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CONTABILIDADE AMBIENTAL AULA 2 Profª Ana Lizete Farias 2 CONVERSA INICIAL Em nossa aula vamos conhecer sobre o Sistema de Contas Nacionais e a sua relação com a contabilidade ambiental. Na sequência, vamos aprender sobre Ativos Ambientais, Passivos Ambientais, Custos, Despesas e Receitas Ambientais. Esses elementos são necessários para compreendermos como estão estabelecidos e como se inter-relacionam. De posse desses conceitos, veremos como se estrutura um Plano de Contas Ambiental. Na prática, vamos conhecer o exemplo de Belo Monte, empreendimento polêmico em termos ambientais, sociais e econômicos. Nesse exemplo, então, vamos nos deparar com os Passivos Ambientais decorrentes desde a sua implantação. Para darmos início, vamos ler o texto de Ricardo Abramovay, renomado pesquisador sobre economia verde, que traz informações sobre para onde caminha a economia global, sinalizando importantes mudanças que se refletirão, certamente, na contabilidade ambiental. CONTEXTUALIZANDO Leia o trecho a seguir, publicado na página do Valor Econômico: Economia global Quanto pesa a economia global? Para a sabedoria econômica convencional, a pergunta é completamente esdrúxula. Faz parte das primeiras lições da disciplina a ideia de que a única forma de comparar banana, ferro, computador e restaurante é por meio daquilo que se paga pelos produtos e pelos serviços. O que há de comum ao mundo das mercadorias é que elas são escassas e é da escassez que decorrem seus preços. Dizer que a soma dos bens e serviços produzidos no mundo em 2017 sobe a US$ 78 trilhões ou que o produto médio anual per capita é de quase US$ 10 mil faz todo o sentido. Mas qual o peso daquilo que está na origem das utilidades de que desfrutamos, esta não é uma pergunta que integra a tradição mais consagrada da ciência econômica. Esta tradição vem sendo contestada, já há algumas décadas, sob o ângulo científico, por meio da ecologia industrial. A base desta contestação é que apesar de sua inegável importância, o valor de mercado dos bens não é capaz de sinalizar adequadamente o uso que deles fazem as sociedades humanas. As 23 conferências climáticas realizadas até hoje e as dezenas de tentativas de taxar a emissão de gases de efeito estufa ainda não conseguiram incorporar ao sistema de preços os danos provocados pelas mudanças climáticas. O que se paga pelos antibióticos não inclui o excesso em seu consumo (sobretudo pelas criações estabuladas) e os estragos provocados pela crescente resistência que sua descarga no ambiente vem causando. Mas este raciocínio aplica-se também aos materiais básicos que compõem a riqueza. Que a melhoria nos padrões de vida conduza a maior consumo de materiais, é intuitivo, que se trate do local onde as pessoas moram, daquilo que comem, de seus deslocamentos ou das infraestruturas de que dependem. Mas é fundamental ampliar a eficiência no uso destes materiais. É para isso que foi formado, em 2007 o Painel Internacional de Recursos, por parte do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. A palavra que o define, decoupling, pode ser traduzida como desacoplamento, ou descasamento: trata-se de alcançar mais riqueza sobre a base da extração e do uso de cada 3 vez menos materiais. Da mesma forma que o mundo se esforça hoje para descarbonizar a vida econômica, é fundamental igualmente satisfazer as necessidades humanas usando menos materiais por unidade de riqueza oferecida. Os especialistas reunidos pelo Painel trabalham em torno de quatro famílias de materiais: biomassa, combustíveis fósseis, minerais metálicos e minerais não metálicos. Seu primeiro relatório, lançado em 2011 mostrava que, em meados da primeira década do milênio, o peso destes quatro materiais chegava a 60 bilhões de toneladas. Cada ser humano em média consumia, anualmente, nada menos que nove toneladas de materiais. Só que a distribuição deste