplo e exaustivo
sobre a ação constitucional, mas apenas cotejar as novas regras com as revogadas, a fim de clarear
os rumos que o importantíssimo instituto processual assumira. Nosso propósito, então, não era mais
do que facilitar, na aplicação prática, a compreensão do novo ordenamento instrumentalizador de
uma das mais relevantes garantias fundamentais, no plano dos direitos do homem, em nosso moderno
Estado Democrático de Direito.
Já no quinto ano de vigência do diploma normativo, o panorama jurisprudencial e doutrinário se
alargou com as luzes do impacto da lei com as exigências do quotidiano, numa aplicação legal
recorrente e rica de variações, que só os casos concretos são capazes de fomentar.
É nessa quadra que nos sentimos atraídos pelo projeto de voltar à análise do mandado de
segurança, por meio de comentários mais detidos, artigo por artigo, da Lei nº 12.016/2009, já então
com os olhos voltados para uma perspectiva exegética mais aprofundada sobre o papel do writ
constitucional em causa. Desafiaram-nos as posições não uniformizadas que insistem em manter
polêmicas, tanto nos tribunais como na literatura doutrinária, em torno de questões, às vezes, de
grande relevância; outras vezes, fruto de puro academicismo.
Duas grandes premissas presidiram os comentários ora divulgados: (a) a necessidade de
abordar o instituto sempre valorizando seu papel e seus fundamentos na ordem constitucional; e (b) o
reconhecimento de que o direito como um todo e, particularmente, o direito processual exigem do
jurista e do aplicador contemporâneos uma análise cada vez menos estrutural e conceitual, e que se
ocupe cada vez mais da funcionalidade dos institutos normativos. Ou seja, o que hoje se impõe – na
lição de Norberto Bobbio – não é apenas saber como o direito é feito, mas, sobretudo, saber para
que serve o direito, operação que quebra o isolamento da ciência jurídica e força sua maior
aproximação com outras ciências sociais. Tudo isto em uma tentativa de promover maior aderência
social à estruturação jurídica, a partir de uma análise funcional do direito1.
Os presentes comentários, em síntese, procuram colocar sempre em primeiro plano exegético a
supremacia da ordem constitucional em tudo que se relacione com a interpretação e aplicação da
disciplina do mandado de segurança. E, na ordem prática procedimental, o critério invariavelmente
valorizado é o funcional, consistente em escolher, entre os entendimentos conflituosos, aquele que se
aproxime, de maneira mais útil e adequada, da função que a Constituição atribui ao remédio jurídico
em causa.
Nunca nos passou pela cabeça dar uma palavra final sobre qualquer dos institutos que a
legislação do mandado de segurança regula e que ainda ensejam dissídio entre os doutos. Nosso
1
propósito não foi além do esforço de apenas contribuir com modestos adminículos para o
prosseguimento do debate instalado, sugerindo a avaliação de alguns enfoques ainda não de todo
exauridos, seja no campo pretoriano, seja no doutrinário.
O Autor
Junho/2014
BOBBIO, Norberto. Dalla strutura alla funzione: nuovi studi di teoria del dirito. Bari: Editori
Laterza, 2007, p. 48-54.
APRESENTAÇÃO DA 2ª EDIÇÃO
O mandado de segurança é, a um só tempo, uma garantia fundamental contra o exercício abusivo
do poder pelas autoridades públicas e um remédio processual estruturado para dar realidade,
efetividade e eficiência à tutela engendrada constitucionalmente entre os Direitos do Homem.
Pela infinidade de situações conflituosas que, no concreto da convivência entre as pessoas e a
Administração Pública, não cessam de acontecer, cada vez com mais diversa roupagem fático-
jurídica, a doutrina e principalmente a jurisprudência se veem na contingência de construir e
reconstruir teses adequadas à almejada função do mandamus.
Daí o propósito da presente reedição destes comentários à Lei do Mandado de Segurança,
focado sobretudo nas questões que, nos últimos tempos, agitaram os tribunais, envolvendo a
aplicação do importantíssimo instituto constitucional.
No plano legislativo, apenas uma alteração se registrou no texto da Lei nº 12.016/2009, e se
ocupou de melhorar a disciplina da defesa oral nos julgamentos de mandado de segurança nos
tribunais, tema que vinha ensejando sérias divergências. A novidade normativa introduzida pela
recente Lei nº 13.676/2018 foi objeto de abordagem nos novos comentários ao caput do art. 16 da
Lei do Mandado de Segurança.
O Autor
Setembro/2018
Material
Suplementar
Para acessar o material suplementar entre em contato conosco através do e-mail
(gendigital@grupogen.com.br).
mailto:gendigital@grupogen.com.br
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8.1.
8.2.
8.3.
8.4.
8.5.
9.
9.1.
9.2.
9.3.
10.
ÍNDICE SISTEMÁTICO
PARTE I
NOÇÕES GERAIS
Capítulo I
HISTÓRICO DO MANDADO DE SEGURANÇA
Antecedentes
O mandado de segurança no regime constitucional
Direitos e garantias fundamentais
Tutela jurisdicional aos direitos fundamentais
Natureza da ação de mandado de segurança
A elevada importância do mandado de segurança no plano das garantias constitucionais
PARTE II
COMENTÁRIOS À LEI Nº 12.016/2009, ARTIGO POR ARTIGO
Capítulo II
TUTELA PARA AS VÍTIMAS DE ILEGALIDADE E ABUSO DE PODER POR ATO DE AGENTE
PÚBLICO
Introdução
Conceito legal
Princípio da legalidade e submissão do Poder Público ao controle judicial
Ilegalidade e abuso de poder
Injuridicidade no plano do procedimento
Cabimento do mandado de segurança em caso de ato administrativo praticado com
desrespeito à garantia do contraditórioe ampla defesa
Mandado de segurança e a teoria do fato consumado
Mandado de segurança repressivo e mandado de segurança preventivo
Mandado de segurança preventivo e lei em tese
Mandado de segurança preventivo em matéria tributária
Mandado de segurança contra ato normativo de efeito concreto
Sumariedade do procedimento
10.1.
11.
12.
12.1.
12.2.
12.3.
12.4.
12.5.
12.6.
13.
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15.
15.1.
16.
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17.1.
18.
18.1.
18.2.
18.3.
18.4.
18.5.
18.6.
18.7.
18.8.
18.9.
18.10.
19.
20.
21.
21.1.
21.2.
Razão de ser da sumariedade do mandado de segurança
Natureza mandamental da ação
Pressupostos processuais e condições da ação: noções gerais
Pressupostos processuais e condições da ação em mandado de segurança
Pressuposto especial do mandado de segurança: direito líquido e certo
O direito líquido e certo é condição da ação ou mérito do mandado de segurança?
Momento da avaliação do direito líquido e certo
O direito líquido e certo e o concurso público
A jurisprudência do STF
Mandado de segurança contra ato omissivo
Livre disponibilidade da tutela mandamental
Competência para o mandado de segurança
Regras legais sobre a competência para o mandado de segurança
Mandado de segurança em matéria penal
O mérito da ação de mandado de segurança
Julgamento do mérito e lei superveniente
Partes na ação de mandado de segurança
Legitimação ativa
Legitimação ordinária
Legitimação extraordinária para o mandado de segurança
Direito comum a diversos titulares
Legitimação passiva
Autoridade coatora
Pessoa jurídica interessada
Legitimidade recursal
Caracterização de autoridade
Erro na nomeação da autoridade coatora
Equiparações legais de autoridade coatora
Mandado de segurança contra ato de colegiado
Sociedades de economia mista e empresas públicas
Atos de gestão comercial
Concessionários e permissionários
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
29.1.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
39.
Assistência e intervenção de terceiro
Intervenção de amicus curiae no mandado de segurança
Intervenção da União em mandados de segurança em que figurem, como par tes, entidades da
Administração Pública Federal indireta (Lei nº 9.469)
Capítulo III
AUTORIDADE COATORA FEDERAL
A autoridade coatora federal. Competência da Justiça Federal
Autoridade coatora em geral e autoridade coatora federal
Ausência de efeitos patrimoniais para a União
A jurisprudência sobre os concessionários de serviço público federal e a com petência para o
mandado de segurança
Uma ponderação de ordem constitucional sobre a regra do art. 2º da Lei do Mandado de
Segurança e a garantia do “juiz natural”
Corolário da tese jurisprudencial relativa a segurança contra ato de con cessionária de
serviço público federal
Situações de conflito em torno da competência da Justiça Federal
Capítulo IV
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL
Legitimação de terceiro interessado: substituição processual
Outro caso de legitimação extraordinária (parcial)
Requisitos da substituição processual
Notificação do legitimado originário
O prazo da notificação e o prazo de decadência da ação mandamental
Capítulo V
MANDADO DE SEGURANÇA EM REGIME DE URGÊNCIA
Impetração do mandado de segurança por meio eletrônico
Notificação e intimação por meio eletrônico
Capítulo VI
RESTRIÇÕES AO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA
Restrições de origem constitucional
Ato praticado em processo administrativo
40.
41.
42.
43.
44.
45.
45.1.
46.
47.
48.
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53.
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57.
57.1.
57.2.
57.3.
58.
58.1.
58.2.
59.
60.