consumo era altamente desigual. A “pegada material” (material footprint) da Índia era de quatro toneladas. A do Canadá subia a 25 toneladas per capita. [...] O Painel acaba de lançar seu último relatório e [...] O consumo dos quatro materiais estudados pelo Painel atinge 88,6 bilhões de toneladas ao final de 2017. O consumo per capita pulou de nove para 11,4 toneladas em uma década. Embora o grande aumento tenha sido na Ásia, o que reflete vitórias importantes na luta contra a pobreza na China e na Índia, é fundamental destacar que o norte-americano médio usa anualmente 30 toneladas e o europeu 20 toneladas de materiais. Americanos e canadenses consomem dez vezes mais materiais per capita que os habitantes da África ao Sul do Sahara. [...] Quais as consequências destas informações para o crescimento econômico? O relatório destaca países (Japão, Alemanha, Áustria, Finlândia, Bélgica e Reino Unido), que já incluem a pegada material de suas economias no sistema de contas nacionais. Sobre esta base o Japão elabora indicadores e metas para chegar a uma “sociedade saudável sob o ângulo de seu ciclo material”. A Áustria quer aumentar a eficiência no uso de recursos em 50% entre 2008 e 2020. [...] Até aqui, não há por parte nem do Governo nem das principais organizações empresariais brasileiras qualquer sinal de que o crescimento econômico, cujo retorno os brasileiros desejam em 2018, tenha a orientação estratégica que norteia a transição dos países acima mencionados. Sem isso, o crescimento pode até vir, mas vai ampliar nossa distância da fronteira tecnológica e cultural do mundo atual. (Adaptado de Abramovay, 2018) TEMA 1 – CONTAS AMBIENTAIS O texto da seção anterior é de um importante economista, Ricardo Abramovay, reconhecidamente um especialista em Economia Verde, e aponta a importância do tema que vamos abordar, relacionado às contas ambientais. Na contramão dos países em desenvolvimento, o Brasil ainda não se pauta por incluir a questão ambiental em seu sistema de contas ambientais. Vamos detalhar, então, do que se trata esse importante tema. Como é possível observar no texto do professor Abramovay, há uma crítica por parte da economia verde em relação ao Sistema de Contas Nacionais pautada pela busca de modificar esse sistema e seus principais macroindicadores econômicos, para incorporar a exaustão e a degradação dos recursos naturais utilizados ao processo econômico (ONU, 1993; IUCN, 1996). Na sua grande maioria, sem dúvida, esse movimento está ancorado nas incontáveis iniciativas para remodelar a agenda de desenvolvimento da nossa sociedade, no sentido de provocar mudanças no funcionamento da economia global na direção de uma releitura do paradigma econômico, que está baseado na concentração de riqueza, no consumo de massa e na exploração imprudente de recursos não renováveis. 4 É nesse contexto, ou seja, nessa inter-relação entre a economia e o meio ambiente que surge, portanto, essa crítica, por parte dos economistas que defendem a economia verde, de que o atual Sistema de Contas Nacionais (SCN) não considera os impactos de uma enorme gama de atividades que afetam significantemente a vida no planeta (Diaz, 2003). Desta forma, entendem esses críticos, as contas nacionais geram indicadores inconsistentes do ponto de vista da sustentabilidade do desenvolvimento. Historicamente, a política macroeconômica adotada pela maior parte dos governos e instituições monetárias do mundo tem se baseado em informações quantitativas sobre a economia fornecidas pelos Sistemas de Contas Nacionais. Esses sistemas de contabilidade se constituíram no modelo macroeconômico desenvolvido por John Maynard Keynes, como resposta à depressão dos anos 1930 para suprir a necessidade de se conseguirdados confiáveis sobre a atividade econômica das nações europeias, durante a II Guerra Mundial. O Produto Nacional Bruto (PNB), o Produto Interno Bruto (PIB) e o Produto Interno Líquido (PIL) foram então estabelecidos como as principais medidas de renda dos SCN e, desde então, possuem uma relevância mundialmente reconhecida. No entanto, em decorrência do processo de degradação acelerado que o planeta atravessa, esses indicadores têm sido alvo de críticas profundas que destacam suas falhas e deficiências, principalmente pelo fato de ignorarem a contribuição dos recursos naturais no processo produtivo. Diaz (2003) delimita importantes aspectos dessa discussão quando questiona, por exemplo, as questões relacionadas ao Produto Interno Bruto (PIB), o qual aumenta quando o país reduz seus estoques de recursos naturais. Nesse caso, um surto de expansão da atividade económica faz crescer o PIB, mas, de forma simultânea, também promove a degradação ambiental, com custos que geralmente não são registrados. Diaz (2003) ainda cita outros exemplos que são computados como incremento do PIB, tais como os custos resultantes dos danos à saúde humana causados por um aumento da poluição produzido por surto econômico, aumentos de gastos em médicos, remédios e hospitais provocados pelo aumento de poluição, os quais são tratados como se representassem elevação de bem-estar social. Além disso, também provocam aumentos no PIB os gastos no controle da poluição e na regeneração ambiental pelo desmatamento 5 realizado na Amazônia por empreendimentos agropecuários incentivados pelo financiamento de instituições públicas. Os questionamentos focalizam-se na distinção entre a verdadeira geração de renda e o consumo do capital natural, pois uma economia cujo crescimento está ancorado na exploração de recursos naturais pode ter rendas superestimadas. Consequentemente, percebemos que o sistema gera indicadores inconsistentes, que afetam a capacidade da economia de produzir numa base contínua do ponto de vista da sustentabilidade ambiental. De acordo com as críticas de Claude (1997) e Harrison (1997) na perspectiva ambiental, o SCN e seus macroindicadores econômicos apresentam três deficiências relacionadas ao tratamento dos recursos naturais exauridos ou degradados no processo econômico de produção: • A primeira falha é de natureza teórica e corresponde à ausência de distinção entre os conceitos de renda e capital; • A segunda é não considerar o esgotamento e a degradação dos recursos naturais como depreciação; • A terceira, tratar de maneira insatisfatória os custos de proteção ambiental ou as despesas defensivas. É a partir desse cenário que as Nações Unidas, com base nas pesquisas e nos debates iniciados na década de 1980, propuseram a revisão do SCN e a implantação do Sistema de Contabilidade Econômica e Ambiental Integrada (System of Integrated Environmental and Economic Accounting – SEEA), que reúne as experiências de vários países em contas ambientais e constitui, atualmente, um dos avanços mais significativos para estabelecer a vinculação entre o sistema econômico e o ambiente natural, na busca da sustentabilidade ambiental (Diaz, 2003). TEMA 2 – ATIVOS AMBIENTAIS Vimos, no tema anterior, que está em curso um debate amplo sobre os principais critérios para mensuração do que, em síntese, é a riqueza de um país e que fundamenta de forma importante o surgimento da contabilidade ambiental. Agora, daremos prosseguimento à compreensão sobre o que constitui os registros e eventos ambientais, que buscam consolidar os dados da posição ambiental das empresas, como descrito por Antonovz (2014). 