Mandado de segurança contra decisão judicial
Ato judicial omissivo
Decisão judicial transitada em julgado
O esvaziamento do cabimento do mandado de segurança contra ato judicial
Prazo para impetração da segurança contra ato judicial: ato jurisdicional e ato administrativo do
Poder Judiciário
Julgados dos Juizados Especiais
Mandado de segurança contra decisão interlocutória nos Juizados Especiais
O problema da competência para processar o mandado de segurança contra decisões dos
Juizados Especiais
Mandado de segurança do terceiro prejudicado por decisão judicial
Mandado de segurança contra órgão fracionário de tribunal
Ato disciplinar
Atos “interna corporis”
Capítulo VII
A PROPOSITURA DO MANDADO DE SEGURANÇA
A importância da petição inicial
Petição inicial defeituosa ou incompleta
A petição inicial e seus requisitos
Os requisitos da inicial e as características do mandado de segurança
Alguns detalhes da petição inicial do mandado de segurança: o sujeito passivo da ação
Inexistência de litisconsórcio entre coator e pessoa jurídica interessada
Autoridade coatora, na concepção legal
Correção da nomeação equivocada da autoridade coatora
Autoridade coatora e a teoria da encampação
Autoridade coatora, nos casos das equiparações do § 1º, do art. 1º, da Lei nº 12.016
Especificação das provas a produzir. Exibição de documentos em poder do coator ou de
terceiro
Documentos indispensáveis à instrução da petição inicial
Instrumento do mandato do advogado do impetrante
Petição inicial por meio eletrônico
Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido
61.
61.1.
62.
63.
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66.
67.
68.
69.
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71.
71.1.
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77.
78.
79.
80.
80.1.
81.
82.
83.
84.
O pedido
Descabimento de pedido que transforme o mandado de segurança em ação de cobrança
Valor da causa
Denegação do mandado de segurança, sem resolução do mérito
Renovação do pedido de mandado de segurança
Desistência do mandado de segurança
Capítulo VIII
DESPACHO DA PETIÇÃO INICIAL
O procedimento sumário do mandado de segurança
A natureza da notificação da autoridade coatora
As informações requisitadas da autoridade coatora
A ciência da pessoa jurídica interessada
Cientificação no caso de organismo autônomo não personalizado
Tutela antecipada: suspensão liminar do ato impugnado
A importância da tutela de segurança alcançável por meio da liminar
Requisitos da liminar do mandado de segurança
Momento processual da liminar
O caráter mandamental e não discricionário da medida liminar
Dimensões da liminar
Direito à liminar e exigência de caução
Duração dos efeitos da liminar
Recurso contra a decisão relativa à liminar do mandado de segurança
Vedações à liminar
Limite temporal dos efeitos da liminar: inexistência
Tramitação preferencial do mandado de segurança
O mandado de segurança e o Código de Processo Civil
Capítulo IX
PEREMPÇÃO OU CADUCIDADE DA LIMINAR
Revogação e cassação da liminar
Revogação tácita
Perempção ou decadência da liminar
85.
86.
87.
88.
89.
90.
91.
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93.
94.
95.
96.
97.
98.
99.
100.
101.
Capítulo X
PROVIDÊNCIAS ADMINISTRATIVAS
Medidas Administrativas preparatórias da defesa da pessoa jurídica
Providência administrativa a cargo da autoridade coatora
Prazo para a manifestação da pessoa jurídica interessada nos autos
Representação judicial da pessoa jurídica afetada pelo mandado de segurança
Capítulo XI
INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL
Indeferimento da petição inicial
Recurso contra o indeferimento da petição inicial
Litisconsórcio ativo superveniente
Capítulo XII
DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DOS ATOS DE COMUNICAÇÃO PROCESSUAL
Documentação processual da notificação da autoridade coatora e da citação
Capítulo XIII
MINISTÉRIO PÚBLICO
Participação do Ministério Público
O Ministério Público como impetrante do mandado de segurança
O representante do Ministério Público como autoridade coatora
Capítulo XIV
EXECUÇÃO DA SENTENÇA
Autoexecutividade da sentença do mandado de segurança
A forma de comunicação e cumprimento do mandado de segurança
Cumprimento da sentença que defere o mandado de segurança
Alguns expedientes utilizáveis para conferir efetividade ao cumprimento da sentença do
mandado de segurança
Capítulo XV
RECURSOS
O sistema recursal da Lei do Mandado de Segurança
Apelação contra a sentença do mandado de segurança
101.1.
101.2.
102.
103.
104.
105.
106.
107.
108.
109.
110.
111.
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115.
116.
117.
118.
119.
120.
121.
122.
Atribuição excepcional de efeito suspensivo à apelação
Prazo para interposição da apelação
Duplo grau de jurisdição necessário
Recurso da autoridadecoatora
Execução imediata (provisória) da sentença do mandado de segurança
Efeito da sentença denegatória da segurança
Verbas remuneratórias de servidores públicos reclamáveis por meio de mandado de segurança
Recursos particulares ilegalmente apropriados pela Administração
Capítulo XVI
SUSPENSÃO DA SEGURANÇA
Suspensão cautelar da segurança
Natureza jurídica
Cabimento do incidente
Legitimidade para promover o incidente
Competência
Procedimento
Oportunidade e eficácia do incidente
Reiteração do pleito e agravo interno
Recurso contra a decisão do pedido de suspensão da segurança
Expansão dos efeitos da suspensão a outros processos
Capítulo XVII
MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS TRIBUNAIS
Mandado de segurança de competência originária de Tribunal
Sustentação oral
Recorribilidade da decisão do relator sobre a liminar do mandado de segurança
O agravo interno
Capítulo XVIII
NOTAS TAQUIGRÁFICAS DAS SESSÕES DE JULGAMENTO
Substituição do acórdão pelas notas taquigráficas
Capítulo XIX
123.
124.
125.
126.
127.
128.
129.
130.
131.
132.
133.
134.
135.
136.
137.
138.
139.
140.
141.
141.1.
141.2.
141.3.
RECURSOS EM MANDADO DE SEGURANÇA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DOS
TRIBUNAIS
Sistema recursal aplicável ao mandado de segurança
Recursos para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça
Recurso ordinário
Conceito de denegação da segurança
Prazo do recurso ordinário e reexame necessário
Julgamento do recurso ordinário
Capítulo XX
MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO COMUM
A sentença do mandado de segurança
Coisa julgada formal e material em mandado de segurança
Coisa julgada formal em mandado de segurança
Rescindibilidade da sentença no mandado de segurança
Coisa julgada e relações jurídicas continuativas
Capítulo XXI
TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA DO MANDADO DE SEGURANÇA
Processamento em caráter preferencial do mandado de segurança
Procedimento célere nos tribunais
Capítulo XXII
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
O mandado de segurança como instrumento de tutela coletiva
A tutela coletiva e a substituição processual
Direitos difusos, direitos coletivos e direitos individuais homogêneos
Mandado de segurança e ação civil pública
Requisitos do mandado de segurança coletivo
Direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo
Identificação dos direitos sob tutela do mandado coletivo
Direitos defendidos pelo mandado de segurança coletivo: os controvertidos “direitos
difusos”
Da pequena relevância da tese que insiste em estender o mandado de segurança coletivo
141.4.
141.5.
141.6.
142.
142.1.
142.2.
143.
144.
144.1.
145.
146.
147.
148.
149.
150.
151.
152.
153.
154.
155.
156.
157.
157.1.
158.
159.
aos direitos difusos
A defesa dos direitos difusos por meio do mandado de segurança coletivo
Impossibilidade prática de isolar os direitos coletivos dos direitos difusos
Mandado coletivo e direitos difusos: um falso problema
Partidos políticos
Os partidos políticos e sua destinação institucional
Alguns problemas da legitimação dos partidos políticos, após a Lei nº 12.016/2009
Organização sindical e entidade de classe
Associações
Relação dos associados da entidade impetrante
Pessoas jurídicas de direito público
Legitimação do Ministério Público para o mandado de segurança coletivo
Legitimação passiva do mandado de segurança coletivo
Competência
O procedimento do mandado de segurança coletivo
Capítulo XXIII
COISA JULGADA E LITISPENDÊNCIA EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
O regime da coisa julgada nas ações coletivas, anteriores ao mandado de segurança coletivo
O regime da coisa julgada nas ações de mandado de segurança coletivo
Substituição processual e coisa julgada no mandado de segurança coletivo: uma última palavra
Inocorrência de litispendência entre mandado de segurança coletivo e as ações individuais
Desistência do mandado de segurança individual
Restrições à liminar no mandado de segurança coletivo
Particularidades da sentença do mandado de segurança coletivo
Capítulo XXIV
DECADÊNCIA DO DIREITO AO MANDADO DE SEGURANÇA
Prazo para impetrar o mandado de segurança
Justificativa constitucional do prazo decadencial estabelecido para o mandado de
segurança
Natureza do prazo para impetração do mandado de segurança
Contagem do prazo decadencial da segurança
160.
161.
162.
163.
164.
165.
166.
167.
168.
169.
170.
171.
172.
173.
174.
175.
176.