6 Vamos olhar, então, o conceito de Ativo Ambiental, relembrando que, segundo Tinoco e Kraemer (2011), Ativos são os recursos que são controlados por uma organização e dos quais se esperam resultados econômicos futuros. Portanto, Ativos Ambientais são os bens adquiridos pela empresa que visam ao controle, à preservação e à recuperação do meio ambiente, os quais são diferentes para cada tipo de organização pois estão relacionados diretamente aos vários processos operacionais das distintas atividades econômicas, devendo compreender todos os bens utilizados no processo de proteção e conservação do meio ambiente (Tinoco; Kraemer, 2011). Segundo Neves (2006), esses Ativos podem estar na forma de Capital Circulante ou Capital Fixo. Nesse caso, o Capital Circulante (Capital de Giro) é o montante aplicado para a realização da atividade econômica da empresa, composto pelas disponibilidades e pelos Ativos realizáveis a curto e longo prazo. A Norma Brasileira de Contabilidade NBC TE XXX, que tem como objetivo definir os conceitos e os critérios para a contabilização de eventos e transações que reflitam as interações da entidade com o meio ambiente, apresenta a seguinte discriminação dos elementos do Ativo Ambiental: Quadro 1 – Elementos do Ativo Ambiental Norma Brasileira de Contabilidade NBC TE XXX Ativos Ativos Circulantes Ambientais Estoques de insumos (bens e serviços) que serão utilizados no processo operacional, ou ao final deste, com o objetivo de reduzir ou eliminar a produção de poluentes ou, ainda, aqueles com a finalidade de recuperar danos ambientais. Estoques Operacionais Ambientais Devem ser segregados entre ambientais, reciclados e reutilizados, visando proporcionar maior transparência sobre a relação da entidade com o meio ambiente. Ativos Não Circulantes Formados por contas de Investimento Ambiental, Imobilizado Ambiental e Intangível Ambiental. Ativos Não Circulantes Ambientais Aqueles associados com a proteção e a recuperação ambiental cuja realização se dará no longo prazo. Investimentos Ambientais Aplicação de recursos na aquisição de áreas de conservação de recursos naturais com o objetivo específico de promover a preservação da fauna e da flora. Se mudada a intenção, o ativo tem que ser reclassificado. Imobilizado Ambiental Itens utilizados ao longo de vários períodos especificamente para tratar os poluentes oriundos do processo operacional da entidade, durante a operação ou após o final desta. Pode incluir, também, os ativos de longa duração, destinados, exclusivamente, à recuperação de áreas degradadas pela entidade em períodos anteriores, enquanto estiverem em atividade. Intangíveis Ambientais Itens incorpóreos controlados pela entidade capazes de produzir fluxos de caixa futuros e que estejam vinculados à interação com o meio ambiente Fonte: NBC, 2012. 7 A importância da identificação dos Ativos Ambientais está na sua utilização em negociações, avaliações, transferências, fusões e aquisições entre empresas desde que comprovada a sua viabilidade legal, a sustentabilidade e a adequação das atividades, o que é extremamente relevante para a valorização financeira do empreendimento. Além disso, a demonstração dos Ativos na contabilidade ambiental torna- se um elemento fundamental para identificar, avaliar e quantificar os custos e gastos ambientais que necessitam de atenção em curto, médio ou longo prazo, assim como relacionar os investimentos necessários. TEMA 3 – PASSIVOS AMBIENTAIS Outro aspecto importante ligado às questões ambientais e, portanto, inserido no escopo da contabilidade ambiental se refere ao Passivo Ambiental, ou seja, os danos ao meio ambiente causados por empresas que têm, consequentemente, obrigação de repará-los. De forma objetiva, podemos dizer que Passivo Ambiental é todo tipo de impacto causado ao ambiente por um determinado empreendimento e que não tenha sido reparado ao longo de suasatividades. Como exemplos, tem-se desde o descarte incorreto de lixo a emissão de gases poluentes, lançamento de produtos químicos em ambientes aquáticos, contaminação do solo ou de águas subterrâneas, alterações realizadas nas paisagens devido às construções de estradas e projetos de mineração. Na teoria da contabilidade, Passivo, de acordo com Braga (2007), é denominado exigibilidade e representa uma obrigação de uma entidade para com outra que em algum momento deve ser liquidada. Adequando esses conceitos à contabilidade ambiental, Kraemer (2003) conclui que Passivos Ambientais são “as obrigações contraídas pela empresa perante terceiros, que origina um gasto ambiental (ativos, custos, despesas etc.)”. De acordo com Ribeiro (2006), há três tipos de obrigações provenientes dos passivos ambientais: • Obrigações de natureza legal são aquelas em que a empresa tem uma obrigação presente legal como consequência de um evento passado, que é o uso do meio ambiente (água, solo, ar etc.) ou a geração de resíduos tóxicos. Surge de um contrato, legislação ou outro instrumento de lei. 8 • Obrigações construtivas são aquelas que a empresa se propõe a cumprir espontaneamente, excedendo as exigências legais. Isso pode ocorrer principalmente quando a empresa estiver preocupada com sua reputação na comunidade em geral ou consciente de sua responsabilidade social, usando os meios disponíveis para proporcionar o bem-estar da comunidade. • Obrigações justas, ou seja, refletem a consciência de responsabilidade social. A empresa as cumpre em razão de fatores éticos e morais. O levantamento do Passivo Ambiental de uma empresa deve ser realizado por equipe especializada para que possa ser realizada a sua contabilização. Essa etapa de levantamentos pode incluir questões desde trabalhos de campo, análises de cunho laboratorial – no caso de contaminações, na sua grande maioria –, enfim, tudo o que for pertinente à caracterização ambiental e seus processos causadores. A partir disso é que o seu valor poderá ser estimando, sendo provisionado um valor, com todos os detalhes dessa estimativa em notas explicativas (Tinoco; Kraemer, 2011). TEMA 4 – RECEITAS, DESPESAS E PERDAS DE NATUREZA AMBIENTAL Ainda dentro do universo que abrange as contas contábeis das empresas, no tocante à sua situação ambiental, é necessário discriminar o que são as receitas, as despesas e as perdas ambientais. Nesse sentido, os custos ambientais fazem parte do total de custos de uma entidade e consistem no conjunto de gastos monetários incorridos em uma instituição. Conforme Antonovz (2014, citada por Santos 2001), entende-se por despesas ambientais todos os gastos relacionados direta ou indiretamente ao gerenciamento ambiental do processo produtivo, ou mesmo aqueles decorrentes de atividades voltadas ao meio ambiente. Nesse caso, ainda conforme citado pela autora acima, representam amortização, exaustão e depreciação, aquisição de insumos para controle, redução ou eliminação de poluentes, tratamento de resíduos de produtos, disposição dos resíduos poluentes, tratamento de recuperação e restauração de áreas contaminadas, mão de obra utilizada nas atividades de controle e preservação e recuperação do meio ambiente. Braga (2007) considera que despesas ambientais são todos os gastos envolvidos com o gerenciamento ambiental, aplicados de forma indireta, 9 consumidos no período e incorridos na área administrativa, apontando como exemplos todos os gastos relativos a horas de trabalho e insumos necessários aos processos de definição e manutenção de programas e políticas ambientais, seleção e recrutamento de pessoal para gerenciamento e operação do controle ambiental, compra de insumos e equipamentos antipoluentes, pagamento das compras realizadas para a área ambiental, recepção dos itens ambientais adquiridos, estocagem dos insumos utilizados no controle ambiental, treinamentos específicos para a proteção ambiental e auditoria ambiental. No caso das receitas ambientais, Tinoco e Kramer (2011) as definem como aquelas decorrentes de prestação de serviços especializados em gestão ambiental, venda de produtos elaborados de sobras de insumos do processo produtivo, como sucatas e sobras, venda de produtos reciclados e receita de aproveitamento de gases e calor. Os autores também listam as reduções do consumo de matérias-primas, de energia, de água bem como ganhos intangíveis àqueles sobre a conquista de mercado