Algumas situações particulares, em tema do prazo decadencial aplicável ao mandado de
segurança
Capítulo XXV
LITISCONSÓRCIO
Litisconsórcio no mandado de segurança
Litisconsórcio passivo
Casos de litisconsórcio passivo necessário
Litisconsórcio ativo
Litisconsórcio ativo superveniente
Assistência no mandado de segurança
Capítulo XXVI
EMBARGOS INFRINGENTES E SUCUMBÊNCIA
Os embargos infringentes e o mandado de segurança
Honorários de advogado e encargos sucumbenciais
Litigância de má-fé
Capítulo XXVII
DESCUMPRIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA
O cumprimento do mandado de segurança
Responsabilidade penal da autoridade coatora: crime de desobediência
Crime de responsabilidade e sanções administrativas
Outras sanções
Capítulo XXVIII DISPOSIÇÕES FINAIS
Reflexos da Lei do Mandado de Segurança
A vigência da Lei nº 12.016/2009 e o direito intertemporal
Leis revogadas
BIBLIOGRAFIA
Parte I
NOÇÕES GERAIS
1.
Capítulo I
HISTÓRICO DO MANDADO DE SEGURANÇA
ANTECEDENTES
No Império e nos primórdios da República, salvo no tocante à liberdade de locomoção, o
direito brasileiro não dispunha de remédio jurisdicional próprio para proteção dos indivíduos em
face dos abusos de poder praticados pelos agentes públicos1. Coube a RUI BARBOSA defender o
cabimento dos interditos possessórios, pelo caráter expedito de seu procedimento, para propiciar o
enfrentamento dos males advindos da ilegalidade cometida pela Administração, em prejuízo dos
cidadãos. Recorria o grande jurista à tese da existência de posse não só sobre coisas corpóreas, mas
também sobre direitos pessoais. Registra, contudo, CELSO BARBI, que o tradicional conceito de
posse impediu que o esforço de aplicar os interditos saísse vitorioso na doutrina e na
jurisprudência2.
Sem resultados práticos significativos, as Leis nºs 221, de 20.11.1894, e 1939, de 28.08.1908,
instituíram a ação com pedido anulatório de ato da administração, aplicável, de início, na esfera da
União, e, posteriormente, estendido às autoridades municipais e estaduais. Podem essas leis, no
entanto, ser vistas como iniciadoras do movimento legislativo que iria, mais tarde, desaguar na
implantação do mandado de segurança3.
Conquanto a ação sumária decorrente da Lei nº 221/1894 tenha institucionalizado o controle
dos atos administrativos pelo Poder Judiciário, não logrou obter a pretendida eficácia, porque,
segundo ARNOLDO WALD, sua tramitação era muito lenta. De tal sorte que acabou, no dizer de
PONTES DE MIRANDA, “desaparecendo da vida jurídica sem que nela se tivesse consolidado”4.
Quando, em 1926, GUDESTEU PIRES defendia, na Câmara dos Deputados, seu Projeto de Lei
destinado a implantar o mandado de segurança, teve a oportunidade de observar que “a ação sumária
especial, criada pela Lei n. 221, de 1894, foi um ensaio no sentido de alargar a defesa dos direitos
individuais; no entanto, a natureza desse processo e especialmente a fórmula de seus recursos deram
lugar a que a chicana abusasse dos prazos, transformando-lhe o rito sumário em interminável
sucessão de defesa e deploráveis delongas”5.
Outro antecedente do mandado de segurança, na luta para coibir os abusos administrativos
contra os particulares, se deu pela ampliação da doutrina do habeas corpus, ensaiada no sentido de
proteger, por seu intermédio, outros direitos individuais além da liberdade de locomoção. Fundava-
se a denominada “doutrina brasileira do habeas corpus” no fato de que a Constituição Republicana
de 1891 garantia o aludido remédio processual em prol do indivíduo sempre que sofresse ou se
2.
achasse na iminência de sofrer violência ou coação “por ilegalidade ou abuso de poder”, sem se
limitar, de maneira expressa, ao “direito de ir e vir”.Embora a jurisprudência tenha, sem maior
ênfase, acatado eventualmente essa tese, sua sobrevivência foi breve e frágil, porque uma Reforma
Constitucional de 1926 interferiu na Carta de 1891 para declarar que o habeas corpus somente se
destinava a tutelar o direito de locomoção6.
O MANDADO DE SEGURANÇA NO REGIME CONSTITUCIONAL
Coube à Constituição de 1934 a criação do mandado de segurança no ordenamento jurídico
brasileiro, ao prever que:
“Dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito, certo e incontestável, ameaçado
ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O
processo será o mesmo de habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a pessoa jurídica de
direito público interessada. O mandado de segurança não prejudica as ações petitórias
competentes” (art. 113, § 33).
A Lei nº 191, de 16.01.1936, disciplinou o processo do mandado de segurança, deixando claro
que em seu campo de atuação não se incluíam as questões puramente políticas, os atos disciplinares,
a liberdade de locomoção e os atos impugnáveis por recurso administrativo, independentemente de
caução, fiança ou depósito.
A Constituição de 1937 não contemplou, em seu bojo, o mandado de segurança, relegando-o ao
plano da legislação ordinária. O Decreto-Lei nº 6, de 16.11.1937, retratando o regime ditatorial
então implantado, vedou o mandado de segurança contra atos do Presidente da República, dos
Ministros de Estado, dos Governadores e interventores.
O Código de Processo Civil de 1939 previu, entre os procedimentos especiais, o do mandado
de segurança (arts. 319 a 331). O status constitucional do mandado de segurança foi reconquistado
por meio da Carta democrática de 1946. A Lei nº 1.533, de 31.12.1951, revogou os dispositivos do
CPC, cuidando em disciplina extravagante, de maneira ampla, do regime do mandado de segurança,
tanto formal como materialmente.
A Lei nº 1.533 vigorou, com algumas alterações pontuais, até 2009, quando adveio a Lei nº
12.016, de 07.08.2009, atualmente em vigor. Nesse meio tempo, surgiu a Constituição de 1967,
seguida pela Emenda nº 1, de 1969, restando mantido o caráter constitucional do mandado de
segurança restabelecido desde a Carta de 1946. A redemocratização do País, operada pela
Constituição de 1988, não alterou esse regime.
Os detalhes relevantes relativos ao mandado de segurança, durante esse processo das
renovações constitucionais, se situaram nos termos da conceituação do remédio heroico: (i) o art.
3.
141, § 24, da Constituição de 1946, falava em proteção a “direito líquido e certo não amparado por
habeas corpus”, excluindo, assim, a antiga exigência de “inconstitucionalidade e de ilegalidade
manifestas”, como requisito do mandado de segurança; (ii) a Constituição de 1967 falava em
proteção de “direito individual líquido e certo não amparado por habeas corpus” (art. 153, § 21);
(iii) a Emenda nº 1, de 1969, excluiu a expressão “individual”, de maneira a restabelecer a
conceituação da Carta de 1946; e (iv) a Constituição de 1988 inovou em três aspectos o regime do
mandado de segurança: a) permitiu sua impetração também contra atos de agentes de pessoa jurídica
privada nas funções do Poder Público (art. 5º, LXIX); b) admitiu a impetração coletiva (art. 5º,
LXX), além da individual; e c) reconheceu que a tutela mandamental tanto pode ser invocada para a
proteção de direitos individuais como de direitos coletivos (art. 5º, LXIX, c/c o inc. XXXV)7.
Depois de quase meio século de vigência da Lei nº 1.533/1951, adveio a Lei nº 12.016, de
07.08.2009, que teve o propósito de unificar a regulamentação do mandado de segurança, levando em
conta as diversas inovações legislativas supervenientes, tanto no plano constitucional como no
infraconstitucional, bem assim a necessidade de incorporar ao ordenamento jurídico positivo as teses
consagradas pela jurisprudência sedimentada em súmulas dos tribunais8. Essa nova lei, então,
revogou a Lei nº 1.533 e toda a legislação que, desde a época da Constituição de 1946, vinha
regendo o acesso ao mandado de segurança.
DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Sem distinguir os que seriam direitos e os que seriam garantias, a Constituição, no art. 5º,
proclama e garante a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no País “a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, nos termos dos 78 itens em
que o dispositivo se desdobra.
Embora seja tecnicamente possível distinguir entre direito e garantia, a Constituição não cuida
de fazê-lo no arrolamento dos direitos e garantias fundamentais, certamente porque, na ordem
prática, não se chega a efeitos distintos significativos para uns e outros. Com efeito, a quem se
outorga um direito, há sempre de garantir o respectivo exercício; e a quem se confere uma garantia,
reconhece-se, ipso facto, o direito de usufruí-la. Há, pois, garantia na própria declaração de um
direito fundamental, como há direito fundamental na instituição de determinado instrumento
garantidor do exercício do direito da espécie9. Adverte, a propósito, JOSÉ AFONSO DA SILVA,
que, embora se procure distinguir direitos e garantias a partir das no-ções de declaração e
assecuração, não é decisivo, “em face da Constituição, afirmar que os direitos são declaratórios e as
garantias assecuratórias, porque as garantias em certa medida são declaradas e, às vezes, se
declaram os direitos usando forma assecuratória”10.
Os direitos fundamentais, nessa ordem de ideias, são faculdades e prerrogativas que a
Constituição reconhece como inerentes à natureza humana, são os clássicos “direitos do homem”,
4.
correspondentes aos atributos essenciais de sua individualidade, cujo respeito não pode faltar na
convivência social e civilizada11. O direito constitucional moderno, porém, se encarrega não apenas
de prever e proclamar os direitos fundamentais do homem, mas também de instituir meios ou
instrumentos que lhe assegurem a eficácia, perante os excessos e desmandos praticados, às vezes,
pelos detentores do Poder Público12.
Dessa maneira, a distinção teórica entre direitos e garantias fundamentais se faz da seguinte
forma: (i) “os direitos são bens e vantagens conferidos pela norma”, enquanto (ii) “as garantias são
meios destinados a fazer valer esses direitos, são instrumentos pelos quais se assegura o exercício e
o gozo daqueles bens e vantagens”13. São inseparáveis dos direitos a que servem, já que, na
qualidade de cláusulas tutelares, só se extinguem quando os próprios direitos protegidos se
extinguirem14.
TUTELA JURISDICIONAL AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Nos moldes de um Estado Democrático de Direito como o Brasil, a garantia dos direitos
fundamentais é realizada por meio da tutela jurisdicional. A Constituição, por isso, ao declarar os
direitos fundamentais, faz inserção, no respectivo rol, também dos remédios processuais destinados a
protegê-los, de modo a assegurar--lhes a plena eficácia.
É assim que, v.ġ., o art. 5º da Constituição prevê ações como o habeas corpus, o habeas data, o
mandado de injunção e o mandado de segurança15. Mas, em sua essência e origem, esses remédios
não podem se caracterizar como meras ações, que se exaurem dentro dos princípios da teoria geral
do processo, “mas sim como garantias constitucionais destinadas a cercear a ilegalidade ou o abuso
praticado pelo Poder Público e às vezes por particulares, não podendo ser abolidos ou limitados
pelo legislador ordinário, e nem mesmo por emenda constitucional, tendo sua criação e limites
impostos pelo próprio poder constituinte originário”16.
Enfim, o mandado de segurança, que pode ser individual ou coletivo (CF, art. 5º, LXIX e LXX),
é a ação constitucional concebida para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas
corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso do poder for autoridade
pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público17.
O enraizamento do mandado de segurança no terreno constitucional dos direitos e garantias
fundamentais exige,antes de tudo, que sua disciplina seja tratada à luz da “verdadeira grandeza e
amplitude do instituto, bandeira da manutenção, conservação e desenvolvimento do Estado
Democrático de Direito brasileiro”18. Por isso, o procedimento e a própria essência do mandado de
segurança devem impor uma compreensão e interpretação, bem como uma aplicação, sempre “a
partir da Constituição”19.
Dessa origem constitucional, todavia, não decorre uma natureza instrumental diversa da que é
própria dos remédios processuais utilizados pela jurisdição estatal. É, pois, o mandado de segurança
– na lição de BARBOSA MOREIRA – “uma ação, uma espécie de gênero bem conhecido e familiar,
cujas peculiaridades, sem dúvida dignas de nota, não a desligam do convívio das outras espécies,
não a retiram do contexto normal do ordenamento jurídico, não a condenam a degredo em ilha
deserta. À semelhança do que acontece com as figuras congêneres, o mandado de segurança está
contido no âmbito normativo do processo civil e submete-se aos respectivos princípios e normas,
sem prejuízo de regulamentação especial constante das leis que a ele especificamente dizem
respeito”20. Não será, de tal sorte, fora da principiologia e sistemática do direito processual que se
conseguirá descobrir soluções para problemas como aqueles que gravitam em torno da competência,
do objeto litigioso, das condições da ação, dos pressupostos processuais, da legitimidade das partes,
da natureza da ação e do provimento judicial, dos recursos, da coisa julgada, da execução forçada, e
assim por diante.21
A fixação da natureza processual do mandado de segurança, todavia, em nada reduz a
importância fundamental de uma ação nascida na Constituição, com função nela definida e voltada
para objetivo institucional que vai muito além da simples composição judicial de conflito jurídico. É
ele, em si, uma das garantias constitucionais fundamentais, como se deduz de sua sede normativa: o
art. 5º da Carta Magna, que o institui, o arrola, expressamente, entre os “direitos e garantias
fundamentais, conferindo-lhe toda nobreza e relevância próprias dessa transcendental categoria
jurídica”22.
Qualquer ensaio, portanto, que se proponha a identificar e avaliar o papel do mandado de
segurança, haverá de fazê-lo a partir do enfoque constitucional, dentro do qual assume, a um só
tempo, a estrutura de remédio processual e garantia constitucional. Essa natureza complexa e
multiforme do instituto faz com que em seu estudo predominem as indagações de ordem
constitucional sobre aquelas de aspecto meramente procedimental. Portanto, nenhum princípio,
nenhuma técnica e nenhuma regra processuais podem influir, de maneira restritiva, no cabimento e
nas dimensões do mandado de segurança, cuja admissão haverá sempre de se dar “de forma
amplíssima, tendo-se por ilegítimo tudo que amesquinhe, tal parâmetro”, na lição de SÉRGIO
FERRAZ23 e de ARRUDA ALVIM24. Aliás, não se pode esquecer que, em matéria de direito
constitucional, vigora, com ênfase, o princípio da máxima efetividade, que, segundo CANOTILHO,
se apresenta como “um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais”,
mas que se aplica, sobretudo, no âmbito dos direitos fundamentais, e que pode assim ser formulado:
“a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê”. De tal sorte,
deve-se evitar interpretações restritivas, e “no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que
reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais”25. É nessa ótica que se preconiza ao legislador
ordinário e aos tribunais evitar medidas regulamentares ou entendimentos interpretativos que
reduzam a garantia constitucional do mandamus, impondo-lhe requisitos e limites não cogitados pela
regra constitucional, que o disciplina como garantia fundamental.
5.
a)
b)
6.
NATUREZA DA AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA
Segundo, pois, a teoria geral do processo, o mandado de segurança, na atualidade, não enseja
dúvida quanto à sua natureza processual: trata-se de uma ação de conhecimento, sujeita a rito
especial, merecendo de PONTES DE MIRANDA26 a qualificação de mandamental, por ensejar a
expedição de “uma ordem ou comando à autoridade pública e à pessoa jurídica interessada”. Essa
peculiaridade, todavia, não lhe retira a natureza, ora de ação constitutiva, ora declaratória, ora
condenatória, conforme o seu conteúdo27.
Em se tratando de ação de conhecimento, “nela pode a parte autora pedir que o órgão
jurisdicional condene a outra a um fazer ou a um abster-se (ação condenatória), crie, modifique ou
extinga uma relação jurídica (ação constitutiva), declare que ocorreu ou não um fato, ou que um
documento é ou não autêntico (ação simplesmente declaratória – CPC, art. 4º), ou ordene à outra
parte que realize uma certa conduta, devendo esta empreender especificamente o que lhe foi
determinado (ação mandamental)”28.
Em suma:
No plano constitucional, “o mandado de segurança está inserido no rol das garantias
constitucionais fundamentais específicas, exercendo, ao lado do habeas corpus, do
habeas data, do mandado de injunção, da ação civil pública, da ação popular, do dissídio
coletivo etc., uma função extremamente importante para a proteção e efetivação dos
direitos, especialmente os constitucionais, no Brasil”29;
No plano processual, “o provimento no mandado de segurança poderá ser condenatório,
declaratório ou constitutivo, conforme o caso; porém, no plano da eficácia, o seu
provimento concessivo da segurança pretendida será sempre mandamental”, ou seja:
importará na expedição de ordem “para a prática ou abstenção de determinado
comportamento por parte da autoridade coatora e do órgão por ela defendido”30.
A ELEVADA IMPORTÂNCIA DO MANDADO DE SEGURANÇA NO
PLANO DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS
No ambiente das instituições básicas do Estado Democrático de Direito, o que é mais
importante não é analisar o mandado de segurança a partir de sua natureza de mecanismo processual,
ao lado das diversas formas de ação exercitáveis para obtenção da tutela do Poder Judiciário. O que
releva descobrir e avaliar é a função que, por meio do instrumento concebido pelo art. 5º, LXIX, da
Constituição, o Estado Democrático moderno confiou à Justiça.
Há um empenho evidente na estruturação do Poder Público e na regulação de seu
relacionamento com os cidadãos, a fim de implantar, na vivência ideal dentro da organização do
Estado Democrático – sob o qual se agrupam não mais os súditos do estado autoritário, e sim os
cidadãos do atual Estado ético e solidário –, mecanismos práticos e eficientes, tendo como missão
principal e primordial a tutela e realização efetiva dos direitos fundamentais.
Esse Estado Democrático de nosso tempo afasta-se dos padrões outrora predominantes no
constitucionalismo primitivo, que se declarava democrático, mas mantinha uma estrutura voltada para
assegurar a supremacia do chamado interesse público (que mais não era que o interesse hegemônico
do Poder Público) sobre o privado. O novo Estado, que aspira ser realmente democrático, elimina o
velho modo de atuar da Administração, que importava um relacionamento desequilibrado entre o
Estado e o particular, no qual prevalecia um vínculo entre senhor e súdito, e, por consequência, o
interesse do Poder Público deveria prevalecer sempre sobre o dos súditos.