que empresa passa a obter a partir do momento em que a opinião pública reconhece suas ações e começa a dar preferência a seus produtos. Em relação às perdas ambientais, Ribeiro (2010) as descreve como aquelas que refletem os gastos incorridos sem uma contrapartida em benefícios, ou seja, não proporcionam benefícios para as empresas. O autor explica ainda que os gastos podem ser classificados como normais, ou seja, aceitáveis e até previsíveis dentro do planejamento da empresa, ou anormais, que são os que acontecem inesperadamente, de volume relevante e na maioria das vezes por subestimação dos riscos. Um exemplo bastante simples e comum sobre perdas ambientais é o caso de multas ou penalidades por inadequações das atividades à legislação. Por fim, Antonovz (2014) aponta uma questão relevante em relação ao tema apresentado, que é o fato de que segregar esses elementos não é uma tarefa muito fácil, uma vez que apresentam elementos que são de natureza intangível, por exemplo a reputação e a imagem de uma empresa. Atualmente, diz a autora, o que é realmente mensurado são os aspectos de mais fácil identificação, aqueles sujeitos a fatores externos, quando se conhecem os impactos gerados pela incorreta utilização dos bens naturais ou mesmo aqueles gerados por um gerenciamento ambiental inadequado. 10 TEMA 5 – PLANO DE CONTAS AMBIENTAIS A partir de tudo o que vimos, podemos definir do que se trata um Plano de Contas, ou seja, o registro adequado e justo das operações realizadas numa organização empresarial de forma objetiva, clara para poder representar as devidas contas dos registros das transações econômicas realizadas ou dos fatos geradores (Ferreira, 2006). Segundo Kramer (2000), o Plano de Contas terá como contribuição dentro da contabilidade de gestão ambiental um uso mais eficiente de recursos naturais, como a água (geração de energia); a redução dos custos externos relacionados à poluição da indústria, como os custos monitoramento ambiental; o fornecimento de informações para a tomada de decisão, melhorando a política pública e o fornecimento de informação ambiental industrial do desempenho (Kraemer, 2000). Créditos: isak55/Shutterstock. O Quadro 1 mostra um exemplo de como os elementos ambientais podem ser estruturados dentro de um Plano de Contas: 11 Quadro 2 – Plano de Contas Fonte: Adaptado de Tinoco; Kraemer, 2011. Conclui-se, então, que um Plano de Contas que envolva as atividades relacionadas ao meio ambiental não é, e não pode ser, um agrupamento de informações recolhidas daquilo que apenas estiver ao alcance rápido do banco de dados da contabilidade geral de forma a preencher algum relatório. Muito pelo contrário, o Plano de Contas deve ser cuidadosamente planejado com atenção à segregação de todas as informações e com visão e preocupação de gerar 12 dados para o futuro uso em análises e geração de indicadores contábeis de meio ambiente. TROCANDO IDEIAS O texto do professor Abramovay apontou que os países mais desenvolvidos andam “a galope” para incluir a pegada material de suas economias no sistema de contasnacional. No entanto, no Brasil, país com imenso potencial de desenvolvimento a partir de seus bens naturais, a discussão é incipiente. O que acha? Quais são os desafios que essa mudança impõe? Qual é o papel do “contador ambiental”? NA PRÁTICA Um dos tópicos incluídos em um Plano de Contas Ambientais se relaciona aos Passivos Ambientais das empresas. A seguir, segue um recorte sobre os passivos ambientais, sociais e econômicos que a empresa Norte Energia, com seu projeto mais controverso e de impacto ambiental altíssimo, tem transferido à sociedade brasileira. Veremos ao longo do trecho os aspectos tangíveis – multas, compensações etc. – e os intangíveis, dos quais também falamos em nossa aula, que se referem aos direitos das populações tradicionais que foram violados desde a constituição do projeto, bem como a reputação da empresa, fora