O centro do universo constitucionalmente organizado, entretanto, se coloca, hoje, em torno do
indivíduo e dos direitos fundamentais a ele atribuídos, e cujo respeito haverá de ser mantido e
garantido em nome da dignidade da pessoa humana. As relações entre Administração e cidadãos (não
há mais súditos, mas cidadãos), por isso, não mais podem se manter na posição de desequilíbrio
hierárquico do passado. Têm elas de ser vistas e tratadas como paritárias, de modo que nenhuma das
partes seja juridicamente superior à outra. Nem a Administração, nem o particular.
Como, no entanto, a Administração enfeixa em suas mãos grandes porções da força do Poder
Público, é preciso garantir o cidadão contra o risco dos eventuais abusosa que se sentem tentados os
detentores da autoridade administrativa.
Numa quadra democrática como a atual, é impossível ignorar ou desprezar, tampouco
minimizar, o papel desempenhado pela instituição constitucional do mandado de segurança. Os
direitos e garantias constitucionais exigem mecanismos práticos e eficientes de proteção, diante da
reconhecida insuficiência da mera proclamação de superioridade normativa da Constituição.
Daí a criação do mandado de segurança, por obra da própria Constituição, vocacionado por
excelência, nas perspectivas relacionais democráticas entre o Poder Público e o cidadão, à proteção
deste contra os abusos administrativos31. É o mandado de segurança uma ação, mas não apenas mais
uma ação no universo das ações judiciais. Em vista de sua figura de garantia constitucional, atua
como um remédio destinado a desenvolver uma “tutela diferenciada”32, não só pelo rito todo
particular, como pela força extraordinária do provimento que é capaz de gerar, mas, sobretudo, pela
natureza constitucional “não só do instrumento, mas dos direitos que objetiva proteger”33.
Trata-se, em suma e acima de tudo, de “expressiva garantia contra a ilegalidade praticada pelo
Poder Público”, com aptidão para “preveni-la, ou obstar a produção de seus efeitos”34, tudo com a
máxima singeleza e efetividade35.
1
2
3
4
5
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7
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9
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11
12
ALMEIDA, Gregório Assagra de; CIANCI, Mirna; QUARTIERI, Rita. Mandado de segurança.
São Paulo: Saraiva, 2011. p. 30.
BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 31.
BARBI. Op. cit., p. 31-32.
WALD, Arnoldo. Do mandado de segurança na prática judiciária. 3. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1968. p. 14.
PIRES, Gudesteu. Avulso da Câmara dos Deputados, n. 148, p. 43, apud CAVALCANTI,
Themístocles Brandão. Do Mandado de Segurança. 4. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1957. p.
73; ARRUDA ALVIM, Eduardo. Mandado de Segurança. 2. ed. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2010.
p. 19.
No direito comparado, já existia, antes da instituição do nosso mandado de segurança, remédios
que viriam influenciar na sua concepção no futuro direito constitucional brasileiro, como o juicio
de amparo da Constituição Mexicana de 1857 e os writs do direito anglo-americano (BULOS,
Uadi Lammêgo. Ċonstituição Federal anotada. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 298; BARBI,
Celso Agrícola. Op. cit., p. 19-22; ALMEIDA, Gregório Assagra, et al. Op. cit., p. 32).
ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de segurança, cit., p. 37-38.
Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto Legislativo nº 125/2006, que se converteu na
Lei nº 12.016, de 07.08.2009, que vem a ser a atual “Lei do Mandado de Segurança”.
Para Ruy Barbosa, uma coisa são os direitos, outra, as garantias, e, por isso, devemos separar,
“no texto da lei fundamental, as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem
existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em
defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos; estas, as garantias: ocorrendo
não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a
declaração do direito” (BARBOSA, Ruy. República: teoria e prática (Textos doutrinários sobre
direitos humanos e políticos consagrados na primeira Constituição da República).
Petrópolis/Brasília: Vozes/Câmara dos Deputados, 1978. p. 121 e 124). Porém, como destaca
Sampaio Doria, não são nítidas as linhas divisórias entre direitos e garantias, pois “os direitos são
garantias, e as garantias são direitos”, ainda que se procure distingui-las (SAMPAIO DORIA,
Antonio Roberto. Direito Constitucional. São Paulo: Max Limonad, 1960, v. II, p. 57).
SILVA, José Afonso da. Ċurso de direito constitucional positivo. 15. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 1998. p. 189. Anota o autor que “a Constituição, de fato, não consigna regra que aparte
as duas categorias, nem sequer adota terminologia precisa a respeito das garantias. Assim é que a
rubrica do Título II enuncia: ‘Dos Direitos e Garantias Fundamentais’, mas deixa à doutrina
pesquisar onde estão os direitos e onde se acham as garantias” (...). Às vezes, “ela se vale de
verbos para declarar direitos que são mais apropriados para enunciar garantias. Ou talvez melhor
diríamos, ela reconhece alguns direitos garantindo-os” (Op. cit., loc. cit.).
BUZAID, Alfredo. Do mandado de segurança. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 16.
“Além do reconhecimento da existência dos direitos fundamentais, é necessário que esses direitos
sejam também garantidos por instrumentos e mecanismos que os tornem eficazes, ao terem de se
defrontar com o próprio Estado e com as instituições estatais previstas na Constituição”
(REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança individual e coletivo. 2. ed. São Paulo:
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
Saraiva, 2009. nº 2.6, p. 16).
SILVA, José Afonso da. Ċurso de direito constitucional positivo. 15. ed. São Paulo: Malheiros
Editores, 1998. p. 413.
CASTRO NUNES, José de. Do mandado de segurança e de outros meios de defesa contra atos
do poder público. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p. 253.
“Diante do conceito de ação com o direito de pleitear e obter prestação da tutela jurisdicional de
mérito, pelo Estado, seja de que conteúdo for, é fácil ver que o mandado de segurança é
verdadeira ação, porquanto também, nesse instituto, há o direito de pleitear do Poder Judiciário
um tipo de tutela jurisdicional visando proteger direito líquido e certo ameaçado de lesão ou
violado por ato de autoridade” (AURELLI, Arlete Inês. O juízo de admissibilidade na ação de
mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 18-19).
REMÉDIO, José Antônio. Mandado de segurança, cit., nº 2.6, p. 17-18.
Idem, op. cit., nº 3.5, p. 42. Lei nº 12.016/2009, art. 1º. Segundo HELY LOPES MEIRELLES, o
mandado de segurança é o “meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou
jurídica, órgão com capacidade processual, ou universalidade reconhecida por lei, para a proteção
de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas
data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais
forem as funções que exerça” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular,
ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 21. ed. São Paulo: Malheiros Editores,
2000. p. 21-22).
BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de segurança: comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e
5.021/66. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 3-4.
CAVALCANTI, Marcos de Araújo. A legitimidade passiva para o mandado de segurança: uma
proposta de interpretação da Lei 12.016/2009. Revista Dialética de Direito Processual, nº 108, p.
69.
BARBOSAMOREIRA,JoséCarlos.Darecorribilidadedasdecisõesinterlocutóriasnoprocesso do
mandado de segurança. Temas de direito processual. 6ª série. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 212.
Para outro acatado processualista, “talvez já tenha passado a hora de os processualistas voltarem
seus olhos e mentes para o mandado de segurança enquanto procedimento especial, analisando-o
de acordo com a teoria geral do processo” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. Natureza jurídica das
informações da autoridade coatora no mandado de segurança. Aspectos polêmicos e atuais do
mandado de segurança – 51 anos depois. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 367-368).
VICENTEGRECOFILHO,comprecisão,ensinaque“apesardeterembasamentoconstitucional, o
mandado de segurança é uma verdadeira ação e deve ser estudado dentro da teoria geral do
processo. Trata-se de um pedido de atuação da jurisdição e, por conseguinte, classifica-se como
ação e como processo” (GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil brasileiro: processo
de execução a procedimentos especiais. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 3. p. 324).
“A estatura constitucional do mandado de segurança, enquanto ação e garantia individual e
coletiva, projeta-o duplamente como instrumento garantidor e garantia em si mesmo. É instrumento
garantidor porque se presta– em inumeráveis situações – para proteger o indivíduo ou a
coletividade de violação ou potencial violação de direitos fundamentais elencados
23
24
25
26
27
28
constitucionalmente (como a própria garantia à legalidade) e também é garantia fundamental em si
mesmo na exata medida em que seu manejo pelos tutelados não pode ser reduzido, impedido ou
turbado nem mesmo pela própria lei” (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro.
5. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 495).
FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 1992. p. 16.
“Assim, não é lícito ao legislador ordinário angustiar as dimensões do remédio constitucional”, a
pretexto de regulamentá-lo. Não pode o legislador ordinário alterar-lhe “as características
propriamente definidoras, pois, desta forma, estaria disciplinando somente, de forma nominal, o
mandado de segurança, que tem sede e dimensão constitucionais” (ARRUDA ALVIM, José
Manoel. Tratado de direito processual civil. São Paulo: Ed. RT, 1990. v. I, p. 251). Há de se ter
em mente que, no Estado Democrático de Direito, a ordem constitucional impõe à Administração
não apenas o dever de não violar as posições subjetivas do cidadão, pois passa a “condicionar
positivamente a Administração, que deve atuar no sentido de permitir a máxima satisfação dos
direitos fundamentais” (CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da
Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. p. 139).