os ecossistemas que foram perdidos ou modificados de forma irreversível. Além disso, estão implícitos os altos custos em medidas judiciais realizadas pela Norte Energia para barrar as ações que têm se acumulado. Esse sem dúvida é um caso extremo em que a Contabilidade Ambiental revela a sua importância em demonstrar o tamanho dos passivos ambientais impostos à empresa e à sociedade. Quem pagará essa conta? Belo Monte, um legado de violações A Licença de Operação de Belo Monte completa um ano e, para marcar a data, publicamos o seguinte balanço dos passivos, pendências e dívidas da usina junto ao Xingu e seus povos. Indígenas isolados ameaçados, sistema de saneamento básico em Altamira (PA) incompleto – jogando esgoto diretamente em rios e igarapés – hospital fechado, ribeirinhos expulsos de suas casas – lutando para recuperar seus modos de vida – Terras Indígenas desprotegidas e o rio Xingu definitivamente transformado. Um ano após a emissão da Licença de Operação (LO) da hidrelétrica de Belo Monte e o barramento definitivo do Xingu, o legado da maior usina hidrelétrica construída na Amazônia está erguido sobre graves violações aos direitos humanos e ao meio ambiente. A usina encerra 2016 com três tentativas de suspensão da LO na Justiça, suspeita de 13 superfaturamento de R$ 3,384 bilhões nas obras e inadimplente nas principais obrigações socioambientais. [...] Durante o primeiro semestre deste ano, Belo Monte recebeu multas administrativas que chegaram ao valor total de R$ 35,3 milhões. Foram as maiores infrações impostas pelo Ibama à empresa Norte Energia desde a emissão da primeira licença ambiental, em 2010. A concessionária foi multada em R$ 27,3 milhões pela morte de 16,2 toneladas de peixes durante o processo de enchimento do reservatório principal, entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016. A essa multa se somam outras duas punições publicadas entre janeiro e fevereiro, no valor de R$ 8 milhões, também por causa da morte massiva de peixes. [...] A Norte Energia, além de responsabilizada por crime ambiental, também foi multada em meio milhão de reais, em janeiro deste ano, por apresentar informações falsas em relatórios para o Ibama sobre a quantidade de trabalhadores contratada para realizar o resgate da fauna aquática. Essa equipe tinha como uma das principais funções fazer o salvamento dos peixes aprisionados em bolsões d’água após a redução da vazão. Ao longo dos seis anos de licenciamento, a Norte Energia já recebeu Autos de Infração que culminaram com a aplicação de multas ambientais no montante de mais de 60 milhões de reais em decorrência de diversas infrações, crimes ambientais, reporte de informações falsas, entre outras irregularidades constatadas pelos analistas ambientais do Ibama que acompanham a obra. [...] Dentre o conjunto de descumprimentos, os mais graves, sem dúvida, têm a ver com a população que ainda luta pelo respeito do direito de ser reassentada próxima ao rio Xingu, em condições dignas e com possibilidades reais de reconstrução de suas vidas, redes sociais e atividades econômicas. Para poder barrar o rio Xingu e encher o lago do reservatório principal da usina de Belo Monte, a Norte Energia removeu compulsoriamente mais de cinco mil famílias que residiam tanto na cidade de Altamira como nas ilhas e nas margens do rio Xingu. [...] [...] Assim, em decisão de setembro de 2016, a Norte Energia foi obrigada a pagar R$ 60 mil pelo descumprimento da conclusão dos sistemas de abastecimento de água e esgotamento sanitário até o dia 30 de outubro de 2016, e a partir desta data, ficou estabelecida multa de R$ 40 mil por dia até a operação dos sistemas de saneamento básico em todo o perímetro urbano de Altamira. Segundo MPF, a empresa não cumpriu a decisão. [...]