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra:
Almedina, 2000, s/d. p. 1.187.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Ċomentários ao Código de Processo Civil. Rio
de Janeiro: Forense, 1974. v. VIII, p. 206; BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança,
cit., p. 45.
CARREIRA ALVIM, J. E. Ċomentários à nova Lei do Mandado de Segurança. Curitiba: Juruá
Editora, 2010. p. 16; BARBI, Celso Agrícola. Op. cit., p. 46. Segundo KAZUO WATANABE, o
mandado de segurança é “uma espécie de ação com provimento reforçado e com procedimento
simplificado e célere, de modo que a tutela dos direitos seja pronta, eficaz e adequada”
(WATANABE, Kazuo et al. Código brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos
autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. p. 836).
DECOMAIN, Pedro Roberto. Mandado de segurança (o tradicional, o novo e o polêmico na Lei
12.016/09). São Paulo: Dialética, 2009. nº 2, p. 16 (o art. 4º citado pelo autor é do CPC/1973,
correspondente ao art. 19 do CPC/2015). Entende o autor que, “tocante às quatro modalidades de
ação de conhecimento – condenatória, constitutiva, declaratória ou mandamental –, o mandado de
segurança pode assumir feições combinadas de ação condenatória e mandamental ou constitutiva e
mandamental, podendo também ser exclusivamente mandamental. Prepondera, todavia, no
mandado de segurança, o caráter de ação mandamental, exatamente porque lhe é inerente que a
autoridade apontada como coatora, em caso de procedência do mandado de segurança, deva
atender precisamente ao que na sentença lhe for determinado” (Op. cit., p. 17-18). A sentença é
vista como mandamental pela circunstância de o comando judicial exigir cumprimento imediato
sem depender de “processo de execução ex intervallo” (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo;
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 18. ed.
São Paulo: Malheiros, 2002. p. 302; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti.
Ċomentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. atualizada por Sérgio Bermudes. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. t. I, p. 111). O fato, porém, de, no caso da ação mandamental, dispensar-se
a ação de execução, não retira à sua sentença o caráter condenatório, “até porque toda sentença
29
30
31
32
33
34
35
em que haja uma ordem é condenatória a uma conduta” (PISTILLI, Ana de Lourdes Coutinho Silva.
Mandado de segurança e coisa julgada. São Paulo: Atlas, 2006. p. 30). O que varia, na espécie,
é apenas a forma de executar o comando sentencial, e não a essência do provimento. A
mandamentalidade, portanto, é eficácia que se passa no plano executivo, não no da substância da
sentença. Dessa maneira, a ação de segurança, por ser mandamental, não deixa de produzir
condenação em sua sentença.
ALMEIDA, Gregório Assagra de, et al. Mandado de segurança, cit., p. 46.
Idem, p. 49.
ANDRADE, Érico. O mandado de segurança: a busca da verdadeira especialidade (proposta de
releitura à luz da efetividade do processo). Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010. p. 361.
“Troppo spesso la tensione ideale verso l’effettività costituzionale è stata identificata con
l’esigenza di una tutela differenziata dei diritti e delle libertà costituzionalmente garantiti”
(MAGRI, Marco. La legalità costituzionale dell’amministrazione: ipotesi dottrinali e casistica
giurisprudenziale. Milano: Giuffrè, 2002. p. 21-22).
ANDRADE, Érico. Op. cit., loc. cit.
WALD, Arnoldo. A nova lei do mandado de segurança (Lei 12.016, de 07.08.2009). Revista dos
Tribunais, 894/12.
ANDRADE, Érico. Op. cit., loc. cit. “A previsão legal de que a petição inicial de mandado de
segurança deve atender às exigências dos arts. 282 e 283 do CPC pode passar à primeira leitura a
ideia de que se trata de uma ação cível, apenas com um rito procedimental distinto, mas tal
sugestão é de todo equivocada, pois não se deve esquecer que se trata de um remédio ou de uma
medida constitucional de excepcional aptidão e valia para conjurar, com eficiência e presteza,
abusos e ilegalidades, ofensas e ameaças de ofensas a direitos subjetivos, o que certamente o
faz inconfundível com o clássico conceito de ação civil comum” (MAIA FILHO, Napoleão
Nunes. Sobre a petição inicial do mandado de segurança. Comentários críticos ao art. 6º da Lei nº
12.016/09. Revista CEJ, Brasília, ano XIII, n. 47, p. 12). Os artigos destacados pelo autor são do
CPC/1973, correspondentes aos arts. 319 e 320 do CPC/2015.
Parte II
COMENTÁRIOS À LEI Nº 12.016/2009,
artigo por artigo
Capítulo II
TUTELA PARA AS VÍTIMAS DE ILEGALIDADE E ABUSO DE
PODER POR ATO DE AGENTE PÚBLICO
Art. 1º. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas
corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer
violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais
forem as funções que exerça.
§ 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e
os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas
naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições.
§ 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de
empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.
§ 3º Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado
de segurança.
Referências legislativas:
CF, art. 5º, LXIX: conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por “habeas
corpus” ou “habeas data”, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de
pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
Súmulas:
Súmula 266/STF: Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.
Súmula 270/STF: Não cabe mandado de segurança para impugnar enquadramento da Lei 3.780, de 12/7/1960, que envolva
exame de prova ou de situação funcional complexa.
Súmula 474/STF: Não há direito líquido e certo, amparado pelo mandado de segurança, quando se escuda em lei cujos
efeitos foram anulados por outra, declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
Súmula 510/STF: Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de
segurança ou a medida judicial.
Súmula 604/STF: O mandado de segurança não se prestapara atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo
Ministério Público.
Súmula 625/STF: Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança.
Súmula 627/STF: No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do presidente da
república, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase
anterior do procedimento.
Súmula 631/STF: Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a
citação do litisconsorte passivo necessário.
Súmula 701/STF: No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo
penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo.
Súmula 42/STJ: Compete à justiça comum estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de
economia mista e os crimes praticados em seu detrimento.
7.
8.
Súmula 177/STJ: O Superior Tribunal de Justiça é incompetente para processar e julgar, originariamente, mandado de
segurança contra ato de órgão colegiado presidido por Ministro de Estado.
Súmula 206/STJ: A existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das
leis de processo.
Comentários ao art. 1º
INTRODUÇÃO
O mandado de segurança é uma instituição jurídica, e, como tal, há de ser conceituado e
analisado, a partir dos dados constantes da norma legal que o prevê e disciplina. Do art. 1º da Lei nº
12.016/2009 podem ser extraídos sua conceituação, sua natureza jurídica, sua função, seus requisitos
de validade e eficácia, bem como seus elementos essenciais objetivos e subjetivos.
Serão, portanto, todos esses aspectos da ação constitucional em foco o objeto da análise que a
seguir se intentará realizar por meio da interpretação do primeiro dispositivo da Lei do Mandado de
Segurança. Embora o estatuto legal básico da ação mandamental se concentre na Lei nº 12.016/2009,
é fora de dúvida que a ela também se aplique, subsidiariamente, a disciplina geral constante do
Código de Processo Civil (sobre esse tema, ver, adiante, o nº 81).
CONCEITO LEGAL
Mandado de segurança é o remédio processual constitucional, manejável contra ato de
qualquer autoridade pública1, que cometa ilegalidade ou abuso de poder, tendo como objetivo
proteger o titular de direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data (CF, art.
5º LXIX)2. Como o habeas corpus assegura a liberdade pessoal (direito de ir e vir) (CF, art. 5º,
LXVIII) e o habeas data, a possibilidade de conhecer e controlar as informações pessoais constantes
de arquivos públicos (CF, art. 5º, LXXII), a conclusão é que a cobertura do mandado de segurança é
a mais ampla possível.3 Compreende todo e qualquer direito subjetivo que, não alcançado pelos dois
remédios já referidos, se enquadre na configuração de direito líquido e certo4.
Trata-se, dentro da função constitucional a que se acha destinado a cumprir, não de singelo
procedimento de jurisdição especial contenciosa. Mais do que isso, por força do art. 5º, inc. LXIX,
da Carta Política, é ele verdadeira garantia fundamental, de modo que a prerrogativa de manejá-lo
equipara-se aos mais importantes direitos do homem reconhecidos pelo Estado Democrático de
Direito, “a exemplo da vida, liberdade, igualdade, intimidade e liberdade de expressão”5.
Por meio da declaração constitucional, proclama-se o direito fundamental do homem de não ser
violado em sua esfera jurídica pelos agentes do Poder Público, ao mesmo tempo em que se institui
uma garantia especialíssima para blindá-lo contra as ilegalidades e abusos de poder praticados em
8.1.
8.2.
nome do Estado.6 A garantia do mandado de segurança é, a um só tempo, um direito cívico dos
cidadãos em sentido lato e um limite dos poderes conferidos aos agentes estatais.
Embora seja o mandado de segurança, do ponto de vista funcional, um procedimento especial
para o exercício do direito de ação (direito à tutela jurisdicional devida pelo Poder Judiciário), não
fica o titular do direito líquido e certo sujeito a fazer uso apenas dele, para a defesa do direito lesado
ou ameaçado pela autoridade pública. Cabe-lhe a faculdade de postular a tutela jurisdicional pela
via expedita do mandado de segurança ou, se preferir, pelo procedimento civil comum, segundo as
próprias conveniências7.
A disciplina procedimental específica do mandado de segurança consta da Lei nº 12.016, de
07.08.2009, que revogou a Lei nº 1.533, de 31.12.1951, e toda a legislação que, desde a época da
Constituição de 1946, vinha regendo o acesso a esse remédio processual.
Princípio da legalidade e submissão do Poder Público ao controle judicial
A garantia de um remédio constitucional capaz de proteger a todos contra a prepotência dos
agentes do Poder Público é algo que decorre diretamente do Estado Democrático de Direito. Não se
concebe um Estado de Direito sem que se dê estrito cumprimento ao princípio da legalidade,
princípio que impõe a submissão ao ordenamento jurídico tanto aos particulares como aos próprios
órgãos estatais8. Isto porque, são características desse tipo de Estado constitucional: a) a submissão
do Estado à jurisdição; b) a jurisdição só há de ser exercida mediante aplicação da lei preexistente;
c) a jurisdição há de ser exercida por meio do juiz natural, ou seja, por órgão de uma magistratura
imparcial, independente, cercada de todas as garantias; e d) incumbe ao Estado submeter-se à
jurisdição em condições de igualdade com qualquer outra parte9. É diante de tal realidade que, na
estrutura constitucional brasileira, as vias de acesso à jurisdição assumem a qualidade de direito
fundamental do cidadão à realização do próprio Estado de Direito, naquilo em que se manifesta “seu
ponto mais vigoroso e mais eficiente”10.
Daí que, se a última palavra cabe ao Poder Judiciário, no controle da legalidade sobre os atos
administrativos, fácil é avaliar “o lugar preeminente que assume a garantia constitucional do
mandado de segurança dentro do Estado de Direito”11.
Ilegalidade e abuso de poder
Esses dois temas – a ilegalidade e o abuso de poder – exigem compreensão fundada na teoria do
direito administrativo, que a partir do século XX vem sofrendo acentuada evolução em suas
concepções básicas. Numa visão liberal (e superada), a ilegalidade estaria ligada à prática dos atos
vinculados, enquanto o abuso de poder relacionar-se-ia com os denominados atos discricionários.
A vinculação da administração seria completa à lei, de maneira que somente poderia fazer aquilo que
a lei determinava e pelos meios também previstos na lei. O princípio da legalidade, segundo a velha
fórmula de ZANOBINI, consagrada entre nós por HELY LOPES MEIRELLES, incidia de forma
diversa em relação ao cidadão e à Administração. “No que diz respeito ao cidadão, o princípio da
legalidade atuaria como limite externo, de modo que o privado poderia fazer tudo aquilo que a lei
não vedasse. Ao contrário, em relação à Administração, a valência do princípio seria diversa,
traduzindo limite interno: a Administração só poderia fazer aquilo que a lei expressamente determina
ou prevê”12.
Daí que, na opinião clássica difundida por ZANOBINI e seus seguidores, seria contaminado de
ilegalidade qualquer ato administrativo que não fosse expressamente autorizado pela lei13.
A ideia de abuso de poder, ainda dentro da doutrina tradicional, foi construída para ser aplicada
àqueles atos qualificados como “discricionários”, porque a lei que os autorizava conferia ao
administrador maior margem de liberdade para apreciar os motivos, os elementos ou a finalidade a
ser atingida. À luz da clássica visão do direito administrativo, haveria o abuso ou desvio de poder
quando o manejo de uma competência, ainda que instituída legalmente, fosse feito “em descompasso
com a finalidade em vista da qual foi instituída”14.
A notável evolução recente do direito administrativo, cujo início se deveu à doutrina italiana, se
deu no rumo de anular a distinção decritérios adotada classicamente para a aplicação do princípio
da legalidade aos atos da Administração e aos atos dos particulares. Num Estado Democrático de
Direito, o princípio constitucional da legalidade é um só, seja para o Poder Público, seja para os
particulares.
Nessa perspectiva, o vínculo de todos, inclusive o Estado, não é com a lei em sentido estrito,
mas com o direito lato sensu, que modernamente reconhece força de norma também aos princípios,
além de adotar, o direito positivo, com grande desenvoltura, normas forjadas por meio de cláusulas
gerais, e com emprego de conceitos abertos ou indeterminados.
Com esse espírito, a Constituição não se limita a vincular os atos da Administração à legalidade
estrita, mas os sujeita a um complexo de princípios preconizados como fundamentais: “A
administração pública direita e indireta (...) – dispõe o art. 37 da CF – obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
A valorização dos princípios constitucionais na seara do direito administrativo teve como
consequência o afastamento da rigidez da subordinação da Administração à lei em sentido estrito,
visto que a característica básica do princípio em direito é a flexibilidade da norma que o consagra15.
A sujeição da Administração diretamente aos princípios constitucionais lhe confere, de certa
forma, muito mais liberdade, permitindo-lhe atuar sob o limite da legitimidade, sem as amarras da
legalidade clássica. Mas, enquanto se amplia a atividade discricionária da Administração, aumenta-
se, também, a possibilidade de controle da sociedade sobre o exercício da atividade
administrativa16.
O mesmo princípio moderno que flexibiliza a discricionariedade administrativa enseja também
“maior controle do exercício da discricionariedade, que passa a ser objeto de uma investigação
judicial, cada vez mais ampla”17. Com isso, “o temor em torno dos abusos ou arbitrariedades no
exercício do poder discricionário diminui e a doutrina atual perde o antigo ‘medo’ com que era
tratado o tema: os princípios constitucionais permitem ampla sindicabilidade judicial do atuar
discricionário, de modo a prevenir e corrigir abusos”18. Portanto, na moderna concepção
jurisprudencial, “‘as disposições do edital inserem-se no âmbito do poder discricionário da
Administração, o qual não está, porém, isento de apreciação pelo Poder Judiciário, se comprovada
ilegalidade ou inconstitucionalidade nos juízos de oportunidade e conveniência, como na espécie, em
que não há previsão legal para a exigência do teste de aptidão física’ (AgRg no RMS 34.676/GO,
Rel. Ministro Castro Meira, 2ª T, DJe 15/04/2013)”19.
Superado o tabu da insindicabilidade do mérito do ato administrativo pelo judiciário20, perde
significado o esforço para distinguir entre ilegalidade e abuso de poder, em relação ao atuar da
Administração. Tudo, enfim, se reduz a atuar em desconformidade com o direito, como um todo.
Tanto a ilegalidade como o abuso de poder se traduzem no mesmo conceito atual de
ilegitimidade, de sorte que, para o cabimento do mandado de segurança, podem praticamente ser
vistos como uma só fonte de invalidação do ato administrativo.21 Tanto quando o administrador viola
manifestamente um preceito de lei em sentido estrito, como quando, no exercício de um poder
discricionário, “vai além do que a lei lhe permitia”, a ilegitimidade do ato, na verdade, deriva de
uma ofensa à legalidade, no dizer de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO22.
No entanto, há de se controlar a flexibilidade da gestão pública principiológica, admitindo-a
mais amplamente quando se tratar de atos administrativos que não atinjam a esfera jurídica do
particular e mais restrita quando tenham força de afetar aquela esfera. Assim, é importante distinguir
o campo autoritário do não autoritário, entendido este como o de atuação interna da Administração,
e aquele como o de atuação em face do particular, restringindo-lhe ou suprimindo-lhe direitos
subjetivos.
Quando a Administração atua fora do campo autoritário, a apuração e controle da legitimidade
do ato administrativo, não mais se limitam ao exame de legalidade estrita. São levados em
consideração os princípios constitucionais e o ordenamento jurídico como um todo23. Quando,
porém, o administrador exerce o “poder de autoridade”, para invadir a esfera dos direitos subjetivos
do particular, não pode deixar de ser observado o princípio da legalidade estrita. Só a lei pode
definir quando o direito de um cidadão pode ser restringido ou suprimido24. Isto não quer dizer que a
Administração fique submissa apenas e tão somente à literal autorização de lei em sentido estrito.
Também a Constituição e as normas de conteúdo aberto (cláusulas gerais) interferem, de modo a
permitir uma visão da juridicidade, principalmente no campo da interpretação, que não seja, por
completo, rígida ou inflexível. Mas, de qualquer forma, a permissão do ato de autoridade haverá de
8.3.
partir de lei em sentido estrito (que pode ser até mesmo a Constituição), a qual determinará o objeto,
a finalidade, os limites da invasão da esfera privada, e definirá o procedimento a ser
obrigatoriamente observado.
Uma das situações que ensejam a acusação de ilegalidade ocorre no exercício do poder
regulamentar, que a autoridade administrativa só pode usar respeitando os limites da lei
regulamentada. Respeitar a lei, na espécie, porém, não equivale a exigir que a regulamentação se
limite a “repetir, palavra por palavra, o que está na lei”, desde que observados “seus limites,
principiologia, estrutura e objetivos”25.
Injuridicidade no plano do procedimento
Dentre as garantias fundamentais, que protegem a propriedade e os direitos subjetivos em geral
contra as ilegalidades e os abusos de autoridade, está a de que “ninguém será privado da liberdade
ou de seus bens sem o devido processo legal” (CF, art. 5º, LIV), e esta garantia se completa com a de
que, no processo administrativo, tal como no judicial, “são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (CF, art. 5º, LV).