. (Adaptado de Instituto Socioambiental – ISA, 2016) FINALIZANDO Iniciamos nossa aula a partir do texto de Ricardo Abramovay, o qual trouxe uma série elementos que reforçam a tese de que o valor de mercado dos bens não é capaz de sinalizar adequadamente o uso que deles fazem as sociedades humanas. Mesmo assim, há uma série de países que têm caminhado nessa direção, situação diferente do Brasil. O texto propiciou um olhar com mais cuidado do Sistema de Contas Nacionais e do movimento atual pela modificação desse sistema em prol de incorporar a exaustão e a degradação dos recursos naturais utilizados no processo econômico. 14 Na sequência, aprendemos sobre os ativos ambientais, bens adquiridos pela empresa que visam a controle, preservação e recuperação do meio ambiente. Também aprendemos sobre os Passivos Ambientais, ou seja, o impacto causado ao ambiente por um determinado empreendimento e que não tenha sido reparado ao longo de suas atividades. Ainda dentro do universo que abrange as contas contábeis das empresas no tocante à sua situação ambiental, examinamos os conceitos de receitas, despesas e perdas ambientais. Por fim, pudemos nos deparar com a estruturação de um Plano de Contas Ambiental. Para a nossa compreensão prática, escolhemos um dos tópicos incluídos no Plano de Contas Ambientais: os Passivos Ambientais das empresas e como se articulam no caso da hidrelétrica de Belo Monte. 15 REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, R. A economia global, cada vez mais pesada. Valor Econômico, 3 jan. 2018. Disponível em: <http://ricardoabramovay.com/a-economia-global- cada-vez-mais-pesada/>. Acesso em: 25 abr. 2019. ANTONOVZ, T. Contabilidade ambiental. Curitiba: InterSaberes, 2014 (Série Gestão Financeira). BRAGA, C. (Org.). Contabilidade ambiental: ferramenta para gestão da sustentabilidade. São Paulo: Atlas, 2007. CFC – Conselho Federal de Contabilidade. NBC TE XXX: Interação da entidade com o meio ambiente. Disponível em: <https://cfc.org.br/wp- content/uploads/2016/02/NBC_TE_INTERACAO_DA_ENTIDADE_MEIO_AMBI ENTE.pdf>. Acesso em: 25 abr. 2019. CLAUDE, M. Cuentas pendientes: estado y evolución de las cuentas del medio ambiente en America Latina. Fundación Futuro Latinoamericano, 1997. DIAZ, M. del C. V.; AMIN, M. M. Sistemas de Contas Ambientais (SCN): a inclusão da exaustão e degradação dos recursos naturais nas estimativas econômicas. In: Encontro de Sociedade de Economia Ecológica – EcoEco Anais. Caxias do Sul, 2003. FERREIRA, A. C. de S. Contabilidade ambiental: uma informação para o desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. HARRISON, A. Introducing natural capital into the SNA. In: AHMAD, Y. J., ELSERAFY, S., LUTZ, E. (Ed.). Environmental accounting for sustainable development. Washington, D.C.: The World Bank/Unep, 1989. p. 19-25. Resources 14, p. 14-16. 1999. ISA – INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Belo Monte, um legado de violações. Medium. Disponível em: <https://medium.com/hist%C3%B3rias- socioambientais/belo-monte-um-legado-de-viola%C3%A7%C3%B5es- 43ea35c973b8>.Acesso em: 25 abr. 2019. KRAEMER, M. E. P. Passivos ambientais. Monografias. Disponível em: <https://www.monografias.com/pt/trabalhos/passivo-ambiental/passivo- ambiental.shtml>. Acesso em: 25 abr. 2019. 16 _____. Contabilidade ambiental. Relatório para um futuro sustentável, responsável e transparente. Ambiente Brasil. Disponível em: <https://ambientes.ambientebrasil.com.br/gestao/artigos/contabilidade_ambient al:_relatorio_para_um_futuro_sustentavel,_responsavel_e_transparente.html>. Acesso em: 25 abr. 2019. RIBEIRO, M. S. Contabilidade ambiental. São Paulo: Saraiva, 2006. TINOCO, J. E. P; KRAEMER, M. E. P. Contabilidade e gestão ambiental. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011. UN – United Nations. Department for Economic and Social Information and Policy Analysis Statistical Division. Handbook of National Accounting: Integrated environmental and economic accounting, interim version. New York, 1993.
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