Portanto, além do princípio da legalidade, a Constituição consagra, também, o princípio do
devido processo legal, que se impõe tanto nos processos judiciais como nos administrativos (CF, art.
5º, II, XXII, XXIV, LIV e LV). Com tal opção, institui-se, no plano constitucional, um eficiente
sistema de controle do poder administrativo e um poderoso mecanismo de defesa do particular contra
os abusos de poder: se a administração se acha legalmente autorizada, em determinados casos, a
invadir a esfera dos direitos subjetivos dos cidadãos, só haverá de fazê-lo mediante a observância de
um procedimento que corresponda ao padrão do “processo justo”, assegurado como “direito
fundamental” pela Constituição, sob o nome de “devido processo legal”.
Nessa perspectiva, a ilegalidade e o abuso de poder (que também é uma forma de ilegalidade)
poderão ser configurados por prática administrativa que viole direitos subjetivos tanto na substância,
como na forma de prejudicá-los, sendo que, principalmente no campo dos atos autoritários, o
procedimento legal funciona como garantia fundamental dos particulares em face da Administração
Pública26. E como adverte MARIA JOÃO ESTORNINHO, parece “absolutamente indispensável
afirmar, de forma clara e inequívoca, que a Administração Pública em caso algum deixa de estar
sujeita ao seu regime de vinculação aos direitos fundamentais”27.
Com efeito, presta-se o procedimento administrativo a dar transparência à formação do ato
administrativo, da qual participará o particular interessado, de forma direta, como coadjuvante.
Mediante a ciência prévia do projeto da Administração e a garantia de diálogo e defesa, a atividade
administrativa se torna, de fato, mais transparente28. Permitir-se-á, por meio do procedimento, o
conhecimento fiel das razões e finalidades do ato administrativo, com o que o controle de legalidade
se tornará mais viável e efetivo, caso o prejudicado pelo abuso de poder tenha de recorrer ao
8.4.judiciário para se proteger.
Assim, com a sujeição da Administração Pública ao devido e justo processo afinado com os
princípios constitucionais, consegue-se reduzir a “discricionariedade administrativa”29 e inibir os
desvios de poder, ao mesmo tempo em que se instrumentaliza o cidadão interessado para buscar e
viabilizar uma tutela judicial mais eficaz, justamente em razão da transparência do modus
procedendi, com que se ultimou o ato a impugnar. No controle jurisdicional, portanto, se logrará
“reconstruir o caminho decisório da autoridade”, desvendando-lhe os eventuais defeitos e abusos30.
É nesse sentido que, perante os atos de autoridade, o procedimento se apresenta “como garantia dos
cidadãos contra o atuar arbitrário da Administração”31.
Da reconhecida relevância da garantia do devido procedimento nos atos administrativos,
conclui-se que as ofensas perpetradas contra as regras que lhe dizem respeito podem, conforme a
gravidade do caso, invalidar o ato de autoridade. É claro, porém, que não se deve valorizar a forma
pela forma, simplesmente, mas pela função essencial por ela desempenhada diante da necessidade de
oferecer meios efetivos de defesa ao direito subjetivo ameaçado pelo autoritarismo da
Administração. Simples infrações de rito, sem maiores repercussões sobre o direito ao contraditório
e à ampla defesa, não comprometem, em princípio, a validade do ato de autoridade. Para que este se
torne inválido, é preciso que o ultraje à garantia do procedimento legal tenha causado lesão grave ao
direito do cidadão de participar da formação do ato administrativo e de se defender amplamente da
pretensão administrativa contrária a seus interesses.
Aplica-se, também, ao procedimento administrativo, o princípio da instrumentalidade das
formas, construído pelo direito processual civil, segundo o qual não se decreta nulidade se, mesmo
inobservando o procedimento legal, o seu objetivo foi alcançado (CPC/2015, arts. 277, 282, § 1º, e
283, parágrafo único32).
São frequentes, na jurisprudência, os exemplos de violação grave e de efeitos perniciosos, ao
procedimento administrativo, como aqueles ocorridos na apelidada “expropriação administrativa”, e
nos procedimentos de concorrência pública para realização de obras públicas ou para admissão de
funcionários públicos. O mandado de segurança cumpre, nesses e muitos outros casos de quebra da
igualdade entre os concorrentes, ou de arbitrariedade no apossamento de bens particulares, a
importante missão constitucional de pôr fim à ilegalidade ou abuso de poder, no campo da atividade
administrativa.
Cabimento do mandado de segurança em caso de ato administrativo
praticado com desrespeito à garantia do contraditório e ampla defesa
A garantia fundamental ao contraditório e ampla defesa aplica-se não apenas ao processo
judicial, mas também aos procedimentos administrativos que possam afetar direitos subjetivos
públicos ou privados (CF, art. 5º, LIV e LV). Revogado, restringido ou negado a alguém um direito
subjetivo qualquer, por ato administrativo, sem respeitar a referida garantia constitucional, a reação
do titular alcançado pela ilegalidade pode, perfeitamente, se dar por meio do mandado de segurança.
O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de apreciar caso em que o CNJ, em
procedimento administrativo, considerou nulos todos os atos de nomeação de servidores de
determinado tribunal de justiça porque realizados após expiração do prazo de validade do respectivo
concurso. A decisão administrativa fundou-se na inconstitucionalidade das portarias do tribunal que
haviam prorrogado o referido prazo. O CNJ, entretanto, chegou à sua deliberação sem convocar os
servidores interessados para participarem do “processo de controle administrativo”, o que motivou a
impetração de segurança perante o STF, com o fito de invalidar a decisão que ordenara a exoneração
dos impetrantes. O fundamento do writ imputava ao acórdão do CNJ violação do “direito líquido e
certo à manifestação em processo que lhes poderia ser prejudicial”.
A segurança foi concedida pelo Pleno do STF, para “anular o acórdão atacado e para que o CNJ
possa notificar os impetrantes acerca da existência do PCA e de seu direito de serem ouvidos”. Em
respeito à garantia constitucional do contraditório e ampla defesa, assentou a Suprema Corte que
“sempre que antevista a existência razoável de interessado na manutenção do ato atacado, com
legítimo interesse jurídico direto, o CNJ está obrigado a dar-lhe ciência do procedimento de controle
administrativo”. Advertiu, ainda, que, “identificado o legítimo interesse de terceiro, o acesso ao
contraditório e à ampla defesa independem de conjecturas acerca da efetividade deste para produzir
a defesa do ato atacado”33.
Os servidores, na espécie, não eram simples concursados na expectativa do ato administrativo
discricionário de sua nomeação. Eram servidores já nomeados e no pleno exercício dos respectivos
cargos públicos. Invalidar, portanto, suas nomeações implicava privá-los dos direitos atuais
correspondentes a uma situação jurídica já adquirida.
Cabe lembrar que a Constituição garante, no rol dos direitos fundamentais, que “ninguém será
privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (art. 5º, LIV). Garante, ainda,
como consectário do devido processo legal, o “contraditório e ampla defesa” a todos os litigantes,
seja “em processo judicial ou administrativo” (art. 5º, LV). Não pode, obviamente, um servidor
público perder o seu cargo, seja qual for o motivo, sem que a Administração lhe proporcione a
oportunidade do contraditório e ampla defesa.
É paradigmático o seguinte aresto do STF:
“Restrição de direitos e garantia do ‘due process of law’. O Estado, em tema de punições
disciplinares ou de restrição a direitos, qualquer que seja o destinatário de tais medidas,
não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no
exercício de sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da
8.5.
legitimidade ético-jurídica de qualquer medida estatal – que importe em punição
disciplinar ou em limitação de direitos – exige, ainda que se cuide de procedimento
meramente administrativo (CF, art. 5º LV), a fiel observância do princípio do devido
processo legal.
A jurisprudência do STF tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele
reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou
entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que
em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da
medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina”34.
Não basta a observância do contraditório entre a Administração e o seu agente responsável pelo
ato a invalidar. É indispensável que a garantia de defesa se estenda a todos aqueles que detenham
legítimo interesse nascido de direitos reflexamente gerados pelo ato administrativo em vias de
desconstituição. É o que tem acentuado, reiteradamente, o STF:
“Tratando-se da anulação de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no
campo de interesses individuais, a anulação não prescinde da observância do
contraditório, ou seja, da instauração de processo administrativo que enseje a audição
daqueles que terão modificada situação já alcançada (...)”35.
Enfim, nenhum ato administrativo pode ser invalidado pelo Poder Público sem que todos os
alcançáveis pela invalidação, direta ou reflexamente, tenham tido oportunidade de se defender,
segundo a garantia constitucional do devido processo legal e do contraditório.36 A infringência
dessas garantias franqueia aos prejudicados o recurso ao mandado de segurança, como remédio
idôneo e adequado para o combate à ilegalidade e ao abuso de poder cometido, in casu, por meio do
ato administrativo.
Mandado de segurança e a teoria do fato consumado
Em nome do princípio constitucional da segurança jurídica, a jurisprudência construiu a teoria
do fato consumado, que, diante de uma conjuntura não apoiada na

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